esporte e religião na grécia antiga
TRANSCRIPT
-
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
1/105
1
UNIVERSIDADE DE SO PAULOESCOLA DE EDUCAO FSICA E ESPORTE
ESPORTE E RELIGIO NO IMAGINRIO DA GRCIA ANTIGA
Raoni Perrucci Toledo Machado
SO PAULO
2006
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
2/105
2
ESPORTE E RELIGIO NO IMAGINRIO DA GRCIA ANTIGA
RAONI PERRUCCI TOLEDO MACHADO
Dissertao apresentada Escola de Educao
Fsica e Esporte da Universidade de So Paulo,
como requisito parcial para obteno do grau de
Mestre em Educao Fsica.
ORIENTADORA: PROFA.DRA. KATIA RUBIO
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
3/105
3
AGRADECIMENTOS
Agradeo primeiro aos meus pais, Paulo e Ana Catarina, pela oportunidade de uma
boa educao.
Depois Katia Rubio, minha orientadora, por iluminar minha jornada mesmo onde
parecia no existir mais ningum.
Aos meus colegas de laboratrio, que evitarei citar nomes para no cometernenhuma injustia, mas que me deram suporte, coragem e motivao para seguir sempre em
frente.
Ao meu irmo Uir, que mesmo sem saber, proporcionou um timo
desenvolvimento para esta dissertao.
A minha irm Amana, que tratou de me ajustar lngua portuguesa.
Agradecer tambm a Cludia Guedes e ao Marcos Ferreira por contriburem
demais neste texto, tanto nas aulas quanto na qualificao.Ao pessoal do departamento de Ps-graduao, Ilza, Lourdes e Marcio, por
cuidarem da tranqilidade de meu percurso.
Lucia, da biblioteca, por me ajudar a deixar tudo isso aqui bonitinho...
A todos aqueles que contriburam direta ou indiretamente para esta caminhada, e
que eventualmente me fugiram a memria.
E por fim, agradeo ao glorioso Colorado, campeo da libertadores, por
proporcionar alegrias em todos os momentos de tenso.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
4/105
4
SUMRIO
Pgina
LISTA DE SIGLAS, ABREVIAES E SMBOLOS 5
RESUMO 6
ABSTRACT 7
1 INTRODUO 8
2 OBJETIVO 14
3 METODO 14
4 REVISO DA LITERATURA 15
4.1 Cultura 15
4.2 Princpios de Racionalidade 18
4.3 Mitologia 28
4.4 Mitologia Grega 44
4.5 O Heri 54
4.6 A Grcia 61
4.7 As Guerras 71
4.8 Religio Grega 76
4.9 A Prtica Esportiva 80
4.10 Os Jogos Pblicos 86
5 CONSIDERAES FINAIS 97REFERNCIAS 101
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
5/105
5
LISTA DE SIGLAS, ABREVIAES E SMBOLOS
Her. Hracles (Eurpides)
Hist. Histria (Herdoto)
Hist. Histria da Guerra do Peloponeso (Tucidides)
Trab. O Trabalho e os Dias (Hesodo)
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
6/105
6
RESUMO
ESPORTE E RELIGIO NO IMAGINRIO DA GRCIA ANTIGA
Autor: RAONI PERRUCCI TOLEDO MACHADO
Orientadora: Prof. Dr. KATIA RUBIO
Na Grcia Antiga, a prtica esportiva, mesmo antes de ser vista como objeto
pedaggico, era uma forma de transmisso cultural, tinha carter sagrado e buscava celebrar a
honra dos deuses. Independentemente dos motivos da criao desses eventos os Jogos
Pblicos, certo era que predominava seu cunho religioso, e como tal, impunham a seus
participantes uma srie de normas a serem seguidas. Com o tempo, os Jogos de Olmpia
passaram a ganhar maior importncia at chegar ao ponto de ser o acontecimento central de
toda a cultura grega, interrompiam-se as guerras e uma multido se dirigia a Olmpia para
apreciar os Jogos Olmpicos. Eram nestas ocasies que se conheciam os novos heris, o
momento em que o homem chegava mais perto dos deuses, buscando sua transcendncia. Com
o tempo, a condio religiosa foi sendo suplantada pelo espetculo propriamente dito,atingindo seu auge logo aps o incio do domnio romano, e quase imediato declnio. Com
isso, este trabalho tem como objetivo fazer uma reflexo sobre os motivos que direcionaram os
antigos rituais a se tornarem os grandes Jogos, apoiado principalmente na mitologia que os
sustentam. Buscar-se- discutir os motivos que levaram o povo grego a tamanha exaltao
frente a essa que foi, talvez, a mais importante manifestao social de todos os tempos.
Palavras-chave: Esporte, Histria, Mitologia
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
7/105
7
ABSTRACT
SPORT AND RELIGION IN THE IMAGINARY OF ANCIENT GREECE
Author: RAONI PERRUCCI TOLEDO MACHADO
Adviser: Prof. Dr. KATIA RUBIO
In the Ancient Greece, the sportive practice, before being seen as pedagogical object,
was a form of cultural transmission, had sacred character and looked for to celebrate the honor
of the gods. Independently of the reasons of the creation of these events - the Public Games,
certain were that predominated its religious way, and as such, for the participants a series of
norms was imposed. With the time, the Games of Olympia had started to gain greater
importance until arriving at the point of being the central event of all the Greek culture, the
wars were interrupted and a lot of people went directed to Olympia to appreciate the Olympics
Games. They were in these occasions that the new heroes were known, the moment where the
man arrived more close to gods, searching his transcendence. With the time, the religious
condition was being supplanted for the spectacle properly said, reaching its peak soon after thebeginning of the Roman domain, and almost immediate decline. This work has as objective to
make a reflection of the reasons that made the olds rituals to become the great Games,
supported mainly in the mythology. We will search to argue the reasons that had taken the
Greek people the so great dither front to that it was, perhaps, the most important social
manifestation of all the times.
Keywords: Sport, History, Mithology
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
8/105
8
1 INTRODUO
Na Antigidade, o esporte era um meio de formao do indivduo
frente s regras sociais e podia ser tratado sob cunho militar, pedaggico e
medicinal. Acreditava-se que a educao do fsico levava o homem a explorar
seu potencial na relao corpo-alma e em relao natureza (QUEVAL, 2004).
Segundo esse autor, os grandes jogos, inseridos em um contexto
guerreiro, revelavam o indivduo em sua totalidade, tanto em relao forafsica quanto em sua grandeza moral. Aqueles eventos eram grandes festivais
religiosos que movimentavam todo o territrio grego, a partir dessa tica que
se justificava a glria da recompensa, assim como a violncia vista nos
combates.
Depois de seu apogeu e declnio, os Jogos foram proibidos por serem
considerados uma festa pag. Durante toda a Idade Mdia, o esporte foi pouco
praticado e era extremamente controlado, j que estava restrito apenas a
membros de famlias nobres, no encontrando muitas possibilidades de
desenvolvimento. Nesta poca, a prtica esportiva era simbolizada pela presena
do heri guerreiro, j que frequentemente se associava s funes do combate.
ANDRIEU (2004) afirma que, muitas vezes, a histria descarta os
mitos por entender que se tratam de crenas ou histrias populares de dimenses
esotricas, ao mesmo tempo em que se busca um conhecimento dos
acontecimentos, freqentemente baseados justamente nessas histrias. Uma
dessas buscas, em fins do sculo XVIII, culminou com as primeiras descobertas
das runas do Santurio Sagrado de Olmpia, revelando, segundo CABRAL
(2004) a primeira data histrica da Grcia atestada com preciso 776a.C. ano
que comearam a ser registrados os vencedores dos Jogos em Olmpia, fazendo
com que as primeiras personalidades histricas conhecidas fossem os atletas
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
9/105
9
vencedores destes Jogos, mostrando o quanto histria helnica estava
intimamente ligada a histria do esporte.Com isso, em princpios do sculo XIX vieram tona grandes
discusses sobre princpios da antiga Hlade. A (re)criao dos encontros
esportivos independentes de festivais tradicionais ou eventos festivos se deu
durante este mesmo sculo e foi bastante facilitado pela proximidade entre os
vilarejos e pela pequena extenso geogrfica da Inglaterra, o que proporcionava
um maior intercmbio entre as vilas e criando as primeiras rivalidades entreequipes. Foi neste pas que o esporte criou seu espao nico e separado da vida
cotidiana. Assim, a durao espao-temporal especfica a essa prtica comeou a
ser vista como uma boa alternativa pedaggica (VIGARELLO, 2002).
A associao da insero da prtica esportiva pedaggica com a
descoberta das runas helnicas resultou no surgimento de um princpio que
tratava o esporte como um elemento educativo, o qual mais tarde seria conhecido
como Olimpismo (MLLER, 2004). No final do sculo XIX e incio do XX, um
educador francs chamado Pierre de Coubertin, desenvolveu a idia de que o
esporte melhorava a formao intelectual e moral dos jovens. Alm disso,
pensava que a incluso do esporte na escola, independente da tutela oficial do
estado, levava as pessoas a terem maior autonomia, iniciativa e honra, com
melhor capacidade para governar. Em meio a esse ambiente, Coubertin teve a
idia de recriar os Jogos Olmpicos. Com isso, ele desejava um evento onde se
elevaria o estado de esprito, o ideal de pureza e moral, que iria alm das
competies esportivas, ofereceria um espetculo com dimenses materiais e
espirituais. De forma geral, o Olimpismo representa valores espirituais para
vitrias materiais (ANDRIEU, 2004).
Semelhante ao desejo de Coubertin, as competies na Antigidade
eram exclusivas para homens livres, onde imperava o amadorismo. No entanto,
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
10/105
10
com o passar do tempo, iniciaram-se conflitos entre o amadorismo e o
profissionalismo e a simples prtica contra o espetculo, quase o mesmo cenriovisto na atualidade (BAILLETTE & BROHM 1995). Os eventos
contemporneos foram ento se transformando at que o antigo culto
aristocrtico do heri acabou substitudo pelo do campeo, levando QUEVAL
(2004) a denomin-lo como o culto da performance. O autor ainda completa,
dizendo que o mito do heri esportivo definido como um campeo simblico
em que aquela sociedade se projeta como um espelho em sua ideologia. Essaidia corroborada por RUBIO (2001), que entende que esses feitos so
interpretados e incorporados ao imaginrio de sua poca e de cada grupo social
particular. O carter agonstico do esporte, presente desde sua origem, contribui
para o reforo desse imaginrio.
Sustentando esse quadro temos o mito, entendendo-o como uma forma
espontnea de compreender o mundo, facilitando a insero do homem na
realidade.
Em qual realidade?
Os grandes festivais, em geral, no eram simples comemoraes, mas
sim uma re-atualizao. Eram a busca do espao e do tempo sagrado original.
BAILLETTE e BROHM (1995) e ANDRIEU (2004) entendem que o esporte
como uma viso mtica do mundo, assim como a religio, propicia a entrada em
um outro mundo, que longe dos problemas da realidade, reconforta o homem de
possveis frustraes, uma satisfao originada pela imaginao.
Independentemente de qualquer perodo histrico, as caractersticas
fundamentais do esporte so as mesmas, por mais distintas que sejam as
manifestaes socioculturais de seu tempo. Ele no faz parte de um tempo
histrico, mas sim da multiplicidade das histrias regionais, de forma que a
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
11/105
11
transio dos valores esportivos est muito mais associada forma como a
sociedade v o mundo do que com as prprias mudanas de suas caractersticas.Analisando a histria do esporte e, conseqentemente, da prpria
formao da sociedade, podemos entender que a prtica esportiva uma
necessidade de todas as culturas, cada qual sua forma, por se tratar de um
confronto simblico mal disfarado (SAGAN, 1988). Encontramos smbolos
de grande riqueza, tais como a bola, o tempo e o espao, dando sentido especial
ao esporte (COSTA, 1991). Associado a isso, temos a figura do heri, h muitotempo identificado como um indivduo que se sobressaa em sua sociedade,
capaz de realizar grandes feitos que ultrapassavam suas condies de simples
mortal, se aproximando dos deuses. Era visto pelos habitantes de sua regio
como um semelhante, isto , em condies iguais de existncia, fazendo com que
o tornasse um exemplo, uma referncia aos mais jovens, conseguindo, desde os
tempos mais antigos, seu espao no imaginrio coletivo.
Baseado na caracterstica mtica do esporte e do heri, o francs Pierre
de Freddy, Baro de Coubertin, desenvolveu o conceito de Olimpismo presente
na Carta Olmpica (COI, 2001, p. 2), utilizado para a recriao dos Jogos
Olmpicos, se referindo a uma:
Filosofia de vida que exalta e combina em equilbrio as
qualidades do corpo, esprito e mente. Ao associar esportecom cultura e educao, o Olimpismo se prope a criar umestilo de vida baseado na alegria do esforo, o valoreducativo do bom exemplo e o respeito pelos princpiosticos fundamentais universais.
Esse princpio, idealizado em fins do sculo XIX d.C., era
perfeitamente justificado pelo momento em que foi criado, onde o esporte era
praticado principalmente como estratgia de controle do tempo livre, ganhando
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
12/105
12
grande importncia como contedo de formao escolar (ELIAS & DUNNING,
1995; HUARD & WONG, 1990). No entanto, tal princpio, visto como aessncia do movimento olmpico da era moderna, teve sua gnese cerca de dois
mil e quinhentos anos antes.
Florescia nesta poca a cultura helnica. Nela, mito e histria se
confundiam desde os seus primeiros habitantes, fazendo com que aquela
sociedade desenvolvesse um profundo respeito por todas as figuras divinas que
controlavam as foras da natureza, das quais eram dependentes. Nos rituaisreligiosos, o homem buscava transcender sua condio de humano e tentava
aproximar-se dos deuses, a maneira encontrada para isso naquela sociedade eram
as demonstraes de destreza fsica.
Dessa forma, foram institudos os grandes Jogos Pblicos que, com o
passar do tempo, ganharam importncia primordial na vida de qualquer cidado
grego. Como consequncia disso, a educao grega, de certa forma, preparava o
homem baseado nos ideais originados desses eventos dentro dos princpios da
aret1 (RUBIO & CARVALHO, 2005), isto , o mximo conseguido pelo
homem equilibrado e perfeito. Quando esse princpio foi transferido para o
esporte ele pde ser entendido como a conquista da vitria de forma nobre e
cavalheiresca, buscando a superao das capacidades individuais. O
desdobramento desse princpio foi okalocagathia2, cujo significado relaciona-se
com a busca do belo e o bom, belo de corpo e bom de esprito. Os gregos
acreditavam que um no poderia existir sem o outro e viam na prtica da
atividade fsica a melhor maneira de tornar o corpo belo e, conseqentemente,
educar o esprito (JAEGER, 2003).
O surgimento dos grandes Jogos na Grcia fez com que a imagem do
heri fosse tambm fortemente contemplada no ambiente esportivo, talvez pela
1 Embora no exista traduo exata, as expresses virtude e excelncia so as que mais se aproximam.2 A busca pelo Bom e Belo (Kalobelo,Agaths Bom)
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
13/105
13
condio que o diferenciava das diversas formas de arte (CORDNER, 1988). At
o final dos Jogos da Antigidade, muitos heris surgiram, e ficaram marcadospara sempre na histria.
O filsofo Espinosa, citado por CHAU (1995, p. 109) em sua abertura
do Tratado da Reforma do Intelecto, expressa o que provavelmente teriam
sentido os helenos daquela poca, caso no conhecessem o significado e
transcendncia dos Jogos:
Tendo em vista que todas as causas de que me arreceavaou temia no continham em si nada de bom nem de mauseno enquanto o nimo se deixava abalar por elas,resolvi, enfim, indagar se existia algo que fosse um bemverdadeiro e capaz de comunicar-se a todos e pelo qualunicamente, afastado tudo o mais, o nimo fosse afetado.Mais ainda, se existia algo que, uma vez encontrado, medesse para sempre a fruio de uma alegria contnua esuprema.
E conclui em seu Quinto Livro de tica:
E com certeza h de ser rduo aquilo que raramente seencontra. Como seria possvel, com efeito, se a salvaoestivesse mo e pudesse encontrar-se sem muitotrabalho, que fosse negligenciado por quase todos? Mastudo que precioso to difcil quanto raro.
Se Espinosa tivesse vivido na Antigidade, possivelmente ele no se
indagaria a esse respeito, e sentado, tentando conter um sorriso, assistiria aos
Jogos.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
14/105
14
2 OBJ ETIVOS
O objetivo principal deste trabalho analisar a funo e a importncia
do esporte, dos festivais esportivos e da religio para a cultura grega da
Antigidade, baseado essencialmente no imaginrio daquele povo. Para tanto
sero buscados na histria da Grcia na Antigidade, assim como em sua
mitologia, elementos que apontem para essa direo associando-os ao
surgimento e aderncia das prticas esportivas por todo o territrio grego.Compreender o significado e importncia dos Jogos Pblicos para a
sociedade desse perodo, desde o perodo minico at as invases romanas,
representa ampliar o conhecimento sobre os Jogos Olmpicos Contemporneo,
seu significado e sua relevncia.
3 MTODO
O mtodo utilizado nesse trabalho ser a pesquisa histrica analtica,
conforme descrita por THOMAS e NELSON (2002), recorrendo a fontes
relacionadas literatura, filosofia, histria antiga e, especificamente,
histria dos Jogos Pblicos na Grcia antiga.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
15/105
15
4 REVI SO DE L I TERATURA
4.1 Cultura
Por cultura, entende-se em seu sentido original ainda sob forma latina,
como algo referente ao cultivo ou cuidado de algo que, com o passar do tempo,
deixou de ser fsico passando a ser tambm cognitivo. TYLOR3, citado por
THOMPSON (2000, p. 171), entende a cultura como:
O conjunto inter-relacionado de crenas, costumes, formasde conhecimento, arte, etc., que so adquiridos pelosindivduos enquanto membros de uma sociedade particulare que podem ser estudados cientificamente. Estas crenas,costumes, etc., formam um todo complexo que caracterstico de uma determinada sociedade,diferenciando essa sociedade de outros lugares e pocasdiferentes.
De maneira geral, a cultura define a identidade de uma sociedade,
modelada pelo tempo e passada atravs de padres de formas simblicas j
incorporadas, como aes, manifestaes verbais, alm de outros objetos de
igual valor simblico, onde se partilham concepes, experincias e crenas.
Essas frmulas simblicas foram caracterizadas por THOMPSON(2000) em cinco formas distintas, de acordo com seus aspectos intencional",
convencional", estrutural", referencial" e contextual". O primeiro deles
refere-se a elas como expresses de um sujeito e para um sujeito, atravs de
formas e expresses produzidas. A segunda refere-se aplicao de regras,
cdigos e convenes para a interpretao das formas simblicas. O aspecto
3 E. B. TYLOR,PrimitiveCulture:Researches into the development of mithology, philosophy, religion,language, art and custom, v. 1, Londres, John Murray, 1903.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
16/105
16
estrutural refere-se s suas caractersticas estruturadas. Na seqncia, o aspecto
referencial traz a idia de que cada uma das formas simblicas representa algo ediz algo a respeito de alguma coisa. E por fim, o aspecto contextual quer dizer
que as formas simblicas sempre estaro contextualizadas nos padres scio-
histricos das sociedades em que elas so produzidas, transmitidas e recebidas.
A cultura, segundo FERREIRA SANTOS (2004), pode ser entendida
como um universo de criao, transmisso, apropriao e interpretao dos bens
simblicos e suas relaes. O que caracteriza as vrias culturas so os processossimblicos envolvidos no ato criativo, bem como aqueles envolvidos em nossa
capacidade de nos apropriarmos de seus contedos, sentidos e significados. Por
meio de processos pedaggicos, isto , atravs de processos de iniciao das
geraes mais novas pelas mais velhas ou mais experientes, as sociedades vo
ganhando sua identidade cultural.
Jos Carlos RODRIGUES4 citado por FERREIRA SANTOS (2004),
afirma que as culturas, em um sentido menos abstrato, so sistemas simblicos,
ou seja, mais que somatrias de vetores, artefatos, crenas, mitos, rituais,
comportamentos, etc. (como queria a definio inaugural de Tylor), cada cultura
uma gramtica que delineia e gera os elementos que as constituem e lhe so
pertencentes, alm de atribuir sentidos nas relaes entre os mesmos. As culturas
no se definem apenas por seus vocabulrios, mas principalmente pelas regras
que regulam a sintaxe das relaes entre os seus elementos.
Logo, se torna muito estreita a relao entre cultura e mito. De forma
geral o mito aquilo que se relata. De acordo com FERREIRA SANTOS (2004),
a narrativa dinmica de imagens e smbolos que orientam as aes na
articulao do passado e do presente, em direo ao futuro. A prpria descrio
de uma determinada estrutura de sensibilidade e de estados de alma que a espcie
4 J.C. RODRIGUES,Antropologia eComunicao:princpios radicais, Rio de Janeiro, Espao e Tempo, 1989.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
17/105
17
humana desenvolve em sua relao consigo mesma, com o outro e com o mundo,
desde que, descendo das rvores, comeou a fazer do mundo um mundo humano.Da tambm a importncia das metforas, um alm sentido que impregnam a
imagem e explode a sua semntica.
Como j foi dito, a principal caracterstica das vrias culturas so os
processos simblicos envolvidos no ato criativo, bem como aqueles envolvidos
na nossa capacidade de nos apropriarmos dos contedos, sentidos e significados,
de poder difundi-los pela comunicao e, sobretudo, de interpret-los para acompreenso do mundo, e conseqentemente, de ns mesmos. Os processos
simblicos podem ser transmitidos e comunicados envolvendo uma
aprendizagem de auto-apropriao e interpretao, fechando e ao mesmo tempo,
ampliando o conceito simblico cultural. Segundo MERLEAU-PONTY (1962),
a comunicao transcende o verbal e tem em ns mesmos uma poderosa
ferramenta, a gesticulao cultural, moldada historicamente pela necessidade de
comunicao, compreende um ato fsico cheio de significados. uma forma e
um sentido que se interpretam configurada por uma determinada estrutura de
sensibilidade. So excedentes do nosso relacionamento com o mundo e com o
outro numa imagem arquetpica, ancorada no prprio corpo.
Esses excedentes de significados, que constituem a polissemia
polifnica (as vrias vozes dos vrios significados), ondulam os oceanos de
possibilidades humanas. E se existe uma realidade real do mundo concreto,
ento ela s pode ser organizada e aprendida na rede simblica das prticas
culturais (FERREIRA SANTOS, 2004).
O imaginrio conclui e reinicia esse ciclo entre o mito e a cultura, ele
o resultado da co-implicao entre as pulses subjetivas e as interaes do meio
ambiente csmico e social, denominado por DURAND (2002) de trajeto
antropolgico. A parte dos contedos e relaes estabelecida entre o corpo e o
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
18/105
18
meio se desenvolvem nas gesticulaes culturais concentradas em sistemas que
produzem uma imagem arquetpica, podendo ter dois caminhos, o racionalizantee o mitolgico, o que nos faz voltar de novo ao incio.
4.2 Princpios deRacionalidade
Iniciarei esse captulo com uma passagem do romance A Histria sem
Fim de Michael ENDE (1988, cap. IX), onde o autor consegue expor como ospersonagens do Mundo de Fantasia interagem com os personagens do Mundo
dos Homens, em um dilogo entre Atrei, o protagonista do livro, e Gmork, um
lobisomem que consegue perambular livremente por entre os mundos, acerca da
presena e multiplicao do Nada em sua terra e como as pessoas de Fantasia
aparecem no mundo dos Homens. O personagem reflete sobre a fico, a fantasia
e a mentira que aos olhos de muitos parece ser a mesma coisa.
Gmork, o lobisomem, comea:
O Nada. Quando entramno Nada ele seapodera devoc. Passa a ser
como uma doena contagiosa, que cega os homens, tornando-os incapazes de
distinguir entre a aparncia e a realidade. Sabe o nome que eles do a vocs?
Mentiras! (...)
Voc me pergunta como vai ser l nesse mundo? Mas o que voc
aqui? Figura de sonhos, invenes do reino da poesia, personagens de uma
histria sem fim! Voc se julga real? Neste mundo voc , mas se entrar no
Nada deixadeexistir. Leva ao mundo dos Homens a cegueira ea iluso (...)
Os habitantes de Fantasia transformam-se em devaneios da mente
humana, em imagens geradas pelo medo, quando na realidade no h o que
temer (...)
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
19/105
19
por isso que os homens tememe odeiamFantasia e tudo o que dela
vem, querem aniquil-la, mas no sabemque ao faz-lo, aumentama torrentede mentiras (...) s no pensaro emvisitar Fantasia se pensaremque ela no
existe (...) nada tem mais poder sobre os homens que mentiras, porque os
homens vivemde idias, e as idias podemser dirigidas, esse poder o nico
que conta, e por isso que tenho estado do lado do poder e o servi, para poder
participar dele.
Quero dizer com isso que, durante muito tempo os seres humanoscreditaram sua vida a uma procedncia baseada em idias mitolgicas que
explicavam de maneira satisfatria a origem da vida e os fenmenos da natureza.
KANT (1959) diz em um de seus prolegmenos que, conforme o ser humano foi
tomando maior conhecimento de si dentro do mundo, essas idias foram sendo
abandonadas aos poucos por pensadores e cientistas, at passarem
definitivamente para o mundo da fantasia, sendo inaceitvel t-las como
verdades.
Durante muito tempo, o ser humano creditou sua vida unicamente a
uma complexa realidade divina, talvez o nico modo possvel de explicar sua
existncia.
Dentre as muitas construes mitolgicas criadas por diferentes
culturas nenhuma outra cultura exerceu tanta influncia sobre o mundo ocidental
como a grega.
As condies peculiares do territrio grego permitiram que desde a
chegada dos Drios, no sculo XII a.C., os gregos tivessem no mar rotas
comerciais com povos do Oriente, facilitando o intercmbio cultural e
incentivando muito a aventura das construes imaginrias (SOUZA, 1999), se
distanciando cada vez mais da cultura arcaica.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
20/105
20
A chegada dos Drios, superiores fisicamente, empurraram os Aqueus
que, at ento ocupavam o territrio grego, para as pequenas ilhas e costa dasia Menor, onde l fundaram colnias e expandiram a cultura helnica. Da
poesia, cantavam o declnio de uma era, alm das grandes epopias, narradas e
enriquecidas durante o tempo pelos aedos (poetas e declamadores ambulantes),
das quais sobreviveram at os dias atuais apenas A Ilada eA Odissia, escritas
entre os sculos X e VIIIa.C., atribudas a Homero, de quem quase nada se sabe
a respeito.A antropomorfia dos deuses dava-lhes aspectos familiares e
inteligentes, afastando os temores relativos s foras obscuras e incontrolveis,
gerando mais segurana existncia. A virtude (aret), dada por Homero aos
nobres (aristoi), diferenciava-os dos homens comuns, principalmente por estes
atriburem a sua rvore genealgica alguns dos deuses ou heris antepassados.
Entretanto, s isso no bastava, os nobres davam provas constantes de sua
valentia, fora e habilidade, que caracterizaram seus ancestrais, principalmente
nas demonstraes fsicas, de luta ou nos jogos atlticos. Mais tarde, a
genealogia foi substituda pela espiritualidade, atravs de Plato e Aristteles.
Com Hesodo, que tambm teria vivido no sculo VIII a.C., e suas obras
Teogonia eO trabalho e os dias, surgiu a noo de que a virtude (aret) filha
do esforo e de que o trabalho o fundamento e a salvaguarda da justia
(PESSANHA, 1999).
A moeda, surgida no sculo VII a.C., dissociou gradualmente a idia
de aristocracia e consanginidade. Junto com isso, surgia na Grcia em fins do
sculo VI e incio do V a.C. uma nova mentalidade, que vinha superar uma
perspectiva da cosmognese e da antropognese.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
21/105
21
TUCDIDES (2001), que viveu entre 460 a 400 a.C. em seu livro
Histria da Guerra do Peloponeso tambm expe de forma clara essecontraste entre mito e realidade, ao defender em sua obra:
luz da evidncia apresentada at agora, todavia,ningum erraria se mantivesse o ponto de vista de que osfatos na Antigidade foram muito prximos de comodescrevi, no dando muito crdito, de um lado, s versesque os poetas cantaram, adornando e amplificando os seus
temas, e de outro considerando que os loggrafoscompuseram suas obras mais com a inteno de agradaraos ouvidos que de dizer a verdade uma vez que suasestrias no podem ser verificadas, e eles em sua maioriaenveredaram, com o passar do tempo, para a regio dafbula, perdendo, assim, a credibilidade (Hist. 1, 21).
E mais frente em sua obra, em relao aos antigos habitantes da
Siclia, diz que:
Os mais antigos que as tradies mencionam comohabitantes de qualquer parte da ilha so os ciclopes elestrignios, a respeito dos quais no posso dizer a queraa pertenciam, nem de onde vieram e nem para ondeforam. Limitemo-nos, pois, s estrias dos poetas e sopinies de cada um a propsito deles (Hist. 6, 2).
CAMPBELL (2004) afirma que a vitria dos gregos sobre os persas
ajudou-os a deixar de obedecer apenas a uma ordem csmica preestabelecida,
como servos de um Deus, e passarem a ter um maior discernimento racional,
com suas obras celebrando a humanidade, e no a divindade. Este fato associado
a um maior desenvolvimento cultural, fez com que os homens apresentassem
solues baseadas na razo para os problemas da natureza, substituindo a viso
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
22/105
22
mtica da realidade. O resultado disso foi o surgimento dos primeiros pensadores
pr-socrticos (SOUZA, 1999).A filosofia grega se iniciou ento pela periferia de seu territrio, onde
existia maior liberdade do julgo da tradio. No continente, enquanto a poltica
ia se transformando, as idias filosficas aos poucos foram sendo incorporadas
s atividades dos cidados. A seguir as principais caractersticas dos mais
importantes pensadores pr-socrticos, que tiveram papel fundamental para a
construo da racionalidade.O primeiro filsofo emprico grego que se tem conhecimento foi Tales
de Mileto, viveu aproximadamente entre 625/4 a 558 a.C., era naturalista, e
acreditava que o princpio de todas as coisas seria a gua. Sua busca ativa e
racional dos princpios das coisas inspirou novos pensadores. De Mileto vieram
ainda Anaximandro (cerca de 610 a 547a.C.) e Anaxmenes (cerca de 585 a 528
a.C.). O primeiro considerado o iniciador da astronomia por definir um padro
para medidas estrelares e, usando um princpio de pares de opostos (o qual
tambm utilizava para definir todos os elementos da natureza), mostrava que a
Terra estava suspensa no Universo, suportada por nada. O segundo, tambm
relacionado a astronomia, dizia que a luz da Lua vinha do Sol, e substituiu a gua
pelo ar como princpio de tudo.
J a matemtica deve muito a Pitgoras de Samos (aproximadamente
580/78 a 497/6 a.C.), que nada tendo deixado escrito permitiu que sua figura
fosse envolvida pelo fantstico. Os pitagricos acreditavam que os nmeros eram
o princpio de todas as coisas. Essa primeira forma concreta de cincia deu incio
a uma onda de crticas s explicaes mitolgicas da realidade, onde o
conhecimento, e no o xtase, tornaram-se os meios de realizaes
(CAMPBELL, 2004). O primeiro a fazer isso foi o igualmente poeta Xenfanes
de Colofo (570 a 528a.C.), que da mesma forma critica a situao de honra dos
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
23/105
23
vencedores de Olmpia, dizendo que estes nada acrescentavam s suas cidades,
dando o primeiro golpe contra o significado transcendente dos Jogos.Por outro lado, era justamente durante a realizao dos Jogos que eles
conseguiam se reunir e divulgar suas idias e assim, conquistar novos discpulos.
Em virtude disso muitos filsofos ainda surgiriam. Havia entre eles um debate
acalorado de idias sugerindo uma espcie de competio, assim como os atletas
competiam entre si. A existncia do ser, por exemplo, foi motivo de muitas
discusses entre Herclito de feso (540 a 470 a.C.), que acreditava namutabilidade dos seres, e Parmnides de Elia (530 a 460a.C.), que criticava as
idias do ser e no ser, trabalhando com a unidade do individuo. A dialtica, isto
, a argumentao combativa, foi inicialmente empregada pelo tambm elio
Zeno (504/1 a.C. a ?), que tinha como principais idias o infinito e a noo
espacial, com a representao no espao e no tempo. Melisso de Samos, no se
sabe ao certo quando nasceu, floresceu em cerca de 444/1a.C., tambm concebia
a idia do ser e no ser, unidade e pluralidade.
A supremacia da racionalizao em detrimento do mito aconteceu com
a discusso dos quatro elementos contra o princpio uno de Empdocles de
Agrigento (490 a 435 a.C.), que preservou a idia de seus antecedentes,
combinando com as suas. Ele acreditava nos deuses e pensava que os homens
eram deuses cados, pagando por pecados. Em relao ao mundo, ele usava como
base a dualidade como fora criadora, amizade e inimizade, o bem e o mal,
atrao e repulsa e assim por diante. Depois dele, em meados do sculo V a.C.,
vieram os pitagricos Filolau de Crotona, e Arquitos de Tarento (cerca de 400 a
365a.C.), que viam nos nmeros uma verdade inabalvel e tinham a matemtica
como cincia, apresentando provas de sua existncia. Alm disso, mostravam
como o raciocnio podia ser usado contra as injustias.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
24/105
24
A primeira escola filosfica de Atenas foi fundada por Anaxgoras de
Clogomenos (cerca de 500 a 428 a.C.), que desenvolveu uma linha depensamento pautado nas idias de causa e efeito na natureza. Para Aristteles,
Anaxgoras foi o primeiro a ter plena conscincia do que falou, ao contrrio de
seus antecessores, quedentre muitas idiasdesorientadas, tinhamuma ououtra
boa. Seguindo a linha naturalista, Leucipo de Mileto, que nasceu por volta de
500a.C., iniciou a idia do tomo, mostrando um principio de racionalidade na
pesquisa natural.O ltimo pensador pr-socrtico foi Demcrito de Abdena (460 a 370
a.C.), que discutiu a essncia das coisas, como leve e pesado, slido e menos
slido, alm de dizer que alma e mente representam a mesma coisa. Sobre o ser e
o no ser, disse que se h movimento, deve haver espao vazio, o que equivale a
dizer que o no ser to real quanto o ser.
Scrates nasceu em 470 ou 469a.C. em Atenas, em um perodo que a
Grcia vivia ainda a euforia frente a vitria contra os persas (PESSANHA,
1999), fato que, segundo CAMPELL (2004), fez com que os homens
acreditassem mais em suas prprias conquistas e passaram a no ser mais to
dependentes das leis divinas. Com essa atmosfera, Scrates encontra condies
propicias para desenvolver seu pensamento e iniciar uma nova era de
conhecimento baseada essencialmente no homem.
Enfim, a busca pelo conhecimento norteou o desenvolvimento do ser
humano por toda sua histria. Os primeiros estgios de avano intelectual,
entretanto, no tornaram isso tarefa fcil e, mesmo antes de haver uma
linguagem j bem definida, h indcios de que o ser humano, desde os seus
primrdios, j buscava elementos que sustentassem sua existncia, busca que,
ainda hoje, continua.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
25/105
25
PEIRCE (1878/9) relata que, no final do sculo XIX d.C., um dos
principais objetos da pesquisa era de fixar uma opinio. A concepo que opensamento ou o sentimento nos traz certamente um progresso novo e muito
importante. De certa forma, o problema se remete a como fixar uma opinio, no
somente para o indivduo, mas tambm para a sociedade. Abandonamos o
esprito humano s causas naturais, sob sua influncia, os homens direcionavam
seus pensamentos e consideravam as escolhas de pontos de vista diversos,
desenvolvendo gradualmente suas crenas em harmonia com as escolhasnaturais. Esse mtodo conduz a maturidade das concepes do domnio da arte,
exatamente como fizeram os povos da Antigidade.
A autonomia da cincia, segundo BOURDIEU (2001), foi sendo
conquistada pouco a pouco contra os poderes religiosos, polticos e at mesmo
econmicos, alm de ir de frente contra os burocratas do estado, que viam suas
condies mnimas de independncia sendo enfraquecidas. Seu desenvolvimento
no foi um processo contnuo, mas marcado por uma srie de rupturas e por
alternncia de perodos de cincia normal e de revolues dentro de um
movimento de acumulao contnua. WHITEHEAD (1929), completa dizendo
que a funo da razo um dos tpicos mais antigos de discusso filosfica,
sempre associada a uma outra coisa (f, autoridade, imaginao...), afirmando
que sua funo de promover o entendimento da vida. No incio explicava a
origem das espcies, mas falhava em determinar o surgimento de organismos
mais complexos. De forma geral, se desenvolveu de trs maneiras, a de viver, de
viver bem, e de viver melhor, isto , estar vivo, viver de forma satisfatria e
melhorar a satisfao, direcionando seu desenvolvimento e operando as
realizaes tericas. Cada metodologia possui sua prpria histria. Primeiro
representa uma coordenao entre pensamento e ao, expressando a satisfao
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
26/105
26
da existncia, de viver bem. Determinando o destino das espcies, conseguimos
estabilizar, tornando-nos livres e entrando na aventura de viver melhor.Ainda sobre a razo, o mesmo autor diz que os gregos possuam duas
figuras exemplares, a saber, Plato e Ulisses. O primeiro tinha a sua razo
baseada nos deuses, e o segundo na astcia. Respectivamente, a razo
procurando um completo entendimento e a razo buscando um mtodo imediato
de ao.
Desta forma, ento, o pensamento se formou para o conhecimento darealidade (PATY, 2004). Deve-se ento considerar que o conhecimento humano
exprime um mundo racional ao mesmo tempo em que transcende raciocnios
imediatos da experincia singular. Esse conhecimento proporciona ao indivduo,
uma compreenso do mundo material a partir de suas dimenses fsicas,
biolgicas e sociais, da mesma forma que os objetos matemticos. As condies
do pensamento racional, como acredita Kant, implicam em um principio de
causalidade, clara para a construo de uma inteligibilidade do mundo de
existncia material, demonstrado cientificamente.
Nesse caso a cincia faz a representao terica e se apresenta como
um sistema de conceitos que regulamentam preposies reportadas as
propriedades gerais da natureza. Essas propriedades, bastante especficas,
descrevem as diversas teorias dinmicas, referentes, em definitivo, ao mundo
fsico e seus objetos. Nesse sentido DALEMBERT5, baseado em Descartes e em
Kant, citado por PATY (2004), designa dois pontos limites para essa discusso:
o conhecimento de si prprio e o conhecimento do mundo real, exterior ao
indivduo.
Sendo assim, o conhecimento no previsvel, ele objeto de
descoberta, precisamente de invenes, invenes criativas, por elaborao e
5 J. R. DALEMBERT, Elmens desSciences, In: DAlembert et Diderot, V. 5, 1755.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
27/105
27
construo do material simblico do pensamento racional. Neste caso a pesquisa
cientifica sistematizaria seu movimento, aprofundando-o e ampliando-o (PATY,2004).
Conforme BOURDIEU (2001), o repertrio empirista caracterstico
dos papis formais das pesquisas experimentais, que so escritas baseadas em
representaes empiristas da ao cientfica. Os estudos de laboratrio seriam
ento uma importante fora contra a viso global empirista. Seus mdulos de
cincia so o resultado de um processo de fabricao, no qual o laboratrio, elemesmo um universo artificial, parte o mundo em pedaos, fsicos, sociais e
tambm materiais, criando fenmenos elaborados e testando teorias que no
existem a no ser pelos instrumentos laboratoriais.
WHITEHEAD (1929) escreve que a pesquisa por si pode nada
representar, tanto no campo fsico, onde as formas definem fatores, como no
mental, no qual as formas conectam ocasies imediatas com ocasies futuras.
Dessa forma, no basta apenas elaborar a metodologia, mas colocar experincias
conscientes para detalhar operaes possveis dentro dos limites desse mtodo,
ou ento, caminhar sobre experincias prticas. A histria da razo especulativa
curta, pertence histria da civilizao e retrocede seis mil anos, mas o grande
avano veio com os gregos. Eles descobriram a matemtica e a lgica como
mtodos de especulao. Com isso, eles puderam fazer uso de um teste objetivo
com um mtodo progressivo, no apenas baseados na viso mtica. Chineses e
indianos tambm produziram variveis do mesmo mtodo, porm os orientais
basearam suas descobertas quase que exclusivamente em aspectos mticos e
religiosos. A diferena principal entre essas culturas estava entre o
conservadorismo oriental contra as experimentaes inventivas e racionais da
escola grega, principalmente ps-Socrtica (CAMPBELL, 2004). A tecnologia
tambm contribuiu para esse quadro, mas ela quase nada avanou nos ltimos
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
28/105
28
trs mil anos em comparao com os ltimos cento e cinqenta, conseqncia da
aproximao e contato da razo especulativa e da prtica. Enquanto uma olhavapara atividades tericas, a outra buscava por metodologias. Esse avano, iniciado
no sculo XIX da era moderna, deveu-se inveno de novos instrumentos
cientficos, que iam coletando dados e introduzindo, aos poucos, outros
elementos de discusso, principalmente da noo do observvel mas no
observado, como as ondas eletromagnticas. O antagonismo entre filosofia e
cincias naturais, produziu limitaes no pensamento dos dois lados.De qualquer forma, a f cientfica foi construda, comunicada e
avaliada sob uma forma de proposies escritas e os trabalhos cientficos
tornaram-se, por essncia, uma atividade literria e interpretativa (BOURDIEU,
2001). Assim que o trabalho histrico de elaborao, retificao, de
familiarizao e de assimilao que representam todo o processo de
conhecimento, chega a ns por nos permitir conceber elucubraes,
possibilitando ao pensamento humano compreender qualquer coisa do mundo
(PATY, 2004).
4.3 Mitologia
O estudo comparativo das mitologias, como mostra a obra de
CAMPBELL (1992), nos compele a ver a histria cultural da humanidade como
uma unidade, ou seja, achamos o roubo do fogo, o dilvio, a terra dos mortos, o
nascimento de uma virgem e o heri ressuscitado, no mundo todo, sob novas
combinaes e se repetem como elementos de um caleidoscpio.
Todas elas foram criadas a partir de um nico fundo de motivos
mitolgicos. Foram selecionadas, organizadas, interpretadas e atualizadas de
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
29/105
29
modos diferentes, de acordo com as necessidades locais, mas veneradas por
todos os povos da Terra.Sendo assim, o homem aparenta no se sustentar no universo sem a
crena em algum poder. Com a herana geral dos mitos, na verdade, a plenitude
de suas vidas pareceria estar na relao direta entre a profundidade e a extenso,
no do seu pensamento racional, mas de sua mitologia local.
O mito o princpio da vida, a ordem eterna, a frmula sagrada para
qual a vida flui quando esta projeta suas feies para fora do inconsciente. Estepode ser pessoal, o qual JUNG (1991) descreveu como o contexto de imagens
esquecidas, ou pode ser coletivo, determinado pelos arqutipos.
No entanto, nenhum sistema mitolgico pode explicar sua funo em
termos de imagens universais da qual ele constitudo. Tais imagens levam as
energias da psique para um contexto mitolgico e as une faixa histrica da
sociedade, portanto, a mitologia possui um carter progressivo e os ritos de
iniciao possuem um papel fundamental neste processo (CAMPBELL, 1992).
A florescncia dos ritos resultou de uma percepo csmica, de
tamanha fora que todo sentido, princpio estruturador do universo, durante certo
perodo da histria humana, parece estar contido nele. Os ritos, segundo as
palavras de Campbell, eram representaes dessas concordncias, de maneira
comparvel s frmulas da fsica moderna, escritas, porm, no preto no branco,
mas na carne humana.
A idia elementar jamais , ela prpria, representada em mitologia. Ela
sempre transmitida por meio de idias tnicas ou formas locais, regionalmente
condicionadas e podendo refletir atitudes de resistncia ou de assimilao. Por
isso, as imagens do mito, jamais devem ser uma representao direta do segredo
total da espcie humana, mas apenas o propsito de uma atitude, o reflexo de
uma posio, uma postura da vida e uma maneira de jogar o jogo, e onde as
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
30/105
30
regras ou formas de tal jogo so abandonadas, a mitologia dissolve-se, e com ela,
a vida.O material do mito lida com os termos que se mostram mais adequados
natureza do conhecimento da poca (CAMPBELL, 1997), alm de estar
intimamente associado sociedade no qual est inserido.
Dessa forma, ela no um fenmeno recente. Joseph CAMPBELL
(1992) mostra que ela acompanha a evoluo do homem h muitos anos. Em
aproximadamente 600.000 a.C. no Perodo Paleoltico, mais precisamente noEstgio do Plesiantropo, tem-se indcios de que os seres primitivos daquela
poca se apegavam a alguns objetos e que existiam algumas pequenas
brincadeiras alm de danas. Esses indcios podem ser o incio da mitologia. No
Estgio do Piterantropo, cerca de 400.000 a.C., os homens j andavam eretos,
possuam um crebro de 900 cm3 (contra aproximadamente 1500 cm3 doHomo
Sapiens), e j tinha conhecimento do fogo. Eles possuam algumas ferramentas
que pareciam no ter utilidade no cotidiano, podendo ser utenslios para
cerimoniais.
No Estgio do Homem de Neandertal, de 200.000a.C.a 75.000a.C.
(ou 25.000a.C., no est bem determinado), j havia o domnio do fogo e o uso
de vestimentas, alm do fato de a capacidade cerebral ser entre 1.250 a 1.750
cm3. As evidncias mostram rituais predominantemente voltados caa, assim
como mostram sepultamentos cerimoniais em posio fetal (volta ao tero),
juntamente com mandbulas de javali, sendo esse um forte indcio da existncia
de certos sacrifcios, os quais podem ser os primeiros ritos religiosos.
O prximo Perodo, o Paleoltico Superior, inicia-se com o Estgio do
Homem de Cro-Magnon, que viveu entre aproximadamente 30.000a.C. a 10.000
a.C.. Estes andavam eretos e possuam uma capacidade cerebral superior a do
Homo Sapiensentre 1.590 a 1.880 cm3. Uma das principais caractersticas do
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
31/105
31
Homem de Cro-Magnon era a fabricao de estatuetas femininas com os seios e
quadris bem enfatizados, em clara aluso aos mistrios da fertilidade. Sodivididos em trs espcies diferentes, cada qual com distintos valores
mitolgicos. Os Aurinhacenses possuam estatuetas femininas e deixaram
inscritas muitas pinturas rupestres. Alm disso, realizavam seus rituais em
cavernas, cuja simbologia representa a mesma esfera e substncia da noite, do
cu noturno e das trevas. A outra espcie eram os Salutreanos que tambm
possuam estatuetas de mulheres e tambm de animais. Por terem sidoencontradas abandonadas em grutas, acredita-se que os membros desse grupo
podem ter seguido a linha dos Aurinhacenses. A ltima espcie eram os
Madalenianos que tambm realizavam seus rituais em cavernas, embora tenham
tido como principal dolo o Sol e algumas estrelas, alm de possurem
capacidade cerebral igual a do homem contemporneo (1.500 cm3). O ltimo
estgio desse perodo foi o Microltico-Capartano que se iniciou entre 30.000
a.C.a 10.000 a.C.e terminou em 4.000 a.C.. Os povos dessa poca possuam
forma expressiva de arte e realizaram inovaes na caa, alm de ser uma raa
mais tecnolgica. Os Xams passaram a ser substitudos pelo grupo como
detentores do poder sagrado e as cavernas continuavam a ser os locais dos
rituais.
Por fim, o ltimo perodo o Neoltico, no qual ocorreu o surgimento
das civilizaes do Oriente prximo, de aproximadamente 7.500 a.C. a 2.500
a.C. A origem dos motivos mitolgicos mais desenvolvidos aconteceu
aproximadamente nesta poca, em meio a proteo dos vales e montanhas da
sia Menor, Sria, Norte do Iraque e Ir, onde as tcnicas de agricultura e
criao de gado foram se desenvolvendo, facilitando o surgimento de aldeias
auto-suficientes. Essa pode ter sido uma das razes para o desenvolvimento do
pensamento do ser humano que se vendo desobrigado das necessidades da
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
32/105
32
sobrevivncia, pde se sentir livre para desenvolver seus pensamentos,
facilitando o surgimento das primeiras formas de cincia (CAMPBELL, 1992).Ainda existiam os cultos s foras femininas e apareciam as idias conscientes
das oferendas aos deuses, almejando algo em troca. Desenvolveram-se tambm
nesse momento os mitos da serpente. Neste perodo, inicia-se um conflito entre o
poder masculino da conquista contra a fertilidade feminina que, como se viu
anteriormente, era at ento o principal motivo dos rituais.
Em relao a isso, CAMPBELL (2004), diz que em um perodoprimitivo, prevalecia uma ordem essencialmente orgnica e vegetal, no herica
da natureza e das necessidades da vida ao contrrio do momento posterior
dominado pelo mpeto guerreiro do patriarcado, onde tudo o que era bom e nobre
estava associado aos novos senhores deuses hericos, deixando para os mortais
apenas o carter de obscuridade. No matriarcado, os aspectos claros e obscuros
da vida eram tratados iguais e conjuntamente como partes inerentes da
existncia. Os ritos desse perodo no tinham o esprito alegre das festividades
dos Jogos Atlticos e do teatro associados Grcia Clssica. Ao contrrio dos
rituais celebrados na Grcia Clssica patriarcal, realizados em ricos templos, com
carne de boi e dirigidos para cima, os sacrifcios Grande Me eram de porcos e
por vezes de seres humanos, sempre dirigidos para baixo, para a terra, em
arvoredos e campos sombrios, onde o pensamento fugia ao dou-te para que me
d, mas dou-te para que parta. A imagem freqentemente escolhida era a da
serpente. E foi justamente a serpente a vtima de todas as grandes batalhas das
novas divindades masculinas. Alguns exemplos podem ser encontrados na
Bblia, que narra a luta entre Jeov e Leviat, na poesia grega, que descreve a
batalha entre Zeus e Tifo, e na ndia, entre Indra a Vritra. Em todos os casos era
a serpente o monstro derrotado, smbolo do matriarcado, destruda pelo mpeto
guerreiro do patriarcado.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
33/105
33
Foi neste perodo que ocorreu a grande transio entre aqueles povos
primitivos com as primeiras formaes de uma sociedade mais organizada. Emseu incio, no estgio do Protoneoltico, de 7.500 a.C.a 5.500a.C.,os homens
ainda eram coletores e iniciou-se a domesticao de animais. J no Neoltico
Basal, que vai de 5.500a.C. a 4.500a.C., comeou a haver um assentamento em
pequenas aldeias e a manufatura de tecidos, cermica e casas. Nesta poca, as
mulheres ocupavam um lugar de auxiliares simblicas do cultivo da terra.
O estgio que segue o milnio seguinte, entre 4.500a.C. a 3.500a.C. o Neoltico Superior, onde h o aparecimento de um grande nmero de artefatos
de cermica com desenhos e formas bastante elaboradas, prenunciando um
grande desenvolvimento social e intelectual que estava por nascer. Isto de fato
pode ser notado nos mil anos subseqentes at 2.500a.C. com o surgimento das
cidades-estados hierrquicas. Nesse momento assiste-se ao surgimento das
cincias, dos sacerdotes e inicia-se a observao das esferas celestes (teoria de
organizao csmica a qual dividia os astros presos em sete diferentes esferas)
com sua adaptao para a estrutura social da poca, o monarquismo, na qual o rei
era considerado o centro da vida social tendo a cidade orbitando a sua volta,
assim como a Terra est para os astros. Desenvolve-se tambm um sistema para
medir o tempo pela posio dos astros e, concomitante a isso, surge a escrita, a
roda e os sistemas de medio decimal e sexagenal (CAMPBELL, 1994).
Nessa poca, na ilha de Creta, assistia-se uma continuao do culto
Deusa-Me, enquanto no continente os povos patriarcais guerreiros realizavam
conquistas e invases, com a conseqente transformao da cultura de
conquistadores e conquistados. As invases Indo-europias vieram da regio
situada ao norte do Mar Negro, onde viviam raas biologicamente diversas,
muito embora falassem lnguas semelhantes. O surgimento do bronze favoreceu
o desenvolvimento de utenslios e armas mais resistentes o que transformou a
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
34/105
34
vida destes povos, antes pacficos, levando-os a partir para a expanso, marcando
este perodo com diversas formas de guerras.O encontro entre o masculino e o feminino na mitologia grega foi
menos conflituoso, uma vez que na dinmica do panteo grego os deuses
patriarcais no exterminaram as deusas locais, mas adotaram uma outra
estratgia, desposando-as, dando incio a grande famlia Olmpica. A religio
grega se desenvolveu a partir de ideais de duas populaes de raas diferentes, a
pr-helnica e os indo-europeus. CAMPBELL (2004), afirma que uma diferenacrucial entre esses dois grupos pode ser sentida entre a religio
predominantemente emocional da populao pr-helnica, que parece ter sido
marcada por uma tendncia essencialmente mstica, e a religiosidade comedida
dos invasores indo-europeus, que confiavam a seus deuses a proteo das leis
no escritas de sua ordem patriarcal.
O conflito entre essas duas formas religiosas pode ser observado no
modelo da guerra grega entre Tits e deuses que simbolizava a batalha entre a
cria escura da Grande Me, gerada pelo seu prprio poder feminino, contra os
claros e brilhantes filhos secundrios, fecundados pelo macho. Esse foi um dos
resultados da conquista dos invasores patriarcais nmades sob a ordem
matriarcal local, como parte das reformulaes das tradies locais, que eles
foram adaptando aos seus prprios fins. Esse tipo de ao chamado por
CAMPBELL (2004) de difamao mitolgica, que consiste na redenominao
dos deuses de outros povos, deixando-os em um nvel de inferioridade,
normalmente associados a demnios, ao mesmo tempo em que elevam os seus
prprios deuses ao domnio do Universo. Criam-se, ento, mitos primrios e
secundrios para ilustrar a fraqueza e a malcia dos demnios e o poder e a
majestade dos grandes deuses. Isso uma clara demonstrao da formao de
uma nova estrutura do pensamento humano, estendido a um alcance universal. A
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
35/105
35
batalha entre os Deuses e os Tits representou a luta entre dois aspectos da
psique humana e ocorreu em um momento crtico de sua histria, quando ossmbolos masculinos hericos claros e racionais superavam os misteriosos e
obscuros smbolos femininos encravados no interior de seu prprio inconsciente.
Por toda essa poca e por muito tempo ainda em um perodo posterior,
insistia-se em pensar na divindade como uma espcie de fato, a noo de algo
que simbolizava a transcendncia e os mistrios. Exemplos de tais prticas so
animais como a Serpente e o Leo, enquanto a primeira representava a Lua, avida, a conscincia e o nascimento e a morte, o segundo significava o Sol, e
como ele a vida absoluta. Eram figuras presentes em quase todas as culturas
primitivas (CAMPBELL, 1990, 1992).
Essa foi a herana e o quadro que os gregos receberam para
desenvolver seu universo mitolgico. As inmeras semelhanas entre a mitologia
grega e a Indonsia em sua estrutura, acusavam um princpio comum em um
passado remoto. Essa condio no prerrogativa apenas dessas duas culturas,
mas de muitas outras, uma vez que a mitologia e seus rituais buscam sempre por
uma renovao do sacrifcio do prprio Deus no princpio, o que originou o
mundo conhecido do qual todos fazemos parte. CAMPBELL (2004) atribui
quatro funes mitologia: a primeira era de trazer a tona e sustentar um sentido
de espanto diante dos mistrios da existncia; depois, de oferecer uma
cosmologia que sustentar e ser sustentada por aquele sentido de espanto diante
do mistrio de uma presena e da presena de um mistrio; a terceira era de
garantir a ordem social vigente, para integrar organicamente o indivduo em seu
grupo; e por fim a quarta, de introduzir o indivduo na ordem das realidades de
sua prpria psique, orientando-a para seu prprio enriquecimento e realizao
espiritual.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
36/105
36
Os mitos, portanto, foram criados para validar costumes e sistemas de
valores de sua sociedade, no como uma preocupao em descrever uma ordemfactual dos acontecimentos, mas apenas de dar um certo suporte sobrenatural a
uma ordem social e um sistema de crenas. Como diz CAMPBELL (2004, p.
110):
Essa era, portanto como o e sempre foi, para aquelesem cujas mentes o bem de uma sociedade tem prioridade
sobre a verdade , uma justificativa adequada paraqualquer fico que a mentalidade da poca pudesse estarpersuadida a aceitar.
No incio, os poderes sagrados ficavam restritos nas mos de poucas
pessoas escolhidas, os chamados xams, eram estes quem centralizavam as
mensagens do mundo oculto e dirigiam os rituais. A subjugao dos xams pelos
deuses e sacerdotes comeou com a vitria do estilo de vida Neoltico sobre oPaleoltico, e talvez j possam estar acabando hoje:
Nesta poca de irreversvel transio da sociedade agrcolapara a industrial, quando no mais a devoo daagricultura, curvando-se humildemente diante dasvontades do calendrio e dos deuses da chuva e do Sol,para a magia dos laboratrios e foguetes espaciais, indo
onde outrora foi lugar dos deuses, iluminavam a promessade benefcios futuros (CAMPBELL, 1992, p. 231).
Mas no avancemos no tempo.
O mesmo autor diz que um princpio fundamental da tradio crist fez
parecer que era um ato de blasfmia comparar a bblia com elementos de outras
mitologias no mesmo plano conceitual. Enquanto os mitos gregos eram
reconhecidos como pertencentes a uma ordem natural, os da bblia eram
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
37/105
37
sobrenaturais. Os heris clssicos eram tidos como obras de fico, enquanto que
os hebreus tinham que ter uma histria factual. interessante notar que aomesmo tempo em que h uma enorme bibliografia de pesquisas usando como
referncia os fragmentos de mitos contidos na Bblia, os historiadores no ousam
fazer o mesmo com os relatos de Homero ou Hesodo. Interpretar um poema
como crnica da vida perder o essencial. Contudo, os elementos fabulosos
comuns s duas tradies mediterrneas orientais, exatamente contemporneas,
provm da precedente civilizao mesopotmica da Idade do Bronze. Tal origemacabar determinando o caminho de seu desenvolvimento.
No incio, enquanto os homens ainda eram completamente
dependentes das foras da natureza e no possuam qualquer conhecimento sobre
suas manifestaes, o temor frente ao desconhecido embasava o respeito dirigido
a deuses superiores.
No perodo Paleoltico, exatamente como na idade muito posterior das
primeiras sociedades agrcolas do Oriente prximo, o corpo feminino era
vivenciado em sua prpria natureza como um foco de fora divina e um sistema
de ritos era dedicado a seus mistrios (OTTO, 2005). Para as sociedades de
caadores e agricultores, o conceito de terrra-me, como gestadora, nutridora e
sepultadora, representava o retorno ao tero e, conforme o homem foi adquirindo
uma maior conscincia, a imagem da mulher participativa fez com que o
indivduo faltasse em suas funes masculinas e regredisse no sistema e no
tempo, reativando o contexto assustador do tero materno e do pai temvel. Essa
imagem norteou e sustentou (sustenta ainda, porque no?), um sistema no qual
domina o patriarcado que, como veremos, se inicia com os gregos e se institui
com os romanos.
Segundo CAMPBELL (1994), a teologia grega no foi formulada por
clrigos e nem mesmo por profetas, mas por artistas, poetas e filsofos. Ningum
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
38/105
38
ditava os termos da crena. Eram personificaes trazidas existncia pela
criatividade e imaginao humana que, por sua vez, foram bastante influenciadaspelas culturas provenientes do Oriente prximo, sendo a ndia o principal bero
dessas idias.
Claro, cada sociedade desenvolveu sua rede simblica de acordo com
suas realidades. No Oriente houve uma tendncia em valorizar a transcendncia,
o pensamento e a imaginao, no podendo estes serem qualificados, enquanto
no Ocidente a origem da existncia era normalmente creditada a um criador,sendo o homem sua criao, dois seres distintos. ZIMMER6, citado por
CAMPBELL (2004, p. 191) corrobora essa afirmao ao observar que:
A escultura grega desenvolveu-se, at seu pice deperfeio, por meio da representao dos belos corposatlticos de jovens e meninos que ganhavam trofus porlutar e correr nas competies religiosas nacionais deOlmpia e outros lugares. A indiana, em seu turno, noperodo de apogeu, apoiava-se nas experincias ntimas doorganismo vivo e nos mistrios do processo vital, queprovm da conscincia interior alcanadas pelas prticasiguicas (...) A arte grega resultou das experincias daviso; a indiana, das experincias da circulao do sangue.
Na Grcia, o fato de os deuses, no princpio, serem filhos doCaos e da
Terra, assim como os homens, no terem sido gerados por alguma fora criativa,mas foram surgindo como frutos espontneos e naturais de sua prpria ordem,
facilitava essa forma de pensamento.
Contudo, os mitos no podem ser entendidos simplesmente pelo seu
sentido literal, e sim como uma expresso de concepes mais profundas, que
procuram compreender o mundo de maneira espiritual, tal qual uma unidade.
6 H. ZIMMER,TheArt of Indian sia, Concludo e editado por Joseph Campbell, Nova York, Pantheon Books,1955.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
39/105
39
Como diz Joseph CAMPBELL (1994, p. 77), no comemos o cardpio
confundindo as letras com aquilo a que elas querem representar, porque fazerisso com os deuses das diversas religies? Os smbolos permanecem como
meios convenientes adaptados s necessidades de compreenso.
Durante o desenvolvimento cultural do ser humano, as vrias culturas
foram vivenciadas e comparadas, havendo ento uma tendncia inconsciente de
julgamentos e eliminao das menos aprazveis, transformando as restantes. As
religies possuem em comum o espanto frente a algo inexplicvel e a redeno esalvamento de um mundo que perdeu o brilho, ou seja, o Mito do Eterno
Retornopresente em todas as manifestaes da natureza e das quatro idades da
humanidade, que sempre em sua evoluo, tende ao pior, para apenas ressurgir.
Conforme o pensamento humano foi se desenvolvendo, e com ele, as
idias do sagrado, a identificao do divino passou a deixar um plano terreno,
visualizado na figura do Rei, para um plano ultraterreno. Com isso, o Rei deixou
de ser deus para ser apenas um servo Dele. O homem no tinha sido feito para
ser Deus, mas para conhec-lo, honr-lo e servi-lo, de modo que o prprio Rei, a
anterior personificao do divino na Terra, era agora apenas um sacerdote
oferecendo sacrifcios quele acima, no a si prprio. Essa ligao do homem
com o divino o que se denomina de religio.
Seu incio se deu provavelmente com a adorao das foras da
natureza. No Oriente prximo, como vimos, foram encontradas estatuetas de
cerca de 4.500 a.C., que possivelmente representavam o Touro, induzindo a
representao da deusa Terra sendo fertilizada pelo Touro Lua. Por volta de
3.500 a.C., com a passagem da caa para a agricultura e domesticao de
animais, o homem pde usar mais de seu tempo para pensar e contemplar a
natureza de forma racionalizada, afetando as formas e funes dos rituais.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
40/105
40
Nas vrias civilizaes, as diferentes culturas fizeram com que
aparecessem diversas manifestaes dessa mesma estrutura. No Egito que,provavelmente, foi ocupado por povos tambm oriundos do Oriente prximo,
existia a figura do Fara, o deus vivente, o centro, a sntese da esfera (do prprio
universo) na qual atuam os pares de opostos e, por isso, acompanh-lo na morte
era o mesmo que permanecer em vida. Esses soberanos eram conhecidos como
os dois senhores, um sistema baseado na crena de que o Rei, embora fsico,
tinha um corpo divino, uma pessoa com duas naturezas, tal como defendeKANTOROWICZ (1998) em seu trabalho Os dois corpos do Rei. Associado a
esse quadro, ou ainda fundamentando esse quadro, vinha a idia de que se o Rei
era um escolhido de Deus e defendia este reino, eu perteno a esse reino e,
portanto, eu perteno a Deus. Apesar de se auto proclamar um deus, no o era
verdadeiramente, e o culto ao seu eu depois da morte procurava apenas
assegurar-lhe as condies semelhantes s que tinha em vida.
As civilizaes do Vale do Indo (2.500 a 1.500a.C.) realizavam cultos
Deusa-Me at um perodo muito superior, e em nenhum outro lugar do mundo
foi to elaborado e desenvolvido. Depois veio o Perodo Vdico (1.500 a 500
a.C.), dominado por cavalheiros com gana de expanso. Por isso, os cultos que
no incio eram ao Touro e Grande Deusa (fertilidade), posteriormente passaram
ao Leo, que devorava o Touro, tal como um guerreiro. E s bem depois veio a
Ioga.
Ouve uma grande crise espiritual na ndia depois da chegada dos Indo-
europeus, momento em que o mito comum comeou a se tornar filosofia, dando
origem ao perodo dos Vedas, uma coletnea de hinos nos quais se manifesta o
conhecimento (Vedas, do snscrito ved conhecimento). A semelhana da
mitologia indiana com a grega fica clara na frase de Alexandre, O Grande, que
diz, aquele a quemchamamos de Zeus, vocs chamamde Indra. A mitologia
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
41/105
41
da ndia caminhava por um relacionamento nico com a natureza, personificado
pelo budismo, baseado no desejo e no medo. O desejo ilusrio e medo da perdaeram as duas circunstncias que faziam com que o indivduo no sentisse sua
existncia e, afastando-se disso, atingia o Nirvana. O Budismo expandiu-se para
o Oriente e na China transformou-se no confucionismo, que pregava a unio com
sua sociedade (CAMPBELL, 1997).
O medo imposto atravs dos cerimoniais e poderes aparentes de seus
encantamentos vdicos foi o meio utilizado pela casta sacerdotal da ndia paraconquistar superioridade sobre a nobreza. No incio, prevalecia a splica aos
deuses e, depois, vieram os poderes atravs da fora dos rituais. A base
mitolgica dos cultos da ndia e da Grcia era muito semelhante. As lutas de
Siva e, posteriormente, o domnio e poderio de Indra eram muito parecidos com
toda a Titanomaquia grega, na qual Zeus assumiu o controle do mundo, e
semelhana do Olimpo, os deuses indianos tinham como principal morada o
Monte Sumeru. Um dos fatores da diferena no desenvolvimento das duas
mitologias foi que enquanto as guas do Mediterrneo convidavam os gregos a
conhecerem seus horizontes, a vastido das terras e montanhas da ndia era
sempre motivo de medo e apreenso frente a chegada de uma fora infinitamente
superior a dos homens. Ento, de um lado tem-se a esfera europia, com a
progressiva segurana do homem em um mundo onde ele poderia se sentir em
casa, na qual os deuses e os mitos de herana arcaica ganharam uma forma
antropomrfica. De outro lado, a ndia, onde o aspecto de espanto, o grande
medo e poder exterior, a fora sobre-humana e a sublimidade transcendente
alcanaram tal proporo que mesmo no corao do homem a humanidade se
dissolveu e nela penetrou a inumanidade de Deus (CAMPBELL, 1994). Esse
ambiente mostrou-se ideal para o aparecimento da Yoga como prtica
transcendente, j que sua autoria atribuda a Siva (SINGH, 1990), e o
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
42/105
42
surgimento do budismo. Aqui tambm encontramos antigos jogos simblicos
para marcar particularidades das estaes.Foi justamente no Oriente prximo nuclear, particularmente na Sria,
que a civilizao bsica de Creta se originou e, para CAMPBELL (1994), por
mais original e nica que parea qualquer uma das antigas civilizaes, nenhuma
surgiu independentemente de forma espontnea. Havia um grande movimento
histrico, uma concatenao de movimentos que se irradiavam de uma mesma
fonte.Portanto, os mitos, os smbolos e os ritos exprimem, em planos
diferentes e com os meios que lhes so prprios, um sistema complexo de
afirmaes coerentes sobre a realidade ltima das coisas.
Para o homem arcaico, a realidade funo da imitao de um
arqutipo celeste. Os rituais e os gestos profanos significativos s assumem o
significado que lhes so atribudos por repetio deliberada desses atos
praticados na origem por deuses, heris ou antepassados. Estamos sempre
ligados a um lugar sagrado, muitas vezes identificado como o centro do mundo,
o qual Mircea ELIADE (1969) chamou de Simbolismo do Centro e, sendo um
Axis Mundi, a cidade ou o templo sagrado so considerados como ponto de
encontro entre o cu, a terra e o inferno. O centro se torna a zona sagrada por
excelncia, da realidade absoluta.
Qualquer ao com significado determinado participar do sagrado, e
apenas so profanas aquelas que no possuem um significado mtico. A repetio
uma reatualizao dessas aes sagradas e todos os atos importantes da vida
cotidiana foram revelados na origem por heris ou deuses. Ao repetir o sacrifcio
arquetpico, o sacrificador abandona o tempo profano e entra no imortal.
Conseqentemente, a imitao de um modelo arquetpico uma reatualizao do
momento mtico em que o arqutipo foi realizado pela primeira vez, de forma
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
43/105
43
que todos os rituais imitam um arqutipo divino cuja reatualizao contnua
decorre num s e nico instante mtico a-temporal.O Cosmos e o Homem se regeneram constantemente e por todos os
meios, o passado consumado, os males e os pecados eliminados, etc. Mltiplos
nas suas formas, todos esses instrumentos de renovao tendem para os mesmos
objetivos, isto , anular o tempo passado atravs de um retorno contnuo no
tempo, pela repetio do ato cosmognico. Tal como o mstico e o religioso, o
primitivo vivia num presente contnuo e, pela repetio, vivia continuamente emum presente a-temporal.
Ainda de acordo com ELIADE (1969), o passado no mais que a
prefigurao do futuro, nenhum acontecimento irreversvel, nenhuma
transformao definitiva. De certo modo, podemos at afirmar que no mundo
no se produz nada de novo, pois tudo consiste na repetio dos mesmos
arqutipos primordiais. Essa reatualizao, ao atualizar o momento mtico em
que o gesto arquetpico foi revelado, mantm continuamente o mundo no mesmo
instante auroral do princpio. O tempo apenas possibilita o aparecimento e a
existncia das coisas e no tem qualquer influncia decisiva sobre essa
existncia, dado que ele prprio se regenera constantemente.
Podemos falar que esse comportamento corresponde a um esforo
desesperado para no perder o contato com o ser (ELIADE, 1969).
No Ocidente ps-Aristotlico houve uma investida gradual contra as
idias mitolgicas, e com isso, o satricismo ocidental tendeu a se distanciar das
idias elementares. Conforme foi se ampliando o conhecimento, mais cresceu
essa distncia.
Para concluir, vimos que a mitologia e o ritual levam a uma
transformao do indivduo, desprendendo-o de sua condio histrica local e
conduzindo-o para algum tipo de experincia inefvel. Funciona como um tipo
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
44/105
44
de idia tnica e, por outro lado, a imagem prende o indivduo ao seu sistema
familiar de valores, atividades e crenas historicamente condicionadas.Os smbolos mitolgicos transmitem uma vivncia do inefvel atravs
do concreto, e assim, paradoxalmente, ampliam a fora e a atrao das formas
locais, ao mesmo tempo em que conduzem a mente para alm dela.
A mitologia e, portanto, a civilizao, uma imagem potica
supranormal, concebida, como toda poesia, em profundidade, mas suscetvel de
interpretaes em vrios nveis (CAMPBELL, 1992). E justamente poesiaque devemos o passado mitolgico da Grcia.
4.4 MitologiaGrega
Os cultos religiosos tiveram incio na Grcia muito antes do perodo
helnico. BRANDO (1996) afirma que os habitantes primitivos da regio
realizavam cultos nos diversos santurios sagrados em honra a certos poderes
sobre-humanos e desconhecidos. Estes lugares eram inicialmente covas e
espaos ilustres e s posteriormente foram construdos templos para consagrar
uma divindade. Nas covas, geralmente de origem vulcnica, foram depois
institudos Orculos em uma poca bem primitiva, baseados na crena de que do
interior da terra surgiam revelaes sobrenaturais. As emanaes de gs
carbnico e as fumaas que surgiam das fendas rochosas aumentavam o temor e
a venerao do visitante. Os santurios eram normalmente em stios ao ar livre e
continham um espao pblico, um altar para sacrifcios e uma esttua para o
culto. As destinaes especficas de cada santurio exigiam instalaes
particulares. Os principais cultos religiosos, em um perodo posterior, estiveram
intimamente ligados a eventos de cunho atltico, para tanto, possuam
instalaes esportivas e alojamentos para visitantes, banhos e salas de reunies.
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
45/105
45
Para entender o motivo dessa relao necessrio tomar conhecimento de como
se desenvolveu a religio grega assim como toda a sua mitologia, usando comobase o trabalho de BRANDO (1996, 1997, 1998).
No incio existia o Caos, uma massa disforme e confusa. Era a
personificao do vazio primordial, anterior a criao, quando a ordem ainda no
havia sido imposta aos elementos do mundo. Do Caos, surgiram as trs primeiras
divindades Gea, Trtaro e Eros. A primeira estava ligada a terra, era a Deusa-
Me representando a fertilidade. O segundo estava relacionado a mais profundadas entranhas da terra e o ltimo representava o amor, a fora invisvel de unio
entre os seres, garantindo a continuidade da natureza. Do Caos ainda, surgiram
rebo e Nix, representando respectivamente as trevas e a noite. De Nix, vieram
ter e Hemera, representando a luz do cu e o dia.
Gea, deusa da fertilidade, sozinha gerou Urano (cu), Montes
(montanhas) e Pontos (mar). Urano representava o cu e tambm a chuva, com
isso, fecundou Gea, e dessa unio surgiram os Tits, manifestaes elementares,
as foras selvagens e insubmissas a natureza. Destes, os mais importantes foram
Oceano (gua) e Cronos (tempo), que mais tarde mutilaria seu pai, tomando seu
lugar. Ainda dessa unio, surgiram as Titanidas (Teia - me do sol, aurora;
Temis - leis divinas; Mnemsina - memria; Ttis - fecundidade martima; e a
mais importante, Ria, me dos quatro elementos e futura esposa de Cronos), os
Cclopes, demnios das tempestades (Brontes - trovo; Estrope - relmpago, e
Arges - raio) e os Hecatoquiros. Urano, sempre que gerava um filho, no mesmo
instante procurava mergulh-lo de novo no seio da Terra (manifestaes
provenientes do cu que desapareciam sem se saber para onde foram), at que
sua esposa, a prpria Terra, irritada com isso, instigou os Tits contra ele. Nessa
desavena, Cronos mutila seu pai Urano, que deixa cair parte de seu smen sobre
a Terra, gerando os Gigantes, mortais, representantes das foras nascidas na
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/ -
7/24/2019 Esporte e Religio Na Grcia Antiga
46/105
46
natureza, que poderiam ser mortos desde que fossem com foras combinadas
entre as de um mortal com as de um imortal. A outra parte do smen de Urano seesparrama pelo mar, gerando as ninfas, personificaes femininas secundrias,
que representavam a natureza e sua fertilidade.
A segunda gerao divina deu-se, ento, com Cronos, o tempo
personificado, e Ria, antiga deusa cretense da fertilidade. Da surgiram mais
seis deuses, trs mulheres, Hstia (fogo que tudo purifica), Hera (deusa da
fecundidade) e Demter (deusa e me da terra cultivada), e mais trs homens -Hades, Poseidon e Zeus - que mais tarde disputariam o governo do mundo. Ao
destronar seu pai, Cronos foi por este advertido que o mesmo lhe sucederia. Por
este motivo, assim que Ria gerava seus filhos, Cronos os devorava (o tempo a
tudo destri desde seu nascimento). Desta forma, Ria conseguiu proteger o
ltimo dos filhos, Zeus, oferecendo ao marido, momentos depois do parto, uma
pedra no lugar do beb, que fora enviado a Creta para ser cuidado. Ao atingir a
idade adulta, o filho iniciou uma batalha contra seu pai, mas no sem antes lhe
dar uma droga que o fez vomitar todos os seus filhos devorados at ento. Essa
batalha, tal como descrita por Hesodo emA Teogonia, envolveu todos os deuses
do Olimpo e, assim que teve seu desfecho e a ordem voltou ao mundo, Zeus
passou a ter poder supremo sobre o Universo, Hades se tornou senhor das
entranhas da terra e Poseidon o senhor das guas subterrneas e martimas.
Zeus j era a suprema divindade da maioria dos povos indo-europeus
e, com isso, juntamente com suas batalhas pessoais, j vinha acompanhando as
batalhas desses povos pelas conquistas territoriais. Ele conseguiu unir em uma s
personagem os ideais de virilidade masculinos com os ideais de fertilidade,
principalmente feminino. Seus poderes estavam associados fora da
tempestade, por meio do poder do raio, ao mesmo tempo em que a gua da
Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.
http://www.pdfdesk.com/http://www.pdfdesk.com/