quilombo cedro

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1 I - INTRODUÇÃO – Este Relatório Técnico-Científico 1 consiste numa fonte de documentação antropológica que pretende oferecer subsídios indispensáveis à tramitação do processo para obtenção do título definitivo da propriedade da terra ora reivindicada por moradores do bairro rural Cedro, pertencente ao município de Barra do Turvo - localizado na região do alto Vale do Ribeira. Trata-se de uma comunidade tradicional que se auto-reconhece como remanescente de quilombo e está empenhada atualmente não apenas em afirmar-se como portadora da identidade afro-descendente e a origem quilombola, mas também ter reconhecido pelo governo do estado de São Paulo, o seu justo direito de permanecer na terra ocupada desde o passado pelos seus ancestrais e, porquanto, receber o título definitivo de propriedade da mesma. Reivindicação que está de acordo com o Artigo 68 do Ato das Disposições Transitórias instituída pela Constituição Federal de 1988, que diz: “Aos Remanescentes das Comunidades de Quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida à propriedade definitiva, devendo o Estado, emitir-lhes os respectivos títulos” 2 . Esclareço logo de início que ao apropriar-me aqui da expressão “comunidade tradicional” estou fazendo uso de uma noção antropológica, cujo significado pretende evocar a idéia de agrupamento familiar ou pessoa individual que embora não possua documentação escrita que comprove a posse indiscutível de determinada área territorial, onde se encontra estabelecido e reivindica direito à propriedade, está vinculada desde as origens mais 1 A criação desta categoria de investigação denominada Relatório Técnico Científico, bem como os parâmetros que o norteiam, são resultantes dos esforços do Grupo de Trabalho criado pelo Governo do Estado de São Paulo por meio do Decreto n. 40.723, de 21 de março de 1996, que tinha por objetivo fazer proposições visando a plena aplicabilidade dos dispositivos constitucionais conferentes do direito de propriedade aos remanescentes das comunidades de quilombos em território paulista. Foi integrados por representantes da Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania, Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes Silva”, Secretaria do Meio Ambiente, Procuradoria Geral do Estado, Secretaria de Governo e Gestão Estratégica, Secretaria de Cultura, Conselho de Defesa do patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico, Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra no Estado de Sã Paulo, Subcomissão do Negro da Comissão de Direitos Humanos da ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo e Fórum Estadual de Entidades Negras. Os trabalho deste Grupo levaram à criação: a) do Programa de Cooperação Técnica e Ação Conjunta para identificação, discriminação e legitimação de terras devolutas do Estado ocupadas por remanescentes de comunidades de quilombos visando sua regularização fundiária, implantado medidas sócio-econômicas, ambientais e culturais e b) de um Grupo Gestor para implementação do Programa. O Programa e o Grupo Gestor foram criados por meio do decreto n. 41.774 de 13 de maio de 1997. 2 Cf.: Andrade, Tânia et. alli.(edts) - Negros do Ribeira: reconhecimento étnico e conquista do território, 2000, p. 3.

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Page 1: Quilombo Cedro

1 I - INTRODUÇÃO –

Este Relatório Técnico-Científico1 consiste numa fonte de documentação antropológica que

pretende oferecer subsídios indispensáveis à tramitação do processo para obtenção do título

definitivo da propriedade da terra ora reivindicada por moradores do bairro rural Cedro,

pertencente ao município de Barra do Turvo - localizado na região do alto Vale do Ribeira.

Trata-se de uma comunidade tradicional que se auto-reconhece como remanescente de

quilombo e está empenhada atualmente não apenas em afirmar-se como portadora da

identidade afro-descendente e a origem quilombola, mas também ter reconhecido pelo

governo do estado de São Paulo, o seu justo direito de permanecer na terra ocupada desde o

passado pelos seus ancestrais e, porquanto, receber o título definitivo de propriedade da

mesma. Reivindicação que está de acordo com o Artigo 68 do Ato das Disposições

Transitórias instituída pela Constituição Federal de 1988, que diz: “Aos Remanescentes das

Comunidades de Quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida à propriedade

definitiva, devendo o Estado, emitir-lhes os respectivos títulos”2.

Esclareço logo de início que ao apropriar-me aqui da expressão “comunidade tradicional”

estou fazendo uso de uma noção antropológica, cujo significado pretende evocar a idéia de

agrupamento familiar ou pessoa individual que embora não possua documentação escrita

que comprove a posse indiscutível de determinada área territorial, onde se encontra

estabelecido e reivindica direito à propriedade, está vinculada desde as origens mais

1 A criação desta categoria de investigação denominada Relatório Técnico Científico, bem como os parâmetros que o norteiam, são resultantes dos esforços do Grupo de Trabalho criado pelo Governo do Estado de São Paulo por meio do Decreto n. 40.723, de 21 de março de 1996, que tinha por objetivo fazer proposições visando a plena aplicabilidade dos dispositivos constitucionais conferentes do direito de propriedade aos remanescentes das comunidades de quilombos em território paulista. Foi integrados por representantes da Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania, Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes Silva”, Secretaria do Meio Ambiente, Procuradoria Geral do Estado, Secretaria de Governo e Gestão Estratégica, Secretaria de Cultura, Conselho de Defesa do patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico, Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra no Estado de Sã Paulo, Subcomissão do Negro da Comissão de Direitos Humanos da ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo e Fórum Estadual de Entidades Negras. Os trabalho deste Grupo levaram à criação: a) do Programa de Cooperação Técnica e Ação Conjunta para identificação, discriminação e legitimação de terras devolutas do Estado ocupadas por remanescentes de comunidades de quilombos visando sua regularização fundiária, implantado medidas sócio-econômicas, ambientais e culturais e b) de um Grupo Gestor para implementação do Programa. O Programa e o Grupo Gestor foram criados por meio do decreto n. 41.774 de 13 de maio de 1997. 2 Cf.: Andrade, Tânia et. alli.(edts) - Negros do Ribeira: reconhecimento étnico e conquista do território, 2000, p. 3.

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2 remotas ao lugar. Em síntese, o lócus espacial onde os antepassados habitaram,

trabalharam, criaram família e formaram rede extensiva de parentesco.

Da mesma perspectiva, o termo “quilombo” é empregado no contexto deste relatório com

sentido mais abrangente e atualizado no campo das ciências humanas e sociais. A partir de

inúmeras reflexões e debates ocorridos no decorrer dos anos 1990, compartilhados por

cientistas sociais, historiadores, intelectuais e militantes de movimentos negros em torno da

noção de “quilombo”, buscou-se reavaliar criticamente o emprego dessa categoria e

redefinir o sentido conceitual da sua aplicação no campo das ciências humanas e sociais;

levando-se em consideração, sobretudo, o aspecto da diversidade das formas da

organização social, dos estilos de vida, das alternativas criadas para a sobrevivência, das

práticas culturais e simbólicas relacionadas aos diferentes tipos de agrupamento familiar -

rural ou urbano - formado por ex-escravos africanos e os seus descendentes no contexto

histórico da sociedade brasileira. Conforme nos esclarece o antropólogo Wagner de

Almeida3:

Os primeiros estudos levaram a uma referência histórica do período colonial. Quase todos os autores consultados, do presente ou do passado – desde o clássico de Perdigão Malheiro, A escravidão no Brasil: ensaio histórico, jurídico, social, que é de 1866, até os recentes trabalhos de Clóvis Moura, de 1996 -, trabalhavam com o mesmo conceito jurídico-formal de quilombo, um conceito que ficou, por assim dizer, frigorificado. Esse conceito, composto de elementos descritivos, foi formulado como uma ‘resposta ao rei de Portugal’ em virtude de consulta feita ao Conselho Ultramarino, em 1740. Quilombo foi formalmente definido como ‘toda habitação de negros fugidos, que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados e nem se achem pilões nele’.

Ao discutir sobre a apropriação do “conceito jurídico-formal de quilombo” por

reconhecidos estudiosos da história da escravidão negra no Brasil Almeida4 procurou

sintetizar cinco elementos básicos que ele observou estarem contidos na definição mais

popularizada dessa categoria descritiva: 1 – fuga: noção de “quilombo vinculada a escravos

fugidos”; 2 – versão que todo “quilombo comportaria uma quantidade mínima de fugido”;

3 – “isolamento geográfico” dos quilombos e sempre localizados em local de difícil acesso;

4 – sugestão de “rancho” instalado; 5 – consideração da “premissa”: ‘nem que achem pilões

3 Cf.: Almeida, Alfredo Wagner B. de – “Os quilombos e as novas etnias”, 2002, p 47. 4 Ibidem, p.48.

Page 3: Quilombo Cedro

3 nele’, significando, no contexto em questão, “símbolo do auto-consumo e da capacidade

de reprodução”.

Esta descrição de “quilombo”, apoiada quase exclusivamente numa acepção conceitual -

jurídico-formal – antiga, compreende-se hoje que é bastante restrita e não permite a

apreensão fidedigna desta realidade histórica em toda sua complexidade e nuanças. Com

efeito, pesquisas de campo - vinculadas principalmente à produção de laudos

antropológicos – contribuem hoje para demonstrar que os quilombos variaram no aspecto

enquanto modelo organização social e tipo de relacionamento com a sociedade envolvente,

como esclarece Bandeira e Dantas5: “A palavra quilombo, portanto, não se refere apenas a

esconderijo de escravos fugidos. Essa era a acepção dada ao termo pelos colonizadores. A

palavra quilombo origina-se etimologicamente da língua africana quimbundo, em que a

palavra kilombo tem, entre outros, significados de povoação, união”.

A partir de reflexões teóricas como as enunciadas acima, baseadas em pesquisas de campo

e tendo como preocupação central a problemática da demarcação de terras das chamadas

populações ou povos tradicionais – negras ou indígenas – é que a comunidade

antropológica discutiu e propôs - em reunião da Associação Brasileira de Antropologia

[ABA ] – a seguinte definição conceitual:

O termo Remanescente de Quilombo (destaque do autor), conforme deliberado pela ABA – Associação Brasileira de Antropologia, em encontro realizado nos dias 17 e 18 de outubro de 1.994, no Rio de Janeiro, embora tenha um conteúdo histórico, designa ‘hoje a situação presente dos segmentos negros em diferentes regiões e contextos e é utilizado para designar um legado, uma herança cultural e material que lhe confere uma referência presencial no sentimento de ser e pertencer a um lugar e a um grupo específico6.

Esta citação é sugestiva, inclusive, quanto à importância de se atentar para as marcas

simbólicas que os sujeitos interlocutores evocam para afirmar a sua diferença como pessoa

e coletividade - o que está sendo dito, as sutilezas das respostas, as narrativas tecidas sobre

as origens e representações do próprio “eu” devem ser consideradas e levadas a sério pelo

antropólogo. Compreendendo isso é que no processo de produção deste Relatório Técnico- 5 Bandeira, M de L. e Dantas, T. de V. S. – “Furnas de Dionísio (MS)”, 2002, p.217. 6 Informação repassada ao ITESP em 1995, por José Milton Garcia, da Procuradoria do Patrimônio Imobiliário de São Paulo, através de ofício. Cf: Andrade, Tânia et. alli.(edts), Op. Cit., 2000, p. 7.

Page 4: Quilombo Cedro

4 Científico procurei de maneira sistemática e rigorosa, levantar informações concernentes

às origens da comunidade, às relações sociais e simbólicas, ao estilo de vida e sobre

genealogias de parentescos; entre outros dados que julguei também ter importância para a

compreensão um pouco melhor da realidade dos habitantes do bairro Cedro – ao evocar o

passado e o presente – bem como colocar em evidência a intenção e o desejo deles de

terem a identidade deles reconhecida e respeitada como remanescentes de quilombos.

Oportunidade que surge para elas neste momento valioso em que o “Instituto de Terras do

Estado de São Paulo – ITESP” está empenhado em cumprir com o dever que é da

competência desse órgão: “promover a identificação e demarcação das terras ocupadas por

remanescente das comunidades de quilombos, para fins de regularização fundiária”7.

Isso posto, gostaria de salientar que este Relatório Técnico-Científico é fruto de um

trabalho de pesquisa antropológica de campo, realizada junto às comunidades

remanescentes de quilombo do povoado do Cedro, entre os meses de setembro e

dezembro8. Este trabalho antropológico possibilitou o levantamento de dados significativos

para a produção na íntegra deste Relatório Técnico-Científico aqui apresentado no formato

de 6 capítulos.

O primeiro compreende-se por esta Introdução. Já o segundo capítulo – “A localização

geográfica da comunidade remanescente de quilombo do povoado do Cedro” -, trata-se de

uma abordagem mais historiográfica, com destaque, na primeira seção, para o processo de

ocupação do Vale do Ribeiro. Na segunda seção a exposição gira em torno do surgimento

7 Este compromisso diz respeito ao “Inciso IV do artigo 3º. Da Lei Estadual n.10.207/99”

Cf.Edital de Pregão n.20/2006; Processo n.0630/2005 – anexo IV(Memorial Descritivo). 8 O trabalho consistiu das seguintes atividades: a) levantamento e consulta a fontes documentais junto ao ITESP e em arquivos da comunidade pesquisada (mapas, registros de imóveis, certidões etc); b) pesquisa e consulta bibliográfica (RTCs livros e artigos que constam da “Referência Bibliográfica” deste trabalho.); e, c) pesquisa de campo propriamente dito, que compreendeu: c.1 - visitas esporádicas à comunidade (com permanência in locu por períodos que variaram entre quatro dias ou uma semana); c.2 - observação direta da vida cotidiana; c.3 - entrevistas gravadas com pessoas mais velhas e lideranças locais e que possibilitou o registro da história oral; c.4 - conversas informais com diferentes interlocutores e que tanto contribuíram para acrescentar informações sobre o passado da comunidade, quanto fornecer esclarecimentos sobre a realidade atual (com destaque para as dificuldades enfrentadas na vida cotidiana, situações de conflito, e as alternativas criadas na tentativa de superá-las), além de permitir a apreensão do imaginário social e as formas de representação dos sujeitos interlocutores enquanto pessoa e coletividade; c.5 – entrevista dirigida com responsáveis da família para levantamento de informações sobre genealogia de parentesco; c.6 – visita domiciliar para conferir e/ou complementar de dados sobre genealogia de parentesco; c.7 – acompanhamento direto do trabalho geográfico de localização dos pontos referenciais – com recurso de GPS – para configuração da área ocupada pela comunidade (casas, roças, engenhos etc).

Page 5: Quilombo Cedro

5 do município de Barra do Turvo, os aspectos culturais, sócio-econômicos e político dessa

localidade no passado.

Ao longo do terceiro capítulo a discussão é centrada na história oral da comunidade

remanescente de quilombo do Cedro. A partir da oralidade destaco os nomes dos ancestrais

que deram origem ao povoado, numa aventura corajosa, pioneira e desafiante.

A abordagem do quarto capítulo é centrada no contexto do presente. A exposição gira em

torno das condições de vida e existência das pessoas do povoado do Cedro. A dinâmica das

relações sociais, as formas de cooperação, situações de conflito, as práticas culturais e

representações simbólicas são apontadas neste capítulo.

Dediquei-me num quinto capítulo à reflexão em torno do conceito de identidade étnica. A

tentativa foi esclarecer ao leitor sobre a aplicação desta categoria analítica no campo das

Ciências Sociais e as críticas suscitadas. Em certo sentido, a proposta do capítulo é repensar

noção de identidade étnica considerando as reflexões teóricas mais recentes, focadas na

questão da crise das identidades no contexto atual da chamada “pós-modernidade”. A

relevância do assunto tratado neste capítulo explica-se, principalmente, pela centralidade

desta noção - identidade étnica - no contexto das discussões em torno da problemática da

demarcação e a concessão, pelo Estado, do titulo definitivo de propriedade das terras

tradicionalmente ocupadas9 pelas comunidades remanescentes de quilombos (e indígenas)

no Brasil.

Por fim, o sexto capítulo consiste da Conclusão deste Relatório Técnico-Científico e,

portanto, é onde apresento o meu parecer sobre a situação da comunidade no que concerne

tanto à questão da afirmação identitária como remanescente de quilombo, quanto ao

problema central que é a reivindicação pela mesma das terras tradicionalmente ocupadas.

9 A propósito de uma discussão mais aprofundada sobre a noção de “terras tradicionalmente ocupadas” a referência sugerida é Almeida, Alfredo Wagner B. de – Terras de quilombo, terras indígenas e fundos de pasto: terras tradicionalmente ocupadas, 2006.

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6 - Capítulo II -

A LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA COMUNIDADE REMANESCENTE DE QUILOMBO DO CEDRO.

A – O Vale do Ribeira -

A região do Vale do Ribeira fica localizada entre os Estados de São Paulo e Paraná; sendo

compreendido por uma extensa faixa territorial que abrange desde municípios no entorno

da capital paulista até os limítrofes de Curitiba. E pelo litoral, desde as proximidades de

Peruíbe, no ponto mais ao norte, até próximo do Paranaguá, no ponto mais ao sul10.

A ocupação do Vale do Ribeira começou pela área litorânea. Na altura do século XVI

portugueses e espanhóis disputaram a colonização desta vasta região. Em 1504, por

exemplo, a esquadra comandada por Américo Vespúcio deixou nas praias da Ilha Cardoso

um bacharel degredado. Depois, em 1508, foi a vez da expedição de Vicente Yanez Pinzon

abandonar na mesma ilha mais sete castelhanos. Aventureiros que foram encontrados mais

tarde, no ano de 1551, pela expedição de Martin Afonso ao ancorar no lugar tendo em vista

a procura de metais preciosos, como ouro e prata.

Os municípios do Vale do Ribeira conhecidos como Cananéia e Iguape são descritos em

RTCs produzidos por antropólogos contratados pelo ITESP - apoiados em Laudos

Antropológicos vinculados ao Ministério Público Federal - como localidades por onde teve

inicio a ocupação colonizadora do Vale do Ribeira.

A ocupação das áreas interioranas do Vale do Ribeira ocorreu posteriormente. No decorrer

do século XVII, motivada particularmente pela descoberta de ouro em depósito aluvião,

pelos aventureiros que adentraram a mata atlântica seguindo o curso dos rios. O movimento

provocado por tal descoberta levou à organização do primeiro povoado surgido no alto do

Vale do Ribeira, como é o caso de Xiririca (hoje conhecida pelo nome de Eldorado).

A descoberta do ouro em depósito aluvião deu impulso ao primeiro ciclo econômico

marcante da região. A mineração aurífera perdurou no Vale do Ribeira do século XVI até o

10 Cf. Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório Técnico-Científico sobre os quilombos remanescentes da comunidade de quilombo do Galvão, municípios de Eldorado e Iporanga – SP, 2000, p. 13.

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7 século XIX; mas enquanto atividade econômica principal o movimento derradeiro foi ao

final do século XVII. A partir deste período a atividade mineradora entra em declínio nesta

região devido à descoberta de atrativos veios auríferos nas encostas e leitos de rios entre as

montanhas da próspera Capitania das Minas Gerais. Em substituição à exploração mineral

ganhou destaque economicamente, no Vale do Ribeira, uma atividade até então secundária,

ou seja, a rizicultura.

A exploração da força do trabalho escravo, representada pela mão de obra indígena e dos

africanos e/ou seus descendentes, tiveram importância capital no contexto destes dois ciclos

econômicos, conforme descrito por Carvalho e Schmitt11: “já no século XVI, não era

incomum a existência concomitante de escravos negros e indígenas nas expedições que

partiam para o interior de São Paulo”.

Entretanto, observa-se que pouca atenção foi prestada a este fato pelos estudiosos da

sociedade escravista no estado de São Paulo. Isso é o que se insinua nas críticas tecidas por

Carril contra a interpretação de alguns historiadores que, segundo ela, defendem a tese de

que o trabalho escravo no estado paulista só foi introduzido de forma significativa a partir

do empreendimento da monocultura cafeeira12. Através da sua crítica esta autora fez alertar

para a carência de estudos historiográficos sistemáticos e aprofundados produzidos sobre o

Vale do Ribeira, então enfrentada por ela.

Mas é preciso reconhecer que esta restrição há algum tempo já vem sendo superada, graças,

inclusive, aos trabalhos de produção de Laudos Antropológicos vinculados ao Ministério

Público Federal13, voltados para a identificação e mapeamento de comunidades tradicionais

remanescentes de quilombos localizadas no Vale do Ribeira, e, da mesma forma, os

Relatórios Técnico-Científicos14, produzidos por antropólogos contratados pelo ITESP e

cuja finalidade é produzir documentação relevante ao processo para obtenção do titulo

definitivo de propriedade das terras tradicionalmente ocupadas nesta referida localidade do

11 Carvalho, Maria C.P. de e Schmitt, Alessandra – Relatório Técnico-Científico sobre a comunidade de quilombo do Nhunguara, localizada nos municípios e Eldorado e Iporanga/SP, 2000, p.22. 12 Apud. Carvalho e Schmitt, Ibidem. 13 A referência principal aqui é ANDRADE, Tânia et alli (eds) – [2ª ed.] Negros do Ribeira: reconhecimento étnico e conquista do território.... 14 Trata-se dos RTCs citados em notas de rodapé ao longo deste documento e com referência completa ao final do mesmo.

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8 estado de São Paulo. Sem esquecer, em acréscimo, da contribuição dos trabalhos

científico-acadêmicos recém produzidos em universidades como USP, Unicamp, entre

outras.

Sobre a exploração da mão-de-obra escrava do africano e seus descendentes no contexto da

atividade da mineração aluvial no Vale do Ribeira a citação do Laudo Antropológico do

MPF é esclarecedora: “(...) o Vale do Ribeira recebeu já no século XVI os primeiros

contingentes negros que foram a mão-de-obra de sustentação para o desenvolvimento da

atividade mineradora (...), eles foram levados também às outras localidades situadas Ribeira

acima”15.

O resumo parcial do Laudo de autoria de antropólogos do MPF, apresentado no contexto de

RTCs anteriores vinculados ao ITESP, também é válido agora citar justamente por fornecer

informações preciosas para a compreensão da peculiaridade da ocupação negra no Vale do

Ribeira, conforme segue abaixo:

“1 - O vale do rio Ribeira de Iguape já era habitado por populações indígenas no

período pré-colombiano, constituindo-se em área de passagem para aqueles que,

no inverno, desciam do planalto em direção ao litoral em busca da pesca.

2 – As populações indígenas tiveram grande importância na dinâmica da formação

dos contingentes populacionais do Vale e aparecem como importante referência

nas narrativas sobre a origem das comunidades negras da região.

3 – após o início da colonização portuguesa, a região ao longo do rio Pardo, com

uma formação geográfica que torna o aceso extremamente difícil, constituiu-se

em importante área de refúgio para as populações originais e também para os

indígenas fugitivos que chegavam de Cananéia e da Ilha do Cardoso.

4 – A constituição geográfica do Vale do Ribeira, com áreas protegidas pelas serras

e inúmeros rios de navegação perigosa atraiu para a região populações indígenas

perseguidas pelo bandeirantismo escravagista.

5 – O processo de expulsão dos índios no litoral do Vale do Ribeira começou logo

nas primeira décadas do século XVI, considerando que a disputa por novas

terras, iniciada por Portugal e Espanha, motivou o apossamento precoce de áreas 15 Apud.: Turatti, Maria Cecília M. – Relatório Técnico-Científico sobre remanescentes da comunidade de quilombo de Morro Seco/Iguape-SP, 2006, p.15.

Page 9: Quilombo Cedro

9 contíguas ao litoral. A ilha de Cananéia, palco dessas primeiras disputas,

fundada por um espanhol refugiados e povoadas por portugueses, foi o primeiro

porto da capitania de São Vicente, fundada após a chegada da esquadra de

Martim Afonso de Souza em 1531.

6 – Desde o século XVI, Cananéia e Iguape funcionaram como ‘cabeças de ponte’

para a penetração de mineradores em direção ao interior do Vale do Ribeira,

sendo que os primeiros núcleos de povoamento rio acima foram Ivaporunduva,

Xiririca (atual Eldorado), Iporanga, Apiaí e Paranapanema.

7 – A mineração nessa região esteve apoiada na mão-de-obra do escravo negro, que

começou a ser introduzida ainda no século XVI com as bandeiras de mineração

que partiam do litoral sul de São Paulo em direção ao interior do Vale. Contudo,

foi a partir de meados do século XVII que as incursões para o interior da região,

via rio Ribeira de Iguape, tornaram-se mais freqüentes.

8 – Embora tenha perdurado até meados do século XIX, quando se esgotaram os

últimos depósitos de ouro de aluvião conhecidos, a atividade mineradora na

região entrou em descenso no século XVIII, época da descoberta das jazidas de

Minas Gerais, para onde afluíram grandes contingentes de mineradores com

seus plantéis de escravos.

9 – Na primeira década do século XIX, especialmente após a chegada ao Brasil da

corte do D. João VI, o ciclo da mineração no Vale, já decadente, dá lugar a um

ciclo econômico agrícola voltado, principalmente, para a produção de arroz, o

qual, através do porto de Iguape, era vendido principalmente para o rio de

janeiro e secundariamente para outras províncias.” 16

Este resumo permite entrever que as características geográficas do Vale do Ribeira (serras e

rios de difícil navegação) ofereceram ambiente propício para o refúgio e abrigo de escravos

negros e indígenas que buscavam escapar, corajosamente, às condições subumanas de

trabalhador cativo. Mas é preciso acrescentar que a formação de agrupamento negros no

Vale do Ribeira também se originou de forma diversa desta; como serve para demonstrar os

registros sobre a libertação de cativos ou simplesmente o abandono dos sujeitos nessa

16 Carvalho e Schmitt – Op. Cit., p. 23; Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório Técnico-Científico sobre remanescentes da comunidade de quilombo do Galvão – Eldorado e Iporanga-SP, 2000, pp.15 -16.

Page 10: Quilombo Cedro

10 condição, pelos seus senhores no Vale do Ribeira, com o advento da descoberta de ouro

em terras das Minas Gerais17.

No alto do Vale do Ribeira o povoado do Cedro destaca-se como um dos bairros rurais

situados no município de Barra do Turvo. Este município fica a 320 quilômetros de

distância da cidade de São Paulo e a 150 de Curitiba. Saindo de ambas localidades, a via

principal de acesso a estes povoados é a Br 116 (“Régis Bittencourt”). Para chegar ao

povoado, para quem sai de carro da metrópole de São Paulo, é preciso seguir pela Br 116

até a altura do Km 551, onde o condutor deve virar, à direita, no entroncamento que dá

acesso à Rodovia SP 287, que liga os municípios de Barra do Turvo (31Km) e Iporanga (75

Km) à via principal, e seguir em frente até o quilômetro 6.

B - Uma breve incursão na história do Município de Barra do Turvo -

Pesquisas arqueológicas empreendidas no Vale do Ribeira têm comprovado que em tempos

remotos esta região era habitada por populações indígenas. No município de Barra do

Turvo os vestígios da existência de povos indígenas também podem ser encontrados. Isso

foi insinuado pelos meus interlocutores em outro momento18 e, também, aparece em

escritos sobre o município: “[há] notícias de que o início do povoamento da região dos rios

Pardos e Turvo, próximo à confluência de ambos ter-se-ia dado na metade do século XVII,

quando aí chegaram os jesuítas para estabelecer catequese dos índios, fato comprovável

pelos vestígios deixados pelo empreendimento”19.

Notadamente, esta “pista” sobre as origens do município deve ser levada a sério e fica por

merecer, todavia, uma pesquisa sistemática e mais aprofundada. Garimpando dados sobre a

história do município, a informação que parece mais consistente sugere que a fundação de

17 Carvalho, Schmitt, OP. Cit. 18 Pedro, um dos representantes da “Associação dos Remanescentes de Quilombo dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca”, em conversa informal, comentou comigo que já encontrou diversos pedaços de pote quebrado, entre outras peças, que acredita fazer parte de utensílios pertencente a povos indígenas que habitaram a região no passado. Um jovem professor do ensino de primeiro e segundo graus da rede municipal de Barra do Turvo, que se apresentou a mim como sendo formado em biologia pela USP e mestre nesta área pela mesma instituição, também fez menção aos indícios de sítios arqueológicos, ainda não explorados, nos domínios do município de Barra do Turvo, que são sugestivos quanto ao fato da ocupação no passado de povos indígenas naquela localidade. 19 Fonte Internet: Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira.

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11 Barra do Turvo teve como personagem principal um senhor cujo nome registrado é

Antonio Bueno Sampaio. Ele migrou de Iporanga para o lugar na altura do ano de 1852.

Nesta localidade ele se instalou definitivamente e dedicou tempo e trabalho investidos na

atividade da criação de suínos e na plantação de lavoura. A boa fertilidade da terra

compensava o problema da característica geográfica da região - formada por terreno

acidentado em altos relevos - e tornava a lavoura produtiva.

Provavelmente, este foi um dos fatores que também veio contribuir para a vinda de pessoas,

em seguida, e a fixação de agrupamentos familiares naquelas terras entre as margens dos

rios Pardo e Turvo. O surgimento dos quilombos que aos poucos se multiplicaram por esta

localidade do alto Vale do Ribeira talvez possa ser, em certo sentido, explicado por esse

motivo.

Desde os seus primórdios as atividades econômicas principais de Barra do Turvo sempre

estiveram relacionadas ao plantio de lavoura e a criação de animais. Produção cuja

circulação em forma de mercadoria dependia ora das demoradas caminhadas a pé, cortando

os sertões, ou longas viagens em lombo de mulas ou em canoas - conforme ilustra a citação

seguinte:

[n]aquela época tudo era muito difícil e o transporte mais usado era o de tração animal: no lombo de burros e mulas, ou, canoas de madeira [...]. Criadores de porcos conduziam suas manadas as vezes com mais de 500 cabeças a Itapeva, rumo aos frigoríficos, cortando sertões em viagens que duravam 20 a 25 dias para chegar a seu destino. Tropas de mulas partiam em direção à Iporanga, Apiaí, Eldorado e Iguape, levando produtos agrícolas20.

As condições para o estabelecimento das relações de troca econômicas e culturais são

também eram limitadas ao recurso dos tipos de transportes mencionados acima:

“Utilizavam-se também canoas como meio de transporte até Iguape, onde iam buscar

mercadorias ou à Tradicional Festa do Bom Jesus”21.

Ao longo da sua história as tentativas de empreendimentos econômicos no contexto de

Barra do Turvo variaram no tocante ao tipo de atividade priorizada. Em torno das

20 Ibidem 21 Ibidem

Page 12: Quilombo Cedro

12 atividades extrativistas e agropecuárias Barra do Turvo experimentou historicamente

momentos de altas e baixas, marcantes dos principais ciclos econômicos do município:

porcos, milho, feijão, Palmito Jussara, gado, buffalo e, atualmente, ganhando prioridade o

método agricultura baseado no sistema agroflorestal22.

Entre os anos 1910 e 1930 foi quando Barra do Turvo teve a sua “maior fartura”. Isso,

graças ao aumento da “produção agrícola e pecuária” que era, em grande parte,

“transformada no próprio município”, através da “fabricação da rapadura, aguardente e

farinha de mandioca”23. Entretanto, pelo que insinuam os registros este salto produtivo foi

passageiro e não garantiu a prosperidade ou o enriquecimento da localidade.

Mas é preciso considerar, todavia, o fato de Barra do Turvo até a primeira metade dos anos

de 1960 pertencer ao município de Iporanga. Segundo fonte consultada, foi em 30 de

novembro do ano de 1938 que se criou, através do Decreto-Lei Estadual n. 9775, o

“Distrito com a denominação de Barra do Turvo, no município de Iporanga”. E só mais

tarde, através da Lei-Estadual de n.8092 de 28 de fevereiro de 1964 é que Barra do Turvo

teve a sua autonomia, ao ser desmembrada de Iporanga e elevada à categoria de

município24.

Semelhante aos tempos passados, Barra do Turvo continua nos dias de hoje a ser um

município predominantemente rural. Com uma população estimada em 2004 de

aproximadamente 8.613 pessoas, 68% estão concentrados na área rural e apenas 32%

fixadas na área urbana da sede municipal. Entretanto, não obstante esta característica da

distribuição populacional a principal fonte de arrecadação de Barra do Turvo não provém

da atividade econômica vinculada ao setor rural e, sim, do “setor de serviços”. E isso não

deixa de gerar sérios problemas econômicos e sociais para o município. Conforme

explicita-se nesta fonte consultada25:

Os municípios dependentes basicamente dos serviços apresentam, em geral, os mais baixos valores per capita. São áreas em que as

22

Ibidem. 23 Fonte Internet: op. cit. Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira 24 Fonte Internet: op. cit. Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira 25 Fonte Internet: OTANI, Malimiria Norico et alli – “Breve perfil dos municípios rurais do Estado de São Paulo”. In.: Portal do governo de São Paulo/Instituto de Economia Agrícola – IEA. (Artigo registrado no CCTC-IEA sob o n. HP – 86/2005).

Page 13: Quilombo Cedro

13 atividades industrial e agropecuária não possuem destaque e, em geral, são dependentes dos serviços públicos ou de transferência de recursos Os 10 municípios com os menores PIBs per capita do Estado têm como atividade principal o setor de serviços. Estes se concentram basicamente no Vale do Ribeira (Barra do Turvo, cuja renda per capita R$ 2.197,00 é a menor do Estado, Iporanga, Cananéia, Miracatu e Barra do Chapéu) e no Vale do Paraíba. [...]

Estes municípios oferecem condições sociais bastante insatisfatórias à população, dado que 70% deles situam-se entre os grupos 4 e 5. Ou seja, apresentam baixo nível de riqueza e de indicadores sociais.

Esta citação contribui para demonstrar que os problemas enfrentados pelo município de

Barra do Turvo – e que sem dúvida refletem diretamente na qualidade de vida e condições

da sobrevivência da sua população. Trata-se de uma realidade concreta que obriga o poder

público local a pensar em alternativas que sejam viáveis para o desenvolvimento sócio-

econômico do município, sem perder de vista a questão da preservação do meio-ambiente e

a necessidade de promover políticas favoráveis à melhoria da qualidade de vida da

população constitutiva do lugar. O empenho na valorização e preservação do meio-

ambiente, o investimento planejado no potencial turístico oferecido pelas benesses da

natureza (Mata Atlântica, relevos, grutas, rios e cachoeiras etc.)26, bem como o apoio á

demarcação das terras ocupadas pelas comunidades tradicionais remanescentes de

quilombos locais, talvez seja uma boa saída para a prosperidade de Barra do Turvo e

revigorar as esperanças no futuro das gerações vindouras deste município.

26 Em portal na Internet do município de Barra do Turvo há destaque para o eco-turismo, a pesca e a prática de esportes radicais - como o vôo livre.

Page 14: Quilombo Cedro

14 - Capítulo III –

- A MEMÓRIA LOCAL -

A reconstituição histórica do povoado do Cedro só se torna possível através do recurso da

oralidade. Assim como em outros empreendimentos antropológicos nos arredores, foi

imprescindível sentar com os mais velhos do lugar para ouvi-los relembrar o passado; sem,

no entanto, desprezar a contribuição valiosa dos dados registrados em trabalhos produzidos

anteriormente sobre comunidades remanescentes de quilombos vizinhas 27.

Observou-se em trabalhos anterior que os nomes de pessoas como Pacífico Morato de

Lima, Miguel de Pontes Maciel, Benedito Rodrigues de Paula, são nomes e sobrenomes

invariavelmente evocados no discurso dos interlocutores para se referirem aos antepassados

que inauguraram a história do lugar. Como demonstração expressiva de uma consciência

identitária assumida, é que os interlocutores relembram com orgulho no relato deles que

estes sujeitos, com nome e sobrenome sempre destacados são os “ancestrais”28; os

“antepassados” que em séculos passados foram os primeiros a abrir “capuava”29 e fixar

com suas famílias naquelas terras a ermo do alto do Vale do Ribeira, ali bem às margens do

rio Turvo. Numa saga empreendedora, como as de muitos outros escravos negros

fundadores de quilombos que se ramificaram pelo interior desta encantadora região de Mata

Atlântica do Estado de São Paulo.

De fato, conforme se pode verificar através da configuração da árvore genealógica dos

grupos familiares constitutivos do povoado rural do Cedro, de fato a maioria dessa

população é descendente do patriarca Pacífico Morato de Lima, um dos pioneiros a instalar

com a família naquelas terras a ermo cobertas por Mata Atlântica do interior paulistano.

27

Faço menção aqui ao RTC produzido, por mim, sobre as comunidades remanescentes de quilombo dos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca – Barra do Turvo, SP. 28 Termo que se observa ser empregado com freqüência no discurso dos interlocutores. 29 Esta palavra é de origem tupi, conforme traduzido pelo Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa “capuava” significa: “local apropriado para plantação, roça ... Do tupi kapï’ aua’ ”. (Cunha, 1996, p.152). Antônio Cândido aponta o uso do termo “capuava” também como “Designação corrente de moradia”. (Cândido, 2003 p.78).

Page 15: Quilombo Cedro

15 Em reforço ao que já havíamos verificado anteriormente, através de pesquisa

antropológica de campo30, o elo entre os bairros rurais do município de Barra do Turvo,

integrados por grupos familiares remanescentes de quilombos, para além do aspecto da

proximidade espacial-geográfica, que define a noção de vizinhança, deve ser explicado,

sobretudo, pela particularidade da rede entrelaçada e extensiva da relação de parentesco

que revela o vínculo aos três patriarcas considerados pioneiros a fincar raízes no lugar.

Conforme descrito em RTCs do ITESP31 o estilo de vida semi-nômade foi uma das

características marcantes do modo de sobrevivência das comunidades quilombolas no alto

Vale do Ribeira. Com destaque para a atividade da agricultura de subsistência, cujo recurso

utilizado era a pratica das “queimadas” com intercalação de áreas de plantio deixadas em

pousio.

Em afinidade com o relato oral de outros interlocutores remanescentes dos quilombos

locais32, desde os primeiros tempos que as dificuldades enfrentadas para sobreviver

naquelas terras interioranas do Vale do Ribeira eram muitas. Não havia estradas que

ligavam o povoado a outras localidades vizinhas. Os deslocamentos internos e para lugares

mais distantes eram feitos através de trilhas que subiam ladeiras e bifurcavam no alto das

serras e cujo trânsito só era possível a pé ou em lombo de animal. Essa é a imagem que os

mais velhos evocam da memória ao relatar casos do passado ouvido dos antigos ou das

lembranças que ainda guardam vivas dos tempos difíceis da infância e juventude:

Aqui, era tudo mato...nós comprava as coisas em Iporanga. A gente andava uns 70, 74 quilômetros (até chegar lá). Tinha um patrão lá que fornecia calçado, roupa – tecido para fazer roupa... Comprava lá... A gente criava o porco e levava lá pra pagar as contas. Então, o porco era trocado (pelas mercadorias) que o patrão fornecia... O prazo era de um ano pra pagar a conta... Às vezes, não tinha como pagar as contas no ano, o patrão, então, fornecia de novo pra pagar tudo no outro ano... O porco era levado a pé. Andava uns dois, três quilômetros, tirava a peia e ia embora, tocado, tocado... Levava uns dois dias para chegar lá (em Iporanga). A primeira parada era lá, na Terra (Seca), depois, Água Quente. Tinha mangueira, mangueira era

30 RTC sobre Comunidade remanescente dos quilombos de Ribeirão Grande e Terra Seca... 31 Cf.: Laudo dos Antropólogos do Ministério Público Federal, apud.: Turatti, Maria Cecília M. - Relatório técnico-científico sobre os remanescentes de quilombo de Morro Seco/Iguape - SP, 2006, pp.29-30. 32 Ibidem

Page 16: Quilombo Cedro

16 feito de Jussara. Abria a mangueira lá e pousava lá. Jussara dura muito né?, aí vinha tocando (porco) neste ano, quando ia tocar outra vez, no outro ano, a mangueira tava lá. [Era levado muita quantidade de porcos?] Era variada (a quantidade de porcos) que levava. Cada pessoa levava, às vezes, até 5 porcos. A maior quantia que o meu pai levou foi 16... [E pra comer...?] Levava o cargueiro. Levava o que podia: farinha, feijão, arroz... Mais era feijão e carne de porco... Matava uma leitoa, e levava... Quando chegava em Iporanga (o cargueiro) tava vazio... A gente parava para descansar o porco. O porco ficava dormindo na ronda, então, a gente cozinhava feijão, fazia tudo. Porque, quando chegava ali (nos pontos de parada) o porco tava cansado, porque o sol era quente. Então dormia, e só mais à tarde levantava; aí, a gente aproveitava para viajar mais. A hora que a gente sempre andava mais era cedo. À tarde o sol tava quente. Relembro uma vez que foi eu e o Felix em Iporanga tocando dois porcos. Durou de oito a doze dias pra nós chegar a Iporanga. Naquele tempo era muito difícil ver gente (pelo caminho). Só quase os tropeiros...

Imagens carregadas de tensão também são evocadas Na conversa dos interlocutores ao

relembrar de pessoas e acontecimentos dos tempos idos de antigamente:

Antropólogo: o senhor contou, ontem, o caso de jagunço aqui, podia repetir pra gente? Pedro: Já falemos disso ontem. Os jagunços atentaram muito nós aqui, minha mãe mesmo... Morreu até animal... Dito: Isso já é do meu tempo pra cá. Isso eu lembro. Ali onde hoje é a minha casa, onde vocês foram ontem, ali tinha a casa de um homem que tinha uma lanchonete lá em cima. Então, além dos jagunços tinham pessoas que puxava o saco dos grandes. Pessoas pequenas que puxava o saco dos grandes. Aí, tinha um tio meu, ele era dos mais novos da família, ele não ele não era flor que se cheirava, ele não tinha muita amizade com os caras que moravam ali. Então, (as pessoas escondiam na moita[?]), cercavam [ele] no meio do caminho, pra (assustar[?]) ele. Esse caso das grilagens aqui na região. Ele tinha gado, criação de animais, então ele tinha pasto... Ele fazia roça, do jeito dele pra evitar confusão. (Evitar) rixa, né?! Mas tinha pessoas que puxava saco dos grileiros e prejudicava muito ele. Talvez, pra gente que era criança não era nada. Porque criança não leva nada a sério! Hoje a gente vê que aquilo era um massacre muito grande. Pessoas cantando no caminho, (ao passar) em frente à casa das pessoas, gritando de lá, só pra irritar...

Page 17: Quilombo Cedro

17 Pedro: ...nós passava aperto naquela época...

Estes conflitos e ameaças que contam ter perturbado a paz da comunidade no passado são

dramas que ainda nos dias de hoje, por ironia do destino, parece incomodar os

remanescentes de quilombo. Por isso, o antropólogo teve o cuidado de desviar o rumo da

conversa em determinado momento, ao perceber certo constrangimento dos interlocutores

com a chegada inesperada de um certo morador da comunidade. Pessoa cuja relação

estabelecida com a comunidade é de conflito e aos olhos da mesma é vista como alguém

“muito perigoso”... (vide diagrama de parentesco, casa 22).

Em relato colhido entre interlocutores de comunidade vizinha um elemento que chamou a

atenção do pesquisador foi a ênfase na relação de solidariedade e cooperação estabelecida

entre os ancestrais fundadores do lugar. Tema que também se apresenta de modo insinuante

nas conversas que tivemos com as pessoas do Cedro:

Antropólogo: vocês sabem dizer quem eram os pais do Pacífico? Benigno: Isso aí a gente não sabe dizer. Isso aí a gente não alcançou. Porque o Pacífico morreu novo... Porque o Pacífico veio lá dos lados do Eldorado; o pai e a mãe dele era tudo de lá do Eldorado. A documentação dele, na realidade, era do Eldorado... Antropólogo: quando o Pacífico veio para cá ele trouxe mais gente com ele? Pedro: Ele veio com a família, mulher e filhos. Antropólogo: vocês sabem o nome dos filhos que vieram com ele? Quando veio ele já tinha todos os filhos, quais e quantos eram? Joana: Só o Miguel, o caçula, nasceu aqui. Os outros eu não lembro não. Eu não sei contar, porque não era registrado aqui... Pedro: Eles eram em três – mesmo que três irmãos -, e um ajudou o outro a instalar com a família aqui [na região].

É importante atentar para esta menção a “três irmãos” que se ajudaram mutuamente no

início do povoamento formado às margens do rio Turvo. Nas muitas conversas com os

interlocutores do Cedro ficou claro que esta era uma maneira de referirem aos pioneiros na

ocupação daquelas termas a ermos, além do próprio Pacífico Morato de Lima, também

Page 18: Quilombo Cedro

18 Benedito Rodrigues de Paula e Miguel de Pontes Maciel. Esse último inclusive, – e de

quem há memória mais detalhada sobre o passado remoto –, é descrito como filho de um

escravo que se tornou livre ao ser abandonado na região pelo seu senhor, quando esse

decidiu partir para Minas interessado no empreendimento da mineração aurífera, naquelas

paradas (cf: Silva, 2006). Não se trata, porém, de evocar o termo “irmãos” no sentido

biológico da definição, mas como uma categoria alusiva às condições semelhantes,

históricas e sociais, que marca a origem daqueles três antigos e, muito provavelmente,

tende a explicar o encontro e a amizade construída entre eles. A propósito desta reflexão,

permita-me citar a transcrição abaixo, extraída de um outro trabalho.

Miguel de Pontes vivia em Indaiatuba e resolveu, em conjunto com o cunhado [...] Benedito deixa[rem] Indaiatuba [e] ficaram uns dias no Reginaldo[...]. Chegando no Reginaldo pegaram Pacífico Morato - [ele que já] morava no Reginaldo [e] tinha a sua família formada [no lugar, concordando que] era hora de mudar de lugar, resolveu subir com eles [Miguel e Benedito]; carregando esposa e filhos nos lombos de cavalos e tocando porcos. Foi assim que Miguel, Pacífico [e] Benedito no chegaram no ‘ perovado’. [...] depois de instalar o senhor Benedito e família lá [no perovado - Terra Seca], onde ele próprio também ficou e teve outros filhos, Miguel se instalou com a sua família no Ribeirão [Grande] - que sempre teve o nome Barra do Córrego e córrego do salto. Pacifico Morato [...] trouxe seus filho já grandes e instalou-se no Cedro, ajudado também por Miguel e Benedito33.

A relação de solidariedade e cooperação mútua, conforme apontou Antônio Cândido em Os

Parceiros do Rio Bonito, ao destacar o trabalho coletivo classificado nos termos do

mutirão, era uma das características da forma da organização social bem como marcante do

estilo de vida tradicional dos bairros rurais do interior paulistas. Com efeito, segundo o

autor, tratavas de uma prática significativa na sedimentação da rede de relações sociais e

forma da sociabilidade constitutiva dos bairros rurais paulistas, entretanto não sendo

exclusiva e única. Observando Antônio Cândido a importância fundamental da prática

religiosa e lúdica para o reforço dos laços da sociabilidade e a “consciência de unidade”

local:

[...] há nos bairros uma solidariedade que se exprime pela participação nas rezas caseiras, nas festas promovidas em casa para

33 Relato de Nilce Pontes Maciel – coordenadora da “Associação dos Remanescentes dos Quilombos dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca” (Silva, 2006).

Page 19: Quilombo Cedro

19 cumprimento de promessas, onde a parte religiosa, como se sabe, é inseparável das danças. Quando, por exemplo, é muito grande o número de inscritos para promover a festa mensal da capela, um morador que tem promessa a cumprir pode trazer a imagem a sua casa: há reza, distribuição de alimentos e, depois, fandango. Geralmente a primeira parte se desenvolve durante o dia, a segunda, à noite (destaque meu).

Estes aspectos da sociabilidade caipira estão presentes na fala dos interlocutores do Cedro -

semelhante ao que se encontra registrado, também, em RTC34 sobre comunidades vizinhas.

A ênfase nos tipos de crenças e práticas religiosas, expressivas de um catolicismo popular e

que eram predominantes na comunidade no tempo dos antigos, são mencionadas nas falas

dos interlocutores, tais como: a Festa de São Pedro, Festa do Divino e Congo, Dança de

São Gonçalo, reza de terço, dança fandango e romarias.

A forte influência do catolicismo no bairro Cedro está representada, simbolicamente, pelo

templo católico que hoje substitui a antiga capela, construída no passado com “parede de

barro e coberta de sapé” e cuja obra, segundo interlocutores quilombolas, deveu-se à

iniciativa do antepassado, Pacífico Morato de Lima, por ocasião da sua instalação naquelas

terras cortadas pelas águas do rio Turvo (ver fotos: 12, 21 e 22). A predominância desta

crença religiosa também se insinua nesta transcrição:

Dito: Esse pessoal mais velho tinha uma tradição, não sei se vinda de Deus, estes homens dos nossos que a gente não chegou a conhecer, eles não sabia fazer o nome deles e sabia falar em latim, não é verdade? Eles não sabiam escrever o nome deles e sabia falar latim. Antropólogo: O Pacífico falava e Latim? Dito: Ele sabia, eu não tenho certeza porque eu não cheguei a conhecer, mas os filhos dele falavam em latim. E alguns que aprenderam com ele falavam em latim também – e não sabiam assinar o nome... Antropólogo: a novena era feita em latim? Dito: Na linguagem do terço, a novena mesma, era rezada em latim. E eles não sabiam escrever...

34 Idem

Page 20: Quilombo Cedro

20 Os relatos orais sobre o passado local são sugestivos quanto ao isolamento quase

absoluto daquele lugar. Num tempo em que os rios e córregos pareciam mais caudalosos, a

flora e fauna mais exuberante. Era o território preservado da natureza; virgem da presença

humana e a sua ação transformadora sobre a paisagem local – por menor ou mais

equilibrada que fora em respeito ao meio ambiente. Pacífico Morato de Lima chegou no

lugar nesse tempo antigo e decidiu que era aquele o lugar abençoado que o santo de quem

era devoto, São Pedro, havia lhe reservado para se instalar com a família, em atendimento

ao pedido dele mediante promessa de retribuir o auxílio prestado com penitência e festa em

homenagem ao santo padroeiro.

Voltando ao Pacífico Morato de Lima, eles eram aqui uma família. Eles eram três. Tem bastante primos dele aí, que são da mesma família. Pra chega ao Pacífico, alguns contam um pouquinho meio diferente. Pacífico vivia aí, eles contam, por estas beradas, lá pelos lados do rio Pardo, mendigando terra de alguém, como se fosse pessoa de terceiro – assim eles contam. Aí, ele fez um pedido pra São Pedro – vou falar um pouquinho diferente do modo que outros primos contam -, ele falou, se ele achasse um lugar onde ele não ficasse dependendo de viver (?); arrumar um lugar onde colocar a família, assentar com a família, ele fazia uma devoção pra São Pedro. Então, ele á tinha feito a promessa antes de chegar aqui. E foi o que aconteceu... Eles conta que ele fez a primeira e a segunda parada; ele veio lá da Terra Seca e assentou a família deste lado aqui. Aí, ele conseguiu fazer uma casinha simples. Construiu a canoa para passar de lá pra cá, para fazer roça. Ele conseguiu fazer uma casa ali, e mandou os filhos dele fazer roça, capinar o terreno, perto daquela árvoe, sem cortar a árvore, de Cedro. Os irmãos dele concordaram em não cortar... Aí começou a capelinha, de pau a pique e coberta com folha de mato. Nas orações que ele fazia – não sei se eu to mentindo – todo mundo que participava tinha muita comida. Ninguém voltava pra casa sem estar bem alimentado... (Ele foi quem fundou a devoção de São Pedro aqui...)

A natureza se transforma em cultura com a instalação de Pacífico Morato de Lima e família

no lugar. Na reconstituição imaginária do passado, os netos deste patriarca contam que uma

das primeiras providências do avô foi aproveitar um tronco de árvore cedro, que encontrou

tombado no chão, para construir um “barco”. Recurso utilizado para atravessar sobre as

águas do rio Turvo de uma margem para a outra ou deslocar pequenas distâncias entre as

Page 21: Quilombo Cedro

21 localidades vizinhas transportando produtos extraídos da plantação de roças nos

arredores. Em torno deste ato imaginário é que se constrói a narrativa de origem do nome

dado ao lugarejo, Cedro: “Ali tinha um pé de cedro. Ele encontrou um pedaço do tronco

caído no chão. Então, ele fez uma canoa pra atravessar de lá pra cá e fazer roça” 35.

35 Esta versão é semelhante a outra que ouvimos referente a origem de um bairro rural e também povoado por comunidades remanescentes de quilombos do município de Barra do Turvo, chamado “Reginaldo”. (Silva, 2006).

Page 22: Quilombo Cedro

22 - Capítulo IV -

- O BAIRRO CEDRO.

Cedro apresenta um perfil populacional variável de, aproximadamente, 96 indivíduos.

Nesse levantamento, verifica-se uma quantidade de 45 indivíduos do sexo feminino e 51 do

sexo masculino - sendo a maior parte jovens e adultos.

No caso particular da população originária do bairro e que foram citadas pelos

entrevistados como pessoas que estão “morando fora”, de acordo com o levantamento feito

totaliza-se 69 indivíduos. De modo a observar que 28 pessoas são do sexo feminino, 35 do

sexo masculino e um número de 6 crianças cujos parentes não souberam precisar qual era

sexo delas.

Portanto, o tamanho da população do bairro Cedro tende a aumentar quando se leva em

consideração o número de pessoas que deixaram a comunidade para morar

temporariamente ou com residência fixa em outros municípios ou estados vizinhos –

principalmente o Paraná. Esta situação migratória é motivada, invariavelmente, pela

procura de emprego com carteira assinada. Assim, ao incluir também na contagem o

número de filhos contraídos a partir da relação matrimonial ou não dessas pessoas

destacadas pelos interlocutores como “morando fora”, a população do bairro amplia-se para

um total aproximado de 165 indivíduos. É preciso salientar que desconsideramos neste

levantamento os parceiros das relações conjugais (união matrimonial ou estável) daqueles

que “moram fora”.

A considerar este total de 165 indivíduos, a divisão populacional salta para um total de 73

indivíduos do sexo feminino e 86 do sexo masculino – com o acréscimo das 06 crianças

cujos parentes não souberam informar ao certo qual era o sexo das mesmas.

Em termos da organização interna o Cedro pode ser descrito como um bairro que

atualmente é representado por, aproximadamente, 21 grupos familiares distribuídos por

casas quase isoladas, distantes umas das outras e situadas, a maior parte, à beira do rio

Page 23: Quilombo Cedro

23 Turvo. Do ponto de vista nuclear, representam tamanho de família bem numeroso: a

contar tanto com o número total de filhos que residem na mesma casa com os pais ou

moram em casa própria dentro da comunidade ou entorno.

A vida destas famílias no lugar não é fácil. A região é montanhosa, o que torna penosa a

atividade principal que ocupam para garantir o mínimo para a sobrevivência: a agricultura.

O plantio de roças é quase exclusivamente voltado para consumo interno e consiste na base

da subsistência dos grupos familiares local. Labuta diária que ocupa a mão de obra de

jovens, adultos e idosos. Em geral, com dedicação mais intensa nos período da manhã até

aproximadamente a metade do dia. Havendo no período da tarde um espaço maior para o

ócio. A criação de animais para consumo interno ou fins comerciais é rara e insignificante.

De acordo com os nossos levantamentos pudemos verificar que a renda familiar é bastante

baixa. Os ganhos financeiros são provenientes das módicas quantias recebidas de

aposentadorias do fundo rural, pensão e, em algumas famílias, auxílios governamentais

(como “Bolsa Escola” e “Bolsa Família”) e, nos casos de algumas famílias, a

complementação da renda financeira graças à contribuição em dinheiro de um ou mais

filho(s) ou filha(s) que trabalham fora.

Cada grupo familiar tem definido localmente o seu espaço particular de moradia e

plantação de roça(s). Uma vez que a localização da(s) área de roça(s) nem sempre

coincidem com o espaço territorial da residência.

O estilo das habitações locais é simples e as condições infra-estruturais improvisadas. Em

geral, casas construídas com paredes de madeira rústica e a cobertura de telhado de

amianto. Sendo raras as construções em alvenaria. O abastecimento de água em casa, tanto

para beber quanto para higiene pessoal (banho, lavagem de roupa etc), é feito de maneira

improvisada através da introdução de mangueiras em minas ou bicas localizadas no alto dos

morros. Desse modo, aproveitando a força natural da queda d'água para manter sempre

cheias as caixas elevadas sobre as casas. Para rede de esgoto utiliza-se o recurso de

encanamentos que permite o escoamento da água de pias da cozinha e banheiros para rios

Page 24: Quilombo Cedro

24 ou córregos próximos da casa. Os detritos humanos são coletados em sistema de esgoto a

seco.

O acesso às casas situadas mais afastadas da rodovia 287, e às roças no alto dos morros, se

dá através das trilhas que serpenteiam mata adentro. As pinguelas feitas de madeira e fios

espichados de arame liso e que servem como corrimão, também compõem o cenário do

lugar; facilitando a travessia sobre o rio Turvo e a chegada à casas e roças localizadas do

lado oposto aonde passa a 287.

O bairro Cedro não possui ainda instalação de rede elétrica. Esta restrição está vinculada ao

fato de a área territorial do bairro localizar-se dentro do Parque Estadual de Jacupiranga –

área de reserva de Mata Atlântica e, por conseguinte, da proteção ambiental pelo poder

público. Entretanto, é preciso ressalvar que esta situação está para se resolver em breve,

graças às negociações políticas em torno do processo de reconhecimento das comunidades

tradicionais que habitam a localidade como remanescentes de quilombos articulada,

inclusive, ao esforço do poder público em garantir o direito legal às mesmas de

permanecem no lugar e com possibilidades abertas para melhoria crescente da qualidade de

vida.

A respeito da inexistência da instalação de rede da luz elétrica no lugar, é válido registrar

neste momento algo sobre a criatividade surpreendente de pessoas do lugar. Quero referir-

me aqui a duas casas que visitamos no lugar, onde encontramos sistema de geração de luz

elétrica desenvolvida numa experiência de bricoler (ver: Foto 18).

Do ponto de vista cultural os nossos interlocutores do bairro Cedro mencionam com

orgulho as festas tradicionais vinculadas ao catolicismo popular que a comunidade sempre

manteve como um compromisso de respeito à memória e o elo simbólico do presente com o

passado. As festas religiosas de São Pedro e São Gonçalo são as principais destacadas.

Entre as festas que eles atribuem como da “diversão”, eles mencionam os bailes

organizados no salão-sede da Associação quilombola local e convidaram os pesquisadores

(este antropólogo, o geógrafo, Rogério Gutierrez, e o agrônomo do ITESP, Mauro Jacob,

Page 25: Quilombo Cedro

25 componentes da equipe do trabalho de campo) para comparecerem no primeiro “baile do

quilombo” que estava planejado para ser realizado no dia 08 de dezembro de 2007.

Relacionado ao aspecto da mobilização e organização política, a comunidade do Cedro

constituiu e aprovou a fundação, em “dezenove de outubro de dois mil e cinco”, da

“Associação Nova Esperança Quilombola do Bairro Cedro”; registrada na Comarca de

Jacupiranga no dia primeiro de dezembro, também, de dois mil e cinco (vide Documentos

Anexos/Ata de Assembléia Extraordinária, p.75).

É preciso observar que esse processo de mobilização da comunidade, tendo em vista a

necessidade dela se organizar politicamente para defender o direito de permanecer nas

terras ocupadas desde os tempos dos seus ancestrais e negociar soluções para os problemas

enfrentados, entre outros, inclusive da infra estrutura básica carente no bairro – como a

instalação da rede de luz elétrica – consistiu num esforço coletivo mais amplo e que recua

no tempo. Sendo preciso considerar, nesse sentido, a significativa rede de agentes

mediadores e de interlocução que é solidária à comunidade: religiosos, militantes do

movimento negro, lideranças quilombolas da região.

De uma maneira sutil, as pessoas com quem conversamos durante o trabalho de campo

explicitam a preocupação com a situação de conflito latente que envolve a relação da

comunidade com terceiros, que em épocas mais recentes vieram a se instalar na área

reivindicada coletivamente – mediante ou não a compra de “títulos de propriedade” de

algum herdeiro quilombola mais ingênuo. Entretanto, há uma nova esperança quilombola

revigorada entre os moradores do Cedro de que esse e outros problemas que ora implicam

um clima de tensão para a comunidade venham encontrar solução equilibrada e pacífica

com a mediação política e compreensiva do poder público do Estado de São Paulo.

Page 26: Quilombo Cedro

26

– REGISTRO ICONOGRÁFICO DO CEDRO –

Page 27: Quilombo Cedro

27 REPRESENTANTES DA COMUNIDADE

Foto 1.

Maria de Moura, Joana de Lima, João Moura, Benedito Moura (Dito). Foto 2. Foto 3.

Benigno de Lima, Joana de Lima, Aristeu de Alcina Pereira, João Moura, Pedro Morato. Lima.

Foto 4.

Dito, Benigno de Lima, Joana de Lima e Aristeu de Lima.

Page 28: Quilombo Cedro

28

VARIAÇÃO DE ESTILOS ARQUITETONICOS DO CEDRO Foto 5. Foto 6.

Casa de Benedito Lima (Dito). Na varanda, a família Barracão anexo a casa à esquerda. Em destaque – reunida. Maria de Moura (esposa do Dito).

Foto 8.

Vista frontal do barracão acima.

Foto 9. Foto 10.

Dispensa. Fundos de uma residência.

Page 29: Quilombo Cedro

29 Foto 11.

Casa de uma antiga agregada do quilombo – Julieta de Camargo.

Foto 12.

Vista do templo católico tradicional, ao lado, a sede da associação, mais recuado, salão de uma escola desativada e metade de um campo de futebol.

Foto 13.

Residência e cozinha anexa de uma família quilombola.

Page 30: Quilombo Cedro

30 ATIVIDADE ECONÔMICA E DE SUBSISTENCIA

Foto 14. Foto 15.

Gado para consumo doméstico. Idem.

Foto 16.

Roça plantada no sistema agroflorestal.

Page 31: Quilombo Cedro

31

RECURSOS PARA A SOBREVIVÊNCIA

Foto 17. Foto 18.

Pilão de arroz. Antônio Capoeira e a invenção dele: um gerador de luz elétrica. Foto 19. Foto 20.

Fogão à lenha. Em destaque – Joana Fogão à lenha. Em destaque – Dito. Lima.

Page 32: Quilombo Cedro

32

SÍMBOLOS MARCANTES DA RELIGIOSIDADE TRADICIONAL

Foto 21.

Interior da capela tradicional do Cedro.

Foto 22.

Símbolos católicos. Em destaque, a matriarca Joana de Lima.

Page 33: Quilombo Cedro

33 CAMINHOS E PASSAGENS

Foto 23.

Vista da BR-287 e do campo de futebol da comunidade.

Foto 24. Foto 25.

Pinguela sobre o rio Turvo. Trilha que leva a um roçado.

Foto 26.

Trilha que dá acesso a casas localizadas mais afastadas da rodovia.

Page 34: Quilombo Cedro

34

Mapa da Ocupação Fundiária

Page 35: Quilombo Cedro

35 - Capítulo V –

– REFLEXÕES SOBRE IDENTIDADE ÉTNICA E QUILOMBOLA –

Ao iniciar este capítulo eu quero chamar a atenção do leitor, logo de início, para a citação

destacada no capítulo introdutório deste Relatório e cujo conteúdo gira em torno da

discussão do termo “Remanescente de Quilombo”36. Através da análise do conteúdo da

referida citação verifica-se que a conceituação descritiva - “Remanescente de Quilombo” -

compreende implicitamente a própria noção de identidade étnica. A referência principal dos

estudos que introduzem a noção de identidade étnica é o antropólogo inglês Fredrik Barth.

Em 1969 Barth escreveu um artigo no qual chamou atenção para a noção de “fronteira”,

entendida como elemento fundamental na demarcação da “diferença entre culturas” e

definição do chamado “grupo étnico”. Nas palavras de Barth37: “As diferenças entre

culturas, assim como suas fronteiras e vínculos históricos, receberam muita atenção (até

então pelos cientistas daquela época); contudo, a constituição dos grupos étnicos e natureza

de suas fronteiras não foram examinadas tão sistematicamente”.

A ênfase na “fronteira” estava relacionada ao fato de Barth compreender o “grupo étnico”

como um tipo de “organização social”. Nesse sentido Barth salientou:

“Então, um traço fundamental torna-se [...] a característica da auto-atribuição ou da atribuição por outros a uma categoria étnica. Uma atribuição categórica é uma atribuição étnica quando classifica uma pessoa em termos de sua identidade básica mais geral [...]. Na medida em que os atores usam identidades étnicas para categorizar a si mesmos e outros, com objetivos de interação, eles formam grupos étnicos neste sentido organizacional”, e acrescenta: “As características que são levadas em consideração não são a soma das diferenças ‘objetivas’, mas somente aquelas que os próprios atores consideram significantes”. (grifos meus) (ibidem, 189-190).

A partir da contribuição de Barth os estudos focados na problemática da identidade étnica

se multiplicaram e as discussões referentes a esse conceito puderam ser aprofundadas à luz

dos dados empíricos produzidos através das investigações de campo em lugares diversos,

comunidades diferentes, situações específicas e contextos variados. Entre os vários

exemplos que poderia ser citado, interessa mencionar de início os nomes dos antropólogos

36 Vide Introdução, página 3 deste Relatório... 37 Barth, Fredrik, 1997, p188.

Page 36: Quilombo Cedro

36 Roberto Cardoso de Oliveira e Manuela Carneiro da Cunha, pela importância deles como

referência obrigatória nos estudos sobre a questão da identidade étnica no Brasil.

O antropólogo Roberto Cardoso de Oliveira (1976) foi quem introduziu, primeiramente, na

antropologia brasileira as reflexões sobre a noção de identidade e chamou atenção para o

conceito de identidade étnica. Cardoso de Oliveira procurou demonstrar com base em

pesquisas empíricas38, e apoiado nas contribuições teóricas de Fredrick Barth39 e Abner

Cohn40, que a identidade étnica é uma modalidade de identidade contrastiva e situacional;

configurando, pois, uma “forma de organização social” e da afirmação do “nós” em

oposição aos “outros”.

Cardoso de Oliveira esclareceu que a identidade étnica para ser afirmada depende sempre

da presença do outro. Esta construção se processa em situações específicas de confronto

interétnico nas quais determinado grupo minoritário encontra-se ameaçado por um outro

dominante – no plano cultural ou mesmo fisicamente – e tem a percepção quanto ao risco

que corre de ser efetivamente dizimado. No contexto desta relação de dominação e conflito,

traduzida através da expressão “situação de fricção interétnica”, é que a identidade étnica,

segundo Cardoso de Oliveira, tende a emergir como uma forma de resistência à dominação

que determinado grupo étnico minoritário toma a de consciência de ter-lhe sida imposta

historicamente. Nesse sentido é que a identidade étnica – de acordo com o referido

antropólogo – ao ser construída exige a demarcação intencional das “fronteiras étnicas” de

modo a evidenciar as diferenças entre o “nós” e os “outros”.

A antropóloga luso-brasileira, Manuela Carneiro da Cunha é outra referência importante no

avanço das reflexões e debates sobre o conceito de identidade étnica no campo da

antropologia brasileira. O estudo desenvolvido por esta antropóloga sobre a população de

ex-escravos retornados do Brasil para a cidade de Lagos, em África, na metade do século

38 Trata-se de pesquisas realizadas nos anos 1970, no norte do país, abordando a problemática da situação de conflito envolvendo de um lado as populações indígenas, ameaçada da perda das terras por elas ocupadas tradicionalmente, além da própria vida e, de outro lado, os regionais – fazendeiros interessados na apropriação das terras ocupadas pelos primeiros. 39 A referência é o artigo deste autor publicado em 1969, intitulado Ethnic groups and boundaries, pela Bergen-Oslo, Universiteta Forlaget. Londres, George Allen & Unwin. 40 Destaca-se como referência principal o livro intitulado Custom and politics in urban África, em Londres, pela Routledge and Kegan Paul, primeira publicação também em 1969.

Page 37: Quilombo Cedro

37 XIX, teve grande repercussão e trouxe acréscimos significativos para a compreensão,

sobretudo, do aspecto político que tende a envolver o jogo da afirmação da identitária

étnica ou – nos termos da antropóloga – a “etnicidade”.

Manuela Carneiro da Cunha41 retomou as discussões de Cardoso de Oliveira e a partir das

contribuições dos mesmos autores de referência desse etnólogo, Fredrik Barth e Abner

Cohen, ela procurou chamar atenção para o papel operacional dos elementos culturais

traduzidos na expressão “sinais diacríticos”. Elementos culturais manipulados

intencionalmente no processo de construção etnicidade. Os “sinais diacríticos”, segundo

explicou a antropóloga, são elementos retirados da própria cultura do grupo cuja identidade

étnica está em questão, porém, de modo selecionado tendo em vista servir

operacionalmente ao contraste com “outros do mesmo tipo”. É através dos “sinais

diacríticos” – esclareceu a antropóloga - que o grupo busca “explicitar marcadamente” as

diferenças entre o “nós” e os “outros”42.

Conforme a explicou Cunha, a escolha dos “sinais diacríticos” não se dá de maneira

arbitraria. Ao contrário, o grupo que quer marcar a sua diferença em relação aos “outros”

irá depender sempre dos elementos que se encontram disponíveis em um “repertório

cultural” limitado – uma vez que é impossível o indivíduo ou grupo levar “na bagagem”

toda a cultura do lugar de origem, de onde teve que sair ou por força das circunstancias

econômica ou política. Os “sinais diacríticos” funcionam como signos de linguagem, sendo

a escolha dos mesmos condicionadas, segundo a antropóloga, à possibilidade de permitirem

certa inteligibilidade da comunicação: “os sinais diacríticos – escreveu Carneiro da Cunha -

devem poder se opor, por definição, a outros do mesmo tipo (...), assim como roupa deve

ser contrastada com roupa, religião deve ser contrastada com religião” 43.

De um modo geral, da perspectiva teórica dos autores acima enunciados a identidade étnica

deve ser entendida como uma modalidade de identidade contrastiva, situacional e que

depende da presença do outro para ser construída. Trata-se de uma atitude política,

assumida por determinado grupo étnico que se sente ameaçado cultural e/ou fisicamente de

41 Ver: Cunha, Manuela C. da – Negros estrangeiros..., 1985; Antropologia do Brasil..., 1986. 42 Ibidem, 1986, p. 85-119. 43 Ibidem, p. 100.

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38 extinção dentro de determinada fronteira territorial e cujos interesses - sejam eles de

ordem econômica, comercial ou política – estão efetivamente colocados em jogo.

Portanto se, por um lado, as reflexões teóricas desenvolvidas por Cardoso de Oliveira

deram destaque, sobretudo, para o fenômeno da identidade étnica compreendida da

perspectiva de Barth, ou seja, com ênfase na idéia do grupo étnico pensado como um tipo

de “organização social”; por sua vez, Cunha destacou o aspecto político desta modalidade

identitária traduzida a partir da definição de grupo étnico em conformidade com a definição

de Abner Cohen, ou seja, um tipo de “organização política”.

A historiadora e antropóloga Lilia Shwarcz ao criticar Cunha observa que essa autora deixa

insinuado na sua forma de interpretação uma ênfase demasiada na predominância da

racionalidade no processo de construção da etnicidade, em detrimento a outros aspectos

subjacentes ao mesmo, conforme ela sugeriu: “[a] identidade não pode ser exclusivamente

definida, dessa forma, como um fenômeno da mais pura imposição e manipulação externa.

Ou seja, apesar de ser objeto potencial de manipulação ideológica, sem a existência interna

de uma ‘comunidade de sentidos’ toda a construção de identidades e tradições tende a

resultar em um imenso vazio”44.

Embora a observação dessa historiadora mereça ser levada em consideração, com efeito, os

escritos de Cunha dialogando com Cardoso de Oliveira, trouxeram contribuições

inovadoras para a antropologia brasileira. Sobretudo no que concerne a referenciais teórico-

metodológicos indispensáveis, principalmente, para os estudos dos segmentos

populacionais indígenas e negros no meio rural - e mesmo no contexto metropolitano –

conforme se pode verificar através dos inúmeros estudos de comunidades, desenvolvidos

no meio acadêmico-científico tomando como referência os estudos destes mencionados

antropólogos.

Interessado em refletir sobre a problemática da “identidade cultural na modernidade tardia”

(traduzido também nos termos de “pós-modernidade”), Stuat Hall45 buscou discutir

44 Shwarcz, L.K.M. – “Complexo de Zé Carioca – sobre uma certa ordem da mestiçagem e da malandragem”,1995, p.60. 45 Hall, Stuart – A identidade cultural na pós-modernidade, 1998.

Page 39: Quilombo Cedro

39 criticamente no livro A identidade cultural na pós-modernidade sobre as teorias da

identidade (individual e coletiva) clássicas, argumentando que as mesmas tendem a

convergir no mesmo sentido de pensar este fenômeno como algo “permanente”, “coerente”,

fixa e estável, tendendo sempre à “continuidade” no espaço e no tempo. Desde a noção de

identidade individual presente no pensamento filosófico iluminista, até as concepções

sociológica e antropológica sobre o processo de construção das identidades sociais

construídas coletivamente, esta idéia aparece de forma recorrente.

Diferentemente disso, para Stuart Hall os indivíduos na “pós-modernidade” estão cada vez

mais numa posição de “deslocamento” ou “descentramento” identitários: “as identidades

modernas – salienta Hall - estão sendo ‘descentradas’, isto é, deslocadas ou

fragmentadas”46. Esta não seria, porém, uma experiência exclusiva das identidades

emergentes no contexto da “pós-modernidade”; sendo que a intensificação desse fato nos

dias de hoje oferece maior condição para se reavaliar a pertinência do conceito de

identidade e atentar, sobretudo, para o que, na realidade, pode estar em jogo neste processo

de construção ou identificação cultural. Em sendo assim, o aspecto da politização das

afirmações identitárias torna-se um elemento fundamental47.

Stuart Hall procura argumentar que as identidades são construções provisórias, inacabadas

e incompletas. Assim, escreve o autor, “deveríamos falar de identificação, e vê-la como um

processo em andamento. A identidade surge não tanto da plenitude da identidade que já

está dentro de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é ‘ preenchida’ a

partir de nosso exterior pelas formas através das quais nós imaginamos ser vistos por

outros”48.

Estas referências teóricas enunciadas acima auxiliam-nos a entender melhor a posição dos

nossos interlocutores, no contexto hodierno em que se torna imprescindível para eles

assumirem a identidade de remanescente de quilombos; tendo claro que ora está em jogo é

a possibilidade ou não de adquirirem do governo do estado paulista o titulo definitivo das

46 Ibidem, p.8. 47 Ibidem, p.21. 48 Ibidem, p.39.

Page 40: Quilombo Cedro

40 terras tradicionalmente ocupadas49 pelos mesmos. Com efeito, ao evocarmos

anteriormente os estudos sobre a identidade étnica ou etnicidade a intenção é dar idéia das

motivações possíveis que podem levar as pessoas a buscarem em determinada situação

específica, contexto particular e momento chegado da sua vida a afirmar para si esta

modalidade identitária distintiva, bem como os recursos utilizados para garantir a

visibilidade e marcar de maneira valorativa e positivamente a sua diferença em relação aos

“outros”, ou seja - a manipulação de elementos culturais significativos e operacionais,

como é o caso dos chamados “sinais diacríticos”.

Sem com isso, no entanto, querer insinuar que estou interpretando a comunidade

remanescente de quilombo em foco neste relatório como “grupo étnico”. É para evitar essa

possibilidade de apreensão que chamei atenção na presente exposição também para as

reflexões do antropólogo Stuart Hall em torno da problemática da crise de identidades no

contexto da “pós-modernidade”. Válido salientar o que ele escreve: “A etnia é o termo que

utilizamos para nos referirmos às características culturais – língua, religião, costume,

tradições, sentimento de ‘lugar’ que são partilhadas por um povo. É tentador, portanto,

tentar usar a etnia dessa forma ‘fundacional’. Mas essa crença acaba, no mundo moderno,

por ser um mito. [...]. As nações modernas são, todas, híbridos culturais.”50 Isso significa

compreender que as identidades ou processos de identificação também se dão a partir da

articulação com outras referências a partir do exterior e/ou no interior do próprio sujeito –

não obstante as contradições presentes51.

49 A propósito desta expressão Alfredo Wagner B. de Almeida esclarece o seguinte: “[...]as terras indígenas são definidas como bens da União e destinam-se à posse permanente dos índios, evidenciando uma situação de tutela e distinguindo-se, portanto, das terras das comunidades remanescentes de quilombos, que são reconhecidas na Constituição de 1988 como de propriedade definitiva dos quilombolas. Não obstante esta distinção relativa à dominialidade, pode-se afirmar que ambas são consideradas juridicamente como ‘terras tradicionalmente ocupadas’ seja no texto constitucional ou nos dispositivos infraconstitucionais e enfrentam na sua efetivação e reconhecimento obstáculos similares. De igual modo são consideradas como ‘terras tradicionalmente ocupadas’ e enfrentam obstáculos à sua efetivação, aquelas áreas de uso comum voltadas para o extrativismo, a pesca, a pequena agricultura e o pastoreio, focalizadas por diferentes instrumentos jurídicos, que buscam reconhecer suas especificidades[...]” ([destaque do autor] Almeida, Terras de quilombo, terras indígenas..., 2006, p.28.). 50 Ibidem, p.62. 51 Conforme bem esclarece esta citação de Stuart Hall: “[...] A identidade [é] definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um ‘eu’ coerente. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas”. (Hall, ibidem, p.13.).

Page 41: Quilombo Cedro

41 As identidades ou “processos de identificações” tendem a emergir em situações de crise,

tendo como referência, sobretudo, o modo particular como o indivíduo é “interpelado” ou

“representado” pelos outros, sugeriu Stuart Hall. As situações empíricas enunciadas acima

admitem em certo sentido este tipo de interpretação. E sugerem, também, que os sujeitos da

comunidade ao refletir sobre a(s) identidade(s) dele(s) também colocam a questão do risco

dessa coletividade se imaginar ou querer se fazer reconhecida como um grupo fechado,

endogâmico ou avesso a diversidade étnica e cultural. Atitude que tendem a repudiar

inclusive pela própria experiência particular deles como sujeitos e coletividade afro-

descendente, alvo potencial e historicamente do racismo na sociedade brasileira.

A afirmação identitária da comunidade remanescente de quilombo do Cedro pode ser

apreendida a partir de falas e comentários como estes selecionados acima, entre outros

ouvidos pelo antropólogo no trabalho de campo. Mas é preciso não esquecer neste

contexto, sobretudo, das versões narrativas da história oral sobre a origem dessa

comunidade, apresentadas no capítulo III. A análise do conteúdo destas versões de origem

bem como da sua performance52 narrativa possibilita apreender as marcas simbólicas

evocadas para afirmar a diferença identitária étnica da comunidade, no cenário até, mais

amplo, da sociedade brasileira.

O cruzamento das versões de origem da comunidade com os dados levantados sobre

genealogia de parentesco, durante a pesquisa antropológica de campo, contribui para

verificar que a maioria absoluta dos grupos familiares do bairro Cedro pertence a uma rede

de parentesco cuja origem remonta ao nome do antepassado Pacífico Morato de Lima,

primeiro ocupante do lugarejo.

[Há] uns quatro, cinco anos pra cá, um grupinho resolveu fazer a Festa de São Pedro no 28 e 29 de junho. Nessa festa, a gente tenta dar comida para todo pessoal da comunidade (e pessoal de fora). [...] Vários de nós, com o vigário da paróquia, fizemos esta festa tradicional no 28 e 29 de junho. Em um ano a gente faz com brincadeira para crianças, presente e tudo, em outro ano não. E, no

52 É inovadora e crescente o debate em torno desta categoria no campo das ciências sociais, particularmente destacando o cenário da antropologia. Entre as principais referencias a frente desta discussão acadêmico-científica destaca-se o NAPEDRA – Núcleo de Antropologia da Performance e do Drama, da Universidade de São Paulo/USP.

Page 42: Quilombo Cedro

42 primeiro sábado de julho, a comunidade se reúne toda novamente e faz um baile. Motivo de festa, quase como se fosse festa (religiosa), mas não tem oração no meio. Ela é mais com violão, mas é tudo em benefício da igreja. Antes, a festa era normal. Podia ser no meio da semana, no sábado pra domingo, se o [dia] de São Pedro caísse no domingo, fazia a festa, se caísse no meio da semana, era do mesmo jeito, hoje modificou muito... Eu não sou dos mais novo, mas posso dar continuidade nisso aí... Só que (antigamente) não tinha essa ilusão do povo ir pra São Paulo, Cajati, Curitiba. O povo morava tudo aqui no sítio. Você ia aqui dentro da Br, ia aqui pra cima, tava cheio de gente. Então, a hora que fizesse o evento, o povo tava aí pra participar. Agora, o povo foi [quase] todo embora; o povo da região foi embora. Eles são assalariados e não podem ta saindo no meio da semana... Hoje, se for fazer o São Pedro no dia dele mesmo, se cair no meio de semana, o povo não pode vir – foi isso que mudou... Eu não cheguei a conhecer o meu avô. Nenhum de nós conheceu, mas essa tradição a comunidade quer preservar. Não deixar essa cultura se acabar...

Ao afirmar a sua identidade de remanescente de quilombo, os sujeito interlocutores buscam

articular a relação de continuidade entre o presente e o passado da comunidade do Cedro

para demonstrar que é justa a reivindicação feita por eles, através da “Associação Nova

Esperança Quilombola do Bairro Cedro”, ao governo paulista da obtenção do título

definitivo de propriedade da terra tradicionalmente ocupada por esta coletividade.

Page 43: Quilombo Cedro

43

Certidão de Auto-Reconhecimento da “Comunidade de Cedro” como “Remanescente das Comunidades dos Quilombos” pela Fundação Palmares

Page 44: Quilombo Cedro

44 - Capítulo VI -

Ao concluir este Relatório Técnico-Científico eu gostaria de salientar que os resultados

aqui apresentados são frutos de um estudo sistemático e rigoroso realizado junto à

comunidade do Cedro, localizada no município de Barra do Turvo, estado de São Paulo. A

partir desse esforço que compreendeu trabalho de campo e de gabinete procurei descrever

sobre as origens históricas dessa comunidade, analisar as formas das relações sociais,

políticas e simbólicas sugestivas da organização interna e valores subjacentes à mesma;

bem como evidenciar as condições de vida e de existência que caracterizam a realidade

atual desta população do interior paulista.

Com efeito, graças ao empenho redobrado na pesquisa antropológica de campo foi que

tornou possível comprovar a origem quilombola da comunidade tradicional do Cedro.

Conforme busquei demonstrar a maior parte das famílias que são integrantes desta

comunidade é descendente de filhos de escravos – a repetir aqui os nomes de Pacífico

Morato de Lima, Benedito Rodrigues de Paula e Miguel de Pontes Maciel. É com orgulho,

pois, que os mais velhos da comunidade relembram os nomes destes ancestrais para os

filhos e netos, com a esperança que eles tenha fixado na memória e guardada para o futuro

a imagem sempre positiva destes antepassados, como referência exemplar da maneira de

ser e agir no mundo, indiferentes dos obstáculos que a vida lhes venha, por ventura, a

oferecer gratuitamente.

Esta memória viva dos antepassados é, sem dúvida, o que revigora o ânimo e vem

estimular, a cada novo dia, a lideranças e associados da “Associação Nova Esperança

Quilombola do Cedro” a investirem na organização e no fortalecimento crescente dessa

entidade sem fins lucrativos, que é um marco importante e significativo para eles, e deles,

manifestarem a intenção e o desejo emergente de valorização de suas diferenças histórica e

social, como indivíduo e coletividade rural, e, desse modo, afirmar positivamente e fazer

tornar-se reconhecida a especificidade da sua identidade étnica enquanto quilombola.

Portanto, é com dando ênfase a esta afirmação identitária étnico-quilombola que ao

terminar este RTC estamos sustentando o argumento de que é justa a reivindicação feita por

Page 45: Quilombo Cedro

45 intermédio da “Associação Nova Esperança Quilombola do Cedro” ao governo paulista -

e direito incontestável dos reivindicantes – a obtenção do título definitivo de propriedade

das terras tradicionalmente ocupadas pela população remanescente de quilombo do Cedro.

A partir da investigação antropológica empreendida pude de perto verificar o profundo

vínculo prático-simbólico da comunidade remanescente de quilombo do Cedro com o

espaço-territorial que ocupa, sendo oportuno ressaltar a importância de se ter a garantia da

propriedade legal da mesma, para efeito da possibilidade de implementação de formas de

produção que possam contribuir para a melhoria da qualidade e propiciar condições dignas

de sobrevivência desta comunidade do Vale do Ribeira. Isso, inclusive, está de acordo com

a posição do Grupo de Trabalho criado pelo Governo do Estado de São Paulo por meio do

Decreto n.40.723, de 21 de março de 199653 ao salientar:

“[...] que o território, em todo seu perímetro, necessário à reprodução física e cultural de cada grupo étnico/tradicional só pode ser dimensionado à luz da interpretação antropológica e em face da capacidade suporte do meio ambiente circundante tendo em vista as necessidades de garantir a melhoria de qualidade de vida de seus habitantes, através da implementação de projetos econômicos adequados, conservando-se os recursos naturais para as gerações vindouras”.

Sendo assim, é valido ressaltar ao final deste RTC que, além do enunciado acima, é levada

em consideração – e se está de pleno acordo aqui – quanto às posições deste mesmo GT e

que são as seguintes:

- que é a “vontade política e visão social do governo paulista de atender e interpretar

o mandamento constitucional, não como obrigação estatal imposta pela lei, mas

principalmente como um ideal da democracia, de proteção aos direitos humanos e respeito

às minorias, a ser perseguido permanentemente”;

- o reconhecimento do GT quanto à necessidade de tratar de forma diferenciada a

identificação dos territórios de comunidades quilombolas, visto que “o cadastro rural

previsto pelo INCRA ou mesmo o cadastro de terras do patrimônio imobiliário estadual

usado para a ‘legitimação de posse e para embasar as ações discriminatórias são incapazes

de detectar apropriações comunais extensas que compõem territórios tradicionais”;

53 Vide nota de rodapé n.1.

Page 46: Quilombo Cedro

46 - que uma das diretrizes do GT destaca a “necessidade de rever procedimentos

técnicos e jurídicos dos órgãos afetos à questão do ordenamento fundiário, agrário,

territorial e ambiental para reconhecer e incorporar as diferenças étnicas e culturais

proporcionando o reconhecimento e a proteção, pelo Estado, dos segmentos portadores

dessas referências e de seus direitos”.

É, portanto, considerando estas posições do GT e os resultados da pesquisa antropológica

realizada que concluímos que a Comunidade do CEDRO é remanescente de quilombo,

de acordo com as definições que embasam os critérios oficiais de reconhecimento adotados

pelo Estado de São Paulo. Salientando, para terminar, que por ocasião da titulação das

terras a Procuradoria do Estado, juntamente com o ITESP, devem promover amplos debates

com a comunidade a respeito do tratamento a ser dado pelo Estado à situação dos pequenos

posseiros que moram, possuem imóvel ou trabalham no lugar para que o processo de

titulação não gere desavença ou venha acirrar situações prováveis de conflitos latentes.

Isso, com certeza, poderá ser evitado através do diálogo e negociação bem conduzidos.

Rubens Alves da Silva.

Antropólogo.

Page 47: Quilombo Cedro

47 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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Page 49: Quilombo Cedro

49 SILVA, Rubens Alves da – Negros católicos ou catolicismo negro?Um estudo sobre a

construção da identidade negra no congado mineiro. Belo Horizonte: Departamento de Sociologia e Antropologia/Universidade Federal de Minas Gerais, 1999 (Dissertação de Mestrado em Sociologia – ênfase: Sociologia da Cultura).

STUCHHI, Deborah (coord.) – Laudo antropológico. Comunidades negras de

Ivaporunduva, São Pedro, Sapatu, Nhunguara, André Lopes, Maria Rosa e Pilões. São Paulo: Ministério Público Federa de São Paulo, 1998.

TURATTI, Maria Cecília M. - Relatório Técnico-Científico sobre os quilombos

remanescentes da comunidade de quilombo de Morro Seco/Iguape – SP. São Paulo: ITESP, 2006.

Internet: Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira Wikipédia, a enciclopédia livre.

Page 50: Quilombo Cedro

50 DIAGRAMA DE PARENTESCO

O diagrama de configuração da genealogia de parentesco que será apresentado mais abaixo

foi elaborado com a finalidade única e exclusiva – e não mais que isto – de indicar quais

são as famílias que possuem vinculo direto de parentesco com o(s) ancestral(is)

reconhecido(s) como fundador(es) do povoado do Cedro.

As informações para elaboração deste diagrama foram levantadas em dois momentos

distintos. Primeiramente, com a colaboração da Coordenadora de lideranças da Associação

Nova Esperança Quilombola do Bairro Cedro, convidamos um dos responsáveis pela

família (pai ou mãe - mas deixando livre a escolha de outro representante) para nos prestar

informação na casa desta liderança.

Em um segundo momento eu procurei revisar as informações preliminares através de visita

domiciliar. Aproveitei, ainda, para completar o registro com novos dados obtidos. A forma

da exposição do diagrama – por casa –, foi inspirado no método utilizado pela etnóloga e

professora já falecida da USP, Dra Aracy Lopes da Silva, em sua tese de doutorado -

Nomes e amigos... (vide Referência Bibliográfica).

Válido mencionar, ainda, que juntamente com a atividade descrita neste segundo momento,

também foi feito levantamento dos pontos de referencia da área ocupada, com o recurso de

GPS operado pelo geógrafo da equipe, Rogério G. Gama. Todo o trabalho deste segundo

momento foi acompanhado de perto pelo técnico do ITESP, Mauro Jacob∗, representante do

“G.T.C. Formação-Pariquera-Açu”.

Importante ressaltar que as famílias configuradas neste diagrama genealógico de parentesco

são aquelas cujo(s) responsável(is) é (ou são) filiado(s) à “Associação Nova Esperança

Quilombola do Cedro”. Condição exigida pela comunidade para a pessoa ou grupo –

independente de ser descendente ou não dos ancestrais fundadores do povoado do Cedro –

tornar-se aceito e reconhecido como um parceiro na luta pela obtenção do título de

propriedade definitiva da terra tradicionalmente ocupada pelos remanescentes de

∗ A quem agradeço imensamente a generosa colaboração neste e outras situações do trabalho de campo.

Page 51: Quilombo Cedro

51 quilombos dessas localidades; e, portanto, poder gozar de todos direitos bem como

usufruir as garantias oferecidas por esse documento legal.

Enfim, a legenda que segue abaixo ajudará o leitor a decifrar os códigos e a entender

melhor a exposição feita e o que está sendo dito através das figuras geométricas e cores

constitutivas deste diagrama de parentesco.

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52 LEGENDA REFERENTE SÍMBOLO Independe do sexo Feminino Masculino Filiação União (casado ou amigado) Separação Viuvez Irmãos Pessoa falecida Faltou Informação ? Famílias Cores Família de Pacífico Morato de Lima Família de Miguel] Pontes Maciel Família de Benedito Rodrigues de Paula Agregados Relação de conflito com a comunidade Trabalhando/morando fora da localidade

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53 Diagrama de parentesco da comunidade remanescente de quilombo do Cedro/Barra do Turvo. Referências Ancestrais - Pacifico Morato de Lima Sebastiana Dias

Luiza Marco Amâncio João Maria Ricardo Joaquim Gonçalo José Felix Francisco Ana Miguel

------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 2ª Geração referencial do quilombo Cedro – Pacífico Sebastiana Angelina Amâncio Gonçalo

Alcides Dolíria ? Joana Joaquim Benigno Judith (Casa 7) (Casa 13) (Casa 11)

Casa 11 (Paraná) (Cajati) Casa 19 Casa14 Casa15 Casa18 Casa7 (Curitiba) (Curitiba) Casa 4 Casa 5 Casa 6 Casa 8 Casa 10 Casa 15 (Curitiba) (Curitiba) Casa 16 Casa 17

------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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54

------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ Casa 01 - Referência: Benedita U. Moura. Cônjuge: Antônio Capoeira.

1- Benedita 2 -Antonio 3-Marcelo 4-Marciano 5-Paulo 6-Sílvio 7-Juliana 8-Mario

9-Estefânia --------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Total do levantamento Populacional:167.

Quilombolas que estão “morando fora”: 69.

Quilombolas na localidade: 98.

Quilombolas

Quantidade

28

35

06

N° Total

69

Comunidade em geral

Quantidade

74

87

06

N° Total

167

Quilombolas

Quantidade

46

52

---

N° Total

98

Page 55: Quilombo Cedro

55 Casa 02 - Referência: Aristeu Rodrigues de Lima. Cônjuge: Alcina Morato Pereira. (José ) 10-Aristeu 11-Alcina

12 13 14 15 16 17 João Leo 20 18 19 Anderson Natália Rafaela Fernanda Julio João Natalina Rosa Edson

21 22 23 24-Bruna 25 ? Guilherme Rodrigues Washington

Obs.: > Sebastiana Lima reside na comunidade vizinha “Terra Seca”.

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Casa 03 - Referência: Adão Monteiro da Paixão. (Filiado a Associação). Cônjuge: Alenide da Paixão. 26 - Adão 27 - Alenide 28 - Oseias 29 - Cássia 30- Mira 31- Daniela ?

----------------------------------------------------------------------------------------------------------

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56 Casa 04 - Referencia: Neuza de Lima Moura. Cônjuge: Durvalino Pires. Casa 07

Neuza 32-Durvalino 33 34 35 Aline Alice Alan

--------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Casa 05 - Referencia: Aparecida de Lima Moura. Cônjuge: Antonio. Casa 07

Aparecida 36-Antônio 37 38 Josenil Douglas -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Casa 06 - Referencia: João de Lima Moura. Cônjuge: Dilacir Tavares Pereira. Casa 07 João 39 Dilacir 40-Alana

--------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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57 Casa 07 - Referencia: Joana Morato de Lima. Cônjuge: Viúva. (Amâncio )

44-Joana 41 42 43 44 45 46 47 48 49 Neusa Aparecida João Nair Benedito Anita (?)Sebastião Maria Nadir

------------------------------------------------------------------------------------------------------------ Casa 08 - Referencia Nair de Lima Moura. Cônjuge: Solteira. Casa 07 Nair 50 51 52 53 54 Rosemary Jeferson Debora Gemerson Andresa

59 Elias

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Casa 09 - Referencia: Valdir Belemer. (Filiado a Associação). Cônjuge: Solteiro.

55 Valdir (Obs.: Vínculo de parentesco nas casas, 02, 11, 14, 18 e na comunidade quilombola Ribeirão Grande/Terra Seca.).

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58 Casa 10 - Referencia: Benedito de Paula Moura. Cônjuge Maria Tereza de Moura. Casa 07 Benedito 56 Maria

57 58 59 60 61 62 63 64 Rogério Romivaldo Reoni Ronildo Maria João Lureti Ricardo

65 Emanoel --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Casa 11 - Referencia Benigno Morato de Lima. Cônjuge Viúvo. (Amâncio ) 66-Benigno 69 Osmanilda 72 João 68 71 73 67-Ivo Sidney 70-Ione Benedita Isauri Gesilene 75 76 Zenilda Ney Adriana 80 81 84 74 77 78 79 Lucas Denílson Roger Osmar Alex Alexandre Sarah Gesiele 82 83 85 86 87-Érika ? ?

(Obs.: Osmanilda: Filha de Valdomiro Lima - comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca).

--------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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59 Casa 12 - Referencia: Isauri Morato de Lima. Cônjuge: Solteiro. Casa 11

Isauri

88-Gesilene

------------------------------------------------------------------------------------------------------------ Casa 13 – Gonçalo José Soares. Cônjuge: Viúvo. 8 9-Gonçalo (Obs.: viúvo da irmã de João, casa 17).

------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Casa 14 - Referencia: Joaquim Boaventura Lima. Cônjuge: Alcidia América de Lima. (Amâncio )

90-Joaquim 91-Alcide Valdir 102 92 93 94 100 101 Aparecida Francisca Anita Elza Lourdes Sebastião 103 104 Valdair Gislaine 105Douglas 106-? 107- ?

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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60 Casa 15 - Referencia: Francisca de Lima. Cônjuge: Pedro Ferreira Belemer. Casa 13 Francisca 108 Pedro ? 118 ? 109 110 111 112 113 114 115 116 Oriel Marcelo Gerson Eliane Aurélio Sebastião João Balbina 117 118 119 120 Rodrigo Guilherme Flávio Ricardo ( Obs.: Pedro Belemer: vínculo de parentesco nas casas 02, 09, 11, 18 e na comunidade quilombola Ribeirão Grande/Terra Seca.).

Casa 16 - Referencia: Anita Soares de Lima. Cônjuge: Viúva. Casa 13 Anita ? 123 Angélica ? Cezar 121 Joel 122 124 125 126 127 Janete Misael Ezequiel Janael Janaina

128 129 130 ? 131 132 Emerson ? Maikon Mailson

Page 61: Quilombo Cedro

61 Casa 17 - Referencia: João Vidal Lima. Cônjuge: Joelma Lima. (Judith )

133- João 134-Joelma 135 136 137 Thaís Tane Júnior (Obs.: João: descendência paterna ligada à Benedito Rodrigues de Paula)

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Casa 18 - Referência: Julieta Antonia de Camargo. Cônjuge: Viuva. 138 Julieta (Obs: Mãe de Joelma- Casa 16.).

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Casa 19 - Referencia: Pedro Morato Pereira. Cônjuge: Sozinho. (Judith ).

139-Pedro 140 141 142 Gerson Luciela Diego (Obs.: Pedro: descendência paterna ligada à Benedito Rodrigues de Paula)

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Page 62: Quilombo Cedro

62 Casa 20 - Referencia: Elza S. Lima. Cônjuge: Vandir Ferreira Belemer. Casa 13

Elza 143-Vandir ? 144 145 146 147 148 149 150 151 152 Lauridir Viviana Cleber Welton Claumir Ladimilda Claudemir Maria Vera 153 154 155 156 Tainá Ana Cristina Carmélia (Obs.: Vandir Belemer: vínculo de parentesco nas casas 02, 09, 11, 14 e na comunidade quilombola Ribeirão Grande/Terra Seca.).

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Casa 21 - Referencia: Carlos de Lima. Cônjuge: Lourdes S. Lima. (Gonçalo . ) Casa 13 157- Carlos Lourdes -Osmar 158 157 158 159 155 156 Maria Paulo Andréia Euvanira Amanda Adriana 159 160 161 162 Elson Kênia Érika Ugo

(Obs.: Carlos Lima : filho de Angelina Pontes Maciel > Neta de Miguel de Pontes Maciel).

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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63 Casas 22, 22a, 22b e 22c - Referência: Manoel (Não filiado a Associação) Cônjuge: (?). 163- Manoel

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Casa 23 - Referência: Antônio Miguel. Cônjuge: Arlinda. 164-Antônio 165 - Arlinda

166 - Pedro Pedroso.

Casa 24 - Referência: Antônio (Sapecado). Cônjuge: (?). 167-Antônio

Page 64: Quilombo Cedro

64 Lista de casas contendo informações sobre genealogia de parentesco da comunidade remanescente de quilombo do Cedro/Barra do Turvo.

Casa

Referencia familiar

Descendentes

01

1- de Moura Antonio Capoeira 2 - Benedita Ursulina (cônjuge).

3-Marcelo, 4-Marciano, 5-Paulo, 6-Sílvio, 7-Juliana, 8-Mario, 9-Estefânia.

02

10-Aristeu Rodrigues de Lima (referência), 11-Alcina Morato de Lima (cônjuge).

12-Anderson, 13-Natália, 14-Rafaela, 15-Fernand,a 16-Júlio, 17-João, 18-Natalina, 19-Rosa, 20-Edson, 21-Guilherme, 22-Rodrigues, 23-Washington, 24-Bruna, 25 (?).

03

26 – Adão Monteiro da Paixão (referência), 27 – Alenide Paixão (cônjuge)

28 - Oseias 29 - Cássia 30- Mira 31- Daniela

04

Neuza Lima de Moura (vide casa 7/referência), 32-Durvalino Pires (cônjuge).

33-Aline, 34-Alice, 35-Alan.

05

Aparecida de Lima Moura (vide casa 7/referência), 36-Antônio (cônjuge).

37-Josenil, 38-Douglas.

06

João de Lima Moura (vide casa 7/referência), 39 Dilacir Tavares Pereira (cônjuge).

40-Alana.

Page 65: Quilombo Cedro

65 07

41-Joana (referência principal).

42-Neusa, 43-Aparecida, 44-João, 45-Nair, 46-Benedito, 47-Anita, 48-Sebastião, 49-Maria, 50-Nadir.

08 Nair de Lima Moura (vide casa 7/referência).

51-Rosemary, 52-Jeferson, 53-Debora, 54-Gemerson, 55-Andresa, 56-Elias.

09

57Valdir

10

Benedito de Paula Moura (vide casa 7/referência), 58-Maria Tereza (cônjuge).

59-Rogério, 60-Romivaldo, 61-Reoni, 62-Ronildo, 63- Maria, 64- João, 65-Lureti, 66-Ricardo, 67 -Emanoel

11

68-Benigno Morato de Lima (referência principal)

69-Ivo, 70-Sidney, 71-Osmanilda, 72-Ione, 73-Benedita, 74-João, 75-Isauri, 76-Lucas, 77-Denílson, 78-Roger, 79-Zenilda, 80-Osmar, 81-Alex, 82-Alexandre, 83-Sarah, 84-Gesiele. 85-Gesilene, 86-(?), 87-(?), 88-Érika

12

Isauri Morato de Lima (vide casa 11/referência)

90-Gesilene

Page 66: Quilombo Cedro

66 13

89- Gonçalo José Soares

14

90-Joaquim Boaventura Lima (referência principal), 91-Alcidia América (cônjuge).

92-Francisca, 93-Anita, 94-Elza, 95-Lourdes, 96-Sebastião, 97-Aparecida, 98-Valdair, 99-Gislaine, 100-Douglas, 101-(?), 102-(?).

15

Francisca de Lima (vide casa 13/referência), 103-Pedro Belemer (cônjuge).

104-Oriel, 105-Marcelo, 106-Gerson, 107-Eliane, 108-Aurélio, 109-Sebastião, 110-João, 111-Balbina, 112-Rodrigo, 113-Guilherme, 114-Flávio, 115-Ricardo.

16

Anita Soares de Lima (vide casa 13/referência).

116 –Joel, 117-Misael, 118-(?), 119-Ezequiel, 120-Janael, 121-Janaina, 122-Janete, 123-(?), 124-Emerson, 125-(?), 126-Maikon, 127-Mailson,

17

128 João Vidal Lima (referência), 129-Joelma Lima (cônjuge).

130-Thaís, 131-Tane, 132-Júnior

Page 67: Quilombo Cedro

67 18

133-Julieta A. Camargo.

19 134-Pedro Morato Pereira.

135-Gerson, 136-Luciela, 137-Diego.

20 Elza Soares de Lima (vide casa 13/referência), 138-Vandir Belemer (cônjuge).

139- Lauridir 140- Viviana 141-Cleber 142-Welton 143-Claumir 144-Ladimilda 145-Claudemir, 146-Maria, 147-Vera, 148-Tainá, 149-Ana, 150-Cristina, 151-Carmélia.

21 Lourdes Soares de Lima (vide casa 13/referência), 152-Carlos de Lima (cônjuge).

153-Andréia 154-Euvanira 155-Amanda 156-Adriana 157-Maria 158-Paulo 159-Elson 160-Kênia 161-Érika 162-Ugo

22 163 – Manoel

23 164 - Antônio Miguel. 165 – Arlinda (cônjuge).

166 – Pedro Pedroso.

24 167 – Antônio (Sapecado).

Page 68: Quilombo Cedro

68

ANEXOS

Page 69: Quilombo Cedro

69

MAPAS

Proposta da área reivindicada pelas comunidades da Barra do Turvo

Proposta da “Reserva de Desenvolvimento Sustentável - RDS”

Situação fundiária da comunidade

Mosaico do Parque Estadual de Jacupiranga (Lei 12.810 de 21/02/2008)

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70

Ata de Assembléia Extraordinária e Certidão

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71

Registros de Imóveis e Certidão