epistemologia do direito ambiental: uma abordagem ... · 2.3 valoração normativa a partir do...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA INSTITUTO DE GEOGRAFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA ÁREA DE CONCENTRAÇÃO ANÁLISE, PLANEJAMENTO E GESTÃO DOS ESPAÇOS URBANOS E RURAIS. EPISTEMOLOGIA DO DIREITO AMBIENTAL: Uma abordagem interdisciplinar da geografia e do direito normativo aplicado. TONY GERALDO CARNEIRO UBERLÂNDIA/MG 2008 1

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLNDIA

    INSTITUTO DE GEOGRAFIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA

    REA DE CONCENTRAO ANLISE, PLANEJAMENTO E GESTO DOS

    ESPAOS URBANOS E RURAIS.

    EPISTEMOLOGIA DO DIREITO AMBIENTAL: Uma

    abordagem interdisciplinar da geografia e do direito normativo

    aplicado.

    TONY GERALDO CARNEIROUBERLNDIA/MG

    2008

    1

  • TONY GERALDO CARNEIRO

    EPISTEMOLOGIA DO DIREITO AMBIENTAL: Uma

    abordagem interdisciplinar da geografia e do direito normativo

    aplicado.

    Dissertao de Mestrado apresentada ao programa

    de PsGraduao em Geografia da Universidade

    Federal de Uberlndia como requisito parcial

    obteno do ttulo de mestre em Geografia.

    rea de concentrao: anlise, planejamento e

    gesto dos espaos urbanos e rurais

    Orientadora: Prof. Dra. Marlene Teresinha de

    Muno Colesanti

    Uberlndia/MG

    INSTITUTO DE GEOGRAFIA

    2008

    2

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    C289e Carneiro, Tony Geraldo, 1974- Epistemologia do direito ambiental: uma abordagem interdiscipli-nar da geografia e do direito normativo aplicado / Tony Geraldo Car-neiro. - 2008. 115 f. : il.

    Orientadora: Marlene Teresinha de Muno Colesanti. Dissertao (mestrado) Universidade Federal de Uberlndia, Programa de Ps-Graduao em Geografia. Inclui bibliografia.

    1. 1. Direito ambiental - Teses. 2. Epistemologia - Teses. I. Colesanti, Marlene Teresinha de Muno. II. Universidade Federal de Uberlndia. Programa de Ps-Graduao em Geografia. III. Ttulo. CDU: 349.6

    Elaborado pelo Sistema de Bibliotecas da UFU / Setor de Catalogao e Classificao

    3

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLNDIA

    Tony Geraldo Carneiro

    EPISTEMOLOGIA DO DIREITO AMBIENTAL: Uma abordagem interdisciplinar

    da geografia e do direito normativo aplicado.

    ____________________________________________________________.

    Professora Dra. Marlene Teresinha Muno Colesanti. (Orientadora)

    ___________________________________________________________.

    Professor Dr. Ezalmone Moreira dos Santos.

    _________________________________________________________.

    Professor Dr. Aguinaldo Alemar.

    Data:____/_________de ______

    Resultado:_________________

    4

  • AGRADECIMENTOS

    "Voc simplesmente no ser a mesma pessoa daqui a dois meses depois de

    conscientemente dar graas todos os dias pela abundncia que existe em sua vida.

    E voc ter colocado em ao uma antiga lei espiritual: quanto mais voc tem e

    agradecido, mais ser dado a voc."

    -Sarah Ban Breathnach

    Externo meus agradecimentos, revestidos de sinceridade e afetividade as quais no podem

    ser mensuradas em palavras e sim mediante o sentimento em demasia alocado no ntimo de

    meu corao. Agradeo primeiramente a Deus que permitiu a realizao deste trabalho, e a

    todas as pessoas que se fizeram presentes, que se preocuparam, que foram solidrias, que

    torceram por mim. Mas bem sei que agradecer sempre difcil. Posso cometer mais

    injustias esquecendo pessoas que me ajudaram do que fazer jus a todas que merecem.

    Apesar de dever muito a todas as pessoas mencionadas aqui, intelectual e emocionalmente,

    as idias contidas nesta dissertao so fruto do trabalho intenso, trabalhados paulatinamente

    ao transpor desta etapa acadmica.

    De qualquer forma, todos os que realizam um trabalho de pesquisa sabem que no o fazem

    sozinhos, embora seja solitrio o ato da leitura e o do escrever. O resultado de nossos

    estudos foi possvel apenas pela cooperao e pelo esforo de outros antes de ns.

    Pesquisadores de vulto histrico, j escreveram sobre o fardo que impomos aos ombros de

    gigantes que nos precederam. Isto me leva a questionar-me: quanto de mim sou eu, e quanto

    dos outros com quem convivi e com quem convivo? A pergunta cabe porque sinto que este

    trabalho no s meu. Pelos autores que li, pelos professores com quem tive aulas na

    graduao e ps-graduao, pelos colegas de mestrado que me fizeram aprender com as

    discusses e conversas e pelos comentrios e sugestes feitos aos meus primeiros rabiscos

    da dissertao.

    Agradeo de forma especial a minha orientadora, Dra. Marlene T. M. Colesanti, antes de

    mais nada pela pacincia que teve comigo, pelas aulas, ensinamentos, sugestes, conselhos,

    5

    http://ociocriativo.com.br/frases/pesquisa.cgi?cmd=psq&chk=1&opc=txt&chk_aut=1&key=Sarah Ban Breathnachjavascript:AbreJanela('pesquisa.cgi?cmd=txt&ref=1132834407');javascript:AbreJanela('pesquisa.cgi?cmd=txt&ref=1132834407');javascript:AbreJanela('pesquisa.cgi?cmd=txt&ref=1132834407');

  • dicas, horas de leitura gastas em meu trabalho e pela participao em minhas bancas de

    qualificao e defesa. Marlene, muito obrigado!

    Agradeo aos Professores Dr. Joo Clps e Dr. Manfred Fer, meus primeiros professores no

    mestrado, ainda como aluno especial, que compartilharam o saber com maestria.

    Professora Dra. Vnia Vlach, de forma singular Dra. Neiva F. Oliveira, que agraciada

    por Deus em intelectualidade e determinao, que auxiliou na base do trabalho, sempre me

    incentivando com suas palavras gentis e sabias.

    Aos professores Dr. Aguinaldo Alemar, Dr. Samuel C. Lima e Dr. Ezalmone M. Santos,

    participantes em minhas bancas de qualificao e defesa, contribuindo ricamente com

    sugestes e conselhos.

    Aos familiares, obrigado por vocs existirem e por depositarem em mim a credibilidade da

    vitria e realizao em todos os momentos. Pais e avs, obrigado pelos valores e exemplos

    sempre pautados na honestidade no trabalho e na famlia, que me proporcionou a base para

    alar grandes vos. Dificuldades todos ns temos, mas vocs foram testemunhas da

    trajetria inclusive das tribulaes, vivenciadas para chegar at aqui, tais dificuldades

    contriburam de forma inegvel para me fazer forte e muito me ensinou. Aos filhos, irmos,

    tios (as), cunhadas (os), sobrinhos, sogro, sogra e amigos, um abrao em cada um de vocs.

    Agradeo a minha esposa Priscila, que por vezes deve ter detestado a mim e a este trabalho,

    pois ele sacrificou muitos momentos que poderamos ter desfrutado juntos, mas sempre

    incentivou, sempre apoiou e, o melhor de tudo, sempre me cobrou para que eu continuasse e

    conclusse mais esta etapa de nossas vidas que vamos construindo juntos. TE AMO.

    6

  • Lista de Siglas

    CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente

    CF Constituio Federal

    EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria

    EIA Estudo de Impacto Ambiental

    IBAMA Ministrio do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis

    IG Instituto de Geografia

    MAPA Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento

    MMA Ministrio do Meio Ambiente

    RIMA Relatrio de Impacto Ambiental

    SDS Secretaria do Desenvolvimento Social

    STF - Supremo Tribunal Federal

    TRF Tribunal Regional Federal

    UFU Universidade Federal de Uberlndia

    UNESCO Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura

    7

  • SUMRIO

    1. INTRODUO...............................................................................................................11

    I EVOLUAO APLICATIVA DA GEOGRAFIA...........................................................15

    1.1 Construo etimolgica e desenvoltura histrica da geografia......................................15

    1.2 Espao geogrfico enquanto meio ambiente..................................................................19

    II ARGUMENTAES JURDICAS NO VIS POSITIVISTA E TRIDIMENSIONAL

    DA NORMA.........................................................................................................................28

    2.1 Panaroma da Norma Jurdica a partir da Moral, Justia e Direito na tica Positivista de

    Hans Kelsen.......................................................................................................................29

    2.2 Viso da Norma Jurdica a partir da Teoria Tridimensional, implantada por Miguel

    Reale.....................................................................................................................................31

    2.3 Valorao normativa a partir do ecocentrismo.................................................................37

    III- ESPAO NORMATIVO A PARTIR DA TICA INTERDISCIPLINAR.........................39

    3.1 Surgimentos da interdisciplinaridade...............................................................................40

    3.2 Teoria do Rizoma.............................................................................................................41

    IV IMPLEMENTAO EFETIVA DO DIREITO AMBIENTAL..................................46

    4.1 Justificativa do Direito Ambiental..................................................................................46

    4.2 Natureza jurdica e demais ramos do Direito Ambiental................................................49

    4.3 Aspectos da Disciplina de Direito Ambiental aplicada ao ensino superior.....................52

    4.4 Mudana de comportamento a partir da conscincia ecolgica e educao ambiental...55

    4.4.1 Imperativo Categrico aplicada a conduta Ambiental......................................58

    4.5 Democratizando a Norma Ambiental Cidad a Partir da Educao Ambiental.............60

    4.6 O Paradigma do Meio Ambiente Sustentvel..................................................................61

    4.6.1 Sustentabilidade do processo de produo e exportao da carne bovina no

    Brasil.....................................................................................................................................69

    8

  • V - PRINCPIO DA BAGATELA NO DELITO DE NATUREZA

    AMBIENTAL........................................................................................................................70

    5.1 Introduo ao princpio da bagatela.................................................................................77

    5.2 Transposio terica aplicao prtica do princpio da bagatela..................................80

    5.3 Manifestaes do Judicirio, aplicadas ao delito de natureza ambiental.........................83

    5.4 Avaliao epistemolgica................................................................................................85

    CONCLUSO.......................................................................................................................91

    REFERNCIAS.....................................................................................................................97

    ANEXO A Crime contra a fauna / Absolvio.................................................................102

    ANEXO B Crime contra a fauna / Absolvio.................................................................105

    ANEXO C Crime contra a fauna / Condenao...............................................................111

    9

  • Resumo

    O presente trabalho dissertativo realiza uma abordagem crtica concepo etimolgica da geografia e de seu objeto de estudo. De forma interdisciplinar, foca o direito ambiental espacial normativo, a partir da concepo moderna de geografia, como cincia resolutiva dos conflitos sociais aplicados. Considerando-se a norma valorativa oriunda da teoria tridimensional, em detrimento da norma positivista, busca-se um desenvolvimento sustentvel e a devida aplicao da legislao ambiental, que deve ser implantada em prol da construo de uma conscincia ambiental personalssima. Ainda, atentamos para a importncia do exerccio da cidadania participativa, a fim de consolidar o regime democrtico de Direito, no tocante tutela do meio ambiente. Concluindo o trabalho, com um estudo de caso, nota-se a importncia do contedo terico trabalhado, explicitando-se como a aplicao do preceito legal ora utilizado, em detrimento da devida tutela normativa, aplicada ao Meio Ambiente.

    Palavras-chaves: direito ambiental, geografia, interdisciplinaridade, sustentabilidade, princpio da insignificncia.

    10

  • Abstract

    The present written work carries through a critical boarding to the design of etymological geography, and its object of study. So interdisciplinary, focus on the right environmental space, from the modern conception of geography resolute science of the applied social conflicts. May there be sight, considering the standard values come from the three-dimensional theory to the detriment of the standard positivist, searching a development sustainable, and the had application of the ambient legislation, what should be implanted in favour of the construction of an exclusive ambient conscience. Still, we are attentive to the importance of the exercise of the participatory citizenship, in order to consolidate the democratic system of Right, in the moving one to the guardianship of the environment. Concluding the work from a case study, the importance of the worked theoretical content is noticed it, explaining how the application of the legal precept sometimes used, at the expense of proper regulatory supervision, applied to the Environment.

    Keywords: enviromental law, geography, interdisciplinarity, support, principle of the insignificncia.

    11

  • INTRODUO

    Atualmente, vivemos nos tempos histricos que sequencializam os tempos biolgicos que

    por sua vez se sobrepem aos tempos geolgicos. Cada lapso temporal (histrico, biolgico

    ou geolgico), possui sua respectiva caracterstica. Os tempos geolgicos ocorreram h

    bilhes de anos e temos poucos registros que nos permitam hoje tirar concluses definitivas

    sobre as origens e etapas de formao de nosso planeta. J o tempo biolgico marcado

    com a presena da vida no palco terreno, h aproximadamente, centenas de milhes de anos.

    Por intermdio de seus ecossistemas, esse processo de formao e desenvolvimento ocorre

    de forma lenta e contnua, de forma que vrias espcies (vegetais e animais), apareceram e

    desapareceram sem uma justificativa plausvel. Entretanto, o processo evolutivo continuou

    seu caminho a fim de preparar o Planeta Terra, para o um momento muito especial. Os

    tempos histricos possuem seu marco inicial a partir da identificao e da presena da

    espcie humana nos ecossistemas naturais. Podemos concluir que esse momento se deu h

    aproximadamente milhes de anos, sem ao certo sabermos o momento exato de tal

    acontecimento. (ALLEGRE, 1987)

    Os tempos histricos tm o condo de demonstrar as atividades do homem, assim, como a

    ocupao do espao. Tambm testemunham as alteraes por ele imposta ao ecossistema

    planetrio, no apenas as causas fsicas naturais bem como as alteraes oriundas de causas

    fsicas artificiais oriundas do intelecto humano. (JOHSTON, 1986)

    Os recursos naturais, finitos por natureza, foram formados lentamente ao decorrer dos

    processos biolgicos e geolgicos, cujo processo de formao no voltaro mais. So

    esgotados e colocados disposio de forma inconcebvel, devido impossibilidade do

    12

  • processo de recriao. Por intermdio do crescente desequilbrio ecolgico e da devastadora

    degradao ambiental, chegamos aos dias atuais. Nossas aes chocam-se contra nossos

    deveres e direitos, comprometendo nosso prprio destino. O historiador H. G. Wells

    registrou: A histria humana cada vez mais uma corrida entre a educao e o desastre.

    (PENNA, 1999, p. 15). Este o paradoxo existente nas relaes do homem e a Terra1.

    A partir deste prisma, temos a imperiosa necessidade de interao entre as cincias como um

    todo, trabalhando em prol de um fim profcuo criao de uma conscincia ambiental

    personalssima, com o escopo universal de proteo ao meio ambiente. Para tanto, temos a

    necessidade de trabalhar a questo ambiental de forma aberta, ou seja, de forma

    interdisciplinar enfatizando a juno entre Direito Ambiental e Geografia Espacial e demais

    reas que se fizerem necessrio.

    Iniciando o presente trabalho, abordamos a conceituao e evoluo da estrutura geogrfica

    espacial no vis de Santos (2001), Kant (2005), Montesquieu (2005) e outros, a fim de

    chegar construo moderna da Geografia, como soluo dos problemas sociais. Ainda

    neste captulo, aborda-se o espao geogrfico, como meio ambiente de forma ampla, bem

    como concepo etimolgica da palavra meio ambiente, posteriormente realizada uma

    avaliao aplicativa considerando meio ambiente e espao, a partir do posicionamento

    moderno de Santos (2001). Finalizando, tecemos algumas ponderaes relativas

    importncia da interdisciplinaridade, em especfico envolvendo Direito e Geografia.

    1 A questo ambiental fica exposta e interpelam a responsabilidade dos seres humanos, inequvoca e intransfervel. Todo saber cientfico contido nas Geocincias, nas Biocincias e nas Cincias humanas, fala da fragilidade do mundo natural e da agressividade dominante. Esse o palco que se desenrola o drama da vida no Planeta, a questo ambiental esta desenhada nos cenrios da humanidade e manifesta-se atravs das aes visveis, que podem facilmente ser constatadas; porm no possvel ignorar o que se passa nos bastidores, nas aes ocultas e no jogo de interesses que no vm cena. A vigilncia ambiental, inclusive a conscincia jurdico-ecolgica, deve estar atenta ao que patente e ao que latente.(MILAR, 2005.p. 49).

    13

  • Em um segundo momento, verificaremos como feita a interpretao da norma a partir de

    um posicionamento positivista, demonstrando a insuficincia atual da utilizao da norma

    posta no direito ambiental, adquirida de forma histrica em nosso contexto jurdico

    utilizado, que consiste em trabalhar em sentido amplo, a norma e a conduta, apartada da

    moral que neste vis objeto de estudo da tica. Seqencialmente, realizada uma

    abordagem detalhada da aplicao da Teoria Tridimensional a qual entendemos deve ser

    aplicada sempre que necessrio for interpretao da norma em geral, pautada em seus

    pilares motrizes: norma, conduta e o valor. A Teoria Tridimensional uma concepo de

    Direito internacionalmente conhecida, elaborada pelo jusfilsofo brasileiro Miguel Reale em

    1968.

    Seqencialmente, abordamos a disciplina de direito ambiental, buscando afastar a aplicao

    da norma positivista e introduzir a aplicao da norma valorativa ou humanizada, pois de

    suma importncia agregar ao preceito legal vigente, tica e cidadania. E concluindo o

    presente captulo, ponderamos sobre as formas e dificuldades na mudana de

    comportamento por parte do ser humano, em prol da implantao de uma conscincia

    ambiental, como forma de maximizao do bem estar e preservao do meio ambiente.

    Alm de rompermos o paradigma do comportamento latencial, com o auxlio da educao

    ambiental cidad, a qual enfatizada no presente captulo, necessrio pautarmos o

    processo de desenvolvimento em bases sustentveis, utilizando como referencial terico,

    Leff, (2001) que traz baila o prisma da sustentabilidade tecnolgica ou econmica, em

    detrimento da amiental ou ecolgica.

    Neste mesmo vis, verifica-se a sustentabilidade da produo e exportao da pecuria de

    corte, bem como seu custeio total.

    14

  • E conclundo o trabalho, apresentamos trs decises oriundas do judicirio, realizando uma

    abordagem prtica do princpio da insignificncia, que por sua vez demonstra a importncia

    da concepo espacial, a necessidade de vigilncia no tocante aplicao da norma bem

    como a necessidade de implantao de polticas pblicas, alinhadas com a tica e cidadania.

    Assim, desenvolvemos o presente trabalho em uma linha dialtica, a fim de construir uma

    viso epistemolgica do direito ambiental, de forma interdisciplinar.

    Buscando agregar ao trabalho, o vis crtico do direito ambiental alinhado dialtica da

    geografia contempornea e demais segmentos inerentes ao eficiente processo de formao

    da conscincia ambiental, a fim de humanizar e uniformizar a aplicao da norma ambiental.

    15

  • I EVOLUO APLICATIVA DA GEOGRAFIA

    1.1 Construo etimolgica e desenvoltura histrica.

    A concepo etimolgica da palavra Geografia auto explicvel e tem origem na Grcia

    antiga, "Geo" significa Terra e "graphos" significa escrever. Assim sendo, Geografia o

    estudo cientfico da superfcie da Terra com o objetivo de descrever e analisar a variao

    espacial de fenmenos fsicos, biolgicos e humanos que acontecem na superfcie do globo

    terrestre. (CHRISTOFOLETTI, 1985.)

    A geografia o estudo do nosso prprio planeta, o oikos, (casa) do ser humano. Enfoca

    a organizao da sociedade e suas relaes com espao fsico, os diversos aspectos da

    natureza e da paisagem.

    Desde o surgimento da geografia na Antiga Grcia, grande parte do mundo ocidental tinha

    interesse em descobrir novos territrios de domnio e atuao comercial, era fundamental

    que conhecessem o ambiente fsico e os fenmenos naturais.

    No perodo entre os sculos XV e XVI, grandes nomes como, Vasco da Gama, Bartolomeu

    Dias, Amrico Vespcio, o genovs Cristvo Colombo redescobririam o interesse pela

    explorao, pela descrio geogrfica e pelo mapeamento. (MOREIRA, 1986).

    Como o direito, a geografia tambm dinmica e, com o passar do tempo, foram surgindo

    novas frentes e subdivises cincia da geografia, tais como:

    O Estudo da Geografia voltado para o fenmeno social, em que grandes estudiosos se

    empenharam no estudo das vrias reas da geografia. Grandes nomes, entre eles: o filsofo

    alemo Emanuel Kant, o iluminista Charles-Louis de Secondat, conhecido como

    16

  • Montesquieu, entre outros, buscavam estabelecer em seu estudo a relao entre a

    humanidade e o meio ambiente. O estudo geogrfico recebeu nova roupagem, no tocante s

    suas novas subdivises geogrficas, dentre elas: a geografia antropolgica e a geografia

    poltica.

    Ressalta-se que em meados do sculo XIX, aps o surgimento da Escola Alem, foi

    mencionado o Determinismo, que se baseava na idia de que o clima poderia estimular ou

    no a fora fsica e o desenvolvimento intelectual das pessoas. Portanto, defendeu-se a tese

    de que, nas zonas temperadas, a humanidade teria um desenvolvimento mais elevado do que

    nas quentes e midas zonas tropicais. Tal teoria caiu por terra quando esportistas se

    confrontaram e perceberam pelos resultados que a argumentao no era procedente. Por

    outro lado, nos anos 30, a Escola Francesa lanava o Possibilismo, que afirmava que as

    pessoas poderiam determinar seu desenvolvimento a partir de seu ambiente fsico, ou seja,

    sua escolha, determinaria a extenso de seu avano cultural (MORAES, 1989).

    Em um momento posterior dcada de 60, surgem novos elementos ilustrativos da

    Geografia, destacamos entre eles: a estatstica, os computadores, os satlites e a concepo

    geogrfica propriamente dita, ganha novos aliados a partir do dinamismo, ento, moderno.

    A vontade de fazer da geografia um estudo mais cientfico, com aceitao harmnica como

    disciplina, gerou a adoo da estatstica como recurso de apoio. Ao findar da dcada,

    considerando as novas tcnicas de suma importncia para a geografia comeavam a ser

    desenvolvidos: o computador eletrnico e o satlite, dando nova nfase disciplina.

    Atualmente, a geografia voltada para o estudo das relaes entre o espao e as sociedades,

    resultando em uma necessidade, hoje experimentada pelo gegrafo, de recorrer a outras

    cincias como geologia, oceanografia, meteorologia, ecologia, matemtica , estatstica,

    bem como s cincias sociais, tais como a Economia, Sociologia, Histria, Poltica e Direito.

    17

  • Portanto, o significado etimolgico da palavra Geografia, uniforme e pacfico, no

    demando uma pesquisa cientfica proficiente. No entanto, quando questionamos o

    significado cientfico da palavra, surgem algumas controvrsias significativas. Assim,

    podemos identificar esta realidade a partir da identificao e avaliao do objeto da

    Geografia.

    Partindo do significado etimolgico da prpria palavra Geografia, a fim de identificar o

    objeto, compreendemos assim, uma descrio da superfcie terrestre, com todos os

    fenmenos apresentados na superfcie planetria, gerando uma sntese de todas as cincias,

    ou seja, seria a cincia com maior multidisciplinaridade existente no planeta, capaz de

    estudar tudo que existe no planeta (ANDRADE, 1999).

    J em outro vis, a Geografia se atm ao mero aspecto visual do real, ou seja, vista como

    cincia sntese da paisagem associada s variantes da fenomenologia, perceptveis ao espao

    terreno visvel. Em outro prisma, pode-se dizer que a geografia, sntese da diferenciao

    de reas, utilizando o mtodo da descrio e comparao. E por fim, temos a viso

    contempornea do objeto pautado, o estudo das relaes entre o homem e o meio, tal

    concepo possui maior difuso no meio cientfico. Atualmente, alguns a chamam de

    geografia ambiental, que por sua vez enfatiza, tanto o meio urbano, o meio rural, quanto os

    impactos da ao humana. Portanto, a anlise da interao entre sociedade e natureza no

    favorece nem um nem outro, por outro lado favorece, o resultado desta relao, o que

    chamamos de organizao do espao.

    Em sendo a Geografia uma cincia que tem o escopo de estudo focado no espao; no o

    espao cartesiano e, sim, aquele produzido entre as relaes do homem e o meio,

    envolvendo aspectos dialticos e fenomenolgicos. Na tica do gegrafo francs Paul Vidal

    18

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Fenomenologiahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Ren?_Descarteshttp://pt.wikipedia.org/wiki/Espa?ohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Ci?ncia

  • de la Blache a Geografia a Cincia dos Lugares2, j Hartshorne (1978, p. 125) diz ser [...]

    a cincia da diferenciao de reas.

    Uma definio simples poderia ser: Geografia o estudo da superfcie terrestre e a

    distribuio espacial de fenmenos geogrficos, frutos da relao recproca entre homem e

    meio. (CHRISTOFOLETTI, 1985. p.19)

    Vale ressaltar a meno de Foucult apud Vasentini, no tocante geografia:

    Cada vez mais me parece que a formao dos discursos e a genealogia do saber devem ser analisadas a partir no dos tipos de conscincia, das modalidades de percepo ou das formas de ideologias. Elas devem ser analisadas em funo das tticas e estratgias de poder. Tticas e estratgias que se desdobram atravs das implantaes, das distribuies, dos recortes, dos controles de territrios, das organizaes de domnios que poderiam constituir uma espcie de geopoltica, onde minhas preocupaes encontrariam os mtodos dos gegrafos. H um tema que gostaria de estudar nos prximos anos: o exrcito como matriz de organizao e saber -- a necessidade de estudar a fortaleza, a 'campanha', o 'movimento', a colnia, o territrio. A Geografia deve estar no centro das coisas de que me ocupo.3(Foucult, apud VESENTINE, 2003, p.98)

    A partir da ponderao de Foucault, percebe-se a associao ntida dos saberes da geografia

    relao de poder e controle, considerando a concatenao dos saberes inerentes a

    disciplina, ou seja, a articulao do saber no vis de domnio, que por sua vez poder ser

    usado para diversas finalidades, tanto para melhorar a qualidade da vida humano quanto

    para pior-la, no caso de regimes ditadores.

    Considerando a Geografia, no vis de melhorar a qualidade de vida, como soluo para os

    problemas da sociedade moderna, os pesquisadores tm obtido um resultado positivo que se

    inicia desde a orientaes para que pessoas com problemas de incapacidade fsica possam

    guiar-se em complexas reas urbanas; pesquisa de distribuio espacial de doenas,

    2 Paul Vidal de La Blache, em sua obra maior O Possibilismo e a Geografia, escrita no incio do sculo XX, tem como caracterstica marcante uma crtica ao determinismo geogrfico desenvolvido por Ratzel, a quem acusava de ter politizado em demasia a cincia geogrfica. (Blache apud. Botelho, 1993, p.22.)3 Artigo do Dr Jos Willian Vesentini sobre o pensamento Geogrfico ao longo da histria, seus destaques e propostas, publicado no site pessoal, Geocrtica. Acesso: http://www.dge.uem.br/geografia_comentarios.htm/ Em 12/03/2008.

    19

    http://www.dge.uem.br/geografia_comentarios.htm/ Em 12/03/2008http://www.dge.uem.br/geografia_comentarios.htm/ Em 12/03/2008http://www.geocritica.com.br/texto05.htm

  • auxiliando de forma direta na implantao de campanha de combate de forma localizada.

    Atualmente, qualquer grande obra no pas, como estradas, pontes , aterros sanitrios e

    instalaes de fbricas requerem um Relatrio de Impacto Ambiental ( RIMA ), em que o

    gegrafo tem atuao fundamental, encontrando suas diretrizes legais em resolues do

    Conama.

    Assim, chegamos em um posicionamento moderno, agregando o vis de soluo dos

    problemas sociais. Ressalta-se que no abordaremos a utilizao do saber geogrfico

    moderno, a fim de mencionar o uso do referido conhecimento em prol de uma utilizao

    negativa, ou seja, o proveito prprio individual em detrimento do progresso e bem estar

    coletivo.

    Portanto, toda essa desenvoltura geogrfica ao transpor do tempo, visa auxiliar o

    aprimoramento dos talentos humanos, a fim de agregar uma melhora no convvio social em

    sentido latu, seja ele no meio ambiente natural, artificial, cultural e do trabalho. Assim,

    passamos a discorrer inicialmente sobre o espao geogrfico ambiental.

    1.2 Espao Geogrfico Enquanto Meio Ambiente

    O espao geogrfico como meio ambiente engloba, alm do espao cartesiano, as relaes

    do convvio social, bem como possveis solues aos problemas terrenos como j dito

    anteriormente. Para tanto, Inicialmente adentraremos na seara da concepo epistemolgica

    do meio ambiente em si.

    20

  • De forma inaugural temos que o naturalista francs Geoffrey de Saint-Hilaire utilizou a

    expresso meio ambiente em sua obra tudes progressives d un naturaliste, de 1835.

    (NUNES, 2006, p. 19)

    A expresso meio ambiente derivada do latim ambiens e entis em sentido amplo, possui

    conotao de algo que rodeia (MACHADO, 2003, p. 75). Diversos autores dizem que o

    vernculo imprprio, considere que meio e ambiente tm a mesma conotao, por outro

    lado h quem utiliza a expresso, meio ambiente como de boa aplicao na lngua

    portuguesa:

    Numa concepo ampla, que vai alm dos limites estreitos fixados pela Ecologia tradicional, o meio ambiente abrange toda a natureza original (natural) a artificial, assim como os bens culturais correlatos. Temos aqui, ento, um detalhamento do tema: de um lado, com o meio ambiente natural, ou fsico, constitudo pelo solo, pela gua, pelo ar, pela energia, pela fauna e pela flora; e, de outro, como meio ambiente artificial (ou humano),, formado pelas edificaes, equipamentos e alteraes produzidos pelo homem, enfim os assentamentos de natureza urbanstica e demais construes. (MILAR, 2005, p. 99)

    Para Silva (1994, p. 84), o meio ambiente , assim, a interao do conjunto de elementos

    naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em

    todas as suas formas. Assim sendo, perceptvel a fragmentao do meio ambiente em

    trs vieses diferentes: o meio ambiente artificial (espao urbano); o meio ambiente cultural

    (patrimnio histrico, artstico, arqueolgico, paisagstico e turstico) e o meio ambiente

    natural ou fsico (constitudo pela interao dos seres vivos com seu meio.)

    Na tica de Santos:

    O meio ecolgico j meio modificado e cada vez mais meio tcnico. Dessa forma, o que em realidade se d um acrscimo ao meio de novas obras dos homens, a criao de um novo meio a partir daquele que j existia: o que se costuma chamar de natureza primeira para contrapor natureza segunda j segunda natureza. A natureza primeira como sinnimo de natureza natural, s existiu at o momento imediatamente anterior quele em que o homem se transformou em homem social. A partir desse momento, tudo o que consideramos como natureza primeira j foi transformado. Esse processo de transformao, contnuo e progressivo, constitui uma mudana qualitativa

    21

  • fundamental nos dias atuais. E na medida em que o trabalho humano tem por base a cincia e a tcnica, tornou-se por isso mesmo a historicizao da tecnologia. (SANTOS, 1997, p.149)

    Na concepo de Corra (1995), podemos classificar o meio ambiente como: I) natural,

    formado pelo ar, solo, gua, fauna e flora; II) artificial, formado pelo espao fsico a partir

    da transformao da ao continua e perseverante do homem almejando estabelecer relaes

    sociais, classificados em urbano, perifrico e rural; III) cultural, formado por bens, valores e

    tradies, significativas para as comunidades, atuando na sua identidade e formao; IV)

    trabalho, enquanto local de exerccio laborativo. Ressalta-se, que o meio ambiente natural,

    visto como objeto valorativo, de acordo com os interesses mercadolgicos.

    Podemos, enfim, citar o conceito legal brasileiro de meio ambiente, presente no art. 3., I, da

    Lei n. 6.938 de 31 de agosto de 1981: o conjunto de condies, leis, influncias e

    interaes de ordem fsica, qumica e biolgica, que permite, abriga e rege a vida em todas

    as suas formas (MEDAUAR, 2006, p.856).

    A partir da leitura desses vrios conceitos, inferimos a concepo de natureza e,

    conseqentemente, de meio ambiente em dois grandes centros distintos: um apoiado no ser

    vivente genrico em que o homem espcie do gnero denominado por muitos como

    ecocentrismo que toma a vida em sua concepo latu universal e, na outra vertente, a

    espcie humana, figurando no plo central universal denominada antropocntrica. Nos

    conceitos de meio ambiente apresentados, grande parte nos conduz a esse axioma de forma

    explcita.

    Portanto, independentemente do vis adotado, entendemos que o meio ambiente, antes de

    tudo, compe o espao geogrfico de forma natural, bem como as relaes desenvolvidas no

    convvio civilizatrio ou ecossistema humano, reforando o carter dinmico de assimilao

    22

  • dos conceitos de espao e meio ambiente (meio natural, ou pr-tcnico, meio tcnico e meio

    tcnico cientfico informacional).

    Entretanto, a tutela do meio ambiente no almeja, por si s, a preservao do planeta, mas

    tambm, a conservao e a melhora do qualitativo da vida terrena. Assim sendo, lembramos

    que as manifestaes bsicas internacionais relativas tutela ambiental reportam a

    necessidade de proteo vida humana com qualidade e preservao dos pequenos nichos

    de etnia desfavorecida.

    Da anlise do conceito de meio ambiente somos remetidos a outro elemento que deve ser

    apreciado: o espao. Lembramos que o estudo do espao considera a presena humana e

    suas respectivas relaes.

    Assim sendo, e, em consonncia com os ensinamentos bibliogrficos apresentados por

    Santos (1999). temos sua conceituao, resultante do conjunto de relaes oriundas de suas

    funes e de formas apresentadas a partir de um contedo histrico, englobando fatos

    pretritos e presentes. A partir do conjunto de formas capazes de representar a relaes

    sociais presenciadas, as quais podem ser perceptveis, consideram-se suas funes e seus

    respectivos fatos. Conclui-se que o espao um lugar onde as foras possuem acelerao

    diferente. Assim, podemos justificar que a evoluo nos espaos, consideram suas

    particularidades especificas, discernindo de um espao para outro.

    Posteriormente, o corrente autor considera o espao geogrfico como mera natureza

    transformada pelo homem face sua interferncia.

    J Corra (1995), enfatiza as relaes sociais quando define o espao geogrfico em sendo o

    local produtor das relaes sociais. Tal construo espacial origina-se, a partir da publicao

    doutrinria de Lefvbre 1979, que concebeu caractersticas de cunho social ao espao. J

    23

  • Kant (2005) trabalhou a problemtica espacial de forma subjetiva, inacreditando na

    existncia espacial, desvinculado das relaes sociais.

    Inicialmente, em sua tica o espao de modo algum representa uma propriedade de coisas

    em si; isto , no representa qualquer determinao dessas coisas que seja inerente aos

    prprios objetos e permanea ainda que se abstraia de todas as condies subjetivas de

    intuio. Com efeito, nem determinaes absolutas nem relativas podem ser intudas antes

    da existncia das coisas s quais dizem respeito e, por conseguinte, tambm, no a priori.

    Portanto, o espao no seno a forma de todos os fenmenos dos sentidos externos, isto ,

    a condio subjetiva da sensibilidade unicamente sob a qual nos possvel a intuio

    externa. Ora, visto que a receptividade do sujeito ao ser afetado por objetos necessariamente

    precede toda a intuio destes objetos, compreende-se como a forma de todos os fenmenos

    pode ser dada na mente antes de todas as percepes efetivas. Por conseguinte, a priori, uma

    intuio pura na qual todos os objetos tm que ser determinados pode conter antes de toda a

    experincia princpios das relaes dos mesmos.

    Em seguida, Santos conclui:

    O conceito transcendental dos fenmenos do espao uma advertncia crtica de que em geral nada intudo no espao uma coisa em si e de que o espao tampouco uma forma das coisas que lhes prpria qui em si mesmas, mas sim que os objetos em si de modo algum nos so conhecidos e que os por ns denominados objetos externos no passam de meras representaes da nossa sensibilidade. (Santos, 1997, p. 138).

    Assim sendo, a idia de espao apresentada pode ser avaliada em quatro vieses, os quais

    Santos ( 1997), denomina de categorias: estrutura, processo, funo e forma. Ressalta que

    tais categorias devem ser observadas forma integrada, isto , estabelecendo entre as

    categorias relaes dialticas, de modo que a anlise do espao sempre deve levar em conta

    seu aspecto sistmico. Essas categorias podem ser assim entendidas:

    24

  • Forma o aspecto visvel de uma coisa. Refere-se, ademais, ao arranjo ordenado de objetos,

    a um padro. Tomada isoladamente, temos uma mera descrio de fenmenos ou de um de

    seus aspectos num dado instante de tempo. Funo, de acordo com o Dicionrio Webster,

    sugere uma tarefa ou atividade esperada de uma forma, pessoa, instituio ou coisa.

    Estrutura implica a inter-relao de todas as partes de um todo; o modo de organizao ou

    construo. Processo pode ser definido como uma ao contnua, desenvolvendo-se em

    direo a um resultado qualquer, implicando conceitos de tempo (continuidade) e mudana.

    A assimilao conceitual dos espaos e da co-relao entre suas categorias importante

    instrumento na identificao e interpretao de questes ambientais relevantes, porquanto,

    so intrinsecamente atreladas ao antrpica.

    Temas atuais como danos ambientais, cooperao internacional, efeitos do comrcio

    internacional sobre o meio ambiente, pobreza, so passveis de estudo tanto sob a tica

    ambiental quanto sob a tica espacial ou geogrfica.

    Utilizemos, como exemplo, a possvel aplicao de diretrizes normativas, no palco terreno,

    em um espao transcendental, a fim de primar pela tutela do meio ambiente. Em

    determinados pases imprescindvel a explorao ambiental de forma direta, o aspecto

    normativo ganha importncia mpar, haja vista a imperatividade do instrumento legal. Com

    o escopo maior voltado equidade ambiental, imaginemos: a implantao normativa com o

    escopo de evitar que a atividade econmica dominante possa provocar modificaes na

    paisagem, por conseguinte, evitando a degradao ambiental; implantao normativa

    regulando de forma sustentvel, a explorao ambiental em questo, a partir de uma

    organizao mnima nos campos poltico (projetos pblicos voltados ao desenvolvimento

    sustentvel) - comercial (compradores, vendedores, logstica, depsitos), social

    (trabalhadores), legal (leis que disciplinam a atividade, ao de fiscalizao das autoridades

    25

  • competentes), de modo que existe uma estrutura que sustenta ou legitima a funcionalidade

    do espao; havendo na utilizao desse espao um processo histrico, primando pela

    existncia de aes estruturadas no decorrer do tempo. Reinando em absoluto, a dinmica

    social em detrimento da latncia, face s modificaes, alteraes e ajustes, dentre as

    relaes sociais como fenmeno contnuo.

    A questo ambiental encontra-se inserida na dinmica espacial. Portanto, Santos (1999),

    descreve a constituio elementar espacial: os homens; as empresas que produzem bens,

    servios e idias; instituies; o meio ecolgico, entendido como um conjunto de complexo

    territoriais que constituem a base fsica do trabalho humano, entendidos tambm como o

    conjunto dos recursos naturais disponveis; e a infra-estrutura (casas, plantaes, caminhos

    etc.). O termo ecossistema ou ecossistema humano refora o carter dinmico que aproxima

    os conceitos de espao e meio ambiente.

    Considerando tais categorias espaciais teremos uma co-relao maior ou menor, portanto,

    classificando o meio onde se do as relaes sociais teremos: I meio natural, ou pr-tcnico -

    marcado pela escassez de objetos substituveis ao trabalho do homem com o escopo de

    dominar os elementos naturais; II meio tcnico - marcado pela mecanizao do espao; III

    meio tcnico cientfico-informacional.

    Neste ltimo, que se manifestou principalmente, aps a Segunda Guerra Mundial, a

    cincia que, dominada por uma tcnica marcadamente informacional, aparece como um

    complexo de variveis que comanda o desenvolvimento do perodo atual. O meio tcnico-

    cientfico-informacional a expresso geogrfica da globalizao (SANTOS, 2001). Com o

    meio tcnico-cientfico-informacional, a dinmica espacial atinge o seu pice, com reflexos

    no fenmeno da globalizao.

    26

  • Encontramos no mundo bons exemplos de tais categorias, haja vista o desenvolvimento dos

    instrumentos de controle e utilizao dos recursos naturais no ocorrer simultaneamente em

    todos os lugares. Boa parte dos problemas ambientais existentes na atualidade, iniciam-se no

    perodo tcnico e intensificam-se quando surge o perodo tcnico, cientfico e informacional.

    A correta utilizao dos avanos tcnicos e cientficos pode, contribuir para a diminuio

    dos problemas ambientais, mas o monoplio do conhecimento tcnico e cientfico tem sido

    aplicado em forma de domnio e esbulho de recursos naturais em detrimento dos pases em

    desenvolvimento por parte dos pases desenvolvidos. Temos, devido a maior ou menor

    quantidade de informao existente e/ou exigida, espaos produtivos (ativos pelo intelecto

    humano) meio tcnico-cientfico-informacional e espaos improdutivos (inertes pelo

    intelecto humano), deficientes de densidade tcnico-cientfico-informacional satisfatria

    (SANTOS, 2001). Assim sendo, os espaos produtivos tendem inevitavelmente expanso e

    ao domnio dos espaos improdutivos, caso no haja a criao de mecanismos, que possam

    garantir condies mnimas, de estabelecer os critrios necessrios expanso do processo

    de produo espacial. Portanto, torna-se evidente e necessria a implantao e utilizao

    efetiva de instrumentos legais e polticas de conscientizao voltadas para coibir o processo

    expansionista dos espaos produtivos, tcnico-cientfico-informacional que, na maioria das

    vezes, so oriundos de pases desenvolvidos, e so implantados em pases subdesenvolvidos

    ou em fase de desenvolvimento. Assim, certamente estaramos primando pela proteo dos

    espaos improdutivos que, no maioria das vezes, esto vinculadas h uma realidade

    economicamente invivel, mas que ambientalmente falando se justifica, haja vista a

    preservao do ambiente natural, cultural e do trabalho. Assim sendo, como resultante da

    implantao destas aes estaria se protegendo o quantitativo de matrias-primas,

    27

  • cooperando de foram internacional para o desenvolvimento tecnolgico dos pases em

    desenvolvimento.

    Concluindo o posicionamento de Santos (2001), o mesmo enfatiza o espao em face das

    relaes de poder e domnio, propondo uma classificao espacial territorial: I) reas de

    densidade e de rarefao considerando a densidade relativa a objetos, pessoas,

    movimentao dos objetos e pessoas, valores e aes; II) fluidez e viscosidade variando,

    conforme o grau de circulao dos fatores acima descritos; III) espao da movimentao,

    conforme a quantidade de elementos fixos (vias, transporte) que favoream a circulao, a

    diviso do trabalho ou a variedade e densidade do consumo.

    Considerando o aspecto social do espao no que tange sua rapidez, podemos dizer que o

    mesmo possui um movimento maior nos locais de concentrao de sua atividade financeira

    ou sociocultural; IV) reluzentes e ofuscados, variando de acordo com a percepo atrativa

    no tocante ao s atividades financeiras, tecnolgicas e; V) espaos coordenativos e espaos

    submissos.

    A partir da avaliao epistemolgica da concepo do espao e de suas categorias e

    classificaes tendem-se um aprofundamento crtico nas abordagens de questes ligadas ao

    meio ambiente, uma vez que esto associadas a processos de ocupao e apropriao do

    espao normatizado. A elaborao de solues para os problemas espaciais como ambientais

    depender cada vez mais do desenvolvimento de trabalhos e da formulao de polticas de

    carter interdisciplinar. E para compreendermos a ocupao do espao de forma ampla,

    percebe-se a necessidade de um vnculo entre os diversos setores do saber em prol desta

    interdisciplinaridade to teorizada, e pouco realizada. E considerando a ausncia de uma

    interpretao pautada na diversidade dos saberes, o aspecto normativo, pouco poder

    intervir, haja vista a concepo espacial, voltada s relaes de poder e domnio.

    28

  • II ARGUMENTAES JURDICAS NO VIS POSITIVISTA E

    TRIDIMENSIONAL DA NORMA

    2.1 Panorama da Norma Jurdica a partir da Moral, Justia e Direito na tica

    positivista de Hans Kelsen

    Considerando a importncia da Geografia no tocante resoluo dos problemas sociais, bem

    como a necessidade de tratar o direito ambiental de forma interdisciplinar, passamos agora a

    verificar as ponderaes por parte da aplicao da norma positivista, herana histrica que,

    por sua vez, no encontra harmonia com a tendncia moderna de aplicao da norma

    ambiental humanizada ou como alguns preferem chamar valorativa.

    O filsofo Kelsen (1984) apresenta um posicionamento critico no tocante s argumentaes

    tericas, ao discernimento entre direito e moral, considerando os critrios interioridade

    como moral e exterioridade como direito. Sua crtica repousa, sobretudo, considerando o

    direito como regulador das condutas intrnsecas e aleatoriamente regulando as condutas

    extrnsecas, igualmente ocorrendo com a moral. Este critrio seria, portanto, insuficiente

    para dar conta do problema.

    Caso o direito venha ser entendido e definido unicamente a partir das idias de

    normatividade e validade, ento seu campo nada tem a ver com a tica. A proposta de

    separao conceitual provocou uma diviso significativa no posicionamento e avaliao dos

    doutrinadores do sc. XX. Resumindo sua proposio: o Direito estudaria as normas

    jurdicas; a moral seria estudada pela tica. Assim sendo, o estudo jurdico, no opinaria

    entre o certo ou errado, sobre o que virtuoso ou vicioso, sobre o que bom ou mau, mas

    29

  • somente em relao licitude e ilicitude, relativo legalidade ou ilegalidade, ainda

    relativo validade e invalidade.

    A diferena no que tange moralidade da juridicidade, na viso de Kelseniana, resultaria na

    observncia da autonomia das cincias normativas. Considerando que estamos diante das

    normas positivistas, ressalta-se que por se de tratar de um direito moral ou imoral, prefere-se

    o Direito moral ao imoral, porm, reconhecendo que ambos so vinculados conduta

    (KELSEN, 1984).

    De forma resumida, temos que um direito positivo sempre pode contrariar algum

    mandamento de justia e nem por isso deixa de ser vlido4. Assim sendo, o direito

    positivado o direito posto pela autoridade do legislador, devidamente validado, por

    obedecer s condies formais para tanto, pertencente a um determinado sistema jurdico.

    No necessrio o respeito moral, por parte do Direito, para que a norma tenha validade

    plena, somente valor jurdico. Portanto, direito e moral no se misturam.5 Assim, vlida a

    ordem jurdica ainda que contrarie os alicerces morais.Validade e justia de uma norma

    jurdica so juzos de valor diversos, portanto (uma norma pode ser invlida e injusta; vlida

    e injusta; invlida e justa; vlida e justa).

    ntida a inteno de Kelsen (1998) em querer extirpar do bojo da teoria jurdica a

    preocupao com o que justo e o que injusto. Assim, a valorao da justia relativa,

    no havendo pacificao por parte dos tericos, dos povos e civilizaes de qual o

    definitivo conceito de justia. A discusso referente justia, trabalho da tica, cincia

    que possui o papel de estudar normas morais e no normas jurdicas. Assim sendo, tem a

    4 O Direito Positivo pode ser justo ou injusto; a possibilidade de ser justo ou injusto uma conseqncia essencial do fato de ser positivo (Kelsen, 1998, p. 364).5 Ocorrendo uma separao entre Direito e Moral, Direito e Justia, significa que a validade de uma ordem jurdica positiva independente desta Moral Absoluta, nica vlida, da Moral por excelncia, de a Moral (Kelsen, 1976, p. 104).

    30

  • incumbncia de detectar o certo e o errado, o justo e o injusto. E muitas so as formas com

    as quais se concebem o justo e o injusto, o que abeira este estudo do terreno das

    investigaes inconclusivas.6 Enfim, fica a indagao, o que justia?

    Geralmente, ocorre o desinteresse errneo da Cincia do Direito ao deter-se em

    investigaes metodologicamente destinadas a outras cincias (Antropologia, Sociologia,

    Geografia, Economia). Neste prisma, podemos dizer que a tica como cincia possui

    autonomia prpria, fora do alcance influenciativo do direito.

    O embate terico relativo justia, de acordo com Kelsen e conforme os argumentos, acima

    elencados, no se situariam no mbito das ambies da Teoria do direito.

    Assim sendo, no necessariamente se deduz que Kelsen no esteja preocupado em discutir o

    conceito de justia, e mesmo busque uma concepo prpria acerca deste valor7 que se

    manifestando de forma controversa a toda discusso opinativa referente aos valores, que por

    sua vez possui um setor delimitado de estudo, denominado de tica. Na seara da tica

    lcito questionar sobre a justia ou a injustia de um governo, de um regime, de

    determinadas leis. Sendo assim, Kelsen manifesta suas argumentaes referentes ao justo e

    o injusto, a partir de sua teoria, em obra prpria, a quem de obra principal a Teoria Pura do

    Direito, na qual somente o direito positivo, e sua organizao hierrquica e estrutural,

    objeto de estudo (KELSEN, 2001).

    6 Realmente, vrias normas de justia, bem diversas e em parte contraditrias entre si, so pressupostas como vlidas. Um tratamento cientfico do problema da justia deve partir destas normas de justia e por conseguinte das representaes ou conceitos que os homens, no presente e no passado, efetivamente se fazem e fizeram daquilo que eles chamam justo, que eles designam como justia. A sua tarefa analisar objetivamente as diversas normas que os homens consideram vlidas quando valoram algo como justo (KELSEN, 1996, p.16).7 Da dedicar-se, fora de sua obra Teoria pura do direito, a extensas investigaes sobre a justia, tendo publicado inmeros artigos, e se detido com muito afinco no estudo de algumas teorias sobre a justia, como, por exemplo, a teoria platnica da justia, que se tornou obra coesa, publicada postumamente (O que justia? A justia, o direito e a poltica no espelho da cincia; O problema da justia; A iluso da justia [].(KELSEN, 1996, p.47).

    31

  • Concluindo, ponderamos que em nosso ordenamento jurdico ptrio, observa-se uma forte

    herana histrica e cultural, no tocante aplicao na norma positivista, como bem

    salientado, trabalha questes meramente jurdicas, vislumbrando apenas a licitude,

    legalidade e validade, no incluindo questes vinculadas ao bom, certo e virtuoso.

    Realizando uma verdadeira diviso de guas entre moral e direito, assim afastando qualquer

    possibilidade de valorao e subjetivismo norma jurdica. E na atualidade, um modelo

    pautado em tais referncias, dificilmente encontrar guarida em qualquer ramo do direito,

    muito menos no que tange aplicao de normas ambientais, as quais demandam um grau

    significativo de sensibilidade, bom senso e valorao.

    2.2 Exegeses da Norma Jurdica a partir da Teoria Tridimensional, implantada

    por Miguel Reale.

    Pautando-se na concepo moderna de geografia como forma de resolver os problemas da

    sociedade moderna, em um cenrio moderno, temos a devida associao tica

    tridimensional do direito, induzida pelo nome em si. O fenmeno jurdico deve ser

    dimensionado sob um processo histrico-cultural de implicao e de forma dinmica e

    unitria, considerando os elementos: fato, valor e norma, pertencentes ao cotidiano mundano,

    realidade social, de modo a solucionar ou encaminhar, adequadamente, o caso concreto.

    Considerando o presente, Reale afirma que:

    Em sendo o direito interpretado como fato histrico cultural, cientificando-nos da presena real e basicamente dialtica, portanto, no aceitvel, somente como processo, cujos elementos constitutivos so fato, valor e norma, recebendo o nome de dimenso em sentido, filosfico, e no fsico-matemtico. (REALE 2003, p. 144)

    32

  • Considerando ser o Direito produto da relao social atravs da dialtica desses elementos,

    chegamos concluso de que o Direito no pode ser considerado um esquema puramente

    lgico, fechado, uma abstrao, sem resultado prtico. A ordem jurdica s tem razo na

    medida em que trouxer solues prticas ao homem, da mesma forma que a geografia

    moderna, sobretudo, como ente ecolgico social, no seu cotidiano. Neste vis, acordando

    com Rodrigues (1983), jurista portuguesa, que se afirma: estreitando a ligao entre

    normas jurdicas e realidade social temos a premissa para a construo de um sistema que

    aspira a uma perspectiva de praticidade.

    Entendemos que a aplicao normativa deve estar voltada para o ser humano, ao seu bem

    estar social, ao seu livre desenvolvimento, soluo do que lhe ocorre ao longo da sua vida.

    O Direito, assim visto, resulta da tenso interativa, a partir da dialtica entre o fato e o valor

    buscando solucionar de forma concreta e racional o conflito. Considera que o homem faz

    parte da histria dia aps dia, construindo de forma ativa seu contexto. O direito no poderia

    ser uma obra finalizada, haja vista seu processo de construo ser contnuo. Sua construo,

    formatao e interpretao, automaticamente, est propensa movibilidade cultural

    valorativa, podendo ocorrer variaes temporais e espaciais, desde que em busca da norma

    justa ou, pelo menos, tolervel e razovel, aplicada ao caso. Assim sendo, o texto normativo

    ser interpretado e valorado considerando os demais aspectos, fora de um perfil fechado,

    simplesmente formal e, sim, em sentido aberto, materialmente falando, satisfazendo,

    efetivamente, o sentido da valorao constitucional, especificamente, em prol do modelo

    Social e Democrtico de Direito vinculado ao nosso atual sistema, em que a humanidade o

    centro convergencial das atenes.

    Lembrando o entendimento de Reale fato, valor e norma esto sempre presentes e

    correlacionados em qualquer expresso da vida jurdica, o que aponta no sentido de que os

    33

  • estudiosos e pesquisadores, independentemente da rea de atuao, no devem atuar de

    forma isolada, mas, sim, conjuntamente de forma global. As pesquisas tm uma conotao

    dialtica e a norma jurdica pesquisada e trabalhada com fulcro em uma experincia

    axiolgica real. Reale, (2003, p. 564) pondera:

    mister intensificar o espectro avaliativo considerando a experincia normativa, para no nos perdemos em cogitaes abstratas, julgando erroneamente que a vida do Direito possa ser reduzida a uma simples inferncia de Lgica formal, como a um silogismo, cuja concluso resulta da simples posio das duas premissas. Nada mais ilusrio do que reduzir o Direito a uma geometria de axiomas, teoremas e postulados normativos, perdendo-se de vista os valores que determinam os preceitos jurdicos e os fatos que os condicionam, tanto na sua gnese como na sua ulterior aplicao.

    Assimilando a faceta axiolgica no que tange experincia, os valores, a no so tratados

    como entidades meta-histricas, mas como afirmado por Czerna (1989, p. 127), em

    aprofundado estudo sobre Miguel Reale: se realizam funcionalmente no prprio processo,

    numa concreo mvel unitria ao mesmo tempo, que no pode dar lugar a formalsticas

    abstraes reducionistas ou isoladores.

    Pautando-se no trabalho de Reale, no h como o estudioso do Direito individualizar, de

    forma absoluta, os elementos fato, valor e norma e obter um resultado cientfico satisfatrio,

    sob pena regressar a um tempo anterior tridimensionalidade concreta e dinmica.

    O mesmo autor, ao mencionar que o direito um s para todos os membros do respectivo

    grupo, no quer dizer que se tenha apenas uma nica Cincia do Direito, haja vista os vrios

    [...] objetos de cognio que a experincia do direito logicamente possibilita (REALE,

    2003, p. 53)

    Assim sendo, a partir de uma estrutura tridimensional, a experincia jurdica, precisa ser

    compreendida como fruto tridimensional de natureza normativa bipolar com as devidas

    atribuies. As respectivas caractersticas se tornam teis considerando que a experincia

    34

  • jurdica composta de homens e de coisas localizadas no mundo, agregadas de valorizaes

    conseqentes.

    A teoria tridimensional, ao utilizar a experincia jurdica, tem como um dos seus traos a

    prpria atualizao dos valores e o aperfeioamento do ordenamento jurdico. Observando

    esta realidade, assinala Reale:

    com fulcro no escopo normativo que temos a essencial ateno jurista, visando atualizao dos valores que nela se consagram. J o poltico do direito ou o legislador, olhos atentos para experincia jurdica em geral, cuidam de aperfeioar o ordenamento em vigor, para adequ-lo s novas exigncias da sociedade. (Reale, 1968, p. 121)

    Referendando a essa sistemtica (modelagem) dos valores em razo da experincia jurdica,

    afirma Reale:

    A formatao da experincia jurdica realizada, portanto, pelo jurista em contato direto com as relaes sociais, como o faz o socilogo, mas enquanto este se limita a descrever e explicar as relaes existentes entre os fatos, em termos de leis causais ou motivacionais, o jurista opera mediante regras ou normas produzidas segundo o processo correspondente a cada tipo de fonte que espelha a soluo exigida por cada campo de setores (Reale 1994, p. 41).

    Considerando a estrutura dialtica da teoria tridimensional, Reale reconhece que o direito

    uma realidade histrico-cultural, a qual no pode ser de forma alguma destacada da

    experincia social. Considerando a situao terica, alerta o mestre que, para a compreenso

    do Direito como fato histrico-cultural, implica o conhecimento de que estamos perante

    uma realidade essencialmente dialtica, isto , que no concebvel seno como processo,

    cujos elementos ou momentos constitutivos so fato, valor e norma, a que se d o nome de

    dimenso em sentido, evidentemente, filosfico, e no fsico-matemtico.(REALE, 2003).

    35

  • Portanto, referindo-se s atitudes humanas, o autor faz aluso experincia histrico

    cultural, a partir das diretrizes da cincia jurdica.

    Podendo inferir como fato tudo de real dado ou disponibilizado desde que possa ser valorado de forma integrada junto norma jurdica, pautando-se em um resultado conexo entre esses elementos: fato, norma e valor, enquanto contedo histrico-cultural. (Reale, 2003, p. 171)

    Para melhor compreender a teoria tridimensional do Direito, necessrio visualiz-la, a

    partir de um prisma dialtico, considerando que os subsdios compem material vivo da

    histria. Portanto, poder ser determinada uma forma futura capaz de convergir em fato,

    haja vista um outro processo de integrao normativa originado de novas exigncias

    valorativas, a dizer:

    Resumindo, o termo tridimensional pode ser compreendido como traduzindo um processo dialtico, no qual o elemento normativo integra em si e supera a correlao ftico axiolgica, podendo a norma, por sua vez, converte-se em fato, em um ulterior momento do processo, mas somente com referncia e em funo de uma nova integrao normativa determinada por novas exigncias axiolgicas e novas intercorrncias fticas. Desse modo, quer se considere a experincia jurdica, estaticamente, na sua estrutura, quer em sua funcionalidade, ou projeo histrica, verifica-se que ela s pode ser compreendida em termos de normativismo concreto, consubstanciado-se nas regras de direito toda a gama de valores, interesses e motivos de que se compe a vida humana, e que o intrprete deve procurar captar, no apenas segundo as significaes particulares emergentes da praxis social, mas tambm na unidade sistemtica e objetiva do ordenamento vigente. (Reale, 2003, p. 228)

    Aps a exposio de toda a argumentao, podemos deduzir que a interpretao da norma

    jurdica somente ter alcance efetivo, se aplicada de forma valorativa, conforme os ditames

    da teoria tridimensional. Assim, reconhecemos que o direito uma realidade histrico-

    cultural, a qual no pode ser de forma alguma destacada da experincia social como um

    todo.

    Atualmente, ainda sofremos reflexos diretos da aplicao da norma de forma positiva em

    boa parte do direito, em geral, de forma tendenciosa ao antropocentrismo.

    36

  • 2.3 Valorao normativa a partir do ecocentrismo no vis de Miguel Reale

    Atualmente, a norma de maior valor hierrquico em nossa cadeia jurisdicional, a

    Constituio Federal de 1988, denominada por alguns de Constituio cidad,

    reconhecendo valores inerentes ao bom e regular desenvolvimento biopsquico da pessoa

    humana. Pertinente ao Meio Ambiente, a mesma designou o Captulo VI, em forma de

    regra geral, tutela Ambiental. Ressalta-se o teor do artigo 225 do presente postulado

    legal:

    Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv-lo para as presentes e futuras geraes. (MEDAUAR, 2006, p. 146)

    Inicialmente, o pronome Todos, pode ser interpretado em dois prismas distintos, no vis

    antropocntrico, obviamente prestigiando exclusivamente a categoria do seres humanos,

    delimitando o acesso e as bencias ao meio ambiente equilibrado somente ao homem,

    considerando a falcia que o homem senhor e detentor absoluto do Planeta Terra.

    Em outra vertente, o pronome supra a partir da tica ecolgica ou ambiental, deve

    contemplar todo ser vivente, pertencente biosfera terrestre, ou seja, o compndio dos

    ecossistemas e nichos existentes em nosso planeta.

    Nas palavras do Professor Reale A Ecologia no se subordina Antropologia, o que a

    humanidade no raro esquece. O referido mestre tem como ponto de partida o

    jusnaturalismo, passando pelo humanismo renascentista, focando grandes nomes como

    Giambattista Vico, filsofo italiano, simpatizante da metafsica; intrprete da histria, a

    partir do historicismo que bem abordado por Hegel (1971), realiza vrios estudos focado

    na argumentao positivista e, por fim, realiza o estudo considerando a problemtica dos

    37

  • valores. Defende certos valores que denominados de invariantes valorativas ou axiolgicas

    como alguns preferem chamar, dando como exemplo a valorao do ser humano, a

    comear pelos direito fundamentais, como vida e liberdade.

    Considerando as invariantes valorativas ou axiolgicas, podemos dizer que elas so

    constantes e se pautaram nesta invariabilidade a fim de originar o valor ecolgico

    estampado em nossa Magna Carta/1988. Em detrimento do absolutismo, o Professor

    Reale confere ao ecolgico um valor absoluto, no obstante t-lo considerado a uma

    invariante valorativa ou axiolgica, diminuindo e ofuscando sua grandeza, enquanto

    protagonista da vida humana. Sustenta o ser humano como valor referncia a todos os

    valores e retira da natureza o valor interno, abordado crescentemente pela cincia e pela

    tica.

    Atualmente, a prioridade valorativa emanada do homem , por natureza antropocntrica.

    Neste vis, quando o filsofo Reale insiste na prioridade absoluta dos valores

    antropolgicos. Considerando o sentido apresentado, no mencionamos antropocntrico

    como cientfico e, sim, como valor, aquele valor interno e inalienvel da pessoa humana. E

    tambm relativo ao valor interno dos demais entes da natureza: minerais, vegetais e

    animais em seus devidos nichos.

    Considerando, o meio ambiente como uma realidade presente de seres reais que se

    integram e se relacionam, de forma contnua, ou melhor, de forma sistmica. o ser

    humano, por sua vez no desvinculado desse sistema, sequer suas relaes se reduzem,

    de forma inversa, pessoa humano, mesmo sendo racional, e possuindo particularidades,

    ainda um elemento, entre e como os demais elementos existenciais na esfera terrena.

    (MILAR, 2005).

    38

  • Portanto, seria mais sensato que a antropologia se integrasse de forma submissa

    Ecologia, haja vista, ser espcie do gnero, enquanto ecossistema global, e universal de

    relaes e inter-relaes realizveis freqentemente em seu bojo.

    Ressalta-se que no est em cheque a valorao do ser humano. O que no refutado pelos

    ambientalistas que possuem um posicionamento prprio a respeito. A partir deste

    posicionamento, cremos que o papel do Homem na biosfera e em toda a Terra seria uma

    espcie de intermedirio entre o Criador e as criaturas, ficando em uma posio talvez

    intermediria e, ao mesmo tempo, mista, enquanto criatura, e ao mesmo tempo, um co-

    gestor universal e ainda, sendo submisso s leis Universais.

    O questionamento inevitvel, partindo dessa premissa, indagamos at que ponto e at

    quando Homem ir sobrepor-se a todas as criaturas e ao prprio Oikos? Ironizando, o

    filsofo Reale, menciona: Tal atitude no seria o mesmo que brincar de ser o Criador

    Supremo, Deus?

    39

  • III - ESPAO NORMATIVO A PARTIR DA TICA INTERDISCIPLINAR.

    3.1. Surgimento da interdisciplinaridade

    Verificamos at o presente captulo, a importncia da epistemologia face concepo

    espacial, para resoluo dos conflitos da sociedade, que devem se pautar em uma

    normatizao eficaz, nacionalista e humana. Para tanto, deve ocorrer a juno de saberes

    locados em reas distintas, por meio do estudo conjuntivo dos saberes de forma

    interdisciplinar entre a normatizao do direito e a geografia espacial.

    O acumular do saber, o transpor do tempo, gerou a especializao. E certamente, no

    podemos negar os benefcios agregados com a especializao impulsionando o progresso

    informativo, tanto no universo fsico-natural, bem como no social, ampliando as frentes

    pesquisadas. (OLIVEIRA; GUIMARES, 2004)

    Assim sendo, considerando o mundo complexo dos dias atuais, este encaminhamento tem

    conduzido a uma fragmentao e dissociao entre vrios saberes, com resultados, muitas

    vezes, comprometedores da prpria apreenso da totalidade do objeto de estudo,

    propiciando vises incompletas e parciais. Isso tem ocorrido nas vrias reas dos saberes e

    particularmente na educao, em todos os seus nveis. Ressaltamos que a sistemtica de

    modelo linear e seqencial disciplinar produto de um modelo epistemolgico racional-

    positivista que se consolidou como hegemnico no pensamento ocidental e acabou por

    definir os espaos/tempos da pesquisa moderna, fundado nas noes de norma, seqncia e

    disciplina.

    40

  • Corroborando neste vis, Deleuze, (1995) e Foucault, (2003) afirmam que estamos

    transitando das sociedades disciplinares, analisadas por Foucault - que deram origem

    priso e escola como conhecemos hoje - para as sociedades de controle, que certamente

    engendraro novas instituies, assim como provocaro agudas transformaes nas que

    conhecemos. E, este espao de transio - problematizado por diversos autores

    contemporneos que vem sendo apontado como transio paradigmtica. Ainda que

    possam ser orientados por diferentes pressupostos conceituais, o fato que as teorizaes

    contemporneas nos levam a admitir que, a crise da modernidade colocou em questo a

    linearidade da histria e possibilitou o emergir de rupturas de diversas foras: sociais,

    culturais, econmicas, educativas gerando uma imprevisibilidade que preciso admitir.

    Neste contexto, ao aceitarmos a idia de que a histria do conhecimento, da verdade, da

    certeza, se encontra em conflito, temos tambm que admitir que esta histria no possa ser

    nem linear, nem carregar a noo de progresso. Tambm a noo de sujeito e de

    subjetivao tem de ser compreendida fora da lgica cartesiana em que o sujeito centro da

    ao. E, se o homem no mais o centro e sim uma das foras, o princpio da

    contemporaneidade deixa de ser o da Identidade para ser o da diferena (DELEUZE, 1991).

    E para romper o paradigma e as imperfeies do monismo disciplinar, surge nos anos 60 a

    interdisciplinaridade, permitindo observao do fenmeno por uma lente grande angular,

    permitindo na mobilidade que a sustenta uma aproximao ou distanciamento do fenmeno

    observado. A incurso do universo interdisciplinar de mltiplas teorizaes induz o

    aparecimento de novas hipteses que podem consolidar o jeito novo, a nova forma de

    conceber e realizar a abordagem temtica. Assim sendo, a interdisciplinaridade, conduzir,

    evidentemente, criao de expectativas de prosseguimento e abertura de novos enfoques

    ou aportes. Conquistando, a metodologia disciplinar parte de uma liberdade cientfica,

    41

  • pautando-se no dilogo e na colaborao, fundando-se no desejo de inovar, de criar, de ir

    alm e aprimorar-se na arte da pesquisa, no objetivando apenas uma valorizao tcnico-

    produtiva ou material, mas possibilitando um dinamismo ao saberes humanos,

    desenvolvendo a capacidade criativa de transformar a concreta realidade histrica.

    (FAZENDA, 1999).

    O segmento da educao defensor da necessidade da interdisciplinaridade, de um inter-

    relacionamento profcuo e complexo entre todas as disciplinas, com o objetivo de romper

    com as limitaes impostas pelas divises arbitrrias do saber.

    3.2 Teoria rizomtica aplicada

    Os filsofos Flix Guattari e Gilles Deleuze (apud FAZENDA, 1999) construram outra

    metfora para mostrar a interdisciplinaridade. No lugar da tradicional rvore do saber,

    criaram a metfora do rizoma, caule subterrneo de alguns vegetais, constitudo por bulbos

    portadores de uma multiplicidade de razes emaranhadas ou enlaadas e cujos elementos se

    inter-relacionam e se conectam de forma completa, formando um conjunto complexo.

    Para que se possa ter uma compreenso mais ampla das possibilidades de aplicao do

    conceito de rizoma na construo interdisciplinar que propomos para o ensino de geografia e

    direito, a seguir, enumeramos alguns de seus princpios e suas aproximaes com a

    formao de um saber rizomtico no vis de Fazenda.

    I Principiologia da conexo: todo e qualquer ponto de um rizoma pode ser/estar conectado a qualquer outro. Uma das principais caractersticas do rizoma , justamente, a ausncia de um centro pr-determinado. Assim, os temas apresentados mostram-se apenas como uma possibilidade de dar incio ao trabalho do Eixo temtico correspondente. Os campos de saberes no possuem uma hierarquia, uma centralizao curricular. Apresentam-se como redes de conhecimentos. A cartografia (o rizoma pode ser cartografado) mostra que o

    42

  • rizoma possui entradas mltiplas, ou seja, ele pode ser acessado a partir de inmeros pontos, podendo da, remeter a quaisquer outros em seu territrio. Estando conectado a normatizao valorativa do direito, ao espao geogrfico moderno, almejamos alcanar uma real conscientizao cidad, a fim de gerar a efetiva mudana de comportamento, em prol de atitudes harmnicas de convivncia. II - Principiologia da heterogeneidade: considerando que no existe disciplinarizao em territrios disciplinares, o rizoma rege-se pela heterogeneidade. Saberes que se desterritorializam e se interpenetram produzindo novas abordagens conceituais e metodolgicas. A partir desse vis, abre-se a oportunidade de exteriorizao do profissional alm do presente conhecimento tcnico, como o caso do Advogado discorrendo face ao espao geogrfico, em uma construo aqum ao universo tcnico da geografia.III Principiologia da multiplicidade: a teoria rizomtica sempre multiplicidade que no pode ser reduzida unidade, ou a homogeneidade. Uma multiplicidade no tem nem sujeito nem objeto, mas somente grandezas. Assim, a constituio interdisciplinar mista, inexistindo preponderncia ou dominncia, os diferentes saberes que constituem a magnitude da multiplicidade rizomtica. Santos, Kelsen, Reale, Corra so meros coadjuvantes, nesta abordagem, resguardando o papel principal aplicao interdisciplinar, formadora de uma nova tica ampliada e postura aplicada. IV Principiologia do romper a-significante: a teoria rizomtica no pressupe qualquer processo de significao, de hierarquizao. Mesmo constituindo um mapa, sua cartografia um devir. (Fazenda, 1999, p. 69)

    Assim sendo, pode-se pensar, desde a perspectiva rizomtica, que o Eixo Temtico se

    desterritorializa ao ser trabalhado pelos diversos saberes que o atravessam. Assim sendo, o

    mapa traado em cada um dos Eixos Temticos est em constante constituio, produzindo

    deveres com o sujeito e as redes de conhecimentos. A cartografia (o rizoma pode ser

    cartografado Princpio da cartografia) mostra que o rizoma possui entradas mltiplas, ou

    seja, ele pode ser acessado a partir de inmeros pontos, podendo remeter a quaisquer outros

    em seu territrio.

    Tomando por base o modelo rizomtico, o qual sugestiona novas possibilidades de

    abordagem do conhecimento, rompendo com o paradigma fragmentalizado do saber ou com

    a disciplinaridade (fruto do modelo arbreo), prope-se a transversalidade ou saberes

    transversais, ou seja, saberes que atravessam as vrias reas do conhecimento (FAZENDA,

    1999).

    43

  • nesse sentido que pretendemos desenvolver o presente texto, buscando a

    interdisciplinaridade. Evitando o isolamento ou a falta de interao do Direito com as

    demais reas do conhecimento, em especial com a Geografia, de forma a propor o

    paradigma rizomtico.

    Tomando por norte os dizeres de MACHADO (2003), a interdisciplinaridade no elimina as

    caractersticas de cada disciplina e no impe uma mesma viso e uma mesma linguagem a

    todos. Alm disso, evita abordagens redundantes e incompreensveis. Se houver disparidade,

    ou at antagonismo, essa circunstncia no deve ser ocultada, mas explicada.8

    Para realizar uma abordagem interdisciplinar, primeiramente nos reportamos Geografia, ao

    pesquisar sobre o estudo do espao geogrfico, cuja apropriao, construo, reconstruo e

    organizao so reguladas por um conjunto de leis e normas que regem a vida em sociedade,

    percebe-se, de forma dialtica, a interdisciplinaridade entre ela e o Direito.

    Assim sendo, percebemos que o espao geogrfico no possui somente uma dinmica

    natural, mas tambm uma dinmica social que exercida pelas formas sociais que nela

    vivem e atuam. Ao se apropriar da natureza e ao transform-la, a sociedade cria ou produz o

    espao geogrfico, utilizando as tcnicas de que dispe, segundo o momento histrico e

    segundo as suas representaes, ou seja, crenas, valores, normas (Direito) e interesses

    polticos e econmicos. Desse modo, no se pode ignorar que os espaos geogrficos

    possuem uma historicidade, ou seja, so realidades temporais, pois a cada gerao humana

    corresponde a uma gerao espacial, mediada no seu processo de apropriao de riquezas e

    de organizao pelas normas ou pelas leis vigentes.

    Sabendo que o ser humano por sua natureza um ser gregrio e no age de forma isolada e

    sim coletivamente, no processo de produo do espao geogrfico, conclui-se que ele 8 PHILIPPI JR e ALVES, Em sua obra, Curso Interdisciplinar de Direito Ambiental., 2005. p. XIX, (Paulo Afonso Leme Machado, ao prefaciar a referida obra, externa, de forma sinttica, sua viso interdisciplinar).

    44

  • socialmente elaborado ou produzido, corroborando o seu carter de produto social ou ainda

    de produto histrico-social.

    Temos que o espao geogrfico , inequivocamente, a expresso do visvel de como a

    sociedade est organizada segundo as normas estabelecidas. Nele esto expressas as

    desigualdades sociais, a distribuio do poder, o jogo de interesses e de presses existentes

    entre grupos e classes sociais sobre o Estado, conduzindo este, historicamente, no veculo

    permissivo da construo de espaos em benefcio de alguns e no de todos.

    Portanto, podemos reconhecer que o espao geogrfico um produto histrico-social e a

    expresso da distribuio do poder existente numa dada sociedade, podemos, sem receio,

    afirmar que ele possui um contedo ideolgico e poltico, ou como afirmou o filsofo

    Lfbre apud: Azuelle,

    A formao do espao se deu a partir de elementos histricos ou naturais. A produo do espao no pode ser comparada produo de tal ou qual objeto particular, de tal ou qual mercadoria. E no entanto existem relaes entre a produo de coisas e a produo do espao. E isso devido a grupos particulares que se apropriam do espao para administr-lo e explor-lo. (LFBRE apud: AZUELLE, 1972, p. 115-116)

    A abordagem conectiva entre o Direito Normativo e a Geografia Espacial vem disciplinar o

    processo de relao, apropriao e produo no espao geogrfico. Podemos observar que a

    cincia sempre entendida como a expresso de seu tempo e aqui se inclui a Geografia, o

    Direito e as demais cincias que esto a servio de todos, melhorando e harmonizando o

    convvio social, atravs de regras de convvio so pautadas na democracia participativa,

    evitando a segregao socioeconmica espacial.

    O estudo interdisciplinar entre Geografia Espacial e Direito Normativo, no vis da

    construo e reconstruo do espao, do aproveitamento dos recursos naturais, da proteo

    ao meio ambiente, da questo fundiria, do uso do solo urbano, da distribuio da renda e de

    45

  • muitas outras contradies que marcam o presente perodo histrico dificilmente ser

    resolvido, se no houver um grande dilogo entre os saberes, um elucidar objetivo da

    realidade social e uma educao no-discplinar, que acreditamos ser uma exigncia da

    contemporaneidade.

    Finalizamos este tpico com base na argumentao do filsofo alemo Hegel, que se

    manifesta da seguinte forma:

    Antes que o novo tenha condies de surgir, necessrio que o antigo atinja a sua plenitude, ou seja, a sua forma mais plena. O momento em que um sistema atinge o seu auge o momento que precede o seu esgotamento e superao. (HEGEL, 1971, p. 344)

    Portanto, percebemos que o atual sistema de regulamentao espacial socioeconmica no

    fornece suporte satisfatrio, a fim de agregar ao ser humano a evoluo do saber,

    implantao de uma conscincia valorativa personalssima, ou se quer coibir a expanso do

    mercantilismo dominante, bem como regular a distribuio de renda, entre outras facetas,

    discernindo, assim o que patente e o que latente.

    IV IMPLEMENTAO EFETIVA DO DIREITO AMBIENTAL

    4.1 Justificativa do Direito Ambiental.

    46

  • A Revoluo Industrial foi protagonista, no cenrio internacional, do desequilbrio

    ambiental, devido a acelerao da extrao dos recursos naturais, para atender a demanda

    crescente das populaes em desenvolvimento urbano, gerando assim, alimento cobia

    humana, resultante, portanto, de um poder a qualquer custo e em um curto espao de tempo.

    Houve a participao direta tanto dos proletrios, movidos pela ganncia, quanto dos pobres,

    movidos pela necessidade de sobrevivncia. Tal situao gerou um desequilbrio social e

    ambiental muito grande, capaz de mudar de uma vez por todas a realidade de nosso planeta

    (GOMES, 1996). Assim, o homem modificou sua viso do mundo, no mais se

    considerando parte da natureza, mas sim, senhor absoluto, a escravizando e explorando seus

    recursos como se fossem inesgotveis. As conseqncias foram inevitveis, resultando uma

    poluio crescente, com malefcios visveis a toda sociedade. Surgiu, o despertar de uma

    conscincia social, considerando que a continuidade desse processo poderia resultar na

    extino da espcie humana. A partir de Estocolmo em 1972, essa preocupao disseminada

    pela sociedade internacional, gerou como conseqncia, atitudes, que por sua vez no

    poderiam ser diferentes, implicando em mudanas na esfera pertinente ao convvio social

    pautado no desenvolvimento sustentvel.

    E j temos mais de 35 (trinta e cinco) anos da realizao da Conferncia das Naes Unidas

    sobre o Meio Ambiente Humano e seu futuro. Realizada em 1972 foi reconhecido como

    marco histrico, resultante de um movimento ambiental permanente e crescente, que vem se

    consolidando ao transpor do tempo, passando do campo terico ao campo da ao (atitude),

    por intermdio da tomada de conscincia dos governos e da sociedade, resultante de uma

    nova forma de gesto de polticas pblicas, priorizando o desenvolvimento sustentvel.

    47

  • No Brasil, tal alerta resultou na ao de implantao da Poltica Nacional do Meio

    Ambiente, Lei n. 6.938/81, que foi o marco inicial ou seja a implantao do primeiro

    diploma legal, que cuidou do direito do meio ambiente como um direito prprio autnomo.

    Antes disso, a proteo do meio ambiente era feita de modo mediato, indireto e reflexo, na

    medida em que ocorria apenas quando se prestava tutela a outros direitos, tais como direito

    de vizinhana, propriedade, regras urbanas de ocupao de solo, etc.

    Como o nome mesmo j diz, a referida Lei criou a Poltica Nacional do Meio Ambiente,

    sendo muito mais do que um simples conjunto de regras, mas estabelecendo uma poltica

    com princpios, escopos, diretrizes, instrumentos e conceitos gerais sobre o meio ambiente.

    A Constituio Federal de 1988, seria o arcabouo jurdico que faltava para que o direito

    ambiental fosse iado categoria de direito autnomo, haja vista estarem esculpidos, na

    Magna Carta, os prprios princpios do direito ambiental. Nestes termos, no h dvida que

    a Lei n. 6.938 foi recepcionada pela norma maior.

    Conforme tendncia mundial, aqui no Brasil o direito ambiental passa a possuir status do

    direito autnomo, constitucionalmente amparado, previsto em um capitulo prprio, no art.

    225.

    A partir deste momento, nota-se por parte do legislador uma elaborao acentuada de leis

    direcionadas tutela do meio ambiente, podemos citar como exemplos dentre as muitas

    existentes:

    Lei dos Agrotxicos n. 7.802/89, Crimes ambientais Lei n. 9.605/98, Lei da Explorao

    mineral n. 7.805/89, Recursos hdricos Lei n. 9.433/97, Lei de Educao ambiental n.

    9.795/99.

    perceptvel que temos um arcabouo jurdico farto em legislao ambiental digno de

    Pases de primeiro mundo. Mesmo assim, nos deparamos de frente com uma realidade

    48