escola conservadora as desigualdades frente à...
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EscolaconservadoraAsdesigualdadesfrenteàescolaeàcultura
PierreBourdieu
Problemacomoqualoautorlidanoar9go:
Ideologiada“escolalibertadora”
Toma-seosistemaescolarcomoumfatordemobilidadesocial
quandotudotendeamostrarqueeleéumdosfatoresmaiseficazesdeconservaçãosocial.
Forneceaaparênciadelegi9midadeàsdesigualdadessociaisE
Sancionaaherançaculturaleodomsocialtratadocomodomnatural(ideologiadodom)
Osmecanismosdeeliminaçãoagemdurantetodaatrajetóriaescolar
Assim,vê-senasoportunidadesdeacessoaoensinosuperiororesultadodeumaseleçãodiretaouindiretaque,aolongodaescolaridade,pesacomrigordesigualsobreos
sujeitosdasdiferentescamadassociais.
Masnãoésuficiente,dizoautor,enunciarofatodadesigualdadediantedaescola.
Énecessáriodescreverosmecanismosobje9vosquedeterminamaeliminaçãoconTnuadascriançasdesfavorecidas.
Aexplicaçãosociológicapodeesclarecerasdiferençasdeêxitoqueseatribuem,comfrequência,àsdiferençasdedom.
Cadafamíliatransmiteaseusfilhos,maisporviasindiretasdoquediretas,umcertocapitalculturaleumcertoethos*,
sistemadevaloresimplícitoseprofundamenteinteriorizados,quecontribuiparadefinir,entreoutrascoisas,asa9tudes
faceaocapitalculturaleàins9tuiçãoescolar.
*Ethos = conjunto de hábitos e ações que visam o bem comum de determinada comunidade ou grupo ou classe social.
Aherançacultural,quediferesobdoisaspectos,segundoasclassessociais,éaresponsávelpeladiferençainicialdas
criançasdiantedaexperiênciaescolare,consequentemente,pelastaxasdeêxito.
Atransmissãodocapitalcultural
Influênciadocapitalcultural=éapreendidasobaformadarelaçãoentreonívelculturalglobaldafamíliaeoêxito
escolardacriança.
Aaçãodomeiofamiliarsobreoêxitoescolaréquaseexclusivamentecultural.
Maisdoquediplomasob9dospelopai,maismesmodoqueo9podeescolaridadequeeleseguiu,éonívelcultural
globaldogrupofamiliarquemantémarelaçãomaisestreitacomoêxitoescolardacriança.
UFOP/ICHS/DEEDUFundamentosdaEducação
Profa.GlíciaGripp
Aindaqueoêxitoescolarpareçaligadoigualmenteaonívelculturaldopaioudamãe,percebem-sevariações
significa9vasnoêxitodacriançaquandosãodeníveldesigual.
Umaavaliaçãoprecisadasvantagensedasdesvantagenstransmi9daspelomeiofamiliar
deverialevaremcontanãosomenteonívelculturaldopaioudamãe,
mastambémodosascendentesdeumeoutroramodafamília(etambém,semdúvida,odoconjuntodosmembros
dafamíliaextensa).
Exemplodoautor:O conhecimento que os estudantes de letras têm do teatro (medidopelo número de peças de teatro vistas) se hierarquiza perfeitamentesegundoacategoriasocioprofissionaldopaiedoavôsejamaiselevada,ou àmedida emque a categoria socioprofissional do pai e do avô seelevamconjuntamente;
Categoriasocioprofissionaldopaiedoavô
Conhecimentodoteatro
0
Emvirtudedalen9dãodoprocessodeaculturação,diferençassu9sligadasàsan9güidadesdeacessoàculturacon9nuama
separarindivíduosaparentementeiguaisquantoaoêxitosocialemesmoaoêxitoescolar.
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Profa.GlíciaGripp
Aresidêncianacapitalounointerior(elafortementeligadaàcategoriaprofissionaldopai)estátambémassociadaavantagens
edesvantagensculturais
cujoefeitosenotaemtodosossetores,quersetratederesultadosescolaresanteriores,deprá9casedeconhecimentosculturais(emmatériadeteatro,música,jazzoucinema)ouainda
dafacilidadelingüís9ca,
vê-sequeaconsideraçãodeumconjuntorela9vamenterestritodevariáveis–asaber,onívelculturaldosantepassadosda
primeiraedasegundageraçãoearesidência–permiteexplicarasvariaçõesmaisimportantesdoêxitoescolar,mesmoemum
nívelelevadodosistemaescolar.
Nívelculturaldosantepassadosda
primeiraesegundageração
Localderesidência
Variaçõesnoêxitoescolar
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Profa.GlíciaGripp
Umaanálisemul9variada,levandoemcontanãosomenteonívelculturaldopaiedamãe,dosavóspaternosematernosearesidêncianomomentodosestudossuperioresedurantea
adolescência,
mastambémumconjuntodecaracterís9casdopassadoescolar,como,porexemplo,oramodocursosecundárioeo9podeestabelecimento(escolapúblicaouprivada,leigaou
confessional),êxitoob9dopelosdiferentessubgruposdefinidospelacombinaçãodessescritérios;eissosemapelar,
absolutamente,paraasdesigualdadesinatas.
Ummodeloqueleveemcontaessasdiferentesvariáveis–etambémascaracterís9casdemográficasdogrupofamiliar,comootamanhodafamília–permi9riafazerumcálculo
muitoprecisodasexpecta9vasdevidaescolar.
Cálculodasesperançasdevidaescolar
Nívelculturaldopaiedamãe
Nívelculturaldosavóspaternose
maternos
Localderesidêncianomomentodos
estudossuperioresedurantea
adolescência
ConjuntodecaracterísPcasdo
passado:RamodocursosecundárioTipode
estabelecimentoÊxitoobPdopelos
subgruposaparPrdacombinaçãodesses
critériosDesigualdadesinatas(gênero,raça,etc.)
tamanhodafamília
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Profa.GlíciaGripp
Damesmaformaqueosjovensdascamadassuperioressedis9nguempordiferençasquepodemestarligadasa
diferençasnacondiçãosocial,
tambémosfilhosdasclassespopularesquechegamatéoensinosuperiorparecempertencerafamíliasquediferemdamédiadesuacategoria,tantoporseunívelculturalquanto
porseutamanho.
Apresençanocírculofamiliardepelomenosumparentequetenhafeitoouestejafazendocursosuperior
testemunhaqueessasfamíliasapresentamumasituaçãoculturaloriginal.
Masoníveldeinstruçãodosmembrosdafamíliarestritaouextensaouaindaaresidênciasãoapenasindicadoresquepermitemsituaronívelculturaldecadafamília,semnadainformarsobreoconteúdodaherançaqueasfamíliasmais
cultastransmitemaseusfilhos,nemsobreasviasdetransmissão.
Aspesquisassobreosestudantesdafaculdadedeletrastendemamostrarqueapartedocapitalculturalqueéamaisdiretamenterentávelnavidaescolarécons9tuídapelas,pelainformaçõessobreomundouniversitárioesobreocursus,a
facilidadeverbalepelaculturalivreadquiridanasexperiênciasextraescolares.
Capitalculturalrentávelnavidaescolar
Informaçõessobreomundoescolar
emgeral
Informaçõessobreatrajetóriaescolar
Facilidadeverbal
Culturalivreadquiridanas
experiênciasextra-escolares
Asdesigualdadesdeinformaçõessãoevidenteseconhecidas.
Oliceu(eafaculdade)nãofazpartedouniversoconcretodasfamíliaspopulareseénecessáriaumasériecon]nuade
sucessosexcepcionaiseconselhosdeprofessooudealgummembrodafamíliapraquesecogitedeenviarparaláoseu
filho.
Aocontrário,étodoumcapitaldeinformaçõessobreocursus,sobreosignificadodasgrandesescolhasquedevemserfeitasaolongodatrajetóriaescolar(localdaeducaçãobásica,doensinomédio,etc.),sobreascarreirasfuturasesobreasorientaçõesquenormalmenteconduzemaelas,sobreofuncionamentodosistemauniversitário,sobreasignificaçãodosresultados,assançõeseasrecompensas,queascriançasdasclassescultas
investememsuascondutasescolares.
Nãoéporluxoqueasfamíliascultasinvestemdesdecedonaformação(enãoapenasnaeducaçãoformal)deseusfilhos,colocando-osemcursosdelínguasdesdecedo,emcursosdemúsica,etc.Enãoéapenascolocaremumaescolinhade
músicaqualquer,porexemplo,maséguiaressaformaçãoparaescolasdequalidade.
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Profa.GlíciaGripp
Ascriançasoriundasdosmeiosmaisfavorecidosherdamtambémsaberes(eum“savoir-faire”),gostoseum“bom
gosto”,cujarentabilidadeescolarétantomaiorquantomaisfreqüentementeessesimponderáveisdaaPtudesãoatribuídos
aodom.
Acultura“livre”,condiçãoimplícitadoêxitoemcertascarreirasescolares,émuitodesigualmentedistribuídaentreos
estudantesuniversitáriosorigináriosdasdiferentesclassessociais.
Porexemplo,éapossedessaculturalivrequemuitasvezesdemarca,dentrodeumacarreirauniversitáriaaquelesquesedirigemàpesquisa–e,claro,sedirigirãoàprofissãoacadêmica–eaquelesquesedirigemaramosmenos
pres9giadosdamesmacarreira.
Oprivilégioculturaltorna-sepatentequandosetratadafamiliaridadecomobrasdearte,aqualsópodeadvirda
freqüênciaregularaoteatro,aomuseu,aconcertos(quenãoéorganizadapelaescola).
Emtodososdomíniosdacultura,teatro,música,pintura,jazz,cinema,osconhecimentosdosestudantessãotãomaisricose
extensosquantomaiselevadaésuaorigemsocial.
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Profa.GlíciaGripp
O êxito nos estudos literários está muito estreitamente relacionado à aptidão para o manejo da língua escolar, que só é uma língua materna para as crianças oriundas
das classes cultas.
De todos os obstáculos, aqueles relacionados com a língua falada no meio familiar são, sem dúvida, os mais
graves e os insidiosos,
sobretudo nos primeiros anos de escolaridade, quando a compreensão e o manejo da língua constituem o
ponto de atenção principal na avaliação dos mestres.
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Profa.GlíciaGripp
Mas a influência do meio lingüístico de origem jamais deixa de se exercer,
de um lado porque a riqueza, a fineza e o estilo de expressão sempre serão considerados, implícita ou explicitamente, consciente ou inconscientemente,
em todos os níveis do percurso escolar,
e, ainda que em graus diversos, em todas as carreiras universitárias, até mesmo nas científicas.
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Profa.GlíciaGripp
De outro lado, porque a língua não é um simples instrumento, mais ou menos eficaz, mais ou menos
adequado, do pensamento,
mas fornece – além de um vocabulário mais ou menos rico – uma sintaxe,
isto é, um sistema de categorias mais ou menos complexas,
de maneira que a aptidão para o deciframento e a manipulação de estruturas complexas, quer lógicas, quer
estéticas, parece função direta da complexidade da estrutura da língua inicialmente falada no meio familiar,
que lega sempre uma parte de suas características à língua falada na escola.
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A parte mais importante e mais ativa (escolarmente) da herança cultural, quer se trate de cultura livre ou da
língua,
transmite-se de maneira osmótica, mesmo na falta de qualquer esforço metódico e de qualquer ação
manifesta.
O que contribui para reforçar, nos membros da classe culta, a convicção de que eles só devem aos seus dons esses conhecimentos, essas aptidões e essas atitudes,
que, deste modo, não lhes parecem resultar de uma aprendizagem.
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Profa.GlíciaGripp
A escolha do destino
As atitudes dos membros das diferentes classes sociais, pais ou crianças e, muito particularmente, as atitudes a
respeito da escola, da cultura escolar e do futuro oferecido pelos estudos são, em grande parte, a expressão do
sistema de valores implícitos e explícitos que eles devem à sua posição social.
Na maior parte dos casos, as famílias têm aspirações estritamente limitadas pelas oportunidades objetivas.
As aspirações e as exigências são definidas, em sua forma e conteúdo, pelas condições objetivas, que excluem a possibilidade de desejar o impossível.
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Profa.GlíciaGripp
As mesmas condições objetivas que definem as atitudes dos pais e dominam as escolhas importantes da carreira
escolar regem também a atitude das crianças diante dessas mesmas escolhas e, conseqüentemente, toda a
sua atitude com relação à escola.
O desejo razoável de ascensão através da escola não pode existir enquanto as chances objetivas de êxito
forem ínfimas.
Assim, compreende-se que a pequena burguesia, classe de transição, adere mais fortemente aos valores
escolares, pois a escola lhe oferece chances razoáveis de satisfazer suas expectativas.
Diferentemente das crianças oriundas das classes populares, que são duplamente prejudicadas no que
respeita à facilidade de assimilação da cultura e a propensão de adquiri-la
as crianças das classes médias devem à sua família não só o encorajamento e exortações ao esforço escolar,
mas também um ethos de ascensão social e de aspiração ao êxito na escola e pela escola, que lhes
permite compensar a privação cultural com a aspiração fervorosa à aquisição da cultura.
A estrutura das oportunidades objetivas de ascensão social
e, mais precisamente, de ascensão pela escola,
condicionam as atitudes frente à escola
– atitudes que contribuem para definir as oportunidades de
se chegar à escola, de aderir a seus valores ou a suas
normas e de nela ter êxito; de realizar, portanto, a ascensão
social –
e isso por intermédio de esperanças subjetivas, que são as
oportunidades objetivas intuitivamente aprendidas e
progressivamente interiorizadas.
EstruturadeoportunidadesobjePvasde
ascensãosocial
EsperançassubjePvas=
oportunidadesobjePvas
interiorizadas
APtudesfrenteàescola
AdesãoavaloresenormasÊxito
Exemplos: o pai, torneiro mecânico, envia seu filho para o Senai para aprender seu ofício ou o pai, motorista de táxi, coloca seu filho bem cedo
para dividir o tempo dirigindo o táxi. Em um curso de letras, um aluno pode escolher português ou inglês, em vez de estudos clássicos...
Lógica do processo de interiorização
Ao final do qual as oportunidades objetivas se tornam esperanças ou desesperanças subjetivas
Dimensão fundamental do ethos de classe, que é a atitude em relação ao futuro
E é a interiorização do futuro objetivo que se impõe progressivamente a todos os membros de uma classe, através das
experiências de sucesso e fracasso.
O nível de aspiração de um indivíduo se determina, em grande parte, em referência às probabilidades – intuitivamente estimadas
através dos sucessos e fracassos anteriores – de atingir o alvo visado.
Aquele que vence, situa o seu próximo um pouco (mas não muito) acima de seu último êxito. Aquele que fracassa, por outro lado, pode
ter duas reações diferentes: ele pode situar seu alvo muito baixo, frequentemente aquém de seu êxito passado, ou então ele situa seu
alvo acima de suas possibilidades.
Os ideais e os alvos dos indivíduos dependem do grupo ao qual ele pertence e dos fins e expectativas desse grupo.
Vê-se que a influência do grupo de pares – sempre relativamente homogêneo quanto à origem social – vem redobrar, entre os
desfavorecidos, a influência do meio familiar e do contexto social, que tendem a desencorajar ambições percebidas como desmedidas e
sempre mais ou menos suspeitas de renegar as origens.
Assim, tudo concorre para conclamar aqueles que “não têm futuro” a terem esperanças “razoáveis” ou “realistas”, ou seja, a renunciarem às
esperanças.
O capital cultural e o ethos, ao se combinarem, concorrem para definir as condutas escolares e as atitudes diante da escola, que constituem o
princípio de eliminação diferencial das crianças das diferentes classes sociais.
Capitalcultural
Ethos
DefinemascondutasescolareseasaPtudesdiantedaescola=
princípiodeeliminaçãodiferencialdascriançasdasdiferentesclassessociais
Ethos = é uma espécie de síntese dos costumes de um povo. O termo indica quais os traços característicos de um grupo humano qualquer que o diferenciam de outros grupos sob os pontos de vista social e cultural. Portanto, trata-se da identidade social de um grupo. Ethos significa o modo de ser, o caráter. Isso indica o comportamento do ser humano e originou a palavra ética.
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Profa.GlíciaGripp
Os obstáculos são cumulativos: as crianças das classes populares e médias que obtêm globalmente uma taxa de êxito mais fraca,
precisam ter êxito mais forte para que suas famílias e seus professores pensem em fazê-las prosseguir em seus estudos.
Parece que o determinante principal do prosseguimento nos estudos, mais do que o capital cultural legado pela família, é a atitude da família a respeito da escola, ela mesma função das esperanças objetivas de êxito escolar encontradas em cada
categoria social.
Funcionamento da escola e sua função de conservação social
Qual a responsabilidade da escola?
Tratando todos os educandos, por mais desiguais que sejam eles de fato, como iguais em direitos e deveres, o sistema escolar é
levado a dar sua sanção às desigualdades iniciais diante da cultura.
A igualdade formal que pauta a prática pedagógica serve como máscara e justificação para a indiferença no que diz respeito às
desigualdades reais diante do ensino e da cultura transmitida, ou melhor, exigida.
A tradição pedagógica só se dirige, por trás das idéias inquestionáveis de igualdade e de universalidade, só se dirige aos
educandos que estão no caso particular de deter uma herança cultural, de acordo com as exigências culturais da escola.
Não só ela exclui as interrogações sobre os meios mais eficazes de transmitir a todos os conhecimentos e as habilidades que a escola
exige de todos e que as diferentes classes sociais só transmitem de forma desigual,
mas ela tende ainda a desvalorizar como “primárias” (com o duplo
sentido de primitivas e vulgares) e, paradoxalmente, como “escolares”, as ações pedagógicas voltadas para tais fins.
A desvalorização e o desprezo das técnicas não é senão o reverso da exaltação da proeza intelectual, a qual tem afinidade estrutural
com os valores dos grupos privilegiados do ponto de vista cultural.
Exemplo: o caso das licenciaturas
Os detentores estatutários das “boas maneiras” estão sempre inclinados a desvalorizar como laboriosas e laboriosamente
adquiridas as qualidades que não valem senão sob a aparência de inato.
Produtos de um sistema voltado para a transmissão de uma cultura aristocrática em seu conteúdo e espírito, os educadores inclinam-se a desposar os seus valores, com mais ardor ainda
porque lhe devem o sucesso universitário e social.
Além do mais, como não integrariam, mesmo e sobretudo sem que disso tenham consciência, os valores de seu meio de origem ou de
pertencimento às suas maneiras de julgar e ensinar?
Assim, no ensino superior os estudantes originários das classes populares e médias serão julgados segundo a escala de valores das classes privilegiadas, que numerosos educadores
devem à sua origem social e que assumem de bom grado, sobretudo se seu pertencimento à elite datar de sua ascensão
ao magistério.
Dá-se uma inversão de valores a partir da qual o ethos pequeno burguês é julgado segundo o ponto de vista do ethos
da elite, ou seja, aferido pelo diletantismo do homem culto e bem nascido.
Por outro lado, o diletantismo que os estudantes das classes favorecidas exprimem em várias condutas e o próprio estilo de suas relações com uma cultura que eles não devem jamais totalmente à escola, respondem às expectativas, freqüentemente inconscientes, dos mestres e, mais ainda, às exigências objetivamente inscritas na
instituição.
Qualquer indício de pertencimento social, a postura corporal, a indumentária, o estilo de expressão ou o sotaque, é objeto de
“pequenas percepções” de classe e contribui para orientar – mais freqüentemente de maneira inconsciente – o julgamento dos
mestres.