estratégias de propaganda política: reflexões sobre as eleições brasileiras

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Estratégias de Propaganda Política

Reflexões sobre as eleições brasileiras

Sociedade Brasileira de Pesquisadores e Profissionais de Comunicação e Marketing

Político – POLITICOM

Estratégias de Propaganda Política

Reflexões sobre as eleições brasileiras

(Organizadores) Adolpho Carlos Françoso Queiroz

Roberto Gondo Macedo Victor Kraide Corte Real

Cátedra UNESCO / Metodista de Comunicação

São Bernardo do Campo | SP | Brasil

2010

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

Conselho Diretor

Wilson Roberto Zuccherato (presidente), Rosilene Gomes da Silva Rodrigues (vice-presidente), Rui Sergio

Santos Simões (secretário), Augusto Campos de Rezende, Clóvis de Oliveira Paradela, Eric de Oliveira

Santos, Henrique de Mesquita Barbosa Corrêa, Maria Flávia Kovalski, Nelly Azevedo Matolla, Nelson Fer,

Paulo Roberto Lima Bruhn e Saulo de Tarso Cerqueira Baptista

Reitor: Marcio de Moraes

Pró-Reitora de Graduação: Vera Lúcia Gouvêa Stivaletti

Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa: Lauri Emílio Wirth

Pró-Reitor de Educação a Distância: Luciano Sathler Rosa Guimarães

Pró-Reitora de Infra-Estrutura e Gestão de Pessoas: Elaine Lima de Oliveira

Faculdade de Comunicação

Paulo Rogério Tarsitano

Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social

Sebastião Squirra

Conselho de Política Editorial

Marcio de Moraes (presidente), Daniel Pansarelli, Etienne Alfred Higuet, José Marques de Melo, Luiz Renato

Paranhos, Luiz Roberto Alves, Magali do Nascimento Cunha, Mário Francisco Boratti, Peri Mesquida

(representante externo), Rafael Marcus Chiuzi

Comissão de Livros

Almir Martins Vieira, Daniel Pansarelli, José Marques de Melo, Magali do NascimentoCunha, Marcelo

Módolo, Maria Angélica Santini, Rafael Marcus Chiuzi

Estratégias de Propaganda Política – Reflexões sobre as eleições brasileiras

Copyright © 2010

Autores

Créditos Institucionais

Universidade Metodista de São Paulo

Reitor: Márcio de Moraes

Vice-Reitor: Clóvis Pinto de Castro

UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciências, a Cultura

Diretor Geral: Irina Bokova.

Assistente do Diretor Geral para a Divisão de Comunicação e Informação: Abdul Waheed Khan

Cátedra UNESCO de Comunicação para o Desenvolvimento Regional

Equipe Executiva

Diretor Titular: Prof. Dr. José Marques de Melo;

Assistente Acadêmica: Francisca Rônia Barbosa;

Estagiários: Lucas Kenji Suzuki Constante; Amanda Carla Pas

Equipe Consultiva: Triênio 2007/2010 - Prof. Dr. Jorge Duarte - Assessor da Secretaria de Comunicação

Institucional da Presidência da República - Brasília; Sra. Lúcia Araújo - Diretora do Canal Futura, da

Fundação Roberto Marinho - Rio de Janeiro; Profª. Drª. Magali Cunha – Conselheira do Conselho Mundial de

Igrejas - Faculdade de Teologia - Igreja Metodista - São Bernardo do Campo - São Paulo; Profª. Drª.

Margareth Born Steinberger-Elias - da Universidade Federal do ABC – Divisão de Ciências Sociais - Santo

André - São Paulo e Sra. Vera Lúcia Rodrigues - Diretora da empresa Vervi Comunicações - São Paulo - SP.

Capa: Lucas Kenji Suzuki Constante

Revisão: Roberto Gondo Macedo

As informações e opiniões emitidas nos artigos são de inteira responsabilidade dos seus autores, não representando,

necessariamente, posição oficial da Editora Metodista.

6

Sumário

Prefácio

Novas – e muito boas! -- reflexões sobre a comunicação política nas eleições brasileiras ..... 8

José Marques de Melo

Apresentação

O marketing pós eleitoral ............................................................................................................... 10

Adolpho Queiroz, Roberto Gondo Macedo e Victor Kraide Corte Real

Parte I – Propaganda política em Jornais, Revistas e Internet

Política e tecnologia: duas realidades na campanha de Barack Obama ................................... 13

Maria Cleidejane Esperidião e Denis Porto Renó

Revista Veja: ascensão e queda de uma pré-candidata .............................................................. 24

Camila et al Jimenez

Um lugar de construção do “mudancismo”: Fernando Henrique Cardoso na Folha

de S. Paulo ...................................................................................................................................... 35

Roberto Gondo Macedo e Wanderon Fábio de Melo

Imprensa e internet: a miopia do TSE ........................................................................................... 42

Maurício Romanini

Parte II – Propaganda política na televisão e rádio

O espaço público mediatizado no portal institucional da RADIOBRÁS durante a cobertura das

eleições 2006. .................................................................................................................................. 51

Débora Burini e Jefferson J. Ribeiro de Moura

Os políticos de Deus: a programação televisiva neopentecostal como ferramenta de

marketing político ........................................................................................................................... 64

José Guibson Dantas

Comunicação pública, interesse público e cidadania política: um estudo da tv ALESP no

Estado de São Paulo ...................................................................................................................... 73

Paulo Cezar Rosa e Roberto Gondo Macedo

7

Parte III – Propaganda política e ações regionais

Uma mulher de força na política limeirense. Um estudo sobre a trajetória política e as

estratégias de comunicação popular de Elza Tank ..................................................................... 85

Carlos Fernando Bosco, Samia Cruanes de Souza Dias, Victor Kraide Corte Real

Projeto Cimento Social no Morro da Providência e a pré-eleição na capital fluminense ........ 95

Plínio Marcos Volponi Leal

“ITU, A CIDADE ONDE TUDO É GRANDE” A construção de um mito a partir da comunicação

popular ........................................................................................................................................... 105

Anne Karoline Martinelli, Victor Kraide Corte Real

Coligações: reflexão da aliança “informal” entre PSDB e PT em Belo Horizonte .................. 116

Sander Neves

Democracia e transmissão de idéias e ações políticas: uma experiência em Piracicaba ..... 128

Fábio Rogério dos Santos, Francisco Negrini Romero e Pedro Paulo Losi Monteiro

Parte IV – Propaganda política e ações nacionais

Lula, o presidente que tem a cara do povo ................................................................................ 138

Rita de Cássia Schultheis Trevisan Assolini

O discurso sobre o Programa Bolsa Família como estratégia pós-eleitoral do governo Lula

........................................................................................................................................................ 150

Luciana et al Panke

As conotações político comunicacionais no discurso de Monteiro Lobato em sua obra e em

suas traduções.............................................................................................................................. 159

Kátia Regiane Gonçalves dos Santos e Roberto Gondo Macedo

Parte V – Propaganda política e ferramentas estratégicas

Propaganda ideológica e cultura ................................................................................................. 169

Fabio Ciaccia Rodrigues Caldas

O universo das marcas. Em busca de uma marca forte. Como se destacar no meio de tantos

signos. ........................................................................................................................................... 177

André Gustavo Rodrigues Monteiro

Uma proposta metodológica de uso da pesquisa amostral para elaboração de marketing

político pré e pós eleitoral............................................................................................................ 184

Pedro Paulo Losi Monteiro

8

Novas – e muito boas! -- reflexões sobre

a comunicação política nas eleições brasileiras

José Marques de MELO1

Eis mais uma produção importante para refletirmos sobre os caminhos da comunicação e

do marketing político no país. Com a sistematização das principais contribuições do seu VIII

Congresso, realizado nas dependências da Faculdade “Prudente de Morais”, em Itu/SP, a

POLITICOM, Sociedade Brasileira dos Pesquisadores e Profissionais de Comunicação e Marketing

Político nos oferecem mais uma série de relatos de pesquisadores de vários cantos do país, que

buscam legitimar este campo de pesquisa no Brasil contemporâneo.

A transposição das principais comunicações, reunidas em mais um e-book, certamente

ganhará importância no cenário contemporâneo das contribuições que esta jovem Sociedade

científica vem dando ao campo da comunicação em nosso país.

Vale lembrar que foi também neste importante congresso realizado no berço da República

do nosso país, que surgiu a POLITICOM com ares de sociedade científica. Ela vinha caminhando

lentamente, a partir do projeto de pesquisa idealizado pelo prof. Dr. Adolpho Queiroz na

Universidade Metodista de São Paulo; ganhou novos alentos com o apoio decisivo da Cátedra

UNESCO de Comunicação para o Desenvolvimento Regional, que apoiou o evento nos anos

subsequentes e passou a integrar o grupo das associações e sociedades científicas brasileiras que

fazem prosperar entre colóquios, simpósios, seminários, congressos científicos e suas publicações,

o conhecimento novo de uma área em ascensão do ponto de vista do interesse público.

Afinal, pesquisar comunicação política no nosso país tem sido um alento, pois a partir das

reflexões que emergem destes seletos grupos, conseguimos vislumbrar, cada vez mais, a

importância da inserção da comunicação como objeto de estudo nesta área de dificuldades

imensas.

São estes pesquisadores idealistas e competentes que começam a recontar parcelas da

história da evolução do conceito do marketing político no nosso país, com seus levantamentos,

pesquisas e constantes debates. E igualmente vem deles, contribuições para uma nova

interpretação do campo, quer do ponto de vista científico; quer do ponto de vista aplicado.

E aí reside outro mérito deste grupo. Tem sido marca indelével dos Congressos e das

ações da POLITICOM, a permanente relação entre o pensar o conhecimento novo e o diálogo com

o mercado dos profissionais do marketing político, formado via de regra por gente de envergadura e

grande experiência na condução dos nossos políticos pelas eleições majoritárias e proporcionais

1 José Marques de Melo é diretor da Cátedra UNESCO/UMESP de Comunicação para o Desenvolvimento Regional

9

por intermédio da imprensa de massa, o jornal,as revistas,o rádio,a televisão e mais recentemente a

internet.

Neste novo volume, organizado pelos profs. Adolpho Queiroz, incansável difusor das novas

conquistas neste campo; por Victor Kraide Corte Real, anfitrião em Itu do VIII Congresso e por

Roberto Gondo Macedo, diretor editorial da POLITICOM, é possível encontrar relatos sobre a

propaganda política no âmbito nacional, convivendo com os seus desdobramentos no campo

regional.

Creio que a nova obra terá sucesso na internet e dará continuidade às preocupações deste

grupo em promover sempre, com criatividade e seriedade, novos chamamentos para que a

produção e a difusão do conhecimento neste campo se dêem com a regularidade que se espera de

congressos científicos periódicos no Brasil do século XXI. Boa leitura a todos.

10

O marketing pós eleitoral

Adolpho QUEIROZ Roberto Gondo MACEDO

Victor Kraide CORTE REAL

O ano de 2008 ficará marcado como o marco zero da constituição de mais uma sociedade

científica no país. Em outubro daquele ano, fundamos em Itu/SP, a POLITICOM, Sociedade

Brasileira dos Pesquisadores e Profissionais de Comunicação e Marketing Político, que com o apoio

da Cátedra UNESCO/UMESP de Comunicação para o Desenvolvimento Regional e o Programa de

Pós-Graduação em Comunicação da mesma Universidade contribuíram decisivamente para a sua

instalação e desenvolvimento.

Naquele ano, o tema do congresso foi o do “Marketing Pós-eleitoral” e diante de uma platéia

composta por pesquisadores de diversas Universidades brasileiras, o tema foi desenvolvido em

duas vertentes principais.

Nas conferências que nortearam o encontro, o prof. Dr. Marcelo Melo, da Universidade

Metodista de São Paulo apresentou o impacto e os reflexos deste tipo de marketing a partir de uma

mini série apresentada pela Rede Globo sobre a vida e obra de Juscelino Kubitscheck. JK foi não só

o presidente bossa nova, mas o empreendedor que construiu Brasília, que utilizou um dos mais

marcantes slogans de campanhas eleitorais, o “Fazer o Brasil avançar 50 anos em 5” ,cuja

atribuição é atribuída ao seu ghost writter,o poeta Autran Dourado, e que, principalmente valorizou

como poucos homens públicos deste país, a comunicação.

Na seleção de imagens que preparou para o público, Melo ia revivendo – através da mini

série – momentos marcantes da campanha de 1955 como os da realização dos comícios, a criação

do primeiro comitê feminino do país – liderado por Sarah Kubitscheck -, as melodias da época, o

empenho do candidato em mostrar-se próximo da população, suas conversas teatralizadas pelos

personagens que representaram os atores sociais daqueles dias.

De outro lado, relembrando os ensinamentos de Carlos Manhanelli, um dos pioneiros no

campo do estudo da propaganda política em nosso país, o prof. Adolpho Queiroz discutiu com os

presentes as ações, estratégias, componentes teóricos e de comunicação aplicada presentes nas

ações do marketing pós-eleitoral.

Este novo componente do planejamento estratégico de uma campanha eleitoral exige que

candidatos a cargos majoritários e proporcionais em nosso país, empenhem-se, no minuto seguinte

ao da proclamação dos resultados eleitorais, numa série de atividades de reconhecimento do apoio

das lideranças, da imprensa e, principalmente, na construção de uma equipe profissional para

atender as demandas de comunicação de uma prefeitura municipal, de um governo de Estado e,

especialmente, de um país.

Além destes momentos importantes naquele Congresso, foram selecionados para

frequentar este e-book – não só como forma de registro das principais idéias debatidas naquele

encontro, mas para continuarem a formar repertório contemporâneo sobre o campo, assuntos

variados sobre campanhas e eleições regionais e nacionais.

Os artigos aqui selecionados e que compõem este novo projeto editorial eletrônico da

POLITICOM são os principais apresentados naquele congresso que agora dividimos com a

11

sociedade científica, os leitores, os críticos e os pesquisadores da área, para que possam servir de

estimulo ao debate e alento à pesquisa que se pretende para o campo do marketing político no

nosso país.

PARTE I

_________________________________

PROPAGANDA POLÍTICA EM JORNAIS, REVISTAS E INTERNET

Estratégias de Propaganda Política: reflexões sobre eleições brasileiras

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13

Política e tecnologia: duas realidades na campanha de Barack Obama

Maria Cleidejane ESPERIDIÃO2 Denis Porto RENÓ3

Resumo

Este artigo discute, de uma maneira geral, como a Internet se consolidou como a ágora

virtual da política americana, durante o primeiro semestre da campanha presidencial. Além de

dispor de uma textura múltipla de estratégias comunicacionais (por meio de text-messages via

celulares, e-mails, robo-calls, conferências e debates transmitidos online), a longa campanha que

precede à indicação dos partidos na corrida à Casa Branca redimensionou a interação entre os pré-

candidatos e o eleitorado. Candidatos, em especial Barack Obama, conseguiram recorde de

arrecadação de doações para a campanha pela web e esgotaram ferramentas disponíveis em sites

de relacionamento e compartilhamento de mídia, ao mesmo tempo em que perderam o controle

sobre seus discursos – do passado e do presente.

Palavras-chave: Eleições americanas; marketing viral; Internet; política; Novas tecnologias Digitais;

Comunicação.

Introdução A eleição presidencial americana de 2008 se constituiu como um fenômeno de texturas

múltiplas. Apresentamos aqui, uma, de duas grandes dimensões, deste processo político4. A primeira é o caráter simbólico desta disputa. É a primeira campanha onde uma mulher teve chances reais de disputar a candidatura, por um grande partido. É a primeira vez que um negro pode ser eleito. É a primeira vez, em 50 anos, que um presidente ou seu vice não fazem parte da disputa. É a

2 Jornalista, Editora Internacional, Mestre em Estudos do Jornalismo pela Cardiff University, pósgraduada em História Contemporânea pela UFPE e Produção para Documentários pela Royal Holloway University. É doutoranda em Comunicação Social da UMESP e professora-colaboradora da Umesp, de Piracicaba. Entre Fevereiro e Janeiro de 2008, acompanhou as eleições americanas, a convite do Departamento de Estado do Governo dos Estados Unidos, através do programa International Visitor Leadership. E-mail: [email protected]. 3 Jornalista, documentarista, mestre e doutorando em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), onde é pesquisador sobre novas tecnologias digitais, linguagem e audiovisual. Membro-fundador da Red INAV – Rede Ibero-americana de Narrativas Audiovisuais, é professor visitante da Universidade Técnica Particular de Loja, onde desenvolve com o corpo docente pesquisas em Comunicação Social e Novas Tecnologias Digitais. E-mail: [email protected] 4 Pela ótica da geopolítica internacional, é uma eleição estratégica e monitorada, em detalhes, por cidadãos de todo o mundo. Pesquisa divulgada pela Pew Reseach Center em 12 países, mostra que a eleição é vista como uma maneira de melhorar a política externa americana. 83% dos japoneses acompanham-a atentamente. No Brasil, apenas 20% (FRAM, 2008). É grande também a avalanche de artigos publicados sobre a representatividade simbólica e o discurso híbrido de Barack Obama. No Brasil, paper apresentado no Celacom 2008 dá conta desta dimensão, discutindo, particularmente, a construção de uma identidade Obama: um sujeito “típico” da pós-modernidade (DINIZ, 2008).

Estratégias de Propaganda Política: reflexões sobre eleições brasileiras

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primeira vez que se registra um aumento significativo de participação de eleitores nas chamadas 56 “prévias”5. Depois de cinco meses de campanha, Barack Obama conseguiu atrair mais de um milhão de doadores, e até o fechamento deste artigo, havia recebido de 272 milhões de dólares – a maioria, pela web. Um recorde e o triplo do concorrente, o republicano John McCain. Mas a dimensão que nos interessa para efeito deste artigo é a conectividade: este ano, 46% dos americanos usaram a internet ou mensagens de texto pelo celular para se engajarem em alguma atividade política. A cultura do “soundbite” televisivo foi, aos poucos, sendo bombardeada pelo efeito contrário: o campeão de audiência no site de compartilhamento de mídia, YouTube, foi, durante uma semana, um discurso de 40 minutos do democrata. Trinta e cinco por cento de potenciais eleitores acessaram vídeos sobre a campanha eleitoral no YouTube. Em 2004, eram apenas 13% (JESDANUN, 2008).

A primeira grande diferença do uso da Internet na campanha presidencial de 2008 foi o lançamento oficial das candidaturas, ao menos pelo Partido Democrata. Em vez de anunciar pela televisão em mídias tradicionais, como as três maiores emissoras de televisão (ABC, NBC, CBS) e canais a cabo (FOX, CNN), os até então précandidatos Barack Obama e Hillary Clinton, colocaram seus nomes na disputa em suas páginas oficiais na rede, em 2007. Além de conteúdo multimídia e de interatividade, os sites oficiais possuíam uma espécie de TV do candidato, onde era possível não apenas acompanhar todas as atividades políticas, como os vídeos publicitários feitos em formatos adequados para web e muito curtos. Obama chegou inclusive a criar uma outra página oficial na web, apenas para apagar rumores de anti-propaganda feita para associá-lo ao extremismo islâmico e anti-patriotismo (SULLIVAN, 2008).

Outra iniciativa do candidato foi a criação de um blog atualizado diariamente por diversas vezes, onde rebate ou reforça questões relacionadas à mídia e adota o espaço para divulgação de vídeos sobre a campanha, transformando o ambiente num canal multimídia6. Obama produz ou grava os vídeos e posta no YouTube, fazendo um link direto ao seu blog. Com isso, o candidato ganha divulgação pelo canal de maior movimentação audiovisual no mundo da Internet sem necessitar de tecnologia particular, espaço no servidor ou mesmo capacidade de banda para isso. A mesma iniciativa foi tomada por Hillary7, mas o endereço não contou com a amplitude de recursos multimídia adotada por seu adversário de partido, nem a periodicidade apresentada pelo mesmo no que se refere a postagens.

A rapidez com que as peças propagandísticas eram produzidas (em cada um, mais de 30 vídeos até Junho) esboçava, também, a capacidade de reação dos concorrentes. Quando a equipe de Hillary produziu um vídeo estrelado por Jack Nicholson, no dia seguinte, já estava postado na Internet a reação da campanha de Obama. Enquanto Jack apelava para as eleitores votarem numa mulher, mostrando cenas do ator com várias mulheres no cinema, a peça de Obama costurava uma série de falas anônimas com a frase “Sinto muito, Jack” (“Sorry, Jack”). Todo este conteúdo acabava reverberando na mídia tradicional, que se alimentava da disputa online para encontrar “notícias” diárias na longa e exaustiva campanha.

A tecnologia móvel e os bancos de informação com número de telefones celulares disponibilizados possibilitaram que os estrategistas da campanha investissem maciçamente em mensagens de texto. No próprio site, há um cadastramento para o usuário, fornecendo os números

5

Adoto aqui uma única tradução brasileira para dois processos distintos: Cacuses e Primaries. No primeiro, eleitores

vão a um local pré-estabelecido, num horário fixo pré-determinado, para realizar uma assembléia e discutir as propostas dos candidatos. Cabos eleitorais tentam convencer eleitores filiados qual dos candidatos é o mais viável para disputar a eleição. Ao final do dia, em cada sala, e através de votação manual , é feita a eleição. Nas primaries, os eleitores votam, das 8h äs 20h, em urnas eletrônicas, para escolher os delegados que representarão os candidatos. Não há um processo de discussão. 6 Disponível em http://my.barackobama.com/page/content/hqblog/. Acessado em 22/06/2008. 7 Disponível em http://hillarysblog.com/. Acessado em 22/06/2008.

Estratégias de Propaganda Política: reflexões sobre eleições brasileiras

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de cadastro e envio de mensagens. Num dos comícios, por exemplo, cada pessoa que chegasse ao local recebia um cartão telefônico, com alguns números telefônicos no verso. Quando o evento começava, o locutor pedia que o usuário do telefone ligasse para aqueles cinco eleitores indecisos, criando voluntários flexíveis e temporários para a campanha: eles convocavam anônimos para outros eventos e pediam doações. Em dez minutos, três mil pessoas passavam 15 mil mensagens, que, por sua vez, multiplicavam-se em outras. É sobre isso que fala a reportagem postada em fevereiro no site da ABC, feita pela jornalista de Sarah Lai Stirland:

O senador por Illinois não é o único candidate que vem usando tecnologia online e telephones celulares. Mas é o que vem sendo mais eficiente ao adotar essas novas estratégias tecnológicas. Na última terça-feira, por exemplo, os que assinaram a lista online receberam uma mensagem de texto nos seus celulares lembrando que era dia de votar. A mensagem incluía, inclusive, um número de telefone gratuito para usar o eleitor a localizar a zona eleitoral – um fator chave para estimular uma presença nas urnas (STIRLAND citada em SCHALLER, 2008)8.

Em outro momento, os eleitores jovens9, alvos do democrata, recebiam mensagens pelo celular pedindo que comparecessem ao comício de Obama porque teriam uma surpresa. Quando Obama ainda nem estava no palco, os organizadores avisaram que 3000 ingressos seriam distribuídos de graça para um concerto pop no campus da Universidade de Indiana. Foi uma receita jamais vista, segundo professor da Georgia University, Michael Cornfield: uma mistura entre celebridade e extensa campanha de base feita por voluntários, e tudo isso remediado pela Internet (CORNFIELD, 2008).

As transmissões via web de tele-conferências e debates também eram avisadas pelo celular e emails rastreados por voluntários da campanha. A telefonia fixa foi outro suporte adotado através de mensagens automáticas, as chamadas robo calls, feitas no fim de semana, em geral em horários de baixo custo10. O mesmo pode ser percebido através deste modelo de convocação, enviado via email, para conferência por telefone. A rede teve um importante papel na comunicação e no envolvimento dos eleitores de Obama no processo pré-eleitoral. Para isso, apóia-se nos conceitos de redes sociais apresentados por Castells (1999, p.566), para quem “Redes são estruturas abertas capazes de expandir de forma ilimitada, integrando novos nós desde que consigam comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem os mesmos códigos de comunicação”. O formato da convocação era o seguinte:

8 “The Illinois senator is not the only candidate whose campaign is using online technology and mobile phones, but his has been one of the most effective in its embrace of new tech strategies. On Tuesday, for example, Obama supporters who signed up with the candidate received a text message reminding them to vote. The text message included a phone number to help them find their polling station, a key feature that helped get out the vote”. Disponível em http://abcnews.go.com/Technology/Vote2008/Story?id=4290708&page=1, acessado em 28/06/2008 9 A Universidade de Maryland acompanhou os resultados de 24 prévias. Em 21 delas, jovens entre 18 e 29 anos votaram em peso em Obama 10 O professor Thomas Schaller conseguiu obter uma transcrição dessas ligações, feitas pelos republicanos: “I‟m calling with an urgent Mitt Romney alert. We care deeply about traditional values and protecting families. And we need someone who will not waver in the White House: ending abortion, preserving the sanctity of marriage, stopping the trash on the airwaves and attempts to ban God from every corner of society. These issues are core to our being. Mitt Romney thinks he can fool us. He supported abortion on demand, even allowed a law mandating taxpayer funding for abortion. He says he changed his mind, but he still hasn‟t changed the law. He told gay organizers in Massachusetts he would be a stronger advocate for special rights than even Ted Kennedy. Now, it‟s something different. Unfortunately, on issue after issue Mitt Romney has treated social issues voters as fools, thinking we won‟t catch on. Sorry, Mitt, we know you aren‟t trustworthy on the most important issue and you aren‟t a conservative. Paid for by John McCain 2008.”

Estratégias de Propaganda Política: reflexões sobre eleições brasileiras

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Eleitores de obama promovem uma conferência por telefone pela discutir a questão da raça/etnia na campanha. Participam senadores e governadores do partido, além de repórteres. Horários: 11.30 da manhã, hora do pacífico... Por favor, confirme sua presença através do email abaixo (SCHALLER, 2008)11.

A publicidade de campanha também direcionava o eleitor para a Internet, convidando-o a participar da rede de relacionamento construída e alimentada por Obama. Para isso, o candidato distribuía nos comícios um panfleto que convida o leitor a permanecer conectado com a campanha, apesar de não estar navegando. Com isso, percebe-se que a campanha de Barack Obama foi planejada de forma multimidiática, com suportes eletrônicos e apoio a esse suporte nas condições convencionais, impressas. Outra indicação de Obama em seus comícios referia-se à utilização de comunicadores móveis, através de aparelhos de telefonia celular, para manter-se conectado nas novidades da campanha. O que pode ser percebido nos casos a seguir é que a comunicação multimídia e os conceitos de redes de relacionamento como ambientes de divulgação de idéias políticas foram adotados como soluções para ampliação destes trabalhos. A partir disso, percebe-se a importância destes ambientes no que tange o planejamento de comunicações convencionais.

11 Email enviado a partir do endereço tededwards@barackobama. Com ao professor Thomas Schaller: Obama Campaign Supporters Host a Conference Call to Discuss the State of the Race Chicago, IL – Top Obama campaign supporters Sen. John Kerry, Sen. Amy Klobuchar, Sen. Claire McCaskill, Gov. Janet Napolitano and Gov. Deval Patrick will join Campaign Manager David Plouffe on a conference call with reporters to discuss the race for the Democratic nomination. WHEN: Wednesday, May 7, 2008 11:30 AM ET // 10:30 AM CT // 9:30 AM MT // 8:30 AM PT WHAT: State of the Race Conference Call/.HOW: To RSVP and receive call information, email [email protected].

Estratégias de Propaganda Política: reflexões sobre eleições brasileiras

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Ágora virtual Recuperamos, a partir de agora, uma discussão importante dentro deste cenário

tecnológico que, sem dúvida, nos permite dimensionar a Internet como a nossa ágora virtual, um novo espaço público de engajamento cívico. A convergência e hibridização de velhas e novas mídias, e a multiplicação de blogs e redes sociais já fazem da eleição presidencial americana de 2008 não apenas um marco nas inovações on-line do marketing político, mas, sobretudo, uma oportunidade para retomar brevemente um debate que está longe de perecer. Se a Internet, como conceituou Manuel Castells, se transformou no “tecido de nossas vidas” (CASTELLS, 2005, p.255), é natural que uma campanha que se utilizou de suas infinitas possibilidades nos conduza a algumas reflexões. Como pontuou José Luiz Brea na obra-manifesto La era postmedia, será que este “despotismo tecnológico” permanece criando falsas promessas de democracia (BREA, 2002, p.102)? Ou, num extremo oposto, a campanha presidencial americana consolidou, ao menos nos Estados Unidos, a nova esfera pública, batizada por Pierre Lévy de “ágora virtual”?

Lévy defende o ciberespaço como único território efetivamente democrático na sociedade midiática de economia globalizada, um atalho de superação das desigualdades, criando novas formas de organização política, descentralizada e flexível. Um espaço planetário no qual atores sociais podem, de fato, ter liberdade de expressão, e não estar submetidos às mesmas correlações de forças a que sempre foram expostos. Para ele, “as novas ágoras on-line permitem que novos modos de interação e de deliberação política venham à luz” (LÉVY, 2005, p.371), internautas se libertam de velhos suportes (imprensa, rádio e TV), e rompem “trancas de acesso à esfera pública”.

Este último estágio de “planetarização”, de emergência de uma “sociedademundo plural”(MORIN, 2000, p.350) se manifesta, principalmente, na proliferação das comunidades virtuais e emergência de um net-cidadão, aquele mais ativo socialmente que quebrou barreiras políticas, culturais, lingüísticas etc. Apesar de reconhecer as barreiras do analfabetismo digital, a concentração/fusão de grandes gigantes midiáticos, Lévy (2005, p.375) considera que a inclusão, a universalidade e a transparência viabilizadas pela web estão gerando, por exemplo, “novas formas de governança”, com novos níveis de hierarquização, fluxos de informação e mobilidade. A popularização de governos eletrônicos (e-govermen12, no qual pode-se acompanhar, via Internet, as ações dos governos) representaria uma revolução cultural com vistas de corrigir assimetrias.

Se o ambiente pós-midiático postulado por autores como Brea (opcit, 2002) é caracterizado por um panorama aberto, sem hierarquias e descentralizado, em que as atuações dificilmente podem ser classificadas conforme os objetivos de organização de consensos reguladores da esfera midiática atual, reorganizando radicalmente o mapa das mídias, parece oportuno lembrar como essas preposições reverberam na maior economia do planeta, os Estados Unidos13. Lévy (2005, p.380) classifica a democracia eletrônica americana como uma das mais eficazes no sentido de ajudar a de disseminar um net-cidadão que pressiona e interpela seus representantes políticos.

Comunidades de base online, ou netroots, operam como resistências eletrônicas, que usam a rede como meio de difusão das atividades que se realizam dentro e fora dela. Andy Carvin (2007,

12 Onze anos atrás, Squirra escreveu artigo destacando justamente a iniciativa do governo estadudinense no sentido de abrir seu orçamento online, em 1993, antes mesmo do que se convencionou chamar da era da internet comercial (1995), período de penetração e maturação no mercado 13Segundo relatório da Pew Internet and American Life Project, divulgado em junho de 2007, 71% de todos os americanos adultos tinham acesso à Internet em casa e quase 50% tinham banda larga. A grande maioria das escolas públicas também está on-line. 24% dos usuários da Internet participam de redes sociais e um terço já fez downloadde vídeos (CARVIN, 2007, p.4-5)

Estratégias de Propaganda Política: reflexões sobre eleições brasileiras

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18

p.5), responsável pelo blog learning.now, de combate à exclusão digital, pontua como redes socais, blogs e discussões on-line vêm modificando, particularmente, a arena política americana. Ele cita dois casos emblemáticos.

O primeiro é o de Howard Dean, atual presidente do Partido Democrata, mas que, em 2004, era apenas um ex-governador de um pequeno estado sem visibilidade na disputada cena política americana. Foi ele quem enxergou, pela primeira vez em larga escala, as infinitivas táticas de marketing político na web: criou listas, blogs, encontros ao vivo pela net, comunidades voluntárias de arrecadação para doações de campanha. Seu obscurantismo foi logo substituído por um estrondoso espaço midiático: arrecadando mais dinheiro que os então pré-candidatos à Casa Branca, se tornou mais presente na mídia, que até então considerava sua candidatura inviável. Ainda que tenha perdido a indicação do partido para John Kerry, “suas técnicas bem sucedidas de organização on-line ajudaram a desenvolver uma infra-estrutura de ativistas liberais online preparados para mobilização em torno de outras causas” (ibidem).

O segundo exemplo dado por Carvin no mesmo artigo publicado na Internet é o surgimento da MoveOn.org, que nasceu de uma grande lista de e-mails de uma empresa do vale do silício. A lista pedia que cidadãos pressionassem seus representantes locais, nacionais e federais a lutar pelo fim do impeachment de Bill Clinton. As mensagens foram passando para além de comunidades de São Francisco e a pequena lista de assinaturas on-line ganhou corpo para se tornar uma das organizações políticas mais eficientes na Internet, com mais três milhões de membros, com uma agenda de esquerda focada, em maior escala, para a oposição a ocupação americana no Iraque (ibidem) e a política externa americana.

Steve Clemons, diretor da New America Foundation -think tank 14

que financia uma variedade de pesquisas independentes na área de política externa, defesa e economia, com sede em Washingthon DC – acredita que somente a “web 2.0” pode ajudar a corrigir distorções construídas ao longo de 200 anos da democracia americana. Mark Dillens, correspondente da Foreign Policy Association, criada em Nova York para divulgar, nos Estados Unidos, agendas trans-fronteiriças, há quase um século, acredita que a desterritorialização de espaços e a experiência social de compartilhar um tempo, e não um lugar, estão criando um instrumento de participação política na Internet sem precedentes. Num mundo de cerca de seis bilhões de habitantes e 80 conglomerados midiáticos -que controlam a produção de conteúdos, muitas vezes consumidos uniformemente -impressiona a elevada multiplicação de organizações isoladas geograficamente, mas conectadas virtualmente em suas lutas ideológicas, que puderam se viabilizar fisicamente enquanto associações. A Grassroots Campaigns, Inc, voltada para o engajamento nas eleições, para criar plataformas políticas desenvolvidas por pequenas comunidades, aluga hoje um sala num dos bairros caros de São Francisco, graças a doações e uma grande mobilização via web, embora seja acusada de ser apenas um braço disfarçado Partido Democrata15

. Diversos autores têm abordado as postulações das utopias tecnológicas de igualdade,

diversidade, liberdade e inclusão. Como não é propósito do nosso trabalho discutir o espaço público na blogosfera, e o chamado jornalismo cívico, de cidadania, em profundidade, mas, apenas, recuperar brevemente deste debate, passamos agora a crítica mais contundente a relação da política com a Internet. Manuel Castells assinala visões mais equilibradas do que entusiasmadas sobre essa relação, e nos ajuda a atenuar os efeitos da ansiedade gerada pelas pesquisas feitas

14 Utilizo aqui a definição dada por Steve Clemons à Maria Cleidejane Esperidião: think tank sãoinstituições independentes e autônomas de governos, encarregadas de gerar pesquisas e conhecimento,contribuindo para a elaboração de políticas externas e internas 15

Os deepoimentos foram colhidos por Maria Cleidejane Esperidião, durante o período em que atuou como observadora

internacional nas prévias americanas, a convite do Departamento de Estado Americano, entre 22 de Janeiro e 14 de fevereiro de 2008.

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sobre o impacto e o futuro da Internet. Sejam elas eufóricas, exageradas ou conservadoras. Estamos, diz ele, diante de um fenômeno novo, e, desta forma, é prematuro elaborarmos análises muito fechadas, definitivas e conclusivas sobre um processo que, afinal, se encontra em andamento – daí gesta-se uma série de teorias conspiratórias e mitológicas sobre a rede (CASTELLS, 2005, p.256). Em suas observações feitas oito anos atrás, o pesquisador discute algumas lições/legados da rede, entre eles o entrelaçamento da sociabilidade na rede e seus impactos nos comportamentos sociais. A Internet se constituiu num lugar de sociabilidade real e as comunidades virtuais são bem sucedidas justamente quando são convocadas a “agir” em conjunto, em torno de um objetivo claro. Quando estão, por exemplo, ligadas a “tarefas” específicas, como arrecadar dinheiro, colher assinaturas, buscar apoio, enfim, “a fazer coisas” (CASTELLS, 2005, p.275). De acordo com o autor, cada vez mais:

(...) assistimos na sociedade, fora da Internet, a uma crise das organizações tradicionais estruturadas, consolidadas, tipo partidos, associações de orientação diretamente política...há na sociedade em geral um salto dos movimentos sociais organizados para os movimentos sociais em rede com base em coalizões que se constituem em torno de valores e projetos (CASTELLS, 2005, p.277)16

.

Sua crítica é mais dirigida ao tipo de net cidadania prometida por governos epartidos políticos, que confundiam a arena do ciberespaço como um “quadro de anúncios” para expor dados e estudar a audiência dos navegadores. Uma suposta “interação participativa” camufla, na verdade, uma “mão única” de interatividade, onde o cidadão tem nulo poder de decisão sobre políticas públicas17. Castells (2003, p.280) sentenciou o falso sentido que se produz com a idéia de que parlamentos e partidos, ao possuírem websites, criam um espaço de diálogo:

São vias, repito, unidirecionais de informação, para captar a opinião, simplesmente para converter os cidadãos em eleitores potenciais e para que os partidos obtenham informação para ajustar sua publicidade. Neste sentido, o problema não é a Internet, e sim o sistema político. É preciso mudar a política para mudar a Internet, e então, o uso político da Internet pode converter-se em uma mudança política em si mesma.

Castells defende uma mudança coletiva, e não somente no campo dos processos comunicacionais. Dessa forma, acredita o autor, as coisas passarão a ser mais justas e democráticas nestes processos. Porém, as novas tecnologias digitais já estão sendo utilizadas pela sociedade em prol de suas idéias, e tal retrato social só tende a aumentar. As redes ganham uma nova importância

Campanhas eleitorais adotam tradicionalmente outras plataformas multimídia, mas neste caso a intensidade destes recursos esteve presente na blogosfera, nos ambientes de rede relacionamento, como Facebook, My Space, e no Youtube, onde os usuários puderam assistir a

16

Este ano, os “panelaços” contra o governo argentino organizados por Ongs, sindicatos e oposição usaram a

tecnologia para atrair novos integrantes ao movimento: as mensagens chamando para a manifestação eram distribuídas por meio de celular e email. 16

Recentemente, a Câmara dos Lordes de Londres disponibilizou no YouTube suas sessões e incrementou um blog para atrair eleitores jovens, já que vem sendo criticada como uma casa excessivamente não democrática e cheia de privilégios. O mesmo fez o premiê britânico Gordon Brown, que enfrenta queda de popularidade e passou a ter um programa semanal no YouTube para responder perguntas. No natal de 2007, a rainha transmitiu sua mensagem tradicional via o mesmo site.

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estes vídeos de forma intensa, além de multiplicar a divulgação dos mesmos através de seus blogs pessoais, tendo em vista que o YouTube oferece essa possibilidade. De acordo com Tricas, Merelo-Guervós & Ruiz (2006, p.51), “a Internet cresce muito depressa e o número de endereços também. Muitas pessoas estão dando conta de que os endereços os permitem publicar na Internet de uma forma muito simples, e estão aproveitando-se para diversas coisas”. Neste caso, a utilização foi no campo da política.

A utilização do YouTube, por sua vez, é intensificada pela praticidade do processo de produção e postagem. Um vídeo produzido para a Internet não requer qualidade avançada de captação de imagens, pois a exibição do mesmo em si já é limitada. A postagem também é simples e o ambiente é considerado hoje um forte concorrente da televisão convencional pela oferta de vídeos on demand, produzidos pelos grupos sociais que se relacionam virtualmente. Com isso, Obama conseguiu combater os possíveis interesses contrários da mídia por sua vitória nas prévias, pois o poder de comunicação por parte dos grupos sociais fica intenso a partir do YouTube e da web 2.0, definida por Fumero (2007, p.10) como a Internet “convertida em um espaço social, com acomodação para todos os agentes sociais, capaz de dar suporte e formar marte de uma verdadeira sociedade da informação, a comunicação e o conhecimento”. Tal ambiente, quando pensada no YouTube, é definida por Renó (2007)18:

Através do YouTube, os grupos sociais passaram a difundir suas idéias, crenças e costumes. E, através deste espaço ciberespacial, pode-se construir um hibridismo cultural capaz, inclusive, de combater a homogeneidade provocada pelos interesses neoliberais, presentes nos produtos da indústria cultural, criticada pela escola de Frankfurt exatamente por seus efeitos.

Tais mudanças sofridas pelos meios comunicacionais com relação ao YouTube e aos grupos de redes sociais apontadas pelo autor compartilham com as idéias de Rodriguez (2008)19, para quem:

Definitivamente, estamos diante de um contexto de mudanças vertiginoso, provocado pelo impacto das novas tecnologias da comunicação e da informação, no qual tem se pretendido examinar mediante a este estudo, abrindo uma possível linha de análise e investigação em torno desta nova dimensão da comunicação que está se arbitrando, caracterizada pelas mudanças no universo midiático, como a integração das diversas formas comunicativas e a evolução dos mecanismos comunicativos, junto com a aparição de outros desenvolvidos especificamente na Internet, e os fluxos comunicativos, basicamente novos, gerados por estes, fortemente inter-relacionados e associados com as características da comunicação na rede.

A autora justifica, a partir deste estudo, as mudanças que a sociedade tem vivido desde a chegada da web 2.0. Tal justificativa fortalece a decisão de Obama em apoiar sua campanha para além mar no que tange os meios de comunicação, adotando a blogosfera e as redes de relacionamento para divulgar suas idéias políticas e ideológicas. O candidato ainda aproveita a Internet para abrir canal de doações de campanha, facilitando ainda mais o contato com o eleitor, agora “sócio virtual” direto no resultado das eleições.

No primeiro semestre de 2008, o YouTube divulgou quatro momentos-chave da campanha. Barack Obama teve que se explicar e fez um discurso histórico sobre raça e identidade, depois que

18 Disponível em http://www.ull.es/publicaciones/latina/200717Denis_Reno.htm. Acessado em22/06/2008.18

19 Disponível em http://www.ull.es/publicaciones/latina/_2008/20_27_virtual/Francisco_Mateos.html. Acessado em 22/06/2008.

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um vídeo do pastor da sua ex-igreja bateu recorde de acesso na web. Nas imagens do sermão, Jeremiah Wright dizia que os EUA foram castigados nos atentados de 11 de setembro pela política externa e intena. Em outro momento, os estrategistas de Obama enviaram às redações emails pedindo desculpas por causa de outro religioso ligado ao candidato que sugeria que Hillary fingia chorar e não aceitava a existência de um negro como seu concorrente. Os “marketeiros” de Hillary, por sua vez, tiveram que conter outra repercussão fomentada pelo YouTube: a ex-primeira dama tinha mentido que, em 1996, havia desembarcado na Bósnia sob intenso bombardeio. As imagens de oito anos atrás registradas por um amador mostravam a visita do então presidente Bill Clinton com Hillary, sem que nenhuma tensão tivesse ocorrido. No início da campanha, Hillary sustentava que Obama não tinha experiência política para enfrentar grandes ameaças globais, como o terrorismo e a política externa. As gafes disseminadas pelo ex-presidente Bill Clinton durante a campanha também viraram febre no site. Do lado republicano, John McCain e Mitt Romney tiveram que se explicar por posições adotadas no passado, que vieram à tona em vídeos caseiros postadas no YouTube. A CNN vira televisão multimídia

Outro traço marcante no ciclo eleitoral de 2008 foi a transformação da cobertura jornalística comandada pelo canal a cabo CNN, criada no início dos anos 80 e que se tornou a verdadeira TV de alcance internacional. A primeira mudança foi a associação com YouTube e Google, para promover debates transmitidos online, com participação de internautas ao vivo. Num deles, era possível inclusive votar se a resposta do candidato parecia ou não verdadeira ou mesmo testar a popularidade da resposta. Durante as primárias, via-se uma quantidade superior de informações na tela, dando conta de dados extras dos resultados da eleição, enquanto o apresentador transmitia o resultado, ao vivo. Telas de tv se pareciam com telas de computador, cheias de textos, fotografias, sinais, até áudio sem vídeo. Como Amanda Lotz (2007) escreveu em obra extremamente atual, a TV pós-internet, ao menos nos Estados Unidos, passa por uma revolução e reflete toda a remediação relaborada pelas novas mídias.

Na página da CNN também se encontram podcasts e i-reports, conteúdos gerados por usuários durante toda a cobertura. As eleições parlamentares de 2006 já sinalizaram o que a campanha 2008 parece ter consolidado e mudado radicalmente o jeito de fazer política. Os pré-candidatos perderam total controle sobre suas imagens e discursos, com a popularização dos sites de compartilhamento de mídia como o Flick e YouTube. Em 2006, 40 milhões de americanos publicaram algum tipo de conteúdo na web, “enquanto um, entre sete usuários de internet, mantinha um blogue”, diz Andy Carvin (2007, p.5). Dois anos atrás, o episódio mais marcante foi a denúncia que partiu de um cabo eleitoral do senador Jim Webb, que seguia os passos do candidato adversário, George Allen. Irritado, Webb acusou o jovem eleitor de jogar sujo e chegou a chamá-lo de macaco por sua origem indiana. Depois de postado no You Tube, o candidato que usou o tom depreciativo foi acusado de racista. “Não se pode afirmar que a repercussão no YouTube e, depois, nas mídias tradicionais, foi o estopim da derrota dele, mas certamente o episódio contribuiu para pensar a nova forma de fazer campanha”, diz David Mark, editor do site político.com, que, junto com real.clear politics.com e o huffington post se tornaram um dos mais acessados no processo eleitoral de 2008, desbancando, em alguns casos, a mídia tradicional, como o New York Times e o Washington Post20

.

20 Em entrevista à Maria Cleidejane Esperidião em 24/01/2008.

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Conclusões

As novas tecnologias digitais alteraram substancialmente as formas comunicacionais, tanto no âmbito particular como no coletivo. Aliás, tais distinções merecem inclusive um questionamento, sobre o que é particular e o que é coletivo, pois os ambientes particulares, como a blogosfera (CEREZO, 2006), agora podem ser considerados essencialmente coletivos, quando acessados na rede ou pertencentes a redes de grupos sociais. Tais efeitos foram consideravelmente aproveitados pelo candidato Barack Obama na pré-campanha presidencial em 2008, nos Estados Unidos, e isso pode ter feito a diferença. Os ambientes comunicacionais seguem uma característica presente na sociedade atualmente: a multimídia, que tem provocado uma crescente intertextualidade nos processos de comunicação, fazendo com que a navegabilidade e a participação sejam ao menos fomentadas, alcançando, assim, as expectativas destes grupos. Obama adotou, de forma profunda, os ambientes multimídia em sua campanha. Através disso, apoiou-se no marketing viral, ou seja, a partir destas tecnologias seus eleitores passaram a divulgar as suas idéias entre os participantes de suas redes sociais particulares, podendo adotar como recursos um pacote intertextual formado por textos, fotos, fragmentos de áudio, vídeos e a participação. Ainda dessa forma, tornou-se limitado o acesso às idéias de Obama através dos vídeos postados no YouTube, gratuitamente. As novas tecnologias têm simplificado os processos comunicacionais de forma que agora a sociedade torna-se facilmente agente emissor, ou multiplicador. Dessa forma, conceitos como aldeia global e indústria cultural precisam de uma revisão, ou ao menos re-significação com relação aos seus papéis. Por outro lado, estes grupos precisam aproveitar estas ferramentas para que desta forma fortaleçam a difusão de suas idéias e reivindicações coletivas no que tange política pública e desenvolvimento social, especialmente.

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Revista Veja: ascensão e queda de uma pré-candidata

Camila JIMENEZ

Caroline MENDES Caroline RIZZI

Fernanda OLIVA Mônica SEIXAS

Tatiane PANTALEÃO Ticiane MOTTA

Katy NASSAR

Resumo

Este artigo tem como tema a pré-candidatura de Roseana Sarney à sucessão presidencial de 2002

e procura entender como se deu a construção da imagem da ex-governadora do Maranhão por parte da

mídia, assim como a sua desconstrução após o escândalo na empresa Lunus Serviços e Participações, da

qual a candidata era sócia junto com Jorge Murad, seu marido. Foram encontrados na empresa documentos

que faziam alusão a fraudes dentro da Sudam (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia). Para

isso utilizamos como referencial teórico o conceito de marketing político e a hipótese da agenda-setting de

McCombs e Shaw. Utilizamos como objeto de estudo a revista Veja, com base na técnica a Análise de

conteúdo.

Introdução

O presente artigo tem como referencial de pesquisa a pré-candidatura de Roseana Sarney nas

eleições presidenciais de 2002. O surgimento do nome de Roseana na disputa presidencial e a grande

visibilidade que recebeu da mídia a levaram ao segundo lugar nas intenções de votos. Após o escândalo na

empresa Lunus Serviços e Participações, da qual era sócia de seu cônjuge, Jorge Murad, a imagem se torna

negativa e inicia o processo de queda na popularidade da pré-candidata culminando na desistência de

concorrer as eleições presidenciais.

O tema foi escolhido pelo interesse em estudar as formas de construção e desconstrução da

imagem pública e entender o papel da mídia nesses dois processos. Por Roseana Sarney ter chegado ao

segundo lugar nas pesquisas de intenção de votos, buscamos entender quais foram as estratégias de

marketing político utilizadas, de que forma o escândalo arranhou sua imagem e como a mídia estudada

trabalhou a ascensão e a queda da ex-governadora do Maranhão.

A importância do tema se dá por tratar da construção da imagem feita pelo semanário. Esta qualificação de construção e projeção de imagens na esfera pública coloca a mídia como umas das principais estratégias de uma campanha política. Ao estudar o caso Roseana, identificamos a força da mídia na política nacional.

Este trabalho tem como objetivo principal analisar a influência da revista Veja na construção positiva e negativa da imagem da pré-candidata. De maneira a estudar sua trajetória política e, posteriormente, os fatos que levaram Roseana a desistir da disputa pela presidência, ambos

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relacionados na referente mídia. Utilizamos como metodologia a análise de conteúdo tendo como referencial teórico o conceito de marketing político e a hipótese do agenda-setting.

Metodologia

Para a elaboração deste artigo, utilizaremos como base metodológica a técnica de análise

de conteúdo, que de acordo com Laurence Bardin, trata-se de um:

Conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por

procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das

mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de

conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas)

destas mensagens. (BARDIN,1977, p.42)

Para a produção deste artigo, foram analisadas a totalidade de 22 matérias referentes ao tema, publicadas de fevereiro de 2000 até maio de 2002, no semanário Veja.

O primeiro passo foi a organização do material extraído da revista Veja em dois grupos: “Ascensão”, que abordavam assuntos relacionados a pré-candidatura de Roseana Sarney à Presidência do Brasil e sua forte presença política e “Queda”, que tratou da desistência de Roseana à Presidência do Brasil e os motivos pelo qual a candidata abdicou da concorrência Presidencial.

No primeiro capítulo produzido, de tema “Ascensão”, foram estudadas 10 matérias, publicadas de fevereiro de 2000 a janeiro de 2002.

Em base na metodologia escolhida, análise de conteúdo, foram categorizadas adjetivações positivas encontradas no texto, e posteriormente, realizada a divisão em subcategorias por assunto: família, marketing político, governo e sexo feminino.

Para o capítulo “Queda”, foram analisadas as produções da revista Veja de fevereiro a maio de 2002, em um total de 12 matérias.

Foram categorizadas adjetivações negativas, que contribuiram para denegrir a popularidade de Roseana e em seguida subcategorizadas em : “O Marido”, “O estado” e “A família”.

Referências teóricas 1.1 - Agenda-Setting

Usamos como embasamento teórico a hipótese da agenda-setting, que trata da influência

midiática na opinião pública e desenvolvida por McCombs e Shaw em 1970. Em definição: “É a hipótese segundo a qual a mídia, pela seleção, disposição e incidência de suas notícias, vem determinar os temas sobre os quais o público falará e discutirá" (Barros Filho, 2001, p. 169).

De acordo com este conceito, a mídia ao escolher determinados assuntos a outros ou a hierarquização desses temas, cria uma falsa realidade. No caso de uma cobertura eleitoral ela não vai influenciar diretamente o voto, mas o debate. Os pesquisadores conseguiram encontrar uma forte correlação na hierarquia temática da imprensa com a hierarquia temática dos votantes.

A mídia se pauta em determinados acontecimentos, que constroem ou destroem a imagem pública do candidato, influenciando os eleitores a discutir sobre aquele determinado fato. No presente artigo, vemos como a mídia pautou os eleitores na construção da pré-candidatura de

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Roseana, e após o escândalo na empresa Lunus, de propriedade da candidata, os pautou na queda.

1.2 - Marketing Político

Barel (2007, p. 205) define o marketing profissional no Brasil como instrumento de captação

de votos recente, (p.205). Voltado para moldar o comportamento de políticos, o marketing surge para dar veracidade as ações de possíveis candidatos a ocuparem cargos públicos. De acordo com Queiroz (2005, p. 24).

O marketing político configura-se como uma atividade multidisciplinar. Ele tem

interfaces com a administração, quando procura sistematizar e hierarquizar

procedimentos a serem adotados por candidatos e/ou partidos (como definição

de uma agenda política pessoal ou a arrecadação de fundos para uma

campanha eleitoral); com a psicologia, quando adota a persuasão como

estratégia de comunicação (transformando candidatos sisudos em sorridentes,

dogmáticos em populares, tristonhos em enfáticos); com a própria dimensão

política, quando alinha candidatos e partidos em determinadas dimensões

ideológicas (tendo que mostrar como candidatos socialistas, liberais ou social-

democratas resolverão os problemas de emprego, educação ou saúde); e, por

fim com a publicidade eleitoral, que envolve a comunicação em diferentes

veículos (tendo que mostrar conteúdos simbólicos, slogans, jingles e discursos

que funcionam como marcas registradas de uma candidatura).

Como foi o caso da pré-candidata Roseana Sarney. Em sua campanha publicitária elaborada pelo publicitário Nizan Guanaes, segundo Queiroz (2005, p. 104).

Roseana aparece como uma candidata forte, sorridente, diferente de todos os

outros candidatos, até pelo fato de ser mulher. Seu slogan refletia o

direcionamento da campanha: “Me chamo Ana, Juliana, Roseana, eu sou

mulher.”

Criou-se assim, durante quatro meses, uma imagem vazia de conteúdo. Em momento algum foram colocadas propostas em debate ou o ponto de vista dela ou de seu partido com relação aos graves problemas pelo Brasil. Ela era “mulher”. A mulher jovem, bonita e bem-sucedida. A mulher “representante ideal de todas as mulheres” e, por extensão, de todo o povo brasileiro.

De acordo com teoria da agenda-setting, os meios de comunicação de massa pautaram a

“agenda” das pessoas, construindo a imagem positiva de Roseana como a candidata ideal, depois do escândalo da Lunus, a mídia reportou uma nova imagem de Roseana, cujo caráter se tornou duvidoso. Queiroz (2005, p.106) afirma que “a imprensa seguiu seus preceitos da propaganda ideológica, tornando visível, construindo e, simultaneamente, destruindo, um mito em construção”.

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Desenvolvimento 2 - Ascensão

Em fevereiro de 2000 surgiu o nome de Roseana Sarney para sucessão presidencial. A partir de então, a possível candidata do PFL (Partido da Frente Liberal) começou a crescer nas pesquisas de intenção de voto, superando candidatos como Anthony Garotinho, Ciro Gomes, José Serra e até Luís Inácio Lula da Silva. As pesquisas foram realizadas pelo Datafolha, Ibope, Instituto Sensus e Vox Populli. A revista Veja, mídia estudada neste artigo publicou, no período de 02 de fevereiro de 2000 a 06 de março de 2002, 10 matérias destacando a força da pré-candidata em relação a seus supostos opositores.

Analisamos estas matérias a fim de entender como o semanário estudado colaborou na ascensão da candidata. Para isso subdivide-se esta categoria em outras quatro: família, marketing, governo e sexo feminino. Estes tópicos foram utilizados pela revista para a construção da imagem da pré - candidata a sucessão.

2.1 - Família

A revista utilizou na construção da imagem de Roseana o fato dela ser herdeira de uma das

famílias de maior tradição política no Maranhão, além de seu pai já ter sido presidente da república. Notamos isso quando o semanário refere-se à pré-candidata como “filha do ex-presidente”, ao invés de como Roseana ou candidata. O pai da candidata é citado 31 vezes nas 10 matérias analisadas. A herança política conta como um ponto positivo na campanha: “Roseana sempre respirou política. Quando ela nasceu, Sarney era deputado estadual. Ainda criança foi morar com a família no Palácio dos Leões, a sede do governo estadual.”( http://veja.abril.com.br/020200/p_038.html ). Seu tataravô foi deputado estadual. Seus bisavós, deputados federais”.

Roseana cresceu em um ambiente político. O início de sua vida política é relacionada ao seu pai 3 vezes. As reportagens trazem o histórico de sua família e de seu ingresso na vida pública.

Em Brasília, Roseana concluiu o curso de ciências sociais e fascinou-se pelo

Congresso Nacional, onde fazia pesquisas acadêmicas. Gostou do clima, das

conversas, das articulações. Nessa época, começou a pensar seriamente em

seguir a carreira política. Esteve muito próxima ao pai, no período em que José

Sarney exerceu a Presidência, de 1985 a 1990, e foi do Palácio do Planalto que

saltou para seu vôo-solo na vida pública.

(http://veja.abril.com.br/141101/p_036.html)

Percebemos, então, que o fato de Roseana fazer parte de uma família de tradição política, foi explorado pela revista de maneira positiva para a construção da imagem da pré-candidata. Quando se referia à família Sarney, era sempre de maneira positiva: “a família Sarney domina a política maranhense há 35 anos. E trabalha em sintonia. (http://veja.abril.com.br/141101/p_036.html).” No que diz respeito a dinheiro, o clã dos Sarney sabe trabalhar”. (http://veja.abril.com.br/141101/p_036.html)

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2.2 - Marketing

A revista aponta o trabalho de marketing desenvolvido como um fator positivo em sua ascensão.

Segundo a revista a exposição de Roseana na mídia serviu para que os eleitores a conhecessem:

É claro que o salto de Roseana se deve a sua superexposição televisiva nas últimas semanas, mas nem por isso seu crescimento pode ser visto como uma bolha que estoura logo adiante. Mostra que parte do eleitorado, ao conhecê-la e ouvi-la, demonstra simpatia. (http://veja.abril.com.br/050901/p_096.html)

O semanário utilizou de 5 reportagens falando somente do trabalho de marketing investido em Roseana pelo seu partido e o vê de maneira positiva como se nota em títulos e linhas finas: ”A nova campeã de audiência” (http://veja.abril.com.br/141101/p_036.html). “Com um marketing imbatível, Roseana Sarney sobe nas pesquisas sem prometer nada. Bastou explorar sua fina estampa.” (http://veja.abril.com.br/141101/p_036.html) 2.3 - Governo

A maneira como Roseana governou o estado do Maranhão, também foi vista com bons olhos pela revista Veja. As bem feitorias de seu governo foram citadas 14 vezes pela revista que afirma que a pré-candidata vinha fazendo um bom serviço em um dos estados mais miseráveis do país:

Nesse ambiente ocorreram avanços inegáveis nos últimos quatro anos. A taxa

de analfabetismo entre crianças caiu de 41% para 30%. A mortalidade foi

reduzida em 30%. O bom desempenho foi premiado. Foi por conquistas assim

que Roseana acabou escolhida a governadora mais popular do país, com 68%

de aprovação em seu Estado. Quando anda pelas ruas de São Luís, recebe

aplausos e acenos. Como se fosse um ídolo da música popular, dá autógrafos,

recebe pedidos e canta músicas em praça pública. Nas viagens ao interior, faz

reuniões em que qualquer um pode levantar e reclamar ou fazer pedidos.

(http://veja.abril.com.br/020200/p_038.html)

A revista mostra que Roseana estaria fazendo um bom trabalho em seu estado, uma das

maneiras foi mostrar a aprovação de seu governo no estado do Maranhão.

Governa com uma rede de apoio que beira a unanimidade. Dos 217 prefeitos

maranhenses, tem o apoio de 210. Dos 42 deputados estaduais, sua base tem

37. Ela não permite emendas a sua proposta de orçamento. Em sete anos, só

duas foram aprovadas, e só porque corrigiam erros grosseiros. Num deles,

previa-se o desembolso de 25 milhões de reais para uma estatal, a Maranhão

Investimentos, que nem existia mais. Em 1998, ano eleitoral, os deputados se

rebelaram e apresentaram 800 emendas.

(http://veja.abril.com.br/141101/p_036.html)

Essa forma como enfatiza o bom governo da pré-candidata, nos mostra a imagem positiva que a revista faz da pré-candidata.

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2.4 - Sexo Feminino

Ser do sexo feminino foi uma característica que a revista usou muito em favor de Roseana. Na primeira matéria publicada cotando a ex-governadora do Maranhão como possível candidata, a Veja já fala positivamente da entrada de uma mulher na política:

Roseana tem hoje índices que variam entre 8% e 9% das intenções de voto para presidente – um patamar acima dos candidatos tucanos. Eleições presidenciais se decidem bem mais tarde no calendário eleitoral, mas o fenômeno da valorização feminina na disputa já merece registro. É a primeira vez na história republicana que uma mulher surge com chances de disputar para valer uma eleição ao mais alto cargo do país. (http://veja.abril.com.br/020200/p_038.html)

Nas demais matérias continuam as referências positivas ao fato da pré-candidata ser

mulher, essas referências são mencionadas 12 vezes nas matérias. A revista considerou a candidatura de uma mulher um grande avanço para a política Nacional

É um avanço incontestável para um país no qual as mulheres conquistaram tarde o direito de voto e sempre foram minoria no parlamento e em postos executivos. (http://veja.abril.com.br/020200/p_038.html)

Percebemos que ao destacar estas categorias e utilizar de adjetivos como fenômeno, ciclone, e outros sinônimos, citados por 33 vezes durante as matérias, a revista colaborou na construção da imagem da pré-candidata até o momento em que um escândalo, envolvendo a empresa em que era sócia com seu marido Jorge Murad vem à tona e essa situação se inverte.

3 - Queda

No dia 1 de março de 2002, a crescente porcentagem de intenções de votos da pré-candidata Roseana Sarney, freou bruscamente. Em uma invasão à sede da empresa Lunus Serviços e Participações, a polícia federal encontrou em cofres a quantia de 1,34 milhões reais em dinheiro, dando fim ao sonho do PFL de chegar à presidência da república.

De forma quase que instantânea, o veículo deixou de propagar uma imagem positiva da pré-candidata e passou a divulgar uma Roseana completamente diferente da mulher forte e decidida que governava com louvor o estado do maranhão. . Daí em diante Roseana passou a ser tratada pela revista de três formas: como governadora de um estado miserável e atrasado, como pertencente da família Sarney e esposa de Jorge Murad.

3.1 - O estado

Antes mesmo de estourar o escândalo envolvendo o casal Roseana Sarney e Jorge Murad, a revista Veja já dava indícios de que Roseana já deixara de ser bem vista pelo veículo. Na edição 1740, do dia 27 de fevereiro de 2002, a revista publicou uma matéria “O fantasma do Maranhão”, com três páginas, para expor estatísticas do estado governado por Roseana. “Roseana quer defender os índices socioeconômicos de sua gestão. Mas, em alguns caso , é impossível”.(http://veja.abril.com.br/270202/p_028.html)

Esta abertura do texto é apenas uma pequena demonstração de um texto que desfaz toda a imagem que a revista tinha ajudado a construir da filha de José Sarney até então. Na mesma edição

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a revista mostra dados que comprovam a falta de crescimento no estado

[...] o Maranhão é um dos estados mais pobres de toda a federação. Se fosse

um País teria um índice de desenvolvimento humano(IDH) parecido com o do

Congo. Separado do Brasil seria o país mais miserável da América Latina. (

http://veja.abril.com.br/270202/p_028.html )

Na legenda de duas fotos, uma de Roseana e outra de uma favela, a revista veja utilizou a seguinte legenda: ”Roseana e uma Favela maranhense: na economia fracasso, fracassos retumbantes”. Com isso o periódico contradiz tudo o que foi dito sobre o governo Sarney. 3.2 - A família

Junto com a imagem de boa governadora a Veja também atingiu a imagem da família Sarney. O

mesmo sobrenome que foi responsável por comparações benéficas à governadora passou a ser usado de

modo pejorativo pelo veículo. Em decorrência disso, de repente o país se deu conta de que os Sarney eram

uma oligarquia no Maranhão, palavra escolhida pela revista para tratar os Sarneys, veja alguns trechos da

Matéria “O Fantasma do Maranhão”:

“Afinal, Sarney reina há quarenta anos sobre uma paisagem deplorável de miséria, com taxas horas haitianas, hora africanas[...] os Sarney são o que poderiam chamar de um oligarquia moderna”. (http://veja.abril.com.br/270202/p_028.html)

Foi uma transformação de opiniões e posições da imprensa e do público, Roseana era, até então, um fenômeno para a Revista e como reflexo, a pré-candidata era também bem vista pela a grande massa. Mas de um momento para o outro, a coisa mudou de figura para ambos os lados.

A própria revista admite a influência que a mídia exerce sobre a população ao explicar a popularidade da governadora do maranhão e sua família em seu estado apesar dos índices do seu governo.

Os Sarney são donos do principal jornal, da principal rádio e da principal emissora de televisão – veículos que, naturalmente, não costumam ampliar críticas à administração de Roseana e estão agora a serviço da propaganda da representante da jovens oligarquia . Isso ajuda a explicar porque Roseana tem apoio de 88% dos maranhense e é a governadora mais popular do país. (http://veja.abril.com.br/270202/p_028.html)

Nas 12 matérias analisadas 45vezes foram feitas relações entre a candidata e o histórico

de sua família, uma média de mais de 3 vezes por matéria. Para justificar o constante recurso de demonstrar a necessidade de expor tanto o sobrenome Sarney a revista indaga:

“A tentativa da governadora de isolar-se dessa herança é inútil. Se o longo domínio dos Sarney tivesse feito do Maranhão uma vitrine nacional, alguém acredita que Roseana não estaria agora capitalizando as conquistas?” ( http://veja.abril.com.br/270202/p_028.html )

3.3 - O marido

Mas definitivamente o cônjuge, Jorge Murad, foi a maior arma usada para derrubar a possibilidade da candidatura de Roseana. Nas 12 matérias que a Veja publicou envolvendo a candidata Roseana Sarney entre 27 de fevereiro a 01de maio de 2002, o nome de Jorge Murad

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aparece 134 vezes, 44 a mais que o da esposa. No texto “O fantasma do Maranhão”, o primeiro da fase nesse artigo considerado como a

queda da candidata, a revista demarca a participação do Marido de Roseana Jorge Murad no seu governo:

Seu Marido, Jorge Murad, é o todo poderoso do governo. Cuida de economia, ciência e tecnologia, turismo e agricultura. Estão sob o seu comando 40% do orçamento do estado, e é Murad quem dá a última palavra sobre ao outros 60%. ( http://veja.abril.com.br/270202/p_028.html )

As reportagens que seguiram, abordaram a descoberta do dinheiro não explicado na empresa Lunus juntamente com documentos que dão a entender que a empresa tem alguma relação com fraudes no Sudam (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia). A Roseana e o marido eram sócios da Lunus, Murad administrava.

Naquele momento a já ex-governadora do Maranhão, que abriu mão do cargo para a candidatura a presidência, tinha 23% das intenções de votos e já estava tecnicamente empatada com o líder nas pesquisas Luis Inácio Lula da Silva. Mas, a partir daquele momento a imagem favorável que o periódico publicou em sua páginas no período de quatro meses – 05 de setembro de 2001 a 30 de janeiro de 2002 - deu lugar à especulações sobre a vida política da candidata e de seu cônjuge, e o caso Lunus se tornou assunto de de interesse público do país.

No dia 6 de março, a edição 1741 da Veja noticiou a invasão da Polícia Federal na sede da Lunus e a descoberta da alta quantia de dinheiro e documentos que comprovam a sociedade da Lunus em uma empresa fraudadora da Sudam. Nesse momento Roseana já havia ganhado uma outra visão na imprensa, o nome do marido passou a ser mais repetido que o dela.

Frases de forte efeito foram repetidas pela revista entre elas: “fraude na Sudam” ou sinônimos que apareceram 53 vezes nos doze textos analisados perdendo apenas em citações ao nome do marido Jorge Murad e o da própria Roseana.

No dia 13 de março, a edição 1742 da revista Veja publicou quatro matérias sobre o “escândalo da Lunus”, como intitulou o caso do dinheiro encontrado na empresa de Jorge Murad, e também sobre o histórico político do cônjuge de Roseana e da Família Sarney. O titulo “A família de 125 milhões... e um genro” já revela muito sobre seu conteúdo.

“Na bibliografia de Murad, não existe condenação nem acusações comprovadas, mas seu nome quase sempre aparece nas bordas de negócios nebulosos,” (http://veja.abril.com.br/130302/p_046.html), cita a revista. Na mesma edição outra matéria intitulada “A candidata que afundou” já demonstrava a queda da ex- governadora do Maranhão nas intenções de votos. Comprovando a teoria da Agenda Setting, os brasileiros discutiam o caso Lunus e repetiam as informações adquiridas nos meios de comunicação.

A Agenda Setting, embora não admita que a mídia forme opinião, ressalta a importância da imprensa em pautar o que vai ser discutido pelo público no momento. E naquele momento, o país debatia nas ruas a decepção ao descobrir que uma mulher forte como Roseana Sarney que segundo a grande imprensa tinha vencido inúmeros problemas de saúde que tinha vencido o preconceito até mesmo dentro da sua família, que era sinônimo de popularidade e confiança, era na verdade uma mulher sem personalidade, influenciada pelo marido e que agora estava sob suspeita de corrupção.

“Roseana Convenceu o PFL a sair do governo. Agora, precisa convencer o eleitor de que nada tem a ver com as fraudes da Sudam.” (http://veja.abril.com.br/130302/p_036.html)

A matéria da edição 1742 de 13 de março de 2002, demonstra a queda da candidata: “25% dos eleitores diziam na última semana de fevereiro que votariam em Roseana. 20% dos eleitores ouvidos semana passada disseram que votariam em Roseana”.

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(http://veja.abril.com.br/130302/p_036.html) Mais uma vez o veículo admite sua influência sobre o público e faz discursos abertos como:

“A reação do país foi imediata e fraturou a candidatura da ex-governadora, já que vinha afundando desde a publicação da foto dos maços de 50 reais apreendidos no escritório da Lunus”. (http://veja.abril.com.br/170402/p_034.html)

A explosão do caso Lunus, evidentemente, comprometeu a imagem da ex-governadora do Maranhão diante da opinião pública, levando-a a renuncia. As possíveis transgressões financeiras de Roseana colocou em dúvida sua credibilidade política. O país passou a desconfiar de sua capacidade de governar.

Em abril Roseana cedeu a pressão e comunicou ao PFL que estava fora da corrida presidencial.

Conclusão

A desconstrução da imagem de Roseana Sarney mostrou a influência das mídias, como a revista Veja, de interferir nos rumos da política em nosso país. Mesmo que este periódico não detenha o maior poder entre meios de comunicação, e não interfira na opinião se detiver a informação somente em suas páginas, é evidente que a sociedade, hoje, se pauta nas informações, também, adquiridas nesta revista, por ser uma das revistas de maior circulação dentro do país.

A cobertura conferida pela revista Veja, influenciou não apenas na ascensão de Roseana Sarney, dentro desta mídia, levando-a ao segundo lugar entre as intenções de votos, mas também em sua queda.

Tantas qualidades apontadas pela mídia, fizeram-se entender que Roseana poderia vir a fazer parte de uma mudança tão esperada no cenário político nacional. A mostra persistente da imagem de Roseana, pela mídia estudada e outras, contribuiu para o marketing pessoal da candidata, que por sua vez ofereceu dados para aumentar as especulações positivas sobre sua candidatura.

De tanto que subiu os degraus nas pesquisas de intenções de votos, caiu de forma drástica quando estourou o escândalo envolvendo a empresa de seu cônjuge Jorge Murad, que era também sócia.

A superexposição, anteriormente usada a seu favor, deu lugar a informações sobre o envolvimento da empresa em fraudes ligadas a Sudam (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia). Assim manchando a imagem de Roseana perante a sociedade e ao cargo presidencial que poderia vir a ocupar.

O semanário Veja, por sua vez, utilizando de pesquisas jornalísticas preencheu suas páginas com informações sobre a denúncia. Cumprindo seu papel de meio informativo, levou ao conhecimento dos leitores o atual momento político que a candidata se encontrava, caindo nas pesquisas de votos e tentando defender sua empresa para a Polícia Federal.

Esse acontecimento, por sua vez, marcou o fim de uma candidatura. Os fatos não provados, até o momento atual, congelaram a ascensão de Roseana Sarney, levando o seu partido a desistir da candidata por se tratar de um acontecimento que desestruturou o suporte, tão cuidadosamente montado, para sua eleição.

Não há o que impeça a imprensa de selecionar informações e repassa-las, se tratando de informações relacionadas ao interesse público. Mesmo que a revista Veja tenha grande circulação no país e colabore para formar a opinião de seus leitores mais assíduos, o fato aconteceu e a forma que foi retratado pelas mídias não se afastou da superexposição dada desde o início. Portanto a partir do momento em que a candidata e seu partido tiveram livre acesso as páginas desta revista, com matérias que ressaltavam as qualidades da candidata, também abriu espaço para que a mídia retratasse o escândalo que abalou a credibilidade de Roseana.

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Mesmo que o escândalo não tenha se confirmado, pois não encontraram provas suficientes para incriminá-los, naquele momento era indispensável que essas informações ganhassem o conhecimento público. Se a imprensa tem a função ética de se pautar nos interesses da sociedade fora necessário para que criassem sua opinião sobre este fato, munidas de aspectos positivos e negativos de um candidato.

Se esse processo construiu uma imagem negativa de Roseana, ou se a revista utilizou de adjetivos que buscavam essa reação é certo que o entendimento desta informação pertence apenas ao leitor e não à revista. A partir do momento em que a mídia transmite uma notícia pode até esperar uma reação óbvia, mas não terá certeza dela, pois o poder de entendimento esta nas mãos de quem constrói a imprensa: a sociedade.

Referências BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa:Edições 70, 1977.223p. BARROS-FILHO, Clóvis de. Ética e Comunicação. São Paulo: Editora Summus, 2003. 237p. COLTRO, ALEX & COLTRO,DEBORAH F.P. Trabalhos acadêmicos e científicos : Construindo inteligentemente. São Paulo: Conhecimento & Sabedoria Ltda,2005. 64p. QUEIROZ, Adolpho (org.). Marketing Político Brasileiro Ensino, Pesquisa e Mídia. Piracicaba, SP: Edição do coordenador, 2005.180p. QUEIROZ, Adolpho (org.); MANHANELLI, Carlos; BAREl & Moisés Stefano. Marketing Político do comício à internet. São Paulo: ABCOP – Associação Brasileira de consultores Políticos, 2007.215p. Veja. O olhar feminino na política. São Paulo: Abril. no 1 634, fev.2000. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/020200/cartaleitor.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------ Candidata nova sobrenome velho. São Paulo: Abril. no 1 634, fev.2000. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/020200/p_038.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------ Surgiu mais um: Com superexposição na TV, Roseana dá salto nas pesquisas. São Paulo: Abril. no 1 716, set.2001. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/050901/p_096.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------ Tudo por Roseana: PFL aposta as fichas na governadora e a fará estrela de uma campanha publicitária digna de cervejaria São Paulo: Abril,no 1 717, set.2001. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/120901/p_046.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ Outro degrau acima: entusiasmada com as pesquisas, a cúpula do PFL reforça a “operação Roseana”. São Paulo: Abril, no 1 720, out.2001. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/031001/p_119.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------ A dama da sucessão. São Paulo: Abril, no 1 726, nov.2001. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/141101/p_036.html>. Acesso em: 03 abr.2008.

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------ Chegando perto: cada partido governista fala em lançar seu próprio candidato, mas só Roseana cresce. São Paulo: Abril, no 1 731, dez.2001. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/191201/p_046.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------ O alvo é Roseana. São Paulo: Abril, no 1 735, jan.2002. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/230102/p_032.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ O azarão está no páreo. São Paulo: Abril, no 1 736, jan.2002. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/300102/p_026.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------ O fantasma do Maranhão. São Paulo: Abril, no 1 740, fev.2002. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/270202/p_028.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------O inimigo de cada um. São Paulo: Abril, no 1 741,mar.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/060302/p_038.html >. Acesso em: 03 abr.2008. ------ A candidata afundou. São Paulo: Abril, no 1 742, mar.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/130302/p_036.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ O novo show do milhão. São Paulo: Abril, no 1 742, mar.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/130302/p_042.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ A família de 125 milhões de reais...e um genro. São Paulo: Abril, no 1 742, mar.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/130302/p_046.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ A fraude está até na placa. São Paulo: Abril, no 1 742, mar.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/130302/p_052.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ A sétima mentira sobre o dinheiro. São Paulo: Abril, no 1 742, mar.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/200302/p_044.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ O ocaso das oligarquias. São Paulo: Abril, no 1 743, mar.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/200302/cartaleitor.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ Exagerado no ataque,fraco na defesa. São Paulo: Abril, no 1 744, mar. 2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/270302/p_040.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ A candidata que virou pó. São Paulo: Abril, no 1 747, abr.2002. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/170402/p_034.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------ Estranheza secreta. São Paulo: Abril, no 1 749, abr.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/010502/p_046.html>. Acesso em: 03 abr.2008. ------A mesma motivação de sempre. São Paulo: Abril, no 1 751, mai.2002. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/150502/cartaleitor.html>. Acesso em: 03 abr.2008.

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Um lugar de construção do “mudancismo”:

Fernando Henrique Cardoso na Folha de S. Paulo

Roberto Gondo MACEDO1

Wanderson Fábio de MELO2

Resumo

Esta comunicação pretende discutir as posições de Fernando Henrique Cardoso expressas em

sua coluna no jornal Folha de S. Paulo, durante o ano de 1984, especificamente o período em que

segue a derrota da emenda pelas diretas no Congresso Nacional até a eleição de Tancredo Neves no

Colégio Eleitoral, momento significativo da transição democrática brasileira. Descreve a importância

dessa manifestação para a consolidação da redemocratização brasileira no início dos anos 80 e o

desenvolvimento democrático ocorrido após esse período propiciando que a comunicação política se

desenvolvesse de modo a tornar-se referência no modelo de planejamento de campanhas eleitorais

proporcionais e majoritárias, bem como a construção de imagem pública e governamental, onde se

destaca também o modelo estrutural eleitoral brasileiro e as técnicas de propaganda política para os

atores públicos.

Palavras-chave: Comunicação Política, Fernando Henrique Cardoso, Mudancismo, Folha de São Paulo Introdução

No início de 1983, o jovem deputado Dante de Oliveira (PMDB-MT) apresentou a Emenda Constitucional defendendo a eleição presidencial direta. A partir do mês de maio daquele ano as forças de oposição à ditadura militar passaram a expressar a necessidade de campanhas de mobilizações e, com isso, iniciou-se o movimento pelas “Eleições Diretas”.

A campanha pelo sufrágio universal possibilitou a união das oposições, uma vez que a questão não era saber qual grupo convocaria as manifestações, mas sim se em nome da democracia e contra a ditadura. Desse modo, tornou-se possível a adesão de diferentes forças políticas. Em outubro, o movimento ganhou o apoio dos governadores eleitos em 1982 pelo PMDB (Partido da Mobilização Democrática Brasileira), o partido da oposição legal.

O objetivo da campanha era a aprovação da “Emenda Dante de Oliveira” no Congresso Nacional. As mobilizações se espalham pelo Brasil, a idéia de votar para presidente ganhou força e apoio da sociedade civil. Multidões tomaram as ruas das principais cidades em manifestações gigantescas. No entanto, a Ementa Constitucional não foi aprovada pelo Congresso. Contudo, a campanha desgastou as forças políticas que apoiavam o governo militar desde o golpe de estado em

1 Doutorando em Comunicação Social, docente nos programas Lato Sensu de Comunicação e Administração da Universidade Metodista de São Paulo e Universidade Presbiteriana Mackenzie, graduação na Faculdade de Mauá – FAMA e CEETEPS, Mestre em Administração Pública pela USCS e Diretor Editorial POLITICOM. 2 Doutor em História pela Pontífica Universidade Católica de São Paulo – PUC, Mestre em História e docente da Universidade Federal Fluminense - UFF.

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1964 e, sobretudo, impôs uma nova configuração política. Na visão de Fernando Henrique Cardoso, o movimento pelo direito ao voto resultou no

desgastes das forças que apoiavam o “regime burocrático autoritário”, de modo a isolar socialmente os agentes políticos das forças no poder desde 1964. Concomitantemente, devido a campanha estar focada na aprovação de uma emenda constitucional, fortaleceu a oposição institucional que ocupava espaços nas estruturas políticas da Câmara, do Senado e em diversos executivos estaduais, sobretudo em São Paulo sob a direção de André Franco Montoro.

Analisar os artigos do senador Fernando Henrique Cardoso permite perceber o percurso político da oposição ulterior à Campanha pelas Diretas, sua interpretação do “mudancismo” e a singularidade da transição política brasileira.

No momento da campanha pelas Diretas-já, Cardoso ocupava a presidência do PMDB paulista, publicava uma coluna semanal na Folha de S. Paulo e exercia o mandato de senador pelo Estado de São Paulo.

A despeito das mobilizações por todo o país3, a emenda constitucional foi derrotada na Câmara dos Deputados, embora tenha conquistado a maioria, visto que foram 298 votos favoráveis, 65 contra, 3 abstenções e 113 deputados ausentes. Mas, faltaram 22 votos para atingir os 320 exigidos para alterar o texto constitucional.

Contudo, após a derrota da emenda no Congresso Nacional, Cardoso defendeu a transformação do movimento “Diretas Já!” em “Mudança Já!”, ou seja, ele apregoou o fortalecimento político do grupo de oposição constituído a partir do Congresso e dos governos. Dessa forma, Cardoso atuou na articulação de uma candidatura de oposição para a disputa no Colégio Eleitoral.

Neste trabalho, pretende-se analisar as ações de Cardoso a partir da perspectiva histórica, ou seja, seguindo o historiador Eric Hobsbawm, “o ofício do historiador é lembrar aquilo que os outros esquecem” e seu objetivo “é compreender por que as coisas deram no que deram e como elas se relacionam entre si” (HOBSBAWM, 1994:13).

Cardoso foi um intelectual que militou na oposição à ditadura militar, elaborou uma obra teórica sobre aquele período, defendeu a campanha popular pelas Diretas já e, depois, o entendimento político via Colégio Eleitoral, ao redor do nome de Tancredo Neves.

As indagações desta comunicação são: primeiro, como Cardoso relacionou a atuação como político de oposição e o trabalho de colunista na imprensa? Segundo, como o resultado da campanha das “Diretas Já!” e a disputa no Colégio Eleitoral influenciaram o tipo de transição política que o país vivenciou?

Cabe também descrever como esse período foi colaborativo para o desenvolvimento de uma nova visão da comunicação política, bem como a propaganda e imagem pública, pois com a redemocratização brasileira, a cada processo eleitoral, as agremiações partidárias, atores sociais e políticos desenvolviam novas formas de comunicação e difusão dos feitos políticos.

Essa evolução veio aliada a tecnologia, principalmente na implantação do modelo até hoje vigente de votação eletrônica, cujo modelo de dados e eficácia operacional serve de exemplo para outras nações do mundo. A cada dois anos delegações de diversas partes do planeta acompanham as eleições brasileiras para observar o modelo implantado de dados que origina-se da logística das urnas até a apuração dos votos.

As fontes utilizadas para esta reflexão foram os artigos de Cardoso que saiam semanalmente na grande imprensa, mais especificamente, na Folha de S. Paulo.

3 Sobre as principais mobilizações pelas Eleições Diretas Já, considerando o público presente, tevem-se: em 27/11/1983, em São Paulo – 15.000 pessoas; 12/01/1984: em Curitiba-PR – 30.000; 25/01/1984: São Paulo, SP – 250.000; 24/02/1984: Belo Horizonte, MG – 300.000; 10/04/1984: Rio de Janeiro,RJ – 1000.000; 16/04/1984: São Paulo, SP – 1500.000; 26/06/1984: São Paulo, SP – 50.000, e 27/06/1984: Rio de Janeiro, RJ – 30.000. Cf. RODRIGUES, 2003: 105-107.

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Fernando Henrique Cardoso: a construção do “mudancismo”

Em março de 1984 ocorreu a votação da Emenda Dante de Oliveira na Câmara Federal. As oposições verificavam a tensão. O general Figueiredo, após inúmeras declarações dúbias, apregoava a desaprovação das eleições diretas para o próximo presidente, contrariando a vontade popular. A campanha pelo voto ganhara as ruas das principais cidades do país.

Em um artigo na Folha de S. Paulo, Cardoso expressou a sua visão sobre aquele momento: “continuo a fazer e a dizer que a imensa maioria dos brasileiros diz e só não fazem quando não podem: a trabalhar para que ocorra, de fato, um avanço democrático. Este avanço democrático se baseia na mobilização popular pelas diretas e requer a aprovação da Emenda Dante de Oliveira. No “day after” esperamos comemorar a vitória. Se não, há novas bandeiras e emendas a favor das diretas e há que estar afinado, principalmente, com a reação da opinião pública que indicar quais os caminhos para prosseguir na luta pela democratização.” (CARDOSO, 1984a: 2)

Notamos que Cardoso divulgou a sua posição em favor do “avanço democrático” entendendo

que se realizaria a partir da pressão popular. Contudo, percebemos que a escrita do senador por São Paulo assumiu o debate tácito com uma outra posição no meio oposicionista, isto é, reiterar o seu compromisso com a campanha pelo direito ao voto e propõe a continuidade das mobilizações no caso da derrota da Emenda de Dante de Oliveira.

Posicionando-se assim, Fernando Henrique Cardoso respondia ao jornalista Ricardo Noblat, na época no Jornal do Brasil, que divulgara em um artigo a conformação da negociação política envolvendo setores governistas e oposicionista representados no Congresso, acerca da busca de alternativa política fora da continuidade das mobilizações, com a confirmação da derrota da emenda propondo “eleições diretas”.

Doravante a derrota da emenda, percebeu-se a fratura no bloco da oposição. Por um lado, os que propunham a elaboração de um novo texto apontando a eleições diretas, e, por outro, os defendiam aproveitar o desgaste político das forças “autoritárias” por meio de uma candidatura respaldada no Colégio Eleitoral. Os grupos que apoiavam a primeira diretiva argumentavam a continuidade dos comitês pró-diretas, durante os meses de abril e maio, este grupo foi representado por Ulisses Guimarães, Lula, Quércia e Brizola. Contudo, os grupos que apontavam na direção do Colégio Eleitoral defendiam a possibilidade da vitória das forças de oposição mesmo interior de uma estrutura “autoritária”, ao mesmo tempo, revelavam o perigo da continuidade do regime. Esse grupo foi representado pelos governadores André Franco Montoro e Tancredo Neves, além do senador Fernando Henrique Cardoso e do deputado Fernando Lyra.

Em um discurso no senado, publicado na Folha, logo após a derrota das diretas, Cardoso proclamou: “O Congresso Nacional é o espaço de disputa. Existem duas forças, os mudancistas e os contra-mudança/.../. Os mudancistas querem as eleições/.../. Os contramudancistas estão isolados.” (CARDOSO 1984b: 7)

O próprio Fernando Henrique Cardoso elegeu esse discurso com sendo o marco na mudança da campanha “Diretas-já!”, para “Mudança-já!”. Eis a instauração da proposta mudancista. Ou seja, a construção de uma candidatura no colégio Eleitoral como continuidade das lutas pelas “diretas”4.

Defendendo a sua posição de participação no Colégio Eleitoral, Cardoso argumentou e um artigo: “Quero deixar claro meu ponto de vista, sei, como todo mortal sei que existe um emenda no congresso e que esta se não aprovarmos as diretas-já deixara as oposições na difícil contingência de votar o menos ruim: eleições indiretas agora e direta em 88 ou indiretas sempre como reza a

4 Uma análise da posição de Cardoso sobre “diretas” ver MELO, 2007.

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Constituição atual.” (CARDOSO, 1984c: 2)

Notamos o esforço de Cardoso na conscientização dos desafios em participar do processo eletivo. Assim, a posição mudança venceu no interior do PMDB e, por conseguinte, fortaleceu a posição dos políticos inseridos na institucionalidade, ao passo que enfraqueceu o grupo histórico liderado por Ulysses Guimarães.

O senador por São Paulo focava as suas análises políticas no movimento da correlação de forças sociais, sobretudo as expressas na política institucional, pois

Mas tampouco cabe a política de Avestruz, fingindo que as forças reais não existem. Algumas delas – as negativas – puseram as mangas de fora. Maluf, Médici e Golbery formam o centro do arco reacionário. Tentarão bloquear qualquer mudança inconstitucional. O governo por sua parte divide-se em dois setores: um mais aberto às mudanças, mas não se sabe até que ponto, capitaneado por Leitão de Abreu e Marchezan e outro enigmático, que inclui (e isto é preocupante) o presidente da República e ancora mais abertamente no General Medeiros e nos generais desconfiados da liberalização proposta por Leitão. Andreazza expressa o vazio político dos interesses burocráticos-empresariais dos beneficiários do regime, mas não tem gás para definir estratégias próprias. Entre o PDS e as oposições – já firmemente no solo do mudancismo – situam-se os parlamentares do grupo pró-diretas e o aurelianismo. Não terão, talvez força para definir rumo autônomo, mas são essenciais em qualquer rearticulação do tabuleiro. Qualquer saída do imobilismo, do ângulo das oposições, passa por duas pré-condições: mobilização popular para forçar mudanças (com o objetivo das diretas já como ponto de união) e a convergência de interesses de arco oposicionista. Neste sentido, a proposta Montoro da semana passada foi um passo adiante: candidato único e competitivo das oposições, eleições diretas (apesar das interpretações noutra direção feitas pelos que desejam complicar o panorama) e programa comum para dar substância as mudanças.” (CARDOSO, 1984d: 2)

Na citação acima, observamos que Cardoso apontou os diferentes grupos com expressão

social no período. O descarte de Maluf devia-se pelo fato de estar respaldado no bloco militar. Importante observar que Paulo Maluf, mesmo civil, naquele momento representava a continuidade do “regime militar”, daí o senador por São Paulo relacioná-lo aos militares impopulares no período. Emílio Garrastazu Médici, chefe no executivo no período violento do “regime”, e Golbery do Couto e Silva, tido como um dos teóricos do “autoritarismo” brasileiro.

No estudo das forças do governo, o autor verificou a fragmentação. Por um lado, o ex-chefe da casa civil do governo, Leitão de Abreu, e o presidente da Câmara dos Deputados, Nelson Marchezan, que formavam um grupo no interior do governo crítico a várias ações de João Batista Figueiredo, pois desejavam uma solução civil; mas, diferente de Maluf. Cardoso entendia esse grupo próximo do mudancismo, ou que aceitaria o resultado de uma disputa do processo de escolha para o poder executivo, pois argumentavam a liberalização do “regime”.

Por outro, o bloco linha-dura, isto é, os militares conservadores que recusavam a liberalização do sistema. Ao contrário, falavam mesmo em continuidade do general Figueiredo no executivo pelo uso da força. Esse grupo foi liderado pelo general Medeiros, presidente da Usina Binacional e Itaipu.

O bloco dos setores estatais agrupavam-se ao redor de Mário Andreazza, que tentava viabilizar o seu nome na disputa no colégio eleitoral como representante do governo. Tinha ao seu lado os representantes do capital estatal e alguns governadores.

Ainda nas forças governista, o colunista da Folha explicitou os “mudancistas”. No momento da campanha pelas diretas ocorreu o desligamento de vários políticos com a base de Figueiredo. Na

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Câmara e no Senado formaram grupos que aderiram a emenda Dante de Oliveira e foram chamados de “pró-Diretas”. Destacaram-se os senadores Marco Maciel e Jorge Bornhausen, além do vice-presidente da República Aureliano Chaves. Eles formaram o núcleo dirigente dos “desgarrados do regime”, que depois se tornaria o segundo principal partido da Aliança Democrática.

Por fim, o senador por São Paulo completa a sua proposição de mudancismo, seguindo o governador Franco Montoro, “um candidato competitivo”, o governador mineiro Tancredo Neves. Nesse sentido, Cardoso passou a articular com um novo grupo no interior do PMDB, deixando o bloco liderado por Ulysses Guimarães.

Fernando Henrique Cardoso em seu método de análise, verificada em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo, professou o politicismo na identificação do determinante da correlação de forças sociais dos grupos e as composições sociopolíticas.

Assim, no processo de abertura política ulterior a derrota da emenda Dante de Oliveira, para Cardoso, “Impõe-se, portanto, dinamizar o campo das alianças entre os mudancistas”, desse modo, notamos o esforço do senador, por meio da imprensa, em construir a imagem política “mudancismo” versus “continuísmo”.

Ao analisar os desafios da democratização institucional, Cardoso considerou:

Agora, quando o jogo está quase feito, deu frenesi nalguns pedessistas. Uns correm parapedir que o General Figueiredo, depois de frustrado em duas tentativas de unificar o PDS, reassuma as rédeas da sucessão. Outros ficam no “Maluf é imbatível” (desde que conte com compreensão presidencial para o uso da máquina e do erário...) Outros ainda, os mais lúcidos e os arrependidos, buscam aliar-se às oposições. Por trás deste Zigue-zague estão à fragilidade das instituições políticas e a heterogeneidade da sociedade. Os liberais-conservadores do PDS não tiveram força para coibir os continuistas do regime. Os liberais-democratas das oposições somados aos democrataspopulares dos vários partidos, tampouco conseguiram sozinhos, saltar o rubicão dos dois terços para mudar as regras do jogo. Só as alianças entre estes três setores parecem ter forças para isolar o Continuísmo (com a Cara de Maluf ou Andreazza) e a realizar as mudanças a que o país aspira.” (CARDOSO 1984e: 2)

Percebemos que a análise de Cardoso identificou a crise no partido dirigente como condicionante da formação do bloco mudancista. Haja vista que, falhara a proposta de Jarbas Passarinho no sentido de unificar as forças governistas, inviabilizada até mesmo pela indecisão de Figueiredo. Falhara a proposição do deputado Flavio Marcílio em unificar o partido em torno de Maluf. Ao passo que, o bloco do mudancismo realizou a composição de somatória de forças envolvendo: liberais conservadores anti-malufistas (José Sarney, Marco Maciel e Bornhausen), liberais-democratas e democratas populares situados no PMDB e nos partidos de oposição. Explicita-se, desse modo, a análise cardosiana de politicismo com alianças.

Realizada a eleição via Colégio Eleitoral, tem-se a confirmação da vitória da política de alianças. Tancredo Neves é eleito em 15 de janeiro de 1985, com a votação de 480, contra 180 de Paulo Maluf.

Comunicação política no cenário atual

Esse fato representa um marco histórico na evolução da dinâmica política brasileira, pois com a vitória de Tancredo Neves, mesmo não conseguindo assumir definitivamente a presidência por ocasião de seu falecimento, o Brasil viveu e vive um ambiente de democracia e liberdade de imprensa e dos direitos políticos e civis.

O país nessas últimas duas décadas acompanhou a evolução dos meios midiáticos e da

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integração com o ambiente de campanha política eleitoral e pós-eleitoral, bem como a dinâmica eleitoral que evolui a cada anos, seja no aspecto impresso, como no eletrônico.

Isso contribui de forma representativa para o surgimento de um novo modelo de comunicação política nacional, como profissionalismo, liberdade de expressão e organização nos pleitos eletivos, fomentando a excelência no desempenho das tarefas de construção e manutenção da imagem pública governamental.

Segundo Queiroz (2005), “sempre dentro do processo de aprendizado sobre a importância dos conceitos correlacionados com as atividades de propaganda política, é preciso distinguir ações distintas neste campo, que, emergem do conceito de marketing político e se espraiam por outros conceitos complementares e importantes, como os de propaganda ideológica, publicidade eleitoral e imagem pública”.

A luta pela liberdade de expressão política do movimento diretas foi de fundamental importância

para o surgimento de agremiações partidárias que se encontram fortalecidas até os dias atuais, como o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e por intermédio de eleições diretas alteram o poder federal nos últimos 16 anos, considerando o final do mandato atual que possui término em 2010, dois pleitos eletivos com o próprio Fernando Henrique Cardoso (PSDB – 1994-2002) e dois pleitos eletivos para Luis Inácio Lula da Silva (PT – 2002-2010), agremiações essas que atualmente convivem em discursos antagônicos, porém muitos de seus idealizadores estiveram juntos pela mesma causa no movimento a favor da redemocratização brasileira.

[...] a comunicação política vai além da comunicação governamental, comunicação eleitoral ou marketing político. por outro lado, a comunicação pública se articula com a comunicação política na esfera pública, como local de interação social de todos os agentes e interesses envolvidos. nesta esfera, transitam os recursos humanos (cidadãos, políticos e eleitores), físicos (suporte de comunicação massiva, tecnologias interativas e convergentes), econômicos (capital, ativos em geral), comunicacionais (discursos, debates, diálogos estruturados dentro e fora das mídias massivas e recursos interativos). (MATOS, 2006).

Com um andamento dinâmico a comunicação política brasileira tende a se desenvolver cada

vez mais no aspecto profissional e de forma gradativa continuará despontando como um modelo eficaz de estrutura democrática, cabe aos atores políticos eleitos a cada pleito corroborarem para o crescimento de uma imagem positiva e sustentável da democracia brasileira, sem escândalos de corrupção e má administração pública.

Considerações finais

Diante do exposto, podemos afirmar que Cardoso atuou como colunista objetivando relacionar a sua imagem de intelectual e político no desvendamento das forças sociais envolvidas no processo político brasileiro do período de abertura.

A visão de Cardoso sobre o processo de redemocratização no Brasil foi a de que esta se desenvolveu a partir de conquista e concessão com negociações protagonizadas por executivos estaduais respaldados na mobilização popular, aproveitando, ainda, as divisões nas forças políticas que sustentaram o que nomeou de “regime autoritário”.

Outrossim, Fernando Henrique Cardoso expressou em sua práxis o politicismo com alianças tendo como referência o campo institucional. Sua contribuição foi relevante no campo do desenvolvimento democrático brasileiro, unidos a outros atores políticos de diversos setores da

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sociedade que unidos fomentaram a mudança de regime político e fixaram novos parâmetros democráticos nacionais.

Referências

CARDOSO, F. H. “Fato e versão”, in. Folha de S. Paulo, 29 de março de 1984a.

______________. “Pronunciamento de Fernando Henrique Cardoso”, in. Folha de S.Paulo, abril, 1984b.

______________. “Impasse e mobilização”, in. Folha de S. Paulo, 10 de maio de 1984c.

.______________. “A estratégia das oposições”,in. Folha de S. Paulo, 17 de maio de 1984d.

.______________. “A transição necessária”, in. Folha de S. Paulo, 19 de junho de 1984e.

QUEIROZ, A. C. F. Marketing Político Brasileiro: Ensino, Pesquisa e Mídia. Piracicaba: Intercom,

2005.

RODRIGUES, A. T. Diretas já: o grito preso na garganta. São Paulo: Perseu Abramo,2003.

MATOS, H. G. de. Comunicação Política e Comunicação Pública. Revista Organicom.ECA/USP. São

Paulo. Ano 3, n04, 2006.

MELO, W. F. “Roberto Campos e Fernando Henrique Cardoso: visões sobre a campanhadas Diretas

já!” Anpuh Nacional, Unisinos. São Leopoldo RS: Oikos, 2007.

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Imprensa e internet: a miopia do TSE

Mauricio Guindani ROMANINI1 Resumo

O paper visa ampliar o debate sobre as temáticas do marketing político e internet e sobre

imprensa e legislação. Particularmente, pela falta de lei eleitoral específica, no tocante a questão da

rede mundial de computadores. De outro lado, pela confusão interpretativa, por parte de juízes,

sobre a legislação da propaganda política.

Palavras-chaves: internet, marketing político e legislação Introdução

Agora, em 2008, faz 10 anos que a internet passou integrar as ações de marketing político

no Brasil. Os envolvidos e interessados nesse campo de estudos, timidamente, começam a descobrir e utilizar o palanque digital.

Muitos pontos, idéias e conceitos apresentados à opinião pública, acadêmicos e profissionais da área, jornalistas, publicitários e marqueteiros soam controversos, utópicos e pouco práticos.

Os órgãos fiscalizadores não acompanham os avanços tecnológicos na área comunicacional. Os novos meios de comunicação, por exemplo, a internet já é um veículo que forma e transforma as relações sociais e continuará a sê-lo nos próximos anos.

Para o jornalista, publicitário e marqueteiro, Adolpho Queiroz2, a internet conseguirá de maneira natural ganhar seu espaço, “o desenvolvimento das campanhas vai mostrar que, de forma natural e serena, a internet vai sobrepor-se a Justiça sem maiores problemas”, diz

No entanto, por outro lado, é necessário fazer a regulamentação do uso da internet no que tange a política. O órgão máximo da Justiça Eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), não definiu, ainda, uma legislação em torno da internet.

Alguns juízes defendem uma regulamentação específica para a internet, como é o caso do Dr. Wander Pereira Rossette Junior, Juiz de Direito, da 93°Zona Eleitoral de Piracicaba3

, “Acho

necessário uma regulamentação específica, ou seja, que contemple somente a internet”, diz. As perguntas são: nada pode, ou tudo pode na internet? Não é concessão pública, portanto, pode ou não pode ser controlada pelo TSE? A intenção é mapear, restringir ou vigiar portais de internet, blogs, comunidades no Orkut etc, por parte do TSE? O TSE quer impor limites a liberdade de imprensa, liberdade de manifestação e do direito de informar? Isso vale também para a imprensa. São regras que privilegiam quem concorre a reeleição? Esse estudo pretende ampliar o debate em torno das temáticas acima, além disso, traçar um panorama da questão: marketing político e internet. Utilizamos como metodologia, a pesquisa exploratória. Dentro da pesquisa social, o estudo exploratório, segundo Gil (1987), tem a

1 Jornalista, Mestre em Comunicação Social, Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé/MG 2 Entrevista concedida ao autor por e-mail, em 13/8/2008. 3 Entrevista concedida ao autor no dia 30/7/2008, no Fórum de Piracicaba.

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finalidade de desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias. Alguns dizem que o jogo eleitoral no Brasil começa muito cedo. A bem da verdade, o Pais

começa a respirar o ar eleitoral no mínimo, um ano antes do pleito. Políticos, partidos, marqueteiros e a mídia esboçam os primeiros movimentos no tabuleiro das eleições para ganhar terreno. A Justiça se esforça para acompanhá-los.

2. A questão da igualdade é utopia, pois o processo político, com raras exceções, é desigual.

Promotores, juízes entre outros gostam de falar de igualdade entre candidatos, mas a legislação eleitoral não é desigual?

Por que a Lei não garante tempos iguais para os candidatos? Ora, nenhum partido é igual ao outro. A concessão do tempo do programa eleitoral é distribuída conforme a freqüência de acordo com a representatividade dos partidos.

A Lei Eleitoral é analisada por vieses diferentes e restritivas, não considerando os anseios da coletividade e nem os interesses jornalísticos. Não é o espaço apropriado para debater, o que no jargão da imprensa convencionou-se chamar de: igreja (área editorial) e estado (área comercial), mas sim para garantir o direito de informar.

A mídia tem regras, que muitas vezes são isonomicamente diferentes. Candidatos, dos partidos maiores, têm a preferência na pauta do interesse comum. Todo o imbróglio foi causado pelas matérias publicadas pela Folha de S. Paulo (FSP), no dia 4 de junho e “Veja São Paulo”, edição de 11 de junho, com a pré-candidata e, agora, candidata Marta Suplicy, do Partido dos Trabalhadores (PT).

As empresas que editam os veículos foram multadas, bem como a então précandidata, que pelo entendimento de um juiz auxiliar da 1º Zona Eleitoral de São Paulo, as entrevistas caracterizavam propaganda eleitoral extemporânea, ou seja, antes da data permitida.

Aqui, cabe uma questão: o que é igualdade? Entrevistar todos no mesmo dia? Fazer as mesmas perguntas para candidatos com propostas diferentes? As matérias, reportagens e entrevistas terão que ter o mesmo espaço? A política ficará acéfala e virará centímetro por coluna – e como se define o espaço publicitário na imprensa?

O atual ministro do TSE, Carlos Ayres Britto, no calor das discussões afirmou, em entrevista a FSP, que os órgãos da Justiça primem pela liberdade de informação e respeitem a Constituição.4

Antes disso, no mês de maio, a mesma FSP entrevistou outros políticos que expuseram suas idéias. Abaixo trechos da decisão a publicação de entrevista em mídia escrita poderia violar a igualdade entre os pré-candidatos, ao permitir que um deles expusesse, antes dos demais e fora do período permitido, sua pretensão de concorrer ao cargo, sua plataforma de governo, enaltecendo suas qualidades e realizações passadas, criticando as ações do atual governo e imputando qualidades desfavoráveis aos adversários. Inegável o interesse público se houver interesse da comunidade acerca do conjunto dos valores que lhe são mais caros. É, assim, inquestionável o Entretanto, a matéria exorbitou do mero interesse jornalístico, exercida a liberdade de informação de modo inadequado, a ponto de caracterizar propaganda eleitoral extemporânea‟5

.

O juiz citou a Lei nº 9.504/97, que permite a propaganda eleitoral somente após o dia 6 de

julho. A decisão é igual para ambas as empresas. No entanto, a interpretação da legislação eleitoral diz outra coisa. Como segue abaixo: Disposições Preliminares

4 AYRES Britto defende direito à informação. FSP, 18 jun. 2008. Brasil. p. A5. 5 www.folha.com.br/08169

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Art. 3º A propaganda eleitoral somente será permitida a partir de 6 de julho de 2008, vedado qualquer tipo de propaganda política paga no rádio ou na televisão (Lei nº 9.504/97, art. 36, caput e § 2º)6 Capítulo V -da Propaganda Eleitoral na Imprensa § 3º Não caracterizará propaganda eleitoral a divulgação de opinião favorável a candidato, a partido político ou a coligação pela imprensa escrita, desde que não seja matéria paga, mas os abusos e os excessos, assim como as demais formas de uso indevido do meio de comunicação, serão apurados e punidos nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/90.

Por não precisar de concessão pública, a imprensa não pode ou não deve ser enquadrada na Lei Eleitoral, ao contrário das rádios e televisões, que precisam respeitar a regra.

Além disso, jornais e revistas podem até, se desejarem, apoiar candidatos, partidos sem que isso sugestione propaganda eleitoral. Não se pode confundir propaganda político ou eleitoral com direito à informação.

Na visão de Queiroz, esse maior rigor do TSE poderá se traduzir numa apatia dos eleitores nas eleições de outubro, “a Justiça jogou pesado contra os candidatos, com cobranças maiores do que as já dimensionadas. O efeito desse novo legalismo poderá ser observado no dia 3 de outubro. Espero que o resultado não seja dado com abstenções, votos brancos e nulos”, pondera.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou, no dia 26 de junho, a proposta que altera norma para permitir a apresentação de propostas de candidatos e pré-candidatos em entrevistas, debates e encontros antes do dia 6 de julho de 2008, data prevista para o início da propaganda eleitoral.7

Com a mudança poderão também ser divulgadas as plataformas e projetos políticos dos candidatos, sem que isso seja caracterizado como propaganda eleitoral. O parecer do Ministro Carlos Ayres Britto, a ressalva de se conferir tratamento isonômico aos candidatos no rádio e na televisão decorre do caráter desses veículos de comunicação, que são permissionários de concessão pública:

Assim não se poderia dar tratamento preferencial ou diferenciado a um ou outro candidato, diferentemente do que ocorre em relação aos jornais impressos, que têm liberdade de opinião e podem expressar seu apoio preferencial a um ou outro candidato.

3. Na internet o marketing político carece de regulamentação viável e condizente com a

realidade social. A legislação é vaga e meramente normativa, ou seja, defini quando começa e quando termina.

As novas tecnologias de comunicação proporcionam oportunidades singulares para ajudar a superar desafios sociais, econômicos e, também, políticos. Sua vantagem é encurtar as distâncias e ajudar a equacionar a questão do tempo.

Como propõe Lévy (1995), a virtualização permite ao candidato ou partido tomar a tangente, recortar o espaço – tempo clássico apenas aqui e ali, escapando a seus lugares comuns. Podem assim, tornarem-se onipresentes, isto é, “aparecer” em qualquer lugar para todos.

O marketing político na internet, na verdade, é o presente e o futuro calcado na tríade: diversificação, interatividade e adequação ao público-alvo. A linguagem e ritos dependem do público, não apenas em conteúdo, mas de toda a construção da página, seu layout é muito importante.

6 www.tse.gov.br/internet/eleicoes/ 7 http://agencia.tse.gov.br

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Para Negroponte (1995, p. 67), “no mundo digital, o meio não é a mensagem: é uma das formas que ela assume. Uma mensagem pode apresentar vários formatos derivando automaticamente dos mesmos dados”.

Algumas dúvidas surgem, particularmente, quando o TSE tenta impor regras ou normas para a utilização da internet, como estratégia de marketing político. O TSE deve cumprir somente, é tão somente, seu papel fiscalizador, pois não há como controlar o fluxo informativo e propagandístico da rede mundial de computadores.

Para o Dr. Wander Pereira Rossetti Junior, Juiz de Direito, da 93°Zona Eleitoral de Piracicaba, é preciso uma regulamentação específica para a internet: Com relação a internet eu tenho um posição diferente de outros juízes, embora eu ache que a Lei não está censurando a liberdade de expressão. Na verdade, ela esta delimitando espaço, eu acho importante para equilibrar o jogo político, pois um candidato com poder econômico maior pode levar vantagem. Acho necessário uma outra regulamentação, específica, para a internet Além disso, o TSE não tem pessoal suficiente para acompanhar o marketing político na internet. Com as regras impostas a cobertura jornalística e a manifestação diferenciada dos políticos, essa ferramenta não agrega na campanha. A resolução nº 22.718 dispõe sobre a propaganda eleitoral e as condutas vedadas aos agentes públicos na campanha eleitoral de 2008. No artigo terceiro, parágrafo primeiro diz: § 1º Ao postulante a candidatura a cargo eletivo é permitida a realização, na quinzena anterior à escolha pelo partido político, de propaganda intrapartidária com vista à indicação de seu nome, inclusive mediante a afixação de faixas e cartazes em local próximo da convenção, com mensagem aos convencionais, vedado o uso de rádio, televisão, outdoor e Internet. (Lei nº 9.504/97, art. 36, § 1º). A mesma resolução, no artigo quarto, dispõe sobre a utilização da internet na campanha política: Art. 4º É vedada, desde 48 horas antes até 24 horas depois da eleição, a veiculação de qualquer propaganda política na Internet, no rádio ou na televisão – incluídos, entre outros, as rádios comunitárias e os canais de televisão que operam em UHF, VHF e por assinatura –, e, ainda, a realização de comícios ou reuniões públicas (Código Eleitoral, art. 240, p. único).

Ainda, mesma resolução, no capítulo cinco, dispõe sobre a propaganda eleitoral na internet: Capítulo IV -Da propaganda eleitoral na internet Art. 18. A propaganda eleitoral na Internet somente será permitida na página do candidato destinada exclusivamente à campanha eleitoral. Art. 19. Os candidatos poderão manter página na Internet com a terminação can.br, ou com outras terminações, como mecanismo de propaganda eleitoral até a antevéspera da eleição (Resolução nº 21.901, de 24.8.2004 e Resolução nº 22.460, de 26.10.2006). § 1º O candidato interessado deverá providenciar o cadastro do respectivo domínio no órgão gestor da Internet Brasil, responsável pela distribuição e pelo registro de domínios (www.registro.br), observando a seguinte especificação: http://www.nomedocandidatonumerodocandidato.can.br, em que nome do candidato deverá corresponder ao nome indicado para constar da urna eletrônica e número do candidato deverá corresponder ao número com o qual concorre. § 2º O registro do domínio de que trata este artigo somente poderá ser realizado após o efetivo requerimento do registro de candidatura perante a Justiça Eleitoral e será isento de taxa, ficando a cargo do candidato as despesas com criação, hospedagem e manutenção da página. § 3º Os domínios com a terminação can.br serão automaticamente cancelados após a votação em primeiro turno, salvo os pertinentes a candidatos que estejam concorrendo em segundo turno,

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que serão cancelados após esta votação.

Como respostas as perguntas feitas no início do trabalho, o TSE não pode e nem deve mapear, restringir ou vigiar portais de internet, blogs, comunidades no Orkut, e-mail, web TV, web rádio, páginas de notícias, etc, somente tem a obrigação de acatar e julgar eventuais reclamações de candidatos ou partidos que se sintam prejudicados.

Segundo o jornalista, publicitário e marqueteiro, Carlos Augusto Manhanelli8, o TSE quer mostrar poder e força, “a intenção é o TSE demonstrar que tem força e faz lei, na lacuna deixada pelo Legislativo. Na falta da Lei, resoluções tomam força de Lei”, diz.

A internet foi equiparada, pelo TSE, aos veículos que necessitam de concessão pública, mas ela não é uma concessão pública, dessa forma, os portais podem apoiar a candidatura que desejar.

A internet não é um espaço proibido nas eleições. O que falta é uma regulamentação. Por outro lado, não será o candidato ou o partido que montará uma rede de correligionários na internet, mas sim seus eleitores, simpatizantes e apoiadores, que orientados pelos marqueteiros poderão transformar-se em diferencial na disputa.

Segundo Queiroz, a Justiça deve rever, após a eleição de outubro, a questão da internet, “após o pleito a Justiça terá condições de refletir melhor sobre seus próprios gestos e rever as posições para as eleições de 2010, deixando o espaço da internet com mais liberdade de ação, até porque o custo é baixíssimo”, assegura.

Uma questão: um determinado texto jornalístico desfavorável a um candidato, por exemplo, poderá ser publicado num jornal impresso, mas não poderá ser reproduzido num blog. Ainda, se esse blog for da mesma empresa de comunicação que tem jornal, rádio, portal, revista, TV e rádio, aí pode ou não pode? Ninguém sabe, nem o TSE.

A internet é uma ferramenta-meio, mas não é um fim em si mesmo, ou seja, o perigo é sair do coronelismo tradicional, para entrar no coronelismo eletrônico. Portanto, é necessário destreza para não cair na armadilha da interatividade dirigida nos endereços eletrônicos de partidos e candidatos.

Para auxiliar o cidadão/eleitor vários sites trazem informações importantes sobre o passado e presente dos políticos. As Organizações Não-Governamentais (ONG`s), Transparência Brasil9, Voto Consciente10

e Constas Abertas11, por exemplo, mapearam perfis dos candidatos na

eleição de 2006. Além disso, tem o site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)12, Tribunal Regional Eleitoral

(TRE)13 e, agora, o Tribunal de Contas da União (TCU) que apresentam dados, estatísticas e

orientações. No caso do TCU14

foi elaborado uma lista com mais de 3 mil nomes de pessoas físicas,

8

Entrevista concedida ao autor, em 30/6/2008.

9 http://perfil.transparencia.org.br (Mostra o perfil dos candidatos a Deputado Federal de todo o País, com ficha pessoal, processos, notícias, patrimônio, atuação parlamentar e doadores da eleição de 2002) 10 http://www.votoconsciente.org.br (Dá conceitos e orientações gerais sobre política, avaliação dos Deputados Estaduais de São Paulo, dicas de cursos de formação política, fóruns e artigos. 11 http://contas abertas.uol.com.br/asp (Permite saber como governos fazem uso de recursos públicos, com dados orçamentários e fiscalização das contas públicas) 12 http://www.tse.gov.br (Contempla lista de candidatos, pesquisas, relação de contas julgadas irregulares, informações sobre gastos e doação de campanha) 13 http://tre-sp.gov.br (Lista os dados dos candidatos, partidos – e suas coligações, estatísticas, registro de pesquisas e orientações ao eleitor). 14 http://www.tcu.gov.br

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entre prefeitos, ex-prefeito, vice-prefeito e secretários estaduais e municipais, que – em tese, não podem se candidatar este ano, pois tiveram suas contas rejeitadas em última instância

A internet funciona assim: de início é uma comunidade ou nas palavras de McLuhan (1969) uma aldeia global, ou seja, são centenas e milhares pequenos grupos, como os citados acima.

Dessa forma, pode-se engajar nesses grupos – em um deles ou em todos, o critério organizacional dessas comunidades não é geográfico, mas baseia-se em áreas de interesse afins.

Segundo pesquisa do Ibope/NetRating15, no fim do primeiro trimestre de 2008, haviam aproximadamente 41,5 milhões de internautas. São brasileiros maiores de 16 anos, aptos a votar, que acessam a rede nas escolas, casas, trabalhos, locais públicos entre outros. Desse total, 23 milhões são internautas ativos.

4. O que pode e o que não pode no marketing político na internet, segundo o nosso

entendimento: 4.1. Site do candidato: pode ser criado uma página exclusiva para a campanha (.can) e, dentro dela, fazer uso dos recursos disponíveis. 4.2. Sites vinculados a grupos de mídia: não pode fazer propaganda. Pode divulgar opiniões. Não pode apoiar, criticar, declarar aopio e nem dar tratamento desigual aos candidatos 4.3. Publicidade Paga: não pode 4.4. Blogs vinculados a grupos de mídia: pode divulgar fatos e opiniões, desde que não caracterize propaganda. Não pode: apoiar, declarar voto, postar vídeos 4.5. Cabo eleitoral virtual: pode apoiar o candidato, mas somente, dentro da sua página oficial. O TSE não sabe se o eleitor pode criar um site, comunidade ou blog para o candidato. 4.6. E-mail e Spam: através do e-mail pode-se pedir voto. Já spam não é permitido. 4.7. Orkut: o TSE não sabe se pode ser usado 4.8. Chat: empresas podem fazer bate-papo com os candidatos, mas tem que ser disponibilizado o mesmo espaço para todos. 4.9. Youtube: somente informações de caráter informativo. Os sites das empresas de jornalismo podem indicar links, mas tem que ser de todos. 4.10. Reprodução de matéria de jornal e revista na internet: somente na integra, não pode ser editada.

O eleitor/internauta poderá ser multado se desrespeitar as regras acima. No entanto, se o mesmo eleitor/internauta fizer um site e registrar num provedor no exterior não tem problema nenhum.

6. Conclusão É preciso uma regulamentação para a internet, pois é um veículo com características

diferentes de outros meios de comunicação. Seu uso tende acrescer nas campanhas futuras. Liberdade de imprensa, de expressão é um princípio inegociável, isto é, faz parte das

sociedades democráticas. Ajudam, fortalecem e constroem o jogo político. Os veículos que não forem regidos ou precisarem obedecer a Lei de concessão pública devem ter autonomia para decidir, por exemplo, quem entrevistar e quem apoiar.

15 www.ibope.com.br

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Referência bibliográfica CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Tad. Roneide Venancio Majer. São Paulo:Paz e Terra,

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n. 184/2008. Disponível em: http://www.folha.com.br/081691. Acesso em 18 jun 2008.

TSE altera norma para permitir divulgação de propostas de campanha em entrevistas antes de 6 de

julho de 2008. Disponível em: http://agencia.tse.gov.br. Acesso em 26 jun 2008.

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1995.

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Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Manaus, 2000, p. 1 - 10.

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Tadeu: Centro de Pesquisa, 2001, p. 96.

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Salvador/BA, 2002, p. 1-14.

______ Internet: da propaganda política ao marketing eleitoral. CELACOM. São Bernardo do

Campo/SP, 2004, p. 1- 14.

______ Marketing Político: a contra-hegemonia pela internet. INTERCOM. Porto Alegre/RS, 2004,

p. 1-14

______ Marketing Político: o uso da internet em Ribeirão Preto. IV POLITICOM: Rio Claro, 2005.

PARTE II

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PROPAGANDA POLÍTICA NA TELEVISÃO E RÁDIO

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O espaço público mediatizado no portal institucional da RADIOBRÁS durante a

cobertura das eleições 2006.

Débora BURINI1

Jefferson J. Ribeiro MOURA2

Resumo

Este artigo foi elaborado durante o desenvolvimento da disciplina “Políticas Públicas de

Comunicação”, coordenada pela Profa. Dra. Mª das Graças C. Caldas, no Programa de Pós-

graduação em Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo. O objetivo foi analisar o

portal da Radiobrás, mais especificamente da Agência Brasil, decifrando seu conteúdo e

examinando como o espaço público foi utilizado, tendo como recorte as eleições de outubro de

2006. O trabalho propõe ainda, a discussão sobre o papel do Estado e as relações de poder entre

os diferentes grupos no setor de Comunicação, que tem por finalidade estudar a influência da

comunicação no processo de formação e/ou deformação da opinião pública brasileira. A

metodologia adotada vai da pesquisa bibliográfica a partir de textos discutidos em aula à pesquisa

de campo, coletando dados durante a semana que antecedeu as eleições.

Palavras-chave: Comunicação; Políticas Públicas; Governo Eletrônico.

Introdução

Este artigo tem por objetivo analisar o portal da Radiobrás, mais especificamente da Agência Brasil, e verificar como o espaço público mediatizado tratou a cobertura das eleições de outubro de 2006. O trabalho procurou ainda, mapear e observar aspectos referentes ao planejamento visual/gráfico (webdesign) do portal, bem como sua funcionalidade e usabilidade. O recorte temporal da amostra incluiu a semana que antecedeu o primeiro turno das eleições de outubro de 2006, entre os dias 25 de setembro e 1° de outubro. O período em questão foi definido por se tratar do momento mais decisivo do processo eleitoral.

O artigo foi elaborado com base nos textos teóricos de Dominique Wolton, Octavio Ianni,

1 Bacharel em Comunicação Social na habilitação Rádio e Televisão (1989), Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC de São Paulo (1996), e Doutoranda em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo - UMESP. Atuou desde 1988 em emissora de televisão, e participou como membro do Conselho Deliberativo da Direção do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (1995). Professora universitária desde 1995, atualmente é docente na Universidade Federal de São Carlos - UFSCAR. [email protected] 2 Formado em Comunicação Social pela USP nas habilitações Rádio e TV e Publicidade e Propaganda. Especialista em Comunicação Social e Mestre em Lingüística Aplicada pela Universidade de Taubaté. Professor há 19 anos, atuou na PUC de Campinas, Faculdades Anhembi Morumbi e Universidade Braz Cubas. Atualmente leciona na UNITAU e Faculdades Integradas Teresa D‟Ávila onde também é Coordenador no Curso de Rádio e TV. [email protected]

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Murilo Ramos, Jesús Martín-Barbero, Giovanni Sartori, Sérgio Caparelli, Joan Ferrés, entre outros. Além dos textos teóricos adotou-se a pesquisa de campo como procedimento metodológico, onde foram coletados dados, que analisados os resultados, estes contribuíram firmemente para proporcionar ao trabalho uma atualização e um olhar diferenciado.

O trabalho baseia-se nas sete heurísticas propostas por Cláudia Dias, em sua dissertação de mestrado3, e propõe analisar através de pesquisa empírica a usabilidade do portal da Radiobrás e as notícias veiculadas pela Agência Brasil. As heurísticas explicam como melhorar a usabilidade de portais corporativos web e assim se apresentam: Heurística 1 -Visibilidade e reconhecimento do estado ou contexto atual, e condução do usuário; Heurística 2 -Projeto estético e minimalista; Heurística 3 -Controle do usuário; Heurística 4 -Flexibilidade e eficiência de uso; Heurística 5 -Prevenção de erros; Heurística 6 – Consistência; e Heurística 7 -Compatibilidade com o contexto.

A análise geral do Portal da Radiobrás foi realizada tomando por base sua estrutura, observando eventuais tendências políticas de interesses específicos no noticiário divulgado pela Agência Brasil sobre os candidatos, em lugar de conteúdos apenas informativos de interesse público. (FIG. 01)

FIGURA 01 – 1ª página do Portal Radiobrás

Desta forma, o objetivo geral do artigo é desenvolver uma reflexão crítica sobre os

interesses públicos e privados embutidos nos serviços oferecidos pelos portais do Executivo Federal, em especial do portal da Radiobrás e da Agência Brasil. (FIG. 02)

FIGURA 02 – 2ª página Agência Brasil

3 De acordo com a autora seu estudo parte das heurísticas de usabilidade para web de Nielsen (1994), os critérios ergonômicos de Bastien & Scapin (1993), as recomendações de Bevan (1998), Instone (1997) e Nielsen (1994-1999), as "regras de ouro" para o projeto de interfaces de Shneiderman (1998) e o guia de estilos para serviços de informação via web de Parizotto (1997). Disponível em: <http://www.geocities.com/claudiaad/heuristicas_web.html> Acesso em: 25 de novembro de 2006.

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Internet, a “grande estrela” da atualidade

Com capacidade de representar o mundo verbalmente, o homem avançou até o pensamento lógico. As imagens e os gestos com que também nos exprimimos associado à alta tecnologia existente em nossa sociedade, terminam por recuperar linguagens imediatas e intuitivas, chamadas de linguagens não-verbais. As linguagens não-verbais podem ser consideradas uma das razões para afirmarmos que estamos na era da imagem.

Com a industrialização, cresceu a publicidade, privilegiando as modernas formas de comunicação, em especial a comunicação audiovisual, sem, no entanto, desprezar a palavra. Um dos últimos recursos da era da imagem, que abre novas fronteiras e traz a realidade virtual é o computador, onde formas ilusórias são percebidas como reais.

A grande estrela hoje, que vem ocupando o seu espaço na mídia interativa é sem dúvida a Internet, que possui todas as características como interação, respostas mensuráveis e um alto nível de segmentação e personalização, para funcionar como uma poderosa ferramenta de comunicação.

Graças à convergência digital das mídias é possível transmitir dados, voz, imagem pelo celular, acessar a Internet pelo telefone, enviar e-mail, assistir vídeos, comprar produtos, transmitir fotos, escolher o melhor ângulo de câmera no televisor da sala, votar no filme que queira assistir, ou se comunicar instantaneamente com pessoas geograficamente distantes.

O e-mail é o recurso mais utilizado na Internet, estimando a IBM que, em 1998, foram trocadas 2,7 trilhões de mensagens pelo correio eletrônico em todo o mundo. Tão importante quanto esse dado é o fato de que 59% dos usuários checam seu e.mail diariamente – e muitos o fazem várias vezes ao dia. (PINHO, 2001, p.127)

As redes mundiais de comunicação eliminaram muitas barreiras do espaço físico que poderiam criar impedimentos para o transporte das informações, o tempo parece ter diminuído e nunca esteve tão curto.

A era da informação parece ter reduzido as distâncias da comunicação,

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desterritorializado os negócios e desconfigurado a noção de tempo diante de uma crescente velocidade de interações e do fluxo de mensagens. (SILVEIRA, 2002, p.64)

É como se a “aldeia global” de McLuhan se materializasse e o homem com apenas um “click” no mouse tivesse acesso a informações de todo o mundo.

Para Luis Ramiro Beltrán, muitos dos povos latino-americanos não faziam parte dessa “aldeia”, em meados dos anos 80, e assim nunca poderiam ser considerados como parte integrante dela.

A crítica veio, basicamente, da América Latina, assegura o texto. E não apenas aos paradigmas tradicionais, mas também aos discursos modernos, como os de McLuhan: „Os latino-americanos não estão certos de que o mundo se converteu numa aldeia global principalmente porque milhões deles não têm acesso algum a qualquer meio de comunicação de massa‟. (SOARES In MARQUES DE MELO & BRITTES, 1998, p.67)

Para Beltrán, o efeito de “aldeia global” serviria, de fato, para neutralizar a diversidade cultural existente nos povos latino-americanos, facilitando, assim, a construção de um mercado de consumo. Se todos pensam da mesma forma, o consumo é igual, homogêneo, assim como a linguagem para instigar este consumo. A grande massa perde suas identidades, substituindo-as por uma única, “enxertada” na personalidade dos pertencentes à “aldeia global” de McLuhan. Segundo Beltrán, com esse desenho o emissor não sofre questionamentos, podendo comunicar o que quiser ao receptor passivo e manipulável.

No Brasil hoje, quase todos os organismos do governo federal possuem páginas na Internet facilitando o acesso de parte da população a informações e serviços anteriormente restritos as repartições públicas em seus estados. Segundo Bernardo Sorj (2003, p.90), os estados do Centro-Sul e a Bahia apresentam um nível bastante alto de utilização de Internet na divulgação de informação e serviços.

O acesso dos cidadãos e empresas a documentos e informação, a disponibilização no ciberespaço de licitações e de informações sobre a execução dos orçamentos governamentais, a unificação e o aprimoramento de bancos de dados sobre segurança pública, o preenchimento de vagas nas escolas e marcação de horário no sistema de saúde pública pelo telefone ou pela Internet são algumas das inúmeras áreas em que a Internet pode representar um instrumento de reforma e democratização do Estado. (SORJ, 2003, p.88)

Estamos diante de um espaço público muito mais vasto do que antes considerado por

Habermas (In WOLTON, 2004, p.511), com um número muito maior de agentes que intervêm publicamente, uma onipresença da informação, das sondagens, do marketing e da comunicação.

Como destaca Octávio Ianni (1996) “algo de essencial pode ter-se modificado, quando o discurso do poder passa a ser formulado e divulgado por meios da mídia impressa e eletrônica”.

No período do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), são apresentadas realizações importantes nas áreas de e-governança e e-governo, intensificando-se ainda hoje no governo do Presidente LULA. O voto eletrônico, a declaração de imposto de renda por Internet, a publicação da informação sobre execução orçamentária, compras, licitações, leilões eletrônicos, são alguns exemplos de ações governamentais apoiadas pela ferramenta tecnológica chamada Internet.

Embora os diversos sites do governo federal tenham um desenvolvimento desigual, foi implantado um portal que permite a pesquisa e oferece links com todos os sites das mais variadas instituições públicas. Em vários estados, o

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poder judiciário disponibilizou serviços on-line para o acompanhamento de processos. O Brasil tem facilitado a expansão dos negócios via Internet e tem avançado bastante na elaboração de legislação específica, na punição de crimes eletrônicos, na tramitação de documentos e na proteção da privacidade. (SORJ, 2003, p.88-89)

O espaço público está sendo conquistado aos poucos por ações que pressupõe a existência de indivíduos capazes de formar sua própria opinião. Para Jorge Werthein, representante da Unesco no Brasil (In SORJ, 2003, p.10), “é preciso escolher a política sobre as quais se possa ampliar o acesso justo à educação e ao conhecimento”, e desta forma, garantir que o espaço público seja efetivamente o espaço das discussões da coletividade, gerando e construindo os espaços políticos por onde surgem as decisões. Para ele, essa tarefa é de todos e se insere no processo coletivo de superação da exclusão digital.

Inclusão ou exclusão, não é uma simples escolha de estar dentro ou fora da sociedade “tecnologizada”. A pretensa escolha representa uma falácia na medida em que, para uma escolha livre é preciso antes um conhecimento livre, onde o debate, as opiniões, as especificidades locais, e os objetivos imediatos sejam a representação das necessidades de uma comunidade, contribuindo para uma opção alicerçada na convergência das divergências. Características gerais do portal, comunicação visual e conteúdo

O portal da Radiobrás (FIG. 03) destaca-se inicialmente pelo seu slogan “Pelo Direito à Informação”, e se apresenta em linhas gerais de forma simples e objetiva.

Sabemos que a Internet possui uma forma hipertextual, não-linear de interação, e que para minimizar efeitos da desorientação dos usuários, o portal via de regra, deve manter sempre o internauta informado quanto à página em que ele se encontra, como chegou até lá, e quais são as opções existentes no portal para ele sair. Estes elementos asseguram aos usuários que eles não estão perdidos durante a utilização do portal da Radiobrás, minimizam os possíveis erros que surgem em uma navegação e garantem uma interação maior do cidadão.

Independentemente do lugar acessado sempre contamos com a logomarca da Radiobrás deixando clara a intenção de identificação da marca e também da sinalização do local onde partimos. FIGURA 03 – 1ª página do portal Radiobrás destaque para o slogan.

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Na página principal, existe um diretório com as principais áreas cobertas pelo portal, apresenta também uma caixa do serviço de busca, mas não oferece um resumo das novidades do portal.

Apesar de contar na primeira página com um link (FIG. 04) da Presidência da República, é preciso clicar na caixa para ter acesso aos detaques do Governo, e em seguida nos ítens oferecidos, “Portal do Governo Federal”, “Portal de Serviços do Governo”, “Portal da Agência de Notícias”, “Em Questão”, e “Programa Fome Zero”. FIGURA 04 – link para site da Presidência da República na parte superior

As opções terminam por confundir o usuário, pois ao clicar nelas é aberta uma nova URL

(Uniform Resource Locator), e assim o internauta passa a seguir por outro caminho, que não o da Radiobrás.

O portal é composto basicamente por três colunas verticais estruturadas de modo a concentrar as informações sobre o objetivo e finalidade da Radiobrás no centro da tela, índice geral (FIG. 05) na coluna localizada à esquerda, e banners de publicidade na coluna localizada à direita da tela. (FIG. 06)

FIGURA 05 – coluna à esquerda FIGURA 06 – coluna à direita

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Segundo recomendações de Cláudia Dias4

(2001), na heurística 2, projeto estético e minimalista, a autora alerta para não utilizar propaganda, mas se ela for necessária, que seja utilizada em parte do espaço anteriormente destinado à navegação, e não no espaço destinado ao conteúdo. A recomendação não é seguida pelo portal, que apresenta na coluna à direita publicidade da Loterias da Caixa Econômica Federal com link de acesso, além de uma imagem com uma frase que sugere um marketing da própria Radiobrás, “Com informação, fica mais fácil conectar o Brasil inteiro com a cidadania”.

Apoiando-se ainda na heurística 2, referente às características do portal que possam dificultar ou facilitar a leitura e a compreensão do conteúdo disponível, nota-se que existe uma preocupação no portal da Radiobrás em oferecer um conteúdo legível, facilitando a leitura da informação nele apresentada.

Faz uso de uma estética simples e funcional, com um conjunto limitado de cores, predominantemente verde e amarelo, reportando às cores da bandeira nacional, além do branco no fundo e as letras sobrepostas na cor preta. O portal evita as cores berrantes, utilizando-se de formas sóbrias e caracteres sem brilho ou piscando. Possui boa densidade informacional.

Na parte superior e inferior apresenta uma faixa (tarjeta) onde destaca o nome, o slogan, e o endereço da Radiobrás (FIG. 07 e 08). FIGURA 07 – tarjeta superior

4 Cláudia Dias. Métodos de avaliação de usabilidade no contexto de portais corporativos: um estudo de caso no Senado Federal. Disponível em: <http://www.geocities.com/claudiaad/heuristicas_web.html> Acesso em: 25 de novembro de 2006.

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FIGURA 08 – tarjeta inferior

No que tange ao conteúdo propriamente dito, o portal http://www.radiobras.gov.br apresenta

a missão da empresa Radiobrás e dá destaque para os valores, que expressam e sustentam a dimensão ética das suas ações. Adota uma política de informação que prioriza a transparência e a imparcialidade. Dá destaque ao fato de ser uma empresa pública de comunicação e deixa clara sua missão, definida a partir de padrões, normas e diretrizes, onde a informação é condição sine qua non para sua existência. Os valores que norteiam a empresa estão em evidência no centro da primeira página (FIG. 09) e refletem a essência de suas ações.

FIGURA 09 – missão da empresa em destaque no centro da 1ª página

Uma empresa pública pelo direito à informação Missão:"Somosumaempresapúblicadecomunicação.BuscamoseveiculamoscomobjetividadeinformaçõessobreEstado,governoevidanacional.Trabalhamosparauniversalizaroacessoàinformação,direitofundamentalparaoexercíciodacidadania".

O atual Presidente da Radiobrás Eugênio Bucci5

(2006) revela que “a Radiobrás é hoje uma empresa pública vinculada à Secretaria Geral da Presidência da República, regida pelas leis da S/A”. Por esta razão cabe a ela a missão de oferecer conteúdo informativo que contemple o Estado, o governo e a cidadania.

No que tange ao planejamento visual/gráfico (webdesign, layout e logomarca), podese dizer que a empresa atende a praticamente todas as recomendações sugeridas por Cláudia Dias6

(2001) na heurística de número 3 referente ao domínio do usuário, onde ele deve ter sempre controle sobre o processamento de suas ações pelo portal.

A nova logomarca da Radiobrás (FIG. 10) apresenta-se em destaque na primeira página e permanece em todas as páginas componentes do portal, inclusive segue a recomendação de localização, ou seja, preferencialmente no canto superior esquerdo.

FIGURA 10 – Nova logomarca da Radiobrás na fachada reformada da empresa, em Brasília.

5 Entrevista de Eugênio Bucci à João Paulo Nucci na Revista Meio & Mensagem em 24 de julho de 2006. . 6 Cláudia Dias. Métodos de avaliação de usabilidade no contexto de portais corporativos: um estudo de caso no Senado Federal. Disponível em: <http://www.geocities.com/claudiaad/heuristicas_web.html> Acesso em: 25 de novembro de 2006

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A tipologia das letras, o tamanho, e a disposição dos ícones são de boa qualidade. O portal usa tamanho de fonte legível, optando pelos padrões entre 10, 12 e 14, da tipologia Verdana, não utiliza caixa alta em excesso, e prima por caracteres de cor escura neutra contrastada com o fundo claro, de cor branca.

Sua funcionalidade é também outro ponto a ser destacado pela facilidade para encontrar as informações que o usuário procura além da apresentação de links para itens como: “A Empresa”, “O Jornalismo”, “Trabalhe Aqui”, “Fale Conosco”, e “Contas”.

Destaque para o ítem “O Jornalismo”, onde o usuário poderá ter acesso ao Código de Conduta da Radiobrás, que estabelece o compromisso com o cidadão na cobertura das eleições gerais e as normas internas para o período. Cobertura das Eleições 2006

O Portal apresenta na segunda camada (FIG. 11) do item O Jornalismo um Código de Conduta na elaboração da cobertura das eleições de 2006, e disponibiliza arquivos no formato PDF e DOC para o usuário ter acesso e conhecimento. Esse elemento de pesquisa e esclarecimento revela um alto grau de comprometimento e transparência na elaboração do conteúdo oferecido nas matérias jornalísticas. FIGURA 11 – 2ª camada do Portal Radiobrás item O Jornalismo

Protocoloseleitorais 1. ARadiobrásnacoberturadaseleições2006 CódigodeCondutadaRadiobrásqueestabeleceocompromissocomocidadãonacoberturadaseleiçõesgeraiseasnormasinternasparaoperíodo.

Cliqueaquiparabaixarodocumentoemformato.pdfCliqueaquiparabaixarodocumentoemformato.doc2.AcoberturadaRadiobrásnaseleiçõesmunicipais

ProtocolodeCompromissoÉticoqueestabeleceosparâmetrospelosquaisanossareportagemseguiouparainformarocidadãosobreaseleiçõesmunicipais.

Clique aqui para ler o documento Cliqueaquiparabaixarodocumentoemformato.doc

Segundo informações do próprio Portal da Radiobrás, as eleições gerais de 2006

apresentam-se como o ponto mais alto de delegação de poder na democracia brasileira, considerando as eleições como o evento oficial mais importante no âmbito do Estado brasileiro. Nessa perspectiva a empresa mantém o dever no exercício de suas atribuições legais conservando o empenho de realizar a cobertura informativa eleitoral de modo equilibrado, objetivo e apartidário.

A RADIOBRÁS trabalha para universalizar o acesso à informação, mantendo e cultivando o compromisso de seu jornalismo com a verdade factual, com a objetividade, com o apartidarismo (...) A RADIOBRÁS trata a informação como um direito de todos, não como mercadoria. A sua produção jornalística é pública e gratuita por definição. A RADIOBRÁS existe para fornecer ao cidadão elementos que o ajudem a formar livremente a própria visão dos fatos e não para direcionar a formação da opinião pública. (2006)7

7 Protocolo de compromisso com o cidadão, Radiobrás, 2006. Disponível em: < http://www1.radiobras.gov.br/jornalismo.htm> Acesso em: 25 de novembro de 2006.

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Assume o compromisso de buscar e veicular com objetividade informações relevantes e de interesse público sobre Estado, Governo e Vida Nacional.

Estabeleceu ainda, para efeito de cobertura, o início em 06 de julho, data a partir da qual a Justiça Eleitoral autorizou a veiculação da propaganda eleitoral. Definiu que as candidaturas seriam noticiadas somente a partir do momento em que foram definidas pelas convenções partidárias, que ocorreram entre 10 e 30 de junho, sendo registradas na Justiça Eleitoral até o dia 5 de julho.

Desta forma, inicialmente o resultado da análise verificou o fluxo de notícias apresentadas no portal da Agência Brasil no período que compreendeu o primeiro turno das eleições de 2006 (de 25 de setembro a 01 de outubro). No recorte foi constatado um total de 577 matérias dentre as quais 235 tratavam do tema Eleições 2006 contra 342 de teor geral, porém com conteúdo de interesse público.

Dia Matérias Gerais Matérias sobre a Eleição 2006 Total

25/09 71 10 81

26/09 63 17 80

27/09 64 17 81

28/09 48 21 69

29/09* 41 14 55

30/09 39 25 64

01/09 16 131 147

342 235 577

* data em que ocorreu a queda do avião Boeing da empresa GOL

A Agência Brasil desenvolveu um subtítulo nas matérias que tratam do tema Eleições 2006, e não se verificou nenhum conteúdo que pudesse caracterizar tendência política nas informações prestadas na cobertura. As matérias apresentam teor consistente, colaborandopara cultivar o compromisso de seu jornalismo com a verdade factual, versando para a imparcialidade, e oferecendo ao usuário/internauta/cidadão informações atualizadas com caráter público-estatal.

Ao fazer a cobertura completa do processo oficial das Eleições 2006, com objetividade e precisão, a RADIOBRÁS espera oferecer ao público um quadro transparente da disputa entre os candidatos e os partidos, livre de especulações e das mais variadas formas de assédio que possam se sobrepor ao debate de interesse do cidadão. A finalidade desse esforço é ajudar o cidadão a equacionar as escolhas que terá de fazer no momento do voto. Todos os candidatos a presidente, quaisquer que sejam seus índices de preferência em quaisquer pesquisas de opinião, serão objeto da cobertura jornalística da RADIOBRÁS. (2006)8

Observa-se claramente o comprometimento da empresa em transmitir conteúdo que seja o

8Protocolo de compromisso com o cidadão, Radiobrás, 2006.Disponível em: < http://www1.radiobras.gov.br/jornalismo.htm> Acesso em: 25 de novembro de 2006.

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mais neutro possível e que atenda aos interesses da cidadania. As matérias procuram retratar e assumir um compromisso permanente com a universalização do direito à informação, com a verdade e com a qualidade da informação, por meio de canal direto com o público, e isenta de influências político-partidárias.

Nos primeiros dias da análise foram verificadas reportagens que apontavam principalmente para a agenda dos candidatos à Presidência da República. Nos dias subseqüentes os conteúdos das matérias eram alterados e seguiam o fluxo natural dos acontecimentos factuais apresentados pela mídia em geral. Porém o grau de relevância dos fatos se baseava principalmente naquilo que sugeria interesse coletivo, como matérias informativas de economia, política, cidadania e legislação pública.

Outras matérias de interesse público como, por exemplo, no dia 27 de setembro, matéria de Ivan Richard da Agência Brasil, intitulada “Idoso está fora da pauta dos candidatos critica médico” trazia em seu conteúdo informações importantes sobre o Estatuto do Idoso, criado em 2003, e depoimento do médico Renato Maia Guimarães, do Conselho Consultivo da Sociedade Brasileira de Geriatria, que alerta para a importância de garantir que o espaço público seja efetivamente o espaço das discussões da coletividade, gerando e construindo os espaços políticos por onde surgem as decisões.

“É muito triste, às vésperas de uma eleição presidencial, nenhum dos candidatos demonstrarem a menor preocupação com os idosos. Tratam os mais velhos como se tratava há 20 anos, como se eles precisassem apenas de um quilo de alimento, no verão, e um cobertor no inverno”, critica o médico, chefe do Centro de Medicina do Idoso e do Centro de Referência em Doença de Alzheimer do Hospital Universitário de Brasília (HUB). 9

A Radiobrás separou um grupo de seus jornalistas para compor uma editoria especial multimídia para cobrir as eleições de 2006. Apenas os integrantes dessa editoria estavam encarregados da cobertura eleitoral, ficando a cobertura dos assuntos ordinários a cargo das estruturas já em atividade.

Tal ação confirma a preocupação da empresa no sentido de manter em atividade o setor jornalístico realizando a cobertura de eventos importantes no cotidiano do país e do mundo, a exemplo do acidente com o avião da empresa Gol, no dia 29 de setembro, que deslocou parte da atenção da mídia do país e do mundo ao fato.

Durante a análise do portal foi encaminhado também e.mail à Presidência da empresa na pessoa do Sr. Eugênio Bucci, a fim de solicitar dados informativos das matérias publicadas no site na 1ª página da Agência Brasil, no período que compreendeu a amostra, e que não foram possíveis de serem copiadas à época, e desta forma testar a eficiência do serviço de “Fale Conosco” oferecido no portal.

O Presidente respondeu no prazo de um dia ao e.mail enviado, e ainda, informou o endereço eletrônico da pessoa responsável que iria auxiliar na aquisição das informações solicitadas.

Isso demonstrou claramente a preocupação da Radiobrás em atender de forma eficiente o cidadão confirmando assim, seu compromisso em oferecer um serviço público com qualidade e respeito. A resposta da empresa em prazo curto significa que o portal atende às recomendações da heurística 3, de Cláudia Dias (2001), que relaciona o controle que o usuário sempre deve ter sobre o processamento de suas ações pelo portal. Nelas os usuários de qualquer sistema interativo

9 Matéria publicada no site da Agência Brasil Disponível em: <http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2006/09/27/materia.2006-09-27.5030739861/view> Acesso em: em 27 de Setembro de 2006 -17h57

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esperam deter controle sobre o conjunto do organismo, fazendo com que este responda a suas solicitações e expectativas.

O portal da Radiobrás (Agência Brasil), portanto, "fala" a língua do usuário, pois adota palavras, frases e conceitos familiares aos cidadãos, ao invés de termos técnicos relacionados ao portal ou à tecnologia web. As convenções do mundo real são seguidas, apresentando informações em uma ordem lógica e natural.

Demonstrou-se também eficiência no uso da heurística 7, que refere-se à correlação direta entre o portal e seu contexto de aplicação. As características do portal da Radiobrás (Agência Brasil) são compatíveis com as características dos usuários e das tarefas que estes pretendem realizar com o site.

O desempenho dos usuários de qualquer sistema interativo melhora quando os procedimentos necessários ao cumprimento da tarefa são compatíveis com as características psicológicas, culturais e técnicas dos usuários; e quando os procedimentos e as tarefas são organizados de acordo com as expectativas e costumes dos usuários. (DIAS, 2001, s/p)

Não foram verificadas interrupções provocadas por erros de processamento que têm conseqüências negativas sobre a atividade do usuário com o portal, conforme recomenda a heurística 5 de Cláudia Dias (2001). Em todos os acessos realizados durante a pesquisa, o portal sempre dispunha de desempenho rápido e eficaz, evitando mensagens de erro, e perturbação na realização das tarefas do usuário. Considerações finais

O portal da Radiobrás, em especial da Agência Brasil, apesar de não seguir absolutamente todas as recomendações propostas por Claúdia Dias, tem uma ótima usabilidade, e cumpre seu papel de empresa pública de comunicação. O portal oferece uma cobertura jornalística de interesse público, imparcial e transparente. Assume o compromisso com os cidadãos e o respeito à política de desenvolvimento dos indivíduos.

O internauta dispõe de um portal capaz de oferecer informações de interesse público eficaz de fundamental importância para o exercício da cidadania. A empresa busca inserir o usuário no universo da informação multimídia através de um recurso tecnológico de fácil localização, de projeto estético simples e objetivo que facilita a navegação, e onde os usuários têm controle sobre as ações realizadas. Flexibilidade, credibilidade e eficiência são palavras de ordem no portal, que apresenta desempenho e velocidade consistentes.

A internet, como canal de comunicação oferece inúmeros recursos que podem ser explorados no sentido de dar acesso à imensa quantidade de informações existentes no interior do organismo comunicacional que compreende a Radiobrás.

No que se refere à cobertura jornalística das Eleições 2006, devemos considerar o contexto político no qual a Radiobrás se insere, e assim avaliar seu desempenho como equilibrado, transparente e apartidário. Assumindo o papel de canal de comunicação público capaz de atingir os leitores/usuários/cidadãos de forma eficiente, separando a comunicação institucional da comunicação pública.

Referências

DIAS, Cláudia Augusto. Portal corporativo: conceitos e características. Brasília: Ci. Inf., Abr 2001, vol.30,

no.1, p.50-60.

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DIAS, Cláudia. Métodos de avaliação de usabilidade no contexto de portais corporativos: um

estudo de caso no Senado Federal. Brasília: Universidade de Brasília, 2001. 229p.

BUCCI, Eugênio. Uma revolução pelo óbvio. In.: Revista Meio & Mensagem, São Paulo, 24 de julho

de 2006.

IANNI, Octavio. A Aldeia Global. In Teorias da globalização. 4ª ed., Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,

1996, 272p.

PINHO, J.B. Comunicação em marketing: princípios da comunicação mercadológica. Campinas-SP:

Papirus. Ed., 2001, 5ª edição, 287p.

SILVEIRA, Sérgio Amadeu da. A parte que te cabe: entenda os interesses que estão por trás da reunião de

cúpula da sociedade da informação. Educação, São Paulo, 64-65, set. 2002.

SORJ, Bernardo. [email protected]: a luta contra a desigualdade na Sociedade da Informação. Rio de

Janeiro: Jorge Zahar Ed.; Brasília, DF: Unesco, 2003,176p.

SOARES, Ismar de Oliveira. Comunicação & neoliberalismo: a vigência das políticas (alternativas) de

comunicação In MARQUES DE MELO, José & BRITTES, Juçara Gorski (orgs.). A trajetória

comunicacional de Luiz Ramiro Beltrán. São Bernardo do Campo: Editora UMESP, 1998, p. 63-73.

VILELLA, Renata Moutinho. Conteúdo, usabilidade e funcionalidade: três dimensões para avaliação de

portais de governo eletrônico na web. 2003. 262 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) –

Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2003.

WOLTON, Dominique. Pensar a Comunicação. (Trad. de Zélia Leal Adghirni). Brasília: Editora

Universidade de Brasília, 2004. 544p.

Sites:

http://www1.radiobras.gov.br/

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100

19652001000100007&lng=pt&nrm=iso

http://www.geocities.com/claudiaad/heuristicas_web.html

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Os políticos de Deus: a programação televisiva neopentecostal como

ferramenta de marketing político

José Guibson DANTAS1

Resumo

O neopentecostalismo, liderado pela Igreja Universal do Reino de Deus, vem se consolidando no

cenário religioso brasileiro como o movimento mais participativo e influente entre as camadas

sociais mais carentes da população brasileira. No campo político ele vem conseguindo cada vez

mais representatividade, seja por associação a partidos políticos ou elegendo candidatos que

pertencem a seus próprios quadros religiosos. Para isto, as igrejas neopentecostais investem

maciçamente na aquisição ou controle dos meios de comunicação de massa, fazendo com que sua

retórica alcance praticamente todas as localidades do país. Este artigo analisará os seus programas

televisivos, que são utilizados como ferramenta de marketing político para cooptação de eleitores

para seus candidatos.

Palavras-chave: televisão; igrejas neopentecostais; política; marketing; religião.

Abstract

The neopentecostalism, led by the Universal Church of the Kingdom of God, has consolidated in

Brazilian religious scene as the movement more participatory and influential among the poorest

social strata of the Brazilian population. In the political field it is getting increasingly representative,

either by association or political parties electing candidates who belong to their own religious

paintings. For this, the neopentecostal churches invest heavily in the acquisition or control of the

mass media, making his rhetoric reach almost all localities of the country. This article will review its

television programmes, which are used as a marketing tool for political cooptation of voters for their

candidates.

Key-words: television; neopentecostal churches; politic; marketing; religion.

1 Professor universitário e doutorando do curso de Comunicação e Poder da Universidad de Málaga. [email protected]

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Introdução

Uma das características da pós-modernidade é o enfraquecimento das fronteiras que antes delimitavam os campos de atuação social. Salvo algumas exceções – como, por exemplo, o místico padre Cícero, que se movimentava entre a política e a religião com grande desenvoltura -, décadas atrás era raro ver uma instituição ou uma pessoa pública assumir uma posição de protagonismo em duas ou mais esferas ao mesmo tempo, pois as posições eram bem definidas.

Com o desenvolvimento dos meios de comunicação de massa e o desmoronamento das instituições-casca que eram o sustentáculo da sociedade moderna (GIDDENS, 2000), os campos de atuação se tornaram híbridos, influenciáveis e dependentes entre si, provocando uma profunda alteração na estrutura social e institucional.

O maior exemplo deste fenômeno são as igrejas neopentecostais, que não limitam sua atuação apenas ao campo religioso, mas militam no campo midiático e logo depois no político, pois seu crescimento quantitativo repentino deixou muitos setores da sociedade em alerta, fazendo com que investigassem as práticas religiosas (e financeiras) destas igrejas. Elas, por outro lado, vendo-se cada vez mais fiscalizadas, passaram a investir maciçamente na política, buscando ganhar representatividade nas câmaras legislativas espalhadas por todo país.

Este breve trabalho analisará as igrejas neopentecostais desde seu surgimento no campo religioso brasileiro até sua conversão em instituições políticas.

O surgimento do movimento neopentecostal.

A implantação do pentecostalismo no Brasil se deu a partir da primeira década do século XX, com a chegada quase simultânea da Congregação Cristã (1910) e da Assembléia de Deus (1911). Já entre as décadas de cinqüenta e sessenta, o campo religioso pentecostal se fragmenta e surgem três grandes grupos: Quadrangular (1951), Brasil para Cristo (1955) e Deus é Amor (1962).

Essas igrejas têm como característica principal o fato de dar forte ênfase à ação do Espírito Santo nas cerimônias, fazendo com que, inclusive, muitos setores desta ala evangélica sustentem o princípio de que o fiel possuído pelo Espírito Santo não pode pecar. Além disso, são instituições com uma forte preocupação em controlar a vida de seus membros por meio de perseguições que, ao final, “transformam o Livre Arbítrio numa espécie de império invisível, ligado por laços emocionais” (MENDONÇA, 2004, p. 72).

Entretanto, no final da década de setenta, inicia-se a terceira e última fase da implantação das igrejas pentecostais no Brasil, que é denominado pelos estudiosos da área como neopentecostalismo. Esse movimento religioso surge ainda sob o governo militar, no momento em que acontece a modernização na área das comunicações no país e o alargamento dos bolsões urbanos, no final dos anos setenta e início dos anos oitenta.

O neopentecostalismo inicia-se na cidade do Rio de Janeiro, quando esta metrópole passa por uma grande decadência econômica, ondas de violência, problemas com as máfias do jogo e é administrado por um governo de política populista. Foi nessa conjuntura de crise social que essas igrejas passaram a funcionar, adotando uma postura evangelizadora adaptada à cultura urbana e influenciada pela televisão. De acordo com ANTONIAZZI (1994, p. 131):

“(…) o pentecostalismo da terceira onda adapta-se às mudanças do período militar: o aprofundamento da industrialização; o inchamento urbano causado pela expulsão de mão-de-obra do campo; a estrutura moderna de comunicações de massa que, no final dos anos 70, já alcança quase toda a população; a crise da Igreja Católica e o crescimento da umbanda; e a estagnação econômica dos anos 80”.

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O avanço neopentecostal e a conseqüente perda de representatividade da Igreja Católica, segundo MARIANO (1999), se acentuaram a partir do momento que o Vaticano relegou os males físicos e psíquicos aos especialistas de cada área científica e ao tratar os problemas sociais com erudição. A população mais carente não compreendia a linguagem científica da Igreja Católica e achou no neopentecostalismo um espaço onde suas crenças e práticas mágicas davam resposta às perguntas emergentes.

Esse tipo de evangelização, direcionado à própria identidade de cada grupo social, foi muito bem recebida pela população, sobretudo pelo fato do povo brasileiro ser híbrido, ou seja, sem uma uniformidade cultural e com diferenças étnicas acentuadas pela imensidão do território nacional.

Conseqüentemente, o neopentecostalismo ajudou a criar uma liturgia mais próxima da complexa realidade cultural e social brasileira. Ritmos como o baião, o samba, o bolero e recentemente o rap e o rock foram incorporados à liturgia religiosa destas igrejas. Com isso, no espaço neopentecostal, o devoto católico esquecido pelo imobilismo territorial da paróquia passou a participar e pregar sua crença sem ter vergonha de si mesmo e da sua forma de vida.

Para entender a aceitação social das igrejas neopentecostais, é pertinente dizer que elas procuram aproximar-se do contexto popular, dialogando com o povo na mesma linguagem dos habitantes dos subúrbios e das periferias. Na verdade, o que estas igrejas fazem é recuperar um tipo de religiosidade muito viva na cultura popular, valorizando e reforçando o fascínio que o sagrado exerce sobre o povo. OLIVEIRA (2003, p. 51), esse novo protestantismo:

“ (...) captou o sentimento místico do povo brasileiro tão presente nas camadas populares. Sentimento que se expressa em diversos matizes, quando os fiéis recorrem ao sagrado não de forma racionalizada, mas com a emoção (...) demonstrando que o diálogo se torna recíproco, em contraposição à Igreja Católica que ainda está a procura do melhor trajeto”.

Uma prova latente dessa preocupação em usar de ferramentas culturais para se aproximar do popular é o fato das principais igrejas neopentecostais (Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça de Deus e Igreja Sara Nossa Terra) não exigirem estudos teológicos dos seus pastores, que são geralmente convocados entre os obreiros -homens e mulheres batizados no Espírito Santo que freqüentam a igreja há pelo menos três meses e que demonstram possuir uma relativa competência nas práticas de culto.

A não valorização do nível de conhecimento teológico decorre da própria visão doutrinal e institucional destas Igrejas que privilegiam a inspiração divina em vez de conhecimentos teológicos.

Por isso, as igrejas neopentecostais não têm uma forma de governo nem estruturas administrativas definidas, sendo que cada segmento adota o que considera mais conveniente. Em vez de preocupar-se com a qualidade dos ensinamentos bíblicos, estas igrejas preferem explorar a figura de um líder forte e carismático que incute nos adeptos a idéia de que o pastor é “ungido pelo Senhor” e que, por isto, não pode ter seu comportamento questionado.

Nestas instituições, os pastores são assalariados, com direito a casa e dedicam-se exclusivamente ao ministério. Além disso, ainda recebem uma porcentagem da arrecadação financeira do templo a qual é responsável, mas controlada por um teto salarial. Esse teto salarial, na verdade, serve para evitar que os pastores se envolvam numa competição doentia pelo pastorado de determinada filial.

Ao adaptar a liturgia religiosa à cultura popular, o movimento neopentecostal buscou incorporar aos seus cultos e produtos um arsenal simbólico que transformasse seu discurso evangelizador em um grande negócio. É justamente aí que a Teologia da Prosperidade é trabalhada

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por estas instituições, que passam a enxergar o espaço sagrado como um mercado de indulgências.

A televisão como meio de evangelização

A construção do discurso neopentecostal produz uma grande quantidade de formas simbólicas, estabelecendo um conceito próprio do que é o sagrado e o profano. Assim, o uso dos meios de comunicação de massa, sobretudo da televisão, passa a ter um papel muito importante para estas igrejas, pois segundo MARTÍN-BARBERO e REY (2001), a televisão é o mais sofisticado dispositivo de moldagem e deformação do cotidiano e dos gostos populares.

Além disso, no Brasil, a televisão também possui um papel político. Com o enfraquecimento do Estado e a conseqüente transmissão da responsabilidade social à iniciativa privada, o meio passou a ser uma forma de mediação que simula o espaço democrático tão almejado pelo povo, no qual adquire visibilidade e reconhecimento. A televisão representa para as camadas populares um instrumento de ócio e diversão (ou seria de conformismo?), que possui também implicação social estabelecida por meio de um tipo de “processo específico de participação da parte do telespectador” (MARTINBARBERO, 2004:103).

A televisão fascina o telespectador porque representa a realidade cotidiana como um mundo repleto de sonhos e fantasias que ele permite ao seu usuário enxergar. É justamente por isso, de acordo com MARCONDES FILHO (1988) que ela é utilizada como propagadora de doutrinas religiosas.

Além da capacidade de transformar o sagrado em espetáculo, a imagem televisiva possui o

poder imaginário de tudo exibir e tudo conhecer o que os telespectadores lhe atribuem, provocando profundas alterações nas relações entre o público e o privado. Decorre daí o fato de igrejas elaborarem projetos de evangelização que mesclam ambientes reais (o templo) e virtuais (programas televisivos), com o intuito de solidificar e angariar novos fiéis. Exemplificando essa nova prática de difusão da fé, ROCHA (1998:125) afirma que:

“Ele (Edir Macedo, mentor da Igreja Universal do Reino de Deus) está preocupado com a perda de adeptos. A estratégia para a recuperação de fiéis pela Igreja Universal do Reino de Deus é usar ao máximo a sua televisão (...) O projeto é manter as igrejas abertas até à meia-noite. A partir daí o “trabalho de assistência espiritual” permanente aos fiéis é feito em programas ao vivo, até às oito horas da manhã, como Palavra da Vida, Jesus verdade e Despertar da fé”.

Apontada por SODRÉ (1990) como parte de um sistema simulador que coloca entre o indivíduo e a realidade tantas mediações que num certo momento não se consegue determinar com precisão o que é original e o que é efeito de código que organiza a mediação, a televisão por meio dos símbolos religiosos cria um elo direto entre as pessoas e a entidade espiritual.

A televisão, na verdade, alia dois discursos legitimadores: o religioso e o midiático, procurando reforçar esta ou aquela posição que possam levantar questões que tenham aparência ou relevância doutrinária e que justifiquem sua presença em um veículo religioso. Faz parte da própria substância da sociedade a necessidade de representação, da teatralização constante da vida. Não é por acaso que DÉBORD (1997) afirmava que o espetáculo é uma relação social mediatizada por imagens.

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Ao camuflar todas as distinções históricas e geográficas e, adaptando-as a modelos de compreensão e absorção, a televisão tornou-se o que MARTÍN-BARBERO (2004) chama de „cidade virtual‟, ou seja, um aparato tecnológico apto a oferecer formas aparentes de socialização às populações marginalizadas, fazendo com que eles estabeleçam vínculos com parte da sociedade.

Apoiando-se nesta premissa, as instituições religiosas – sobretudo as neopentecostais – dirigem sua programação a um segmento da população que sempre foi excluído pela programação televisiva nacional:

“Os evangélicos constituem um segmento da população que sempre foi excluído por essa TV de madame que temos aqui. Os “crentes” nunca foram mocinhos de novela, nem autoridade para opinar sobre os costumes e sobre a moral; os “crentes” nunca foram nada. Eram invisíveis. Até que a TV Record de São Paulo foi comprada pelo bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, e a Rede Record (...) trouxe os evangélicos para a tela” (BUCCI, 1997:141).

A programação televisiva destas igrejas neste início de século tem como característica, para ROCHA (1998) o fato de gerar conteúdos para os telespectadores e não propriamente para os fiéis. A conversão da religião em espetáculo audiovisual é reforçada pela transformação da imagem em símbolo por meio da repetição, que tem o poder “em amarrar o passado e o futuro, em evocar ao mesmo tempo em que antecipa, tudo, porém, a partir de uma inércia que carrega a ação, estereotipando-a” (MARTINBARBERO, 2004b:98).

A televisão recorre a procedimentos para persuadir o público que é calcado em repetições no próprio ritmo das seqüências. O ato de persuadir pela repetição é uma prova de que o texto televisivo também é oral, na medida em que o escrito necessita ser coloquial e informal para um melhor entendimento do telespectador. A tele-evangelização como ferramenta de marketing político.

Como pudemos observar, a televisão se configura num poderoso meio de produção de

sentidos religiosos e de mediação cultural para as igrejas neopentecostais, sendo talvez a grande ferramenta de evangelização das mesmas. Não é por acaso que alguns pesquisadores importantes como ASSMANN (1986) as chamam de „igrejas eletrônicas‟.

Com o sucesso alcançado, as igrejas chamaram a atenção das autoridades e da população em gera, que passou a desconfiar de suas práticas religiosas. A Igreja Universal, a maior igreja neopentecostal brasileira, após comprar a Rede Record nos anos 80 iniciou uma batalha midiática com a Rede Globo pela audiência. Quem não se recorda do episódio em que o então pastor da Igreja Universal, Sérgio Von Helder, chutou a imagem de Nossa Senhora Aparecida no programa “Palavra da Vida” da Rede Record?

Ao desafiar o poderio da emissora de Roberto Marinho e mostrar a estrutura de sua organização religiosa, a Igreja Universal passou a ser investigada pelos órgãos de imprensa monopolizados por ser considerada uma forte concorrente no ramo da indústria cultural, pois além da emissora de TV a instituição de Edir Macedo possui um verdadeiro império midiático, com jornal, editora, centenas de emissoras de rádio e uma gravadora.

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ENTIDADES EVANGÉLICAS NÚMERO

DE RTVs GRUPO

Rád io e Televisão Reco rd

S.A 196 IURD

Red e Mulher d e Televisão

Lt d a. (d esd e 9/2007 Record

New s) 61 IURD

Red e Fam ília d e

Com un icaçõ es S/C Lt d a 10 IURD

RTVs controladas pela IURD

O bispo Macedo, mostrando mais uma vez uma visão empresarial bastante aguçada, observou que era interessante instituir uma política partidária para seu empreendimento religioso justamente para conter as investidas dos “inimigos”. Foi quando a Igreja Universal entrou nas campanhas eleitorais definindo um amplo leque de candidaturas próprias e quando não tinha a possibilidade de ter candidatos próprios ela fazia alianças com políticos já conhecidos no cenário eleitoral. Esta prática política, bem como as práticas de fundo religioso, logo foram copiadas pelas outras igrejas neopentecostais, que podem ser consideradas como seguidoras da Igreja Universal.

Apesar dos evangélicos atuarem na política desde A República Velha (CAMPOS, 2006), foram as neopentecostais que realmente sacralizaram a política, usando muitas vezes o termo “Políticos de Cristo” para se referirem aos seus candidatos. Esta sacralização pode ser percebida no discurso do bispo Célio Lopes, em 1996, durante uma campanha eleitoral na periferia carioca:

“Os candidatos evangélicos são pessoas escolhidas e não indicadas. São homens e mulheres de Deus, com Jesus Cristo no coração. Cheias do Espírito Santo. Gente que irá assumir cargos públicos (...) para servir e não para ser servido. E que jamais participarão de tos desabonadores (e que deverão) oferecer às populações algo novo em matéria de representação popular” (apud CAMPOS, 2006, p. 52).

Entretanto, o lugar onde realmente se faz campanha eleitoral de candidatos

neopentecostais é nos programas televisivos, inicialmente concebidos apenas para dar continuidade ao serviço religioso após o encerramento das atividades nos templos. Vejamos alguns exemplos.

No programa “Show da Fé” (produzido pela Igreja da Graça) é muito comum a presença de candidatos nas atrações do programa, sendo muitas vezes apresentados com uma breve biografia, sonhos e vida religiosa. Já a Igreja Universal utiliza quase sempre o famoso programa “Fala que eu te escuto” para reforçar a candidatura de algum membro, mas de uma forma bem mais inteligente que R. R. Soares, que parece ainda engatinhar no ofício de construir políticos.

O programa “Fala que eu te escuto” sempre possui um tema central a ser debatido e logo no início é apresentado um resumo temático de aproximadamente dez minutos com exemplos e notícias tiradas de telejornais e mídia televisiva em geral. Após aclarar o telespectador do que vão ser debatido na noite, os pastores se apresentam e iniciam o debate, dando um amplo espaço para o telespectador participar por meio do telefone.

Ás vezes, dependendo do tema, o debate é intermediado por um membro ou simpatizante da igreja que é apresentado como especialista na questão. É justamente esta posição de destaque

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no programa que eles costumam colocar um candidato político, sem dar ênfase diretamente ao fato deste ser candidato. A estratégia de marketing político adotado no programa é a seguinte: durante o dia o eleitor assiste aos programas eleitorais e vê centenas de candidatos utilizando um mínimo espaço de tempo para ganhar visibilidade pública e conseguir votos do eleitorado; no final da noite assiste um debate sobre um tema de interesse público e vê um cidadão apresentado ali como especialista no tema (ou seja, que possui conhecimentos para a solução do mesmo) que, horas antes, viu pedindo votos durante 15 segundos.

Não podemos afirmar que esta estratégia de marketing que observamos na programação televisiva das igrejas neopentecostais seja determinante para que o eleitor se decida por um “político de Jesus”, pois sabemos que nas periferias, onde funcionam os núcleos evangelizadores descentralizados destas instituições, há um enorme esforço por parte dos pastores (se existem “políticos de Jesus” podemos afirmar que estes são os “cabos eleitorais de Jesus”) para elegerem os candidatos que seus líderes determinaram como importantes para os interesses futuros da igreja.

De todas as formas, o quadro abaixo nos mostra uma participação ativa dos políticos neopentecostais na política nacional:

Nº NOME TÍTULO

ECLESIÁSTICO PARTIDO UF IGREJA

1 Ant onio

Bulhões BISPO PMDB SP IURD

2 Flávio

Bezer ra BISPO PMDB CE IURD

3 George

Hilt on PASTOR PP MG IURD

4 Léo Vivas BISPO PRB RJ IURD

5 Paulo

Rober t o BISPO PTB RS IURD

6 Eduardo

Lopes BISPO PSB RJ IURD

7 Vinicius

Carvalho PASTOR PT do B RJ IURD

8 Jorge T.

Mudalen MEMBRO PFL SP IIGD

9 Dr . Adilson

Soar es PASTOR PRB RJ IIGD

10 Eduardo

Cunha MEMBRO PMDB RJ CESNT

11 Robson

Rodovalho BISPO PFL DF CESNT

12 Marcelo

Cr ivella BISPO PRB RJ IURD

Frente Parlamentar Neopentecostal (2007-2011)

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Conclusões

A atuação das igrejas neopentecostais no campo político brasileiro é um tema complexo e que pode ser estudado sob vários ângulos: em nível nacional, regional, estadual ou municipal? Nos templos tradicionais ou nos espaços midiáticos? Candidaturas de membros das próprias igrejas ou aliados externos? Por partido ou frente ideológica?

Enfim, são varias formas de analisar este fenômeno, que vem despertando cada vez mais a curiosidade de pesquisadores, pois o tema é de interesse nacional e se insere numa discussão maior que é o fortalecimento do regime democrático na nação de maior influencia do continente sul-americano.

No nosso breve texto, nos preocupamos apenas em mostrar que os programas televisivos das igrejas neopentecostais passaram de simples ferramentas de difusão doutrinária para estratégia de marketing político para apoiar candidatos que possam defender os interesses destas igrejas.

Concluímos que o tema é preocupante, pois envolve uma série de questionamentos importantes - é legal utilizar uma concessão pública para fazer campanha política fora do espaço gratuito eleitoral? É ético construir um discurso político pautado em doutrinas religiosas? É correto convidar candidatos a participar de programas televisivos que tem como objetivo evangelizar as pessoas? – que se chocam diretamente com o próprio sistema democrático do país.

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Comunicação pública, interesse público e cidadania política: um estudo da TV

ALESP no Estado de São Paulo

Paulo Cezar Rosa1

Roberto Gondo Macedo2

Resumo

Esta pesquisa tem por objetivo discutir o papel das emissoras públicas de comunicação no

Brasil na formação cultural e na construção de uma cidadania política para os brasileiros. Pretende

refletir sobre a responsabilidade social dessas emissoras em contraposição às emissoras comerciais, no

momento em que se quer discutir o novo marco regulatório da radiodifusão no Brasil. O veículo de

comunicação, objeto deste estudo, é o canal de Televisão da Assembléia Legislativa do Estado de São

Paulo – TV ALESP, pois engloba ideologicamente o conceito de TV Pública, com foco em conteúdo

político e representa uma das mais representativas ferramentas disponíveis atualmente de comunicação

política governamental no que tange a representação do estado democrático brasileiro, sejam em

períodos eleitorais e pós-eleitorais.

Palavras-chave: TV ALESP, TV Pública, Comunicação Política, Democracia.

1. Introdução

Discutir o papel das emissoras públicas de comunicação no Brasil na formação cultural e na

construção de uma cidadania política do brasileiro e refletir sobre a responsabilidade social dessas emissoras em contraposição às emissoras comerciais, no momento em que se pretende discutir o novo marco regulatório da radiodifusão no Brasil, conscientizando a população sobre a importância da participação da sociedade nas discussões e decisões sobre o estabelecimento de prioridades na produção do saber é, sem dúvida, uma das tarefas do Jornalismo Científico. Integrar a sociedade brasileira no debate da política científica nacional também é tarefa inadiável.

Caldas, em Mídia, Educação Científica e Cidadania - A experiência das revistas Eureca e ABC das Águas, (2005) destaca que: A divulgação do conhecimento científico na mídia faz com que o cidadão comum, seja ele criança, jovem ou adulto, tome contato cada vez mais freqüente com o mundo da ciência, sem se dar conta do papel estratégico que ela ocupa nas sociedades modernas. Questões de natureza polêmica como os alimentos geneticamente modificados, os transgênicos; a clonagem

1 Doutor em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo, onde atua como docente no programa de

especialização Lato Sensu em Administração. Mestre em Controladoria, consultor nas áreas de planejamento estratégico e comunicação. 2 Doutorando em Comunicação Social, docente nos programas Lato Sensu de Comunicação e Administração da Universidade Metodista de São Paulo e Universidade Presbiteriana Mackenzie, graduação na Faculdade de Mauá – FAMA e CEETEPS, Mestre em Administração Pública pela USCS e Diretor Editorial POLITICOM.

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terapêutica ou reprodutiva, bem como discussões relacionadas ao meio ambiente ocupam o imaginário popular construindo conhecimentos a partir de fragmentos de informações com qualidade às vezes duvidosa e quase sempre destituída de seu contexto sócioeconômico e político.

De acordo com Briggs e Burke (2004, p.179) “O Scannereletrônico, que se tornou a chave da

televisão, foi identificado por Campbell Swinton em 1908.” Um século foi necessário para discutirmos com mais profundidade no Brasil sobre o avanço da ciência e tecnologia na vida da sociedade que requer uma cultura científica mais difundida, assegurando um mínimo de compreensão ao cidadão comum sobre o impacto provocado pelas políticas governamentais na área de Ciência e Tecnologia – C&T.

Por um outro lado, também se precisa então de uma linguagem acessível ao grande público. Este é o papel que cabe aos meios de comunicação. Desta forma, o cidadão comum poderá compreender e participar das decisões dos governos por meio de suas diferentes representações e organizações sociais.

O I Fórum Nacional de TVs Públicas é um esforço conjunto para disseminar o conhecimento científico com a participação das associações do campo público da televisão brasileira – Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec), Associação Brasileira de Canais Comunitários (ABCCom), Associação Brasileira de Emissoras Universitárias (ABTU) e Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas (Astral) – e das organizações da sociedade civil, que ao tomarem parte deste processo, dele se apropriaram, difundindo-o e ampliando. Abaixo transcrevemos o Manifesto pela TV Pública independente e democrática:

Nós, representantes das emissoras Públicas, Educativas, Culturais, Universitárias, Legislativas e Comunitárias, ativistas da sociedade civil e militantes do movimento social, profissionais da cultura, cineastas, produtores independentes, comunicadores, acadêmicos e telespectadores, reunidos em Brasília, afirmamos, em uníssono, que o Brasil precisa, no seu trilhar em busca da democracia com igualdade e justiça social, de TVs Públicas independentes, democráticas e apartidárias. Nove meses transcorridos desde o chamamento para o 1º Fórum Nacional de TVs Públicas, uma iniciativa pioneira do Ministério da Cultura, por meio da Secretaria do Audiovisual, com apoio da Presidência da República, podemos afirmar que este nosso clamor soma-se aos anseios da sociedade brasileira. Neste processo, o Brasil debateu intensamente a televisão que quer e pretende construir, quando estamos à porta da transição para a era digital. Nesse período, superamos a dispersão que nos apartava de nós mesmos e descobrimos uma via comum de atuação, que tem como rota o reconhecimento de que somos parte de um mesmo todo, diverso e plural, complementar e dinâmico, articulado em torno do Campo Público de Televisão. Um corpo que se afirma a partir da sua heterogeneidade, mas compartilha visões e concepções comuns. Os participantes do Fórum afirmam: a TV Pública promove a formação crítica do indivíduo para o exercício da cidadania e da democracia; a TV Pública deve ser a expressão maior das diversidades de gênero, étnico-racial, cultural e social brasileiras, promovendo o diálogo entre as múltiplas identidades do País; a TV Pública deve ser instrumento de universalização dos direitos à informação, à comunicação, à educação e à cultura, bem como dos outros direitos humanos e sociais; a TV Pública deve estar ao alcance de todos os cidadãos e cidadãs; a TV Pública deve ser independente e autônoma em relação a governos e ao mercado, devendo seu financiamento ter origem em fontes múltiplas, com a participação significativa de orçamentos públicos e de fundos nãocontingenciáveis; as diretrizes de gestão, programação e a fiscalização dessa programação da TV Pública devem ser

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atribuição de órgão colegiado deliberativo, representativo da sociedade, no qual o Estado ou o Governo não devem ter maioria; a TV Pública tem o compromisso de fomentar a produção independente, ampliando significativamente a presença desses conteúdos em sua grade de programação; a programação da TV Pública deve contemplar a produção regional; a programação da TV Pública não deve estar orientada estritamente por critérios mercadológicos, mas não deve abrir mão de buscar o interesse do maior número possível de telespectadores; a TV Pública considera o cinema brasileiro um parceiro estratégico para a realização de sua missão e enxerga-se como aliada na expansão da sua produção e difusão; o Campo Público de Televisão recebe positivamente a criação e inserção de uma TV Pública organizada pelo Governo Federal, a partir da fusão de duas instituições integrantes do campo público e promotoras deste Fórum(ACERP e Radiobrás);E recomendam:a nova rede pública organizada pelo Governo Federal deve ampliar efortalecer, de maneira horizontal, as redes já existentes;a regulamentação da Constituição Federal em seu capítulo sobreComunicação Social, especificamente os artigos 220, 221 e 223; o processo em curso deve ser entendido como parte da construção de um sistema público de comunicação, como prevê a Constituição Federal de 1988; a construção e adoção de novos parâmetros de aferição de audiência e qualidade que contemplem os objetivos para os quais a TV Pública foi criada; a participação decisiva da União em um amplo programa de financiamento voltado para a produção de conteúdos audiovisuais, por meio de mecanismos inovadores; promover mecanismos que viabilizem a produção e veiculação de comunicação pelos cidadãos e cidadãs brasileiros. E propõem em face do processo de migração digital: garantir a construção de uma infra-estrutura técnica, pública e única, que viabilize a integração das plataformas de serviços digitais por meio de um operador de rede; a TV Pública considera que a multiprogramação é o modelo estratégico para bem realizar a sua missão; a TV Pública deve ser promotora do processo de convergência digital, ampliando sua área de atuação com as novas tecnologias de informação e comunicação e promovendo a inclusão digital; a TV Pública deve se destacar pelo estímulo à produção de conteúdos digitais interativos e inovadores; o apoio à continuidade de pesquisas com vistas à criação de softwares que garantam a interatividade plena; os canais públicos criados pela Lei do Cabo devem ser contemplados no processo de migração digital, passando a operar também em rede aberta terrestre de televisão; a TV Pública deve estar presente em todas as formas de difusão de televisão, existentes ou por serem criadas; trabalhar em conjunto com o BNDES para encontrar mecanismos de financiamento, por meio do fundo social do banco de fomento, da migração digital das TVs Públicas; fomentar o debate sobre a questão da propriedade intelectual no universo digital, buscando ampliar os mecanismos de compartilhamento do conhecimento. A força e a solidez do 1º Fórum Nacional de TVs Públicas são reflexos do envolvimento das associações do campo público de televisão brasileiro – Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec), Associação Brasileira de Canais Comunitários (ABCCom), Associação Brasileira de Emissoras Universitárias (ABTU) e Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas (Astral) – e das organizações da sociedade civil, que ao tomarem parte deste processo dele se apropriaram, difundindo-o e ampliando-o. Ao cabo destes quatro dias de reunião, sob o signo da fraternidade e de uma harmonia construtiva que só se vivencia nos grandes momentos históricos, todos saímos fortalecidos. Acima de tudo, emerge fortalecido o cidadão brasileiro, detentor de um conjunto de direitos que jamais se efetivarão sem a ampliação e o fortalecimento do espaço público também na televisão brasileira. Pelos motivos

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que se depreendem da leitura desta carta, é consenso, por fim, que o Fórum Nacional de TVs Públicas deve se transformar em espaço permanente de interlocução e de construção de políticas republicanas de comunicação social, educação e cultura, institucionalizando-se na vida democrática do País. Brasília, 11 de maio de 2007 I Fórum Nacional de TVs Públicas.

O Ministro de Estado da Cultura, Sr. Gilberto Gil, faz a abertura oficial do I Fórum Nacional de

Televisão Pública reafirmando os desafios da televisão pública brasileira sob o prisma da convergência, solicitando aos participantes que nesse novo contexto utilizem a inteligência e a reorganização do Estado na formulação de estratégias novas, amplas e consistentes em diálogo com os setores e que encontrem respostas como por exemplo: Como tais mudanças demandam a diversificação das formas de conteúdo? Como fortalecer as TVs públicas, dotando seus modelos de gestão de maior autonomia e capacidade de programar conteúdos de alta qualidade? Qual é o papel do Estado no apoio à realização plena dessa esfera comum, que supere o estatal e o privado e projeta o Brasil na direção de uma necessária afirmação do espaço público, do espaço comum?

O Manifesto pela TV Pública transcrito acima foi a resposta que a sociedade ofereceu ao pedido do Ministro de Estado da Cultura, Sr. Gilberto Gil. 2. Objetivos e hipótese

O objetivo deste trabalho é discutir o papel das emissoras públicas de comunicação do Brasil na formação cultural e na construção de uma cidadania política do brasileiro. Refletir sobre a responsabilidade social dessas emissoras em contraposição às emissoras comerciais, no momento em que se pretende rediscutir o novo marco regulatório da radiodifusão no Brasil para a criação de uma Lei Geral de Telecomunicação o que implica a elaboração de uma visão crítica sobre a radiodifusão brasileira.

O veículo de comunicação, objeto deste estudo, é o canal de Televisão da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo – TVALESP. Pretende-se analisar como esse veículo de comunicação aborda aspectos da TV pública a partir dos princípios e das recomendações estabelecidas no “Manifesto pela TV Pública independente e democrática”, trabalho este oriundo do I Fórum Nacional de TVs Públicas realizado em maio de 2007 em Brasília.

Parte-se da hipótese de que, por envolver interesses de diferentes pontos de vistas público e privado, quando confrontado, o manifesto pela TV Pública com a realidade do veículo de comunicação, objeto deste estudo, a TV ALESP não refletirá as recomendações nele contidas e talvez, por isso, consigamos discutir as relações de poder inerentes ao processo e aos diferentes grupos de interesse nelas envolvidos a fim de justificar a hipótese aqui levantada. 3. Metodologia

Esta pesquisa é de caráter exploratório e de natureza qualitativa, mas em alguns momentos,

fez-se necessário recorrer a procedimentos quantitativos. Utilizou-se a pesquisa bibliográfica e a análise documental, numa perspectiva comparativa. Para verificar a hipótese, o corpus contemplou o site do portal da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, mais especificamente os ícones da TV Alesp -programação. O recorte temporal foi de 08 a 14 de outubro de 2007 (inclusive), totalizando 07 dias, e escolhido um programa para análise entre os diferentes gêneros e sub-gêneros noticiosos.

De acordo com Wilson Corrêa da Fonseca Junior (2005, p .280 à 304) “a formação do campo comunicacional não pode ser compreendida sem fazer referência à análise de conteúdo”. Desta forma, utilizamos a Análise do Conteúdo – AC, para a apreciação do material a partir de algumas categorias analíticas construídas durante o processo da pesquisa. De acordo com Krippendorff (1993, p. 29), “a análise de conteúdo é uma técnica de investigação destinada a formular, a partir de certos dados,

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inferências reproduzíveis e válidas que podem se aplicar a seu contexto”. Num primeiro momento, selecionaram todos os programas; após isso procedeu-se a um sorteio para gravarmos a programação diária de um período, considerando, madrugada, manhã, tarde e noite. Com a ajuda de dados, o período selecionado foi o da manhã e gravou-se das seis às doze horas, ou seja, seis horas diárias, que multiplicadas por sete dias, totalizam quarenta e duas horas de gravação. Separou-se as matérias por gêneros jornalísticos e seus respectivos sub-gêneros.

As categorias gêneros analíticas observadas na elaboração da ficha de pesquisa, em ordem alfabética, para a análise qualitativa foram:

• Natureza/Gêneros do Programa o ciência e tecnologia; o cultura; o educação; o esporte; o economia; o política pública; o serviço e o turismo. e as subcategorias ou subgêneros, também em ordem alfabética foram:

• Formato do Programa

o cinema; o debates; o documentários; o entrevistas; o filmes; o noticiosos; o musical e o talk show

• Conteúdo o Programa

o ambiental; o artístico; o científico; o cotidiano; o esportivo; o histórico; o institucional; o literário; o político; o saúde; o segurança pública; o social e o tecnológico.

Para melhor visualização das categorias e subcategorias analíticas ver abaixo o quadro 1 -Análise de Conteúdo – TV Alesp -Fichário.

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site: ALESP – Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo

Título:Programação da TV Alesp

Data: de 08 a 14/10/2007 end:Net-canal 13 – TVA-canal 66

Obs.compreende o período acima e das 6 h às 12 h, ou seja o período da manhã

Quadro 1 - Análise de Conteúdo – TV Alesp – Fichário

Após o levantamento das matérias e a tabulação dos resultados em 57 fichas (número correspondente ao de programas levantados) conforme o quadro 1, realizou-se uma tabulação total das 57 fichas em uma única ficha, procedendo agora uma análise preliminar das categorias, apresentados no tópico 4 – Resultados de Gêneros e Subgêneros e subtópicos deste trabalho.

A categorização utilizada para esta análise dentro dos critérios segundo Bardin (1988) é o semântico, que divide em categorias temáticas. Ainda de acordo com a mesma autora, os critérios também pode ser sintáticos: que dividem em categorias de verbos e adjetivos; léxicos: que dividem em categorias que classificam as palavras conforme seu sentido e expressivos: categorias que dividem ou classificam as perturbações da linguagem.

Novamente com a ajuda de dados, selecionamos um programa a ser analisado com mais profundidade e este foi o das 6 h, “Depoimento com Arte” realizado pelo apresentador Liésio Pereira, apresentados no tópico 5 – Resultados do Programa deste trabalho.

Assim, verifica-se se a mídia, efetivamente, está cumprindo seu papel de emissora pública de comunicação do Brasil na formação cultural e na construção de uma cidadania política do brasileiro com base no Manifesto pela TV Pública independente e democrática.

4. Resultados de gêneros e subgêneros

O período analisado é o da manhã e compreende o horário da programação de 6 h às 12 h, a seguir, apresentam-se os resultados alcançados dos conteúdos dos 57 programas analisados relacionados à cobertura da TV Alesp no período já descrito. 4.1 Natureza do Programa

Inicialmente na categorização, utilizou-se da natureza do programa e percebeu-se uma predominância da natureza política pública, seguida da cultural e do serviço, conforme o Quadro 2 –

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Natureza do Programa. Ciência e Tecnologia 2

Cultura 15

Esporte 0

Educação 8

Economia 0

Política Pública 17

Turismo 0

Serviço 15

Quadro 2 - Natureza do Programa

No gráfico 1 – Natureza do Programa, a tabulação das informações revelou que dos 57 programas selecionados 17 são relacionados a políticas públicas, mostrando uma predominância nesta natureza que justifica-se, pois a TV-Alesp é da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e discute as questões políticas do Estado. Empatados com 15 programas cada um de natureza cultural e de serviços e com 8 programas de natureza educacional, essas três naturezas juntas perfazem um total de 70% dos 57 programas selecionados.

Gráfico 1-Natureza do Programa 4.2 Formato do Programa

Neste item verifica-se a predominância de 3 categorias (ver Quadro 3 – Formato do Programa): a de caráter de entrevista com 20 programas, seguida da de caráter documentário com 19 programas e em terceiro lugar o de debate com 15 programas. Juntos as 3 categorias perfazem 94,7% do total da amostra. Para completar os 57 programas analisados, 3 são de caráter noticioso, conforme demonstra o Gráfico 2 – Formato do Programa.

Entrevista 20

Talk show 0

Cinema 0

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Documentário 19

Filme 0

Noticioso 3

Musical 0

Debate 15

Quadro 3 -Formato do Programa

Gráfico 2 – Formato do Programa 4.3 Conteúdo do Programa

Para identificar os conteúdos foi necessário expandir as categorias e aceitar que em um

programa possa existir mais de um tipo de conteúdo, chegando a um total de 65 (ver Quadro 4 – Conteúdo do Programa), desta forma, identifica-se uma predominância em três categorias, sendo a primeira com 12 verificações no conteúdo social, 11 no conteúdo artístico e 10 no conteúdo saúde, a categoria predominante perfaz 50,7% de um total de 65 categorias. Após, temos em segundo lugar um bloco de 4 categorias, sendo a primeira com 8 verificações no conteúdo ambiental, 7 no conteúdo histórico, 6 no conteúdo científico e outras 6 no conteúdo político. Conforme demonstra abaixo o Gráfico 3 – Conteúdo do Programa.

Ambiental 8

Artístico 11

Científico 6

Cotidiano 0

Esportivo 0

Histórico 7

Institucional 1

Literário 2

Político 6

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Saúde 10

Segurança Pública 1

Social 12 Tecnológico 1 Quadro 4 - Conteúdo do Programa

Gráfico 3 - Conteúdo do Programa 4.4 Reprises

Neste item verificou-se que dos 57 programas analisados neste horário apenas 5 foram reprisados. Conforme demonstrado abaixo no Gráfico 4 – Reprises.

Gráfico 4-Reprises 5 Considerações finais

A análise evidenciou que existe uma clara predominância de programas de natureza políticas públicas, culturais e de serviços. Os programas de políticas públicas são apresentados no formato de debates e entrevistas, onde os Deputados da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo discutem sobre um determinado assunto como, por exemplo, Lei Maria da Penha, Tratamento

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do Lixo Reciclado, Flotação do Rio Pinheiros, Nepotismo e a Profissionalização do Estado, Venda de Fardas Policiais, Habitação etc muitos dos programas com a participação de cidadãos e autoridades no assunto.

Os programas de natureza cultural são apresentados no formato de entrevistas, notícias e documentários, com predominância nas entrevistas como, por exemplo, o programa “Depoimento com Arte” analisado.

Os programas de serviços são apresentados no formato de documentários e debates sobre assuntos variados, com predominância nos debates como, por exemplo, Problemas de Coluna, Brinquedos Perigosos, Transplante de Órgãos, Pneus Velhos, Baixa Umidade do Ar, Código de Defesa do Consumidor, Rubéola, Cigarro/Prejuízos e outros.

Considerando-se o Manifesto pela TV Pública independente e democrática como parâmetro para esta análise, percebemos que no período analisado, concretizou-se sua função de promover a formação crítica do indivíduo para o exercício da cidadania e da democracia.

Também atendeu ao que se refere a diversidades de gênero, étnico-racial, cultural e social brasileiras, promovendo o diálogo entre as múltiplas identidades do país.

Contemplou também a produção regional apresentando, por exemplo, documentário sobre a vida de Vital Brasil, e sua atuação no Instituto Butantã. As obras públicas esculpidas pelo artista Victor Brecheret, encontradas na cidade de São Paulo, também foram apresentadas na programação durante o período analisado. A cidade de Ribeirão Preto, com depoimentos de seus moradores e historiadores foi um outro assunto em pauta na programação.

No item que a TV Pública deve ser independente e autônoma em relação a governos e ao mercado, verifica-se que todas as propagandas veiculadas durante o período compreendido da pesquisa, continham a chancela do governo do Estado de São Paulo e como escreveu Debord (1997, p. 30) “O espetáculo é o momento em que a mercadoria ocupou totalmente a vida social. Não apenas a relação com a mercadoria é visível, mas não se consegue ver nada além dela: o mundo que se vê é o seu mundo”. Neste item a dependência é do poder público, portanto, sua autonomia enquanto TV Pública não é atendida e contraria o Manifesto pela TV Pública independente e democrática.

A TV Pública analisada não atende ao critério de alcance a todos os cidadãos e cidadãs por estar sendo veiculado na TV a cabo, restrita a seus assinantes.

As recomendações e propostas em face ao processo de migração digital contidas no Manifesto pela TV Pública independente e democrática não foi analisada neste estudo por tratar-se de um projeto para o futuro e poderá ser objeto de continuidade deste trabalho. Referências

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PARTE III

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PROPAGANDA POLÍTICA E AÇÕES REGIONAIS

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Uma mulher de força na política limeirense. Um estudo sobre a trajetória

política e as estratégias de comunicação popular de Elza Tank

Carlos Fernando BOSCO1

Samia Cruañes de Souza DIAS2 Victor Kraide CORTE REAL3

Resumo

Este artigo tem o propósito de apresentar e relatar a história de uma mulher influente na

política e na sociedade limeirense: Elza Sophia Tank Moya. Durante sua trajetória política ela

sempre trabalhou com um tipo de marketing político baseado principalmente em sua intuição e

sensibilidade, fazendo uso de elementos relacionados com a comunicação popular e desenvolvendo

trabalhos antes, durante e após as eleições em prol da população carente da cidade. A

preocupação em ajudar ao próximo é uma característica defendida pela vereadora como sendo

parte de sua própria natureza, não estando relacionada simplesmente ao “fazer política”.

Palavras-chaves: Propaganda, Política, Folkcomunicação, Limeira.

Histórico

A vereadora Elza Sophia Tank Moya teve influência de seu pai Lázaro da Costa Tank e de seu avô João Kühl Filho, que foram vereadores de Limeira, para entrar no meio político, pois já participava da política desde seus nove anos de idade, fazendo companhia a seu pai nas reuniões partidárias.

1 Graduado em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda pelo ISCA Faculdades (Instituto Superior de Ciências Aplicadas – Limeira/SP) e Especialista em Gestão Estratégica de Comunicação pela METROCAMP (Faculdade Integrada Metropolitana de Campinas). Docente do curso de Publicidade e Propaganda da Anhanguera Educacional (Faculdade Comunitária de Santa Bárbara) e do Instituto Superior de Ciências Aplicadas (Limeira/SP). E-mail: [email protected] 2 Graduada em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda pela UNIP (Universidade Paulista) e Mestre em Comunicação Social pela UMESP (Universidade Metodista de São Paulo). Docente do curso de Publicidade e Propaganda da Anhanguera Educacional (Faculdade Comunitária de Santa Bárbara), das Faculdades Integradas Claretianas (Rio Claro/SP) e da Faculdade Prudente de Moraes (Itu/SP). E-mail: [email protected] 3 Graduado em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda pela UNIMEP (Universidade Metodista de Piracicaba) e Mestre em Comunicação Social pela UMESP (Universidade Metodista de São Paulo). Docente do curso de Publicidade e Propaganda da Anhanguera Educacional (Faculdade Comunitária de Santa Bárbara), do Instituto Superior de Ciências Aplicadas (Limeira/SP) e coordenador do curso de Publicidade e Propaganda da Faculdade Prudente de Moraes (Itu/SP). E-mail: [email protected]

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Naquela época, a vereadora nos conta que as eleições eram denominadas currais, nos quais somente as pessoas ricas podiam se candidatar e fechavam os seus votos com a população, principalmente com os trabalhadores de suas fazendas, garantindo assim a vitória nas eleições. Desta forma, tanto seu avô quanto seu pai entraram no meio político em oposição a essa forma de conquista de votos.

Outra influência que teve para entrar no meio político foi devido à Elza Tank ter nascido no dia 01 de junho de 1935, num asilo, construído por seu avô João Kühl Filho, onde passou toda a sua infância e adolescência, tendo contato com idosos e presenciando as condições de miséria que pela qual passavam, por serem abandonados por suas famílias. Neste asilo, sua família também abrigava mães solteiras, que naquela época eram expulsas de casa por seus pais, devido a fatores culturais brasileiros.

No asilo vi muita miséria, mas também tive muitas alegrias porque eu era menina e só conhecia aquele aspecto da vida e vivia entre os asilados tranquilamente, que entre eles também havia leprosos e pessoas com problemas de saúde mental, que naquela época eram chamados de loucos. Lá também tinha mulheres descendentes de escravos que gostavam muito de mim, me carregavam no colo, faziam bonecas para mim. Então, também fui muito feliz no asilo, por incrível que pareça, porque conforme fui crescendo, passei a ver muita miséria, o que acabou se perpetuando dentro de mim, por isso que tenho essa tendência, mesmo sendo política, de atender o meu semelhante4.

A vereadora Elza Tank passou a fazer parte da política logo após o falecimento de seu pai,

quando passou a trabalhar com o Dr. Jurandyr da Paixão de Campos Freire que conquistou a sua primeira eleição como prefeito de Limeira, em 1960, vencendo os candidatos mais ricos da cidade. Esta vitória aconteceu como conseqüência de Jurandyr Paixão ter realizado um trabalho como advogado dos operários da Máquina São Paulo e ter vencido todas as causas. Desta forma, os operários passaram a pedir que ele fosse candidato a prefeito da cidade de Limeira.

Neste período, Elza Tank ajudou Jurandyr Paixão durante a campanha eleitoral, trabalhando nos bastidores da disputa, o que favoreceu muito o interesse dela cada vez maior pela política. Com a vitória do então candidato a prefeito da cidade, ela trabalhou durante muito tempo como secretária, pois naquele tempo não havia distinção de setores, mas atuava no gabinete do Prefeito e já desenvolvia trabalhos de auxílio à população carente.

Desde seu início na vida pública, pertenceu ao PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro, do qual Jurandyr Paixão também era filiado, e foi uma das primeiras pessoas a fundar o partido na cidade de Limeira. No ano de 1982 resolveu disputar sua primeira eleição como candidata a vereadora da cidade a convite de Jurandyr.

Fui candidata à vereadora e muito preocupada, porque eu não achava que poderia ser como eu realmente era, embora gostasse muito da política. Fui muito bem votada porque também o Jurandyr me ajudou muito. Depois não parei mais, sendo a candidata mais votada na minha segunda candidatura no ano de 19885.

Conforme nos conta, Elza Tank passou a ser a vereadora mais votada em todas as eleições

em que se candidatou: 1988, 1992, 2000 e 2004. Já em seu primeiro mandato foi eleita presidente da Câmara Municipal de Limeira, com voto contrário apenas de dois vereadores, permanecendo no cargo durante todo o mandato, pois teve a presidência renovada depois de dois anos, quando

4 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira 5 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira.

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houve outra eleição e foi escolhida novamente, recebendo os votos de todos os homens, na época Elza Tank era a única mulher vereadora.

Logo em seguida (1988), venceu a segunda eleição como vereadora da cidade de Limeira, conforme relatado anteriormente, sendo a vereadora mais votada, desta forma, permaneceu por mais dois anos como presidente da Câmara Municipal.

Fiz uma presidência muito voltada ao bem social da população que me procurava. Realizava muitos atendimentos e acho que por isso também resolveram votar mais uma vez em mim. Eu era muito enérgica por ser mulher e estar no meio de muitos homens e acho que conquistei os vereadores por eu ser muito justa6.

No ano de 1994 foi eleita Deputada Estadual pelo PMDB e numa segunda disputa eleitoral, pelo mesmo cargo, acabou perdendo as eleições, conforme relata a seguir:

Perdi a eleição devido a fatores políticos enfrentados na época, porque a política gira muito, ela não é estática. Evidentemente passei por muitas traições, pois ela é um peso que o político carrega. Nunca um político pode acreditar piamente nas pessoas que o cercam, e às vezes, confiamos em pessoas erradas. Meu pai dizia sempre: a política é boa, às vezes os políticos não são bons7.

Elza Tank comenta que sempre busca fazer o melhor na Câmara Municipal, e luta por aquilo que realmente acredita, não se importando se vota contra sozinha ou mesmo se a opinião de outros vereadores é contrária a dela, porque procura discutir as idéias, não ficando calada e dizendo que irá votar contra quando achar que uma decisão não ajuda a população.Mostrando seu lado de personalidade forte e muitas vezes enérgica para fazer valer o bem social.

Dessa forma, fica evidenciada a habilidade de Elza Tank sobre o uso eficiente da linguagem e da comunicação para fazer valer seu ponto-de-vista, característica fundamental dos representantes políticos da população. É possível perceber assim que, mesmo fora os períodos eleitorais, ela se utiliza dos artifícios de propaganda e persuasão e, sobre a interrelação entre estas duas ferramentas da comunicação, é pertinente registrar a análise de Nelson Jahr Garcia:

A propaganda pode não ser eficaz e, assim mesmo, ficar caracterizada como tal. Por outro lado, pode haver persuasão e não existir propaganda quando não houve a intenção inicial. Todavia, não basta a emissão simples de mensagens sem nenhum cuidado. (...) só se pode verificar a intenção persuasiva se o emissor estiver apoiado num mínimo de precauções. (...) a eficácia ou não de sua campanha é difícil de ser verificada porque outras variáveis podem ter ocorrido para um determinado resultado (GARCIA, 1990, p. 20).

Mesmo fora da Câmara, Elza Tank apóia as pessoas, deixando transparecer seu lado

pessoal e emotivo, pois acha que deve ajudar o próximo inclusive quando está fora da política.

Recebo muita crítica por isso, porque as pessoas acham que o político deve apenas trabalhar na política e eu não acredito nisso. Acho que o político tem que trabalhar na política e continuar sendo o que é, com o coração, com a alma,

6 Ibid. 7 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira

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trabalhando a favor da população de uma outra forma. Ajudo pessoas doentes, pessoas necessitadas através de pedidos a amigos e não com ajuda financeira8.

A sensibilidade de Elza Tank e a naturalidade com que ela lida e se relaciona com as pessoas representa uma forma particular de comunicação. Esse tipo de proximidade com seu público receptor pode ser analisado no âmbito da ciência da comunicação a partir de uma corrente teórico-metodológica elaborada pelo recifense Luiz Beltrão e chamada de Folkcomunicação. Essa linha de pesquisa analisa os cruzamentos existentes entre a cultura popular e a cultura de massa, concentrando o foco na comunicação relacionada com o povo.

Atuação política

Durante seus mandatos realizou muitas benfeitorias para a população de Limeira, pois diz que não é uma política de grandes projetos, mas sim de muitas ações, sendo uma delas a implantação da primeira Delegacia de Defesa da Mulher no interior paulista, pedindo pessoalmente ao Michel Temer, então Secretário de Segurança do Estado de São Paulo, quando o mesmo fez uma visita à Limeira.

Três dias antes da visita de Michel Temer a cidade, sabendo que havia a intenção de uma instalação da Delegacia de Defesa da Mulher no interior, Elza Tank colocou nas ruas cerca de treze mulheres para arrecadar assinaturas apoiando a instalação da Delegacia em Limeira. Elza conseguiu cerca de 6.800 adesões para serem entregues pessoalmente ao Secretário de Segurança.

Elza nos conta ainda que, durante o almoço com todos os secretários, o atual prefeito de Limeira e com Michel Temer, conseguiu a conquista da Delegacia para a cidade. Pegou o microfone que passava ao lado dela e contou a história de uma mulher que, alguns dias antes, havia lhe procurado por ter perdido o pátrio-poder de seus filhos, por assumir no lugar do amásio que havia batido nas crianças. Em seguida entregou as 6.800 assinaturas e pediu para que a Delegacia de Defesa da Mulher fosse instalada em Limeira.

Outra grande ação da vereadora Elza Tank foi o desenvolvimento de campanhas de prevenção do câncer na mulher, viabilizadas através de uma grande amizade com um médico ginecologista, Dr. José Aristodemo Pinotti, então chefe do Hospital Pérola Byington da cidade de São Paulo e atual Deputado Federal pelo partido DEM - Democratas.

Elza Tank visitou aquele hospital e ficou emocionada devido ao tratamento dos médicos para com as mulheres, resolvendo assim desenvolver uma campanha de conscientização das mulheres em relação ao câncer e convidou seu amigo Dr. Pinotti para fazer o lançamento.

Naquele tempo, as mulheres não sabiam de seus direitos e não se cuidavam. Então eu fui de bairro em bairro, de escola em escola, tomei muito desaforo dos homens, porque eu ia bem no dia em que ocorriam as reuniões de pais nas escolas. Entrava nas salas e dizia às mulheres que elas deveriam se cuidar, fazer exames ginecológicos pelo menos uma vez por ano para que se prevenissem quanto ao câncer, informando que esta doença podia matá-las. E ainda falava: se vocês não se cuidarem, vocês vão morrer, seus maridos vão casar com outra mulher que vai judiar de seus filhos, só porque ele não quer que você faça o exame, sendo que você é a dona de seu corpo. Eu era dura para falar, não fazia uma palestra agradando as mulheres, fazia uma palestra séria, dizendo o que podia acontecer com elas9.

8 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira. 9 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira.

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Esta campanha tornou-se uma corrente, que se perpetua até os dias de hoje, as mulheres contavam para suas vizinhas e parentes sobre a necessidade da prevenção e, assim, de maneira geral a conscientização sobre os cuidados se propagou. Foi deixado um posto de saúde somente para realizar esses exames, os quais detectaram muitas mulheres com câncer que foram encaminhadas para Campinas e para o Hospital Pérola Byington em São Paulo. Ainda assim, quando a mulher não terminava o tratamento, recebia visitas de enfermeiras para dar acompanhamento. “Até hoje encontro mulheres na rua que me falam que estão fazendo exame. Isso me deixa muito feliz, porque foi uma campanha que deu resultado, na qual as mulheres aprenderam.”10.

Com este relato, fica evidenciada a força política da vereadora Elza Tank através dos trabalhos desenvolvidos durante todos os anos em que exerceu cargos públicos. É possível verificar, assim, a presença de um marketing político denominado “pós-eleitoral”, o mesmo ocorre no período em que o político exerce um cargo público, cumprindo compromissos de fato pertinentes às suas obrigações, mas que ao serem explorados como uma estratégia de comunicação eleitoral de longo prazo oferece um alto potencial de fidelização ao político.

O conceito de marketing eleitoral normalmente é descrito como uma variação do marketing político, estando particularmente preocupado com as estratégias mercadológicas adotadas pelos candidatos políticos durante o período que antecede uma determinada eleição. Porém os conceitos de marketing eleitoral e marketing político muitas vezes aproximam-se e são usados como se não houvesse distinção, pois muitos dos políticos conduzem sua vida pública como sendo um permanente processo eleitoral, ou seja, atitudes e manifestações diante da sociedade são enfatizadas durante um processo eleitoral. De fato, todo indivíduo que pretende ocupar cargos políticos deve estar preocupado em trabalhar seu marketing político diariamente (CORTE REAL et al, 2007, p. 29).

Outra conquista de Elza Tank por Limeira, foi no período em que foi Deputada Estadual

(1995 a 1998), trazendo a JUCESP – Junta Comercial do Estado de São Paulo, naquele tempo o prefeito de Limeira era Pedrinho Kühl (PSDB), governo de oposição. Nesta conquista, a deputada Elza Tank foi questionada, numa reunião na cidade de São Paulo, pelo Sr. Natan Chaves Junior, presidente da JUCESP/SP, querendo saber o motivo para Limeira não receber a Junta Comercial, pois ele tinha a informação de que não queriam ceder uma casa para tal instalação. Imediatamente, Elza Tank disse que Limeira tinha interesse e pediu para ele esperar que ela iria resolver o caso. Solicitou ao prefeito e aos empresários fortes da cidade que cedessem um local para a instalação da JUCESP.

Mais uma vez, Elza Tank mostrou a força de sua personalidade ao buscar benefícios para a cidade, independente de qual partido estivesse no poder. É capaz de mobilizar pessoas importantes da sociedade limeirense em busca de melhorias para a população.

Dessa forma, a vereadora atua como um tipo específico de formador de opinião, um líder de opinião folk, que exerce maior influência e transmite mais credibilidade que os tradicionais de formadores de opinião:

Enquanto no sistema da comunicação social é muito freqüente a coincidência entre os líderes de opinião e as autoridades políticas, científicas, artísticas ou econômicas, na folkcomunicação há maior elasticidade em sua identificação: os líderes agentes-comunicadores folk, aparentemente, nem sempre são

10 Ibid.

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“autoridades” reconhecidas, mas possuem uma espécie de carisma, atraindo ouvintes, leitores, admiradores e seguidores, e, em geral, alcançando a posição de conselheiros ou orientadores da audiência sem uma consciência integral do papel que desempenham.

Mudança e atuação partidária

É importante relatar que durante seu mandato como Deputada Estadual, Elza Tank deixou o PMDB devido a pressões que sofreu na época por não querer assinar um documento que estava sendo obrigada. Desta forma, ficou durante um bom tempo na Assembléia Legislativa sem partido, e mais tarde, foi convidada pelo Deputado Campos Machado, a fazer parte do PTB – Partido Trabalhista Brasileiro, no qual está filiada até os dias de hoje.

O Campos Machado sempre dizia que eu era a mais desobediente do partido, porque ele conseguia controlar os deputados, mas eu não. Sempre tive opinião própria também como deputada. Muitas vezes não votei a favor daquilo que era para ser votado. Eu nunca tive muita obediência a partido e acredito que até hoje ainda não tenha. Mas hoje em dia temos que ter a fidelidade partidária e respeito isso11.

A partir desse momento, Elza Tank também passou a ocupar o cargo de Presidente do partido PTB Mulher, o qual mantém até hoje, e diz que funciona da forma como ela é: atendendo mulheres e crianças que possuem problemas de saúde. Além deste cargo, Elza Tank também é Presidente de Honra da AMTESP – Associação das Mulheres Trabalhistas do Estado de São Paulo que, como próprio nome diz, busca trabalhar seriamente para que as mulheres garantam seus direitos. Atualmente é presidente regional do PTB.

Este trabalho junto a AMTESP é realizado porque as mulheres carentes ainda não perceberam do que são capazes, pois trabalham fora, cuidam de suas casas e não sabem de seus direitos. Muitas vezes as mulheres nos procuram para conversar, tanto em São Paulo como aqui em Limeira, e procuramos aconselhá-las e explicar, mas as mulheres ainda são temerosas. Sabemos que, infelizmente, a cultura brasileira ainda não chegou numa situação em se que possa dizer para essas mulheres: coragem, vamos seguir em frente, nós e nossos filhos. Porque o filho também aprisiona a mulher, por ela ser mais emotiva, mais chorona e desta forma, acaba renunciando muitas coisas pelos filhos12.

Sempre pensando no bem-estar das mulheres, Elza Tank lutou pela instalação da Casa Transitória da Mulher e finalmente, em sua atual gestão como vereadora, conseguiu esta conquista para Limeira.

A Casa Transitória da Mulher é um abrigo para as mulheres que são violentadas por seus maridos. Após realizarem um boletim de ocorrência na Delegacia de Defesa da Mulher, elas são abrigadas e amparadas para não voltarem ao mesmo lar em que sofriam, até a conclusão dos inquéritos policiais e os devidos julgamentos.

Esse exemplo foi visto em São Paulo, onde as mulheres apanhavam dos maridos, faziam o BO e voltavam para a mesma casa onde tinham sofrido

11 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira. 12 Ibid.

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ameaças. E lá, foi então instalada a Casa Transitória, para que as mulheres ficassem abrigadas até que fosse realizado todo o processo de justiça. E mesmo por São Paulo ser muito grande, os maridos encontravam as casas onde suas esposas estavam abrigadas. E hoje conseguimos instalar aqui em Limeira e agradeço muito ao prefeito Silvio Félix por ter realizado este trabalho. Felizmente ainda nenhum marido apareceu por lá13.

Além desta conquista para as mulheres de Limeira, Elza Tank foi convidada pelo atual prefeito Silvio Félix para ocupar a Secretaria da Saúde, onde realmente pôde verificar que não precisava fazer política para agradar os outros, mas sim cobrar os direitos da população. Durante a ocupação deste cargo, Elza Tank conseguiu diversos benefícios para a saúde da cidade, sendo um deles a realização de um sonho, que foi conquistado juntamente com o atual prefeito, de implantar o Centro de Atenção à Saúde da Mulher, chamado por ela como Hospital da Mulher. Este centro tratará de mulheres com gravidez de alto risco, mulheres com câncer e as diversas doenças que as mulheres estão sujeitas. Ele já está pronto, mas ainda não pôde ser inaugurado devido ao atual período eleitoral.

Elza Tank foi Secretária da Saúde por pouco tempo, pois precisava voltar à Câmara Municipal de Limeira para se candidatar novamente a vereadora nas eleições que ocorrerão neste ano de 2008. Eleições 2004

Elza Tank faz da política uma escola, pela qual aprende o que deve fazer e de que forma deve votar, sempre citando o aprendizado que teve com seu pai, tendo isso como uma direção em tudo o que realiza.

Para mim a política é muito séria e acho que hoje em dia, ela está muito baseada em questão de dinheiro. Eu não posso conversar com pessoas que dizem que a política é muito ruim, porque as pessoas dizem que nunca querem ser políticas. E essas pessoas que se julgam boas não são candidatos. Eu falo muito sério nas reuniões que realizo que se as pessoas tivessem coragem de serem candidatas, talvez nós tivéssemos uma política muito melhor. Por infelicidade nossa, tem aqueles corruptos, tem os políticos que traem, tem políticos que só vêem a si mesmos. Política não se faz fora da sessão, e se costuma fazer. Acho que o político tem que ser amigo daquelas pessoas que ele queira ser, independente de partido político. A política hoje em dia está muito raivosa, cheia de denúncias, sendo que muitas vezes, quem denuncia também deve, conforme vemos nos jornais o que está acontecendo com os políticos em Brasília14.

Em 2004, foi mais uma vez candidata a vereadora na cidade de Limeira e ganhou a eleição com 4.379 votos, sendo a concorrente mais votada da cidade. O segundo colocado foi o candidato Eliseu Daniel dos Santos (PSDB), que totalizou 3.541 votos.

Limeira possuía, no ano de 2004, 171.815 eleitores e 282 candidatos a vereador, conforme dados coletados no Jornal de Limeira, com informações fornecidas pelo TSE - Tribunal Superior Eleitoral.

13 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira. 14 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira.

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Naquelas eleições, podemos verificar um grande número de abstenção de eleitores, 34,1% maior do que o registrado nas eleições ocorridas em 2000, fator este que compromete a vitória dos candidatos.

Balanço Geral das Eleições de 2004 – (Cargo de Vereador)

Total de candidatos na urna eletrônica 282

Total de votos apurados (100%) 149.565

Votos nominais 125.780

Votos de legenda 11.712

Votos válidos (nominais + legenda) 137.492

Votos em branco 7.241

Votos nulos 4.832

Seções totalizadas (100%) 372

Comparecimento 149.565

Abstenção 22.250 Fonte: Jornal de Limeira, 5 de outubro de 2004, p.6.

A propaganda política muitas vezes procura atribuir valores questionáveis a um

determinado candidato, com o intuito de influenciar uma decisão que está relacionada à busca, através do voto, da opção que aparentemente melhor satisfaça as necessidades dos cidadãos. Mas, de acordo com Carlos Eduardo Lins da Silva, na obra “O Marketing Eleitoral” (2002), as motivações que levam os eleitores a escolherem um candidato são muito diferentes daquelas que levam um consumidor a comprar um sabonete. Lins da Silva considera o mundo da política, e as diferentes percepções que cada um de nós tem sobre o assunto, como sendo algo bastante complexo, impossibilitando que uma teoria simplista seja sustentada a partir da defesa de que o marketing é uma “atividade mágica” capaz de decidir eleições. Neste sentido, somente uma “pessoa imbecilizada escolheria um governante com os mesmos critérios com que elege a marca de seu sabonete”, acreditar nisso seria subestimar “até o mais baixo ponto a capacidade de raciocinar do cidadão” (LINS DA SILVA, 2002, p.13).

A partir dos dados levantados, através de pesquisa nos dois principais veículos impressos da cidade de Limeira: Gazeta de Limeira e Jornal de Limeira, foi possível verificar a presença de diversos anúncios de candidatos a vereador. No entanto, Elza Tank relacionou-se de modo contrário quanto ao uso da mídia para propaganda eleitoral.

Foram encontrados apenas três inserções no Jornal de Limeira, medindo cada uma delas 13cm x 2col, da candidata Elza Tank no período de campanha eleitoral ocorrido entre 6 de julho e 3 de outubro de 2004. Estes anúncios continham os seguintes dizeres: “Falo o que penso e faço o que falo”, mostrando a personalidade forte que a vereadora possui.

Mesmo sem anúncios em jornais, Elza Tank apareceu em primeiro lugar na pesquisa de intenção de voto para vereador de limeira, realizada pelo instituto de pesquisa Datacorp, ligada à Rede Anhangüera de Comunicação (RAC), publicada no Jornal de Limeira (05 set 2004, p. 7).

Nesta pesquisa, Elza Tank apareceu com 8,13% de intenção de votos, enquanto a segunda colocada, Iraciara, contava com 4,07%. Isto comprova o reconhecimento da população limeirense pelos trabalhos realizados por Elza Tank durante toda sua trajetória política.

A opção em não utilizar tanto da comunicação de massa e dos meios midiáticos durante a campanha eleitoral e, mesmo assim, registrar uma trajetória política bem sucedida comprova a afirmação de Rubens Figueiredo e demonstra a força das estratégicas de comunicação popular e interpessoal:

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O eleitorado está cada vez mais atento, recusando votar em candidatos cujas campanhas são repletas de „truques‟ para confundir, quando não enganar, o eleitor. O “marketismo” tem um duplo – e definitivo – defeito. Não é construtivo para a democracia que o suporta. Nem eficiente para os candidatos que o adotam (FIGUEIREDO, 2000, p. 39).

Nelson Jahr Garcia (1990, p. 71) analisa com bastante critério a capacidade persuasiva e

de manipulação ideológica dos meios de comunicação de massa. Ele acredita que a mídia pode exercer algum controle ideológico sobre o espectador quando este evita fazer qualquer análise ou discussão mais profunda daquilo que está assistindo. Quando o modelo informativo vigente transforma em espetáculo os fatos sociais, pode abalar de certa forma a credibilidade sobre uma certa versão ideológica da realidade.

Ao ser questionada sobre as estratégias eleitorais adotadas, Elza Tank relata que ficou muito mais difícil para candidatos a vereador trabalharem com propaganda devido às novas leis eleitorais, mas que, mesmo assim, desenvolve reuniões com os eleitores, em forma de bate-papo, respondendo às questões a ela dirigidas. Passeia pelas ruas do centro da cidade e realiza visitas aos bairros.

O que mais me agrada, e se é marketing o que estou fazendo, é sair nas ruas e ser abraçada por tanta gente. Crianças chamando o meu nome, que já é uma outra geração, que não deveria me conhecer, mas que os pais provavelmente falaram. E fico gratificada não como política, mas como ser humano. Volto para casa feliz da vida e ainda brinco com as mães dizendo que beijo de criança é sincero15. Faço questão de não fazer meu nome em época de campanha eleitoral, quero ser reconhecida pela população pelo trabalho que desenvolvo, sempre lutando pelo melhor da população. E meu pai sempre me dizia: as coisas boas que você fez você esquece, e as coisas que você não fez deve lembrar e verificar se há possibilidade de fazê-las16.

Não podemos negar que o desenvolvimento dos meios de comunicação eletrônicos trouxe alguns benefícios para a democracia e para a prática do marketing político. É possível perceber que hoje é muito mais fácil conhecer as idéias dos diversos candidatos políticos através da televisão e da internet, do que nos deslocarmos até os comícios ou dependermos exclusivamente daquilo que está escrito nos santinhos. Segundo Lins da Silva (2002, p. 78), o que a pesquisa sobre o marketing político aponta “é que os meios eletrônicos, como os comícios do passado, funcionam muito mais para cristalizar atitudes e opiniões antes assumidas do que para alterá-las”. Diante disso, o uso de estratégias consistentes de relacionamento interpessoal e de ações alternativas de comunicação, não midiática e popular, como as praticadas por Elza Tank ao longo de sua vitoriosa trajetória política, representam uma importante contribuição aos pesquisadores e profissionais do marketing político.

Referências bibliográficas

CAMARGO, Nani. 72 mulheres disputam uma das vagas no legislativo. Limeira: Jornal de

Limeira, 18 set. 2004, p. 9.

15 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira. 16 Entrevista concedida aos autores desta pesquisa no dia 07/09/08, em Limeira.

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CORTE REAL, Victor Kraide; DIAS, Samia Cruañes de Souza; DIAS, Fábio. A manutenção do

marketing político via web no período entre as eleições. Anuário da Produção Acadêmica

Docente. V. 1, N. 1. Anhanguera Educacional, 2007, p. 28-35.

FIGUEIREDO, Rubens. O marketing político: entre a ciência e a falta de razão. In: Marketing

político e persuasão eleitoral. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2000.

GARCIA, Nelson Jahr. Sadismo, sedução e silêncio: propaganda e controle ideológico no Brasil

(1964-1980). São Paulo: Edições Loyola, 1990.

GAZETA DE LIMEIRA. Veja os votos dos candidatos a vereador. Limeira: Gazeta de Limeira, 04

out. 2004, p.9.

JORNAL DE LIMEIRA. 58% não definiram em quem votarão para vereador. Limeira: Jornal de

Limeira, 05 set 2004, p.7

____________________. Saiba quem é a DataCorp. Limeira: Jornal de Limeira, 04 set. 2004, p.7.

____________________. Lista de votos dos candidatos a vereador de Limeira. Limeira: Jornal

de Limeira, 05 out. 2004, p. 6.

LINS DA SILVA, Carlos Eduardo. O marketing eleitoral. São Paulo: Publifolha, 2002 – (Folha

Explica).

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Projeto Cimento Social no Morro da Providência e

a pré-eleição na capital fluminense

Plínio Marcos Volponi LEAL1

Resumo

Este ensaio discute o Projeto Cimento Social, de autoria do senador Marcelo Crivella, que

tem como objetivo a revitalização de casas no Morro da Providência no Rio de Janeiro. Essa

iniciativa ficou famosa em junho de 2008, posteriormente ao ato dos militares, que faziam a

segurança no local, de terem entregado três jovens a traficantes do morro rival. Durante a discussão

da retirada ou não do exército, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE/RJ) recebeu a denúncia de que o

senador Crivella estaria fazendo do projeto sua campanha eleitoral e distribuindo panfletos, anterior

ao prazo permitido para tal. Dias anteriores a esse episódio, o parlamentar tinha se lançado pré-

candidato à prefeitura da capital fluminense. A mídia parece não ter economizado ao declarar tal

fato como uma atitude eleitoreira.

Palavras-chave: Projeto Cimento Social, Marcelo Crivella, Morro da Providência, Cobertura

Mediática, Eleição 2008.

Introdução

A segurança pública nunca esteve tão presente na mídia como nos dias atuais. Tanto em jornais impressos, revistas quanto em telejornais, observa-se o grande número de matérias policiais. Ao mesmo tempo, é notória a violência que ocorre na cidade do Rio de Janeiro, criando até uma imagem na percepção dos brasileiros de que lá é um ambiente muito perigoso. A violência, pelo menos na mídia, é freqüentemente ligada à população desfavorecida financeiramente que cometem crimes. “Já que não tem dinheiro, a única solução é o roubo”: essa é a leitura feita pela maioria dos brasileiros. Tem-se também a crença de que as medidas educativas e projetos sociais podem trazer melhorias para tais regiões. Porém, o cenário se apresenta difuso, visto que há interesses privados que permeiam o processo de combate à violência.

Neste estudo, discutimos o Morro da Providência e o Projeto Cimento Social de autoria do senador Marcelo Crivella. Como ponto de partida, apresentamos a formação histórica de uma das favelas mais perigosas da capital fluminense; em seguida, debatemos o Projeto Cimento Social e sua aprovação pelo Senado; e, finalizamos com a discussão sobre o papel e a atuação do Exército na segurança pública, em especial no caso que culminou na morte de três jovens do Morro da Providência em 14 de junho de 2007. Para arrematar essas questões, trazemos a cobertura mediática da interrupção da continuação do Projeto Cimento Social pelo TRE/RJ, devido ao início

1 Mestre em Comunicação - UNESP – SP - [email protected]

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dessas obras ser em um ano eleitoral e a utilização do projeto pelo seu autor, e pré-candidato à prefeitura, para fazer propaganda eleitoral antecipada. O Morro da Providência

No início de sua organização, o Morro da Providência, como é conhecido atualmente, era popularmente denominado Morro da Favella. Sua história faz-se necessária para compreender a noção do que se entende por “favela”. Fazendo um breve relato histórico, havia no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, crises de crescimento populacional e, conseqüentemente, problemas com a habitação na cidade. As pessoas passaram a se organizar em estruturas de moradias populares coletivas, conhecidas como “cortiços” – considerados uma semente da favela atual.

Havia um temor geral, principalmente dos políticos, com os cortiços porque eles estavam localizados na região central e podiam ser locais de abrigo de assassinos e de pervertidos, sem contar que representavam um afrontamento à saúde pública. “Caracterizado como verdadeiro „inferno social‟, o cortiço era tido como antro não apenas da vagabundagem e do crime, mas também das epidemias, constituindo uma ameaça às ordens moral e social” (VALLADARES, 2000, p.7). O discurso de higiene pública culminou na lei que proibiria a implantação de novos cortiços e na demolição do cortiço Cabeça de Porco em 1893:

O prefeito Candido Barata Ribeiro (1843-1910) justificou o desalojamento de cerca de duas mil pessoas em nome da higiene pública. (...) Um grupo de ex-moradores do Cabeça de Porco conseguiu autorização para levar consigo ripas de madeira – muitos quartos ali se assemelhavam aos barracões das futuras favelas. Caminharam então poucos metros até o Morro da Providência, onde levantaram novas moradias. (...) Pouco tempo depois, em 1897, soldados retornados da Guerra de Canudos instalaram-se no já habitado Morro da Providência. (MATTOS, 2007)

Quanto à nomeação do morro como Morro da Favella, e posteriormente Morro da Providência, há uma diversidade de opiniões, sendo que duas, ligadas ao conflito de Canudos, parecem ser as mais freqüentes, divergindo-se apenas seu enfoque. Uma diz respeito à vegetação e a outra ao simbolismo da topografia.

Primeiro, a existência neste morro da mesma vegetação que cobria o morro da Favella do Município de Monte Santo, na Bahia; segundo, o papel representado nessa guerra pelo morro da Favella de Monte Santo, cuja feroz resistência retardou o avanço final do exército da República sobre o arraial de Canudos. Se, no primeiro caso, a explicação está baseada numa similitude tout court, no segundo, a denominação morro da Favella vem revestida de um forte conteúdo simbólico que remete à resistência, à luta dos oprimidos contra um oponente forte e dominador. (VALLADARES, 2000, p. 9)

Muitas são as críticas quanto à associação à vegetação porque não haveria no Rio de

Janeiro tal planta leguminosa do sertão, a qual se dá o nome de faveleiro ou favela, mas teria apenas uma vegetação rasteira que lembraria a região nordestina. A versão mais aceitável é a posição estratégica do Morro no Rio semelhante ao que os ex-combatentes ocuparam na serra baiana. “Isolado, oculta de quem olha de baixo o que se passa em cima” (VALLADARES, 2000, p. 11). Já o nome Providência, como é conhecida a região hoje, passou a ser utilizado depois da década de 1920, como referência a um rio das proximidades de Canudos. Tais características e

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denominações podem ser encontradas em “Os Sertões” de Euclides Cunha, obra clássica da literatura nacional.

Muitos historiadores não defendem o Morro da Providência como a primeira organização conhecida como favela, mas concordam que foi aquela que teve maior visibilidade. Isso porque outras regiões já apresentavam uma organização semelhante em morros. De qualquer forma, “o nome próprio „Morro da Favella‟ passou-se ao substantivo „favela‟, o qual serviria desde então para denominar os casos cada vez mais freqüentes de terra invadida e/ou ocupada ilegalmente por moradias precárias e população pobre” (PRETECEILLE; VALLADARES, 2000, p. 461). É a partir dessas concepções que se surgiu o arquétipo de favela.

A esses espaços se associaram representações que serviriam para identificar a favela: ocupação ilegal, situada nas encostas de um morro ou localizada em bairro relativamente central, com moradias precárias, sem infra-estrutura e serviços urbanos. O favelado, morador da favela, passou a simbolizar o migrante pobre, semi-analfabeto, biscateiro, incapaz de se integrar e se adaptar ao mercado de trabalho da cidade moderna, industrial. A fórmula „favela é igual a pobreza‟ logo se tornou consensual, sendo compartilhada pelo meio acadêmico e político e sendo difundida pela mídia. (PRETECEILLE; VALLADARES, 2000, p. 461-462)

Além da ilegalidade, havia também o problema da violência urbana e da criminalidade: “No fim da década de 1900, o Morro da Favela passou a ser considerado o lugar mais perigoso da capital, reforçando a má fama conquistada por seus moradores depois da participação na Revolta da Vacina, em 1904” (MATTOS, 2007). Nos anos que se seguiram, houve várias ações governamentais para promover o fim das favelas, como o Código de Obras de 1937 que vedava qualquer tipo de melhoramento nesses locais. Mais recentemente, as políticas públicas envolvem principalmente o aperfeiçoamento desses espaços, e não mais a sua remoção, como o projeto Favela-Bairro que foi implantado no Morro da Providência.

Foram investidos no Favela-Bairro da Providência R$ 14 milhões que foram usados não só na construção de redes de água e esgoto, praças e creche, como acontece nas demais favelas, mas também na viabilização de um “roteiro turístico” que instituiu a localidade como atração. Neste contexto, foi inaugurado um cybercafé e “pontos históricos” foram recuperados: a igreja de Nossa Senhora da Penha (que abriga imagens sacras valiosas); a centenária capela do Cruzeiro; a escadaria de granito construída por escravos no século 17; a casa de Dodô da Portela, porta-bandeira campeã do primeiro desfile oficial; o antigo reservatório de água. (FREIRE, 2006, p. 17)

Outras políticas são implantadas nas regiões mais carentes do Rio de Janeiro, mas o foco parece ser as favelas e o combate ao tráfico. Por exemplo, no Morro da Providência atua a facção criminosa conhecida como Comando Vermelho (CV). As pessoas dessa favela convivem constantemente com drogas e traficantes armados. Um dos projetos que buscam melhorar as condições precárias e dar uma visibilidade mais positiva ao Morro da Providência é conhecido como Cimento Social. Projeto Cimento Social

Em 13 de Setembro de 2007, o senador do Partido Republicano Brasileiro Marcelo Crivella (PRB/RJ) fez uma proposta de sua autoria intitulada como “Programa de Melhoria Habitacional em

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Áreas Urbanas de Risco com participação do Comando do Exército”. Nela entende-se por área urbana de risco “as favelas localizadas nas áreas urbanas com índices de criminalidade superiores à média local” (CRIVELLA, 2007b).

O objetivo do programa é a execução de obras de recuperação, adequação, conclusão, reforço estrutural e melhoria de habitações individuais e coletivas, utilizando mão-de-obra local. Os recursos seriam provenientes da conta do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social e de parte do orçamento geral da União. A justificativa da implantação do projeto, segundo o senador carioca, é que:

Nas periferias „enfaveladas‟, predominam altos índices de criminalidade, numa brutal realidade de violência e mortes. É certo que a maioria dos crimes, no País, acontece em vilas e favelas dos grandes centros urbanos. Ademais, pesquisas indicam que, no Brasil, grande parte dessas mortes podem ser atribuídas à sangrenta realidade do tráfico de drogas. Assim, o Programa de Melhoria Habitacional em Áreas Urbanas de Risco além de proporcionar a melhoria da qualidade de vida das famílias que habitam comunidades carentes, reveste-se, também, de importante estratégia para o assenhoreamento territorial. Por seu intermédio, o Estado, de forma pacífica e companheira, acomodará seu poder nas áreas dominadas por facções criminosas. É, portanto, com esse propósito que a gestão do programa é confiada ao Comando do Exército, que além de atender à questão estratégica, tem larga experiência em obras de engenharia. Por essas razões, o programa difere positivamente dos demais programas habitacionais tradicionais. (CRIVELLA, 2007b)

No Senado, o PSL 541 tramitou na CRE (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional), na qual o relator foi o senador Almeida Lima (PMDB-SE), depois seguiu para a CAS (Comissão de Assuntos Sociais), na qual coube a ela a decisão terminativa que foi favorável. Dessa forma, o Projeto Social não foi levado ao Plenário, isso porque a decisão terminativa é tomada por uma comissão, com valor de uma decisão do Senado. Cabe esclarecer que alguns projetos não vão a Plenário, são enviados diretamente à Câmara dos Deputados e encaminhados à sanção, sendo promulgados ou arquivados. Eles somente serão votados pelo Plenário do Senado se houver um recurso com esse objetivo, assinado por pelo menos nove senadores e for apresentado ao presidente da Casa. Sendo assim, o PSL 541 foi aprovado.

Para a implantação do Projeto Cimento Social em 782 casas foi realizado um convênio de 12 meses entre o Exército, do Ministério da Defesa, e o Ministério das Cidades, assinado no dia 31 de janeiro de 2008 - em pleno ano eleitoral. Segundo os dados divulgados pela Agência Brasil, órgão oficial do governo, as obras seriam executadas pelo Batalhão Escola de Engenharia do Exército e pela Comissão Regional de Obras da Primeira Região Militar e a verba, no valor de R$ 12 milhões, viria do Ministério das Cidades. Porém, a operação teve início no dia 13 de dezembro de 2007, quando cerca de 200 soldados subiram o Morro da Providência. Vale lembrar que o Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar, unidade de elite da polícia fluminense, ocupou o morro dois dias antes “para garantir a segurança nos locais das obras, uma vez que a favela é dominada por uma facção criminosa” (AGÊNCIA BRASIL, 2007b). Posteriormente, a segurança dos canteiros das obras ficaria a cargo da Nona Brigada de Infantaria Motorizada do Exército e da Secretaria Estadual de Segurança. Essa foi a segunda vez que o Exército subiu no Morro da Providência para a realização de uma tarefa. Na primeira, em março de 2006, foram recuperados 10 fuzis roubados de um quartel após tiroteios com traficantes.

A justificativa para a presença do Exército é a de garantir a segurança dos trabalhadores, materiais e equipamentos. A reação dos moradores foi compatível com a recente lembrança dos tiroteios que houve cerca de dois anos antes. Uns estavam em pânico, mas outros até apostavam

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na missão positiva que o Exército estava disposto a fazer. Segundo o morador Elson Vieira de Oliveira, em entrevista para a Agência Brasil (2007a): “Se for para ter melhoras, vamos gostar e aplaudir. Mas para piorar, é melhor deixar como está”. E, na mesma matéria, o coronel do Comando Militar do Leste, Carlos Barcellos explicou que a participação do Exército “é ser a mão amiga. Vamos realizar ações cívicas e sociais. Trazer nossos médicos e dentistas, fazer recreação com as crianças, recuperar creches e associação dos moradores. Tudo para estreitar os laços com a comunidade.” (AGÊNCIA BRASIL, 2007a).

Em um discurso no Senado no dia 05 de dezembro de 2007, anterior à subida do Exército no Morro da Providência, o autor do projeto Marcelo Crivella (PRB/RJ) ressaltou os pontos positivos agregados à implantação do Cimento Social:

Esse projeto prevê o resgate histórico de revitalização daquelas casas, colocação de telhados para que não haja ali naquelas lajes a proliferação da dengue, que é um caso de saúde pública nacional cada vez mais grave; ele também evitará o crescimento vertical das comunidades, em cujas casas estarão sendo trocadas todas as esquadrias, portas, janelas, fazendo emboços, o que daria melhores condições de habitabilidade, melhorando os acessos e possibilitando também acesso à Internet, à banda larga. (CRIVELLA, 2007a)

Esse projeto abrange, ainda, a urbanização do local e o reflorestamento, como a instalação de postes de iluminação e um sistema de proteção para a rede elétrica e telefônica. Entre os outros benefícios do projeto e da presença do Exército no Morro, estão a desativação de pontos de vendas de drogas e o fim da circulação de olheiros e soldados armados do tráfico. O Exército aproveitou a sua instalação no Morro por um ano inteiro e patrocinou uma ação cívico-social junto à região com início em 19 de fevereiro de 2008. De acordo com O Dia On-line (2008), nessa ação estaria envolvidos outros 150 militares das áreas de saúde e infra-estrutura, que ofereceriam “consultas médicas, atendimento odontológico e entregas de medicamentos aos moradores, além da restauração de equipamentos públicos, como praças, igrejas e a caixa-d´água principal”.

Em 28 de março, um mês e alguns dias após a instalação dessa iniciativa do Exército, o ministro das Cidades Marcio Fortes de Almeida, o vice-presidente da República José Alencar e, seu companheiro de partido, o senador Marcelo Crivella visitaram as obras do projeto e conversaram com moradores locais. Na ocasião, o ministro declarou que “o Exército não é inimigo. Aqui ele não sobe com arma, ele sobe com flor, porque ele está coordenado as obras que vão reverter em qualidade de vida” (AGÊNCIA BRASIL, 2008).

O episódio

No dia 14 de Junho de 2008, três jovens voltavam de um baile funk quando foram abordados por uma patrulha do Exército na entrada do Morro da Providência. Segundo os depoimentos, eles teriam desacatado a autoridade dos militares. Desse local, eles teriam sido encaminhados ao quartel do Exército para conversarem com o comandante da tropa, de onde teriam sido liberados sem punição após serem ouvidos. Alguns soldados teriam ficado inconformados e queriam dar um corretivo nos jovens. Então, eles levaram os jovens ao Morro da Mineira, no Catumbi, e os entregaram ao grupo de traficantes ADA (Amigos dos Amigos) que são rivais do Comando Vermelho do Morro da Providência. No dia seguinte, os corpos dos três jovens foram encontrados em um lixão, com várias marcas de tiros. A população local reagiu jogando pedras nos militares e depredando nove ônibus.

A partir de então, virou tema público a atuação do Exército na segurança pública. Por um lado, é legal a participação das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem (LEI COMPLEMENTAR, 1999). Por outro, não há uma definição constitucional clara sobre o papel do

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Exército, já que se entendia que é a organização policial que está treinada e preparada para atuar diretamente com a sociedade civil. Esse desvio da função militar gerou uma pressão para que fosse legalizada a participação de soldados em ações de segurança pública, por exemplo, ao especificar as ações e prazos do Exército e/ou criar uma lei que tipificaria o crime de milícia.

Em 16 de junho, três soldados envolvidos com o episódio teriam confessado o crime à polícia. Foi declarada, então, a prisão preventiva dos onze militares envolvidos, sendo um tenente, três sargentos e sete soldados. Mais de mil pessoas acompanharam o enterro dos três jovens. No dia seguinte, o ministro da Defesa Nelson Jobim subiu ao Morro da Providência para pedir desculpas aos parentes das três vítimas e afirmar que o ocorrido foi um desvio de conduta isolado e não haveria motivos para a saída do Exército do local. Também, nessa data, foi criada uma comissão externa à Comissão de Segurança Pública do Congresso para acompanhar o envolvimento dos militares na morte dos três jovens. O projeto, que teve grande repercussão mediática, passou a ser visto como suspeito de fazer parte de um esquema político da prefeitura do Rio de Janeiro. E a população, por sua vez, estava revoltada e pedia a expulsão dos militares do Morro.

No dia 18, a Justiça Federal acatou a ação da Defensoria Pública da União, pedido por André Ordacgy, e determinou a saída imediata dos militares do Morro da Providência. A juíza federal da 18ª Vara Federal do Rio, Regina Céli Medeiros de Carvalho, determinou a troca do Exército pela Força de Segurança Nacional para realizar o policiamento, já que os trabalhadores estavam autorizados a retomarem as obras. Antes da decisão, o presidente Luiz Inácio “Lula” da Silva havia afirmado que o Estado deve indenizar as famílias das vítimas. Ele também defendeu a continuação do projeto, com ou sem soldados no local, e reforçou que o erro foi provocado por quem estava no comando e não uma falha do Exército.

No dia seguinte, a polícia concluiu o inquérito sobre o crime e indiciou os onze militares por triplo homicídio triplamente qualificado, ou seja, com os agravantes: motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa das vítimas. Se condenados, a pena poderia chegar a 30 anos de prisão. No dia 20 de junho, o Tribunal Regional Federal suspendeu por uma semana a decisão da juíza, determinando que o Exército reposicione sua tropa para a rua Barão da Gamboa, na parte baixa da favela, onde está o canteiro de obras do projeto Cimento Social.

Denúncia Eleitoral e a cobertura mediática

No dia 24 de junho, o Tribunal Regional Eleitoral embargou as obras do Projeto Cimento

Social depois de ter recebido uma denúncia anônima de uso eleitoral da máquina pública, sendo o beneficiado o pré-candidato à prefeitura do Rio Marcelo Crivella. O senador Crivella, antes do período permitido de campanha política, teria produzido um folheto com fotos do Morro da Providência, antes e depois do projeto de sua autoria. E, para o juiz responsável pela propaganda eleitoral, o convênio entre os Ministérios foi adotado em pleno ano eleitoral, o que é proibido pela Lei 9.504 de 1997. A Justiça Eleitoral ordenou que ao senador Marcelo Crivella interrompesse a distribuição dos “santinhos” e desse explicações em até 48 horas. Em nota à imprensa, ele divulgou que lamentava a determinação do TRE que interditava as obras do Projeto Cimento Social

Respeito e acato a decisão da Justiça Eleitoral que determinou a suspensão das obras do projeto Cimento Social, realizadas pelo Exército brasileiro no Morro da Providência. Lamento, no entanto, que obra tão importante para a melhoria das condições de vida de 782 famílias tenha sido paralisada, por causa da contaminação do debate político provocada pela proximidade da disputa eleitoral; as obras foram propostas ao presidente Lula em maio de 2007 mais de um ano atrás e iniciadas em dezembro de 2007. Lamento ainda que a

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suspensão da reforma das casas possa deixar sem emprego cerca de 150 trabalhadores contratados para trabalhar na recuperação da estrutura e da fachada das casas, inclusive moradores do próprio Morro da Providência. Por último, nego qualquer conotação eleitoreira do projeto Cimento Social, que pretendo ver transformado em lei, conforme o projeto de número 541/2007, que apresentei no Senado Federal em setembro do ano passado. O projeto estende os benefícios do Cimento Social a todas as áreas de risco das grandes cidades brasileiras. (CRIVELLA, 2008)

Vejamos trechos da cobertura mediática sobre esse caso, veiculados no dia 25 de junho de

2008. A começar pela revista semanal de maior circulação nacional:

Esse projeto, chamado Cimento Social, foi idealizado como propaganda política do senador Marcelo Crivella, candidato do Palácio do Planalto à prefeitura do Rio de Janeiro (...) Na Providência, o Exército não poderia fazer ações destinadas à manutenção da ordem, muito menos em nome de ajudar populações desvalidas, servindo a um dos mais escandalosos casos de favorecimento político já vistos, e isso num país onde a concorrência nesse campo não é fácil. O Cimento Social é uma escancarada peça de propaganda de Marcelo Crivella, que é do PRB, o mesmo partido do vice-presidente José Alencar. Bispo licenciado da Igreja Universal, ele é um dos principais nomes da base aliada do governo. Desde 2004, Crivella usa o Cimento Social como promessa de suas campanhas. Foi a equipe do senador que fez o projeto e elaborou o cadastro dos beneficiados, embora a obra de 16 milhões de reais seja paga com dinheiro do Tesouro Nacional. Há denúncias de favorecimento a fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus. E também de que foram escolhidas as casas mais visíveis das movimentadas avenidas próximas da favela. (VEJA, 2008)

A Veja foi rápida ao divulgar tal acontecimento em sua edição, diferentemente da

concorrente Istoé que não teve tanta sorte. Com relação ao enquadramento dado ao fato, a revista VEJA indica que o senador antes de criar o projeto já tinha como objetivo final a sua propaganda eleitoral. Ela também reforça que o Cimento Social utilizou a máquina pública para auxiliar determinada população carente, “servindo a um dos mais escandalosos casos de favorecimento político já vistos”. E, além da ligação política com o vice-presidente da república, o projeto já era planejado desde 2004 como promessa de campanha. A revista ainda ataca explicitamente Crivella, que é bispo da Universal, ao dizer que houve um favorecimento de fiéis e de casas mais visíveis.

O jornal impresso carioca de maior circulação, e que possui uma postura contra-Crivella declarada, divulgou:

Segundo o juiz Fábio Uchôa, o projeto é irregular porque foi contratado em ano eleitoral e por ter sido usado na campanha do senador Marcelo Crivella (PRB), précandidato à prefeitura. O caso será remetido para o Ministério Público Eleitoral e para o procurador regional eleitoral, Rogério Nascimento. Caso seja comprovado o abuso de poder econômico, o senador responderá por crime eleitoral e, no limite, poderá ter o registro de sua candidatura cassado. Equipes da Justiça Eleitoral lacraram os canteiros de obras, provocando protestos de operários. Logo após, o Exército deixou a favela. O senador, em nota, negou qualquer conotação eleitoreira no projeto. (...) Caso seja comprovado o abuso de poder econômico (utilização da máquina pública em benefício da campanha do candidato), o senador responderá por crime eleitoral e pode até ter o registro de sua candidatura cassado. (O Globo, 2008)

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O jornal aborda as questões ligadas às conseqüências que envolveriam o candidato em “abuso do poder econômico”, em “crime eleitoral” e, até, em “cassação do registro de candidatura”. Contudo, o jornal tentou disfarçar seu pluralismo ao divulgar parte da nota do acusado, evidenciando a negação como um projeto eleitoreiro. Ao que tudo indica, O Globo apenas colocou tal trecho para evitar processos judiciais por não ter “ouvido o outro lado” em mais uma matéria que citasse Crivella negativamente.

O maior jornal de circulação nacional, Folha de São Paulo, procurou ser mais objetivo e informativo. Dessa forma, o veículo paulista não se posicionou abertamente, mas sim tentou apenas apresentar os fatos:

Juiz eleitoral considerou que projeto beneficia o senador Marcelo Crivella (PRB) (...) O juiz Fábio Uchôa Montenegro considerou que a obra tem objetivo eleitoral, por beneficiar „diretamente‟ o senador e pré-candidato a prefeito do Rio pelo PRB, Marcelo Crivella, aliado do presidente Lula. (...) O embargo resultou do processo que o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) abriu ao receber, de modo anônimo, cartão com a imagem de Crivella sobreposta a fotos da Providência. O site do senador também destaca o projeto. Responsável pela fiscalização da propaganda eleitoral na capital, o juiz enviou toda a documentação relativa ao caso ao Ministério Público Federal e à 171ª Zona Eleitoral, responsável pela aplicação de multa por propaganda eleitoral irregular. O juiz constatou que o projeto de Crivella no Senado (número 541/07) não foi transformado em lei. (Folha de São Paulo, 2008)

Tais reportagens foram impressas no dia 25. Contudo, ainda no dia anterior, o telejornal líder em audiência nacional veiculou a seguinte matéria:

A decisão de interditar as obras foi do juiz responsável pela fiscalização da propaganda eleitoral. No processo, ele diz que recebeu esta denúncia anônima que veio acompanhada de um folheto que estaria sendo distribuído pelo senador Marcelo Crivella, pré-candidato à Prefeitura do Rio. Aqui, fotos do Morro da Providência, antes e depois do projeto Cimento Social. Para o juiz, o convênio foi adotado em pleno ano eleitoral, o que é proibido. A Justiça ordenou ainda ao senador Marcelo Crivella que interrompa a distribuição dos cartões associando o nome dele à obra. „A única alternativa que a Justiça Eleitoral teve para resguardar esse princípio da igualdade em prol de todos os candidatos foi determinar a suspensão dessa obra‟, afirmou Fábio Uchoa, juiz eleitoral do TRE/RJ. O senador Marcelo Crivella não quis gravar entrevista e divulgou nota em que diz que respeita a decisão da Justiça, mas lamenta que a obra tenha sido paralisada, segundo ele, por contaminação do debate político provocado pela proximidade das eleições. Marcelo Crivella diz que a obra foi iniciada em dezembro do ano passado e negou que haja qualquer conotação eleitoreira. (Jornal Nacional, 2008)

Pertencente ao mesmo grupo carioca de O Globo, o Jornal Nacional parece ter adotado uma postura mais neutra, semelhante a da Folha de São Paulo. O telejornal enfatizou que Crivella foi procurado, mas “não quis gravar entrevista”. Tal postura revelaria que a empresa estava interessada em ouvi-lo, mesmo com as diferenças ideológicas que o grupo mantém contra ele. Diferente do jornal impresso do grupo, o Jornal Nacional não enquadrou as conseqüências.

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Considerações Finais

O senador Marcelo Crivella protocolou o projeto de lei 541, que diz respeito ao Projeto Cimento Social, em 13 de setembro de 2007. Curiosamente, no mesmo mês em que ele lançou sua pré-candidatura à prefeitura do Rio pelo PRB. Vale lembrar que as convenções partidárias só ocorreriam no dia 28 de junho de 2008, exatamente duas semanas posteriores ao assassinato dos três rapazes do Morro da Providência, quando foi confirmada a candidatura do senador Marcelo Crivella à prefeitura do Rio de Janeiro.

Durante o seu discurso na convenção partidária, Crivella pediu um minuto de silêncio em memória dos três rapazes assassinados e reforçou a importância do Projeto Cimento Social. No dia anterior, o TRE/RJ havia notificado o senador sobre nova denúncia, referente a um informe publicitário publicado na revista de veiculação estadual "Roteiro do Poder", da Editora WD, que o apontava como responsável pelas obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), do governo federal, realizadas em favelas do Rio. Crivella teve até o dia 30 de junho para prestar novos esclarecimentos à Justiça Eleitoral. Será que utilizar a propaganda eleitoral antecipada faz parte das estratégias de campanha de Crivella ou tudo foi mera coincidência?

Outro dado relevante é a sua história política no Rio de Janeiro. Crivella foi candidato em 2004 à prefeitura da capital fluminense, ficando em 2º lugar na eleição vencida por César Maia em 1º turno, e em 2006 foi candidato a governador ficando em 3º lugar, perdendo para Denise Frossard e o atual prefeito Sérgio Cabral. No ano de 2008, são 11 os candidatos à prefeitura do Rio de Janeiro. Em ordem alfabética por apelido eleitoral são: Antonio Carlos (PCO), Chico Alencar (PSOL), Eduardo Paes (PMDB), Filipe Pereira (PSC), Gabeira (PV), Jandira Feghali (PC do B), Marcelo Crivella (PRB), Molon (PT), Paulo Ramos (PDT), Solange (DEM) e Vinícius Cordeiro (PT do B).

Com relação à cobertura mediática percebemos que seu enquadramento não economizou ao declarar tal fato como uma atitude eleitoreira e, de certa forma, incriminando o pré-candidato Crivella. O enquadramento das matérias se dá principalmente pelas vozes de fontes oficiais, como os juízes, ou por provas apresentadas, como os panfletos distribuídos, ou mesmo pela irregularidade do convênio assinado no mês de janeiro, em pleno ano eleitoral.

Resta saber se essas denúncias vão influenciar nas eleições de 2008 ou se os eleitores, muitas vezes pouco informados, entenderão tais acontecimentos como perseguição política ao candidato Marcelo Crivella. De qualquer forma, parece haver uma exploração de regiões menos favorecidas com fins eleitorais. E isso é um fato freqüente no Brasil.

Não podemos, de modo algum, assimilar favela a espaço de exclusão social, uma vez que estas não se distinguem assim tão fortemente, e que as situações de pobreza urbana extrema são mais freqüentes fora das favelas. Essas, aliás, não são áreas tão distintas das demais áreas da cidade quanto se pensa (sobretudo se comparadas com outros espaços pobres, como os loteamentos da periferia metropolitana). E os pobres que residem nas favelas não são todos iguais, revelando a presença de desigualdades dentro da pobreza. Num momento em que as políticas sociais se tornam cada vez mais focalizadas, tais resultados nos parecem importantes de ser assinalados: políticas exclusivas para as favelas, quando o universo da pobreza é muito mais heterogêneo do que se supõe? (PRETECEILLE. E; VALLADARES, L, 2000, p. 483)

Até quando os políticos vão utilizar as favelas e regiões pobres para se lançarem

politicamente e se elegerem? Será que eles gostariam mesmo que essa situação se revertesse ou é muito mais fácil ficar sentado em seu gabinete observando por meio da mídia o que ocorre em

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essas regiões? Mas, por outro lado, se a mídia está dando visibilidade, é uma oportunidade para fazer uma visita e se tornar notícia. Ou, será que é melhor criar outro projeto e incluir na próxima campanha eleitoral? Enquanto isso, a população segue trabalhando e votando no candidato de sua preferência.

Referências AGÊNCIA BRASIL. Exército sobe morro carioca para recuperar casas sob desconfiança de

moradores. 13 dez. 2007

_____________. Ministro das Cidades ouve reivindicações de moradores de favela no Rio. 28

mar. 2008.

_____________. Projeto prevê revitalização de casas em favela do Rio. 12 dez. 2007.

PAULO. Justiça Eleitoral veta obra e Exército deixa morro no

Rio. 25 jun. 2008.

FREIRE-MEDEIROS, B. A construção da favela carioca como destino turístico. Rio de Janeiro:

CPDOC, 2006.

JORNAL NACIONAL. Exército se retira do Morro da Providência no Rio. 24 jun. 2008.

MATTOS, R. C. Aldeias do Mal. Revista de História da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro. ano

3. v. 25, p. 28-33, 2007.

O DIA ON-LINE. Exército expulsou tráfico do Morro da Providência, diz CML. 19 fev. 2008.

O GLOBO. Juiz pára obra de Crivella por uso eleitoral e o Exército sai. 25 jun. 2008.

PRETECEILLE. E; VALLADARES, L. Desigualdade entre os pobres – favela,

favelas. In: HENRIQUES, R. (Org.). Desigualdade e Pobreza no Brasil. Rio de Janeiro: IPEA

(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 2000, p. 459-485.

VALADARES, L. A Gênese da Favela Carioca: A produção anterior às ciências sociais. Revista

Brasileira de Ciências Sociais, vol. 15, n. 44, out. 2000. p. 5-34.

VEJA. E quanto aos bandidos que sem farda? Ed. 2066. 25 jun. 2008.

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“ITU, A CIDADE ONDE TUDO É GRANDE”

A construção de um mito a partir da comunicação popular

Anne Caroline Martinelli de MATOS1

Victor Kraide CORTE REAL2

Resumo

A Estância Turística de Itu, no interior do Estado de São Paulo, ganhou na década de 1960

a fama de “cidade dos exageros”, fato que tornou a cidade conhecida nacionalmente, promovendo o

turismo e aumentado o desenvolvimento econômico da região. O responsável pela criação desse

mito ficou conhecido como Simplício, personagem humorístico de Francisco Flaviano de Almeida. A

fama e os símbolos permanecem até hoje na cidade, o objetivo dessa breve pesquisa é analisar a

história de Itu e do personagem Simplício, procurando relacionar a construção do mito com

aspectos da comunicação popular.

Palavras-chaves: Simplício, Folkcomunicação, História. Introdução

O Programa de Iniciação Científica da Faculdade Prudente de Moraes tem como objetivo

introduzir os estudantes de graduação na área da pesquisa científica, ou seja, os alunos que participam do programa geralmente possuem pouca experiência em trabalhos desse tipo, por isso mesmo essa atividade de extensão recebe o nome de “iniciação” e deve contribuir com a formação acadêmica/intelectual dos alunos envolvidos. A metodologia consiste na orientação de um professor (orientador), que acompanha o desenvolvimento do trabalho, agregando conhecimento ao iniciante e mostrando uma nova perspectiva de sua formação acadêmica.

A teoria aplicada ao contexto desse artigo é a Folkcomunicação, estudo baseado na inter-relação entre elementos da cultura popular e as tendências de comportamento da massa, tendo como instrumento, os meios de comunicação que, por sua vez, atuam na disseminação do folclore popular e na evolução do mesmo.

A cidade de Itu participou diretamente da mudança do quadro político do país entre os anos de 1870 e 1889, pois sediou a primeira reunião dos políticos do Movimento Republicano Paulista, o qual repercutiu em todo país, tornando-se o movimento político mais organizado e atuante a favor da República, agregando para a cidade, o título de “Berço da República”. Porém não foi por meio desses acontecimentos que Itu ficou conhecida mundialmente, mas sim por um artista chamado “Simplício” (Francisco Flaviano de Almeida) que através de um quadro num programa televisivo de humor, exibido em rede nacional, fez com que sua personagem “engrandecesse” as coisas de Itu, a qual logo recebeu o título de “Cidade dos Exageros”.

O mito contado, não demorou muito para aguçar a imaginação popular que inventou

1 Aluna do curso de Publicidade e Propaganda e bolsista do Programa de Iniciação Científica da Faculdade Prudente de Moraes. 2 Coordenador do curso de Publicidade e Propaganda e professor-orientador do Programa de Iniciação Científicada Faculdade Prudente de Moraes.

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diversos objetos gigantes, como pizza de metro, lembranças gigantes e até mesmo a colocação de um orelhão gigante na praça central.

O folclore ditado por Simplício através da mídia gerou reações populares e tornou-se o ícone da cidade, trazendo conseqüências positivas à economia da mesma. Itu passou a gerar empregos através do comércio dos exageros que, até hoje, atraí muitos curiosos interessados em conferir esse folclore e ainda levar uma “amostra” dele para sua cidade.

A teoria da Folkcomunicação inserida na cultura popular de Itu é evidente, pois apesar do decorrer das décadas esse folclore permanece presente e adaptado à evolução popular, não perdendo suas raízes.

Para entender a junção dos temas foi necessário buscar estudos anteriores, como trabalhos bibliográficos realizados na área acadêmica da comunicação, leitura de artigos científicos sobre a teoria da folkcomunicação, notícias de jornais, documentos históricos que fazem parte do acervo da biblioteca municipal da cidade, além de entrevistas realizadas com parentes e amigos do humorista. 1. A Estância Turística de Itu

Igreja Matriz Nossa Senhora da CandeláriaFonte: http://www.hoteliernews.com.br

O nome “Itu” procede do Tupi (y: água, rio; tu: queda-d'água). O município localizase no

estado de São Paulo e possui uma população estimada em 157.000 habitantes (fonte: IBGE/2007), formada principalmente por imigrantes italianos.

A cidade é um dos 29 municípios paulistas que possui o título de Estância Turística, por cumprir requisitos da Lei Estadual, assim tendo o direito de uma verba diferenciada por parte do Estado.

Para quem gosta de turismo, Itu reserva atrações para todas as idades: fazendas, campings, cavalgadas, pesqueiros, museus, roteiros religiosos e rurais, esportes de aventura e intensa vida cultural. São muitas opções para quem gosta de natureza e de história.

A cidade possui muitos casarões, lembrando o estilo de casas européias. O sotaque dos Ituanos deve-se a uma influência das pronúncias portuguesas, ou seja o “r” puxado, que ficou conhecido tipicamente como sotaque do interior de São Paulo.

O som do “e” é também mais uma característica do sotaque do interior e diferencia-se dos demais sons do “e” utilizados pelo Brasil: o “e” que é pronunciado pela maior parte do país como /i/ (/denti/, /quenti/) aparece de forma mais marcante em Itu, como /e/ (/dente/, /quente/).

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1.1. História

Em 1610, Domingos Fernandes e seu genro Cristovão Diniz, contruíram uma capela em homenagem a Nossa Senhora da Candelária, devido a essa construção o povoado foi crescendo, participando ativamente da vida política do país.

Em 1842, devido aos benefícios trazidos pela cana-de-açúcar e pelo café, Itu passou de vila à cidade.

Anos mais tarde, devido a posição de centro cafeeiro, a cidade inaugurou a primeira Fábrica de Tecidos movida a vapor do estado de São Paulo (1869) e a Estrada de Ferro de Itu a Jundiaí (1873).

Fábrica de Tecidos São LuizFonte: http://www.baroniimoveis.com.br

Durante anos, Itu foi considerado o município mais rico da Província (Estado) de São Paulo,

com importante participação na vida política e econômica. A vida cultural e educacional de Itu iniciou-se no colégio Nossa Senhora do Patrocínio para

as moças e no Colégio São Luis para rapazes. Na atualidade Itu possui 57 escolas primárias, 10 escolas de ensino médio e 3 escolas de ensino superior.

A vida religiosa de Itu possui um grande destaque no Brasil, pois algumas igrejas de tradição como a Matriz de Nossa Senhora da Candelária, Carmo, Bom Jesus e Nossa Senhora do Patrocínio, são exemplos da mais requintada arte, visitadas e admiradas por turistas do país e do exterior 1.2. Antecedentes da República

As idéias republicanas no Brasil surgiram nos tempos coloniais, porém no século XVIII devido a independência dos Estados Unidos (1776) e a Revolução Francesa (1789) foi que o Brasil aderiu como legítima a causa da República.

Vários movimentos marcaram o caminho dessa conquista, a Inconfidência Mineira (1792) e a Baiana (1798), foram as principais, determinando os princípios a serem seguidos pelos adeptos a República, como a liberdade de pensamento oral e escrito (imprensa), a escolha da religião, governos eletivos (com representação popular) e mandatos temporários.

Mas a forma de governar imperialista, tendo como um de seus marcos a escravidão, não tolerava oposição e, aos olhos do governo, os idealistas republicanos eram vistos como “rebeldes” e

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“anarquistas”. Anos mais tarde, em 1870 no Rio de janeiro, membros do Partido Liberal, somados a alguns

jovens iniciantes na política, criaram um jornal na Capital do Império, cujo nome era, A República, o qual trazia impresso um documento que entraria para a história do país: “O Manifesto Republicano” que anunciava a fundação do partido:

É a voz de um partido a que alça hoje para falar de um país. Esse partido não carece demonstrar a sua legitimidade. Desde que a reforma, alteração ou revogação da carta outorgada em 1824, está por ela mesma prevista e autorizada, é legítima a aspiração que hoje se manifesta para buscar em melhor origem o fundamento dos inauferíveis direitos da nação. Só à opinião nacional cumpre acolher ou repudiar essa aspiração . Não reconhecendo nós outra soberania mais do que a soberania do povo, para ela apelamos . Nenhum outro titular pode julgar-nos, nenhuma outra autoridade pode interpor-se entre ela e nós.

1.3. Itu, o “Berço da República”

Pintura sobre azulejos no Museu Republicano “Convenção de Itu”, retratando a assinaturada Ata da Reunião do Partido Republicano em Itu no dia 18 de Abril de 1873Fonte: http://www.itu.com.br

No dia 18 de Abril de 1873, reuniram-se no sobrado na antiga Rua do Carmo, atualmente

Rua Barão do Itaim, na casa do então deputado Prudente de Moraes, representantes republicanos das classes tanto Conservadora quanto Liberal de várias cidades paulistas.

A Convenção de Itu veio reafirmar o manifesto de 3 de Dezembro de 1870 iniciado no Rio de Janeiro, porém a decisão de ter Itu como sede da Convenção foi devido a dois fatores predominantes: o primeiro, pelo fato do clube de republicanos da cidade ser um dos mais ativos do Estado e, o segundo fator, porque a maioria dos núcleos republicanos paulistas estava localizada no centro-oeste, região de influência ituana.

Da Convenção, participaram 133 representantes de todo Estado, tendo como objetivo fundar o primeiro partido republicano organizado. Assim nasceu o PRP (Partido Republicano Paulista) que posteriormente aliou-se a eventuais partidos que surgiram no Brasil, como o partido fluminense e o mineiro, bem como aos militares e à igreja católica, todos em busca da Proclamação da República do Brasil.

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Devido aos manifestos políticos e a criação da Lei Auréa (Princesa Isabel) no final do regime imperial, a mão-de-obra escrava foi substituída pela assalariada, porém os fazendeiros que sustentavam a República e que se enriqueciam com o trabalho escravo, somente trocaram o negro pelo imigrante, não deram de fato a qualidade de vida aos “novos empregados”, por isso conclui-se que o movimento republicano, apesar de ter base em ideais populares, era um movimento de elite, sem a participação efetiva do povo.

A proclamação da República foi concretiza em 15 de Novembro de 1889, 16 anos após a Convenção de Itu. O PRP ficou conhecido como partido da política “café com leite” devido ao acordo entre os integrantes do partido de manter no poder do Governo sempre um presidente de São Paulo e na seguinte um de Minas Gerais

1.4. Filhos ilustres de Itu Prudente de Morais, primeiro presidente civil da República, nasceu no município de Itu em 4 de outubro de 1841.

Antônio Francisco de Paula Sousa, engenheiro, nasceu em Itu em 6 de dezembro de 1843. Participou da Convenção de Itu, foi deputado estadual em 1892 e presidente da Assembléia Legislativa. Foi ministro dos Transportes do governo Floriano Peixoto, de 22 de abril a 8 de setembro de 1893. Foi o primeiro diretor da Escola Politécnica de São Paulo.

Dom Frei Gabriel Paulino Bueno Couto, bispo católico, nasceu em Itu em 22 de junho de 1910. Foi um dos signatários do documento Testemunho de Paz (1972), a primeira manifestação do episcopado brasileiro sobre as prisões e torturas cometidas pelo governo militar no Brasil.

Elias Álvares Lobo, compositor erudito, nasceu em Itu em 1834. Foi autor da ópera “A Noite de São João”, a primeira ópera escrita e estreada no Brasil.

Octavio Ianni, sociólogo, nasceu em Itu em 1926. Foi um dos fundadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP).

Almeida Júnior, grande pintor, nasceu em Itu em 8 de maio de 1850. Francisco Flaviano de Almeida, humorista mais conhecido como Simplício, nasceu em

Itu em 1916. Ele é o responsável pela fama de Itu como "a cidade onde tudo é grande".

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“O caipira”Fonte: http://www.itu.com.br

2. Simplício Francisco Flaviano de Almeida, nasceu em Itu, aos 5 de outubro de 1916. Quando

adolescente trabalhou como operário na fábrica de tecidos São Luiz e como vendedor de armazém, emprego o qual deixou, para ser baterista, atuando na Banda União dos Artistas, uma tradicional banda instrumental de Itu.

Desde jovem sempre teve paixão por palco e pela vida artística. Aos 13 anos de idade, juntamente com um grupo de amigos, montou no quintal da casa do cabo José Ferreira, do Regimento do Exército, na antiga Rua das Flores, atualmente Rua Marechal Deodoro, um circo em condições humildes, cujo ingresso eram palitos de fósforo não usados.

Em uma entrevista ao Jornal República (Caderno R – 5/09/1998 – “Simplício, o humorista que criou a fama de Itu”) comenta: “Ainda havia alguns espertinhos que colocavam palitos usados na bandeja. Pensavam que estavam enganando”.

O circo melhorou quando o seu quadro de artistas começou a aumentar, começaram a fazer parte, Alfredo Figlié Silvio Martins, Zé Costa (o acrobata), Felício Ruggieri (o diretor), Mario Macedo Junior (Mariozito), Segundo Ferretti (que interpretava um italiano), Gumercindo Barraqueiros e Alyrio Stipp (Cenarista).

Por esse motivo, a entrada começou a ser em dinheiro, uma quantia que cada um pagava conforme achava que valia o espetáculo ou podia pagar pelo mesmo. O sucesso foi certo, pois os espetáculos a cada dia acumulavam mais pessoas na platéia.

Mas com o sucesso surgiram os problemas, a direção do antigo Cine Central era contra o circo, pois o mesmo lhe tirava o público. O circo correu o risco de fechar por imposição do dono do cinema. Porém esse empecilho não atrapalhou por muito tempo, logo surgiu uma solução, o antigo vigário Padre José Maria Monteiro, cedeu às instalações do salão paroquial, em troca de uma parte da renda, que se destinaria a igreja Matriz.

A vinda do circo “Irmãos Leandro” para Itu mudou o destino de Francisco Flaviano, a beleza da vida artística despertou paixão no jovem, fato que o levou a deixar a cidade e seguir com o circo.

Com a companhia de circo, rodou o interior do estado de São Paulo e grande parte do Brasil, aos 20 anos, estreou como humorista profissional, na cidade de Amparo, no dia de sua estréia alguém o lembrou que precisava de um nome artístico e Francisco Flaviano, pelo fato de ser um homem simples, quase simplório, passou a ser chamado por todos de Simplício.

2.1. A carreira no Rádio, na TV e no Cinema

Quando Simplício foi morar em São Paulo, passou a trabalhar em programas humorísticos nas rádios, trabalhou na Bandeirantes, Cultura (com o programa O Clube dos Mentirosos), onde conheceu e trabalhou com Manoel de Nóbrega, de quem se tornou grande amigou, trabalhou

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também na Difusora (com o programa Festa na Roça) e na rádio Piratininga (com o Programa Torre de Babel).

Participou da inauguração da TV no Brasil, em 1945 e ao representar para o pioneiro Assis Chateaubriand (fundador da Tupi), um fato engraçado ocorreu, Chateaubriand fez uma pequena confusão, porque ao final da apresentação, cumprimentou Simplício elogiando sua habilidade como cantor, o mesmo sem reação deixou com que Assis acreditasse em seu “talento” de cantor. Depois de aparecer na inauguração da TV, foi convidado por Manoel de Nóbrega para trabalhar na "Praça da Alegria", onde viveu “O Garoto” e “O Simplício”.

Simplício também passou pela Rede Record, Rede Bandeirantes, Rede Globo e SBT. Além de trabalhar na TV, Simplício fez cinema, estrelando em “Samba da Vila” (1957),

"Sertão Em Festa” (1970), “No rancho fundo” (1971), entre outros filmes. 2.2. O Homem que criou a “Praça”

Em 1955, Manoel de Nóbrega, recebeu um pedido de Victor Costa, diretor da TV Paulista, para idealizasse um programa de humor. Logo após o pedido, Nóbrega entrou em férias e foi viajar para Buenos Aires.

Na sua viagem deparou-se com um hábito interessante, pois em uma praça em frente do hotel diariamente um homem sentava no banco para ler o jornal e observar as pessoas passarem, isso inspirou Nóbrega a criar a “Praça da Alegria”, o programa foi ao ar pela primeira vez na TV Paulista. Anos mais tarde, em 1967, Nóbrega levou o programa e parte do elenco para TV Record. O programa fez com que se criasse toda a fama de Simplício e da cidade de Itu.

No banco da “Praça da Alegria”, Manoel de Nóbrega lia um jornal, Simplício entrou em cena como o caipira Ozório e sua mulher vinha ao seu lado, o nome dela era Ofélia, os dois se decidiam sentar no banco da praça para descansar entre a roça e a cidade.

Chegavam, pediam licença, sentavam e começavam a conversar. Simplício contava vantagem, nada da cidade grande poderia ser maior do que as coisas do interior.

Conforme a conversa desenrolava surgia o assunto sobre frutas. O caipira dizia para Manoel que na sua terra todos os tipos de fruta eram gigantes. Nóbrega duvidava. Então o caipira, para provar a verdade, vira-se para mulher ordenando:

-Ofélia, diga para ele qual é o tamanho das pitanguinhas lá de Itu, nossa terra... -Assim ó! – exclamava a moça com voz estridente, arregalando os olhos e abrindo os

braços como se abraçasse o mundo. Foi assim que Itu ficou conhecida pelo mundo todo, como “a cidade dos exageros”. A

princípio o roteiro pedia que o caipira falasse das pitanguinhas de “sua terra”, sem citar qualquer localidade. Simplício é que, resolveu colocar o nome de Itu na conversa.

Logo após improvisar o nome de Itu no meio do texto, o humorista encontrou com Nóbrega no camarim: Se quiser continuar falando de Itu, pode continuar – disse o dono do banco da “Praça”.

Simplício trabalhou com Nóbrega até seu falecimento (17 de Março de 1976) e quem assumiu o banco da “Praça” foi seu filho Carlos Alberto e esse trabalho foi o último que Simplício desempenhou antes de seu falecimento em 14 de fevereiro de 2004, deixando sua esposa Helena Maria de Almeida, com quem foi casado desde 1959, seus cinco filhos, Francisco Alberto, Luiz Eduardo, Carmem, Péricles e Luiz Maria, nove netos e nove bisnetos. 2.3. O comércio do Exagero

Muitos comerciantes de Itu dissem que sobreviveram e ainda sobrevivem da fama da cidade, principalmente os proprietários das lojas de lembranças de Itu.

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Em uma entrevista que a proprietária do “Lembranção de Itu”, Malvina Campfield Mori, forneceu para o Jornal Periscópio (19/02/2004 – “Comerciantes sobrevivem com exageros” – Rafael Cristofoletti) é comentado que sua loja foi a primeira na cidade a comercializar produtos em tamanho exagerado, há 42 anos. Ela ainda destacou a importância de Simplício para o turismo local: “Itu é uma cidade turística devido ao trabalho do humorista e esse é turismo mundial, todos devemos muito a ele”.

Malvina afirmou que pela loja já passaram turistas do mundo todo. “Já recebemos turista dos Estados Unidos, Alemanha, Portugal, Itália, Israel, Uruguai, Argentina, Suíça, Japão e de outros países”.

Outro comerciante José Lobo, proprietário das lojas “O Gigantão” e “A Exótica”, confirmou numa entrevista na mesma reportagem de Rafael Cristofoletti ao Jornal Periscópio, que a maioria dos turistas vem a Itu devido à fama e em busca de objetos grandes: “Muitas pessoas vêm por causa das igrejas, museus, mas acredito que 80% das pessoas visitam Itu por causa do exagero”. Pelo fato de muitos turistas terem interesse em saber a respeito da história do exagero o comerciante comenta que: “Nós trabalhamos com monitores e vendedores que contam a história do Simplício. Eles pegam algum texto da Praça da Alegria para explicar”.

2.4. Simplício e Itu, um caso de amor

Simplício foi um dos 12 primeiros artistas da América Latina a aparecer na televisão, foi um pioneiro. Com sua personagem fez com que a fama dos exageros, modificasse o perfil econômico de Itu nas décadas de 60 e 70, pelo fato do aumento da vinda dos turistas à cidade, esse comportamento foi considerado a primeira influência da TV na vida das pessoas.

Seu orgulho pela cidade foi demonstrado numa entrevista à Revista Kalunga, nº 76:

Eu amo Itu, acho minha cidade linda e queria arrumar um jeito de divulgar ainda mais o que ela é. Além disso, Itu faz parte da história do Brasil. Criei o bordão de que lá tudo era grande e acabou pegando. Tanto que a cidade ganhou um orelhão gigante do Ministério das Telecomunicações e um semáforo enorme de uma empresa que fazia placas de ruas. Algumas lojas passaram a vender lembrancinhas de Itu, tudo naturalmente em tamanho gigante.

O motivo que levou Simplício a interpretar sua personagem foi o fato de na década de 60,

Itu não atrair uma quantidade considerável de turistas, mesmo havendo tanta história e beleza a se conhecer. Com a iniciativa de Simplício, Itu não ficou conhecida somente no Brasil, mas também em todo mundo.

Todo o sucesso trouxe reações da população, pois o prefeito da época, Olavo Volpato, recebia inúmeras ligações de toda a parte, pedindo para que o mesmo mandasse presentes de tamanhos gigantes.

Na opinião de Helena de Almeida, esposa de Francisco Flaviano de Almeida (o Simplício): “Ele defendia a cidade com unhas e dentes. O crescimento de Itu se deve a este homem”.

A população admirava tanto o comediante, que ligavam avisando que tinham encontrado abóboras e chuchus gigantes e Simplício, juntamente com Olavo Volpato, providenciavam a busca desses “exageros” nas fazendas.

A fama conquistada pelo comediante, fez com que o Ministro das Comunicações do governo de Médici, Higino Corsetti, doasse a Praça Matriz um orelhão enorme. O fato ocorreu quando numa visita profissional ao interior, o Ministro conheceu Simplício e envolvido com sua simpatia resolveu colocar um ícone na cidade que expressasse o “exagero” de Simplício e a publicidade da companhia Telesp.

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Sendo que nessa mesma época, porém já no primeiro mandato do Prefeito Lázaro Piunti, foi instalado na Praça Matriz um semáforo gigante, um presente pessoal de uma empresa de SP, para o prefeito de posse, Lázaro, que decidiu doar o objeto a cidade.

De acordo Salathiel Westphalen de Souza (2004, p. 10-11), pesquisador da vida e obra de Simplício:

A maioria dos turistas vinha conhecer a cidade e comprar lembranças. Além de admirar o orelhão gigante, a atração mais famosa de Itu, eles podiam experimentar comidas tipicamente pitorescas, como a pizza de um metro de diâmetro e o chope servido numa taça de um metro de comprimento. Uma sorveteria começou a aproveitar o folclore para vender os “sorvetões de itu”, feitos em palitos enormes, trinta centímetros. As taças de sorvete gigante eram três vezes maiores do que as normais. Outra lanchonete lançou um sanduíche enorme feito com uma bengala de pão. A imaginação popular não demorou a criar objetos curiosos. Há uma lista deles: poltronas, estilingues, caixas de fósforo com palitos de 13 centímetros. Sem falar nas “pulgas de Itu” criadas em gaiolas e no “chapéu de Itu”, cuja aba tinha uma metro de diâmetro, igual a pizza ituana.

Simplício foi proprietário de um restaurante em Itu, onde recebia os clientes, conversava, fazia piadas, enquanto os mesmos desfrutavam de um almoço tipicamente caipira.

O comediante chegou a participar da equipe de ciclismo de Itu, defendendo as cores da Associação Atlética Ituana.

Foi presidente da Corporação Musical União dos Artistas (diretoria administrativa) e também secretário do Turismo da municipalidade ituana (nos períodos de 1973-1976 e de 1983-1988), nos governos do prefeito Lázaro Piunti, sendo que nessa época seu cargo não era remunerado.

Em 9 de Agosto de 2002, Francisco Flaviano de Almeida, recebeu da Câmara de vereadores o título de Cidadão Honorário de Itu.

Conforme a reportagem de Antonio Rafael Júnior, na edição do dia 19/02/2004 do Jornal Periscópio – “Simplício foi o maior marketeiro de Itu”: “Numa época até então insipiente em termos de turismo, o programa fez o número de visitantes aumentarem entre 60% e 70%. O Simplício foi o maior marketeiro de Itu. Ninguém divulgou a cidade como ele”. 3. Comunicação e Folclore

Ao percorrer a trajetória do personagem ituano Simplício e perceber sua importância para a criação do mito de que “Itu é a cidade onde tudo é grande”, é importante levar em conta a inter-relação entre a Comunicação e o Folclore e o conseqüente impacto ideológico das mensagens provenientes dessa união sobre um determinado público receptor.

Neste sentido, é possível encontrar respaldo científico numa corrente teóricometodológica eminentemente brasileira, elaborada por Luiz Beltrão e denominada – Folkcomunicação. Essa linha de pesquisa analisa os cruzamentos existentes entre a cultura popular e a cultura de massa, concentrando o foco na comunicação oriunda do povo, nela incluídas a literatura, a arte, as crenças, os ritos, os costumes dessas camadas sociais, os seus meios de expressão.

A influência do folclore nesses processos de comunicação pode ser compreendida de acordo com Luiz Beltrão, a partir do ponto-de-vista do folclorista Édison Cordeiro, como sendo, por um lado, uma forma de acomodação das tradições, mas também como uma manifestação ou reivindicação social: “sob a pressão da vida social, o povo atualiza, reinterpreta, e readapta constantemente os seus modos de sentir, pensar e agir em relação aos fatos da sociedade e aos dados culturais do tempo” (BELTRÃO, 1980, p. 24).

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Sobre a produção e propagação da comunicação intermediada pelo folclore, o que Luiz Beltrão chamou de “sistema da Folkcomunicação”, são promovidas manifestações resultantes de uma atividade “artesanal” do agente-comunicador e difundida de maneira “horizontal” entre os destinatários da mensagem. No fundo, são estes os principais pontos responsáveis pelo sucesso da comunicação Folk diante de outros tipos de comunicação produzidas de maneira “industrializada” e propagadas “verticalmente” entre emissores e receptores. Ainda que se utilize de canais indiretos e industrializados (como tv, rádio, etc.) a Folkcomunicação, segundo Luiz Beltrão (1980, p. 28), mantém em essência a semelhança com a comunicação interpessoal, “já que suas mensagens são elaboradas, codificadas e transmitidas em linguagens e canais familiares à audiência, por sua vez conhecida psicológica e vivencialmente pelo comunicador”.

Outro aspecto fundamental que nos permite perceber e identificar com mais clareza como o discurso de Simplício foi capaz de fixar o mito em torno da cidade de Itu, é sua atuação como um tipo específico de formador de opinião, um líder de opinião folk, que exerce maior influência e transmite uma credibilidade mais convincente quando comparado aos outros tipos de formadores de opinião que atuam de maneira “autoritária” e “verticalizada” sobre o público receptor. A respeito disso, Luiz Beltrão (1980, p. 35) defende sua tese:

Enquanto no sistema da comunicação social é muito freqüente a coincidência entre os líderes de opinião e as autoridades políticas, científicas, artísticas ou econômicas, na folkcomunicação há maior elasticidade em sua identificação: os líderes agentes-comunicadores folk, aparentemente, nem sempre são “autoridades” reconhecidas, mas possuem uma espécie de carisma, atraindo ouvintes, leitores, admiradores e seguidores, e, em geral, alcançando a posição de conselheiros ou orientadores da audiência sem uma consciência integral do papel que desempenham.

Podemos questionar dessa forma, se Simplício teve a percepção do papel que desempenhou ao promover, em âmbito nacional, o nome da cidade de Itu, criando um mito que encontrou receptividade por parte do público e que foi adotado pela cidade como uma identidade. Mas ter percepção ou não disso, lançar uma expressão de modo consciente ou acidental, não são questões que necessariamente requerem resposta diante dos objetivos dessa breve pesquisa, o mais importante agora é registrar que Simplício foi um exemplo de comunicador folk e que, através de sua habilidade com o humor e do uso folkcomunicação, obteve êxito na criação do mito: “Itu é a cidade onde tudo é grande”. Referências

CARVALHO, Márcia. Coisas da roça: a música sertaneja no cinema brasileiro. Artigo apresentado em

forma de comunicação no Núcleo de Pesquisa de Comunicação Audiovisual, do XXX Congresso Brasileiro

de Ciências da Comunicação, (INTERCOM), realizado em Santos, de 29 de agosto a 02 de setembro de

2007.

CARVALHO, Roberto Machado. Convenção Republicana de Itu (1873-2003). Itu, 12 de Abril

de 2003.

LEPSCH, Inaldo Cassiano Silveira. A Convenção de Itu e os Republicanos – ontem e hoje.

Conferência pronunciada em Londrina, Paraná, no dia 28 de Maio de 1977, no Club dos 21 Irmãos

Amigos.

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SOUZA, Jonas Soares de. A convenção de Itu e o Partido Republicano Paulista. Universidade de São

Paulo Museu Paulista/Museu Republicano de Itu: 1987.

SOUZA, Salathiel Westphalen de. Simplício, um contador de histórias. Vida e Obra de Francisco

Falviano de Almeida. Itu, Faculdade Prudente de Moraes: 2004.

Periódicos

A Fidelíssima (Revista de Itu). Dezembro de 1968.A Região Hoje (Caderno História). Abril de 1998.Jornal A

Federação. Itu, 23/02/1974.Jornal República. Itu, 8/10/1996; 4/04/1998; 5/09/1998 e 21/02/2004.Jornal do

Turista de Itu. Agosto/2004.Jornal Periscópio. Itu, 15/11/1989; 17 e 19/02/2004Revista Kalunga – Nº 76.

Internet

www.itu.com.br www.wikipedia.org

http://violaenluarada.blogspot.com

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Coligações: reflexão da aliança “informal” entre PSDB e PT em Belo Horizonte

Sander NEVES

Resumo

Os partidos políticos brasileiros, às vésperas das eleições de 2008, buscam alternativas que

lhes permitam ampliar o número de votos destinados aos candidatos indicados nas convenções

para concorrer ao cargo de prefeito. Neste contexto, as coligações partidárias ganham cada vez

mais importância no cenário da política nacional. Em Belo Horizonte, nove partidos lançaram

candidatos próprios. Os demais participarão via coligações. E é exatamente uma das coligações o

alvo deste artigo. A capital mineira é palco de uma coligação “informal” entre o atual governador do

estado, Aécio Neves (PSDB), e o atual prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), que se

uniram, contra a vontade dos seus respectivos partidos, para apoiar a candidatura do empresário

Márcio Lacerda (PSB). PT e PSDB juntos? O que estaria por trás desta parceria? Este artigo tenta

refletir sobre estas questões.

Palavras-chave Eleição, coligações, Belo Horizonte, PT e PSDB.

Considerações iniciais

Os partidos políticos brasileiros, às vésperas das eleições de 2008, buscam alternativas que

lhes permitam ampliar o número de votos destinados aos candidatos indicados nas convenções para concorrer ao cargo de prefeito. Entre elas pode-se destacar: o desenvolvimento de peças publicitárias permitidas pela legislação, o corpo a corpo em pontos estratégicos das cidades, os comícios, as passeatas, as carreatas, a apresentação das propostas de campanha em diferentes áreas, entre outras.

Neste contexto, as coligações entre partidos ganham cada vez mais importância na política nacional. De acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), existem hoje 27 partidos políticos no Brasil1. Contudo, nem todos se propõem a lançar um candidato nas eleições municipais. Há, inclusive, partidos que nem têm representatividade em cidades de porte médio e baixo. E,

1 Os dados foram extraídos do endereço eletrônico http://www.tse.gov.br/internet/partidos/index.htm, no dia 22 de agosto de 2008. Os partidos são: Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Partido Democrático Trabalhista (PDT), Partido dos Trabalhadores (PT), Democratas (DEM), Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido Socialista Brasileiro (PSB), Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Partido Trabalhista Cristão (PTC), Partido Social Cristão (PSC), Partido da Mobilização Nacional (PMN), Partido Republicano Progressista (PRP), Partido Popular Socialista (PPS), Partido Verde (PV), Partido Trabalhista do Brasil (PTdoB), Partido Progressista (PP), Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), Partido Comunista Brasileiro (PCB), Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), Partido Humanista da Solidariedade (PHS), Partido Social Democrata Cristão (PSDC), Partido da Causa Operária (PCO), Partido Trabalhista Nacional (PTN), Partido Social Liberal (PSL), Partido Republicano Brasileiro (PRB), Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e Partido da República (PR). Esta lista segue a ordem de criação dos partidos

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mesmo em cidade de maior porte2, partidos preferem fazer coligações a lançar um representante próprio.

Em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, por exemplo, “apenas” nove partidos lançaram candidatos próprios. São eles: PMDB (Leonardo Quintão), PSB (Márcio Lacerda), PCdoB (Jô Moraes), PSTU (Vanessa Portugal), DEM (Gustavo Valadares), PCO (Pedro Paulo de Abreu Pinheiro), PRTB (Jorge Periquito), PTdoB (André Alves) e PDT (Sérgio Miranda). Os demais partidos optaram por não entrar na disputa diretamente, preferindo fazer coligações.

E é exatamente uma das coligações o alvo deste artigo. A capital mineira é atualmente palco de uma coligação “informal” entre o atual governador do estado, Aécio Neves (PSDB), e o atual prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), que se uniram, contra a vontade dos seus respectivos partidos, para apoiar a candidatura do empresário Márcio Lacerda (PSB). PT e PSDB juntos? O que estaria por trás desta parceria? Este artigo, por isso, tenta refletir sobre estas questões.

Coligações: breve histórico da legislação brasileira

O segundo título da Constituição do Brasil, promulgada em 1988, intitulado “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, traz especificamente em seu capítulo quinto um espaço para tratar da seguinte temática: “Dos Partidos Políticos”. Em seu artigo 17, traz que “é livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana [...]”.

O artigo, único deste capítulo da Constituição Brasileira, indica os “preceitos” a serem observados apresentando-se em quatro itens. O primeiro indica que o partido deve ter “caráter nacional”. O segundo indica a “proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes”. O terceiro indica a necessidade de “prestação de contas à Justiça Eleitoral”.

Já o quarto item, que reza sobre o “funcionamento parlamentar de acordo com a lei”, articula-se em quatro parágrafos. O primeiro tinha, até o ano de 2006, a seguinte redação: “É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir estrutura interna, organização e funcionamento, devendo seus estatutos estabelecer normas de fidelidade e disciplina partidárias”.

Contudo, esta redação foi modificada pela emenda constitucional número 52, de 2006, ficando com o seguinte texto:

É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos3

estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.

(CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA, 1988)

Como se pode notar, a mudança refere-se exatamente às questões relativas às coligações eleitorais. Já os demais parágrafos, continuam com o texto original. O segundo indica que “os partidos políticos, após adquirirem personalidade jurídica, na forma da lei civil, registrarão seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral”. O terceiro reza que “os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e

2 O parâmetro para definir cidades de grande porte é o recorte feito pela Constituição Federal. Ela indica que apenas as cidades que tenham mais de 200 mil eleitores podem ter segundo turno nas eleições para prefeito. 3Estatuto do PT disponível no endereço http://www.pt.org.br, do PSDB no http://www.psdb.org.br e do PSB http://www.psb.org.br. Estes são os partidos que são estudados neste artigo.

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acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei”. E o quarto: “é vedada a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar”.

Em relações às normas para eleição, há uma lei específica para normatizar as coligações políticas. Trata-se da lei 9.504, de 30 de setembro de 1997, na qual se estabelece em seu artigo sexto a seguinte determinação:

É facultado aos partidos políticos, dentro da mesma circunscrição, celebrar coligações para eleição majoritária, proporcional, ou para ambas, podendo, neste último caso, formar-se mais de uma coligação para a eleição proporcional dentre os partidos que integram a coligação para o pleito majoritário. (LEI 9.504, on-line)

O artigo sexto da lei é dividido em três parágrafos. O primeiro reza que:

A coligação terá denominação própria, que poderá ser a junção de todas as siglas dos partidos que a integram, sendo a ela atribuídas as prerrogativas e obrigações de partido político no que se refere ao processo eleitoral, e devendo funcionar como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários. (LEI 9.504, on-line)

Já o segundo, indica que:

Na propaganda para eleição majoritária, a coligação usará, obrigatoriamente, sob sua denominação, as legendas de todos os partidos que a integram; na propaganda para eleição proporcional, cada partido usará apenas sua legenda sob o nome da coligação. (LEI 9.504, on-line)

E, no terceiro parágrafo, que trata da “formação das coligações”, é dividido em quatro incisos:

Na chapa da coligação, podem inscrever-se candidatos filiados a qualquer partido político dela integrante; o pedido de registro dos candidatos deve ser subscrito pelos presidentes dos partidos coligados, por seus delegados, pela maioria dos membros dos respectivos órgãos executivos de direção ou por representante da coligação, na forma do inciso III; os partidos integrantes da coligação devem designar um representante, que terá atribuições equivalentes às de presidente de partido político, no trato dos interesses e na representação da coligação, no que se refere ao processo eleitoral; a coligação será representada perante a Justiça Eleitoral pela pessoa designada na forma do inciso III ou por delegados indicados pelos partidos que a compõem, podendo nomear até: três delegados perante o Juízo Eleitoral; quatro delegados perante o Tribunal Regional Eleitoral; cinco delegados perante o Tribunal Superior Eleitoral. (LEI 9.504, on-line)

Seguindo o exemplo do que aconteceu nas eleições municipais de 2004, o Tribunal Superior Eleitoral manteve, para as eleições de 2008, a obrigatoriedade de que as coligações feitas nas eleições majoritárias (ou seja, para o cargo de prefeito) sejam as mesmas feitas para as eleições proporcionais (para os cargos de vereador). Esta decisão é baseada na resolução do TSE número 22.717, do dia 28 de fevereiro de 2008, cujo relator foi Ari Pargendler. Dupla dinâmica, duplo interesse

Ironicamente, a primeira eleição para presidente da República Federativa do Brasil aconteceu um

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século depois do país arrebentar o “cordão umbilical” do Império português4. Para a população de uma república que até então costumava ter a limitação de escolha somente entre um ou outro presidente, o fim da Ditadura Militar, na década de 1980, possibilitou aos eleitores brasileiros a escolha entre 235

presidentes na eleição de 1989. Hoje, com 27 partidos políticos, de fato é difícil delimitar as diferenças entre eles.

Principalmente porque as coligações mudam de acordo com as sucessões de eleições e até entre os diferentes estados e cidades. Contudo, alguns partidos têm divergências definidas que os separam em dois supostos pólos: esquerda e direita. Resta saber se as diferenças são apenas em busca de votos ou por ideologia política (ou ambos).

Ao se revezar com a eleição dos dois últimos presidentes nos últimos 16 anos, PT e PSDB, tornaram-se inimigos explícitos. Prova disso são os ataques verbais do expresidente Fernando Henrique Cardoso ao atual presidente Luís Inácio Lula da Silva, e vice-versa. O que apimenta ainda mais a rixa entre os petistas e peessedebistas é que a vitória de um partido sempre culminou com a derrota de outro na eleição para presidência desde a redemocratização pós-ditadura.

Em um clima como este, parecia impossível uma aliança entre políticos do PT e PSDB nas eleições para prefeito em 2008, principalmente em cidade de grande expressão. Aliás, os próprios Ricardo Berzoini e Sérgio Guerra, presidentes dos dois partidos, respectivamente, trataram de descartar esta possibilidade. A firme negativa deu-se em virtude da aproximação do atual governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), e do também atual prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT).

Já reeleitos em por uma ocasião, Aécio e Pimentel não mais podem se candidatar aos cargos de governador e prefeito, respectivamente. Como a “carta na manga” e as negociações internas para escolher candidatos aos cargos do executivo fazem parte o ritual dos partidos, PT e PSDB ainda não anunciaram futuro dos candidatos com alto índice de aprovação, mas tudo indica que a dobradinha visa – pelo menos para Aécio e Pimentel – eleger este para o governo de Minas Gerais e aquele para presidente.

Longe dos holofotes, microfones e até das decisões oficiais dos partidos, Aécio e Pimentel se articularam (informalmente) para apoiarem a campanha do empresário Márcio Lacerda (PSB) à prefeitura de Belo Horizonte. Contudo, o abismo que separa as ideologias do PT e PSDB não permitiu que ambos se juntassem ao PSB para apoiar a candidatura de Lacerda. O racha entre os partidos, contudo, não atingiu diretamente Aécio e Pimentel, que chegam a fazer corpo-a-corpo em apoio a Lacerda.

O acordo foi mantido em sigilo até janeiro, quando Pimentel passou a defender publicamente a candidatura comum. Em março, uma pesquisa Vox Populi mostrou que 80% dos eleitores de Belo Horizonte eram a favor de uma

4 Saiu das “garras” dos portugueses para continuar nas mãos das oligarquias no troca-troca da política do café-com-leite. Depois veio Vargas, que fechou o congresso, e implantou a ditadura disfarçada de Estado Novo. Vargas suicidou-se. Em apenas dois anos – 1954 e 1596, ano em que assumiu Juscelino – o Brasil teve três presidentes: Café Filho, Carlos Luz e Nereu Ramos. Depois veio Jânio Quadros, que “pulou fora”, assumiu Jango Goulart e o “apagão” com a Ditadura Militar. Isso sem falar nos governos provisórios, presidente que morreu antes de assumir, vice que virou presidente... Uma história triste, mas rica de acontecimentos para uma república de apenas 119 anos. Para obter mais detalhes sobre aspectos históricos da política brasileira sugiro a leitura do livro “Marketing Político – do comício à internet”, organizado por Adolpho Queiróz, Carlos Manhanelli e Moisés Stefano Barel. 5 A recheada lista era formada por: Fernando Collor de Melo, Luís Inácio Lula da Silva, Leonel Brizola, Mário Covas, Paulo Maluf, Guilherme Afif Domingos, Ulysses Guimarães, Roberto Freire, Aureliano Chaves, Ronaldo Caiado, Affonso Camargo, Enéas Ferreira Carneio, José Alcides Marronzinho, Paulo Gontijo, Zamir José Teixeira, Lívia Maria de Abreu, Eudes Mattar, Fernando Gabeira, Celso Brant, Antônio Pedreira, Manuel Horta, Armando Corrêa e Sílvio Santos(!) – este teve a candidatura barrada pelo TSE.

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candidatura apoiada por Aécio e Pimentel, mas parte só votaria nela ao analisar o perfil do candidato. Márcio Lacerda reúne condições de encarnar o petano perfeito, uma vez que sua biografia admite qualquer caracterização ideológica. (CABRAL, p.57)

Ninguém sabe ao certo ou apresenta publicamente quando começaram as articulações, mas desde

o início de 2008 elas saíram dos bastidores para ganhar as páginas das mídias brasileiras. A Revista Época, por exemplo, em janeiro estampava uma foto que o presidente Lula aparece sorrindo ao lado de Aécio e Pimentel com o seguinte título: “Uma aliança contra Serra”. E linha de apoio: “Aécio Neves articula um acordo entre PT e PSDB na eleição à Prefeitura de Belo Horizonte. Esse pode ser seu trunfo na disputa pela Presidência em 2010”. (EVELIM, on-line).

A reportagem sugere que José Serra (PSDB), virtual candidato à Presidência da República em 2010, tentava inviabilizar a candidatura do colega de partido Geraldo Alckmin em detrimento do atual prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (DEM). Esta queda-de-braço Serra perdeu, já que tanto Alckmin quanto Kassab disputam a cadeira de prefeito da cidade mais populosa do país. A fissura, supostamente, dificulta uma futura aliança entre DEM e PSDB para lançar Serra como candidato à Presidência do Brasil.

Do outro lado da balança, Evelim (on-line), citando o atual governador de Minas Gerais como outro rival interno de Serra, especula que “a movimentação de Aécio também se explica por seus planos presidenciais”. Este, por sua vez, acredita que a aliança com o PSB de Márcio Lacerda, em Belo Horizonte, pode lhe abrir portas para obter o apoio de Ciro Gomes em 2010.

Aécio aposta também que crescerá nos Estados um sentimento contra a hegemonia política de São Paulo nos últimos anos, que se traduziu na radicalização do confronto entre PT e PSDB. Nos planos idealizados pelo governador mineiro, até um adversário feroz de Serra, como Ciro, poderia ter espaço em sua aliança como possível candidato à Vice-Presidência. A eleição de Belo Horizonte é o primeiro passo de Aécio para tentar colocar essa estratégia em execução. (EVELIM, on-line)

Há fatores reforçam esta suposição. Um deles é que, apesar de Lacerda nunca ter sido candidato a nenhum cargo político, era tesoureiro de Ciro na campanha para presidência em 2002. Outro é que, desde o início do governo de Aécio, é comum vê-lo no mesmo palanque que Pimentel durante a inauguração de obras pela capital e interior de Minas Gerais. Na reportagem, há inclusive uma fala de Aécio sobre a aliança: “Essa não é uma aliança artificial, porque não existe em Minas o clima de radicalização política entre PT e PSDB existente em outros lugares do país”. (EVELIM, on-

line) E Pimentel, o que ele tem a ver com isso? Como já foi reeleito uma vez, a exemplo de Aécio, o atual

prefeito de Belo Horizonte almejaria disputar a cadeira de governador de Minas Gerais – com apoio de Aécio, é claro. A movimentação, contudo, não conta com 100% do apoio de petistas e tucanos. Patrus Ananias

(PT), por exemplo, que também pode ser candidato ao governo de Minas, criticou a atitude: “O processo tem de ser conduzido pelo prefeito, ouvindo as instâncias partidárias”, conforme citação inserida na reportagem de Evelim (on-line).

Vai-e-vem para a definição das alianças

A partir de abril, reta final para definição das alianças políticas para as eleições de 2008, Aécio e Pimentel fortaleceram o apoio à Lacerda na disputada pela prefeitura de Belo Horizonte. Para evitar o que se denominou de “surpresa desagradável”, o diretório da executiva nacional do PT limitou para o dia 26 de maio o prazo para que os diretórios estaduais e municipais apresentassem as intenções de coligações. Contudo, a decisão para Belo Horizonte já parecia tomada mesmo antes da chegada da data (e foi ratificada).

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A Executiva Nacional do PT manteve ontem, por 13 votos a 2, o veto à aliança com o PSDB na eleição para prefeito de Belo Horizonte. Foi o mesmo placar da reunião do dia 24 de abril, quando foi aprovada uma resolução em que havia definido que a Executiva não iria autorizar, em nenhuma hipótese, uma coligação com os tucanos da capital mineira. (PAIXÃO, p.3)

De olho em coligações com partidos considerados “de fora” da base aliada do governo petista,

diretórios do interior de Minas Gerais buscavam uma solução que não os prejudicasse, afinal de contas, dos “[...] 141 municípios que representam 52% dos 267 diretórios municipais informaram ao PT estadual sobre as alianças que pretendem fazer com [...]: PSDB (em 63 municípios), PPS (em 34) ou DEM (em 44)”. (PEIXOTO, on-line)

Em Belo Horizonte, base das definições que se espelham para o interior, a decisão estava tomada antes mesmo das indicações dos diretórios municipais, conforme declarou o próprio secretário de comunicação do PT, Gléber Naime:

O partido não quer ser surpreendido. O Diretório Nacional não pode ser atropelado. [...] A comissão da Executiva Nacional fez um comunicado a Belo Horizonte dizendo que não aprovará em hipótese nenhuma a aliança. Foi um comunicado político. (GIRALDI, on-line)

A atitude da executiva nacional petista incomodou não apenas políticos mineiros, que viam na

parceria com o PSDB a possibilidade de ampliar o número de cadeiras nas prefeituras do estado. O governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), por exemplo, acredita que houve excesso na intervenção feita em Minas Gerais. Conforme entrevista à Folha de São Paulo, o governador minimizou a importância da coligação em Belo Horizonte e preferiu criticar a ineficácia petista em impedir a aliança entre PSDB e PMDB em São Paulo. Déda afirmou que:

A turma ficou olhando para Minas e tomou bola nas costas, porque lá em São Paulo aconteceu um fato político que tem relevância dentro das implicações que podem causa para a base do governo do presidente Lula (Luis Inácio Lula da Silva). [...] Se houve algum fato na conjuntura política brasileira com incidência e reflexo sobre o possível horizonte de 2010, não foi a aliança de Belo Horizonte. Foi a aliança do PMDB com o DEM, lá em São Paulo. (GUIBU, on-line)

Até mesmo o presidente Lula não concordou com a decisão da executiva nacional do PT em barrar

a aliança entre PT e PSDB para apoiar o PSB em Belo Horizonte. Em entrevista ao Jornal da Cultura, reproduzida pela Folha de São Paulo, o presidente da república admitiu que a aliança não o incomodava. Além disso, afirmou que são as executivas municipais é que têm possibilidade de dizer com mais clareza quais são as melhores alianças para cada cidade. Lula, inclusive, fez uma mea culpa:

Houve um tempo em que a direção nacional do PT se reunia, como se fosse um conjunto de magistrados, e a gente definia lá de São Paulo, e eu digo isso não fazendo críticas ao PT, fazendo críticas a mim, que era o presidente do partido. Então a gente decidia qual era a lógica da aliança política a ser feita em Boa Vista ou em Belém. [...] No fundo, no fundo, as divergências que eu possa ter com o partido em São Paulo, não tem nada a ver com as divergências que, lá em Belém, o PT possa ter com outro partido político. Às vezes, nós queremos fazer uma aliança em São Paulo, e esse partido que nós queremos fazer aliança é o pior inimigo do PT em Belém. [...] Então, a sabedoria de quem conhece a grandeza desse país, a diversidade política e cultural desse país é permitir que as cidades decidam aliança em função da realidade local. (FOLHA, on-line)

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Como o PT vetou formalmente a coligação com o PSDB em Belo Horizonte, coube ao PSB definir se

faria uma aliança com o PSDB ou com PT. O PSB acabou cedendo à jogada dos petistas. A ironia ficou por conta da maior proximidade de Lacerda do PSDB, já que ele é secretário estadual de Desenvolvimento Econômico de Aécio. Nem mesmo as ameaças de PSDB em lançar candidato próprio fizeram o PSB recuar na escolha da aliança, ainda mais que o PT correu na frente indicando o nome de Roberto Carvalho para vice-prefeito.

Restou à Comissão Executiva Nacional do PSB, de qualquer forma, veicular um comunicado oficial sugerindo que se buscasse ampliar as alianças na capital mineira, o qual foi publicado na imprensa brasileira:

A direção socialista de Minas Gerais decide recomendar à seção estadual do PSB que, na condução do processo político-eleitoral, considere essa necessidade de ampliar o arco de alianças, inclusive com o PSDB mineiro, como melhor caminho para assegurar o sucesso dessa candidatura e a continuidade das administrações progressistas de Belo Horizonte. (GIRALDI, on-line)

Mesmo com todos os indicativos de que não haveria mudança nesta decisão, coube ao líder do PT

em Minas Gerais, Aloísio Marques, fazer um pedido formal à aliança entre PT e PSDB para apoiar a candidatura de Lacerda. Contudo, no dia 19 de junho, na capital mineira já estava proibida a coligação com os tucanos. Por outro lado, a executiva nacional também negou o pedido de Rogério Correa e Sumara Ribeiro que pediam intervenção em Belo Horizonte devido ao descumprimento de Pimentel à recomendação de distanciamento de Aécio. (GIRALDI, on-line)

E o PSDB? Bem, a princípio seria o partido mais prejudicado. Afinal de contas foi teoricamente colocado para escanteio pelo PT e preterido pelo PSB em relação aos petistas. Para fazer a força contrária, ameaçava lançar um candidato próprio para disputar a cadeira de prefeito em Belo Horizonte. Ameaçou, mas não lançou. Preferiu encarar que seria melhor que Aécio apoiasse, informalmente, Lacerda a buscar um racha com o candidato do PSB e PT na eleição da capital mineira. Contudo, nem todos os companheiros de partido de Aécio ficaram satisfeitos com a decisão do governador:

[...] e os tucanos que estão insatisfeitos com a possibilidade de o partido apoiar informalmente a dobradinha tentam, nesta semana, pressionar o governador Aécio Neves (PSDB) a não aceitar a união extra-oficial. Nos bastidores, a estratégia é tentar constranger o governador sob o argumento de que o apoio informal não condiz com a envergadura política dele. (GOULART, p.5)

Coube, ainda, ao presidente do PT, Ricardo Berzoini, criticar a possível aliança informal pretendida

por Aécio.

O presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini (SP), divulgou nota hoje na qual nega que o Diretório Nacional do partido tenha autorizado uma aliança informal com o PSDB em Belo Horizonte para as eleições municipais de outubro. Na nota, Berzoini disse que o diretório não debateu o assunto e que não houve „nenhum apreço‟ por alianças informais que não fiquem transparentes para os eleitores. (HOJE EM DIA, p.3)

Corpo a corpo mexe com as pesquisas eleitorais

O imbróglio entre PT, PSDB e PSB deixou os eleitores de Belo Horizonte indecisos. Em uma

pesquisa realizada entre os dias 14 e 16 de julho6, que contou com a participação de 805 eleitores 6 A pesquisa foi realizada a pedido do jornal Estado de São Paulo e pela TV Globo, e está registrada na vigésima sexta Zona Eleitoral de Belo Horizonte, sob o número de 46239/2008.

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mineiros, 71% declaravam-se indecisos. A mesma pesquisa emplacou a liderança de Jô Moraes (PCdoB) com 17% das intenções de voto, seguida de Leonardo Quintão (PMDB) com 14%. Já o candidato Márcio Lacerda (PSB), o “escolhido” por Aécio e Pimentel, aparecia somente na terceira posição com 8% dos votos, em um empate técnico com a candidata Vanessa Portugal (PSTU). (AGÊNCIA ESTADO, on-line)

Cerca de uma semana depois, no dia 24 de julho, foi realizada uma nova pesquisa de intenção de votos para a prefeitura de Belo Horizonte. O cenário ainda era de incerteza, já que 48% dos eleitores disseram não ter escolhido um candidato, dos quais 26% estavam indecisos e 22% afirmavam que votariam em branco ou anulariam o voto. Em relação à pesquisa anterior, Jô Moraes subiu de 17% para 20% e Leonardo Quintão caiu de 14% para 9%. Márcio Lacerda e Vanessa Portugal continuavam empatados, mas com a queda de 8% para 6% das intenções de voto. (AGÊNCIA ESTADO, on-line)

O Ibope também realizou, entre os dias 11 e 13 de agosto, uma pesquisa com 805 eleitores da capital mineira. Portela (2008, on-line) informou em reportagem publicada na Reuters Brasil, que a pesquisa manteve em primeiro lugar a candidata comunista Jô Moraes, com 18% das intenções de voto, seguida pelo peemedebista Leonardo Quintão com 10% e por Márcio Lacerda, que aparecia com 9%. Os votos brancos e nulos chegaram a 15%, e 37% dos eleitores da capital mineira não sabiam em quem votariam antes de acabar a primeira quinzena de agosto.

A candidata do PCdoB também se saiu melhor em todas as projeções de cenários para o segundo turno. Em uma eventual disputa com Leonardo Quintão, Jô Moraes teria 31 por cento dos votos, contra 18 por cento do peemedebista. Já contra Lacerda, Jô teria os mesmos 31 por cento, enquanto o socialista é o preferido de 16 por cento dos entrevistados. Em disputa contra Vanessa Portugal, Jô teria 34 por cento dos votos e a candidata do PSOL, 11 por cento. (PORTELA, on-line)

A campanha política no rádio e na televisão começou no dia 19 de agosto7. Dois dias antes, o jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte, divulgou uma pesquisa Sensus que indicava que 51% dos eleitores da capital ainda estavam indecisos em quem escolher para assumir a cadeira da prefeitura. A mesma pesquisa ratificou a candidata Jô Moraes no primeiro lugar, com 16,7 das intenções de voto. Leonardo Quintão, que vinha em segundo lugar, caiu para terceiro com 8,8% das intenções. Coube a Mário Lacerda assumir a vice-liderança com 11,6%. (IG, on-line)

Na primeira pesquisa Datafolha realizada após o início das campanhas no rádio e na televisão, cujas entrevistas aos 829 eleitores foram feitas nos dias 21 e 22 de agosto, houve uma reviravolta. Com apoio de Aécio Neves8

e Fernando Pimentel no rádio e na televisão, bastaram três dias para Márcio Lacerda aparecer em primeiro lugar, com 21% das intenções de voto9. Jô Moraes continuou com 17%, mas em segundo lugar. Leonardo Quintão atingiu 13% das intenções de voto. Já 14% disseram que votariam em branco e 24% ainda se diziam indecisos. (IG, on-line)

Indignada com a participação explícita (mas informal) de Aécio na campanha de Mário Lacerda, Jô Moraes ingressou, no dia 21 de agosto, com uma liminar na justiça pedindo que a

7 A coligação do PSB conta com os seguintes partidos: PT, PMN, PP, PR, PRP, PSL, PSDC, PSC, PPB,PPN e PV, que dão uma fatia de 40% do tempo do horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão paraLacerda. 8 Vídeo mostra apoio de Aécio a Lacerda: http://eleicoes.uol.com.br/2008/ultnot/multi/2008/08/25/04023766C0990326.jhtm?datafolha-bh-apoio-deaecio-e-pimentel-pesa-em-resultado-04023766C0990326 9 Vale ressaltar que, na pesquisa anterior do Datafolha, realizada nos dias 23 e 24 de julho, Lacerda aparecia com apenas 6%.

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campanha de Lacerda fosse retirada do ar. A comunista alegava que o PSDB de Aécio Neves não se coligou com o PSB na campanha para prefeitura de Belo Horizonte. Contudo, a decisão na foi acatada por Marcos Flávio Lucas Padula, da Comissão de Fiscalização da Propaganda Eleitoral de Belo Horizonte, a partir da seguinte alegação:

É fato incontroverso que o governador do Estado é filiado do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), [...] portanto, não havendo candidato do PSDB (ou, repita-se, de coligação integrada pelo PSDB) que seja antagonista ao representado, qualquer filiado do PSDB, inclusive o governador Aécio Neves, é totalmente livre para hipotecar seu apoio ao representado, inclusive participando dos programas de propaganda eleitoral no horário gratuito e nas inserções. (RUBENS, online)

Com a decisão da justiça, Aécio Neves (PSDB) e Fernando Pimentel (PT) intensificaram a apoio a

Márcio Lacerda (PSB)10. Eles realizam, inclusive, passeata nos pontos de maior concentração de eleitores da capital mineira. Uma delas aconteceu no dia 29 de julho, na Praça Sete, na tradicional avenida Afonso Pena, localizada na região Centro-Sul da cidade (a mais populosa e estratégica). Aécio, que cumpriu os seus compromissos no governador do estado durante a manhã deste dia, garantiu que estava usando o horário de almoço para apoiar Lacerda e afirmou:

Eu sempre que puder vou estar ao lado dele, fora do expediente. No horário de almoço e nos fins de semana, estarei à disposição da campanha. [...] Só existe um candidato que representa a união e o fortalecimento de Belo Horizonte e esse candidato é Marcio Lacerda. (UOL, on-line)

A lei 9.504, traz referências à “propaganda de rádio e televisão”. Aponta que, nesses meios de

comunicação, a propaganda se restringe aos horários gratuitos definidos por lei. Ao se colocar como um

“eleitor comum” para fazer propaganda eleitoral para Lacerda, Aécio recorre ao artigo 54 da lei eleitoral que traz o seguinte texto:

Dos programas de rádio e televisão destinados à propaganda eleitoral gratuita de cada partido ou coligação poderá participar, em apoio aos candidatos desta ou daquele, qualquer cidadão não filiado a outra agremiação partidária ou a partido integrante de outra coligação, sendo vedada a participação de qualquer pessoa mediante remuneração. (LEI 9.504, on-line)

E, caso houvesse aceitação da justiça a um pedido de intervenção como o que foi feito pela

comunista Jô Moraes, a determinação da lei 9.504 é: “O requerimento de partido, coligação ou candidato, a Justiça Eleitoral poderá determinar a suspensão, por vinte e quatro horas, da programação normal de emissora que deixar de cumprir as disposições desta Lei sobre propaganda”.

E parece que a atitude de Aécio e Pimentel juntos apoiando Lacerda dá resultado. Pelo menos é o que indica a pesquisa Ibobe, contratada pelo Estado de São Paulo e Globo. Em 805 entrevistas a eleitores da capital mineira, entre os dias 26 e 28 de agosto, Márcio Lacerda já apareceu com 40% das intenções de voto (ou seja, quatro vezes a mais do que aparecia quando a campanha da TV ainda não tinha começado). Como os demais candidatos mantiverem a média das pesquisas anteriores, já se cogita que Lacerda pode ganhar no primeiro turno. (AGÊNCIA ESTADO, on-line)

10 A decisão, diga-se de passagem, era esperada. Afinal de contas, nos materiais impressos Márcio Lacerda aparece ao lado de Aécio Neves e Fernando Pimentel.

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Conclusão No “jogo” da política, muitas vezes as relações entre os partidos políticos não seguem uma

seqüência lógica. Ou se seguem alguma lógica, ela não fica explícita para os “eleitores comuns”. O que estaria por trás da recusa de coligações entre PT e PSDB em Belo Horizonte? Afinal de contas, mesmo com todas as divergências entre petistas e tucanos, ambos já fizeram parcerias que foram responsáveis pela eleição de 149 prefeitos em 2004. E pode-se ir mais longe: em 51 municípios brasileiros PT e PSDB têm a dobradinha de prefeito e vice-prefeito. (ARRAIS, on-line)

Então, porque em Belo Horizonte PT e PSDB não deram as mãos para juntos elegerem o candidato do PSB? Nem Aécio, nem Pimentel declaram explicitamente, mas nos bastidores da política comenta-se que ambos pretendem alçar vôos mais altos nas eleições para presidência da república e governo de Minas Gerais em 2010, respectivamente. Além de não explicitar estas hipóteses, tanto Aécio quanto Pimentel têm declarado que as eleições municipais não exercem nenhuma influência em campanhas para governador e, em especial, para a presidência. Resta saber se os eleitores pensam da mesma forma.

O que fica claro é que, na política, a legislação muitas vezes não alcança as alianças que são desenvolvidas de maneira “informal”. O caso da capital mineira é exemplo disso. É claro que Aécio pode ser considerado um “eleitor comum”, mas como admitir que mesmo com a recusa de coligação entre PSDB e PT em Belo Horizonte o atual governador mineiro faça campanha para o Lacerda? Se Aécio vai às ruas, aparece nos programas eleitorais de rádio e televisão do PSB, que fez aliança com o PT, seria isso uma aliança “informal”? Não seria uma brecha na legislação esta tal aliança?

Ontem, depois de um almoço entre petistas ligados a Pimentel, Lacerda, o presidente estadual do PSB, deputado Wander Borges, e o presidente do PT estadual, deputado Reginaldo Lopes, uma solução intermediária começou a ser ensaiada. Trata-se de uma aliança em que o PSDB não seria registrado na chapa. Portanto, do ponto de vista do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), os tucanos não fariam parte da coligação. Mas o apoio seria formalizado da perspectiva das instâncias partidárias. Ou seja, o PT reconheceria que o PSDB é aliado e vice-versa. (LARA, p.3)

Se por um lado a legislação não prevê punições nem limitações para os pactos além das regras

previstas em 2008, por outro os eleitores parecem não se importar com as relações partidárias. Aliás, fora as pessoas que são filiadas aos partidos políticos, os eleitores parecem conhecer pouco ou quase nada sobre a quantidade de partidos políticos que existem no Brasil. Tampouco o que prega os estatutos de cada um deles.

E os partidos, como ficam neste contexto? É fato que as filosofias partidárias podem mudar a cada eleição. PSDB e PT, inimigos confessos a partir da polarização entre Luís Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso (FHC), podem no futuro se sentarem na mesma mesa para, juntos, elegerem prefeitos, governadores, deputados, senadores e, quem sabe, até mesmo um presidente. Diante de tudo isso, o que mais importa é que um dia a política deixe de ser um jogo em que os vencedores não visem o lucro pessoal ou partidário, mas sim uma sociedade igualitária e mais justa. Referências

AGÊNCIA ESTADO. Jô Moraes soma 17% e Quintão, 14% em Belo Horizonte. São Paulo, 19 jul.2008. Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/eleicoes/belo_horizonte/noticias/2008/07/19/jo_moraes_ soma_17_e_quintao_14_em_belo_horizonte_1455914.html. AGÊNCIA ESTADO. Jô lidera em BH, mas 48% dos eleitores não têm candidatos. São Paulo, 24 jul.2008. Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/eleicoes/belo_horizonte/noticias/2008/07/24/jo_moraes_ lidera_em_bh_mas_48_dos_eleitores_nao_tem_candidato_diz_datafolha_1468978.html AGÊNCIA ESTADO. Ibope: Lacerda dispara e hoje venceria no primeiro turno em BH. São Paulo, 30 ago.2008. Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/eleicoes/belo_horizonte/noticias/2008/08/30/ibope_lacer

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Democracia e transmissão de idéias e ações políticas:

uma experiência em Piracicaba

Fábio Rogério dos SANTOS1 Francisco Negrini ROMERO 2

Pedro Paulo Losi MONTEIRO3

Resumo

Este artigo mostra o desenvolvimento do trabalho de extensão universitária realizado pelo

Núcleo de Estudos e Programas em Educação Popular (NEPEP) da Universidade Metodista de

Piracicaba (UNIMEP) em parceria com a Câmara de Vereadores de Piracicaba. Trata-se de um

Programa de Melhoria do Relacionamento entre o Poder Legislativo e a Sociedade Civil, pautado

em quatro eixos norteadores: i) esclarecer à população sobre o Poder Político no Município de

Piracicaba; ii) exibir o modo de funcionamento da Câmara de Vereadores da cidade; iii) Orientar às

pessoas quanto aos critérios analíticos para a escolha de candidatos eleitorais; iv) Estimular a

participação popular junto ao Poder Legislativo local. O Programa já alcançou mais de 3.000

pessoas, entre jovens e adultos, nos mais diversos espaços de discussão e de organização social,

como: escolas, empresas, igrejas e centros coletivos de reuniões populares.

Introdução Seguindo uma tendência histórica que remonta ao Brasil colonial, de acordo com Arretche

(1996) a esfera municipal, no período 1964-1985, operava sob a ótica centralizadora. O executivo federal centralizava para si as decisões político-administrativas e financeiras. Dessa forma, Selcher (1990) afirma que a movimentação do fundo público e as competências do executivo e legislativo permaneceram sob fortes restrições financeiras e institucionais, impostas pelo regime vigente.

Os municípios encontravam-se privados do poder de decisão na medida em que estavam submetidos a Leis Orgânicas Estaduais4. O legislativo municipal encontrava-se impedido de legislar sobre questões financeiras, portanto, limitado para interferir nas questões referentes à ação governamental. As Câmaras Municipais, no início da década de 1980, desempenhavam o papel de órgãos representativos das peculiaridades locais e anseios eminentemente comunitários devido à redução constitucional e legal do seu papel5.

Em função do padrão centralizador na época, os municípios, muitas vezes, acabavam fazendo muito pouco em termos de produção de benefícios públicos, com a justificativa de dependência em

1 Sociólogo e assessor de projetos do Núcleo de Estudos e Programas em Educação Popular (NEPEP) da Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP -SP – email: [email protected]. 2 Sociólogo, Doutor em Educação e Diretor do Núcleo Núcleo de Estudos e Programas em Educação Popular (NEPEP) da Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP -SP – email: [email protected]. 3 Sociólogo e assessor de projetos do Núcleo de Estudos e Programas em Educação Popular (NEPEP) da Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP -SP – email: [email protected]. 4 Para uma análise mais detalhada sobre o assunto ver Oliveira (1981). 5 Sobre as questões ligadas ao papel do municipalismo brasileiro ver Dias (1993).

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relação às esferas superiores do Governo. Uma segunda ambigüidade pode ser apontada como decorrente dessa centralização, que é a manutenção de arranjos políticos conhecidos pela literatura como coronelistas ou clientelistas, ou seja, arranjos que se constituíram historicamente em função de benefícios obtidos pelas oligarquias locais, através de suas articulações político-eleitorais com os governos estaduais e federal. A conseqüência inédita da perpetuação desses arranjos é a permanência do particularismo no que diz respeito às políticas publicas.

Sildershineider (1993) chama a atenção para o fato de que indivíduos isolados ou em grupo são favorecidos em detrimento de outros, sem qualquer critério que o justifique a não ser a troca de favores a curto prazo. Assim, o município, na medida em que não rompe com essa prática privatizante, acaba por desempenhar um papel ambíguo no atendimento aos interesses públicos

Por conseguinte, com o advento da nova República e a elaboração da Constituição, de 1988, a relação entre as três esferas: “União, Estado e Município” – sofreu profundas alterações. Segundo Arretche (1996), a necessidade de construir um “novo equilíbrio federativo”, através do fortalecimento financeiro e político-administrativo dos estados e municípios, havia ocupado um lugar de destaque na agenda política do processo constituinte.

Com a volta das eleições diretas para prefeitos de capitais e municípios de áreas de segurança nacional, o debate se concentrou na necessidade de conferir ao município capacidade financeira e legal para administrar as questões locais. A instrumentalização dessas questões dar-se-ia, principalmente, com a reforma tributária, que aumentaria as transferências financeiras para o município e a possibilidade de elaborar autonomamente a Lei Orgânica Municipal.

Os municípios receberam na constituição de 1988 posição de relevo, exemplificada pela inclusão expressa como membros da Federação, dotados de autonomia, que se desdobra em política, administrativa, financeira e legislativa. Essa autonomia passou a ser representada especialmente pela capacidade adquirida de elaborar a Lei Orgânica que regerá suas atividades.

Com efeito, as reformas político-administrativas, realizadas no Brasil nas últimas duas décadas, deram origem a mudanças importantes na vida dos municípios, pósconstituinte de 1988. Dentre tais transformações destaca-se a descentralização, que possibilitou o fortalecimento financeiro e institucional dos municípios, bem como, viabilização, constitucional da participação dos setores organizados no processo de tomada de decisões do poder público municipal.

A Constituição de 1988 traduziu conquistas importantes de vários setores da sociedade brasileira, incluindo o fortalecimento dos estados e municípios e a criação de mecanismos legais de participação política dos cidadãos na gestão pública. Tais mudanças institucionais, imprimidas no decorrer desse longo processo, contaram, em alguma medida, com a participação ativa dos atores da sociedade civil.

Se, por um lado, as manifestações ocorridas nessa esfera não sensibilizaram integralmente as instâncias decisórias, no sentido de implantar políticas públicas que atendam, de fato, às demandas articuladas pelos movimentos sociais, por outro, é inegável o impacto que causaram, em alguns setores, modificando ampliando suas agendas políticas.

À volta das eleições diretas para prefeitos de capitais e municípios de área de segurança nacional, o debate se concentrou na necessidade de conferir ao município capacidade financeira e legal para administrar as questões locais. A instrumentalização dessas questões ocorreu principalmente com a reforma tributária, que passou a aumentar as transferências financeiras para o município, e a autonomia para elaborar a Lei Orgânica Municipal.

Institucionalmente, além da aprovação da lei Orgânica Municipal, a Câmara dos Vereadores, juntamente com o executivo municipal, passou a debater o plano diretor que se tornou obrigatório para as cidades de mais de 20 mil habitantes.

Em que se pesem as conquistas adquiridas tanto financeira quanto institucionalmente no plano depois de promulgada a Constituição Federal, permaneceram distorções importantes que devem ser ressaltadas como, por exemplo, a ausência de uma descentralização efetiva do poder e da distribuição de competências entre as três esferas. Na área social, na maioria dos casos – saúde, assistência social,

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habitação e educação – a forma de financiamento e gerenciamento padece de indefinição quanto ao grau de desenvolvimento das diferentes instâncias e quanto às formas de repasse dos recursos geridos pela União. Assim, para Almeida (1995)6, da mesma forma, estados e municípios não são capazes de definirem com clareza seus papéis quando a lei estabelece competências concorrentes e, resistem a assumir funções, que o novo modelo lhes atribuiu.

Entretanto, como adverte Draibe (1990), apesar de a política brasileira dos anos 1980-90 ser marcada pela esperança democrática, encerrou-se um alto déficit social. E os anos 1990 caracterizaram-se por um paradoxo: uma democracia consolidada nas suas instituições e nas regras formais, mas que convive cotidianamente com a violação dos direitos humanos e a incivilidade das relações sociais.

A permanência desse paradoxo, ao longo da década, reforça os argumentos apresentados sobre os limites do conceito de democracia, defendido pela tradição elitista. O problema da governabilidade não se limita ao restabelecimento das regras formais da democracia; é necessário ir além, pensar, dentre outras coisas, as práticas do poder público e suas relações com os atores sociais.

O fato de a democracia7, como forma institucional, incorporar o princípio da competitividade política não é suficiente para garantir o caráter democrático das instituições políticas. Este depende, também, da participação ativa da cidadania nessas instituições, cumprindo o papel de renovação da prática democrática.

As regras e instituições de caráter democrático devem ser conciliadas com a criação de formas modernas, públicas e pluralistas de mediação entre Estado e Sociedade Civil, possibilitando, assim, integrar a preocupação com a cidadania no interior do processo tomado de decisões políticas e administrativas.

O diagnóstico da crise de “governabilidade” no Brasil dos anos 1990 pode ser explicado, entre outras coisas, pela incapacidade de as estruturas políticas do país modificarem a forma de relação entre o Estado e a Sociedade, caracterizada pela falta de publicidade e de eqüidade na distribuição de recursos, a reprodução de práticas particularistas e a ineficiência com os gastos públicos8.

Como conseqüência das reformas implementadas pela constituição federal de 1988, os governos locais viram-se obrigados a modificar os estilos de gestão, não apenas em termos de recursos, mas também, em termos de relação com a sociedade local.

De acordo com Velásquez (1992), a gestão municipal pode ser entendida como a organização e gestão de uma série de recursos organizacionais, financeiros, humanos e técnicos por parte da municipalidade para proporcionar aos diferentes setores da população a satisfação de suas respectivas necessidades de bens de consumo individual e coletivo, e estimular potencialidades de desenvolvimento local.

Quando é feita referência à gestão, fala-se de um processo de tomada de decisão, tanto da sociedade civil (associações de bairro, conselhos, ONG‟s, Terceiro Setor entre outros) quanto da sociedade política (poder legislativo e poder executivo), através do qual se determina o futuro de uma

6 Almeida (1995) analisa as características mais gerais do processo de redesenho das competências e atribuições entre esferas de governo na área social – saúde, educação, assistência social e habitação. Segundo a mencionada autora, embora houvesse uma inclinação generalizada pela descentralização, não existiu uma verdadeira política de descentralização que orientasse a reforma das diferentes políticas sociais. Ao contrário, lógicas particulares presidiram a redistribuição de competências e atribuições nas diferentes áreas. A única exceção apontada é a área da saúde. 7 O conceito de democracia não se restringe à elaboração das regras e procedimentos, mas incorpora, além disso, a capacidade dos atores políticos de agirem na sociedade através das esferas públicas capazes de influenciar as decisões do sistema político-administrativo. 8 Conforme os trabalhos de Santos (1993) e de Azevedo (1995) a crise de governabilidade seria decorrência, dentre outros aspectos, de uma situação social híbrida na qual o governo governa muito, mas no vazio, sem efetividade. Conseqüentemente, tem-se a violação constante das normas – impunidade, corporativismo desregulado, extorsão de renda, etc. – que comprometem a credibilidade da lei e os efeitos perversos oriundos das próprias tentativas de formalização da intervenção estatal, que levam a uma situação constante de imprevisibilidade, de ausência de “regras do jogo” fixas e confiáveis, na qual prevalece a lei do mais forte.

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localidade em termos de seu desenvolvimento. Nela intervêm critérios de caráter técnico: para o desenvolvimento da gestão, os municípios contam com uma estrutura institucional de apoio formada por normas, competências, procedimentos, estruturas administrativas, recursos humanos e econômicos, etc., cuja articulação permite às autoridades e aos funcionários municipais atenderem às necessidades e demandas da população.

Mas por outro lado, as decisões são tomadas atendendo ao jogo de influências das diferentes forças sociais e políticas sobre as instâncias de poder local. A gestão municipal é política na medida em que intervêm grupos que representam interesses individuais e coletivos diversos, os quais instituem regras de jogo, estabelecem relações entre si e desempenham papéis decisivos nos processos de decisão. Nesse sentido, a gestão municipal não deve ser entendida unicamente como a habilidade gerencial para administrar recursos, mas sim como a capacidade para negociar as decisões e resolver os conflitos.

Atualmente, a intervenção das comunidades é um ingrediente fundamental dos processos que se desenvolvem no âmbito local, tanto do ponto de vista jurídico, como social. De fato, a participação popular tornou-se um aspecto central e prioritário da vida dos municípios. Em termos normativos, é possível encontrar diversas leis e decretos que expressam a importância e a necessidade de envolver a comunidade na gestão municipal. Essa normatividade implica em um processo de assimilação e uso dos recursos dos mecanismos e canais de participação nas atividades destinadas em aplicação dos recursos públicos e na busca da melhoria das condições de vida das comunidades.

Em outras palavras, a participação popular é um instrumento chave para ajudar na solução dos problemas mais gritantes em nível comunitário, e para a realização de uma gestão mais democrática, eficiente e eficaz.

É disso que trata a questão da governabilidade. Ela faz referência à gestão realizada pelas autoridades da esfera estatal e das relações entre a sociedade e esta esfera para satisfazer as demandas cidadãs e alcançar os grandes objetivos de governo, Alude, portanto, à capacidade do sistema político para alcançar objetivos comuns e tomar as decisões corretas; a sua legitimidade, enquanto representante de interesses comuns; à gestão de conflito na estrutura de regras democráticas; ao conflito das imagens que os cidadãos fazem de seu governo e das instituições políticas; enfim, ao estímulo e fomento de canais de participação cidadã e à disponibilidade dos diferentes setores sociais para apropriar-se e utilizá-los.

Conforme Abrucio (2003), para o funcionamento das democracias contemporâneas, a organização político-territorial do poder é um dos aspectos mais importantes. Isso se deve ao fato de que o processo decisório e a participação dos cidadãos são delimitados pela circunscrição política onde ocorrem. As regras políticas têm conotações diferenciadas em níveis de governos específicos, e, em boa medida, vinculam-se à características históricas locais. Adiciona-se que, para se alcançar um relacionamento sério entre comunidade e Estado será preciso superar a noção popular de que a câmara faz parte da prefeitura, pois isto torna a relação de cobrança e proposta mais difícil à população quando não se sabe a quem reportar as suas demandas.

É diante deste contexto de transformações políticas vivenciadas pelo país nas últimas décadas que, este artigo pretende registrar e sistematizar a experiência de aplicação do “Programa de melhoria do Relacionamento entre a Câmara de Vereadores e a Comunidade”, tendo por objetivo mostrar e discutir como o desenvolvimento de uma série de ferramentas conceituais, jurídicas e práticas podem contribuir para o fortalecimento da participação popular e o melhor desempenho das organizações sociais locais junto ao poder legislativo municipal. Outro objetivo é discutir a construção e aplicação de um conjunto de instrumentos pedagógicos para apropriação dos canais e mecanismos de participação na gestão municipal, com vistas ao fortalecimento da democracia e os processos de intervenção cidadã no âmbito mais próximo dos cidadãos: o municipal.

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2. Desenvolvimento A participação popular, princípio fundamental garantido pela Constituição de 1989, ergue-se

como um componente essencial da construção da democracia no Brasil. Os progressos legislativos da Carta Política dão conta dos canais e mecanismos de participação nos diferentes âmbitos da vida nacional. Neste sentido, o país possui atualmente um conjunto importante de normas que traduzem o espírito da constituição em tudo o que está relacionado com a intervenção dos cidadãos na vida pública. Entretanto, o caminho a percorrer para que os cidadãos se apropriem e façam uso desses instrumentos é um caminho difícil e de duração indeterminada. Requer-se não sua divulgação e conhecimento, como também a transformação dos valores políticos e culturais dos cidadãos e sua conscientização sobre o papel que devem desempenhar no exercício da democracia, forjando atores sociais que participem na construção de espaços e propostas públicos.

Registra-se que no primeiro semestre de 2008 foram capacitadas pelo programa quase 1.200 jovens e adultos, conforme mostra o quadro 1.

QUADRO1. Relação das instituições capacitadas pelo programa

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Para atender aos objetivos propostos, segue-se uma síntese dos principais temas abordados pelo Nepep em escolas, igrejas, associações de bairros, empresas e outras instâncias acadêmicas. 1. Esclarecimento sobre o modo de funcionamento do Poder Político no Município de Piracicaba.

Procura-se mostrar como o poder político municipal é constituído, e quais as funções principais de cada uma das três esferas de comando. a. Poder Executivo: Prefeito Municipal -Garantir a realização das obras necessárias para a população; Fazer os serviços públicos funcionarem corretamente; Administrar o dinheiro público. b. Poder Legislativo: Vereadores -Fiscalizar a ação do prefeito, garantindo que o dinheiro público seja aplicado de acordo com o que estabelece a lei; Apresentar e aprovar leis que melhorem a cidade e a qualidade de vida de seus moradores. c. Poder Judiciário: Tribunais e Juízes -Fiscalizar o cumprimento das leis. 2. Modo de funcionamento da Câmara de Vereadores:

A Câmara Municipal, por imposição legal, tem sua sede, onde necessariamente, reúnem-se os vereadores para realização das sessões e práticas de todos os seus atos. As câmaras legislativas atuais podem ser comparadas às câmaras coloniais, em que os juizes e oficiais se reuniam em vereação duas vezes por semana, às quartas-feiras e aos sábados. Sabe-se, no entanto, que nos dias atuais, as reuniões são rapidíssimas, duram pouco mais de duas horas, em média. Há cidades em que as sessões não passam de trinta minutos, este panorama é constatado de norte a sul do país.

As câmaras possuem outra característica que é a de que as sessões são quase sempre noturnas. Pesquisas mostrar que, quase três quartos (74%) de um total de 100 câmaras só têm sessões no período da noite. Isto deve-se ao fato de que a maioria dos vereadores continuam, após eleitos, a exercer suas profissões normalmente. É possível que, nesses casos, as atividades de mandato sejam relegadas a um plano secundário.

A câmara de vereadores conta com as seguintes repartições internas: a. Plenário b. Mesa Diretora c. Comissões d. Bancadas e. Setor Administrativo

Qual é o verdadeiro papel do vereador? Essa pergunta confunde muita gente. Há pessoas que acreditam que o papel do vereador é cuidar da oferta dos bens e serviços públicos, ou até mesmo, exercer funções assistencialistas, como a doação de bens materiais. Dessa forma, nos encontros de capacitação, procura-se também, apresentar e discutir as funções de cada vereador eleito, que são:

a. Apresentar propostas de emenda à lei orgânica do município; b. Apresentar projetos de lei ordinária e de lei complementar. Projetos de decreto legislativo,

projetos de resolução; c. Fiscalizar os atos do Prefeito, formulando críticas construtivas e esclarecedoras; d. Julgar atos do Prefeito e dos Vereadores em determinadas infrações; e. Atenção aos eleitores, nos pleitos coletivos e individuais; f. Fazer requerimentos, escritos ou verbais; g. Emitir pareceres, escritos ou verbais; h. Julgar os gastos da administração do Executivo; i. Sugerir indicações; j. Oferecer emendas.

A Câmara de Vereadores de Piracicaba é constituída por 16 vereadores. 3. Orientação quanto a critérios analíticos de escolha de Candidatos à Vereador e à Prefeito:

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No processo de capacitação, simultaneamente à exposição do modo de funcionamento dos poderes públicos municipais, busca-se chamar a atenção para a escolha de candidatos aos cargos de vereador e de prefeito. 2 Estimular a participação popular junto ao Poder Legislativo.

Procura-se estimular a participação popular, identificando a intervenção social como uma ação

que permite aos indivíduos reconhecerem-se como atores que, ao compartilhar de uma determinada situação, têm a oportunidade de identificarem-se a partir de interesses, expectativas e demandas comuns e que têm a capacidade de traduzi-las em formas de ação coletiva com uma certa autonomia frente a outros atores sociais e políticos”

Nesse sentido, a participação, é compreendida como a intervenção (direta ou indireta) de diferentes atores na definição das metas de ação de uma coletividade e dos meios para alcançá-los. É um processo que gera a interação ou relacionamento de diferentes atores (individuais ou coletivos) na definição de seu destino coletivo. Essa interação envolve, portanto, relações de poder que apresentam em todos os espaços onde as relações humanas se desdobram e que têm uma incidência maior ou menor segundo seus interesses, as valorizações e as percepções dos implicados na interação. 3. Considerações finais

Durante o desenvolvimento do projeto, procurou-se de maneira efetiva, ampliar o acesso da

população aos bens e serviços públicos, promovendo ações democratizadoras, isto é, uma real construção do espaço público democrático, eliminando o segredo burocrático, favorecendo a transparência das atividades legislativas municipais, buscando o exercício de uma nova cidadania como fator de transformação.

Na verdade, todo o esforço da equipe do Nepep está pautada na construção de uma sociedade que reconheça seu direito a ter direitos, que incluem a desconstrução de uma cultura política com ações e práticas clientelistas, apostando na emancipação de sujeitos que reivindiquem as sua próprias demandas. 4. Refrências bibliográficas ABRUCIO, F. L. Reforma política e federalismo: desafios para a democratização brasileira. In:

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& Debates, São Paulo, v. 15, n. 39, p. 75-87, 1996.

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SILBERSCHNEIDER, W. Democracia e participação política: o Partido dos Trabalhadores e o Conselho

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PARTE IV

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Propaganda Política e ações nacionais

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Lula, o presidente que tem a cara do povo

Rita de Cássia Schultheis Trevisan ASSOLINI 1

Resumo

Análise da propaganda eleitoral gratuita do candidato Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições

de 2006, à luz das teorias de aprendizagem da mensagem, especificamente as que tratam sobre

homofilia e atratividade da fonte. O objetivo é mostrar que tipo de estratégias foram utilizadas pela

equipe de comunicação responsável pelos programas do candidato na tentativa de ressaltar os

aspectos de semelhança entre o emissor (o candidato em questão) e o receptor (uma parcela

significativa de seu eleitorado). Para aclarar a linha de pesquisa proposta por esse trabalho,

encontro apoio nas teorias consolidadas no campo da recepção, especialmente nos estudos de

Ellen Berscheid e Elaine Hatfield Walster, Everett M. Rogers e Richard M. Perloff, quando tratam

dos aspectos persuasivos que envolvem a comunicação interpessoal.

Palavras-chave: Comunicação, Televisão, Propaganda Eleitoral, Lula, Homofilia.

Introdução

O candidato Luiz Inácio Lula da Silva iniciou sua campanha de reeleição no ano de 2006 fragilizado pela crise política que envolvia o Partido dos Trabalhadores e membros da base de seu governo em denúncias de corrupção.

Além disso, desde o início de sua campanha, Lula contou com um tratamento bastante desfavorável por parte da imprensa. Embora não seja o foco deste trabalho a análise da cobertura da mídia sobre o fato, é de conhecimento geral que a grande imprensa buscou, durante o primeiro e segundo turnos, aclarar todas as denúncias de corrupção que atingiam parlamentares e pessoas ligadas direta ou indiretamente ao governo. Com isso, a imagem do governo – e de seu representante maior, o presidente da República – sofreu profundos desgastes. Tanto é assim que a equipe de comunicação do governo chegou a divulgar nota oficial criticando a atuação da imprensa, intitulada: “Força do Povo, Fraqueza da Mídia”2. A nota foi apresentada no dia 23 de setembro, dias após a divulgação do escândalo envolvendo a suposta compra de um dossiê contra candidatos tucanos. Neste boletim, que é um duro ataque à mídia, Lula a classifica de “elitista”.

Ainda assim, ao final do segundo turno o candidato sagrou-se vencedor com 58,3 milhões de votos, que representam 60,83% dos votos válidos. O resultado foi muito semelhante ao obtido

1 Mestre em comunicação social pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) Endereço digital: [email protected] 2 Nota oficial disponível em http://odia.terra.com.br/politica/htm/geral_58222.asp. Acesso em 02 de julho de 2007.

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em 2002, em que Lula ficou com 61,27% dos votos válidos. A performance durante a campanha, segundo dados do Instituto Vox Populi3, demonstrou

que o candidato manteve vantagem de pelo menos 10% sobre o seu adversário durante todo o período da campanha e chegou a distanciar-se em até 25% de Geraldo Alckmin, consolidando expressiva vantagem sobre o outro candidato4.

Em face das observações feitas acima, o presente trabalho procura apontar apenas um dos aspectos explorados pelo candidato durante a sua propaganda política eleitoral e que poderia representar um ganho significativo para sua imagem, funcionando como um contraponto aos desgastes sofridos. Não é objetivo do trabalho aferir resultados quanto à aceitação do público a essas estratégias, uma vez que não foram feitas pesquisas com os telespectadores deste tipo de programa. Mas o estudo pretende demonstrar como foi utilizado o conceito de homofilia nos programas do candidato Lula, favorecendo uma percepção de semelhança entre ele e uma parcela significativa de seu eleitorado.

O trabalho parte de uma análise de conteúdo dos programas apresentados pelo candidato na campanha à presidência da República no ano de 2006. A técnica foi aplicada às propagandas eleitorais gratuitas do candidato à reeleição, Luís Inácio Lula da Silva, no ano de 2006 (período compreendido entre 15 de agosto e 27 de outubro, primeiro e segundo turnos). Foram observados 32 programas veiculados no período noturno, de um total de 45 apresentados no horário. Portanto, a pesquisa considerou uma amostra que representa 73% do total. Nesta pesquisa, não foram considerados os programas apresentados no período da tarde nem as inserções diárias.

O estudo busca responder às seguintes questões: o candidato utilizou estratégias para criar pontos de aproximação com seu leitor e reforçar o aspecto da homofilia? De que forma esses aspectos foram trabalhados nos programas eleitorais analisados? Alguns aspectos, entre estes, mereceram mais ênfase? Quais foram eles? Os objetivos, por conseqüência, foram investigar se o candidato explorou o recurso da homofilia -da semelhança com seus eleitores -e analisar os elementos verbais e não-verbais que foram utilizados para sugerir essa semelhança.

A análise do corpus demonstrou que três aspectos foram mais recorrentes na tentativa de trabalhar o conceito da homofilia: a origem, a trajetória do candidato e a sua linguagem. Por isso, no desenvolvimento deste trabalho, estes pontos foram trabalhados como categorias. A codificação foi tanto quantitativa quanto qualitativa, pois a porcentagem de programas em que houve alguma menção à semelhança entre o candidato e o eleitorado, de forma mais explícita, rendeu um resultado quantitativo. Já a indução sobre as estratégias utilizadas para dar ênfase aos aspectos de semelhança foi qualitativa.

Os resultados foram analisados à luz das teorias de aprendizagem da mensagem, especificamente as que tratam sobre atratividade da fonte. Elas indicam que a semelhança entre emissor e receptor é capaz de tornar a mensagem mais eficaz e, conseqüentemente, mais persuasiva. Este será o viés dado à presente análise exploratória que, certamente, poderia ser abordada de inúmeras outras formas tendo em vista o riquíssimo material representado pelos programas eleitorais. Sem a pretensão de esgotar o assunto, esta pesquisa visa apenas contribuir para o debate acerca das estratégias utilizadas pelos candidatos na comunicação com seus eleitores.

3 Considerando pesquisa de voto estimulado. 4 Tabela ilustrativa em anexo I

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A trajetória do candidato Lula

Nascido em 1945, em Caetés (PE), Luiz Inácio Lula da Silva foi criado em uma família de lavradores e, aos cinco anos, mudou-se com a mãe e os irmãos para Vicente de Carvalho (SP). Fez a viagem em um pau-de-arara, tendo como suprimento para a viagem apenas água, farinha e rapadura. Aos 12 anos, começou a trabalhar como engraxate e vendedor de amendoim e tapioca.

Segundo Frei Betto, “sua trajetória familiar coincide com a de inúmeros nordestinos que, expulsos da terra pelo latifúndio ou condenados à fome pela „indústria da seca‟, rumaram para São Paulo em busca de melhores condições de vida” (1989, p.17)

Em 1963, formou-se torneiro mecânico e começou a exercer a profissão. Mas só em 1967 entraria pela primeira vez em um sindicato.

Em 1972, foi eleito primeiro-secretário do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema e a partir daí iniciou uma trajetória que, mais tarde, o consagraria como liderança nacional.

Em fevereiro de 1980, Lula fundou o PT em São Paulo. Três meses depois, sua chapa foi eleita para comandar a executiva da sigla. Naquele ano, Lula também havia sido preso por ter liderado as primeiras greves do setor automobilístico no ABC paulista.

Dois anos depois, Lula se apresentou como candidato ao governo de São Paulo e foi derrotado. Mas, mesmo sem mandato parlamentar, já era um líder reconhecido no final da ditadura militar, em 1984, época do movimento “Diretas-Já”. Ele fazia parte da comissão de frente do movimento, ao lado de Ulysses Guimarães, Franco Montoro e Teotônio Vilela.

A primeira eleição para a Câmara dos Deputados foi em 1986. Foi eleito com mais de 650 mil votos e sagrou-se o deputado mais votado do país, participando da elaboração da nova Constituição.

Em 1989, Lula disputou pela primeira vez as eleições para Presidente da República. Nesse momento, ainda era um líder de expressão fechada, barba comprida e que se apresentava em comícios e passeatas vestido de jeans e camiseta. Muito por conta de sua aparência, e de suas palavras de ordem interpretadas, à época, como radicais, Lula era vítima de algum preconceito por uma parcela expressiva da população. Mesmo assim, o candidato chegou ao segundo turno.

Depois dessa, foram mais duas tentativas frustradas de chegar à presidência, em 1994 e em 1998. Em 2002, num momento político totalmente diferente, o petista garantiu sua primeira vitória, com uma diferença superior a 19 milhões de votos.

Em 2006, quando Lula candidatou-se à reeleição, denúncias de corrupção e caixa dois acumulavam-se e a palavra “impeachment” pairava no ar. Mas, para surpresa da oposição, os ataques não conseguiram abalar a preferência do eleitorado, estável em cerca de 40% das intenções de voto favoráveis a Lula. O cenário das eleições para o candidato

Em seu primeiro mandato, Luiz Inácio Lula da Silva enfrentou uma série de crises políticas. A primeira delas foi noticiada em 2004 e envolvia o ex-assessor da Casa Civil. Ele foi filmado enquanto negociava propina com um empresário do ramo de jogos, fato que deu início ao processo de instauração da CPI dos Bingos.

Antonio Palocci tornou-se, pela primeira vez, o centro das atenções, quando a CPI apurou possíveis irregularidades na Prefeitura de Ribeirão Preto durante a sua gestão. Em 2006, o caseiro Francenildo Costa afirmou que o ex-ministro freqüentava uma mansão usada por lobistas para fechar negócios suspeitos e promover festas com prostitutas.

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Mas o governo viveria seu pior momento com a crise do mensalão, iniciada 2005, em virtude da revelação de uma fita de vídeo que mostrava um ex-funcionário dos Correios negociando propina com empresários participantes de uma licitação. É a CPI dos Correios dá a Roberto Jefferson projeção nacional. Jefferson, por sua vez, denuncia um suposto esquema de pagamento de mesada a parlamentares da base aliada, em troca de apoio. Para investigar o caso, uma terceira CPI foi instaurada, a do Mensalão.

A CPI dos Correios ajudou a revelar o esquema de distribuição de recursos a parlamentares para bancar campanhas, apelidado pela imprensa de “valerioduto”, devido ao nome de seu principal operador, o empresário Marcos Valério.

Já em 2006, outro esquema de corrupção foi descoberto pela PF: a máfia das ambulâncias, como foi batizado pela mídia. O escândalo envolvia membros do Congresso Nacional e do Executivo. A CPI dos Sanguessugas foi criada para apurar as possíveis fraudes nas vendas de ambulâncias para prefeituras de diversos Estados.

Ainda assim, a reeleição de Lula era dada como certa ainda no primeiro turno, quando, a 15 dias das eleições, outra denúncia ganhou espaço na mídia. Na ocasião, a Polícia Federal apreendeu vídeos, DVDs e fotos que mostram o candidato do PSDB ao governo de São Paulo, José Serra, entregando ambulâncias da máfia dos sanguessugas. O material contra Serra seria entregue a Gedimar Pereira Passos e Valdebran Padilha da Silva. Os dois foram presos e, em depoimento, Gedimar disse que foi contratado pela Executiva Nacional do PT para negociar a compra de um dossiê contra o tucano, e que do pacote fazia parte uma entrevista, acusando Serra de envolvimento na máfia. Ele disse que seu contato no PT era o assessor especial da Presidência da República, Freud Godoy, que pediu afastamento do cargo. Outros nomes ligados ao PT começaram a ser relacionados ao dossiê. A crise derrubou o coordenador da campanha à reeleição de Lula, Ricardo Berzoini, o presidente do PT, Oswaldo Bargas, o coordenador de programa de governo da campanha, entre outros.

Todas as crises políticas dificultaram a campanha do candidato Lula e conduziram a um desgate de imagem do estadista. Porém, o resultado das urnas indicou que a popularidade do candidato à reeleição resistiu aos ataques. Lula ganhou um novo mandato e recebeu uma avaliação positiva recorde de seu governo: 53% de ótimo ou bom, em outubro, segundo o Datafolha. Descrição geral do material analisado

Os programas do candidato Lula mantiveram basicamente o mesmo formato durante os dois turnos. O tempo de programa foi maior no segundo turno – cerca de 10 minutos cada, em média – do que no primeiro turno – quando cada programa tinha, em média, 7,15 minutos. Eram iniciados com uma vinheta de abertura, com o mote “É Lula de Novo, com a Força do Povo”. Em seguida, os apresentadores conduziam uma explicação sobre as realizações do governo petista em uma ou mais áreas específicas. Na seqüência, o tema – ou temas -que havia sido escolhido como principal assunto do programa era analisado por representantes da população, entrevistados sobre a situação antes do governo Lula e após as realizações conduzidas pelo presidente. Os programas eram finalizados com um discurso do candidato, normalmente focado na apresentação de propostas para um eventual segundo mandato. Um jingle, acompanhado de uma seqüência de imagens bastante sugestiva, fechava o programa. Os jingles foram peçaschave durante a campanha. Nos programas apresentados no primeiro e segundo turnos, foram utilizados quatro jingles diferentes5.

Cerca de metade (56%) dos programas analisados foram desenvolvidos com base em um único tema, como saúde, segurança ou transporte. Nestes casos, um assunto era tratado como fio

5 Letra dos jingles disponível na íntegra no anexo II.

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condutor para a apresentação de realizações e propostas e era retomado durante todo o programa. A outra metade dos programas (54%) versava sobre dois ou mais temas, cada um deles desenvolvido em um trecho do programa. De forma geral, o candidato apostou na apresentação de suas realizações e nas propostas para o futuro. As realizações que mais mereceram destaque foram o crescimento das exportações e do crédito para a população de baixa renda, a queda no risco Brasil, a diminuição do desemprego e da miséria, o aumento real do salário mínimo e as bolsas para estudantes carentes em universidades privadas. Lula evitou responder diretamente às acusações que pairavam sobre o governo e o Partido dos Trabalhadores. E para dissociar sua imagem desses escândalos, utilizou-se dos mais diversos recursos. Um letreiro6, onde se liam, entre outras frases “Começa agora o programa do candidato que não agride nem calunia” foi introduzido às propagandas eleitorais quinze dias após o início da campanha pela TV. Num momento mais crítico, no programa que foi levado ao ar no dia 21 de setembro, o presidente usou do fato de estar em missão oficial em Nova Iorque para não responder diretamente às denúncias. Ele envia um comunicado à nação7, pedindo que os brasileiros mantenham a calma e “não se deixem perturbar pelo desespero dos perdedores”. O texto é lido por um narrador e exibido em forma de letreiro. As críticas feitas à oposição diretamente pelo candidato, durante seu discurso no programa, não foram freqüentes. A biografia diferenciada do metalúrgico e sindicalista foi explorada em todos os programas analisados, ficando extremamente marcada pelos jingles. Em outros momentos, como no discurso do presidente ou nas participações populares, a imagem de presidente que “tem a cara do povo” também foi reforçada.

O cenário dos programas do primeiro turno é limpo, arrojado, semelhante ao de um grande escritório. A partir do programa de 31 de agosto, muda, para assumir elementos ainda mais modernos e sofisticados. O fundo é prateado e o mapa do Brasil aparece em relevo em uma das laterais. O candidato se apresenta com trajes sociais, exceção feita aos dois últimos programas do primeiro e do segundo turnos, em que assume um visual um pouco mais despojado, com calça social, camisa e jaqueta substituindo o terno e a gravata dos outros momentos. Embora assuma uma expressão de seriedade, Lula procura transmitir serenidade durante seus discursos e freqüentemente sorri. A construção da imagem do candidato nas eleições de 2006

As campanhas eleitorais midiatizadas têm substituído, de certa forma, as campanhas de rua, os comícios. A TV, entre outros meios, traduz a estratégia do candidato para seu eleitorado. “Se esses recursos não forem utilizados de maneira apropriada [...] o eleitor não vai ver, nem ouvir, nem se convencer a votar no candidato.” (Haswani, 1995, p. 143)

Nesse sentido, a televisão se legitima como espaço privilegiado de disputa (Makovics, 2007, p. 73). A conjuntura política, econômica e social influenciam de modo significativo o sucesso das campanhas políticas. No entanto, no contexto midiático atual, a decisão de voto também pode ser fortemente influenciada pelo posicionamento do candidato na mídia. Segundo Makovics, “as técnicas de marketing político, associadas à televisão, exploram o simbolismo e a imagem dos candidatos.” (2007, p. 77)

Outro pesquisador do marketing político, o autor Gaudêncio Torquato, segue a mesma linha de pensamento e diz que o trabalho da imagem de um candidato passa pela adoção de recursos de teatralização e que os recursos técnicos disponibilizados pela mídia são utilizados como um meio para melhorar a performance. Com isso, “as pessoas percebem no ator político estados e situações afetivas que lhe são próprias. Identificam-se com ele. E se satisfazem.” (Torquato, 2002, p. 187-188) 6 Texto apresentado pode ser lido, na íntegra, no anexo III. 7 Comunicado pode ser lido, na íntegra, no anexo IV.

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Inserido neste contexto midiático, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva apresentou uma campanha eleitoral criada por profissionais capacitados e baseada em técnicas mercadológicas que, por si só, não compõem o objeto de estudo deste trabalho. Porém, fica evidente o esforço feito pela equipe de comunicação na construção de uma imagem positiva do candidato e a utilização dos recursos audiovisuais próprios da mídia televisiva na busca deste resultado. A origem humilde e a história de vida

Após a breve explanação sobre a vida e a trajetória do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, não restam dúvidas de que ele é um homem de origem humilde, que transitou pelas classes trabalhadoras durante boa parte de sua vida, seja pela condição de operário ou, mais tarde, de sindicalista. Fez carreira na política e, após três tentativas frustradas, elegeu-se Presidente da República. O candidato é, por sua trajetória pessoal, um exemplo vivo de ascensão social.

Nos programas analisados, procuramos observar como essa experiência de vida do candidato foi utilizada de modo a reforçar o conceito de homofilia, na tentativa de relacionar a imagem do candidato a de líder que tem “a cara do povo”.

Em primeiro lugar, importa conceituar homofilia, entendida por Everett M. Rogers, como “o grau em que pares de indivíduos que interagem são similares em certos atributos, como crenças, valores, educação, status e gostos.” (1971, p.210). Segundo as teorias da aprendizagem da mensagem, a transmissão de idéias ocorre com mais freqüência quando fonte e receptor são parecidos. Da mesma forma, elas indicam que a comunicação entre semelhantes é mais recompensadora para os envolvidos nela. (ROGERS, 1971, p. 210).

A equipe de comunicação do candidato à reeleição trabalhou com este conceito e procurou aproximar o líder institucionalizado, já na posição de Presidente da República, do povo simples e humilde que compõe parte significativa da população brasileira. Aqui vale destacar a entrevista concedida pelo publicitário Duda Mendonça, grande responsável pela mudança de imagem do candidato Lula ainda nas eleições de 2002, à autora de uma tese de mestrado sobre o assunto. Na ocasião ele explica que:

O que eu acho um erro, um exemplo do que não deve ser o marketing político, é a descaracterização dos candidatos. Você tentar inventar o candidato [...] O candidato já tem uma história, tem um jeito de ser, tem um vínculo com os eleitores [...] O eleitor sempre procura um candidato verdadeiro [...] Trata-se é de trabalhar a imagem de um candidato, potencializando as suas virtudes” (MARCOS, grifo do autor, 2006, anexo 31)

Nos programas analisados, a origem humilde do candidato foi realmente utilizada como forma de estabelecer esse vínculo entre Lula e seus possíveis eleitores. Mesmo na abertura do programa, marcada pela frase “É Lula de Novo, com a Força do Povo”, a seqüência de imagens já faz referência à origem humilde do presidente, que foi das camadas mais simples da população para o posto de governador da Nação, como também faz o inverso: mostra o presidente, líder institucionalizado, voltando aos braços do povo, às suas raízes. Mostra-se, evidente, a estratégia de reforçar a característica do candidato como homem do povo, conhecedor e, por isso mesmo, mais sensível às necessidades da população de baixa renda.

No primeiro programa do primeiro turno, que foi ao ar dia 15 de agosto de 2006, foi apresentada uma rápida biografia do candidato, narrada pelos apresentadores e ilustrada com fotos do arquivo pessoal do presidente. O filme explorava o fato de que ele saiu de Caetés, interior de Pernambuco, em cima de um pau-de-arara, trabalhou como engraxate, vendeu amendoim e

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tapioca, dividiu “o pouco que tinha” com sete irmãos e reforçava sua atual posição como líder respeitado, inclusive fora do país, e ao mesmo tempo sensível às necessidades dos trabalhadores.

Dessa forma, evidenciava-se também o esforço de marcar a imagem do candidato como a de quem luta pela justiça social. Ainda no trabalho de Mestrado anteriormente citado, diz Duda Mendonça, sobre as estratégias de campanha: “O PT sempre lutou pela justiça social, nós não inventamos isso, apenas procuramos formas mais criativas para comunicá-lo” (MARCOS, 2006, anexo 31).

A semelhança do presidente com o povo é reconhecida, inclusive, por representantes da população. E isso foi explorado em diversos programas, quando possíveis eleitores, de classe social mais baixa, eram entrevistados sobre o impacto das realizações do governo em seu dia-a-dia. No programa apresentado no dia 24 de agosto, por exemplo, uma faxineira representa uma das beneficiadas pelo projeto ProUni, que visa aumentar o acesso de estudantes de baixa renda ao ensino superior. Em um trecho da entrevista, ela diz: “O presidente que é tão cobrado que ele não tem curso superior, eu acho que é por isso que ele tem tanto empenho. Os outros governantes não tiveram essa preocupação porque eles tiveram tudo de mão beijada”.

A teoria, quando trata da semelhança entre fonte e receptor, já prevê algumas razões para que haja essa concordância de opiniões, como a expressa no trecho acima. Segundo Rogers (tradução nossa, 1971, p. 210-211):

A maioria dos indivíduos aprecia o conforto proporcionado pela interação com outros que são muito similares. A interação com aqueles que são muito diferentes envolve mais esforço para que a comunicação seja eficaz. A interação entre heterófilos é mais provável de causar uma dissonância cognitiva, porque o receptor é exposto a mensagens que podem ser contrárias às suas crenças pré-existentes, um estado psicologicamente desconfortável.

Richard M. Perloff destaca mais duas razões para que haja essa concordância de opiniões: a afeição, já que as pessoas tendem a gostar de quem compartilha de suas atitudes, e os processos de comparação social, uma vez que as pessoas tendem a se comparar com semelhantes para receber, assim, uma espécie de validação de seus comportamentos (1993, p. 146-147).

Em relação ao aspecto da afeição, vale recorrer à teoria de equilíbrio de Heider. Segundo o autor, as entidades separadas semelhantes tendem a ser percebidas como unidas. E a formação de uma unidade positiva deve levar a uma relação harmoniosa de sentimento. Sendo assim, pode-se dizer que a semelhança de atitudes leva à afeição. Mas, pela teoria, também pode-se inferir o inverso, que a afeição – ou a opinião prévia que se tem a respeito de alguém que inspira simpatia – pode provocar a percepção de semelhança (BERSCHEID; WALSTER, 1973, p. 70).

Ellen Berscheid e Elaine H. Walster também pontuam que reforçar aspectos de similaridade entre emissor e receptor significa emitir importante estímulo para o processamento da mensagem. A comunicação, feita desta forma, é extremamente compensadora, como expressam as autoras (1973, p. 72):

Podemos nos perguntar por que as pessoas encontram recompensa na semelhança de atitudes. Por que a semelhança deve levar à afeição? [...] Mencionamos uma razão para isso: o desejo de coerência cognitiva é atendido quando a pessoa gosta daqueles que têm atitudes semelhantes às suas.

As autoras ainda esclarecem que, ao verificar que alguém exprime as mesmas opiniões e atitudes que aceitamos, “temos apoio para a noção de que nossa atitude é correta” (1973, p.72).

Seguindo, ainda, essa linha de pensamento, vale destacar, entre os programas analisados,

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um trecho do apresentado no dia 31 de agosto. Na ocasião, mais uma vez aparece a estratégia de mostrar a aproximação do candidato com a realidade do povo. Ao abrir um programa temático sobre energia, e falando especificamente sobre o projeto “Luz para Todos”, Lula inicia seu discurso dizendo: “Eu vivi sem luz e sei muito bem o que é isso”. Essa fala, aparentemente simples, ilustra um recurso utilizado pelo candidato em diversos outros momentos, no decorrer dos dois turnos, em que ele enfatiza sua semelhança com parcela expressiva do eleitorado que o assiste e que pertence a um nível social mais baixo.

Num letreiro exibido durante o programa do candidato Lula, em 07 de setembro de 20068, a tentativa de estabelecer esse processo de percepção de semelhança é mais uma vez reforçado, quando o candidato é chamado de “filho do povo”. O texto indica ainda que, “com sua vitória, é todo o povo que se afirma”.

Nos jingles que encerram os programas, a estratégia de posicionar o candidato como um presidente que tem “a cara do povo” fica ainda mais clara, seja pela edição das imagens ou mesmo pelo discurso empregado. O jingle introduzido a partir da primeira propaganda do primeiro turno, exibida em 15 de agosto de 2006, pode ilustrar essa afirmação. Ele diz: “O Brasil quer seguir em frente com o primeiro homem do povo presidente. Em outro momento: “É o primeiro presidente que tem a alma do povo e tem a cara da gente”. Acompanham esse discurso diversas imagens de trabalhadores (do agricultor ao operário), além de flashes que retratam momentos de interação do presidente com esse povo, durante a campanha. O jingle diz ainda: “São milhões de Lulas povoando esse Brasil [...] onde o presidente é povo e o povo é presidente”.

Ao estimular a percepção de semelhança com o candidato, por parte do receptor, o programa consegue oferecer uma comunicação altamente recompensadora, eficaz e cujo processamento cognitivo é feito de maneira mais confortável. De acordo com Worchel e Cooper, nossa percepção de que estamos certos ou errados em nossos julgamentos é frequentemente baseada nos julgamentos dos outros. E é reconfortante saber que os outros vêem o mundo da mesma forma que nós e que concordam com nossos julgamentos (1976, p. 215). A linguagem partilhada

As teorias de aprendizagem da mensagem que tratam da semelhança entre fonte e receptor destacam a linguagem como mais um fator de aproximação entre os dois pólos. Diz Everett M. Rogers que “quando fonte e receptor dividem significados comuns, atitudes e crenças, e uma linguagem mútua, a comunicação entre eles provavelmente será eficaz.” (grifo nosso, 1971, p. 210)

Na mesma linha, Cacioppo e Petty (apud BIRCH; MCPHAIL, p. 94) também propuseram que as variáveis da linguagem podem ser usadas para estabelecer quão similares são emissor e receptor da mensagem.

No programa apresentado em 22 de agosto de 2006, vale ressaltar o trecho de um discurso do presidente, apresentado minutos antes do fim do programa, em que ele comenta a rejeição, por parte dos outros candidatos, ao projeto do Bolsa Família. Diz Lula: “Tem alguns candidatos chiques que dizem que o Bolsa Família é uma esmola. Realmente, pra quem almoça e sobra metade pra jogar no lixo, é esmola. Pra mim, chama-se o início da dignidade”. Interessante observar que o candidato chamou seu adversário de “chique”, não utilizou outros termos tais como “elitista” ou “de classe social mais elevada”. Lula usou a linguagem que é de seu repertório habitual e que é facilmente compreendida pelo povo mais humilde.

Os próprios jingles, utilizados para fechar todos os programas, exploram termos mais populares, estabelecendo, assim, uma comunicação mais eficaz do candidato com seu público. No

8 Texto disponível na integra no anexo VI.

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jingle introduzido a partir do segundo turno, por exemplo, merecem destaque os versos: “Deixa o homem trabalhar/Tá tudo andando direitinho.” Por estes trechos, é possível observar que a linguagem escolhida para a comunicação com o público privilegia formas da língua mais usuais, em detrimento das formais. E que se privilegia uma comunicação mais direta e clara com os eleitores das classes mais baixas. Considerações finais

Lula é, certamente, um homem que veio do povo, têm origem humilde e uma trajetória

diferenciada em relação aos presidentes que o antecederam. Portanto, é semelhante a grande parte do povo brasileiro em diversos aspectos. Quando fala em candidato chique, conforme trecho anteriormente citado e apresentado em um de seus programas, não faz isso porque foi instruído pela sua equipe de comunicação na tentativa de persuadir o eleitorado através do recurso de aproximação pela linguagem similar. O faz porque o termo integra seu vocabulário corrente. Lula foi, sem sombra de dúvidas, um representante da classe mais humilde com quem se comunica hoje, de seu posto de líder da Nação. E, como já dissemos, essa classe é parcela expressiva de seu eleitorado.

Tendo este fato como dado, ainda convém destacar o trabalho da equipe de comunicação responsável pela edição das propagandas eleitorais do candidato, que foram veiculadas no horário nobre durante primeiro e segundo turnos. Nestes programas, a semelhança do candidato – que existe por conta de sua trajetória pessoal ímpar – foi explorada pelos recursos discursivos e imagéticos de maneira marcante. No jingle, na fala do povo, no discurso do estadista, nas vinhetas, em diversos momentos de cada um dos programas o objetivo de mostrar que Lula é “o presidente que tem a cara do povo” foi contemplado. Esse aspecto ficou bastante evidenciado durante toda a campanha do candidato pela TV e apareceu em todos os programas analisados.

Os resultados favoráveis obtidos por Lula poderiam indicar que a estratégia funcionou. Porém, queremos nos abster de quaisquer conclusões relacionadas à recepção, uma vez que os eleitores não foram ouvidos. Fica sendo este um possível caminho para outros estudos na área. Referências

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Anexos do trabalho Anexo I Gráfico ilustrativo do ano eleitoral, compreendendo as pesquisas feitas pelo Instituto Vox Populi entre os dias 26 de maio e 20 de outubro de 2006. Considerou-se, para esta análise, as pesquisas feitas com voto estimulado. Anexo II 1. Letra do Jingle do candidato Lula utilizado durante todo o primeiro turno em suas propagandas eleitorais gratuitas. “Não adianta tentarem me calar/Nunca ninguém vai abafar a minha voz/Quando o povo quer, ninguém domina/O mundo se ilumina, nós por ele e ele por nós/O mundo se ilumina, nós por ele e ele por nós/O Brasil quer seguir em frente/Com o primeiro homem do povo presidente/Ele sabe governar com o coração/E governa pra todos com justiça e união/É o primeiro presidente que tem a alma do povo/E tem a cara da gente/São milhões de Lulas povoando este Brasi/lHomens e mulheres noite e dia a lutar/Por um país justo e independente/Onde o presidente é povo/E o povo é presidente/Por um país justo e independente/Onde o presidente é povo/E o povo é presidente/Nós estamos aqui de novo...Cantando!/Um sonho novo...Pra sonhar!/Nós estamos aqui de

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novo...Lutando!/A esperança não se cansa...De gritar:É Lula de novo, com a força do povo! (4X)” 2. Letra do jingle introduzido na campanha de Lula no último programa do primeiro turno. “Não troco o certo pelo duvidoso/Eu quero Lula de novo/Não vou jogar fora o que ganhei/Perder tudo que alcancei/Voltar para o sufoco/Pra que começar tudo do zero?/Se eu sempre soube o que quero/Com Lula minha vida melhorou/É apenas o começo/Vem mais coisa sim, senhor (2X)/Não vou deixar a velha turma me enganar/Por mais que eles tentem/Não vão voltar/Quanto mais eles mentem/Não vão ganhar/Não sou bobo, não sou louco/É Lula de novo, com a força do povo. (3x).” 3. Letra do jingle introduzido na campanha de Lula a partir do segundo turno. “A voz de Deus é a voz do povo/Olha Lula aí de novo/Lula é um grande presidente/E vai continuar com a gente/Não troco o certo pelo duvidoso/Eu quero Lula de novo/ Nosso Brasil no rumo certo/Deixa o homem trabalhar/O futuro não é mais incerto/Deixa o homem trabalhar/Nosso povo agora é quem decide/Lula vai continuar/Eu quero Lula lá (2x)/Deixa o homem trabalhar/Tá tudo andando direitinho/Deixa o homem trabalhar Ele trata o povo com carinho/Eu quero Lula lá/E a gente não tem porque mudar.” 4. Letra do jingle introduzido na campanha de Lula, a partir do dia 20 de outubro de 2006. “Do meu futuro eu não abro mão/O que é certo eu não largo, não/Eu quero é mais do que me faz/Ter esperança/O meu coração não cansa/De me chamar pra razão/Eu quero seguir em paz/No rumo certo/Não andar pra trás/Eu quero é mais daquilo/Que me traz respeito/E o orgulho no meu peito/Me dá força pra cantar/Eu quero Lula de novo/Com a força do povo/Eu quero Lula novamente/E o Brasil seguindo em frente/Eu quero Lula presidente (3X)” Anexo III Texto exibido no início de alguns programas do candidato Lula ao final do segundo turno. “Começa, agora, o programa do candidato que não agride e não calunia. O presidente que além de já ter feito muito pelo país, tem as melhores propostas para o nosso futuro.” Anexo IV Comunicado enviado pelo presidente a seus eleitores e exibido durante o programa do dia 21 de setembro de 2006. “Minhas amigas e meus amigos: Acabo de chegar a Nova Iorque para representar o Brasil na abertura dos trabalhos da ONU. Li os jornais brasileiros e reafirmo minha profunda indignação com os acontecimentos envolvendo a disputa eleitoral de S. Paulo. Mais uma vez, peço a apuração rigorosa dos fatos e a punição dos culpados. Seja quem for. Em toda minha vida, nunca concordei com o jogo sujo nas campanhas. Não seria agora, quando concorro à reeleição e todas as pesquisas apontam minha vitória, que iria concordar com este tipo de prática. Cabe uma pergunta ao povo brasileiro: a quem interessa perturbar as eleições? Reflitam sobre isso, mantenham a calma, não aceitem provocações, nem se deixem perturbar pelo desespero dos perdedores.” Anexo V Texto exibido durante o programa do dia 23 de setembro de 2006, cujo tema era segurança. “É assim que se combate o crime organizado e a corrupção. Sem varrer o lixo pra debaixo do tapete e permitindo que a sociedade veja tudo com seus próprios olhos. Sem medo de punir, seja quem for, doa a quem doer. Um comportamento muito diferente de certos políticos que hoje se dizem defensores da ordem e da moral e que, ontem, faziam o contrário. O Brasil sabe muito bem quem deixou S. Paulo refém do crime organizado. E os

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paulistas sabem quem mandou engavetar mais de 60 CPIs para que seu governo não fosse investigado. O povo conhece e respeita Lula. E sabe porque seu trabalho não deve parar. A hipocrisia e o desprezo ao povo não voltarão, jamais, a este país.” Anexo VI “Quando um brasileiro, filho do povo, chega tão longe é todo o povo que se afirma, que mostra a sua força e que prova o seu valor. Viva o Brasil! Viva o povo brasileiro!”

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O discurso sobre o Programa Bolsa

Família como estratégia pós-eleitoral do governo Lula1

Annie MARTINS2

Mariana DOMAKOSKI3

Thaíse MENDONÇA4

Luciana PANKE5

Resumo

O artigo apresenta os resultados da pesquisa desenvolvida no programa de Iniciação Cientifica

do curso de Comunicação Social da UFPR, sobre os discursos do presidente da República Federativa

do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, durante o primeiro mandato, enfatizando o Programa Bolsa Família.

O trabalho pautou-se em pesquisas quantitativas, qualitativas e bibliográficas nas áreas de

Comunicação Política, Pública e Governamental e Teoria da Argumentação. O objetivo principal foi

verificar as estratégias argumentativas do Presidente para reforçar sua imagem após a eleição de 2002,

com o apoio do programa social Bolsa Família.

Palavras-chave: comunicação, discurso político, marketing pós-eleitoral, comunicação política, Lula,

Bolsa Família.

Na eleição presidencial em 2002, o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva apresentou o Programa de Governo organizado em quatro temáticas básicas: “crescimento, emprego e inclusão social”, “desenvolvimento, distribuição de renda e estabilidade”, “inclusão social” e, por último, “infra-estrutura e desenvolvimento sustentável”. As diretrizes do Plano Brasil, nome dado ao plano do governo Lula, defendiam “as bases de um programa popular e democrático para o Brasil”. O material foi articulado em três eixos compostos pelo social, o democrático e o nacional. No decorrer do documento, observou-se uma distribuição temática clara entre eles. No âmbito social, foram justificadas ações de educação, saúde, segurança pública, combate à fome, direitos humanos, cultura nacional, ampliação de bens de consumo, apoio à habitação, o que geraria empregos e a reforma agrária. No âmbito nacional, privilegiaram-se ações econômicas, centradas na reconstrução de um sistema de financiamentos, planejamento econômico enfatizando ações regionais, controle inflacionário, reforma tributária e de defesa da soberania. A principal preocupação relacionava-se ao comércio exterior e à competitividade dos produtos brasileiros no cenário mundial. O item mais extenso dessa temática foi defender o socialismo democrático.

A preocupação com o planejamento também resultou numa pesquisa de opinião realizada pela

1 Resultados parciais a partir de pesquisa desenvolvida na Iniciação Cientifica do Curso de Comunicação Social da UFPR, integrante do Grupo de Pesquisa Mídia, Linguagem e Educação – Meduc – www.meducufpr.org 2 Graduada em Comunicação Social – Relações Públicas – UFPR. Contato [email protected]

3 Estudante do 3o. ano de Comunicação Social – Jornalismo – UFPR [email protected]

4 Estudante do 3

o. ano de Comunicação Social – Jornalismo – UFPR [email protected]

5 Orientadora da Pesquisa. Doutora em Ciências da Comunicação e prof. Adjunta do Depto de Comunicação Social da UFPR. Contato [email protected]

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Criterium – Pesquisas de Opinião e Avaliação em Políticas Públicas, encomendada pelo Partido dos Trabalhadores em novembro de 2002 após a eleição de Lula, em 27 de outubro. O universo pesquisado correspondeu à população com idade a partir dos 16 anos, totalizando 2416 entrevistas aplicadas em 137 municípios distribuídos em 23 estados. A equipe responsável previu, com essa metodologia, um intervalo de 95% de confiança.

As maiores expectativas da população centraram-se na geração de empregos e combate à fome. Os dois temas superaram, inclusive, as tradicionais demandas por saúde e segurança pública. Nas respostas espontâneas, para o primeiro ano, a criação de empregos ficou com 33% da preferência, contra 24% de um projeto de combate à fome. Já para o mandato, 32% avaliaram a questão do emprego como prioridade, contra 19% sobre o combate à fome.

Diante do quadro, observou-se a necessidade de comunicação governamental sobre as temáticas com maior cobrança social, afinal, como alerta Manhaneli (2004, p. 68) “o que está na memória dos eleitores é a esperança apresentada pela candidatura vitoriosa, isso é o que está sendo cobrado”. Neste sentido, a criação do programa Fome Zero, cuja repercussão inicial gerou mobilização e polêmica, passou a ser oferecido por Lula como resposta à expectativa gerada pela promessa de combate à fome. Exaustivamente em seus discursos eleitorais, Lula reforçava que não descansaria enquanto o brasileiro não tivesse três refeições por dia. O discurso, portanto, enquanto ato simbólico, criou um cenário que impulsionou as estratégias adotadas no pós-eleitoral, conforme se verificou na comunicação pós-eleitoral.

Comunicação Pós-Eleitoral e Discurso

O Marketing Político constitui-se de uma série de ações estratégicas a serviço de candidatos, pessoas públicas, governos ou partidos políticos. Portanto, é uma atividade permanente de comunicação com os públicos de interesse e a população em geral. Já o marketing eleitoral implementa estratégias com o fim especifico de eleger determinado candidato, possuindo, então, uma característica temporal predominante. O marketing póseleitoral, por sua vez, é a resposta aos eleitores e à população em geral a respeito das atividades desenvolvidas pelo candidato eleito.

(...) O Marketing Político é utilizado nas gestões políticas ou administrações públicas, para garantir a eficiência do uso das ferramentas adequadas para a comunicação com a população, preservando ou requalificando a imagem do homem público, garantindo assim a correta avaliação popular das ações sociais impetradas pelos atores, e facilitando o processo de reeleição ou eleição futura a outros cargos. (MANHANELLI, s/d)

A comunicação pós eleição não apenas é um instrumental valioso para manter a credibilidade

do eleito, mas, principalmente, um compromisso ético de retorno à população que confiou seu voto. Neste aspecto, ressalta-se a fundamental importância de um discurso articulado entre a teoria e a prática. Cabe à pessoa pública oferecer um discurso coerente e bem argumentado sobre suas ações e propostas.

Perelman e Tyteca (1996), no Tratado da Argumentação, defendem a distinção entre persuadir e convencer, o que também parece sintomático na perspectiva pré e póseleitoral. Mesmo que o candidato tenha conseguido persuadir a ação do eleitorado, após a eleição, há necessidade de convencer, pois sua governabilidade depende da conquista de apoio político e da opinião pública favorável.

(...) para quem se preocupa com o resultado, persuadir é mais do que convencer, pois a convicção não passa da primeira fase que leva à ação. Em contrapartida, para quem está preocupado com o caráter racional de adesão, convencer é mais do que persuadir. Essa característica racional da convicção ora depende dos meios utilizados, ora das faculdades às quais o orador se

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dirige. (PERELMAN e TYTECA, 1996, p.30)

Conforme os autores, os atos de convencer ou persuadir são comuns ao processo de

argumentação, no entanto, a fronteira de significações inerentes aos termos é muito próxima, e deve permanecer assim, ou seja, os argumentos possuem a força da inteligência e da vontade, da razão e do irracional. Por sua vez, os auditórios são imprecisos, e os argumentos do orador se submeterão a eles, levando em consideração o objetivo da argumentação, as reações e objeções dos públicos.

O marketing Pós-Eleitoral prevê uma consistência de práticas das propostas e metas colocadas na pré-eleição. A constante manutenção dos ideais primitivamente apresentados, após a eleição, pode ser realizada pelo orador que utiliza técnicas argumentativas em seus pronunciamentos, como estratégia para consolidar a imagem de seu governo e enaltecer o valor de sua figura como político comprometido em cumprir com os planos e metas.

Coutinho de Lima (1988), aponta ainda um aspecto fundamental para o sucesso das estratégias de Marketing Político. Trata-se do processo de identificação do eleitorado com candidato, ou no caso do marketing pós-eleitoral, com o governante. O autor descreve a existência de três grupos: público primário, possui uma base de identificação natural com o político, público secundário, a base de identificação com o candidato foi deriva de testemunhos ou estímulos por parte do grupo anterior. O terceiro grupo, que mais interessa a essa pesquisa, é o público indireto, “composto por todos os eleitores que não tem uma relação direta com o candidato ou seu público primário”. A base de identificação deste grupo é construída, segundo o autor, através dos meios de comunicação de massa e da credibilidade atribuída ao político, ou seja, da imagem pública construída pelo candidato.

O processo de identificação entre orador e auditório é conceituado também pela Teoria da Argumentação. Segundo Perelman e Tyteca “auditório é o conjunto daqueles que orador quer influenciar com sua argumentação, (...) o auditório presumido é sempre, para quem argumenta, uma construção mais ou menos sistematizada” (p. 22, 1996). O orador por sua vez, é tratado como alguém que fala e pensa de forma mais ou menos organizada e consciente, e seu foco está naqueles que procura persuadir e que constituem o auditório ao qual se dirigem seus discursos. Ao auditório cabe o papel principal de determinar a qualidade da argumentação e o comportamento dos oradores. Perelman e Tyteca (1996) destacam que para se fundamentar, o orador necessita realizar escolhas com a finalidade de alcançar a adesão de seus ouvintes, dessa maneira utiliza-se de premissas, que servirão para a construção do discurso, isto é, o objetivo é estabelecer um acordo, uma combinação de idéias entre o orador e o auditório. Estas premissas são baseadas na categoria do real, que corresponde à racionalidade dos argumentos e cujo discurso é dirigido a um auditório universal – homogêneo, e na categoria do preferível, cujo orador se fundamenta na subjetividade e dirige-se a auditórios particulares, em que os referenciais culturais e econômicos do público são variáveis.

Para esta análise serão consideradas as estratégias de marketing pós-eleitoral baseadas fundamentalmente nos argumentos expostos no discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre o programa Bolsa Família. O corpus da pesquisa configura-se nos pronunciamentos oficiais realizados entre os anos de 2003 e 2006. A classificação das técnicas argumentativas elaboradas por Perelman (1996) foi a principal ferramenta de análise dessas estratégias. A argumentação objetiva provocar ou aumentar a adesão dos espíritos às teses que se apresentam a sua concordância. É uma ação que pretende modificar um estado de algo preexistente, e ela se apresenta em um contexto em que orador, o auditório, as premissas e o acordo se fundem formando um discurso fundamentado por técnicas argumentativas.

De acordo com os autores, as técnicas argumentativas dividem-se em três categorias: os Argumentos Quase-lógicos, os Argumentos Baseados na Estrutura do Real eo Fundamento pelo Caso Particular. A primeira é baseada em raciocínios matemáticos ou de fundamento lógico, tais como: Contradição e Incompatibilidade, Ridículo, Identidade, Tutologia, Análise, Reciprocidade, Transitividade, Inclusão da Parte no Todo, Divisão do Todo em Partes, Comparação, Sacrifício e Probabilidades. A

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segunda é suscetível à interpretação e relaciona-se com os conhecimentos empíricos do orador e do auditório. Ela é baseada em ligações de sucessão (Vínculo Causal, Fins e Meios, Desperdício, Direção e Superação), e de coexistência (Pessoa e seus Atos, Autoridade, Grupo e seus Membros e Ligação Simbólica), que são simbólicas e hierárquicas, pois busca nos fatos empíricos a sustentação necessária para a defesa da tese. A terceira categoria, fundamentada pelo Caso Particular, utiliza-se de exemplos, ilustrações ou modelos que possam aproximar o discurso da realidade vivenciada pelo público-alvo.

Resultados e discussões

Durante a campanha eleitoral de 2002 que tornou Luis Inácio Lula da Silva Presidente da República, verificou-se a importância da temática inclusão social e da construção da imagem do presidente como um candidato que pretendia atuar ao lado do povo e em favor dele. Partindo desta premissa, a análise dos pronunciamentos oficiais procurou compreender os usos dos programas sociais voltados ao combate à fome como componente dos discursos e como um elemento na consolidação da imagem trabalhada na campanha. Nos quatro anos do seu primeiro mandato, o presidente dedicou 23,11% dos pronunciamentos oficiais aos programas Bolsa Família e Fome Zero. Dos 1073 pronunciamentos realizados no período, 148 apresentaram referência direta ao Programa Bolsa Família e em outros 100 o presidente fez menção ao Programa Fome Zero.

A partir desta análise pode-se perceber que a temática do combate à fome recebeu amplo destaque nos pronunciamentos oficiais. Para tentar compreender a forma como essa relevância caracteriza o discurso do presidente, foi realizado um estudo lexical com as expressões fome, Fome Zero e Bolsa Família. Abaixo, a tabela demonstra os usos e repetições dos termos durante os quatro anos.

Após uma primeira análise lexical, foram selecionados os pronunciamentos em que o presidente Lula fez referência direta ao Programa Bolsa Família, foco da pesquisa. Então, os pronunciamentos foram analisados e classificados conforme cada auditório, partindo da identificação dos acordos entre orador e público e das adaptações realizadas no discurso para adequá-lo às premissas aceitas. Como suporte metodológico foram criadas três categorias para organizar os pronunciamentos de acordo com cada público: Auditório popular, auditório internacional e a auditório formado por lideranças locais.

Para o auditório popular, foram considerados todos os pronunciamentos direcionados à classe trabalhadora e às comunidades em geral, comumente atingidas durante inaugurações de obras ou comemoração de datas ou metas de programas governamentais. Verificou-se que este auditório configurou-se como um importante público-alvo durante todos os quatro anos. Em 2006, os pronunciamentos foram majoritariamente direcionados ao segmento popular da sociedade, correspondendo a 51,16%. As tabelas a seguir ilustram a quantidade de discursos contendo a

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expressão Bolsa Família que foram direcionados ao auditório popular. Destaca-se o papel permanente deste público nos pronunciamentos do presidente.

Tabela 1: Pronunciamentos contendo a expressão Bolsa Família voltados ao auditório popular

Ano Corpus Apoio Popular Outros Auditórios

2003 5 2 3

2004 44 11 33

2005 56 20 36

2006 43 22 21

Total 148 55 90

Tabela 2 – Total de pronunciamentos com a expressão Bolsa Família voltados ao auditório popular.

Gráfico 2 – Classificação dos pronunciamentos voltados o auditório popular em porcentagem.

Uma etapa importante da pesquisa qualitativa foi a análise da totalidade dos pronunciamentos em que a expressão Bolsa Família foi mencionada e a identificação das técnicas argumentativas que utilizaram o Programa como instrumento discursivo. A tabela abaixo apresenta os dados analisados.

Técnicas argumentativas direcionadas ao auditório popular

Principais técnicas Apoio Popular

Direção 28

Superação 28

Contradição 23

Fundamento pelo caso particular 16

Pessoa e seus Atos 10

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Fins e meios 12

Identidade 9

Vínculo causal 5

Probabilidade 4

Desperdício 2

Argumento pragmático 2

Ligação Simbólica 2

Transitividade 2

Comparação 1

Tabela 3 – Total das Técnicas argumentativas direcionadas ao auditório popular

De acordo com a tabela 3, pôde-se verificar o predomínio das técnicas argumentativas de Direção e Superação nos discursos direcionados a angariar o apoio popular. Essas técnicas se fundamentam nos argumentos baseados na estrutura do real e procuram demonstrar, respectivamente, onde se quer ou deve chegar com uma ação, evitando ameaças, chantagens ou qualquer desconfiança do auditório, e o que se passou para alcançar determinado ponto.

Cada vez que uma meta pode ser apresentada como um ponto de referência, uma etapa numa certa direção, o argumento de direção pode ser utilizado. Esse argumento responde à pergunta: aonde se quer chegar? (...) Os argumentos da superação insistem na possibilidade de ir sempre mais longe num certo sentido, sem que se entreveja um limite nessa direção, e isso com um crescimento contínuo de valor (...) para mostrar que o que era considerado um obstáculo, é na realidade, um meio para se chegar a um estágio superior. (PERELMAN e TYTECA, 1996, p.321-329.)

É bastante comum no discurso sobre o Bolsa Família voltado ao público popular o uso das técnicas de Direção e Superação aliadas em um mesmo cenário argumentativo. Enquanto o orador aponta o objetivo a ser conquistado ele também detalha as dificuldades e vitórias obtidas durante o processo, o que valoriza a conquista do

presidente. No trecho abaixo, retirado do pronunciamento realizado durante a cerimônia de entrega de cartões do Programa Bolsa Família, em Santo André (SP), o uso das técnicas citadas demonstra essa situação.

Nós assumimos um compromisso de que, até o dia 31 de dezembro de 2006, todas as famílias brasileiras que ganham ou que estão vivendo naquela faixa considerada a faixa abaixo da linha da pobreza, iriam receber um programa de transferência de renda que lhes permitisse ter um mínimo de ação para a sua sobrevivência. E pelo IBGE, esses números davam por volta de 11 milhões e 400 mil famílias (Lula, 04 de junho de 2005).

No exemplo acima, o presidente relaciona a meta de atendimento global de todas as famílias

que vivem abaixo da linha de pobreza com os seus compromissos assumidos em campanha eleitoral e, de certa forma, reafirma sua disposição em cumpri-los. Ao dizer que a meta será cumprida e que resultará na eliminação completa da fome, a técnica de Superação funciona para ressaltar a grande conquista do governo Lula e aproximá-lo daquilo que defendia enquanto candidato.

Outro exemplo do uso da técnica de superação é o pronunciamento realizado durante o lançamento da proposta de implementação dos objetivos do milênio nas comunidades de Madureira, Oswaldo e bairros adjacentes no Rio de Janeiro-RJ, em novembro de 2004. Na ocasião, o argumento baseado na Superação foi utilizado para valorizar as dificuldades enfrentadas para alcançar as metas anunciadas. Dessa forma, o presidente deixa claro que vencer o desafio da fome é uma tarefa difícil, mas que, como o seu governo assumiu a responsabilidade de resolver o problema, ele irá cumprir a promessa. Tal argumento colabora para centrar na figura do presidente e no mandato que exerce as

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reais possibilidades de resolver o problema.

Eu sei que não é uma tarefa fácil porque, se fosse fácil alguém já teria feito. É muito difícil. Mas nós assumimos a responsabilidade de que é possível a gente combater, de que é apenas uma questão de a gente amadurecer, convencer e motivar a sociedade, criar um clima de solidariedade como esse que estamos vendo aqui, e a gente vai perceber que é muito mais fácil acabar com a fome do que se escreveu neste país. (Lula, 05 de novembro de 2004).

A técnica de superação também foi utilizada na elaboração de discursos que tinham como

principal força argumentativa a história de vida do presidente e não apenas os sucessos dos programas Bolsa Família e Fome Zero. No pronunciamento realizado durante o ato público comemorativo do Programa Um Milhão de Cisternas Rurais em Lagoa Seca-PB, as dificuldades que Lula passou na infância funcionam como elemento discursivo, primeiramente estabelecendo uma identificação imediata com seu auditório, enaltecendo sua imagem como pessoa que conseguiu ir adiante a seus projetos pessoais e profissionais, e em seguida mostrando a possibilidade de superar os obstáculos.

Eu digo, sempre, que não tenho o pescoço grande porque quando eu tinha sete anos de idade já ia para um açude carregar lata d‟água na cabeça, para poder beber. A cisterna já é uma revolução, porque a água já está melhor tratada, as pessoas podem tratar a água e as crianças podem beber água boa. (LULA, Luís Inácio. 30 de outubro de 2003).

Outras técnicas que se destacam nos discursos proferidos pelo Presidente com menção ao

Bolsa Família durante o primeiro mandato são as de Contradição (23 usos), Fundamento pelo Caso Particular (16) e Pessoa e seus Atos (10). A técnica de Contradição tem como fundamento os argumentos quase-lógicos, baseados em raciocínios matemáticos ou de fundamento lógico e procura convencer que a tese do adversário é incompatível com a realidade. Abaixo está exemplificado o uso dessa técnica como uma forma de defesa contra possíveis críticas direcionadas ao Programa Bolsa Família e à maneira como o Governo Federal o administra.

Obviamente que temos falhas, porque é humanamente impossível o governo federal fiscalizar uma por uma as pessoas e, também, porque em algumas regiões do Brasil – vocês viram na televisão – os prefeitos ao invés de chamarem as pessoas pobres para dar o Bolsa Família... graças a Deus, poucas pessoas se utilizaram do Programa para fazer comícios e cadastrar pessoas que sequer tinham direito a receber esse Plano. O que é importante é que a maioria do povo brasileiro, a grande maioria, a absoluta maioria, é de pessoas honestas e decentes. (Lula, 05 de novembro de 2004).

A utilização da técnica tende a tirar do governo a responsabilidade sobre as irregularidades

encontradas na distribuição do benefício. No trecho acima, o Presidente apóia-se na técnica da Contradição, com o objetivo de demonstrar que as críticas não devem ser direcionadas à administração federal. Tal técnica também é utilizada como forma de rebater as críticas de que o programa é assistencialista ou que não resolve de verdade o problema da fome. A forma especifica de refutar é afirmar que quem nunca passou fome não tem noção real do problema e por isso a crítica é sem sentido.

Essa política de Combate à Fome é isso. Tem muita gente que diz: “Mas isso é proselitismo”. É proselitismo para quem está com o buchinho cheio. (Lula, 17 de março de 2004)

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A técnica do Fundamento pelo Caso Particular, baseada no uso de exemplos, ilustrações e modelos, funciona para reafirmar os argumentos e fortalecer o apoio do auditório às teses defendidas pelo orador. Para Perelman e Tyteca (1996, p.399), a argumentação pelo caso particular, pode se apresentar em papéis variados: como exemplo, irá implicar numa generalização dos fatos; como modelo, incentivará a imitação e como ilustração, estabelecerá uma regularidade. O discurso escolhido para representar essa técnica ocorreu na cerimônia de assinatura de convênios para saúde na Baixada Fluminense, em Queimados (RJ), no dia 20 de janeiro de 2006. Nesse caso, argumentos fundamentados pelo Caso Particular mostram modelos que devem ser seguidos, e, no caso do presidente Lula, um exemplo de administração.

É por isso que nós temos 8 milhões e 700 mil famílias recebendo o Bolsa Família. É pouco? É pouco, mas estamos dando à família o direito de comprar a ração básica, é por isso que eu vi na televisão, esses dias um saco de cimento a 8 reais. Quando eu tomei posse estava 22,50 e está 8 reais hoje. É por isso que as donas de casa estão comprando sacos de arroz de cinco quilos, que custavam 13 reais, por 4,80 ou por 5,20. Porque as coisas demoraram para ser consertadas, a casa estava desarrumada, as coisas estavam encrencadas e vocês viram que esta semana eu fiz um pronunciamento devolvendo ao FMI um dinheiro que tinha sido colocado à nossa disposição por causa da crise de 1998 e 2001, que nós estávamos pagando juros. (Lula, 20 de janeiro de 2006).

A quinta técnica mais utilizada pelo presidente nos pronunciamentos voltados ao segmento popular é a de Pessoa e seus Atos. Tal técnica tende a evidenciar que o orador não mudou, ou seja, que os compromissos assumidos anteriormente ainda são importantes e que serão cumpridos. Em pronunciamento realizado na cerimônia de visita às futuras instalações do campus da Univasf em Juazeiro-BA, em 21 de fevereiro de 2006, Lula explorou essa técnica.

Mas não é apenas isso. Neste estado aqui, nós cuidamos dos pobres. Só o Bolsa Família atende, aqui na Bahia, 1 milhão e 70 mil famílias, e isso tem um repasse do governo federal, do Ministério do Desenvolvimento Social, de 844 milhões de reais por ano. Eu estou aqui na frente do Governador, na frente de autoridades da Bahia, de Pernambuco, na frente da imprensa e na frente do povo. Eu duvido que desde o dia em que o Brasil foi descoberto, teve algum governo que cuidou mais dos pobres da Bahia do que nós estamos cuidando neste governo. Duvido. (Lula, 21 de fevereiro de 2004)

No trecho acima, o uso da técnica Pessoa e seus atos pode ser verificado devido à força argumentativa do discurso estar centrada no orador e no convencimento de que o presidente irá cumprir seus compromissos. O compromisso funciona como instrumento argumentativo suficiente. Tal técnica resulta também no fortalecimento da imagem pessoal do orador. O presidente acaba por consolidar uma imagem previamente construída de um herói do povo, que luta por suas causas e que não mudou sua ideologia; seus pensamentos permanecem os mesmos, puros. Ele cita as metas do Programa Bolsa Família como um prova de que aquilo que ele sempre prometera estava sendo cumprido pouco a pouco, nos estados brasileiros. No momento em que Lula menciona a possibilidade de que nenhum governo havia disponibilizado tanta atenção aos pobres, ele reafirma o caráter histórico de suas promessas, tornando o Bolsa Família uma espécie de ponte para obter a simpatia do público. Considerações Finais

Após esta pesquisa e com os dados fornecidos por ela, pode-se concluir que o Programa Bolsa Família serviu para reforçar a imagem pública de Lula, tanto em âmbito nacional quanto internacional,

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solidificando a postura adotada nas eleições de 2002 quando o atual Presidente dizia que “o medo venceu a esperança”. Em um aspecto simbólico geral, a esperança era personificada pela figura do Presidente. Enquanto, em uma visão especifica, pode-se observar que a esperança constituiu-se nas ações específicas como o Bolsa Família, especialmente, no que se refere às camadas menos favorecidas da população.

Quando se considera que a comunicação governamental é permeada de diversas estratégias, das quais destaca-se o discurso presidencial, conclui-se que o Programa tornou-se um referencial no posicionamento estratégico do governo, amparando as ações do marketing pós-eleitoral. O Bolsa Família foi usado como argumento e estratégia discursiva para desencadear ações políticas e angariar adesões nacionais e internacionais. Sobretudo, demonstrou ser o reforço da imagem de “pai dos pobres” adotada pelo Presidente. Interessante também ressaltar que esta postura auxiliou na manutenção de Lula às raízes históricas que o levaram ao poder. A linguagem desenvolvida por Lula em seus pronunciamentos, mostrou que as técnicas de Superação, Direção, Pessoa e seus Atos, Fins e Meios e o Fundamento pelo Caso Particular, as quais pertencem à categoria da estrutura do real, em que juízos de valor e a interpretação subjetiva vão fundamentar a opinião do auditório, foram as mais utilizadas para consolidar o apoio popular.

Pautada pela Teoria da Argumentação, a pesquisa identificou que os argumentos utilizados pelo presidente Lula em seus pronunciamentos oficiais retratam comumente a figura do presidente Lula identificada às dificuldades do povo brasileiro, enaltecendo as propostas de seu governo e realizando uma promoção da imagem de ambos. É fundamental compreender que a verdadeira argumentação é baseada em elementos que possibilitem o pensar, a escolha e a liberdade que o auditório possui para interpretar um discurso. Para Perelman e Tyteca, “apenas a existência de uma argumentação, que não seja nem coerciva nem arbitrária, confere um sentido à liberdade humana, condição de exercício de uma escolha racional” (1996, p.581).

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As conotações político comunicacionais no discurso de Monteiro Lobato em

sua obra e em suas traduções

Katia Regiane Gonçalves dos SANTOS1

Roberto Gondo MACEDO2

Resumo

O presente artigo irar discorrer sobre as traduções de Monteiro Lobato e Carlos Lacerda no

Brasil desde o período de 1920 até 1970 e a repercussão política que algumas dessas traduções

causaram naquela época. Na égide da comunicação política, um dos princípios para garantir a

integridade da imagem pública de um determinado grupo político é a atenção nos atores sociais que

podem, segundo suas limitações promover e fomentar afrontas contra o sistema governamental

vigente por intermédio de suas obras, como charges, gravuras, livros, programas de rádio e TV,

dentre outros. Cabe a cada grupo político em seu período de vigência de governo desenvolver

técnicas comunicacionais que inibam ou controlem essas manifestações evitando problemas nas

ações de propaganda política.

Palavras-chave: Comunicação Política; Monteiro Lobato, Estado Novo, Getúlio Vargas Introdução

Monteiro Lobato foi o precursor da literatura infantil no Brasil e ficou conhecido como um conjunto educativo. A produção infantil compreende metade de toda sua obra que é composta de 30 volumes, também foi criador do personagem Jeca Tatu3

no grande sucesso Urupês, o homem do interior brasileiro.

Fundou a Companhia Editora Nacional e os "produtos" dessa nova editora abrangiam uma variedade de títulos, inclusive traduções de Hans Staden e Jean de Léry. Além disso, os livros garantiam o "selo de qualidade" de Monteiro Lobato com projetos gráficos muito bons e com enorme sucesso de público.

Desde então, Lobato continuou a escrever livros infantis de sucesso, especialmente com

1 Bacharel e Licenciada em Letras pelo Centro Universitário de Santo André, Pós-Graduada em Lingüística pela Universidade Metodista de São Paulo e Mestranda em Letras pela Universidade de São Paulo. Atua na docência superior e treinamentos corporativos de idiomas. 2 Matemático e Analista de Sistemas pelo Centro Universitário Fundação Santo André, Pós-Graduado em Direito Educacional pela Faculdade São Luis, Mestre em Administração Pública pela USCS e Doutorando em Comunicação Social, Propaganda Política pela UMESP. É docente universitário nos níveis de Graduação e Pós-Graduação, bem como consultor na área de comunicação mercadológica e gestão. 3 Jeca era um grande preguiçoso, totalmente diferente dos caipiras e índios idealizados pela literatura romântica do período modernista, pois Monteiro Lobato se recusava a participar do movimento modernista. Seu aparecimento gerou uma enorme polêmica, em todo o país, pois o personagem era símbolo do atraso e da miséria que representava o campo no Brasil. Monteiro Lobato conheceu apenas o caipira caboclo e generalizou o comportamento destes para todos os caipiras causando muita polêmica.

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Narizinho e outros personagens, como Dona Benta, Pedrinho, Tia Nastácia, o boneco de sabugo de milho Visconde de Sabugosa e Emília, a boneca de pano.

Além disso, por não gostar muito das traduções dos livros europeus para crianças, e sendo um nacionalista convicto, criou aventuras com personagens bem ligados à cultura brasileira para recuperar os costumes da roça e lendas do folclore. Continuou a fazer uma mistura de personagens brasileiros e os enriqueceu '"misturando-os" a personagens da literatura universal, da mitologia grega, dos quadrinhos e do cinema. Desenvolvimento nacional e campanha do petróleo

Implantou Companhia Petróleos do Brasil e fundou várias empresas para fazer perfuração de

petróleo, como a Companhia Petróleo Nacional, a Companhia Petrolífera Brasileira e a Companhia de Petróleo Cruzeiro do Sul, e, a maior de todas (fundada em julho de 1938), a Companhia Matogrossense de Petróleo que visava perfurar próximo da fronteira com a Bolívia, país vizinho que já havia encontrado seu petróleo.

Com isso Lobato prejudicou os interesses de gente muito importante na política brasileira e de grandes empresas estrangeiras. Começava nesta fase a luta que o deixou pobre, doente e desgostoso. Havia interesse oficial em se dizer que no Brasil não havia petróleo. Tendo-os como adversários, passou a enfrentá-los publicamente.

Por alguns anos, seu tempo foi dedicado integralmente à campanha do petróleo e a sua sobrevivência garantiu-se pela publicação de histórias infantis e da tradução magistral de livros estrangeiros como O Livro da Selva, de Rudyard Kipling (1933), O Doutor Negro, de Arthur Conan Doyle (1934), Caninos Brancos (1933) e A Filha da Neve (1934), ambos de Jack London, entre outros.

Teimava em dizer que era preciso explorar o petróleo nacional para dar ao povo um padrão de vida à altura de suas necessidades. Tentou, sem êxito, organizar uma companhia petrolífera mediante subscrições populares.

Aceitou o convite para ingressar na Academia Paulista de Letras e, com isso, apresentou um dossiê de sua campanha em prol do petróleo, O Escândalo do Petróleo (1936), no qual acusava o governo de "não perfurar e não deixar que se perfure". O livro esgotou várias edições em menos de um mês. Aturdido, o governo de Getúlio Vargas proibiu e mandou recolher todas as edições. Com isso, criou a União Jornalística Brasileira, uma empresa destinada a redigir e distribuir notícias pelos jornais.

Lobato enviou uma carta ao ministro de Agricultura que precipitara a abertura de um inquérito sobre o petróleo. Recebeu convite de Getúlio Vargas para dirigir um ministério de Propaganda, mas Lobato recusou.

Em uma outra carta ao presidente fez severas críticas à política brasileira de minérios. O teor da carta foi tido como subversivo e desrespeitoso e isso fez com que fosse detido pelo Estado Novo, acusado de tentar desmoralizar o Conselho Nacional do Petróleo, ironicamente presidido à época pelo general Horta Barbosa que foi o responsável por colocar Lobato atrás das grades do Presídio Tiradentes e que, abraçando as idéias de Lobato, se tornaria em 1947 um dos maiores líderes da nacionalista Campanha do Petróleo. Lobato foi condenado a seis meses de prisão e permaneceu encarcerado de março a junho de 1941.

Uma campanha promovida por intelectuais e amigos conseguiu fazer com que Getúlio Vargas concedesse o indulto que o libertaria e reduziu sua pena de seis para três meses na prisão.

Apesar disso, Lobato continuou sendo perseguido e o governo fazia de tudo para abafar suas idéias. Foi então que passou a denunciar as torturas e maus tratos praticados pela polícia do

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Estado Novo4. Em 1943 foi fundada a Editora Brasiliense por Caio Prado Júnior que negociou com Lobato

a publicação de suas obras completas. Em seguida recusou a indicação para a Academia Brasileira de Letras, de onde tinha sido derrotado há alguns anos. Entretanto integrou a delegação paulista do I Congresso Brasileiro de Escritores reunidos em São Paulo que divulgou no encerramento uma declaração de princípios exigindo legalidade democrática como garantia da completa liberdade de expressão do pensamento e redemocratização plena do país.

Suas companhias foram liquidadas e a censura da ditadura faz com que Lobato se aproximasse dos comunistas chegando a receber convite do Partido Comunista para integrar a bancada de candidatos. Mesmo sendo um simpatizante do partido recusou o convite, mas enviou uma nota de saudação que foi lida por Luís Carlos Prestes num grande comício realizado em 1945 no estádio do Pacaembu.

Segundo John Milton, especialista em tradução literária e professor do departamento de Letras Modernas da Universidade de São Paulo, em seu ensaio, juntamente com Eliane Euzébio, que examina os diferentes aspectos das traduções de Monteiro Lobato, pois há diferentes aspectos das associações entre tradução e política, focalizando traduções que foram realizadas no Brasil entre 1930 e 1945, período marcado pelo governo ditatorial de Getúlio Vargas.

Foi feito uma análise referente a relação entre tradução e política fiscal e em outro momento foi estudado as traduções – ou melhor, adaptações – de Peter Pan e Dom Quixote Monteiro Lobato.

A política protecionista do governo brasileiro durante os anos 30 buscava desenvolver a indústria brasileira e promover a substituição das importações. Conseqüentemente, fixaram-se tarifas elevadas para a maioria dos bens importados, inclusive livros e papel.

A equação, no entanto, é um pouco mais complicada. Em 1918, Monteiro Lobato, então no início da sua carreira editorial, criticou as baixas tarifas impostas pelo governo brasileiro aos livros importados, que os tornavam mais baratos do que o similar nacional, além de isentar de impostos todos os livros importados de Portugal, graças a um acordo especial e à necessidade de atender a uma demanda não muito significativa por obras técnicas e científicas.

Como editor Lobato desejava, naturalmente, que seus livros tivessem uma vantagem competitiva em relação às obras estrangeiras, o que o levava a defender a taxação desses produtos.

Por outro lado, ele defendia tarifas baixas para o papel importado. A incipiente indústria do papel brasileira, que tinha um lobby5

poderoso, precisava importar celulose e máquinas caras, e não dispunha da técnica necessária para garantir um bom produto. Dessa forma, Lobato queria ter acesso a papel importado de alta qualidade e baixo preço, mas não queria a concorrência dos livros importados, mais baratos do que os nacionais.

A elevação de tarifas sobre praticamente todos os bens importados efetivamente ocorreu depois de 1930, quando os rebeldes nacionalistas, liderados por Getúlio Vargas, derrotaram as forças da República Velha e conseguiram consolidar a indústria editorial brasileira. No entanto, a maioria das editoras não tinha outra alternativa a não ser usar papel brasileiro de baixa qualidade,

4 Estado Novo (nome tirado da ditadura de Antonio de Oliveira Salazar em Portugal) durou até 29 de Outubro de 1945 quando Getúlio Vargas foi deposto pelas Forças Armadas. Nesse período, Getúlio Vargas determinou o fechamento do Congresso Nacional e extinção dos partidos políticos, outorgou uma nova constituição que lhe conferia o controle total do poder executivo e lhe permitia nomear interventores nos estados, aos quais Getúlio deu ampla autonomia na tomada de decisões, e previa um novo legislativo, porém nunca se realizaram eleições no Estado Novo. 5 A expressão lobby em muitas áreas do conhecimento conota formação de cartel em determinado segmento de mercado, onde grandes empresas monopolizam os insumos de produção, bem como não permitem a livre concorrência, reportando em alguns casos a condicionante de valores taxados de forma proibitiva e ilícita. No caso de Lobato, o segmento editorial criava mecanismos de inibir o seu crescimento nas ações de sua editora.

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que tinha um custo de produção mais elevado do que o papel estrangeiro. A produção de livros aumentou substancialmente na década de 30 e continuou a crescer

durante a Segunda Guerra Mundial. As políticas governamentais causavam um impacto considerável sobre a indústria do livro: a reforma do ensino básico resultou em maior demanda por livros escolares; e a desvalorização da moeda, com a adoção do milréis (1930-31), fez com que, pela primeira vez, os livros importados custassem mais caro do que os publicados no Brasil.

Esse fato ajudou a aumentar o número de traduções e a reduzir o volume de livros importados da França, bem como a estimular a exportação de livros do Brasil para Portugal. Além disso, a situação precária dos direitos autorais no período possibilitava aos editores infringir abertamente a legislação sobre o assunto, ensejando a realização de várias traduções de uma mesma obra, cada uma delas voltada para um mercado específico.

As traduções de obras literárias de sucesso costumavam ser um bom investimento. Se a obra já fosse de domínio público, não precisaria pagar royalties6, e as chances de uma obra estrangeira ser bem aceita pelo público brasileiro – acostumado a consumir produtos de fora – eram muito maiores do que as de um livro escrito por um desconhecido autor brasileiro.

Lobato foi o primeiro editor no país a procurar desenvolver um mercado de massa para livros e transformar a indústria editorial em uma indústria de consumo. Até então, a atividade editorial estava nas mãos de companhias portuguesas ou francesas, e o público alvo era, basicamente, a elite francófila de classe média.

Ele acreditava que uma indústria editorial em expansão impulsionaria o desenvolvimento do país: “Um país de faz com homens e livros” (Koshiyama, 1982:99). As pessoas costumam agir baseadas na experiência de outras pessoas, que é veiculada nos meios de comunicação, principalmente nos livros. Enfatizou a importância que o Brasil deveria dar à sua própria cultura. Sempre foi contra seguir a cultura francófila dominante, que copiava a última moda parisiense nas artes, música e literatura.

Queria abrir o Brasil às literaturas alemã, russa, escandinava e anglo-americana, e traduziu e adaptou obras como Peter Pan, Alice no País das Maravilhas, Robinson Crusoé, Tom Sawyer, Huckleberry Finn e As viagens de Gulliver.

Lobato acreditava que o Brasil deveria voltar-se para o interior, para seu próprio folclore e mitos tradicionais. No entanto, o interior brasileiro precisava ser despertado. O escritor, sempre um homem prático, incentivou campanhas de vacinação e melhorias nas condições sanitárias básicas.

Era necessário que o governo estimulasse o investimento no campo, e os próprios habitantes dessas regiões sofriam de indolência, caracterizada na figura de Jeca Tatu, que contrasta radicalmente com os personagens rurais idealizados de José de Alencar, por exemplo.

A adaptação de Don Quijote, D. Quixote das Crianças, é bem típica de Lobato: a travessa boneca de pano, Emília, alter ego do escritor, retira da estante um livro grande e pesado, uma tradução portuguesa da obra de Cervantes, que Dona Benta começa a ler para seus netos e bonecos.

Todos, no entanto, acham o estilo do texto muito pomposo. Depois de ouvir “lança em cabido, adarga antiga, galgo corridor” (Monteiro Lobato, 1957:16), Emília – que, como Lobato, é contra tudo que é antiquado e retrógrado – não entende nada, perde o interesse e se prepara para brincar de esconde-esconde. Diante disso, Dona Benta resolve contar a história para as crianças com suas próprias palavras.

O mesmo recurso é usado em Peter Pan, enquanto Robinson Crusoé (1930), As viagens de

6

Definição dada as taxas sobre direitos autorais, sejam de caráter de propriedade intelectual ou algum produto ou

serviço regularmente patenteado. São definidas pelos seus detentores de direitos e sem a autorização de uso de imagem a possibilidade de entraves judiciais é representativa.

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Gulliver (1937), Alice no País das Maravilhas e Alice no País do Espelho são adaptados sem intervenções narrativas. Quase no final do livro D. Quixote das Crianças, Pedrinho pergunta à avó se ela está contando a história inteira ou apenas fragmentos, ao que Dona Benta replica que apenas pessoas adultas deveriam tentar ler a história na íntegra, e que somente o que pode agradar à imaginação das crianças deveria ser incluído em tais versões (Monteiro Lobato, 1957:152). Qualidades “literárias” não têm lugar num livro para crianças, cuja imaginação deve ser estimulada por uma linguagem fluente e acessível.

Em uma carta escrita em 1943, Lobato descreve as dificuldades que teve para extirpar a “literatura” de meus livros infantis. A cada revisão nova mato, como quem mata pulgas, todas as literaturas que ainda as estragam. O último submetido a tratamento foram As Fábulas. Como achei pedante e requintado! De lá raspei quase um quilo de “literatura” e mesmo assim ficou alguma. (Abramovich, 1982:152)

Em Peter Pan e D. Quixote das Crianças, esse contato próximo com a história é enfatizado por meio da interação dos ouvintes com a trama e os personagens. Lobato usa a técnica de Sherazade, com Dona Benta interrompendo o relato todas as noites às nove, hora de dormir, e prometendo retomá-lo na noite seguinte.

Os ouvintes ficam muito envolvidos com as histórias: em Peter Pan, Emília faz um gancho e o prende à mão. Em D. Quixote das Crianças, ela se veste como Dom Quixote e ataca as galinhas e a cozinheira, apresentando-se como o gigante Freston. Pedrinho, o outro alter ego de Lobato, sente-se tão seduzido pelos livros quanto Dom Quixote. Depois de ler a história de Carlos Magno, o menino se convence de que o personagem Roldão encarnou-se nele; pega uma espada velha, vai ao milharal e, acreditando que os pés de milho são 300 mil mouros, derruba-os todos (Monteiro Lobato, 1957:94-95).

O Peter Pan de Lobato enfrentou uma série de problemas políticos. Em junho de 1941, um parecer do procurador público do estado de São Paulo, Dr. Clóvis Kruel de Morais, recomendou ao Tribunal de Segurança Nacional que fosse proibida a distribuição da obra, sob a alegação de que esta transmitia às crianças uma opinião errada do governo brasileiro e dava a impressão de que o Brasil era um país inferior à Inglaterra.

Quando a narradora, Dona Benta, compara as crianças brasileiras às inglesas, ela diz que, diferentemente daquelas, as inglesas, sem exceção, tinha seu próprio quarto, denominado nursery, cheio de brinquedos, com pinturas nas paredes e móveis especiais. Em contrapartida, continua ela, o das crianças brasileiras é “um quarto qualquer e por isso não tem nome especial” (Monteiro Lobato, 1971: 59), ressaltando a inferioridade das condições de vida das crianças brasileiras.

Lobato também compara os sistemas de aquecimento, observando que nos países avançados de clima frio, todas as casas têm aquecimento central e, não, uma lareira. Embora o conforto do aquecimento não seja necessário no Brasil, sua falta está claramente ligada aos “países atrasados” (ibidem, p. 59-60).

Uma outra passagem em que Lobato revela aspectos do Brasil é quando Emília pergunta se as crianças inglesas brincam com um “boi de chuchu”, brinquedo caseiro que é feito enfiando-se pedaços de madeira no vegetal de modo a reproduzir um animal, recurso comum em áreas do Brasil onde as crianças tinham de improvisar brinquedos com bugigangas.

Um dos personagens principais das histórias infantis de Lobato é o boneco Visconde, feito de uma velha espiga de milho (ibidem, p. 12). Dona Benta responde que as crianças inglesas são muito mimadas e têm os brinquedos que querem, e que eles não são incrivelmente caros, como no Brasil. Lobato também elogia a qualidade dos brinquedos alemães, feitos em Nuremberg, e observa, através de Dona Benta, que a indústria de brinquedos está apenas começando em nosso

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país. É evidente que, aqui, assim como no trecho citado, o escritor está [inserindo/vocalizando]

suas próprias opiniões, contrárias ao protecionismo econômico do Estado Novo. Outro parecer para o Tribunal de Segurança Nacional, de autoria de Tupy Caldas, acusava as obras de Lobato de serem excessivamente materialistas e desprovidas de qualquer tipo de espiritualidade, e recomendava a sua proibição por colocarem em risco o projeto educacional do governo na medida em que não contribuíam para a formação de uma “juventude patriótica, continuadora da tradição cristã, unificadora da Pátria”. O próprio Vargas, consciente do papel que os livros podem desempenhar, enfatizou esse risco:

Todo e qualquer escrito capaz de desvirtuar esse programa é perigoso para o futuro da nacionalidade. O nosso mal até aqui foi justamente dar liberdade excessiva aos escritores, quando é o livro o mais forte veículo de educação. (em Carneiro, 1997: 76)

Tanto Peter Pan como Dom Quixote podem ser vistos como figuras anárquicas, que não respeitam a autoridade. Diz Pedrinho, a respeito do segundo: “-O que eu gosto em D. Quixote -observou Pedrinho, é que êle não respeita cara. Mêdo não é com ele. Seja clérigo, seja moinho de vento, seja arrieiro, êle vai de lança e espada em cima, como se fôssem carneiros.” (Monteiro Lobato, 1957:91).

O anti-clericalismo de Lobato era, naturalmente, desaprovado pela ala direitista da Igreja Católica, cujas opiniões estão expressas em A Literatura Infantil de Monteiro Lobato ou Comunismo para Crianças, em que o autor, Padre Sales Brasil, acusa Lobato de incentivar a revolução comunista, a falta de educação, o ateísmo e a rebelião contra o direito à propriedade privada.

Como resultado das instruções dadas pelo Tribunal de Segurança Nacional, o Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (DEOPS) apreendeu e confiscou todos os exemplares de Peter Pan disponíveis no estado. Comunicação política para a integridade da imagem pública

As ações de comunicação política buscam estrategicamente protegem a imagem governamental, neste caso, o principal objetivo do governo Vargas perante as manifestações de Lobato era de inibir suas potencialidades de desenvolvimento profissional para inibir a suas mensagens para a população brasileira.

Segundo Queiroz (2005), “sempre dentro do processo de aprendizado sobre a importância dos conceitos correlacionados com as atividades de propaganda política, é preciso distinguir ações distintas neste campo, que, emergem do conceito de marketing político e se espraiam por outros conceitos complementares e importantes, como os de propaganda ideológica, publicidade eleitoral e imagem pública”.

Reportando aos dias atuais as ações impostas pelo governo Vargas apresentaram alto índice de hostilidade nas ações, vinculadas a um modelo ditatorial que imperou em diversos países do hemisfério norte e sul, mais incisivamente entre as décadas de 20 e 60.

No caso brasileiro, com a redemocratização brasileira a partir da década de 80, qualquer ação que vise inibir a manifestação política dos atores sociais deve ser desenvolvida pelos responsáveis de comunicação política de maneira estratégica e cautelosa, evitando assim maiores problemas quanto a liberdade de expressão e manifestação política.

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Segundo Ferrari (2007) cada dia mais políticos precisam melhorar a capacidade de se comunicar eficazmente para assegurar a sua representatividade junto aos seus públicos. Da mesma forma, para que o governo possa assegurar a sua representatividade e legitimidade, os cidadãos devem ser informados tanto sobre os acontecimentos, como sobre sua necessidade, interpretação e análise dos programas políticos.

A imagem pública anda como um foco de trabalho para comunicação política pós eleitoral, pois esse tema remete a construção da imagem do candidato, a partir do momento que ele dispor de uma assessoria competente que o conduza aos meios de comunicação eletrônicos e impressos da região, uma imagem se constrói, em algunsmomentos não sendo para determinado pleito, pois, nem sempre todas as disputas eleitorais são ganhas, mas fortalecendo sua imagem para batalhas futuras.

Essas estratégias já foram utilizadas em diversos momentos da história, em uma desses fatos, com Hitler em relação a comunicação de massa e seu assessor de comunicação política Goebbles:

Goebbles mandava metodicamente recolher os “boatos” em circulação, e organizava a contrapropaganda para neutralizá-los, seja por via oral, seja por meio da imprensa, do rádio, do cinema, ou então apelava para testemunhos estrangeiros, geralmente repórter complacente. Como, em casos tais, multiplicavam-se as profecias, as predições e os horóscopos, não hesitava em fazer Nostradamus dar uma interpretação oficial favorável aos desígnios do Reich. (DOMENACH, 1950).

No cenário político, onde o clima de competitividade é intenso, o candidato ou o eleito deve prioritariamente preocupar-se com a comunicação, isto é, com a comunicação de qualidade, pois contratar assessores simplesmente para ter a falsa impressão de êxito não é ação de prevenção nem estratégica.

a comunicação política vai além da comunicação governamental, comunicação eleitoral ou marketing político. por outro lado, a comunicação pública se articula com a comunicação política na esfera pública, como local de interação social de todos os agentes e interesses envolvidos. nesta esfera, transitam os recursos humanos (cidadãos, políticos e eleitores), físicos (suporte de comunicação massiva, tecnologias interativas e convergentes), econômicos (capital, ativos em geral), comunicacionais (discursos, debates, diálogos estruturados dentro e fora das mídias massivas e recursos interativos). (MATOS, 2006).

Controlar manifestações contrárias ao governo é um desafio representativo para os

profissionais de comunicação política pós-eleitoral, principalmente porque nos dias atuais a manifestação das convergências midiáticas aliadas à evolução tecnológica transformam boatos em fatos em uma velocidade antes inimaginável, alcançando regiões antes nunca pensadas.

a comunicação como processo relacional tem sido privilegiada nos últimos anos, como podemos observar pelo desenvolvimento do marketing político e das ações públicas e políticas desenvolvidas pelos diferentes níveis de governo e do estado. Cabe compreender melhor quem são os principais agentes nos processos de mudança na gestão pública e política, e buscar as formas de exercer a cidadania neste novo cenário político-governamental do qual somos atores principais. (FERRARI, 2007).

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O uso dos canais tecnológicos na sociedade informacional7

cria um novo cenário na comunicação política no mundo, pois apresentam novas formas de interação com a população, bem como condiciona a mudanças de comportamento onde a necessidade de rapidez nas decisões é ponto fundamental nas relações pessoais e profissionais.

O exemplo analisado de Lobato reporta aos profissionais do universo comunicacional político que a liberdade de expressão nos dias atuais segue livre, democrática e ativa, diferente do cenário vivido na época do estado novo de Getúlio Vargas, porém é conciso lembrar que as ações de retalhação tomada na época para inibir a difusão de suas idéias e obras são impensáveis em serem desenvolvidas e implantadas atualmente, principalmente no Brasil. Considerações finais

Fica claro que Lobato usou de seu poder no discurso para escrever o que achava que era

certo e, dessa maneira confrontou com gente poderosa no Brasil naquela época. Não foi em vão tudo o que escreveu e lutou para ter e ser no Brasil.

Sua visão de mundo e a ideologia no discurso que usava para escrever seus livros e a incorporação de valores culturais e pessoais nas traduções que fez pôde e ainda pode ser comprovada ao consultar o acervo de sua obra completa. A herança que foi deixada por ele é uma das maiores riquezas da literatura brasileira.

As ações desenvolvidas por Lobato caso estivesse em atuação neste atual período seriam muito mais complexas de serem inibidas por qualquer governo vigente ou equipe de comunicação ativa, pois, os recursos multimídia e tecnológicos disponíveis propiciariam Lobato a criar redes de contatos em diversas partes do país e do mundo dificultando o controle de suas ações, como feito no período Vargas. Referências ABRAMOVICH, Fanny (1982) “Lobato de todos nós”. In Paulo Dantas (org.) Vozes do tempo de

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DOMENACH, J. M. La propagande politique. Série “Que sais-je”, 448, Paris: Presses Universitaries

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7 Sociedade Informacional é o termo utilizado e desenvolvido por Castells, Manuel em sua trilogia Sociedade em Rede. Consiste basicamente na estruturação da sociedade em redes de comunicação integradas propiciando uma interdependência dos atores envolvidos e a troca de informações em uma velocidade intensa e com aumento gradativo.

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PARTE V

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PROPAGANDA POLÍTICA E FERRAMENTAS ESTRATÉGICAS

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Propaganda ideológica e cultura

Fabio Ciaccia Rodrigues CALDAS1

Resumo O Brasil tem sua história marcada por momentos de liberdade e outros de governos

ditatoriais. A propaganda ideológica marca sua presença em todos os momentos, funcionando como

base para a manutenção do sistema, ou da luta por mudanças. Este trabalho busca apresentar os

usos da propaganda ideológica em diferentes momentos da política brasileira, por grupos de

interesse totalmente contraditórios.

Palavras-chave: propaganda ideológica, cultura, política

Introdução

A comunicação política no Brasil passou por diferentes momentos, sempre precisando de

uma forte adaptação. Em alguns momentos a democracia exigia dos políticos a interação com o povo, para conseguir o apoio necessário para o período eleitoral. Durante as ditaduras, os governantes, civis ou militares, usaram a comunicação para controlar a reação popular, através de campanhas estruturadas que visavam apresentar a situação da melhor maneira possível. Associada à censura, a comunicação cumpriu o seu papel, colaborando com os quinze anos de governo de Getúlio Vargas e, posteriormente os vinte e um anos dos militares.

O esforço de comunicação teve que ser adaptado às diferentes mídias. Durante o período de Getúlio, o rádio teve fundamental importância, com programas como a “Hora do Brasil”, por meio do qual a população tomava conhecimento das diferentes ações do governo. Por acreditar no poder do meio, o governo federal financiava a compra de aparelhos de rádio para colocação nas praças principais de muitas cidades do interior, possibilitando assim que as pessoas tivessem acesso às notícias.

Com a chegada dos militares ao poder, a estratégia de divulgação passa por algumas mudanças, mas mantém o perfil de rígido controle dos meios de comunicação. A primeira mudança é o crescimento das rádios FM e da televisão. A tecnologia muda, porém o conteúdo da comunicação permanece o mesmo. Era o tempo do “Brasil grande”, ou do “Brasil: ame-o ou deixe-o”. Quem não era a favor das políticas governamentais era considerado subversivo e automaticamente perseguido. O país enfrenta forte censura. Rádios, jornais e redes de televisão tinham seu conteúdo auditado e precisavam da liberação dos agentes do governo para serem veiculados. A produção cultural também é patrulhada, sendo novelas, peças teatrais e músicas analisadas e proibidas aquelas consideradas subversivas. O maior problema era a falta de critério para considerar algo subversivo ou não. A decisão variava de acordo com a opinião do censor responsável pela análise.

O governo militar usou fortemente a comunicação para manter o controle da população e evitar revoltas. Entretanto, a oposição, mesmo que desarticulada, também buscava suas formas de protestar. E o caminho mais eficaz estava nas manifestações culturais. A propaganda ideológica se traveste de cultura, em um momento em que a única voz da população era a dos artistas, quando

1 Mestre em Comunicação Social Instituição: Universidade Metodista de São Paulo - SP

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estes estavam dispostos a enfrentar as represálias do governo, ou mesmo dos donos do capital.

A propaganda ideológica A propaganda é uma ferramenta de comunicação que busca levar o público a uma ação.

Quando uma empresa divulga algum produto, quer que o consumidor compre, ou inicialmente tenha uma atitude positiva em relação à marca. Na propaganda eleitoral o candidato busca o voto e o apoio do eleitor. Para isso faz promessas, conta sobre seu passado e apresenta a possibilidade de um futuro melhor. Porém, existe outro tipo de propaganda que usa da sutileza para comunicar algo: a propaganda ideológica.

Segundo Nélson Jahr Garcia propaganda ideológica é mais ampla e global do que a com fins comerciais ou eleitorais. Segundo o autor,

Sua função é a de formar a maior parte das idéias e convicções dos indivíduos e, com isso, orientar todo o seu comportamento social. As mensagens apresentam uma versão da realidade a partir da que se propõe a necessidade de manter a sociedade nas condições em que se encontra ou de transformá-la em sua estrutura econômica, regime político ou sistema cultural. (Garcia, 1999).

Garcia explica ainda que nem sempre é possível perceber a real motivação da

comunicação, nem seus grupos de interesse. Para falarmos em propaganda ideológica temos que recorrer ao próprio significado de

ideologia. Para Garcia, uma ideologia está baseada em três tipos básicos de idéias: as representações, os valores e as normas.

Para o autor, representações são idéias a respeito de como é a realidade, a organização social, sua divisão de classes, entre outros conceitos. Valores são idéias sobre como deve ser a realidade, ou seja, se as coisas devem permanecer como estão, ou se devem ser mudadas. Já as normas, são as idéias que dizem respeito ao que deve ser feito para mudar a realidade, ou mantê-la como está.

Sobre o surgimento da ideologia, Garcia apregoa que Uma ideologia nunca surge, ao mesmo tempo, para todos os membros de uma determinada classe. Geralmente são apenas uns poucos, um pequeno grupo, que consegue adquirir consciência e visualizar um quadro completo de sua realidade (Garcia, 1999).

Este é o motivo da necessidade da busca de apoio quando um grupo tenta mudar a

realidade. Este grupo tende a ser inicialmente pequeno e conseqüentemente sem muita força. À medida que um maior número de pessoas aceita a nova ideologia, o grupo ganha força para buscar seus objetivos.

A propaganda ideológica é a ferramenta que divulgará os conceitos da ideologia e buscará os apoios. Para isso precisa passar por um processo de desenvolvimento que é dividido em emissor, elaboração da ideologia, codificação, controle ideológico e difusão.

O “emissor” é o grupo inicial que dará início à ação. É dele a responsabilidade pela “elaboração da ideologia”, que deve ter idéias claras e simples, para que seja facilmente recebida pelos demais. O maior exemplo disso na história é a Alemanha de Hitler. A ideologia nazista basicamente pode ser entendida como defensora de um estado forte e nacionalista, que lutava contra todos que pudessem atrapalhar o desenvolvimento da nação. Se levarmos em consideração a crise vivida pela Alemanha no período pós-primeira guerra mundial, fica fácil compreender que este era o desejo do povo. O nazismo foi apenas a canalização desse desejo para uma ideologia

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organizada. A codificação da mensagem tende a ser o maior problema na difusão de uma ideologia. A

sutileza é essencial, pois as pessoas não gostam de saber que estão sofrendo manipulação. Ainda no exemplo alemão, o ministro da Propaganda, Joseph Goebbels, defendia que a propaganda política precisava ser divertida, transformando-se em entretenimento, pois, caso contrário, não atrairia o público. Sua certeza de ser este o melhor caminho era tamanha que o governo alemão desenvolveu um projeto para ter seu próprio estúdio de criação de desenhos animados.

O “controle ideológico” é um ponto sensível. O emissor não pode permitir que outras ideologias sejam divulgadas, dando a possibilidade ao receptor de escolher a que mais lhe agrada. É por este motivo que os regimes autoritários cuidam com extrema eficácia da censura aos meios de comunicação e às expressões artísticas. A única mensagem que pode ser divulgada é a de interesse do emissor. O Brasil conviveu com a censura por muitos anos, tendo no governo Getúlio Vargas o Departamento de Imprensa e Propaganda, que controlava o conteúdo divulgado pela oposição e preparava a comunicação do governo. Os presidentes militares também tiveram seus órgãos de controle, como veremos posteriormente.

A “difusão” é a parte do processo responsável por fazer com que o conteúdo chegue ao público. Uma boa campanha de propaganda ideológica consegue trabalhar com repetição e amplo alcance. Assim, por mais que as pessoas não vejam a comunicação em uma determinada mídia, verão em outras. Televisão, jornais, revistas, brindes, discursos, tudo se torna mídia, sendo responsável por divulgar a ideologia desejada.

Uma forma de neutralizar a comunicação dissonante é a contrapropaganda. Garcia explique que:

Ela se caracteriza pelo emprego de algumas técnicas que visam amenizar o impacto das mensagens opostas, anulando seu efeito persuasivo. Procura colocar as idéias dos adversários em contradição com a realidade dos fatos, com outras idéias defendidas por eles próprios ou em desacordo com certos princípios e valores aceitos e arraigados entre os receptores. Outras vezes, atua de forma indireta, tentando desmoralizar as idéias, não pela crítica à personalidade ou ao comportamento daqueles que as sustentam. Critica-se o sacerdote para desmerecer o conteúdo de suas pregações, ataca-se alguns dirigentes políticos para combater a filosofia adotada pelo governo e assim por diante (Garcia, 1999).

A contrapropaganda foi utilizada no regime militar para desqualificar as ações da esquerda.

Até mesmo em casos arquitetados por agentes do governo os acusados eram os “subversivos”. Podemos tomar como exemplo o atentado ao Riocentro, onde grupos de esquerda foram acusados da autoria, sendo que anos depois foi descoberto que na verdade havia sido praticado por militares.

A contrapropaganda baseia-se em fatos, na sua maioria, forjados e de difícil comprovação. Porém, a informação toma vulto e desqualifica os acusados. Entretanto, quando a mentira é descoberta, o emissor pode sofrer com a perda da credibilidade.

A propaganda ideológica tem forte poder de repercussão. Depois de emitida, a mensagem se espalha automaticamente, atingindo grande número de pessoas. Família, igreja, escola, qualquer centro de convívio social é um potencial disseminador da ideologia.

Esta disseminação causa alguns efeitos na sociedade. Em indivíduos do mesmo grupo social, funciona como instrumento de homogeneização, indicando um mesmo caminho que deve ser seguido por todos e garantindo uma posição coesa de todo o grupo. Em indivíduos de classes diferentes a propaganda ideológica tem como função conseguir que um grupo domine o outro, sendo a ideologia dominante a preservada e garantindo que não exista espaço para mudanças.

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A classe dominante precisa usar alguns artifícios para potencializar a propaganda ideológica. Um bom exemplo disso são as concessões à classe dominada. Estas são dadas em troca de apoio. Porém, para não perder sua eficácia o sistema de propaganda ideológica precisa assumir novas formas e se reinventar constantemente. A propaganda ideológica e o governo militar

Durante o regime militar a linha de propaganda ideológica adotada foi a do ufanismo.

Apoiado pelo crescimento econômico o governo passava à população a idéia de que os grupos que combatiam o “regime revolucionário” eram, na verdade, subversivos a serviço do comunismo.

O governo do general Castello Branco foi marcado por uma mudança na política econômica, que vivia forte crise. Tal ajuste foi um dos pilares do crescimento vivido pelo país durante o chamado “milagre brasileiro”. Entretanto, a popularidade do presidente foi corroída, uma vez que não existia um sistema de comunicação voltado para a preservação da imagem do chefe do executivo. Pela baixa popularidade e articulação política do Ministro da Guerra Arthur da Costa e Silva, o presidente não conseguiu impor um nome para a sua sucessão, tendo de aceitar o do próprio ministro.

O governo militar que melhor trabalhou a propaganda ideológica foi o do presidente Medici. Não por acaso, o período em que o general comandou o país foi o de maior crescimento e de mais dura repressão e controle ideológico. Amante do futebol manteve estreita ligação com o jornalista Nelson Rodrigues, sendo este seu acompanhante na inauguração do estádio do Morumbi, em São Paulo. Nesta ocasião o jornalista aceitou um convite do presidente para retornar ao Rio de Janeiro no avião presidencial, mesmo tendo medo de voar.

Para organizar sua comunicação, em 1968 o governo cria a AERP – Assessoria Especial de Relações Públicas. É sob o comando do órgão que, na década de 1970, o governo Medici lançou campanhas ufanistas usando a vitória do futebol brasileiro na Copa do Mundo do México, como exemplo de sucesso do modelo de governo em vigor. A Arena, partido do governista, foi orientada a usar as imagens das vitórias do Brasil no México como instrumento de campanha, para auxiliar na ligação da imagem do futebol com o governo. Campanhas divulgando obras grandiosas eram feitas para passar à população a idéia de que, apesar das dificuldades, o Brasil estava crescendo e que o futuro guardava bons resultados à população. Esta técnica, aliada à censura que impedia os meios de comunicação de falar o que realmente estava acontecendo, favoreceu o controle das insatisfações e ampliou a duração do regime militar.

Em outros momentos do regime militar, outros órgãos foram responsáveis pelas ações de propaganda ideológica, como a Assessoria de Imprensa e Relações Públicas, no governo Geisel, ou a Secretaria de Comunicação Social, do presidente Figueiredo.

A estratégia era a mesma, usar a comunicação como forma de manter o controle da população. Garcia cita que para legitimar o regime político “a propaganda encarregou-se de enaltecer os presidentes, apresentando-os como líderes, os mais indicados para serem chefes de governo” (Garcia, 1999). O objetivo do governo era convocar a população para trabalhar pelo crescimento econômico, sem questionar as diretrizes políticas.

O uso da propaganda ideológica foi tão eficaz durante o governo militar que criou-se a crença que se existisse uma eleição durante o governo do general Medici e esse fosse candidato a reeleição, teria grandes chances de ser eleito. É o que defende em declaração dada a Ronaldo Costa Couto, no livro A História indiscreta da ditadura e da abertura, Luiz Inácio Lula da Silva:

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Era pelo resultado econômico e era pelo controle que eles tinham dos meios de comunicação. Eu digo pelo que eu vivia dentro das fábricas. Havia pleno emprego, era uma época de muita facilidade pra gente trabalhar. Eu acho que o Medici teria sido eleito. Na época foi feita uma pesquisa. Acho que ele teria 70% dos votos. Agora veja: se houvesse eleições e tivesse espaço para a oposição falar, obviamente que isso poderia cair muito. Era o tempo do “Eu te amo meu Brasil”, “Brasil: ame-o ou deixe-o”, “Brasil grande potência”, “Ninguém segura este país” (Couto, 2003, p. 117).

A propaganda ideológica na cultura brasileira

Se por um lado o governo militar usava a propaganda ideológica para controlar a situação alguns representantes das elites culturais tentavam o confronto por meio das idéias.

Em 1975 Chico Buarque de Holanda e Paulo Pontes lançam a peça Gota D‟água – uma tragédia carioca. Sem maiores preocupações em criticar o sistema de governo, a peça buscava desmitificar o “milagre econômico”. Atacava fortemente a concentração de renda e a desmobilização do povo, que era facilmente controlado pelos donos do capital, fosse por meio da oferta de empregos, fosse por meio de concessões e pequenas melhorias na qualidade de vida.

Os autores basearam a peça em três pilares: a crítica à situação econômica do país, a reaproximação entre o povo e os artistas e o resgate do uso da palavra como ponto central do teatro, uma vez que os aspectos técnicos ganharam relevância como forma de fugir da perseguição da censura.

Em sua carreira, Chico Buarque acumula longo histórico de ações de combate à ditadura. Em 1970 lança um compacto com a música “Apesar de Você”, que antes de ser proibido pela censura atinge a marca de cem mil cópias vendidas. A letra apresentava forte crítica ao presidente Medici, e aos demais líderes militares. Pregava o momento em que o povo conseguiria se libertar e passaria a viver em liberdade, sem que os militares pudessem fazer nada contra.

As disputas entre Chico Buarque e o governo continuaram. Em 1973 escreve em parceria com Ruy Guerra a peça Calabar – ou o elogio da traição. A peça relativiza a posição de Domingos Fernandes Calabar que preferiu os holandeses, que invadiram o país, aos colonizadores portugueses.

Na peça os autores questionam a traição de Calabar, o que desagrada o governo. Depois de ter o texto aprovado, a Polícia federal proíbe a montagem do espetáculo. No site oficial de Chico Buarque a história da proibição é contada:

Era uma das mais caras produções teatrais da época, custou cerca de 30 mil dólares e empregava mais de 80 pessoas. Como sempre, a censura do regime militar deveria aprovar e liberar a obra em um ensaio especialmente dedicado a isso. Depois de toda a montagem pronta e da primeira liberação do texto, veio a espera pela aprovação final. Foram três meses de expectativa e, em 20 de outubro de 1974, o general Antônio Bandeira, da Polícia Federal, sem motivo aparente, proibiu a peça, proibiu o nome Calabar e, como se não bastasse, ainda proibiu que a proibição fosse divulgada. (Buarque, 2008, on-line)

O teatro brasileiro concentrou entre 1969 e 1980 grande número de peças críticas ao regime militar. Este movimento recebeu o nome de Teatro de Resistência, que teve como expoentes o próprio Chico Buarque, Gianfrancesco Guarnieri, Oduvaldo Vianna Filho, entre outros. A temática principal do movimento era as questões sociais, como a crítica ao milagre econômico e posteriormente à crise econômica, a falta de liberdade, os excessos dos militares e o papel da censura. Em alguns casos trabalhavam com fatos reais e em outros criavam livremente. Entretanto,

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conviveram com a censura, que por vezes cortava trechos das obras, ou impedia o texto integralmente. Muitas obras esperaram anos para chegar aos palcos e outras nunca foram montadas.

A televisão ganhou força na propaganda ideológica com o final do regime militar. O aumento da liberdade encorajou o meio a tratar temas políticos mais abertamente em suas produções. A Rede Globo abordou centralmente o tema político em pelo menos duas novelas no ano de 1989: “Que rei sou eu?” e “O salvador da Pátria”.

A primeira era ambientada no ano de 1786, em um reino imaginário europeu, onde Jean-Pierre, filho bastardo do falecido rei, luta para tomar posse da coroa, enquanto os detentores do poder tentam impedi-lo. Aspectos da política e economia brasileiros eram abordados, como as constantes trocas em nomes de moedas, a corrupção e a ânsia do povo em ter o poder em suas mãos, terminado o período de ditadura e eleições indiretas para a Presidência da República. A novela usava fatos da realidade brasileira como, por exemplo, a instituição dos selos-pedágio que deveriam ser colados na testa dos cavalos, para assim acabar com os postos de cobranças existentes nas estradas do reino. Este selo foi implantado no Brasil durante o governo do presidente José Sarney, sendo extinto em 1990. O motorista precisava ter o selo no vidro do carro para circular pelas rodovias federais. Obviamente existia uma taxa para colocação do selo. Esta e outras semelhanças com a realidade brasileira fizeram com que o público a associasse cada vez mais com o país.

O Reino contava com o bruxo Ravengar, interpretado por Antonio Abujamra, que exercia grande influência na corte. Após o levante popular e a tomada do poder o bruxo volta ao palácio disfarçado de rebelde e com o nome de Richelieu Rasputin Golbery, numa clara alusão ao russo Grigori Yefimovich Novykhn, o Rasputin, conhecido por seus poderes de cura e visões sobre o futuro – e ao general Golbery do Couto e Silva, conhecido como o feiticeiro do governo do presidente Geisel. Neste retorno Ravengar oferece seus serviços de conselheiro ao novo governo, colocando seus conhecimentos a serviço do novo rei.

O humorista Chico Anysio chegou a gravar uma participação especial em Que rei sou eu? na qual interpretava o especulador internacional Taj Nahal, que aplicaria um golpe na bolsa, no mercado de “Val Estrite”, centro financeiro do reino. Esta passagem era uma alusão ao caso do investidor Naji Nahas, que enfrentava um processo por estelionato, e operações ilegais na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Os advogados do investidor conseguiram na justiça que o caso não fosse abordado pela novela, alegando pré-julgamento. Frente à determinação judicial, a emissora resolver não exibir as cenas.

Outra obra com declarado conteúdo político foi O Salvador da Pátria. Na trama um trabalhador rural, Sassá Mutema, vivido por Lima Duarte, é lançado candidato a prefeito, após ser preso injustamente sob a acusação de assassinato. Apesar de sua inocência, o trabalhador fica marcado pelo crime – uma das vítimas era um conhecido radialista – porém, quando descobrem que o comunicador estava envolvido com operações ilegais, o bóia-fria passa a ser aclamado, surgindo então a candidatura e sua posterior eleição.

Inicialmente Sassá Mutema era ligado a um poderoso deputado, que acredita conseguir manipular as ações do bóia-fria na prefeitura. Porém este não aceita a manipulação e rompe as relações com seu padrinho político, adotando uma postura de independência. No texto original o trabalhador chegava a ser eleito Presidente da República, porém como em 1989 aconteceriam eleições presidenciais, a estória foi alterada.

Tanto os partidos de direita quanto os de esquerda reclamaram da novela e da criação de Sassá Mutema. Os primeiros argumentavam que acreditavam que o sucesso do bóia-fria era uma forma de apoio ao candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva, por causa de sua origem operária. Em 2002, o jornal Folha de São Paulo, publicou matéria de Laura Matos sobre a comemoração de dez

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anos e reinauguração do Núcleo de Pesquisa de Telenovela, da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, que contava com a presença do autor da novela, Lauro César Muniz. Questionado por um estudante sobre a falta de politização das novelas na década de 1980, o autor respondeu:

Há novelas de esquerda mesmo, como muitas de Dias Gomes. [...] Em 1989, já não havia mais a censura formal, mas houve uma interferência direta de Brasília na cúpula da Globo. Era o primeiro ano de eleições diretas, Lula contra Collor, e acharam que o Sassá Mutema fazia apologia à esquerda. Assim, acabou vindo uma pressão na emissora para que a trama fosse mudada. Cheguei a ouvir, nos bastidores, „o autor dessa novela vai eleger o presidente do Brasil‟. Tive de abandonar o aspecto político da história e focalizar apenas o policial [Sassá era suspeito de ter cometido um duplo assassinato] (Matos, 2002, on-line).

Já a esquerda não gostava de ver um trabalhador – que facilmente seria comparado a Lula – sendo manipulado por outros políticos. Entendia que o personagem precisava demonstrar sua liberdade e orientação política própria. Na mesma matéria o autor fala sobre as pressões vindas de dentro do Partido dos Trabalhadores – PT:

Lembro que a Erundina [hoje deputada federal do PSB, na época, prefeita de São Paulo pelo PT] reclamava. Achava que estávamos satirizando o Lula, porque o Sassá era ingênuo e chegou a fazer muitas concessões aos poderosos. (Matos, 2002, on-line)

O uso da mídia e da cultura como ferramenta de propaganda ideológica é hoje mais restrito do que nos anos do regime militar. A falta de liberdade da imprensa e das organizações sociais deixava a cargo dos artistas e intelectuais a missão de denunciar à sociedade o que acontecia e a tentativa de iniciar um processo de mudança por meio da divulgação de uma ideologia diferente. Não houve facilidade, mas com certeza as gerações que vieram na seqüência podem entender um pouco melhor o que aconteceu no passado pelo levantamento da produção cultural da época. Conclusão

O Brasil foi marcado por intensos processos de propaganda ideológica. Vindo do período Getúlio Vargas, com o controle sobre a produção cultural e divulgação de notícias, passando pelos militares, que usaram as mesmas técnicas do Estado novo, porém com um incremento na ferramenta de propaganda, principalmente com a divulgação de um Brasil em franco crescimento e um futuro brilhante à sua frente e finalmente com a chegada nos anos 1980, quando a abertura política deu espaço para novas ideologias, a cultura brasileira sempre esteve envolvida com o jogo político. Inúmeros atores, diretores, compositores, músicos e profissionais de outras tantas atividades artísticas buscaram uma mudança de realidade, ou a sua manutenção, dependendo do lado que se encontravam.

É inquestionável que a propaganda ideológica tem papel relevante na manutenção e na mudança do poder. A liberdade de imprensa coibiu em certa medida sua prática, uma vez que os abusos são denunciados, o que coloca os emissores das mensagens em situação difícil. A mudança de realidade confirma o que apregoava Nelson Jahr Garcia:

Os setores dominados, pela própria exigência do desenvolvimento econômico e político, também se desenvolvem e se tornam menos sugestionáveis e vacinados contra certas formas de manifestação. Gradativamente, a

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manipulação ideológica precisa sofisticar-se, sob pena de perder a eficácia. Cada vez se acredita menos e, propostas triunfalistas e promessas demagógicas. Começa-se a exigir maior participação real e efetiva. Embora com um ou outro retrocesso, os esquemas de controle e persuasão vêm perdendo sua força e eficiência e tendem a desmoronar mais cedo ou mais tarde. O futuro deverá trazer formas mais democráticas na transmissão das ideologias. (Garcia, 1999)

Referências Bibliográficas

BUARQUE, Chico. Disponível em <http://www.chicobuarque.com.br/> Acesso em 10 jul 2008

_______________; PONTES, Paulo. Gota D’água – Uma tragédia carioca, 16ª Ed. Rio de Janeiro:

Civilização Brasileira, 1987

COUTO, Ronaldo Costa. História indiscreta da ditadura e da abertura – Brasil: 1964 – 1985. 4ª

Ed. Rio de Janeiro: Record, 2003

GARCIA, Nelson Jahr. O que é propaganda ideológica. São Paulo: Editora Brasiliense, 1982.

ITAÚ CULTURAL. Disponível em <http://www.itaucultural.org.br/> Acesso em 10 jul.2008.

MATOS, Laura. Autor diz que “Brasília interferiu em novela” da Globo. Folha de São Paulo, São

Paulo, 17 maio 2002. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1705200212.htm>

Acesso em 11 jul. 2008

MEMÓRIA DA GLOBO. Disponível em <http://memoriaglobo.globo.com> Acesso em 10 jul. 2008

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O universo das marcas. Em busca de uma marca forte. Como se destacar no

meio de tantos signos.

André Gustavo Rodrigues MONTEIRO1

Resumo

Neste artigo temos uma proposta de análise da imagem de marca da campanha política do

candidato Vitor Lippi (PSDB) para a Prefeitura de Sorocaba – SP, ano das eleições 2008. A

utilização dos recursos simbólicos do candidato serão analisados com base nas idéias de Charles

Sanders Peirce (1839-1914) e Carl Gustav Jung (1875-1961). A metodologia para o estudo se dá

através da classificação dos signos e estrutura dos arquétipos. Como a marca do candidato pode

deixar de ser um símbolo para se tornar um modo de vida.

Palavras-chave: signo, publicidade, arquétipo, marca, marketing político.

O que um eleitor espera da marca do seu candidato? Sabemos que as marcas tem personalidades que se identificam com os consumidores. Os elementos visuais que compõem uma marca são para nós signos. Dessa forma, marca é uma representação de uma empresa, produto, ou pessoa. O que vamos abordar nesse artigo está diretamente relacionado a criação de identidade visual para um candidato e representa a personalidade e a promessa que a marca traz ao eleitor.

O ponto de partida para iniciarmos um estudo profundo de marca é o signo. Devemos entender o que é o signo, suas funções e representações. O signo deve ser visto como realidade física que representa algo para alguém. Tudo é signo, o som que produzimos, a palavra escrita, nossos gestos, um rabisco no papel, uma imagem, uma marca, enfim algo material. Quando observamos o signo, podemos interpretá-lo de formas diferentes, ou seja como o objeto é representado. O primeiro termo foi utilizado por Ferdinand de Saussure; o segundo pelo norte-amercano Charles Sanders Peirce. Saussure e Peirce foram contemporâneos e desenvolveram seus estudos no final do século XIX e início do século XX, sem que um tomasse conhecimento da obra do outro. (Valente, 1997: 14). Em nossa escola de Semiótica da Cultura, entendemos por signo um objeto material que é produzido por um produtor de signos (não existe um signo que não seja produzido por um ser vivo), que seja recebido por um receptor, e interpretado por esse receptor. (Bystrina, 1995).

De acordo com as três propriedades do signo: qualidade, existente e lei, o signo demonstra sua relação com o objeto. Dessa forma de acordo com Peirce se o fundamento é quali-signo, em relação ao objeto o signo se torna ícone, e sucessivamente se for existente, será índice, se for uma lei, deverá ser um símbolo. Assim inicia-se o percurso de análise semiótica na definição do que vemos e interpretamos. Na publicidade costuma-se empregar a palavra ícone para um desenho que represente uma marca, porém vemos que este desenho tem a função de indicar alguma coisa, portanto se torna índice.

A Tríade de Peirce nos leva a algumas considerações (Valente, 1997: 14-32): O ícone, por exemplo, apresenta uma relação de semelhança entre significantes e significado. Icon, elemento 1 Mestre em Comunicação e Cultura. Universidade de Sorocaba. Sorocaba, SP.

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grego, significa imagem. Uma relação metafórica segundo Vestergaard (2000: 33). O índice – apresenta uma relação direta entre significante e significado. O índice tem como um traço principal a proximidade. Um exemplo de signo índice: um céu nublado, pode indicar que vem chuva, ou tempestade. Já o símbolo demonstra uma relação convencional entre significante e significado. É uma convenção iconográfica, que estabelece com os outros dois, um trinômio perfeito (Vestergaard, 2000: 35). É o campo das leis, ou convenção, o símbolo de um círculo com uma cruz por exemplo é um símbolo da mulher.

No nosso estudo se faz importante conhecer a classificação dos signos para entendermos os diversos interpretantes nas marcas. Atualmente uma marca não tem somente características funcionais, mas possui significados e valores. O mundo onde ocorrem as trocas e a apresentação dos signos é a semiosfera, onde os espaços urbanos nos fornecem estímulos e buscam chamar nossa atenção. A semiosfera demonstra a preocupação de não separar o homem, não dividir mas sim analisar a cultura como um todo, onde tudo acontece nela.

A fenomenologia e a semiótica despertam nossa capacidade contemplativa, nos levando a distinguir diferenças nessas observações e ainda nos fornece capacidade para generalizar as observações em classes ou categorias abrangentes. A primeira categoria que corresponde a capacidade de contemplação é a primeiridade, momento em que só identificamos qualidade sem relação com nada.

A identidade visual da campanha do candidato Vitor Lippi

As relações entre signos e objetos foram explicadas por Peirce, que diz que dependendo da

natureza do signo, este estabelecerá, com seu objeto, uma relação diversa: de sugestão, indicação ou representação. Nesse contexto um nome próprio pode ser considerado um símbolo (por convenção, lei.). A marca como signo tem a função de indicar o objeto que quer representar, ou seja, convenciona-se e denomina-se algum produto ou marca porém a interpretação é contínua e inesgotável. O contato que os consumidores terão com a marca é que vão nortear diversos processos interpretativos. Assim a escolha, opção por uma marca será decorrente de um processo de identificação e afinidade por parte do eleitor. Segundo Kotler, uma Marca é um nome, termo, símbolo, desenho, ou uma contribuição desses elementos, que deve identificar os bens ou serviços de uma empresa ou grupo de empresas e diferenciá-los da concorrência. Numa pesquisa exploratória identificamos que signo deriva do latim “signum”, uma marca. O signo é denotativo e representa um objeto ou direção.

Já o símbolo deriva do latim “symbolum” e representa alguma coisa mais e desperta respostas emocionais. Dessa forma os símbolos refletem uma personalidade para a marca. Uma Marca deve ter em sua essência a identificação imediata junto a uma empresa ou fabricante, nesse caso o candidato, com a possibilidade de ser um nome, uma marca comercial, um logotipo ou outro símbolo. A Marca é percebida como a promessa do candidato que oferta promessas ou serviços junto aos eleitores, fornecendo uma série de atributos e benefícios.

Entendemos que um candidato é um produto, em sua composição temos seus atributos pessoais, seus planos, sua imagem e suas idéias. O candidato então deve possuir uma marca e uma “embalagem”, que irão influenciar diretamente no processo de decisão do eleitor. O perfil do candidato é detalhadamente estudado para planejar sua imagem na campanha.

A composição da imagem de marca é o nome, a cor, a marca e a comunicação integrada, coerente com a imagem e uma linguagem específica para o público-alvo. Dessa forma surge a composição gráfica do candidato que representa uma identidade com os eleitores. Para garantir a eficácia é preciso observar algumas características técnicas.

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Na primeiridade identificamos qualidade, textura, cor, aparência. Esse estágio é importante,

pois é nele que devemos chamar a atenção pelo efeito visual. A marca do candidato deve atrair a atenção dos eleitores. A cor laranja atrai o olhar e o contraste com o azul é muito bem-sucedido.

O uso das cores do partido (PSDB) é obrigatório para a composição da marca de um candidato. É preciso manter fidelidade nas cores para facilitar a lembrança do partido e garantir a harmonia da identidade visual. A legibilidade também está presente, com uma tipologia moderna, sem serifas, proporcionando leitura rápida e fácil compreensão dos elementos.

A secundidade é a fase da consciência, depois do impacto visual causado pelo contraste em tamanhos de tipologias e cores, assimilamos que é um nome de um candidato, assim torna-se existente e indicial. Os recursos visuais utilizados indicam que é uma logomarca de um candidato a um cargo político. Possui os elementos obrigatórios, número, nome do candidato, cargo e nome do vice.

Nesse caso a simplicidade garante melhores resultados de leitura não importando a distância. Temos claramente a ordem de importância escolhida pelo criativo, destacando o número no primeiro momento e o nome do candidato. Também foram utilizados recursos de reprodutibilidade pois a marca se adapta muito bem em todos os materiais da campanha, ou seja, não precisa ser alterada para aplicação em materiais específicos. Isso facilita a fidelidade da campanha pois o eleitor tem contato constante com os mesmos elementos simbólicos.

A inclusão dos elementos desenhados indicam pessoas em situações de lazer, qualidade de vida, e natureza. De acordo com nossa experiência colateral podemos dizer que esses elementos foram inseridos pois no primeiro mandato do candidato, o mesmo investiu a maioria dos seus projetos nesses segmentos, dessa forma os símbolos criam familiaridade com

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o eleitor que pôde acompanhar o trabalho do candidato. A proposta da logomarca é afirmar que ainda é intenção investir nesses projetos e continuar o trabalho. A família também está representada, pois é um recurso de extrema persuasão. Demonstrar a preocupação com todos da família e principalmente trazendo sentimento de emoção e proteção. Também identificamos um ciclista e um indivíduo correndo, para indicar os investimentos em pistas de caminhada e ciclovias, apelo principal da campanha do candidato que já construiu mais de 18km de ciclovias que interligam todas as regiões da cidade.

Dessa forma os objetivos ficam mais próximos de serem atingidos já que o marketing político tem como principal função reunir técnicas e procedimentos para adequar o candidato aos eleitores buscando torná-lo conhecido pelo maior número de eleitores possíveis, posicionando-o em destaque frente aos adversários. Na identidade visual da campanha do candidato Vitor Lippi identificamos todos os elementos necessários para promover a imagem de marca desejada e trazer o candidato mais próximo dos eleitores.

O signo e sua interpretação irão formar um novo signo. A terceiridade está convergindo com a publicidade. A associação entre o símbolo e conceito/imagem se dá na terceiridade. Todas as interpretações e imagem de marca são originadas na terceiridade. Assim cada eleitor interpreta de forma diferente os estímulos que recebeu com a identidade visual. A terceira categoria que trata da consciência é a terceiridade, interpretação, lei. É na terceiridade que as marcas são personificadas, criam “vida”, são interpretadas e posicionadas na mente dos consumidores. Para alguns eleitores os símbolos, ou a posição das tipologias têm representações diferentes. Por isso é mais fácil conquistar o inconsciente coletivo com elementos conhecidos pelos eleitores. É preciso evitar o ruído na comunicação utilizando repertório e bagagem cultural coerente com o perfil do candidado e dos eleitores.

Enfim devemos observar qual o objeto que a marca representa, assim como visto anteriormente a representação não seria apenas um serviço, uma marca, ou uma idéia, mas sim a marca representa algo complexo que envolve o repertório do eleitor, a história do candidato, ambiente sócio-cultural, valores, e ligação direta com seu público-alvo. A solução dada pela agência de propaganda e o marketing político são objetos que irão representar uma marca.

Todos esses símbolos são necessários para que a marca se transforme num personagem para os eleitores, ou seja, o candidato deve representar um arquétipo. Um arquétipo segundo Jung são formas ou imagens de natureza coletiva, que ocorrem em praticamente toda a Terra como componentes de mitos e, ao mesmo tempo, como produtos individuais de origem inconsciente.

De acordo com Jung, o inconsciente se expressa primariamente através de símbolos. Embora nenhum símbolo concreto possa representar de forma plena um Arquétipo (que é uma forma sem conteúdo específico), quanto mais um símbolo se harmonizar com o material inconsciente organizado ao redor de um Arquétipo, mais ele evocará uma resposta intensa e emocionalmente carregada.

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Essas estruturas arquétipas estão presentes dentro do inconsciente coletivo, segundo Jung,

tais Arquétipos são formas sem conteúdo próprio que servem para organizar ou canalizar o material psicológico. Jung também chama os Arquétipos de imagens primordiais, porque eles correspondem freqüentemente a temas mitológicos que reaparecem em contos e lendas populares de épocas e culturas diferentes. Os mesmos temas podem ser encontrados em sonhos e fantasias de muitos indivíduos. De acordo com Jung, os Arquétipos, como elementos estruturais e formadores do inconsciente, dão origem tanto às fantasias individuais quanto às mitologias de um povo. É interessante saber que quando um consumidor está exposto a um símbolo surgem inúmeras idéias e imagens, por isso estamos cada vez mais distantes de uma associação e interpretação comum a todos.

Os arquétipos possuem funções básicas que representam algo na vida das pessoas. O arquétipo Criador tende a ajudar as pessoas a criar algo novo; o Prestativo ajuda os outros; o Governante exerce o controle; o Bobo da Corte ajuda as pessoas a se divertirem; o Cara Comum, diz para as pessoas estarem bem assim como são; o Amante encontra e dá amor, o Herói age corajosamente e refere-se sempre a um homem deus poderoso que vence o mal; o Fora-da-lei quebra todas as regras; o Mago influi em alguma transformação; o Inocente mantém ou renova a fé; o Explorador ajuda as pessoas a manter a independência; enfim o Sábio compreende o mundo em que vive.

Essas imagens arquétipas tem a função de identificar o consumidor e realizar desejos e motivações. Segundo Jung, os arquétipos “não são disseminados apenas pela tradição, idioma ou migração. Eles podem reaparecer espontaneamente a qualquer hora, em qualquer lugar, e sem qualquer influência externa” (JUNG, 2000 pag 79). Isso e bastante interessante pois não trata-se de algo cultural, que envolve algum tipo de troca. Não é só repertório, pois a qualquer momento o sentimento arquétipo pode ser despertado nos eleitores. Frequentemente são utilizadas as imagens para persuadir, levando-nos a ter a impressão de que fazermos parte dessas imagens. Cada candidato assume assim um arquétipo que irá garantir seu posicionamento ideal durante a campanha. No estudo de Jung os tipos psicológicos fundamentais é que influenciam no comportamento do consumidor/eleitor. Para ele o pensamento e o sentimento são formas alternativas de elaborar julgamentos e tomar decisões. Dessa forma os pensamentos se relacionam

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com a verdade lógica e objetiva. Essa função é bastante reflexiva, assim os tipos pensadores são mais planejadores. O sentimento para Jung classifica as pessoas mais emocionais. Esses consumidores avaliam seus valores próprios para tomar decisões de compra. Os consumidores intuitivos tomam suas decisões com base em experiências passadas.

Jung descobriu que além do consciente e inconsciente pessoais existe uma faixa psíquica onde estariam as figuras, símbolos e conteúdos arquétipos de caráter universal, frequentemente expressos em temas mitológicos. Enquanto o incosciente pessoal consiste de material reprimido e de complexos, o inconsciente coletivo é composto de uma tendência para sensibilizar-se com certas imagens, símbolos e sentimentos profundos de apelo universal, os arquétipos. As imagens arquétipas são figurações dos instintos. O comportamento do eleitor é influenciado por essas representações pela sua carga afetiva, por exemplo a associação do feminino com características maternas. Assim a mãe boa é um aspecto do arquétipo do feminino na psique, que pode ter a figura de uma deusa ou de uma fada, da mãe má, ou que pode possuir os traços de uma bruxa; já a figura masculina poderá ter uma representação num sábio, no prestativo ou governante.

Todos os eleitores também desejam pertencer a um grupo, assim os arquétipos diferenciam esses eleitores, individualizando-os. Uma marca tem como função identificar um benefício que aumenta o valor do candidato demonstrando sua vantagem diferencial. Conclusão

A busca do posicionamento de marca ideal deve ser embasada num trabalho de branding

que nada mais é do que um processo de construção e gerenciamento de marca. Esse processo de construção possui estratégia de marca, posicionamento e uma série de aspectos que serão a alma da marca. O posicionamento da marca é a síntese da concepção estratégica da marca, a criação e o desenvolvimento de diferenciais percebidos pelos eleitores. Um bom posicionamento de marca concentra o mesmo ponto de vista estratégico em relação a: desenvolvimento de uma vantagem competitiva ágil; orientação para os objetivos; atenção aos eleitores.

De acordo com Santaella e Nöth, o universo das imagens pode ser dividido em dois domínios: O primeiro é o domínio das imagens como representações visuais, desenhos, pinturas, gravuras, fotografias e as imagens cinematográficas, televisivas, holo e infográficas pertencem a esse domínio. Imagens, nesse sentido são objetos materiais signos que representam o nosso meio ambiente visual. O segredo é o domínio imaterial das imagens na nossa mente. Neste domínio, imagens aparecem como fantasias, imaginações, esquemas, modelos ou, em geral, como representações mentais (Santaella, 2001).

Uma imagem de marca é construída na mente do eleitor como resultado perceptivo das impressões positivas, negativas ou neutras que se originam do contato entre o eleitor e identidade visual da campanha. Nesse sentido, ela é um "símbolo complexo", função da destilação de vários fatores: publicidade, marketing político, experiências anteriores, logomarcas, e assim por diante". A imagem é formada a partir da maneira com que o partido delineia sua estratégia. Num segundo nível as impressões deixadas por candidatos anteriores do partido contribuem para formação da imagem. No terceiro nível estão as consequências das relações com os vários públicos com os quais lida, direta ou indiretamente, tais como imprensa, líderes de opinião, comunidade, empresas, e concorrentes. No quarto nível está a imagem que se forma a partir das ações desenvolvidas pelo partido e pelos candidatos. Enfim a busca por um espaço na mente dos eleitores não é tarefa fácil, é preciso cuidar para que todos os detalhes sejam percebidos e utilizar ferramentas de persuasão / sugestão que configurem o perfil do candidato, partido e objetivos de campanha.

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Referências Bibliográficas

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ed. São Paulo, Iluminuras.SANTAELLA, Lucia 2001. Matrizes da linguagem e pensamento. São

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Site: http://www.vitorlippi45.can.br

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Uma proposta metodológica de uso da pesquisa amostral para elaboração de

marketing político pré e pós eleitoral

Pedro Paulo Losi MONTEIRO2

Resumo

Este trabalho apresenta uma proposta metodológica de construção do marketing político

pré e após eleitoral, através do uso da pesquisa amostral. Como estudo de caso, iremos apresentar

um desenho amostral construído com objetivo de eleger um pré-candidato a vereador que concorre

ao pleito municipal na cidade de Paulínia para o ano de 2009 á 2012. A pesquisa foi realizada entre

os meses de maio a julho de 2008, foram entrevistadas 935 pessoas, e a campanha esta em fase

de andamento. Demonstraremos também como os resultados da pesquisa estão sendo utilizados

durante a campanha eleitoral e como pretendemos auxiliar o pré-candidato vereador a governar em

ressonância com os anseios do eleitorado caso eleito.

Palavras-chave: pesquisa amostral; marketing eleitoral; eleições.

Introdução

Paulínia[1] é uma cidade do interior paulista que possui um diferencial com relação a outros

municípios, possui uma grande arrecadação em impostos, com destaque para as industrias petroquímicas, que anualmente depositam cerca de R$ 600 milhões nos cofres públicos do município através de ICMS. Esse montante coloca o município como umas das cidades do interior que mais arrecada e conseqüentemente uma cidade que possui uma forte disputa a cargos políticos. Nas duas últimas eleições municipais para vereador 2008 e 2004, o Tribunal Superior Eleitoral3

registrou em cada eleição cerca de 193 candidatos para concorrerem a 10 vagas no poder legislativo.

Do ponto de vista dos eleitores, tamanha arrecadação traz uma discussão para sociedade sobre como deve ser gasto o dinheiro público. Tal direcionamento faz das eleições um momento importante para a cidade de Paulínia, na medida em que a sociedade procura direcionar seus interesses para eleger representantes que façam valer os anseios do eleitorado. Nesse sentido os cargos políticos tem sido alvo de uma disputa por melhores representantes, dado as experiências de erros e acertos em eleições anteriores por parte do eleitorado.

Entendemos que convencer hoje o eleitor de Paulínia a votar em um determinado candidato está relacionando com a capacidade de apresentar propostas que vão de encontro tanto com as necessidades locais da população quanto na identificação de prioridades gerais para cidade. Além

2 Cientista Social, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, São Paulo. 3 Ver: TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Divulgação dos candidatos. Disponível em: http://www.tse.gov.br/internet/eleicoes/divulg_cand.htm.

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dessas questões esta pesquisa foi direcionada para identificar opiniões publicas que possibilita-se captar atitudes, intenções, freqüência em mídias, imagens de políticos, interesses, comportamentos, questões morais e éticas, gostos, preferências ou rejeições. Portanto, mais do que opiniões, o que procuramos captar foram as “representações da política” da cidade de Paulínia. E o conjunto de informações que foram levantadas, nos permitiu compreender o “cenário de representação da política4” e identificar tanto seus elementos constitutivos hegemônicos como aqueles que têm potencial contra-hegemônico, as correntes de opinião presente, sua base social, etc.

Para isso realizamos um survey ou pesquisa amostral, na cidade de Paulínia, que possui aproximadamente de 41.000 mil eleitores dos quais 988 foram entrevistados. O objetivo foi identificar alguns elementos, variáveis e fatores que estejam presentes no “cenário de representação política” da cidade de Paulínia para auxiliar um pré-candidato as eleições do poder legislativo. Objetivo

Objetivo deste trabalho é apresentar uma metodologia de construção do marketing pré e

pós eleitoral através da realização de um survey ou pesquisa amostral. Apresentaremos também resultados de uma pesquisa amostral realizada na cidade de Paulínia construída para auxiliar um pré candidato que disputa uma vaga no poder legislativo da cidade. Metodologia

Os survey repartem-se entre a descrição e a explicação. Primeiro, mede-se as variáveis e depois é realizado as associações entre elas [3]. Para isso é necessária a elaboração dos instrumentos de pesquisa e escolhas estratégicas de aplicação. Nesta pesquisa a proposta metodológica desenvolvida propõe a elaboração de sete etapas:

4

Ver: apud ALMEIDA [2] Este conceito foi originalmente utilizado por Venício Lima (1996) para quem deve ser entendido

como um cenário de representação específico da política. Portanto, como parte do hegemônico, que poderia ser decomposto em vários cenários (como, por exemplo, de representação da questão de gênero, racial, etc). Cenários que são construídos pelos sujeitos sociais. Assim, aqui trata-se de estudar a construção social das significações relativas à política. “As representações não se referem somente à realidade existente mas também à constituição da realidade, da mesma forma que a hegemonia é construção da realidade: sistema constituído e constituidor de significados e valores. Neste sentido, a hegemonia realiza-se nos espaços das representações, inclusive, mas não somente, da política. Assim o cenário de representação da política, como parte da hegemonia, é predominantemente simbólico e menos duradouro do que a hegemonia como um todo” (Almeida, 1999-b).

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Figura 1: Organograma Metodológico da Pesquisa Amostral.

1. Definição dos objetivos da pesquisa: Esta etapa inicial da pesquisa é de extrema relevância, pois a decisão sobre o que

pesquisar, ira guiar toda a metodologia, incluindo custo, tempo de pesquisa e o mais importante que são os resultados obtidos.

Desse modo é fundamental que a escolha dos objetivos da pesquisa sejam construídos de forma coletiva entre o pesquisador e a equipe central do candidato. A definição de um ou mais objetivo deve levar em consideração: i. O que queremos conhecer? ii.Porque queremos conhecer determinado aspecto ou fenômeno? iii. De que forma o resultado da pesquisa irá ajudar na construção do marketing eleitoral? iv. Qual é o custo e o tempo necessário? A partir destas referencias delimitamos os seguintes objetivos5

para esta pesquisa:

i. Intenção de voto: Compreender a percepção do eleitor acerca do quadro político,

apontando aspectos positivos e negativos

ii. Mapear as demandas e frustrações do eleitor em termos de políticas públicas;

iii. Identificar suas expectativas com relação à solução dos problemas sociais;

iv. Avaliar a imagem dos candidatos e as razões para votar ou não nos mesmos; 2. Dimensionar: Esta etapa envolve quatro passos importantes: i. construção do questionário, ii. realização do pré-teste, iii. definição do tamanho da amostra, iv. definição do local de aplicação do questionário. 2.1 Elaboração do questionário: A construção do questionário deve ser elaborada de acordo com os objetivos da pesquisa. Realiza-se primeiro a definição das variáveis (ver tabela 1) e logo em seguida a construção do questionário.

Variável Descrição n° de questões

A – Dados

Perfil do entrevistado: endereço, sexo, idade, escolaridade e renda.

5

B – Políticas públicas

Conhecer os principais problemas da cidade de maneira geral, detalhando as diferenças de cada região. Conhecer os anseios da população com relação a execução de obras/serviços urbanos a serem implementados na cidade. 4

C – Perfil político

Conhecer os elementos que influencia a decisão do voto do eleitor: meios de comunicação que utilizam, valores que esperam de um candidato, ações e programas. 3

5 Destaco dois fatores importantes que contribuíram para elaboração dos objetivos e de toda a pesquisa de uma maneira geral. A primeira influencia é o perfil ideológico do candidato, que esta ligado a uma história de vida de extrema pobreza, um ex-trabalhador do corte da cana de açúcar, que venceu economicamente na vida, adotando um discurso político voltado para ajudar a melhorar as condições de vida da população de Paulínia. E a última interferência foi a adoção do próprio pesquisador ao perfil ideológico do candidato criando um laço por afinidade e passando a assumir um papel de contribuição política para o candidato.

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D – Intenção de voto

Conhecer a preferência do eleitor para prefeito Identificar a quantidade de pessoas que conhecem o vereador que contratou a pesquisa

2

TOTAL 14

Tabela 1: Definição das varáveis utilizadas no questionário. 2.2 Realização do pré teste: O pré teste do questionário deve ser realizado no local de aplicação da pesquisa e deve ter como objetivo: i. verificar se o entrevistado compreende claramente as perguntas formuladas, ii. verificar se as respostas imaginadas pelo entrevistado corresponde a um item de resposta do questionário6, iii. identificar o tempo que leva para aplicar cada questionário, iv realizar uma estimativa do tempo necessário para aplicar todos questionário de acordo com o recurso humano disponíveis.

No caso de Paulínia, realizamos um pré-teste com dez entrevistas, resultando no aperfeiçoamento do questionário, tanto nas perguntas quanto na inclusão de algumas respostas. O tempo realizado em cada entrevista foi uma média de 7 a 10 minutos. 2.3 Definição do tamanho da amostra: A amostragem é uma técnica de pesquisa na qual um sistema preestabelecido de amostras é considerado idôneo para representar o universo pesquisado, com margem de erro e nível de confiança aceitável. Para pesquisas eleitorais a amostra pode ser realizada com base no número de eleitores da local pesquisado, obtido através do tribunal regional eleitoral [4]. Município Qtd de Locais Qtd de Seções Qtd de Eleitores

PAULÍNIA 15 123 41,941

Tabela 2: Quantidade de eleitores da cidade de Paulínia.

O critério da amostra adotado nesta pesquisa levou em consideração um nível de confiança de 95% da pesquisa com uma margem de erro de 4.5%. E o cálculo utilizado foi a de uma amostra aleatória simples [5]:

Figura 2: Cálculo da Amostragem.

2.4 Definição do local de aplicação do questionário: A estratégia de pesquisa definida pelo grupo teve como objetivo conhecer a maioria das regiões da cidade, para isso agrupamos os bairros em

cinco regiões, categorizados como: A,B,C,D e Central (ver Figura 03) e distribuímos os 988 questionários proporcional ao número de habitantes presente em cada bairro7. Utilizamos fotos de satélite8

para identificar a quantidade de ruas e o número de quarteirões, para que os questionários

6 Tal preocupação evita encontrar durante a tabulação uma porcentagem significativa de respostas classificadas como “outros”, dificultado a interpretação. 7 Os dados do número de habitantes por bairros foram obtidos pela da Prefeitura Municipal de Paulínia: Secretaria de Planejamento-2007 8 http://www.maps.google.com.br.

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fossem aplicados de forma mais homogenia possível no interior de cada bairro. Este procedimento foi adotado até se conseguir o numero de residências planejado9.

Figura 03: Mapa das regiões pesquisadas na cidade de Paulínia.

3 . Tabulação dos dados: A tabulação é a etapa de digitalização dos questionários em algum software de estatística

sendo possível utilizar programas comuns como Microsoft Acess e o Microsoft Excel. Nesta pesquisa utilizamos o Excel. Construímos uma tabela geral e na medida em que os questionários foram sendo respondidos outra equipe digitava os dados no programa. Com todos os dados digitalizados foi possível gerar as tabelas simples, com duas e até três variáveis, além da construção de gráficos para auxiliar a análise estatística. 4. Análise estatística: Uma vez os dados tabulados a análise estatística é o momento de observar as tabelas e gráficos obtidos. Realizamos esta etapa em conjunto com a equipe principal do candidato incluindo algumas lideranças de bairros. O objetivo foi apresentar os dados e confrontá-los com a opinião da equipe. 5. Apresentação do relatório: O relatório é um documento que deve conter todas etapas da metodologia, incluindo os resultados obtidos, tabelas, gráficos, fotos e interpretação do pesquisador frente aos dados obtidos. 2 Indicar tomada de decisão

Após realizada toda pesquisa os resultado apontam para um diagnóstico tanto da cidade de forma geral quanto de cada região/bairro. Os dados se materializaram na confecção da

9 A participação do entrevistado em uma pesquisa eleitoral deve ser completamente consentida e livre de pressão, deve garantir o anonimato do entrevistado e preservar a integridade e privacidade. O entrevistador deve tomar todas as precauções consideradas razoáveis para assegurar que os entrevistados não sejam, sob nenhuma circunstância, prejudicados por sua participação e não se sinta pressionado por quaisquer pessoas ou fatos de natureza política ao participar de uma pesquisa eleitoral [6].

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propaganda eleitoral: santinhos, banners, faixas, cartazes, músicas, jornais de bairro entre outros, em estratégias de arrastão pelas ruas da cidade e em conscientização política sobre os problemas da cidade.

Resultados Obtidos O relatório final apresentado ao candidato foi elaborado sobre cinco eixos principais com

dados tabulados para grupos específicos da cidade para que a construção do marketing eleitoral atenda diferentes grupos da cidade:

� Eixo 1 -Perfil Geral da pesquisa: apresenta dados sobre todos os entrevistados e da

cidade de Paulínia como um todo.

� Eixo 2 – Perfil dos Bairros: apresenta dados segmentados por regiões da cidade,

apontando as especificidades de cada local

� Eixo 3 – Perfil por Sexo: Dados sobre o perfil do cidadão paulinense segundo o sexo

masculino e feminino, identificando quais são as diferenças de demandas em termos de perfil político e políticas públicas.

� Eixo 4 – Perfil por Renda familiar: apresenta dados sobre três classes sócias distintas

identificando perfil pessoal, eleitoral e demandas de políticas publicas.

� Eixo 5 – Perfil por Idade: Dados sobre o perfil familiar, eleitoral e demandas depolíticas

publicas apresentado por três faixas etárias.Para este trabalho vamos apresentar apenas alguns resultados destes eixos: Perfil do entrevistado:

Sexo: A maior parte dos entrevistados foram mulheres com 65% e homens com apenas 29%, havendo certa defasagem com relação aos dados do Tribunal Regional Eleitoral-SP que apresentam os eleitores de Paulínia como: mulheres 53% e homens 47%.

Gráfico 1: Total dos entrevistados por sexo.

Idade: A maioria dos entrevistados possui idade entre 27 e 47 anos (49%) e acima de 47 anos (35%). Um dado bom para pesquisa, pois aproximou do perfil do eleitor segundo dados do Tribunal Regional Eleitoral-SP. Idade

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27 a 47 acima de 47 anos De 16 a 26 (vazio)

Gráfico 2: Idade dos entrevistados.

Renda e Escolaridade: A maior parte dos entrevistados possui ensino médio (43%) e ensino fundamental (39%) com renda que varia entre dois e três salários mínimos (38%) e até dois salários mínimos (33%).

Sobre a cidade de Paulínia: Objetivo era conhecer os principais problemas da cidade bem

como as principais obras ou serviços que a população de Paulínia gostaria que fossem implementados na cidade. A saúde pública é a principal preocupação da população segundo 22% dos entrevistados (ver gráfico 5), é também na área da saúde que 19% dos entrevistado apontaram como a principal obra a ser implementada (ver gráfico 6). O segundo maior problema de acordo com 12% dos entrevistados é a educação pública. Entendemos que a educação pública esta relacionado com capacitação técnica/profissionalizante e também com a criação de escolas, solução apontada pelos entrevistados (ver gráfico 6).

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Gráfico 5: Principais Problemas da cidade de Paulínia.

Gráfico 6: Obras/ações que gostariam de ver implementado na cidade.

Perfil do Eleitor: Uma parte do questionário aplicado nos bairro teve como objetivo conhecer os principais meios de comunicação que o eleitor de Paulínia utiliza para conhecer um candidato a vereador. A idéia era construir estratégias de marketing aplicado a mídias/meios das quais os eleitores realmente utilizam.

O principal meio utilizado pelo eleitorado para se informar sobre um candidato é através de conversas com amigos ou com pessoas da família, segundo 43% dos entrevistados. Através deste dado fortalecemos a idéia do candidato estar mais próximo do eleitor visitando casas, famílias e associações.

Com relação aos 11% dos entrevistados que apontaram para as noticias de jornais como o terceiro meio de comunicação mais utilizado, foram criados jornais impresso contendo informações sobre o candidato e propostas de governo.

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Gráfico 7: Principais meios de comunicação utilizado pelo eleitor para informar sobre os candidatos.

Ao identificar os meios utilizados pelo eleitor para conhecer os candidatos conjugamos tal dado com os principais fatores que influenciam a escolha do candidato para poder incluir nos meios/mídias o conteúdo necessário que o eleitor deseja.

Dessa forma identificamos que 43% dos entrevistados decidem seu voto através das propostas/programas de governo, seguido por 23% dos entrevistados que levam em consideração ações que um candidato já realizou e por ultimo com 7% dos entrevistados apontando para promessas de realiza melhorias na cidade e no bairro.

Gráfico 8: Fatores que influenciam o voto do eleitor.

Sobre os principais valores que um político deve ter, foi apontada a honestidade como principal segundo 29% dos entrevistados, seguido por caráter e sinceridade (ver gráfico 9). Um fator positivo com relação aos valores apontado pelos entrevistados foi coincidir com valores do próprio candidato e isto se refere ao caráter e sinceridade que são características naturais e visíveis. Tais características foram destacadas durante a construção de textos, na música do candidato e em outras propagandas eleitorais.

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Valores que o vereador deve ter

Gráfico 9: Principais valores que os eleitores esperam de um candidato.

Intenção de voto: Objetivo desta parte do questionário foi identificar a quantidade de pessoas que conhece o candidato. Encontramos 22% dos entrevistados que conhecem o candidato Adilson Censi. Estes dados estão sendo utilizados para identificar a pessoa que respondeu conhecer o candidato a fim de fortalecer o vinculo do candidato nessas localidades, e tornar essa pessoa mais uma apoio para o candidato.

C.5 Você já ouviu falar do pré-candidato a vereador Adilson Censi, o “Palito”? Total

Não Sim Não sabe/não respondeu 72,51% 22,29% 5,20%

Total geral 100,00%

Tabela 3: Pessoas que conhecem o candidato Adilson Censi.

Principais Problemas de cada região da cidade: o fato da maior parte dos entrevistados terem escolhido as propostas de campanha com principal elemento de decisão do voto (ver gráfico 8) revelou um resultado extremamente positivo na pesquisa, uma vez que esse fato acabou por coincidir com a escolha metodológica de colher amostras nas diferentes regiões da cidade, possibilitando criar programas de governo especifico para cada região (ver figuras 4 e 5) de acordo com suas necessidades apontadas pelos entrevistados (ver gráfico 10)

Cada região da cidade apresentou configurações diferenciadas com relação ao acesso e carências de políticas públicas. Porém, itens como segurança pública e a falta de área de lazer são comuns nas quatro regiões: D, central, B e A (ver gráfico 10). Vejamos os problemas de cada região, descritas de acordo com as prioridades apontadas pelos entrevistados.

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Figura 4: Propostas de governo para região A.

Figura 5: Propostas de governo para região D..

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Conclusão As pesquisas eleitorais têm um papel importante a desempenhar na sociedade atual. É

desejável que o público, os políticos, os meios de comunicação, os agentes divulgadores e outros grupos interessados tenham acesso a dados exatos e sem distorções a respeito das atitudes e intenções da população. A metodologia escolhida irá influenciar diretamente nos resultados obtidos, mas é preciso também estar atento na interpretação dos resultados, para montar uma representação do cenário político o próximo possível da realidade local. A partir da interpretação dos resultados o próximo passo e fazer com que esses dados atinjam realmente o eleitorado, ou seja, eles têm que retornar durante a campanha e após as eleições caso o candidato seja eleito, este movimento é o marketing eleitoral.

Referencia Bibliográfica [1] PREFEITURA MUNICIPAL DE PAULÍNIA. Disponível em : http://www.paulinia.sp.gov.br. Acesso

em 09 set. 2008.

[2] ALMEIDA. Jorge. Pesquisas de opinião e cenário de representação da política. Disponível em:

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[3] BABBIE, Earl. Métodos de Pesquisas de Survey. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001.

[4] TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE SÃO PAULO. Estatística do Eleitorado. Disponível em:

http://www.tre-sp.gov.br/estat/. Acesso em 09 set. 2008.

[5] BARBETTA, Pedro Alberto. Estatística Aplicada às Ciências Sociais. Ed. UFSC, 7a Ed.,

Florianópolis, 2007.

[6] Guia ABEP para divulgação de Pesquisa Eleitoral. Disponível em

http://www.abep.org/CodigosGuias/GuiaAbep_DivulgacaoPesquisasEleitorais.pdf. Acesso em 09

set. 2008.