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30 Produção Animal | Avicultura Especial Nutrição A Segurança alimentar em números O agronegócio consiste de todo o conjunto de negó- cios que se relacionam com a agricultura e pecuária e re- presenta grande parte do Produto Interno Bruto do Brasil. Este seg- mento alocou, em 2008/09, apro- ximadamente 38% da mão-de- -obra do país e foi responsável por 42% das nossas exportações, ten- do assim uma significativa repre- sentatividade em nossa balança comercial, sendo um dos setores mais importantes da nossa econo- mia, impulsionado pela globaliza- ção dos mercados, pelo aumento das taxas demográficas mundiais e o consequente aumento da de- manda de alimentos em nível mundial. O Brasil possui uma afinidade natural para o agronegócio em função da diversidade de seu cli- ma, chuvas regulares, energia so- lar abundante e quase 13% da água doce disponível no planeta, contando ainda com uma enorme área agriculturável, na ordem de 388 milhões de hectares, dos quais 90 milhões ainda constam inex- plorados. O Brasil será o maior produtor mundial de alimentos da próxima década, o que irá causar impactos positivos diretos em nos- sa economia, reforçando a taxa de crescimento e auferindo uma maior credibilidade frente a outras economias, o que pode ser enten- dido como um ciclo sinérgico de vantagens, contribuindo para a solidificação da economia interna do país (RUAS, et al. 2008). Estas projeções são otimistas e com uma grande probabilidade de que as metas propostas sejam atin- gidas! Porém, a infraestrutura de produção de toda a cadeia deve ser revista para que não ocorram pro- blemas de fornecimento frente a esta demanda crescente por ali- mentos. Neste contexto, os países emergentes possuem um papel fundamental na projeção futura de produção de alimentos visando ao controle da segurança alimen- tar mundial. Farei neste texto três perguntas que julgo de grande relevância para abordarmos o tema seguran- ça alimentar e suas implicações no mercado produtivo de carne e de grãos brasileiro. Minha intenção aqui é apenas gerar uma discussão em torno deste tema de grande re- levância na atualidade. O primei- ro questionamento é: Por que a quantidade de alimentos produzi- dos atualmente é um problema para o Brasil e para o mundo? De acordo com a associação The World Food Summit (1996) a segurança alimentar está garanti- da quando todas as pessoas têm acesso físico, social e econômico a alimentos seguros, nutritivos e su- ficientes para satisfazer as suas ne- cessidades nutricionais e de prefe- rências alimentares, para que possam levar uma vida ativa e saudável. Para a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) a segurança alimentar, originalmente, não era atendida apenas em regiões onde Autor: Alexandre Barbosa de Brito, Gerente de Formulação e Nutrição da Poli-Nutri Alimentos Desafios, possibilidades e consequências na produção animal Entre 2001 e 2012, a população mundial cresceu menos que a produção de grãos, mas os estoques de alimentos caíram 14,58%. Isso ocorre devido a um novo fenômeno: o mundo está consumindo mais alimentos e de melhor qualidade Informe Técnico-Empresarial

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Page 1: Especial Nutrição Informe Técnico-Empresarial A Segurança ...revista para que não ocorram pro-blemas de fornecimento frente a esta demanda crescente por ali-mentos. Neste contexto,

30 Produção Animal | Avicultura

Especial Nutrição

A Segurança alimentar em números

O agronegócio consiste de todo o conjunto de negó-cios que se relacionam

com a agricultura e pecuária e re-presenta grande parte do Produto Interno Bruto do Brasil. Este seg-mento alocou, em 2008/09, apro-ximadamente 38% da mão-de--obra do país e foi responsável por 42% das nossas exportações, ten-do assim uma signifi cativa repre-sentatividade em nossa balança comercial, sendo um dos setores mais importantes da nossa econo-mia, impulsionado pela globaliza-ção dos mercados, pelo aumento das taxas demográfi cas mundiais e o consequente aumento da de-manda de alimentos em nível mundial.

O Brasil possui uma afi nidade natural para o agronegócio em função da diversidade de seu cli-ma, chuvas regulares, energia so-lar abundante e quase 13% da água doce disponível no planeta, contando ainda com uma enorme área agriculturável, na ordem de 388 milhões de hectares, dos quais 90 milhões ainda constam inex-plorados. O Brasil será o maior produtor mundial de alimentos da próxima década, o que irá causar impactos positivos diretos em nos-sa economia, reforçando a taxa de crescimento e auferindo uma maior credibilidade frente a outras economias, o que pode ser enten-dido como um ciclo sinérgico de vantagens, contribuindo para a solidifi cação da economia interna do país (RUAS, et al. 2008).

Estas projeções são otimistas e com uma grande probabilidade de que as metas propostas sejam atin-gidas! Porém, a infraestrutura de produção de toda a cadeia deve ser revista para que não ocorram pro-blemas de fornecimento frente a esta demanda crescente por ali-mentos. Neste contexto, os países emergentes possuem um papel fundamental na projeção futura de produção de alimentos visando ao controle da segurança alimen-tar mundial.

Farei neste texto três perguntas que julgo de grande relevância para abordarmos o tema seguran-ça alimentar e suas implicações no mercado produtivo de carne e de grãos brasileiro. Minha intenção aqui é apenas gerar uma discussão em torno deste tema de grande re-levância na atualidade. O primei-ro questionamento é: Por que a quantidade de alimentos produzi-dos atualmente é um problema para o Brasil e para o mundo?

De acordo com a associação The World Food Summit (1996) a segurança alimentar está garanti-da quando todas as pessoas têm acesso físico, social e econômico a alimentos seguros, nutritivos e su-fi cientes para satisfazer as suas ne-cessidades nutricionais e de prefe-rências alimentares, para que possam levar uma vida ativa e saudável. Para a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) a segurança alimentar, originalmente, não era atendida apenas em regiões onde

Autor: Alexandre Barbosa de Brito, Gerente de Formulação e Nutrição da Poli-Nutri Alimentos

Desafi os, possibilidades e consequências na produção animal

Entre 2001 e 2012, a população mundial cresceu menos que a produção de grãos, mas os estoques de alimentos caíram 14,58%. Isso ocorre devido a um novo fenômeno: o mundo está consumindo mais alimentos e de melhor qualidade

Informe Técnico-Empresarial

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se observavam problemas climáti-cos e atraso tecnológico que oca-sionavam difi culdade na produção em massa de alimentos.

Com o gigantismo populacio-nal vivido entre 1950 e 1990 (perí-odo onde a população mundial registrou um aumento de 109%), outro motivo começou a fi gurar com grande relevância para a sus-tentação da segurança alimentar. O problema agora não é apenas de desenvolvimento em áreas sub--aproveitadas, na verdade isso se transformou em uma necessidade. O desafi o contemporâneo está na dependência de uma produção cada vez maior de alimentos para garantir as necessidades nutricio-

nais desta população crescente.A ONU publicou um trabalho

em 2010 relacionando às perspec-tivas de crescimento populacional até 2100. Neste estudo foram ava-liadas três formas de abordagem: conservadora, ponderada e pessi-mista. Na projeção conservadora, estima-se que a população mun-dial começará a cair já em 2060, onde chegaremos em nossa capa-cidade máxima, por volta de 7,9 bilhões de habitantes. Na opção pessimista, a involução populacio-nal está estimada apenas para o ano 2300, sendo que em 2060 po-deremos chegar a 11,5 bilhões de pessoas no planeta. Na opção pon-derada (Gráfi co 1), projeção que

julgo mais realista, a população mundial só reduzirá após 2150, sendo que em 2060 seremos mais de 9,6 bilhões de pessoas.

Avaliando estes dados fi ca cla-ro que vivemos em um mundo de gente, que cada vez mais exigirá nossos recursos básicos para satis-fazer suas necessidades dietéticas.

Um ponto positivo neste cená-rio é que, como dito anteriormen-te, já estamos vivendo uma época de desaceleração no crescimento mundial. Para se ter uma idéia, a população mundial cresceu 10,9% entre 1965 e 1970, o quinquênio de maior crescimento mundial histórico. Já no último quinquê-nio (2005 a 2010) esta taxa caiu para 5,8%. Porém, de acordo com a projeção ponderada, estas taxas só vão se estabilizar entre 2060 e 2150, como descrito acima. Isso nos leva à segunda pergunta: Nos-so planeta suportará tal demanda?

No Gráfi co 2 pode-se observar a evolução de 2001 a 2012 da pro-dução de grãos e da população mundial. Acredito que esta com-paração seja bastante válida, pois os cereais são fontes básicas de nutrientes para os humanos, seja por consumo direto, biotransfor-mado em produtos industrializa-dos ou via carne, já que o cresci-mento animal é, em sua maioria, impulsionado pelo consumo de cereais.

Apesar de a população neste período ter crescido menos que a produção de grãos (crescimento de 12% para população e 21% para os grãos), os estoques reduzi-ram em 14,58% (Gráfi co 2). Isso ocorre devido a um novo fenôme-no mundial: a população global está consumindo mais alimentos e de melhor qualidade. Esta deman-

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da fica evidente quando compara-mos o consumo per capita de grãos, que neste período aumen-tou em 7,73% (Gráfico 3).

Ainda que os produtores te-nham obtido sucesso na já tecnifi-cada produção agrícola mundial, estamos caminhando para um ce-nário pessimista, onde figurará uma situação incômoda de não contarmos com estoques alimentí-cios para uso em eventuais dificul-dades climáticas ou para a tendên-cia de uso crescente da indústria de biocombustíveis.

De acordo com a FAO (2011) a última previsão para a produção mundial de cereais para a safra 2011/2012 (feita em Junho de 2011) é de cerca de 2.313 milhões de toneladas (3,3% superior ao do ano passado). Porém, a utilização

de cereais no mesmo período de-verá crescer 1,4%, chegando ao fi-nal de 2011 a 2.307 milhões de toneladas.

Temos aí um excedente de ape-

nas cinco milhões de toneladas entre a produção e o consumo, o que reforçaria os estoques globais em apenas 0,22%. Avaliando este montante, enquanto os estoques de trigo e arroz deverão assumir uma quantidade confortável, os estoques de outros grãos, especial-mente o milho, ficariam bastante desfavorecidos, o que dá margem a inferirmos uma dependência mundial quase que total para a quantidade produzida nas próxi-mas safras.

Isto ajuda a explicar a elevação mundial no custo alimentar, seja para ingredientes destinados à ali-mentação animal ou humana. O índice da FAO de preços dos ali-mentos, Food Price Index (FPI), é uma medida da variação mensal dos preços internacionais de uma cesta de produtos alimentares. É composto por índices de preços médios desde 1990 de cinco gru-pos de commodities (representan-do 55 cotações globais).

Nos Gráficos 4 e 5 é possível observar que a alta no FPI está di-retamente relacionada com a ele-vação do açúcar no mercado glo-bal. Porém, não podemos desprezar as outras commodities, por exemplo, o preço dos cereais, fontes oleaginosas e do complexo

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carne, que é o mais alto desta série histórica da FAO, iniciada em 1990. Os preços dos primeiros cin-co meses de 2011 superam em 17% aos observados no mesmo período de 2008 (Gráfico 06), épo-ca também de inflação do merca-do alimentício devido à crise fi-nanceira americana do mercado de hipotecas. Houve uma deflação

apenas para o preço do leite. Ou seja, vivemos uma época

de preços onde quase todas as commodities estão atingindo o patamar máximo histórico, e sem sinais de recuo. De acordo com a Embrapa/CNPMS (2011), os pre-ços dos alimentos devem continu-ar elevados e voláteis em 2012, exercendo uma pressão cada vez

maior sobre os países importado-res.

Mas os países produtores tam-bém estão sendo afetados. Para o Brasil, por exemplo, o preço do milho elevou em 25,2%, compa-rando a safra 2009/2010 com a 2010/2011. Isso nos leva à última pergunta: Como os produtores de aves e suínos do Brasil podem se beneficiar, de forma sustentável, desta situação?

Entendo que a sustentabilida-de de uma empresa refere-se a uma característica ou condição de um processo que permita a sua permanência em um nível confor-tável quando ao emprego de seus recursos e o retorno financeiro da atividade.

Este é o grande desafio atual, o de produzir carne em um cenário onde o custo das matérias-primas tradicionais tem ajudado a reduzir a competitividade de nossos pro-dutos no cenário internacional e deixando-os mais caros no merca-do nacional.

BIBLIOGRAFIAEMPRAPA/CNPMS. Mercado do milho

e da soja. [http://www.cnpms.embrapa.br/noticias/noticias.php], 2011.

FAO. Food and Agriculture Organiza-tion. [http://www.fao.org/news/story/en/item/81577/icode], 2011.

FAOSTAT. Food Statistics of Food and Agriculture Organization. [http://www.fao.org/corp/statistics/en], 2011.

ONU. Population Division of the Department of Economic and Social Affairs of the United Nations Secretariat. World Population Prospects: The 2010 Revision, http://esa.un.org/unpd/wpp/index.htm. 2011.

RUAS, D.T.; ANTUNES, A.; MORO, M., et al. A economia e o agronegócio no Brasil e Sul do Brasil. Observatorio de la Economía Latinoamericana, Número 105, 2008.

WFS. World Food Summit, [http://www.fao.org/worldfoodsummit/english/index.html]. FAO, 1996.

ZANNI, A. Tendências do mercado de grãos. [http://www.agrolink.com.br/culturas/milho/noticia/tendencias-do--mercado-de-graos_122186.html], 2011.

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