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ENSAIO HISTÓRICO-JURÍDICO-SOCIAL PARTE 2ª ÍNDIOS eBooksBrasil 1

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ENSAIO HISTÓRICO-JURÍDICO-SOCIAL

PARTE 2ªÍNDIOS

eBooksBrasil

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A Escravidão no Brasil - Vol. II (1867)Agostinho Marques Perdigão Malheiro (1824 -

1881)

Fonte digitalDigitalização de edição em papel de 1867

Rio de Janeiro - Typografia Nacional - Rua daGuarda Velha

1867

Transcrição para eBookeBooksBrasil

© 2008 Agostinho Marques Perdigão Malheiro

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Francisco de Paula Ferreira de Rezende,primo do Autor, nos dá este testemunho dossentimentos abolicionistas de Perdigão Malheiro:

“(..) legítimo branco, neto defazendeiros e ele mesmo senhor deescravos, não duvidou, no entanto, emum tempo em que falar em aboliçãoera mais que um crime e era quase umsacrilégio, de escrever um livro que elemuito bem sabia não havia de tercompradores; e isto unicamente paraconvencer a quem não queria serconvencido, que a escravidão era amaior de todas as iniqüidades, fossequal fosse o ponto de vista debaixo doqual se a pudesse considerar.

E como (..) era preciso queninguém pudesse duvidar da suaprópria sinceridade, ele que nãodispunha de uma muito grandefortuna, libertou a todos os seusescravos.”

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O livro mencionado é o “A Escravidão noBrasil (Ensaio Histório-Jurídico-Social)”, em 3volumes, editados pela Tipografia Nacional, oprimeiro deles em 1866, ano em que PerdigãoMalheiro terminava sua gestão à testa doInstituto dos Advogados do Brasil.

É o 2.° volume (Índios), de 1867, que oracoloco nas estantes virtuais eBooksBrasil. E oescolhi porque Perdigão Malheiro tem muito anos dizer hoje, como o tinha quando o escreveu,sobre questões sobre as quais ainda nãoencontramos a solução e com as quaiscontinuamos a nos debater.

Espero que o eventual leitor entenda que,originado de uma fonte em cola e papel de 1867,em muitos pontos esvanecida pelo tempo, afidelidade ao original pode deixar muito adesejar. Mas lhe asseguro que estará lendoexatamente como li, com a ajuda, nos trechosmais esmaecidos, de lupa para poder, na medidado possível, precisar datas, distinguindo os 3 dos5, os 9 dos 0; tentando atualizar, no melhor domeu possível, para o português hoje corrente,para benefício das novas gerações.

No futuro, talvez, os “órgãos competentes”,providos de mais recursos do que os meus,possam fazer circular uma edição digital maisfidedigna. Até lá, o leitor e eu teremos que nos

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contentar com o que foi possível.

Boa leitura!

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ENSAIO HISTÓRICO-JURÍDICO-SOCIAL

PELO

Dr. Agostinho Marques Perdigão Malheiro

_______________________________

PARTE 2.ª

_______________________________

ÍNDIOS

RIO DE JANEIRO.TYPOGRAPHIA NACIONAL,RUA DA GUARDA VELHA.

____________1867

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INTRODUÇÃO

Parte II. — Título Único. — Escravidão dos índios.—Extinção da mesma. — Catequese e civilização.

Cap. I. — Os índios ao tempo da descoberta do Brasil.— Generalidades

Cap. II. — Expedições. — Primeiras relações com osnaturais. — Introdução da escravidão dos índios. —Seu desenvolvimento. — Determinações a respeito. —Colonização. — Regime colonial

Cap. III. — Colonização; regime colonial (continuação).— Catequese — Os Jesuítas — Padres Manoel daNóbrega, José de Anchieta — Missões de índios. —Guerras dos mesmos. — Novas providências sobre oseu cativeiro

Cap. IV. — Leis de escravidão dos índios. — Jesuítas, ecolonos. — Leis de liberdade dos gentios. — Novas leisde escravidão. — Caçadas de índios. — Os Paulistas

Cap. V. — Bula do Papa Urbano VIII a favor dos índios.— Oposição do povo. — Expulsão de Jesuítas. —Administração de índios. — Padre Antônio Vieira. —Aldeias. — Entradas nos sertões para descer gentios. —

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Nova expulsão de Jesuítas. — Novas leis sobre índios eJesuítas. — Guerra aos índios; destruição de tribos

Cap. VI. — Leis sobre liberdade dos índios. — MissõesJesuíticas. — Regimento das missões. — Novas leis deescravidão. — Descimento de índios. — Guerras dosmesmos. — Novas providências.

Cap. VII — Bula de Benedito XIV a favor dos índios. —Novas providências sobre os mesmos. — Guerra dasMissões no Rio da Prata. — Oposição no Amazonas. —Os Jesuítas. — Leis de liberdade absoluta dos índios.— Nova forma do seu governo temporal. — Diretóriopara o Maranhão e Pará. — Expulsão dos Jesuítas. —Decadência das aldeias; dispersão dos índios. —Abolição do Diretório. — Novas providências

Cap. VIII. — Restauração do sistema do terror contra osíndios. — Guerra aos mesmos. — Bandeiras. — Novasprovidências para a sua catequese e civilização. —Sistema misto

Cap. IX. — Direito novo. — Abolição completa edefinitiva do cativeiro e servidão dos índios. — Proteçãoe favores. — Sistema atual. — Futuro dos índios ante acivilização. — Conclusão.

Notas

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Nesta 2ª Parte do presente Ensaio vaisucintamente historiada a escravidão dos índiosaté sua completa e definitiva abolição.Comprende-se que não era possível deixar deentrar no plano desse trabalho semelhanteassunto, de cuja importância se fará idéiaaproximada com a leitura desta 2.ª Parte.

Mo era possível, também, prescindir dehistoriar ligeiramente a catequese e civilizaçãodos índios.

E como esta se prendia e prendeimediatamente à colonização, e civilização doBrasil, foi alargado um pouco o quadro, dando-seigualmente notícia muito abreviada da povoação,desenvolvimento e progresso do país.

Intimamente ligada, identificada com a dosíndios é a história dos Jesuítas. Eraabsolutamente indispensável acompanhá-los apar e passo com os índios, desde que pisaramem a terra do Santa-Cruz até que foramexpulsos.

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Por último, havendo ao trabalho uma partesocial, são aventadas algumas idéias sobre acatequese e civilização dos indígenas.

Eis em poucas palavras o plano desta 2ªParte, e os motivos do mesmo plano.

Cumpre-me, porém, declarar alto e bomsom que não tenho a vaidosa pretenção de haverescrito obra completa; muito longe disso, apenasum ensaio: outros o farão.

Também não tenho a louca aspiração deinstruir pessoa alguma, nem de ver abraçadasalgumas de minhas idéias; sobretudo em umpaís tão rico de elevadas inteligências, de sábios,e de ilustrações:— não é para esses que euescrevo, que nos meus escritos nada têm queaprender.

Estes meus trabalhos são apenas umprotesto que do fundo do meu gabinete e naminha obscuridade desejo fazer a bem de nossacivilização atual, das idéias e sentimentos dopovo Brasileiro. A liberdade dos índios é desde1831 garantida pelas leis do um modopermanente e inconcuso; foi a vitória das idéiasliberais, da civilização e humanidade. Restasomente a dos Africanos e seus descendentes,que ainda gemem nos grilhões do cativeiro. Mastudo se dispõe para esse outro grande triunfo,

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porque está na consciência de todos a justiça, aconveniência, a necessidade da sua abolição:apenas se diverge quanto ao modo e tempo.

Com o auxílio de Deus (pois que doshomens o não tenho), espero publicar breve a 3.ªParte deste Ensaio, onde exporei algumas idéias,concorrendo assim com a minha boa vontade embem da pátria, digna do mais brilhante eventuroso futuro.

Rio de Janeiro, 26 de Fevereiro de 1867

O Autor.

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ESCRAVIDÃO DOS ÍNDIOS. — EXTINÇÃO DAMESMA.— CATEQUESE E CIVILIZAÇÃO.

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OS ÍNDIOS AO TEMPO DA DESCOBERTA DO BRASIL. —GENERALIDADES.

Tendo por fim especial nesta segundaparte do presente opúsculo historiarsucintamente a escravidão dos Indígenas até quefoi definitiva e realmente extinta, econseqüentemente tratar também da catequese ecivilização dos mesmos não só no ponto de vistahistórico mas igualmente no social, pede a boaordem que alguma notícia se dê dos índios doBrasil ao tempo em que teve lugar a suadescoberta.

Não investigaremos — quando, como, e porquem foi povoado o Brasil antes dela—; sãoquestões, é verdade, de interesse histórico, eprincipalmente científico(1), mas alheias aoobjeto que nos propomos(2).

Pela mesma razão não nos demoraremoscom a classificação dos povos que ocupavamentão o território que constitui hoje o ImpérioBrasileiro(3).

Pretendem alguns que existiu um tronco

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comum, d’onde provieram as diversas nações etribos, concorrendo não pouco para corroborartal opinião a existência de uma denominadalíngua geral Guarani ou Tupi, e certa comunhãode tradições, de usos e costumes, e de idéias.Outros, porém, concluem que não háclassificação possível(4).

O certo e averiguado é que, ao tempo emque Pedro Álvares Cabral tocou em terraAmericana, e engastou na coroa do Rei dePortugal D. Manoel, o Afortunado mais esseprecioso diamante, que depois se chamou Brasil,era o país habitado por tribos diversas de índios,que, embora alguns indícios demonstrassem decerta comunhão talvez outr’ora existente denacionalidade ou de raça, todavia se distinguiamperfeitamente umas das outras pelas suasqualidades físicas, por sua língua, usos ecostumes, carácter, índole, e outroselementos(5). Das relações dos primeirosdescobridores, dos primeiros povoadores, doshistoriógrafos mais antigos das cousas do Brasil,dos Jesuítas e outros, em máxima parteconfirmadas pelos estudos posteriores e atécontemporâneos, assim como por ilustradosviajantes que têm percorrido diversas partes doImpério, alguma cousa se pode dar como exatoem relação aos usos e costumes da generalidadedessas tribos, seu estado social, sua indústria,suas habilitações para as ciências e artes, sua

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disposição enfim para a civilização européia(6).

Entre eles era admitido o casamento comoa base da família(7). Em regra dependia doconsentimento paterno; mas, recusado este, àsvezes era a mulher havida à força. As núpciaseram celebradas com certos ceremoniais, emboraafetados da rudimental civilização em que entãose achavam; o festim transformava-se emverdadeira bacanal. Das próprias prisioneiras,que reduziam à escravidão, não poucas vezesfaziam suas eoncubinas e mulheres. A poligamiaera tolerada, conforme os baveres e forças dovarão; mas sempre distinguiam uma como apredileta, e verdadeira esposa. O adultério damulher, porém, era tido em horror, e punido, àsvezes, com a morte. A autoridade marital erareconhecida e sancionada, ao ponto exageradode tratarem, embora não de modo geral, asmulheres antes como escravas, do que comoverdadeiras consortes na vida comum quelevavam(8).

Sobre os filhos era reconhecido o pátriopoder conquanto se abstivessem de correçõescorporais(9).

O estado social era imperfeitíssimo,vivendo os índios por grupos mais ou menosnumerosos, em aldeias ou tabas, quase sempreem perfeita promiscuidade de homens, mulheres

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e crianças. Reconheciam, porém, a autoridade deum chefe que denominavam morubixaba; comquanto em negócios de maior monta e gravidadetomasse toda a tribo parte nas deliberações. Ocomunismo excluía questões de propriedade; oroubo era desconhecido. No sistema penalvingava o do talião(10).

Essas tribos viviam em quase contínuasguerras, não com o fim de se apoderarem doalheio, mas principalmente para se vingarem dealguma afronta ou injúria recebida, e (sobretudomais tarde) para fazerem prisioneiros. Muitasvezes os ataques tinham por fim especial raptaras mulheres para se proverem de consortes ouconcubinas. Os prisioneiros eram reduzidos àescravidão, principalmente as mulheres. Osvarões eram, por via de regra, devorados pelosvencedores em festins extraordinários, comformalidades próprias, e regozijo extremo de todaa tribo; a tanto eram arrastados pelo ódio evingança contra os seus inimigos, e também poruma errada crença religiosa(11).

Simples, frugais, corajosos, generososmesmo e hospitaleiros eram, em geral, os índios;sentidos apurados, força física notável, destrezaem manejar suas armas, e outros dotesestimáveis, em quase todos se notavam(12).

Da sua indústria dão idéia suficiente os

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artefatos de barro, de palha, de embira, demadeira, de pedra e de outras substâncias, deque se serviam para os seus usos, emboralimitados às suas escassas necessidades; o ouroe pedras preciosas nenhum valor para elestinham(13).

Tudo neles revelava o povo no estado deatrasadíssima civilização; mas nem por issodeixavam de ter alguma. Se não eram como osdo México e Peru, com suas belas cidades, seusImperadores ou Incas, sua riqueza, suas leis,seus costumes, seus templos, e tudo quanto aíforam encontrar de prodigioso Cortez, Pizarro, eoutros(14), seria inexato e injusto dizer que os doBrasil eram absolutamente bárbaros(15).

Se a religião não tinha templos, nem poristo deixavam de reconhecer a existência de umEnte Supremo Tupan, que lhes era manifestadopelo trovão e raio; tinham seus sacerdotes pajés,(que viviam retirados da sociedade, e eram aomesmo tempo os seus médicos, sendo recebidosna aldeia quando a ela vinham com asdemonstrações do mais profundo respeito(16).

Na imortalidade da alma davam indícios deacreditar, como consta das tradições colhidas, ese depreende do estudo dos seus sarcófagos ousepulturas(17).

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Sua aptidão para os diversos trabalhos eindústrias, para as artes, e mesmo para as letrase belas artes, demonstra-se pelos produtos desua indústria, embora imperfeitos, e dos quais seapropriaram os colonos logo desde os primeirostempos introduzindo-os na sua indústria e usos;demonstra-se ainda melhor pelo que mais tarde,devido sobretudo aos esforços dos PadresJesuítas, eles fizeram, e que se pode qualificarde verdadeiros prodígios(18).

Diz-se que eram falsos, infiéis,desconfiados, e até bárbaros(19). Se alguns semostraram tais, e cometeram mesmo traições,sobretudo em épocas posteriores e diversas, foiantes por vingança, ou por justa desconfiança erepresália contra os que já então e desde ocomeço se fizeram seus opressores e gratuitosperseguidores. Na quase generalidade os índiosse mostraram sempre de fácil acesso e trato,desejando mesmo as relações dos estrangeiros; eaté foram generosos protetores de muitos, quealiás poderiam ter morto e devorado(20).

Os Indígenas eram, pode-se dizer,nômadas; conquanto em extensão determinadade território se vissem predominar certas tribos.Suas tabas eram de pouca duração. Tribos haviaagrícolas; e portanto de costumes mais brandos,de mais sociabilidade. Outros mostraram-sedestros cavaleiros(21). O litoral e as margens dos

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rios eram os lugares mais povoados, de que dãonotícia as relações dos descobridores e viajantes;a pesca a isto convidava; eram, portanto,também navegantes. Outros viviam internadospelos sertões; a caça, os frutos silvestres eram oseu principal recurso: mais atrasados e bárbarosdeviam naturalmente ser do que aqueles(22).

Tais eram, em rápido esboço, os povos queocupavam o território brasilíco desde o Prata atéo Amazonas, desde o Oceano até o Paraguai,quando os Portugueses a ele aportaram em 1500da era de Cristo.

Que destino tiveram? Por que revoluçõespassaram depois da descoberta? Acasoaproveitaram eles da civilização européia? Qual oseu estado presente? Qual o seu futuro ante acivilização?

Tais são as questões que nos vãosuecessivamente ocupar.

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EXPEDIÇÕES. — PRIMEIRAS RELAÇÕES COM OSNATURAIS. — INTRODUÇÃO DA ESCRAVIDÃO DOS

ÍNDIOS. — SEU DESENVOLVIMENTO. —DETERMINAÇÕES A RESPEITO. — COLONIZAÇÃO. —

REGIME COLONIAL.

É um fato, infelizmente confirmado pelahistória, que desde a mais remota antigüidade ovencedor ou conquistador, quando não matava ovencido ou o prisioneiro, reduzia-o à escravidão.Pretendeu-se mesmo que fosse esta última regraum progresso no Direito das gentes, um ato dehumanidade; no entanto que era realmente demaior ferocidade por afetar já nãoexclusivamente o prisioneiro, e simindefinidamente toda a sua descendência.

Entre os índios acontecia que, em vez dedevorarem os prisioneiros, reduziam-os ao seucativeiro, sobretudo as mulheres que nãohouvessem tomado parte ativa na guerra; dasquais não raras vezes faziam suas consortes. Osfilhos, porém, eram livres, se livre o pai; porqueentre eles seguia o filho a condição do pai e nãoa da mãe(23): do que há exemplo também em

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povos do velho mundo, quais foram osVisigodos(24).

Quando Cabral, depois da sua felizdescoberta, resolveu seguir sua viagem para aÍndia, conforme as instruções que recebera,expediu ao Rei de Portugal, como devia, umemissário, Gaspar de Lemos, a instruí-lo de talachado; e, em troca de dois criminosos quedeixou na terra, fez embarcar, entre outrascousas, dois dos seus naturais como amostrados novos súditos d’El-Rei(25).—Os índios(Tupininquins) mostraram-se dóceis e bondosos;assistindo mesmo com reverência à missa que secelebrou(26).

Em o ano seguinte 1501 teve lugar aprimeira expedição de exploração da costa doBrasil, vindo como piloto e cosmógrafo AméricoVespucio, o qual percorreu o litoral desde o cabode S. Roque até o de Santa Maria; destaexpedição ficou na Cananéia para cumprir apena de degredo um bacharel, que 30 anos maistarde ainda aí foi encontrado(27).

Em 15003 veio nova expedição, com omesmo Américo. Fundou-se nesta época aprimeira feitoria portuguesa no Brasil, próximode Porto Seguro, onde fundeara a esquadrilha deCabral, e à qual se deu o nome de Santa Cruz,composta do pessoal de 24 homens(28).

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É provável que de outras armadas que poreste tempo se dirigiam à Índia, alguns naviosque aportaram ao Brasil tivessem deixadocolonos, mas não é isto bem averiguado(29).

A atenção do Governo Português estavaabsorvida pelas conquistas na Índia e África,para onde se expediam grandes armadas, egrandes capitães quais os Almeidas, osAlbuquerques. De sorte que houve intermitênciade explorações das costas e território do Brasilpor parte do mesmo Governo(30).

Mas, havendo começado o tráfico de certosgêneros do país e sobretudo do pau brasil d’ondeveio o nome que lhe ficou), os contratadoresmandavam navios de conta própria a essecomércio. Do número destes foi a nau Bretoa,que, saindo de Lisboa em 22 de Fevereiro de1511, aí voltou no fim de 8 meses, levando, alémdo pau brasil e outros gêneros, para cima de 30índios cativos.(31).

No entanto havia expressa recomendaçãodo Rei para que se tratasse bem aos naturais daterra, e nenhum fosse levado para a Europa indaque o quisesse, afim de que não pensassem osoutros que os matavam para seremdevorados(32).

Ao contrário disto, em Espanha se havia

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declarado por uma lei de 1504 legítima aescravidão dos Caraibes por antropófagos ebestiais; o que deu lugar a que para as partes doNorte do Brasil aparecesse navio a carregarescravos(33).

Outras expedições, anteriores mesmo à deCabral, tiveram lugar pelo Amazonas ouMaranhão, e costa do Norte, quais as de Alonsode Hojeda, Vicente Yanes Pinzon, e Diogo deLepe(34). Mas serviram apenas de prevenir osIndígenas contra os descobridores pelas lutastravadas entre os mesmos e esses primeirosnavegantes(35).

Ainda outras se seguiram por parte daEspanha, quais de João Dias Solis em 1508 e1815, de Fernando de Magalhães e Ruy Falleiroem 1519. — Nada, porém, de notável quanto aosIndígenas em relação ao Brasil.

Parcialmente sucedeu que naviosnaufragassem em diversas paragens, e quealguns indivíduos se aventurassem em viagensfluviais e terrestres. A muitos coube a tristesorte de serem mortos e devorados pelos índios.Outros, porém, eram por eles recebidos etratados com a maior fidelidade e amizade. Nãopoucos são os exemplos; de que basta referir ode Diogo Álvares, denominado o Caramuru:naufragado pela altura da Bahia em 1510, foi

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poupado pelos índios, entre os quais veio a tertal predomínio e estima, que se constituiu, parabem dizer, seu Chefe, e se casou com a célebreParaguassú; a ele deveram mais tarde osPortugueses relevantes serviços(36). É assim queoutros Portugueses, e mesmo Espanhóis eFranceses foram encontrados estabelecidos emdiversos lugares do tão extenso território, emplena paz e harmonia com os naturais(37); sendodigno de notar que Portugueses dos navios daÍndia e de contratadores procedessem porsemelhante forma deixando-se ficar em terra,contra a proibição da lei.

Outras expedições tiveram lugar em datasposteriores por parte de navegadores Franceses,estimulados pelos lucros prodigiosos queretiravam dos gêneros do Brasil mais estimadose procurados nos mercados europeus(38). Bemcomo por parte de Espanhóis, distinguindo-se asdo Diego Garcia, D. Rodrigo d’Acuna, e SebasliãoCabot em 1525 e 1526. Por eles foramencontrados Castelhanos, de longa data aíestabelecidos; e muitos dos seus também sedeixaram ficar por a isto os convidar a terra(39).

Pela mesma época, fins de 1526, aportavaCristovão Jacques com a sua esquadrilhadestinada a defender a costa do Brasil contrainvasões estrangeiras. Tendo fundado emIgarassú a feitoria de Pernambuco, e feito uma

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excursão ao Sul, retirou-se para Portugal.Vindo-lhe a idéia e desejo de ser donatário noBrasil, obrigando-se a introduzir aí mil colonos,comunicou-o a Diogo de Gouvêa, que otransmitiu com empenho ao Rei D. João III, quedesde 1521, por morte de D. Manoel, governavao Reino. Desde então começou a germinar a idéiade estabelecer na terra de Santa Cruz um núcleoforte de colonização, visto a quaseimproficuidade das esquadras, o grande despesaque importava este gênero de guarda edefesa(40).

Preparada a frota, foi o seu comandoconfiado a Martim Afonso de Souza; ao qual sederam poderes extraordinários, com alçada nocrime e civel, tanto para o mar como para aterra; assim como de dar sesmarias, mas poruma só vida(41). Em 31 de Janeiroo de 1531alcançou o Cabo de Santo Agostinho; e, depoisde destroçar e aprisionar navios Franceses queaí encontrou, seguiu para a feitoria dePernambuco; da qual saindo para o Sul, entrouna Bahia de Todos os Santos, onde encontrou oPortuguês Diogo Álvares o Caramuru, em cujacompanhia deixou dois homens(42). Obrigado aarribar, voltou de novo à Bahia; e aí achou umacaravela, que tomou a seu serviço, depois defazer desembarcar os escravos que elatransportava(43). Descendo para o Sul entrou noRio de Janeiro, onde se demorou três meses,

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bem tratado pelos da terra, a quem igualmentetratou bem(44). Proseguindo, ancorou junto àCananéia, onde encontrou o bacharel PortuguêsFrancisco de Chaves e vários Espanhóis. Jáentão os escravos se contavam por centenas,pois que o dito bacharel ofereceu-se-lhe trazerdentro de dez meses 400 escravos carregados deprata e ouro(45).

Continuando na sua viagem, cujo fim era oestabelecimento no Rio da Prata, e sofrendogrande temporal, despachou seu irmão PeroLopes de Souza a continuar a assentar padrõesde posse. De volta, entrou Martim Afnso, emJaneiro de 1532, no porto de S. Vicente, ondeencontrando o Português João Ramalho, que aívivia entre os índios há vinte anos, se deliberoua fundar uma colônia, a primeira regular que noBrasil se levantou, não existindo até então senãoas pequenas feitorias de Santa Cruz, Igarassú, eSanta Catarina. De acordo com Ramalho, e paramaior auxílio da colônia marítima, fundou aomesmo tempo outra em Serra-acima junto aPiratininga, d’onde veio o nome à aldeia, e é hojeS. Paulo; cujo governo confiou do mesmo JoãoRamalho, nomeado guarda-mor(46).

No entanto o governo da Metrópoleocupava-se agora com mais interesse depromover a colonização da possessão Americana;e resolveu-se a dividi-la em grandes capitanias,

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que seriam distribuídas, como foram(47), porpessoas dignas por seus serviços e fidalguia, ouriqueza, com obrigação de trazerem gente e naviosà sua custa(48).

Essas doações eram de juroe herdade, e jánão simples sesmarias por uma só vida, como aprincipio se tinha assentado: e acompanhadasde concessões extraordinárias aos donatários,com alçada até morte natural aos peães,escravos, e índios, atribuições judiciais,nomeação de autoridades e empregados,distribuição de sesmarias conforme as leis doReino, assim como de cativar gentios para o seuserviço e dos navios, e de mandá-los vender àLisboa até certo número cada ano livres de sisa, aque eram aliás sujeitos os escravos que alientravam(49); doações confirmadas pelos foraisde cada capitania(50).

O governo reconhecia e legalizava assimcom a sua autoridade soberana e onipotente ofato abusivo e odioso da escravidão dosIndígenas; e, longe de reprovar e punir, quase sediria que o acoroçoava.

É verdade que os Espanhóis haviam dadoo exemplo perverso de cativarem os desgraçadosíndios logo desde a primeira descoberta (1402)por Cristovão Colombo; a história das conquistaspor eles feitas o demonstra para opróbio eterno

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dos descobridores e sua gente(51). É verdade quea Espanha fazia o comércio de escravosAfricanos, que de Sevilha saíam para diversaspartes. É verdade que leis de Espanhaautorizaram o cativeiro de alguns índios, v. g. osCaraibes, e que até os mandavam marcar comferro quente para se não confundirem sefugissem(52). É verdade que mesmo em Portugalse mantinha a escravidão dos Mouros e dosAfricanos negros; e que destes já se fazia grandecomércio(53). Não é, pois, muito de admirar, queesse ato de perversidade de povos, que se diziamcivilizados e cristãos, se fizesse extensivo aopobre e mesquinho gentio do Brasil; tanto mais,quanto faltavam os braços para os misteres dosdonatários e dos colonos.

Refere igualmente a História quechegou-se naquela época até a pôr em dúvidaque os índios pertencessem à espécie humana!pretendendo-se que eram escravos por natureza!A tamanho desvario foram arrastados osEspanhóis, seus mais atrozes perseguidores,pela sede e ambição de riquezas(54), e a seuexemplo os Portugueses(55).

Mas também, desde logo, e como fatoprovidêncial, apareceu o incansável DominicanoPadre Bartholomeu Las Casas, Bispo de Chiapa,que tomou constantemente na América e naEuropa a defesa dos índios, convenceu de falsas

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e anti-cristãs aquelas doutrinas, obteve doRegente de Espanha o Cardeal Ximenes e doImperador Carlos V medidas a bem da liberdadedesses infelizes nas possessões espanholas, emostrou-se um seu acérrimo protetor, umverdadeiro apóstolo(56).

Por oulro lado, reconhecido naquelestempos em os Sumos Pontífices o poder deresolver questões temporais de grandealcance(57), não podiam eles deixar de intervirem objeto tão melindroso; muito mais porque dealgum modo afetava o espiritual, quer dospretendidos senhores, quer dos inculcadosescravos. A Igreja. fiel intérprete da verdadeiradoutrina de Cristo, reprovou sempre aescravidão. Os Apóstolos e Doutores assim oensinaram e pregaram. Os Papas Alexandre III(fins do Século XII), Pio II (Bula de 7 de Outubrode 1462) o proclamaram quanto aos cristãos,censurando mesmo este último os que reduziamà escravidão os neófitos d’África. E, depois dadescoberta da América, por vezes o repetiramlogo desde o começo com especial referência aospovos desta parte do mundo; distinguindo-senessa época Leão X, perante quem teve lugar acélebre disputa entre os Dominicanos e osFranciscanos sobre a liberdade dos índios,defendida por aqueles e impugnada por estes,decidindo a bem da liberdade aquele sábio everdadeiramente cristão Sumo Pontífice.

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Em relação à Espanha, ou antes ao Peru, oPapa Paulo III, por Breve de 28 de Maio de 1537,dirigido ao Cardeal Arcebispo de Toledo, muitocategoricamente declarou que os Indígenas,entes humanos como os demais homens, nãopodiam ser reduzidos a cativeiro; Breve que maistarde se fez extensivo ao Brasil por Bula deUrbano VIII(58). Esse mesmo Pontífice,interpretando a Bula de Alexandre VI (de 1492)sobre a conversão dos índios à fé Católica, fixoua sua verdadeira inteligência, e procurou oporbarreira aos abusos dos Espanhóis contrários àsdeterminações da Rainha Izabel, que ainda noseu testamento havia recomendado se tratassebem aos índios(59).

Não obstante, continuava a manter-se ofato de escravizar o gentio; e agora com maisfranqueza, atenta a legalização deshumana pelogoverno da Metrópole de semelhantebarbaridade, embora debaixo de pretendidas esubentendidas regras de Direito.

É sabido que desde os primeiros tempos, atítulo de resgate, os índios eram reduzidos àescravidão dos colonos, e até transportados aPortugal(60). Igualmente os aprisionados naguerra eram feitos escravos por um alegadodireito do vencedor(61). Mas os colonos, levadospela avidez e cobiça, em breve tal latitude derama esses princípios, que havia-se convertido em

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regra para semelhante abuso a necessidade quediziam ter de braços para a lavoura e outrosmisteres; empregando neste intuito todas asmanhas, artifícios, fraudes, e até força a fim deobterem os índios: por tal forma, que a CortePortuguesa viu-se na indeclinável obrigação deregular tão grave objeto, e de estabelecerrestrições a esse direito de escravizar o gentio,como adiante diremos(62).

Vejamos no entanto o que se passava emas diversas Capitanias nas suas primeirasépocas. Em 12 fora dividido o território brasílico.Poucas prosperaram; algumas não puderamprogredir; e outras nem mesmo fazer vingar oprimeiro estabelecimento. Quais as causas?

S. Vicente, que coube a Martim Afonso deSouza, foi a primeira colonizada; floresceu dentroem pouco, não obstante dificuldades com que aprincípio tiveram de lutar os colonos, já deataques de índios de fora, já dos outros colonos;a amizade de João Ramalho e seu sogro Tibiriçácom os seus índios lhe foi de inapreciávelauxílio(63). S. Vicente foi a cabeça da Capitania.

Pernambuco, que coube a Duarte Coelho,igualmente prosperou, debaixo da ilustrada,severa, e virtuosa administração desse varão,que praticou a idéia altamente civilizadora,política, e cristã de atrair os índios por meio de

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afagos, recompensas, e chegando mesmo apromover, em bem da colonização, o casamentodos colonos com as índias(64). Olinda foi acabeça da Capitania.

Espirito Santo coube a Vasco FernandesCoutinho, que comsigo trouxe, além dos colonos,pessoas de nobreza. Os índios, a começoesquivos, sujeitaram-se e muito o auxiliaram. Adecadência posterior foi devida aos próprioscolonos(65).

Porto-Seguro tocou a Pero do CampoTourinho, que foi estabelecer-se no porto em queancorou a esquadrilha de Cabral. Os índiosmostraram-se mansos e trataveis, como o eramno tempo da descoberta. Reinou paz, justiça, emoralidade. Mais tarde veio a decadência(66).

Pero Lopes de Souza havia tratado deaproveitar a sua de Santo Amaro (próximo à deS. Vicente), e terras de Itamaracá, admitindocolonos, e cuidando da lavoura(67).

Jorge de Figueiredo Corrêa a dos Ilhéus.Ausência de Governo, vexame aos colonos,perseguição aos índios obstaram a queprosperasse(68).

Tais foram as Capitanias que entãopuderam suportar a colonização. Algumasfloresceram rapidamente, sobretudo Pernambuco

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e S. Vicente; benéficos resultados de umaadministração inteligente, religiosa, e zelosa. Emoutras, depois dessa primeira prosperidade,manifestaram-se sintomas de decadência, devidaprincipalmente ao mau governo delas, ou àambição, injustiça, desobediência, e imoralidadedos colonos.

Das outras dessa primitiva distribuiçãonenhuma logrou a colonização nessa época:

A do Maranhão e mais duas, quecouberam à trina sociedade do historiador Joãode Barros, Fernão Álvares, e Ayres da Cunha;porque a frota preparada com tamanho sacrifícionaufragou desastrosamente. Alguns dos colonos,que se salvaram, fundaram na ilha da Trindadeuma povoação Nazareth. Os índios lhesprestaram auxílio valioso, acompanhando maisde 200 deles os colonos restantes, quando seresolveram a abandonar a povoação(69). A sorteadversa, que não a culpa dos donatários ecolonos, malogrou essa tentativa.

Outro tanto se não pode dizer da Capitaniade S. Tomé, depois Campos, dada a Pero deGóes. Conseguiu fundar a povoação Vila daRainha. Durante a sua ausência em Portugalpara promover capitais e gente, tudo foidesordem na colônia. O lamentável incidente dehaver sido por um pirata entregue um dos

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Chefes índios aos seus inimigos, levantou osmesmos índios contra os colonos, que se viramforçados a abandonar a terra(70).

Na Bahia, o seu donatário FranciscoPereira Coutinho conseguira fundar a povoaçãoda Vitória. Mas a velhice, enfermidade, efraqueza do donatário, a desmoralização einsubordinação dos povoadores trouxeram aruína da colônia, retirando-se estes para osIlhéus, e o donatário para Porto-Seguro;perecendo o mesmo com quase todos os seus àsmãos dos índios de Itaparica(71).

Na Capitania de Antônio Cardozo deBarros, nem se chegou a tentar acolonização(72).

Em tal estado de cousas, não era possívelque o Rei D. João III(73), que tão bem haviacompreendido a vantagem de promover acolonização e o desenvolvimento da novaconquista, deixasse de tomar providências emordem a coibir os abusos introduzidos sobretudopelos colonos, e os defeitos reconhecidos dalatitude de poderes, atribuições e isençõesconferidos aos donatários(74), bem como deprovidenciar sobre a sorte dos verdadeiramentemiseráveis indígenas, que, ou fizessem bem oufizessem mal, eram desapiedadamente vexados,e escravizados pelos colonos.

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CULONIZAÇÃO; REGIME COLONIAL (CONTINUAÇÃO). —CATEQUESE. — OS JESUÍTAS. — PADRES MANOEL DA

NÓBREGA, JOSÉ DE ANCHIETA. — MISSÕES DEÍNDIOS. — GUERRAS DOS MESMOS. — NOVAS

PROVIDÊNCIAS SOBRE O SEU CATIVEIRO.

A tentativa quase malograda decolonização; a desordem e perigo de decadênciadas Capitanias; a desmoralização dos colonos; ado próprio clero, que, longe de dar o exemplo dobem, levava vida desregrada; a falta sobretudo deunidade e centralização de governo, pois que osdonatários eram independentes reciprocamente,e gozavam do privilégio de couto e homisio nosseus respectivos territórios; a perseverança dosFranceses em suas excursões ao Brasil; aaudácia dos contrabandistas, que achavam apoionos colonos; a insubordinação e irreligiosidadeque lavravam em geral, concorrendo não poucopara este funesto resultado o fato de viremdegradados criminosos ou por condenação oupor comutação de pena; e outros fatos de graveponderação; reclamavam enérgicas providências.

Duarte Coelho, de Pernambuco, em 1546

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representava ao Rei que os donatários abusavamdo sou direito de asilo, negando-se a entregar oscriminosos que se refugiavam nas suasCapitanias; e em carta de 20 de Dezembro domesmo ano rogava-lhe que lhe não mandassemais degradados, que eram piores que peste,verdadeira peçonha(75).

Por outro lado, Luiz de Góes, da Capitaniado S. Vicente, dirigiu ao Rei uma carta em 12 deMaio de 1548, em que expunha com franqueza operigo que corria a Coroa de perder a suaconquista Americana, se lhe não acudisse semdemora(76).

El-Rei, seguindo o parecer de Pero deGóes, deliberou criar no Brasil um governocentral. Resolveu-se que aos donatários serestringiriam certos direitos, atribuições, eisenções, sobretudo em relação ao asilo, justiça, efazenda pública(77).

Tomé do Souza foi o primeiro GovernadorGeral para o Brasil, a quem se deram asinstruções constantes principalmente do seuRegimento de 17 de Dezembro de 1548(78);Pedro Borges de Souza o primeiro Ouvidor geral,a quem se deram as instruções contidas no seuRegimento, de cujas disposições dá ele mesmonotícia em carta de 7 de Fevereiro de 1550dirigida ao Rei(79); Antônio Cardozo de Barros, o

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Provedor-mor da Fazenda, com o seu Regimentotambém de 17 de Dezembro de 1548(80); Pero deGóes foi escolhido para o cargo de Capitão-morda Costa(81).

Entre os Regimentos parciais, igualmenteexpedidos então, é digno de menção especial o dacriacão de Provedores das Capitanias da mesmadata 17 de Dezembro de 1548(82).Posteriormente outros ainda foram expedidos,como v. g. o da criacão dos Capitães-mores em1609(83); e outras providências se tomaram emrelação aos diversos ramos da públicaadministração.

Nova ordem de cousas foi assim criada embem da colônia, restringindo-se os direitos eprivilégios dos donatários, e concentrando nasmãos do Governador Geral as mais importantesatribuições; era a unidade e centralizaçãoadministrativa, que substituiam a independênciarecíproca das Capitanias; eram a ordem, a força,o princípio da Autoridade que vinham pôr cobroà anarquia, à fraqueza, à desordem edesobediência na colônia; era em suma asalvação desta, e a sua conservação integralconstituindo hoje a Império Brasileiro(84).

Segundo lhe ordenava o seu Regimento,dirigiu-se Tomé de Souza para a Bahia, ondechegou a 29 de Março de 1549; trazendo em sua

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companhia, além dos Chefes mencionados eoutras pessoas notáveis, muitos casais, 600homens de armas, e 100 degradados(85).

Vierão também seis (sendo dois apenasirmãos) religiosos da Companhia de Jesus, osprimeiros que pisaram terra brasilica, e com elesManoel da Nóbrega(86).

Aí encontrou Tomé de Souza mais de 40colonos, entre os quais Diogo Álvares oCaramuru, e Paulo Dias(87).

A Metrópole, porém, continuava a despejarna colônia os seus degradados, como acabamosde ver. Conquanto a legislação abusasse da penade degredo, aplicando-a em excesso, e até porfados qne escapam à ação da justiça pública, eratodavia sempre um grande mal por viremtambém entre os condenados muitos criminosose perversos, que introduziam os vicios e oscrimes na colônia, e inoculavam-lhe os maushábitos que traziam(88).

Entre outras recomendações trazia oGovernador a de cuidar em que os índios fossembem tratados, castigando-se os delinqüentes quelhes fizessem dano; porque, diz o Regim. cit. — oprincipal fim por que se manda povoar o Brasil é aredução do gentio à fé católica.... e convém atraí-losà paz para o fim da propagação da fé, e aumento

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da povoação e comércio.

Também no mesmo Regimento se proibiusaltear e fazer guerra ao gentio por mar ou porterra, ainda que estivessem levantados, semlicença do Governador ou dos Capitães, que só adariam a pessoas de confiança; sob pena demorte e de perda de toda a fazenda: e isto porque— era costume (diz o Regim.) saltear e roubar osgentios de paz por diversos modos, atraindo-osenganosamente, e indo depois vendê-los, até aosseus próprios inimigos, d’onde resultavalevantarem-se eles e fazerem guerra aos Cristãos,sendo esta a principal causa das desordens quetinham havido.

Ao mesmo tempo, recomendava oRegimento, com cruel contradição — que fizessea guerra aos que se mostrassem inimigos....destruindo-lhes as aldeias e povoações, matando,e cativando.... e fazendo executar nas própriasaldeias alguns Chefes que pudesse aprisionarenquanto negociasse as pazes (!).

A respeito dos índios amigos autorizava aconcessão de terras e aldeamentos; sendo dignode nota que nesse Regimento se consignassedesde logo a idéia altamente profícua àcivilizarão dos indígenas, qual a de exigir — queos convertidos se estabelecessem junto àspovoações, porque com o trato dos cristãos mais

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facilmente se hão de policiar.

Por outro lado, o mesmo Regimento proibiuque, atentos os graves inconvenientesdemonstrados pela experiência, os colonos seinternassem pelos sertões, e se comunicassempor semelhante meio de umas para outrasCapitanias, sem licença do Governador,Capitães, ou povoadores, sob pena de açoites oumulta.

Várias outras importantes providênciasforam tomadas.

Se bem o recomendou o Regimento aoGovernador, melhor o executou este, logo que selhe ofereceu ocasião oportuna, com o fim deaterrar os gentios, não obstante prestarem-se aoserviço dos colonos a troco de quaseinsignificante remuneração: porquanto,levantando-se rixas entre eles, foram vítimasalguns colonos que se haviam imprudentementeembrenhado pelo sertão; para vingá-los foimandado Pero de Góes, que, conseguindoapreender dois dos culpados, os fez fuzilar àboca de uma peça, como refere ele próprio emcarta de 18 de Julho de 1551(89).

Do seu lado, porém, os Jesuítas,abrazados no santo fervor da propagação da fé,da conversão e civilização do gentio, tendo nessa

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época diante dos olhos unicamente a religião,conforme a pureza do seu instituto(90), nãopouparam trabalhos, fadigas, e até perigos parao conseguirem. De grande auxílio lhes foi naBahia o Caramuru e seu genro Paulo Dias. OPadre Manoel da Nóbrega(91) em breveconseguiu, pela música, pelo canto, e peloaparato das cerimônias religiosas, entusiasmaros jovens índios, e com estes percorrendo asaldeias arrebanhar muitos, mesmo adultos;igualmente pregava aos colonos, e dirigia aescola, à qual concorriam também alguns índiosmansos(92). O Padre João de Aspilcueta Navarrochegou a pregar-lhes na língua indígena(93).Alguns outros foram a outras Capitanias em suamissão evangélica, quais o mesmo Navarro,Leonardo Nunes, Diogo Jacome, Francisco Pires,Vicente Rodrigues, Afonso Braz, SimãoGonçalves. Em meados de 4549 saiu Nóbrega avisitar as Capitanias do Sul, chegando até S.Vicente.

A relaxação dos costumes continuavaentre os colonos, não obstante os esforços dosJesuítas; por tal forma, que Nóbrega, em cartade 9 de Agosto de 1549, o declara alto e bomsom, dizendo ser o escândalo da mancebia, e adesordem da religião e justiça um mal geralentre colonos e indígenas, e até entre os própriossacerdotes, em todas as Capitanias; e instava(bem como o Governador) pela presença urgente

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de um Bispo no Brasil(94).

Os índios continuavam, apesar dasúltimas providências, a ser pelos colonosaleivosamente assaltados e escravizados, comose vê da carta dirigida ao Rei pelo Ouvidor GeralPedro Borges em 7 de Fevereiro de 1550(95); eaté pelos mesmos provocados a guerrasdestruidoras, como ainda em data de 5 de Julhode 1559 o denuncia formalmente Nóbrega aoGovernador Tomé de Souza, dizendo que — emtoda a costa se tem geralmente por grandes epequenos que é grande serviço de Deus fazer aosgentios que se comam, e se travem uns com osoutros; e nisso dizem consistir o bem e segurançada terra; e isto aprovam Capitães e prelados,eclesiásticos e seculares(96). A regra deMaquiavel — dividi para reinar — já então erapraticada, independente de brilhantes discursose teorias.

Fundada a cidade de S. Salvador, cabeçado governo geral da colônia, e nela o primeiroColégio de Jesuítas no Brasil, foi a mesmaconstituída sede do Bispado com a chegada doprimeiro Bispo D. Pedro Fernandes Sardinha(97).Outro Colégio de Jesuítas também se fundou nomesmo ano de 1549 em S. Vicente(98).

Ao passo que o Governador Geral não sedescuidava do bem temporal da colônia,

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seguindo porém a respeito dos índios o sistemado rigor, os Jesuítas prosseguiam na propagaçãoda fé, e na consolidação dos princípios religiosose da moral, meios reconhecidos os maisprofícuos à boa ordem e prosperidade do estadocivil e político; sem religião, sem moral, asmelhores leis são quase de todo praticamentenulificadas. Os incansáveis e hercúleostrabalhos de Nóbrega, Navarro e seuscompanheiros o atestam. Sendo poucos para tãoárdua tarefa, tiveram reforço; vindo ultimamenteLuiz da Grã, e José de Anchieta(99), quechegaram à Bahia com o novo Governador geralDuarte da Costa em Julho de 1553. O Brasil eracriado província à parte, tendo por provincial oPadre Manoel da Nóbrega.

Fundou ele nos campos de Piratininga umoutro colégio em 154(100) da invocação de S.Paulo; o que trouxe mais tarde a fusão doestabelecimento antigo.

Os jesuítas não esmoreciam; ao contrário,maior fervor demonstraram na sua missãoevangélica e civilizadora, não poupando fadigas,nem sacrifícios; o Padre Navarro, por exemplo,morreu de cansaço da primeira viagem deimportância de exploração ao Rio de S.Francisco(101), o Padre Manoel da Nóbregatambém de fadiga e excesso de trabalho(102).

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No entanto, por tal maneira estavamarraigados nos costumes pervertidos dos colonosa falta de religião e de moral, assim como adesobediência e desrespeito às leis, por tal formapredominava a ambição de riquezas, quecontinuava o tráfico infame do cativeiro dosindígenas, chegando estes a venderem-se a sipróprios, sobretudo na Capitania do EspiritoSanto(103).

Os Jesuítas eram presentes em toda aparte, dir-se-ia que tinham o dom da ubiqüidade;aonde maior o perigo aí se achavam; comabnegação verdadeiramente cristã, cometiamatos de inaudita coragem, de assombrosoheroísmo, qual, entre outros, o de arrancarem dopoder e mãos dos índios (Tupinambás) um corpohumano destinado ao cruento festim(104),internando-se pelo sertão indefesos, e expostos àvingança cruel dos mesmos.

Verdadeiros apóstolos davam eles oexemplo, pregaram a colonos e índios,promoviam a reforma e regeneração da sociedadepela reforma dos costumes, pela prática dareligião, e moral do cristianismo.

Infelizmente, o mal era profundo, e afetavainteresses, que em todas as épocas da vida dahumanidade têm sempre feito esquecer osprincípios do justo e do honesto.

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Também essas desordens deviamnecessariamente trazer os seus naturaisresultados; porque na vida moral, como na vidafísica, as conseqüências derivam dos fatos emuma série de outros fatos, que se prendem comoos elos de uma cadeia: é a lógica dos fatos.

Os índios em todas as Capitaniascomeçaram de reagir; e, como é natural edesculpável em povos selvagens, cometerão semdúvida atrocidades, qual v. g. a de matarem edevorarem o mártir 1.° Bispo do Brasil com todosos seus companheiros, quando infelizmentenaufragaram quase defronte da foz doCoruripe(105); os engenhos eram assaltados pelogentio; os colonos viviam em contínuosobresalto; a navegação sofria, porque a suaaudácia tinha chegado ao ponto de acometeremos navios portugueses; a própria capital viu-seem perigo pelos ataques dos indígenas.

Para cúmulo de desgraça, os Franceses,continuando em suas excursões, haviamconseguido sob a direção de Nicolau DurandVillegaignon estabelecer-se no Rio de Janeiro(1555), angariando as boas relações e amizadedos Tamoios(l06).

Em o Norte os colonos repeliam comopodiam os ataques dos índios; no Sul, porém, aaudácia destes tinha crescido sobretudo por

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haverem alcançado algumas vantagens contra osPortugueses(107). Os colonos não poupavam osdesgraçados que lhes caíam nas mãos; o ferro, ofogo, e o cativeiro eram a sorte dos índiosinimigos. E, se em Pernambuco Jerônimo deAlbuquerque Coelho se lisonjeava de tersubmetido o gentio, o mesmo não acontecia nasCapitanias do Sul, onde as correrias e invasõesdos Indígenas continuavam(108). Uma C. R. de1557 legaliza o cativeiro dos Caetés(109).

Terminado o governo de Duarte da Costa,sendo já falecido (desde 11 de Junho de 1557)El-Rei D. João, a quem sucedeu D. Sebastião,então na menoridade, sob a regência de D.Catarina (e desde 1562 sob a do Cardeal D.Henrique), foi deliberado, à vista do críticoestado da colônia, mandar-se por GovernadorGeral (3.°) Mem de Sá, magistrado distinto portodos os dotes da inteligência e do coração; oqual chegou ao Brasil em 1558(110).

Acudiu ele de pronto à Capitania doEspírito Santo, onde os índios se tinhamlevantado; aí perdeu o filho Fornão de Sá: assimcomo à dos Ilhéus, e à de Porto-Seguro, onde osterríveis Aimorés não deixávam repouso aoscolonos(111).

O governo da metrópole aprovou e lh’oagradeceu; e ao mesmo tempo, em carta Régia de

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1558 recomendou-lhe toda a proteção aosJesuítas na conversão dos gentios. Em outracarta Régia do mesmo ano, dirigida à Câmara deS. Salvador, igual recomendação se fez, e queaos convertidos se tratasse bem, não fossemvexados, nem se lhes tomassem as terras,porque, além de ser de razão e justiça, isto serviriade exemplo aos outros gentios(112).

Mem de Sá começou nesta época aorganizar as missões, reunindo várias aldeias deíndios sob o governo de um principal d’entre eles,e auxílio espiritual dos Padres daCompanhia(113), os quais todavia exerceramdesde logo também alguma autoridade temporal,embora em forma palernal e conciliatória; taisforam as de S. Paulo, Espirito Santo, e outras.Proibiu a antropofagia, fazendo punirseveramente a infração.

Continuava entretanto o sistema do terrorcontra os índios que se atreviam a atacar aspovoações e colonos; e também a guerra abertapara afugentá-los, quando se não submetiam,como sucedeu na Bahia e mais tarde em S.Vicente(114).

Os selvagens persistiam por sua parte eminfestar a terra com suas assaltadas; formandomesmo alianças entre si contra os Portügueses,como foi a celebrada Confederação dos Tamoios,

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conjurada pelos esforços dos Jesuítas esobretudo do Padre José de Anchieta(115); eauxiliando os estrangeiros, quais os Franceses,contra os colonos. — Acaso eram eles instigadospelo espírito do mal? ou tal estado de cousasteve sua causa originária no fato nãointerrompido das vexações exercidas peloscolonos contra os pobres índios, fossem amigos epior se inimigos? sofrendo agora os atuaiscolonos as conseqüências das culpas dosantecessores, e quiçá das suas próprias?

O certo é que, se alguns Índios semostravam assim inimigos, e até cruéis (porvingança), outros se prestavam com facilidade àcatequese debaixo da direção dos Padres daCompanhia(116). As missões criadas por Mem deSá aumentavm e progrediam a olhos vistos; osíndios se convertiam à religião cristã pormilhares; o casamento era sancionado peloSacramento da Igreja; as escolas eramfreqüentadas com proveito por número nãopequeno deles(117). Os Jesuítas instituiramaulas da língua tupi(118).

Com as providências tomadas, com osexemplos de castigo, e mais que tudo com aintervenção e influência dos Jesuítas, conseguiuMem de Sá algum sossego; e a colônia davaindícios de prosperar; o gentio mostrava-se maispacifico ou amedrontado(119).

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Cumprindo desalojar definitivamente osFranceses, já expulsos em 1560 do forte deVillegaignon, e fundar no Rio de Janeiro umacolônia, veio da Metrópole uma armada, quechegou à Bahia em Fevereiro de 1564, trazendopor Capitão-Mor Estácio de Sá, sobrinho doGovernador. Com auxílios recebidos,principalmente de S. Vicente, entrou ele a barraem Fevereiro de 1565, e lançou os fundamentosda cidade de S. Sebastião junto ao Pão d’Açúcar.Os gentios, auxiliados e industriados pelosFranceses, incomodavam em extremo a novacolônia. Disto informado por José de Anchieta, eobtidos reforços da Metrópole e de Pernambuco,veio Mem de Sá em socorro de seu sobrinho: e,destroçando os Franceses e os índios emtemíveis combates, conseguiu a paz; a cidade foitransferida para outro lugar mais apropriado, e éhoje a Capital do império. Mas Estácio de Sáhavia perdido a vida em conseqüência deferimentos no último combate(120). Deixandopor Governador seu sobrinho Salvador Corrêa deSá, voltou Mem de Sá à Bahia. Salvador repeliuos Franceses que o tinham vindo atacar, e foibatê-los a Cabo Frio, onde se haviamacoutado(121). De grande auxílio foi aosPortugueses o índio Ararigboia(122). — OsJesuítas fundaram um outro colégio na novapovoação(123).

Urgia no entanto tomar providências sobre

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os índios, a fim de que se harmonizassem asqueixas dos colonos, que clamavam sempre porfalta de braços, e a oposição dos Jesuítas àssuas injustas e exageradas preterições; de umlado a escravidão formal ou disfarçada, de outroa proteção decidida à liberdade dos mesmos.Recebeu Mem de Sá uma Carta Régia o esserespeito, de conformidade com o Assento tomadopela Mesa de Consciência e Ordens(124),impondo restrições ao direito de cativar o gentio;declarando-se no Assento e na Carta que sóseria legítimo, quando o fossem em guerra justa,ou entregues por seus pais para seremeducados, ou dos que se vendessem, maiores de20 anos. Na Carta se reconhecia que tinhamhavido abusos para reduzir a cativeiro os índios,e que para isto se usava de manhas, enganos, eforça, a fim de serem eles induzidos avenderem-se, e a resgates injustos. Na mesmaCarta se recomendava que nas aldeias fossemadmitidos colonos morigerados, ainda fazendo-se-lhes algumas vantagens, no intuito de facilitara civilização dos indígenas; o mesmopensamento já manifestado no Regimento dado aTomé de Souza.

Segundo determinação da referida Carta,fez Mem de Sá um Conselho com o Bispo,Ouvidor Geral, e Padres da Companhia; o qualtomou a resolução seguinte, em favor dos índios:que, se algum se recolhesse às missões, só

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poderia ser entregue por ordem do Governadorou do Ouvidor, provada a legitimidade docativeiro; 2.°, que perderia o colono todo o direitoao índio, se daí o tirasse à força; 3.°, que osJesuítas entregariam dos das suas aldéas os quese confessassem escravos, ou preferissem livresservir fora; 4.°, que os resgates não seriamválidos sem o consentimento das autoridades(não obstante os forais em contrário); 5.°, quefossem castigados os que casassem as índiascom escravos; 6.°, que se nomeasse um Curadoraos índios; 7.°, que o Ouvidor fizesse correçãopelas missões e aldeias, ouvindo as partes eadministrando justiça(125).

Tão justas providências excitaram, todavia,como sempre, queixas dos colonos; e vieramdemonstrar o fato público e notório da injustiçacom que se mantinham cativos os índios, pelaimpossibilidade em que se acharam de provarque eram possuídos como tais segundo asdeterminações do Direito então vigente.

Tornava-se, portanto, necessárioregularizar de modo mais solene semelhantematéria. Uma lei do Reino o fez; é outras se lheseguiram.

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LEIS DE ESCRAVIDÃO DOS ÍNDIOS. — JESUÍTAS, ECOLONOS. — LEIS DE LIBERDADE DOS GENTIOS. —NOVAS LEIS DE ESCRAVIDÃO. — CAÇADAS DE ÍNDIOS.

— OS PAULISTAS.

Desde 1568 (20 de Janeiro) tomara asrédeas do governo El-Rei D. Sebastião,cavalheiro, e religioso ao ponto do sacrifício daprópria vida na defesa da fé e da religião deCristo. Governava ainda o Brasil Mem de Sá,quando se expediu a L. de 20 de Março de1570(126), publicada na colônia neste mesmoano, relativa à escravidão dos índios. Ainfluência do Cristianismo nela se revela; oanátema fulminado pelo Sumo Pontífice Paulo IIIna sua Bula ou Breve de 1537 não deixou deproduzir alguns benéficos resultados. Todavia oGoverno da Metrópole foi arrastado, a seu pesar,a fazer concessões aos colonos, mantendoexceções a favor do cativeiro dos índios,comquanto em principio reconhecesse emandasse garantir-lhes a liberdade(127);exceções fundadas em aparente humanidade abem dos mesmos índios, e em um errado direitodo vencedor.

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Reconhecendo a lei que se cativava ogentio por modos ilícitos, proibiu que de entãoem diante se pudesse cativar por modo nemmaneira alguma; exceto: 1.° aqueles que fossemaprisionados em guerra justa, feita com licençaRégia, ou do Governador; 2.°, aqueles quecostumavam saltear os colonos ou outros índiospara os devorarem. — Ainda nestes casosrestritos, era imposta a obrigação de inscrever oscativos nos livros das Provedorias dentro de doismeses a contar da apreensão, sob pena deperderem todo o direito, e de ficarem ipso factolivres os aprisionados.

Como era de esperar, atentos os hábitosdos colonos, levantaram estes tal clamor contraa lei, que em breve foi expedida ao Governadoruma Carta Régia(128) mandando restabelecer oantigo sistema de resgates, e recomendando-o domodo seguinte: — No que toca ao resgate dosescravos se deve ter tal moderação, que não seimpida de todo o dito resgate, pela necessidadeque as fazendas deles têm, nem se permitamresgates manifestamente injustos, e a devassidãoque até agora nisso houve(129).

Mem de Sá não chegou a ser o seuexecutor; porquanto a Metrópole, entendendoconveniente dividir o Brasil em dois governosgerais, um ao Sul confiou ao Dr. AntônioSalema, e o outro ao Norte a Luiz de Brito e

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Almeida, sendo já falecido Mem de Sá, assimcomo o Bispo D. Pedro Leitão(130).

Antes, porém, de se separarem para osseus respectivos governos, reuniram-se na Bahiaem conselho com o Ouvidor Geral e Padres daCompanhia, a fim de regularem a execução dasleis sobre os índios; e assentou-se em 6 deJaneiro de 1574(131) no seguinte acordo,composto de 10 capítulos ou artigos, cujas idéiascapitais são: 1.° que seria legítima a escravidãodo índio aprisionado em guerra manifestamentelícita; entendendo-se por tal a que fosse feitapelos Governadores segundo os seusRegimentos, ou a que ocasionalmente se vissemos Capitães forçados a fazer, precedendoresolução com voto dos Oficiais da Câmara eoutras pessoas experientes, dos Padres daCompanhia, do Vigário, e do Provedor daFazenda, de que se deveria lavrar auto; 2.°, quetambém se reputaria legitimamente cativo oíndio que, maior de 21 anos e escravo de outrosíndios, preferisse ser escravo de cristão; 3.°, queo resgate não era aplicável ao índio manso; oqual não podia portanto ser por tal títuloreduzido a cativeiro; exceto se, fugindo da aldeiapara o sertão, estivesse ausente mais de um ano;4.°, que nenhum resgate seria válido, quandofeito sem licença dos Governadores ou Capitães;devendo decidir sobre sua validade os Provedorese mais dois adjuntos eleitos em Câmara no

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princípio de cada ano; 5.°, que as pessoas quetrouxessem índios de resgate, ou por mar ou porterra, dessem entrada na respectiva alfândega,antes de qualquer comunicacão com alguém; 6.°que só seria garantida aos colonos a propriedadesobre o índio de resgate, quando registrado;tendo-se por livres os que não estivessem; 7.°que os índios apreendidos em guerra que nãofosse feita nas condições expostas, seriam livres:8.° que os infratores ficariam sujeitos às penasde açoites, multa, e degredo, além das outras emque pudessem incorrer.

Os dois Governadores, seguindo no seugoverno, viram-se todavia a braços com o gentio,quiçá incitado pelos colonos, que agora achavammeio de assim arrebanharem trabalhadores paraas suas fazendas e serviço.

Mas o erro de dividir o Brasil em doisgovernos foi de pronto reconhecido; e logo emfins de 1577 restabeleceu-se o de um só,confiado a Lourenço da Veiga, que empossou-seem princípios de 1578(132). Neste mesmo anoEl-Rei D. Sebastião perdera a vida emAlcaçarquevir (4 de Agosto de 1578); dando estedesastre lugar a que pouco depois a coroa dePortugal fosse reunida à de Castela na cabeça deD. Felipe II, por falecimento do Cardeal Rei D.Henrique(133), e assim passasse o Brasil aomesmo domínio.

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Por morte de Lourenço da Veiga (1581), foio governo da colônia exercido interinamente porCosmo Rangel de Macedo; tudo foi desordem nacolônia; o gentio continuava alevantado: oscolonos sofriam; os Franceses persistiam nassuas tentativas; e agora também os Inglesescomeçavam as suas.

Com o nuvo Governador Manoel TellesBarreto vieram (1583), de reforço á Companhiade Jesus alguns companheiros, entre os quais oPadre Fernão Cardim(134). No seu tempoconseguiu-se a colonização da Paraíba, tantasvezes malograda. A ordem foi restabelecida. Astentativas dos estrangeiros burladas, e mesmorepelidas à força. De sorte que, nessa época,pode-se dizer, se em algumas Capitanias oestado era pouco lisonjeiro, em outras erapróspero a ponto mesmo de se desenvolver(Pernambuco v. g.) o luxo entre os colonos já demodo notável.

Falecendo Barreto (Março de 1587), passouo governo à Junta interina.

A corte de Madri expediu a Lei de 22 deAgosto de 1587(135), pela qual se suscitava aobservância da Lei de D. Sebastião de 1570, nelainserta, relativamente aos casos em que osíndios podiam ser cativos, acrescentando-se queos que livres trabalhassem nas fazendas não

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pudessem jamais ser retidos como escravos, massim como inteiramente livres a serviço enquantofosse sua vontade(136); lei em que se fundaramos Padres da Companhia, combinada com outrasdeterminações anteriores, para se constituíremos protetores e defensores dos Indígenas(137).

Em 1591 chegou ao Brasil o novoGovernador geral D. Francisco de Souza; cujaidéia dominante de descoberta de minas, emboratrouxesse a exploração e descobertas no sertão,todavia distraiu gente e cabedal, e impediu deacudir, como conviria, às agressões deFranceses, Ingleses, e Holandeses. Conseguiu-seno entanto a colonização do Rio Grande doNorte(138).

Ainda outros fatos se passaram; dos quaismerece especial menção o de começarem osPaulistas as suas excursões para o Sul,acossando os índios. Os Jesuilas, porém, semprefirmes e alerta no seu posto como verdadeirossoldados da fé e da religião, já lhes faziam frente,estabelecidos na Laguna(139).

Em algumas Capitanias sofriam os Padresas conseqüências da sua pertinácia em defensados índios; assim, na Paraíba foram elesexpulsos (1593) por Feliciano Coelho, queconfiou as aldeias aos Franciscanos; os quaispor seu turno também foram lançados fora em

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1596(140).

Os Jesuítas conseguiram, entretanto, dacorte de Madri outra Lei em 11 de Novembro de1595(141) e a Provisão de 26 de Julho de1596(142), regulando não só as condições paraque se entendesse justa a guerra ao gentio, econseqüentemente, nesse caso único, legal ocativeiro, mas também a maneira por que osPadres se haveriam com os mesmos, e ostratariam. Só seria jusla a guerra mandada fazerpor provisões especiais assinadas do Realpunho(143).

Havendo tomado posse do governo doBrasil em 1602 o novo Governador geral DiogoBotelho, representou este à corte sobre o sistemaseguido com o gentio, qualificando-o deimprofícuo, porque os Padres os tinhamseparados em aldeias suas; entendendo ele maisacertado trazê-los às povoações, ainda quecoagidos(144). A resposta, porém, graças àinfluência que a ditou, foi negativa, como constadas Provisões de 5 de Junho de 1605 e 4 deMarço de 1608(145), extremamente restritivas daescravidão.

A primeira(146) estabeleceu mesmo, emtese, que em nenhum caso se pudesse cativar ogentio — porque, conquanto houvesse algumasrazões de Direito para se poder em alguns casos

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introduzir o dito cativeiro, eram de tanto maiorconsideração as que havia em contrário,especialmente pelo que tocava à conversão dosgentios à nossa Santa Fé Católica, que se deviamantepor a todas as mais; e também pelo que maisconvinha ao bom governo e conservação da pazdaquele Estado.

Foi este um primeiro raio fulminado contraa escravidão, antes tolerada e legitimada.

Na Lei de 30 de Julho de 1609(147) foi istomais explicitamente consignado. — Em a 1.ªparte lê-se— que, para se atalharem os grandesexcessos que poderá haver, se o cativeiro em algumcaso se permitir, e para de todo se cerrar a porta aisto, declaram-se todos os gentios daquelas partesdo Brasil por livres, conforme a Direito e seunascimento natural, assim os que já forembatizados e reduzidos à nossa Santa Fé Católica,como os que ainda vierem como gentios conforme aseus ritos e cerimônias; os quais todos serãotratados e havidos por pessoas livres, como são; enão serão constrangidos a serviço, nem a cousaalguma, contra sua livre vontade; e as pessoas quedeles se servirem nas suas fazendas lhes pagarãoseu trabalho, assim e da maneira que sãoobrigados a pagar a todas as mais pessoas livres,de que se servem; podendo outrossim os ditosgentios com liberdade e segurança possuir suafazenda e propriedade, morar e comerciar com os

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moradores das Capitanias. — Na 2.ª parte dispôsa lei sobre a civilisação e catequese dos mesmos,que confiou dos Jesuítas — pelos muitosconhecimentos e exercício que desta matéria têm, epelo crédito e confiança que os gentios deles fazem—; aos quais igualmente confirmou o protetoradodós índios, devendo com eles entender-se oGovernador sobre os aldeiamentos, distribuiçãode terras, entrega de índios para serviço públicoou particular, não podendo outros senão eles irao sertão buscá-los: proibiu, outrossim, que osíndios fossem contra sua vontade transferidosdas Capitanias, ou das povoações e lugares emque estivessem; que sofressem tributo algumreal ou pessoal; que sobre eles exercessem maisjurisdição e poder, do que fosse conferido pelosRegimentos sobre as pessoas livres. Em falta doOuvidor, deveria o Governador nomear Juizespecial, que conhecesse das causas dos Índios,dispensando todo o favor compatível com ajustiça; assim como designar por Curador paraas suas causas um cristão velho e de confiança,que de acordo com os Religiosos requeresse abem dos mesmos. — Na 3.ª parte, olhando aopretérito, e reconhecendo abusos no cativar osíndios, ordenou que fossem restituídos àliberdade todos os que foram escravizados contraDireito, não obstante títulos de venda e mesmosentenças em contrário, que foram declaradosnulos. — Na 4.ª, finalmente, impôs as penas dasOrdenações e Direito Comum(148) aos que

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trouxessem do sertão e tivessem por escravos osgentios, em contravenção ao que ficavadecretado.

No entanto, forçado Botelho a retirar-seem conseqüência de suas desavenças com oBispo e Jesuítas, havia chegado ao Recife emDezembro de 1607 o Governador D. Diogo deMenezes e Siqueira, depois Conde daEriceira(149), que dali seguiu para a Bahia emfins de 1608. — Para o Sul (Espírito Santo, Riode Janeiro, e S. Vicente) de novo separado, veioD. Francisco de Souza, igualmenteSuperintendente Geral das Minas, a quemsucedeu seu filho D. Luiz de Souza(150).

Pelas últimas leis sobre os índios, ficavamestes sob a tutela quase exclusiva dos Padres daCompanhia; os quais já cuidavam mais deatentar para os bens temporais da Ordem comvistas ambiciosas de predomínio(151) edesenvolviam a sua indústria agrícola e atécomercial, com o grande auxílio do braço dosindígenas, que tinham em grande número nasfazendas e engenhos(152). Por modo que,faltando trabalhadores aos colonos para as suaslavouras e serviços, e opondo-se os Jesuítas aque escravizassem os índios (e nisto tinhamrazão), ou mesmo retirassem das aldeias oupovoaçõe os já domesticados, levantaram-se,sobretudo em S. Paulo, bandeiras para irem

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aprender índios bravos fora da jurisdição dosPadres(153).

A Câmara da Paraíba fez chegar ao Reiuma representação datada de 19 de Abril de1610 sobre o estado dos colonos e necessidadede lhes acudir. Em carta de 8 de Maio do mesmoano igualmente o fez o Governador D. Diogo deMenezes. Feliciano Coelho (da Paraíba)queixava-se amargamente, receiando até que sedegolassem reciprocamente índios e colonos.Ainda em Carta de 7 de Fevereiro de 1611 D.Diogo insistia em mudar-se de conduta arespeito dos índios e dos Jesuítas, tirando-se aosPadres a direção temporal das aldeias, eacabando-se mesmo com estas — porque eles e oEstado maiores vantagens ganhariam,introduzindo-se os gentios nas grandes povoações,onde somente, que não isolados delas em aldeias,poderiam ganhar os hábitos civilizados.

Semelhante estado de cousas despertou aatenção da Corte, que, revendo tão melindrosoassunto, promulgou a L. de 10 de Setembro de1611(154); a qual contém as seguintesdisposições capitais: 1.ª a liberdade dos índios éreconhecida em tese, sob penas aos infratores;2.ª, todavia era reputado legitimo o cativeiro nãosó dos aprisionados em guerra justa, mastambém dos resgatados quando cativos de outrosíndios, que, a não ser o resgate, os devorariam;

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3.ª, nenhuma guerra se poderia fazer ao gentiosenão quando este movesse guerra,levantamento, ou rebelião; precedendo resoluçãotomada pela Junta composta do Governador,Bispo (se presente), Chanceler eDesembargadores(155) e todos os Prelados dasOrdens (presentes no lugar da Junta), e depoisde competentemente aprovada pelo Rei; excetoem caso de perigo iminente, em que todaviaficava livre ao Rei a confirmação (e portanto alegitimação do cativeiro); 4.ª, que os resgatadosserviriam como cativos somente 10 anos quandocomprados por preço não excedente ao taxadopela Junta(156), e perpetuamente se fossesuperior; 5.ª, que para o governo civil dasaldeias, o Governador, sob parecer do Chancelere do Provedor de Defuntos, nomeasse Capitão,que serviria por três anos; organizadas as aldeiasem povoações de 300 casais quando muito, emtal distância das matas do pau brasil e dosengenhos, que lhes não pudessem fazer dano; eque se lhes distribuíssem terras; 6.ª, que,quanto ao espiritual, houvesse em cada aldeiauma Igreja com um Vigário, Clérigo Portuguêsconhecedor da língua indígena; e, em falta,religiosos da Companhia do Jesus; e, não oshavendo, de quaisquer outras Religiões;apresentados pelo Rei ou pelo Governador,confirmados pelos Bispos, o sujeitos àsvisitações(157), e penas eclesiásticas; 7.ª, quenas aldeias deveriam residir os Capitães com

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suas famílias, e os Vigários; 8.ª, que nelas seriao Juiz Privativo o Capitão da aldeia; de cujasdecisões caberia recurso para o Ouvidor, eRelação; 9.ª, que os índios delas poderiam serdados a serviço mesmo particular, quando osprocurassem e eles quisessem servir, por preçoconstante da taxa geral que fosse marcada parao Estado; 10.ª, que esta ordem se guardasse emtodas as aldeias presentes e futuras, bem comonas que fossem criadas de índios mandados pelamesma Lei reslituir à sua liberdade porindevidamente escravizados; 11.ª, que todos osanos mandaria o Governador tirar devassa porum Desembargador contra os Capitães dealdeias, e quaisquer outras pessoas,relativamente à falta de observância da Lei;procedendo-se por ela na Relação breve esumariamente contra os culpados.

Os colonos haviam assim conseguido avitória, abrindo-se de novo lugar à escravidãodos índios; o interesse pecuniário e metálico, apretexto de — paz do Estado... e maior bem dosmiseráveis que por tal sorte se pretendiamcivilizar e cristianizar — levou de vencida a causada justiça, da humanidade, e da verdadeirareligião, aliás bem julgada na anterior Lei de1609! Em vez do progresso, foi um passoaltamente retrógrado, como a experiência veioconfirmar.

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Os Jesuítas, por seu lado, viram-sedispensados quase que absolutamente da suatarefa, perdendo assim, com visível satisfaçãodos seus inimigos, um meio de grande influênciae poder.

D. Diogo de Menezes se retirara em 1612,e fora substituído por Gaspar de Souza. — OsFranceses, como previra aquele estadista,dirigiram-se para o Maranhão, onde sefortificaram, sob o comando de La Ravardière;em 1615, porém, foram expulsos por Jerônimode Albuquerque Coelho (Maranhão), auxiliadopor diversos, quais sobretudo Alexandre deMoura, Diogo de Campos, Diogo Soares, e muitosÍndios(158). — E fins do mesmo ano teve começoa povoação do Pará por Francisco Caldeira deCastelo Branco. Para o Maranhão principalmenteeram mandados colonos dos Açores, e tambémos degradados(159);.

Em conseqüência das dificuldades danavegação naqueles tempos, provenientes dascorrentes oceânicas, as três Capitanias doCeará, Maranhão, e Pará foram constituídas emgoverno distinto do das outras, em Estadoseparado do Brasil, por Decreto de 13 de Junhode 1621(160).

Os Jesuítas só foram aí admitidos (1622)com a formal obrigação de se não intrometerem

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na proteção dos índios, impedindo a sujeição aoscolonos, que já então se denominavaadministração(161).

Enquanto isto se passava no Norte, e asoutras Capitanias progrediam com algumsossego e prosperidade, os Paulistas haviamdesenvolvido extrema atividade em cativar osgentios, exercendo sobre eles uma verdadeiracaçada, e chegaram nas suas excursões até aoscampos ao N. de Guarapuava, e missões deGuaira, onde os aprendiam por milhares, quevinham vender mesmo ao Rio de Janeiro(162).

Por esta época, organizada na Holanda acélebre Companhia das Índias Ocidentais,foram-lhe pelos Estados-Gerais conferidosextraordinários favores, inclusive fazer com osindígenas tratados de aliança e comércio,reconhecendo assim formalmente neles aqualidade e todos os direitos de homens livres, enão entes destinados a servir aos Europeuscomo escravos, ou contra sua vontade(163). —Esta mesma Companhia deliberou a conquistado Brasil, que tentou sem grande êxito(164). —Diogo Luiz de Oliveira, o novo Governador, tratoude fortificar-se e preparar-se contra tão temívelinimigo.

No Estado do Maranhão e Grão Pará sehavim estabelecido as chamadas administrações

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de índios, que consistiam em confiar-se ogoverno das aldeias a chefes colonos, que eramretribuídos com o serviço dos mesmos índios. E,porque o Alv. de 8 de Junho de 1623 o houvessepositivamente proibido(165), o povo sublevou-se,e a Câmara fez suspender a sua execução atéque chegasse o Governador Francisco Coelho deCarvalho.

Por esta época, e mesmo anteriormente,Bento Maciel Parente (de execranda memória)exercia crueldades contra os miseráveisíndios(166).

A título de resgates continuavam osatrozes delitos cometidos pelos colonos nossertões em busca de índios; nada podia evitar ouimpedir: de sorte que o Governador se viuforçado a proibí-los, ainda que contra a lei queem alguns casos os permitia. Mas esta justaprovidência deu lugar a tal clamor do povo, queele foi obrigado a cassar a sua ordem, erestabelecer os resgates(167).

No Sul, não era mais feliz a sorte domiserável gentio. Os Paulistas continuavam nassuas correrias em caça dos índios, queescravizavam e vendiam; chegando a invadiragora as próprias missões dos Jesuítas, e até asaldeias, d’onde arrancavam mesmo os járeduzidos; por forma que dali trouxerão para

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cima de 15.000(168). — Por Dec. de 18 deSetembro de 1628 havia a Corte mandado que sepunissem os culpados. — Os Jesuítasqueixavam-se; e vieram a S. Paulo e ao Rio deJaneiro pedir providências. — Nada, porém,continha a audácia daqueles intrépidosaventureiros.

Quase em fins da primeira metade doséculo XVII consolidou-se a conquista Holandesano Brasil, não obstante a oposição de Matias deAlbuquerque Coelho e de outros bravos;Pernambuco era definitivamente ocupado; acolônia holandesa estendia-se nessa época(1635–1644) desde Pernambuco até o Maranhãoinclusivamente, apesar de serem os Holandesesgrandemente incomodados pelas correrias doíndio Antônio Felipe Camarão, do preto HenriqueDias, e de outros, intitulados — capitães dasemboscadas —. O governo dessa Nova Holandaou Brasil Holandês foi confiado ao príncipeMaurício de Nassau; cuja sábia, ativa e justaadministração fez em breve prosperar a colônia(singular e natural contraste do procedimentomesquinho, suspeitoso e egoísta da metrópoleportuguesa ou espanhola), e grangeou-lhe aestima e o respeito não só dos seus, mas dospróprios inimigos(169); a colonizaçãomereceu-lhe especial cuidado; os índios eramhomens.

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Deixemos, porém, tão vasto assuntohistórico e social. Voltemos aos nossosindígenas, cuja escravidão ou liberdade foisempre a questão abrasadora da colônia(170).

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BULA DO PAPA URBANO VIII A FAVOR DOS ÍNDIOS. —OPOSIÇÃO DO POVO. — EXPULSÃO DE JESUÍTAS. —ADMINISTRAÇÃO DE ÍNDIOS. — PADRE ANTÔNIO

VIEIRA. — ALDEIAS. — ENTRADAS NOS SERTÕES PARADESCER GENTIOS. — NOVA EXPULSÃO DE JESUÍTAS.— NOVAS LEIS SOBRE ÍNDIOS E JESUÍTAS. — GUERRA

AOS ÍNDIOS; DESTRUIÇÃO DE TRIBOS.

Dominava o sistema da Lei de 10 deSetembro de 1611.

Os Paulistas prosseguiam cada vez maisousados nas suas correrias ou caçadas, eassaltavam as missões jesuíticas até doAcaraí(171), sem que cousa algumaconseguissem os Padres do Governo do Brasil;por forma que resolveram mandar queixasdiretas a Madri e ao Sumo Pontífice,despachando para aquela o Padre Ruy deMontoya(172), e para Roma Francisco DiasTano(173).

Mais bem sucedidos voltaram com umaBula do Papa Urbano VIII (de 22 de Abril de1639) publicando no Brasil a de Paulo III (de 28

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de Maio de 1537), declarando incorrer emexcomunhão os que cativassem e vendessem osíndios.

O povo e a Câmara do Rio de Janeiro seopuseram à execução da Bula; e, não obstante aproteção do Governador, Salvador Corrêa de Sá eBenavides, aos Jesuítas, foram estesconstrangidos a desistir de quaisquer direitosque da Bula lhes pudessem vir, e a declarar quese não envolveriam mais na administração dosíndios, exceto das Aldeias, onde secomprometeram a não admitir os dosparticulares, como consta do Acordo de 22 deJunho de 1640(174).

Em S. Paulo o levantamento contra osJesuítas foi mais violento, porque trouxe a suaexpulsão, conforme o acordo de 13 de Julho de1640(175); e os Paulistas mandaram à Corteprocuradores com uma representação contra osPadres, e com eles Amador Bueno enviado pelaCâmara(176).

A representação referida, e a anterior quehaviam levado os Jesuítas contra os Paulistas,foram submetidas ao parecer de várias pessoasconspícuas; dando em resultado que semandassem, por Alv. de 3 de Outubro de 1643 eC. R. da mesma data, restituir os Jesuítas aosseus colégios até que se deliberasse

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definitivamente(177): o que todavia não pôde serlogo executado(178).

Na Bahia se havia deliberado por assentode 6 do Abril de 1643(179), confirmado pelo Reiem C. R. de 23 de Junho de 1655; fazer a guerraaos índios; o que foi confiado a GasparRodrigues.

No entanto, com a gloriosa revolução do 1.°de Dezembro de 1640 havia terminado paraPortugal o domínio da Espanha, e sido elevadoao trono o Duque de Bragança aclamado Rei D.João IV. — E logo em 1641 o Brasil voltou aodomínio português à exceção da parte ocupadapelos Holandeses.

O Conselho das Índias fora substituídopelo Ultramarino (1642), incumbido de prover aoque conviesse ao bem dos Estados ultramarinos,bom governo e aumento deles, e propagação doSanto Evangelho.

O desejo de lançar fora os Holandesesagora mais se pronunciava. O Padre AntônioVieira, em um célebre sermão pregado na Bahiaem 1640, provocou os povos. A corte portuguesaprestou então maior atenção a tão grave objeto; emuito facilitou a vitória a má gerência da colôniaholandesa desde que em 1643 a deixou opríncipe de Nassau, assim como a guerra

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levantada entre a Holanda e a Inglaterra. Não foi,porém, sem se haverem ferido combates por mare por terra, e sem se haver derramado não poucosangue. Todos porfiavam a quem melhor servirianessa tão grande luta, nesse patriótico empenho.Desde 1644 foram expulsos do Maranhão porAntônio Moniz Barreiros e Pedro de Albuquerque.No Ceará o mesmo lhes sucedia. EmPernambuco durou a luta desde 1645 até 1654,em que Segismundo Von Schkoppe teve decapitular e abandonar o Recife; as batalhas dosGuararapes sobretudo decidiram da sorte daguerra da restauração. A história registra comrespeito e gratidão os nomes de Antônio Telles daSilva (governador geral), João Fernandes Vieira,André Vidal de Negreiros, Antônio Telles deMenezes, Francisco Barreto de Menezes, AntônioDias Cardoso, Salvador Corrêa de Sá eBenavides, Pedro Jacques de Magalhães, etantos outros verdadeiros heróis; distinguindo-seo negro Henrique Dias, o índio Camarão com osseus, sua mulher D. Clara, e ainda váriosoutros(180).

Entretanto fatos interessantes tinhamlugar na vida colonial do Brasil, e acerca dosÍndios.

Por Dec. de 27 de Abril de 1645 se dispôsque os primogênitos herdeiros presuntivos dacoroa se intitulariam — Príncipes do Brasil —, o

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que elevava a colônia à categoria dePrincipado(181).

Havia sido instituída por Alv. de 10 deMarço de 1649 a Companhia geral de Comérciodo Brasil, à semelhança da de Holanda, cujaduração seria de 20 anos, prorrogáveis por mais10, e à qual se concedeu o monopólio de diversosgêneros(182).

O Estado do Maranhão fora dividido pelaResol. de 25 de Fevereiro de 1652 em doisgovernos distintos, Maranhão e Pará.

Na Bahia fora restabelecida a Relação, àqual se deu o novo Regimento de 12 de Setembrode 1652(183). Nele se recomendava aoGovernador proteção aos índios de paz (§21),«não consentindo que fossem maltratados,fazendo punir com rigor quem os molestasse emaltratasse; assim como que desse ordem a quepudessem viver junto das povoações dosPortugueses, de modo que os do sertão folgassemde vir para as ditas povoações, observando-se alei de D. Sebastião e provisões posteriormentepromulgadas.»

No Pará e Maranhão continuavam asadministrações de índios, com todos os horrorescometidos pelos colonos, a fim de os haverem dosertão por bem ou por mal; e abusavam por tal

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forma dos que caiam debaixo das mesmasadministrações —que(184) em breves dias deserviço ou morriam à fome e excessivo trabalho, oufugiam pela terra dentro, onde a poucas jornadaspereciam, havendo por esta causa perecido eacabado inumerável gentio no Maranhão e Pará, eem outras partes do Estado do Brasil.

Foi, pois, decretado pelo Alvará de 10 deNovembro de 1647(185) —que, sendo livres osíndios, como fora declarado pelos Reis de Portugale pelos Sumos Pontífices, não houvessem maisadministradores nem administrações, havendo pornulas e de nenhum efeito todas as que estivessemdadas, de modo a não haver memória delas; e queos índios pudessem livremente servir e trabalharcom quem bem lhes parecesse, e melhor pagasse oseu trabalho.

Outros Alvarás de 5 e 29 de Setembro de1649 foram expedidos sobre o mesmoassunto(186).

E os novos Governadores, Baltazar deSouza Pereira, no Maranhão, e Inácio do RegoBarreto, no Pará, trouxeram instruçõesconstantes dos seus regimentos(187), especiaispara a execução das ditas determinações; o quetodavia não conseguiram, em razão da oposiçãolevantada pelos povos, que no Pará chegaram atéa obrigar o Reitor dos Jesuítas, João de Souto

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Mayor, a declarar solenemente que os Padres selimitariam ao espiritual quanto aos índios,condição essencial de sua tolerância nessaCapitania.

Pelo mesmo tempo chegava ao Maranhão oPadre Antônio Vieira (1653), da Companhia deJesus, com carta do Rei de 21 de Outubro de1652, autorizando-o a proceder como melhorentendesse relativamente aos índios; para o quedeveria ser auxiliado pelos Governadoresconforme as instruções a estes dadas(188). Na1.ª Dominga da Quaresma pregou ele o seu 1.°sermão, em defesa da liberdade dos índiosprocurando captar a benevolência, e tentar aemenda ou correção dos moradores. E,passando-se ao Pará, exibiu a Carta Régiamencionada; dando esta lugar a umlevantamento popular, de que resultou assinarele um protesto de se não envolver em reformaras administrações de índios. Querendo, porém,aquilatar por si mesmo o procedimento doscolonos na apreensão deles, acompanhou umaexpedição ao Alto Tocantins; e do que observousoube desde logo tirar partido em bem da suaOrdem e dos míseros Indígenas.

A Corte Portuguesa, sempre vacilante etímida em questão de tamanho alcance para ahumanidade, e para a paz do Estado Brasílico,havia relaxado a restrição das Leis últimas,

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cedendo à representação dos procuradores dopovo do Pará e Maranhão; e pela Provisão de 17de Outubro de 1653(189) restabeleceu não só oscasos anteriores de cativeiro dos índios, quandoaprisionados em guerra justa, ou resgatadosquando destinados à morte, e atados à cordapara serem devorados, mas introduziu casosnovos e tão latos, que era quase impossíveldeixar de haver índio que pudesse escapar a essarede que assim se lançava contra todos, em bemsuposto dos colonos, dos próprios índios, edesejada tranqüilidade e prosperidade do Estado.— Para se reputar justa a guerra — há de constar(diz a Provisão) que o dito gentio, livre ou vassalo,impediu a pregação do Evangelho, e deixou dedefender as vidas e fazendas dos vassalos deEl-Rei em qualquer parte; haver-se lançado com osinimigos da Coroa, e dado ajuda contra osvassalos. — Também será legítimo o cativeiro, seexercerem latrocínios no mar ou em terra,infestando os caminhos; salteando ou impedindo ocomércio e trato dos homens, para suas fazendas elavouras: se os índios, súditos de El-Rei, faltaremàs obrigações que lhes foram postas e aceitas nosprincípios de suas conquistas, negando ostributos, e não obedecendo quando foremchamados para trabalharem em o Real serviço, oupara pelejarem com os inimigos do Estado; secomerem carne humana, sendo meus súditos.—Igualmente poderão ser cativados aqueles gentiosque estiverem em poder de seus inimigos, atados à

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corda para os comerem, e meus vassalos osremirem daquele perigo com as armas, ou por outravia; e os que forem escravos legitimamente dossenhores, a quem se tomaram por guerra justa, oupor via de comércio e resgate.

Para este fim permitiu a Provisão (2.ªparte) que se pudessem fazer entradas no sertãopor pessoas eleitas, à maioria de votos, pelosCapitães-mores, Oficiais da Câmara, Preladosdas Religiões, e Vigário geral (onde houvesse);acompanhadas, porém, de Religiosos que fossemà conversão dos gentios.

E quanto às aldeias, dispôs (parte 3.ª) quenão lhes pusessem Capitães, e sim osGovernadores as deixassem sob a direção egoverno de um dos principais da sua nação, quefariam a repartição dos índios pelos colonosvoluntariamente, mediante o salário costumado.

Com esta Provisão chegaram (1654) osreferidos Procuradores; a vitória era atualmentedo povo; os Jesuítas derrotados. — Mas o PadreA. Vieira não se acovardava tão facilmente; eresolveu ir pessoalmente a Lisboa sobre tãomelindroso assunto.

Aos seus esforços foi devido criar-se aí achamada Junta das Missões, para onderecorressem e apelassem os Missionários; ante a

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qual defendeu ele com ardor a necessidade darevogação da Provisão de 17 de Outubro de 1653:o que conseguiu em parte, como se vê da Lei de9 de Abril de 1655. André Vidal de Negreiros,novo Governador do Pará e Maranhão (de novoreunidos), fiel ao seu Regimento de 14 de Abrilde 1655(190) declara-se a favor dos índios(191).

Pela referida Lei ou Provisão de 1655(192)conservaram-se os quatro antigos casos deescravidão, e eliminaram-se todos os outrosintroduzidos pela outra Provisão de 1653;confirmaram-se as entradas no sertão paraconversão dos gentios e sua distribuição,escravos de resgate; confiou-se a direção delas, emesmo a sua resolução, tempo e modo defazê-las, aos Padres da Companhia(193) complena autoridade espiritual e temporal; e bemassim a direção das aldeias(194).

Estas novas resoluções da Corte, postasem execução por Vieira, auxiliado por Vidal, indode encontro aos intentos e hábitos desumanosdos colonos no cativar os índios, produzirammais tarde os seus naturais efeitos na luta quede novo se travou entre os mesmos e osJesuítas. Por enquanto prosseguiam estes, sob adireção de Vieira, nas suas missões; chegando afazerem diversos da Companhia, e entre eles opróprio Vieira, várias entradas no sertão para adescida e conversão dos gentios(195): em uma

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destas — ficaram 240 prisioneiros; os quais,conforme as leis de S. M., a título de haveremimpedido a pregação do Evangelho, foram julgadospor escravos e entregues aos soldados —, como selê em carta de Vieira de 11 de Fevereiro de1660(196).

Por sua parte, continuavam os Paulistasas suas excursões às missões, e a guerrear eescravizar os índios; sendo das mais notáveis abandeira que em 1648 acometeu a missão ouredução de Xerez. Mas os missionários doParaguai, à frente de 4.000 índios ao mando doPadre Alfaro, derrotaram diversos. É de presumirque fossem destroços deles os Paulistas queapareceram em 1631 ante Curupá no Pará(197).

Em S. Paulo chegou-se a um acordo (14 deMaio de 1653) pelo qual eram readmitidos osJesuítas, com a expressa condição porém de senão intrometerem em negócios de índios(198).

Por falecimento do Rei D. João IV (6 deNovembro de 1656), e sendo ainda menor D.Afonso VI, foi o Reino governado pela Regente aRainha D. Luiza de Gusmão; só era 1062 tomouD. Afonso as rédeas do Estado, sendo poucodepois (Novembro de 1667) deposto pela Juntados Três-Estados, e nomeado Regente o InfanteD. Pedro; o qual, por falecimento de D. Afonso(12 de Setembro de 1683) subiu ao trono.

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A questão dos índios e Jesuítaspreocupava sempre os colonos, e trazia emtormento a Metrópole.

Em 1660 a Câmara do Pará propôs à doMaranhão uma aliança, com que melhorgarantissem os interesses dos povos respectivoscontra os Jesuítas em relação aos índios(199).

E por tal forma cresceu a exasperaçãocontra os Padres, que em 1661 teve lugar umasublevação(200), de que resultou serem presos eremetidos para Lisboa vários deles e o PadreAntônio Vieira; ficando outros presos em Belém(1662).

Em conseqüência, e havendo-se levantadona Metrópole um partido anti-Jesuíta, o Governoexpediu a Provisão ou Lei de 12 de Setembro de1663(201), pela qual se proibiu aos Padres daCompanhia e a todos os outros qualquerjurisdição temporal sobre os índios; e que,quanto ao espiritual, fossem todos postos em péde igualdade — por ser justo que todos sejamobreiros da Vinha do Senhor —, ficando a direçãoespiritual incumbida a qualquer deles, que peloPrelado, de acordo com as Religiões, fosseescolhido, assim como a paróquia e cura dasalmas dos gentios das aldeias; podendo os índiosser removidos, quando parecesse conveniente; esem que pudessem as Religiões ter aldeias

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próprias de índios forros de administração: e, notemporal, poderiam ser governados por algumdos seus principais, que houvesse em cadaaldeia, decidindo sobre suas queixas e causas osGovernadores e autoridades civis, como para osdemais vassalos se achava determinado. — Pelamesma Provisão, as nomeações dos cabos dastropas para descida dos índios, e do distribuidordeles, era conferida às Câmaras; de cujo votoficavam também dependentes as entradasanuais no sertão. Os missionários, queacompanhassem, não poderiam trazer escravospara si, nem para as suas Religiões; nemdurante um ano adquirir qualquer dos quefossem resgatados: proibição que se fez extensivaaos cabos da tropa(202), Governadores, Capitães-mores, e demais ministros e Oficiais do Estado.— Finalmente eram os Jesuítas restituídos àssuas missões, mas só com a jurisdição espiritualna forma exposta; exceto o Padre AntônioVieira(203).

Esta decisão produziu desencontradosefeitos no Maranhão e no Pará; de que resultoutergiversação em sua execução. Já anteriormente(1662) as Juntas haviam deliberado sobredescidas de índios, e restituição dos Jesuítas aoEstado com a cláusula de se não envolverem emtal assunto(204). O Governador Rui Vaz deSiqueira suspendeu a sua execução, e convocouJunta geral. Enquanto a Câmara do Pará queria

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que se cumprisse a lei, e o Governador não, eque este mandava por fim subitamente executá-la(205), a Câmara de S. Luiz em Junta resolveumandar ao rei uma representação, suspensa noentanto a dita Lei(206). Com a demora daresposta, em Belém suscitaram-se desordens,publicando a Câmara (1666) por bando a Lei; oque igualmente sucedeu depois em S. Luiz doMaranhão (1667). O Governador, assim forçado,pôs-lhe todavia na execução as restriçõesconstantes das dúvidas submetidas à Corte.

Afinal vieram estas resolvidas pela C. R. de9 de Abril de 1667, que ordenou a inteiraobservância da Provisão de 1663, com osaditamentos seguintes: 1.° que aos missionáriosera proibida toda e qualquer intervenção narepartição dos índios: 2.° que seria esta semprefeita pelo Juiz mais velho(207), de acordo com aLei de 18 de Outubro de 1666(208).

O novo Governador Antônio deAlbuquerque Coelho de Carvalho, na suaexecução, arrogou-se atribuições exorbitantescom ofensa dos direitos das Câmaras e dosJuízes. Efetuaram-se no entanto algunsdescimentos de índios(209).

Sucedendo-lhe Pedro César de Menezes, asnovas dúvidas postas à execução das leisúltimas suscitaram a expedição da C. R. de 21

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de Novembro de 1673(210), pela qual foideclarado que se publicassem e cumprissemessas leis de 1663 e 1667, e se acrescentava quea eleição dos cabos das entradas, dosrepartidores, e a deliberação de mandar aosertão descer os gentios não se fariam semautoridade dos Governadores.

A perseguição aos índios era um malincurável; e agora o ódio ia até à destruição domiserável gentio. Em 1664 tribos foramaniquiladas, quais as dos Tapuias do Urubu. Nogoverno de Inácio Coelho da Silva (1679) igualsorte tiveram os índios Taramambezes,perseguidos por água e por terra, não sepoupando sexo, idade, nem os fugitivos.Posteriormente fatos idênticos se repetiram(211).

No entanto, o Governo da Metrópole nãocessava de recomendar proteção aos índios e aosmissionários, como ainda no Regimento novo de23 de Janeiro de 1677 para os GovernadoresGerais do Brasil(212).

Continuavam as excursões pelo interior dopaís, já não tanto em busca de índios, como deminas de metais preciosos. Crescia a população.Os vexames e males provenientes do monopólioconferido à Companhia do comércio trouxeram asua extinção (1663). Era criado o Arcebispado daBahia, e os bispados do Rio de Janeiro e

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Pernambuco(213); sendo o l.° Arcebispo D.Gaspar Barata de Mendonça: e o bispado doMaranhão(214). Em fins de 1679 assentou-se noRio da Prata a colônia do Sacramento, que deuorigem em diversas épocas a gravescomplicações com a Espanha.

A questão dos índios continuava ainquietar a colônia, e a provocar novas decisõesda Metrópole; — A Câmara do Maranhão tinhaali por procurador do povo Paulo MartinsGarro(215). — A de S. Paulo queixava-se de queos Jesuítas só desejavam os índios para si, demodo que entre os seus domésticos se contavampara cima de 700(216); chegando-se mesmo alavrar aí em 24 de Junho de 1677 um acordocom o Reitor do Colégio, Padre Francisco deMorais, para que este não influisse em bem daliberdade dos índios sob pena de sofrer o que aopovo aprouvesse(217). — No Rio de Janeiroalgumas desavenças se haviam levantado entre aCâmara e os Jesuítas(218). — No Espírito Santoresolvera-se fazer a guerra aos índios(219); o quefoi incumbido aos Paulistas(220).

Os Jesuítas, porém, não se deixavamreduzir à nulidade, nem se davam por vencidosnas lutas com os colonos, já não pelo amor santoe puro de reduzir à fé Católica os gentios, e deprotegê-los contra os excessos dos povos, masprincipalmente por amor próprio, e defesa da sua

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preeminência. A decidida influência dos Padresse revela claramente nas determinações que setomaram, como veremos.

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Leis sobre liberdade dos índios. — MissõesJesuíticas. — Regimento das missões. — Novasleis de escravidão. — Descimento de índios. —Guerras dos mesmos. — Novas providências.

A Lei de l.° de Outubro de 1680(restaurando a de 30 de Julho de 1609), e aProvisão de igual data foram o resultado dessainterminável questão entre Jesuítas e colonospor causa ou a pretexto de índios(221).

Reconhece-se na Lei que — tem mostrado aexperiência que são de maior ponderação as razõesque há para proibir o cativeiro em todo o caso,cerrando a porta aos pretextos, simulações, e doloscom que a malícia abusa. — E, desejando reparartão graves danos e inconvenientes, eprincipalmente facilitar a conversão dos gentios,atendendo por outro lado ao que mais convinhaao bom governo, tranqüilidade e conservação doEstado do Brasil, aonde por muitos anos seexperimentaram os mesmos danos einconvenientes que ainda então se sentiam no doMaranhão; — Ordenou que dessa época emdiante se não pudesse cativar Índio algum do dito

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Estado em nenhum caso, nem ainda nosexcetuados nas leis anteriores; sendo livres osque fossem prisioneiros nas guerras defensivasou ofensivas que os colonos lhes fizessem, comose usa nas da Europa; podendo somente serentregues nas aldeias de índios livres Católicos,para que se pudessem reduzir à Fé, e servir aoEstado.

A Provisão(222) regulava a distribuição e oserviço dos índios livres, e dispunha o seguinte:1.° que fossem recolhidos às suas respectivasaldeias os que andassem por fora; 2.° que,verificado o número total de índios de serviço,fossem distribuídos em três partes; das quais,uma ficaria nas aldeias para tratar da lavoura,subsistência própria, e dos índios descidos denovo; a outra seria distribuída pelos moradores;e a terceira se agregaria aos Padres daCompanhia, para os acompanharem ao sertão;3.° que aos índios se dessem terras, livres detributos, sem atenção a concessões já feitas dasmesmas, porque, devendo ser sempre salvo oprejuízo de terceiro, estava implicitamenteresalvado o dos mesmos índios, primários enaturais senhores delas; 4.° que só osmissionários da Companhia de Jesus poderiamir ao sertão trazer, catequizar, e administrar osgentios, que pela grande confiança que nelestinham perderiam o temor do cativeiro, eprestariam inteira fé à liberdade que a nova lei

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lhes afiançava; sendo certo que não só osmesmos missionários se haviam mostradosempre os mais práticos o zelosos neste santoministério, cujo desempenho se lhes confiavaexclusivamente, mas porque eram graves enotórios os inconvenientes de ser ele exercido aomesmo tempo por diversas Religiões; 5.° que osmissionários nunca se acompanhassem de gentede guerra, pelo temor que inspirava aos índios;exceto quando absolutamente fosse istoindispensável por precaução, e mesmo assim àsua escolha e aprazimento; 6.° finalmente, aosPadres se mandaram restituir todas as aldeias, eentregar quaisquer outras que estivessem vagase sem párocos.

Estas novas leis foram, como sempre, malrecebidas na colônia, e para logo deram lugar areclamações e queixas por causa da distribuiçãodos índios, e por entenderem os colonos queofendiam altamente os seus direitos e interessesvitais; confiando-se, além disto, aos Jesuítas,que tinham por seus inimigos, toda a jurisdiçãoespiritual e temporal sobre os índios. Por outrolado, também o Bispo do Maranhão se queixou,por pretender que lhe cabia jurisdição sobre osJesuítas em qualidade de simples Párocos(223).

Outra causa grave de descontentamentodo povo foi o monopólio conferido a uma novaCompanhia de comércio do Grão-Pará e

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Maranhão pelo Alvará de 12 de Fevereiro de1682(224). Já neste Alvará o acordo respectivo sefez modificação à Lei e Provisão referidas; porquese permitiu aos contratadores ou assentistasfazer no sertão as entradas que quisessem, e terna Capitania até cem casais de índios a seuserviço, contanto que os baixassem à sua custa,e lhes dessem um sacerdote (escolhido peloOrdinário) para os catequizar, sem que pessoaalguma, nem mesmo o Governador, se pudesseingerir por qualquer forma em tal matéria.

Tantas causas acumuladas deram emresultado no Maranhão a revolta aberta (1684)de Manoel Beckman (ou Bequimão), a deposiçãodo Governador, a expulsão dos Jesuítas, edeclarar-se extinta a Companhia doComércio(225), tudo por deliberarão do umadenominada Junta dos Três Estados (clero,nobreza e povo). Os Padres sairam para Portugalem número de 27, depois de declararem, e seobrigarem, que em nenhum tempo por suavontade nem leve pensamento volariam.Inúmeros índios assistiram ao seuembarque(226). Havendo os Padres saído emdois navios, um destes foi tomado por umcorsário, que os deitou em terra; sendo peloGoverno Provisório do Maranhão mandados paraBelém: o outro chegou à Bahia, onde já então seachava de novo o Padre Antônio Vieira, e daíseguiu para Lisboa. Também à Corte tinha ido

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Tomás Beckman, irmão do chefe da sublevação,em missão dos sublevados.

Mas os do Maranhão, logo que sepromulgou a citada lei de 1680, haviammandado a Lisboa procuradores a reclamarem,distingindo-se entre eles Manoel Guedes Aranha,acérrimo defensor da escravidão. Conseguirameles a Lei de 2 de Setembro de 1681(227), pelaqual eram restabelecidas as administraçõesparticulares de índios, visto estarem as aldeiasmuito diminutas e não baixarem índios para oserviço dos moradores, nem os haver para asentradas do sertão; havendo risco, por estacausa, de interromper-se o comércio, consistentena indústria dos mesmos índios, e até deperder-se a sua comunicação. Conseguintementedispôz a Lei: 1.° que os moradores, ouindividualmente, ou unidos em sociedades ecompanhias, averiguando o número de índios deque houvessem mister para as suas fazendas eserviços, e com a devida autorização doGovernador, pudessem fazer descimentos; 2.°que os índios fossem sustentados pelosadministradores e se lhes dessem terras para assuas lavouras; 3.° que para as entradas iriasempre um Religioso da Companhia, ou de SantoAntônio; ao qual ficariam sujeitos no espiritual,levantando os moradores Igreja para o culto; 4.°que, no temporal, seriam livres os descidosconforme as leis em vigor; decidindo o

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Governador as suas dúvidas, ouvindo sempre oPadre respectivo; 5.° que a distribuição dosíndios entre os moradores seria feita naproporção do cabedal com que cada umhouvesse concorrido para a entrada, descimento,e fundação da aldeia; 6.° que os índiostrabalhariam, por salário, uma semana para osmoradores; ficando-lhes outra semana livre parasi em suas aldeias e lavouras; 7.° que não seriamobrigados a trabalhar, se lhes não fosse pago osalário do mês antecedente; 8.° que, para asentradas, só levariam os moradores metade dosda sua lotação, ficando a outra nas aldeias paraconservação destas; 9.° que destes serviços eramisentas as mulheres; podendo elas, sequisessem, acompanhar os maridos ou pais aotrabalho, contanto que viessem dormir à aldeia.

Era a escravidão disfarçada o que serestabelecia.

A revolução, porém, do mesmo ano obstouà sua execução, não se fazendo pela mesma Leiobra alguma por se oferecer outro meio maisconveniente(228), de que trataremos.

Os Jesuítas em Lisboa fizeram subir àpresença do Rei um memorial dos P.missionários do Estado do Maranhão com 12propostas relativamente aos negócios de índios, eà sua explusão; em o qual, queixando-se

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amargamente, concluíram pedindo a suareintegração no Brasil e Maranhão, comvantagens e garantias as mais latas no espirituale temporal relativamente aos índios emissões(229). Não eram os Jesuítas pessoas quese deixassem facilmente abater.

Antes, porém, de resolver definitivamentesobre tão grave assunto, cumpria pôr cobro àrevolta. Em 1685 chegou ao Maranhão o novoGovernador Gomes Freire de Andrade; o qualtomou enérgicas providências, que trouxeram apaz ao Estado por algum tempo; e chamou osPadres que se achavam no Pará(230).

Os Jesuítas voltavam agora, vencedores,de Belém e Lisboa. A C. R. e Regimento de 21 deDezembro de 1686, denominado das missões,entregavam-lhes para sempre não só a direçãoespiritual das aldeias, e índios, mas também ogoverno temporal e político, objeto constante dosseus esforços e ambição(231), embora o mesmoconcedessem aos Religiosos de Santo Antônio, econseqüentemente a outras OrdensReligiosas(232), a quem se permitiu aldearíndios.

Reconhecendo o dito Regimento no seupreâmbulo que todos os esforços das leispromulgadas tinham sido inutilizados pelamalícia dos moradores que inventam e descobrem

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novos modos de se não observarem, dispôs: 1.°que os Padres tornassem ao dito Estado; 2.° queteriam o governo não só espiritual que d’antestinham, mas também o temporal e político dasaldeias de sua administração, como igualmentese concedia aos Padres de Santo Antôniorelativamente às suas: com a declaração de seobservarem neste governo as leis régias, emordem a prestarem-se os índios à defesa doEstado, guerras do sertão, e outros serviços; 3.°que haveriam dois procuradores dos índios, umem S. Luís, e o outro em Belém; aos quais sedariam alguns índios para o seu serviço, semque comtudo fossem sempre os mesmos àarbítrio dos Padres; 4.° que seriam eleitos peloGovernador sob proposta do superior; e se lhesdaria Regimento; 5.° que nas aldeias nãopoderiam morar senão os índios e suas famílias,sob pena de açoites e degredo para Angola; 6.°que ninguém poderia ir às aldeias tirar índiospara seu serviço ou para qualquer outro fim, semlicença; nem aí se conservar além do tempo dalicença; tudo sob pena de prisão, multa, edegredo para Angola; 7.° que, constando que osíndios e índias eram induzidos a saírem dasaldeias para se casarem com escravos, ficassemem tal caso livres os escravos, e se mandassempara as aldeias; mas que, não constando doinduzimento, ficariam sempre os índios e índiasobrigados a permanecer nas aldeias, embora comlicença do Bispo lhes fosse lícito sair para ver o

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cônjuge: outrossim que, pela fraqueza dasíndias, verificando-se adultério, de queprovinham graves danos às aldeias, o Ouvidorgeral tirasse devassa (por exceção à lei geral emcontrário sobre tal crime) em cada ano, punindocom degredo para Angola o adúltero, e a adúltera(caso o marido não a quisesse receber) comoparecesse mais benignamente à Junta dasMissões; 8.° que os Padres tivessem muito emcuidado o aumento de povoação índia nasaldeias, por ser isto conveniente não só àsegurança e defesa do Estado, mas às entradasnos sertões e serviço dos moradores; 9.° queigual cuidado tivessem de descer dos sertõesnovas aldeias de índios, persuadindo-os ao tratoe comércio dos colonos; 10.°, que, para evitarengano no comércio e serviço dos índios, seriamos preços dos gêneros taxados pela Câmara comassistência do Governador, Ouvidor geral, eProcurador da Fazenda: e os salários peloGovernador com assistência dos Padres daCompanhia e de Santo Antônio, ouvidas asCâmaras; do que tudo se deveria lavrar assento;1l.°, que os salários seriam pagos metade nocomeço e o resto no fim do serviço; 12.°, que secriassem dois livros para a matricula dos índioscapazes de servir, a saber: de 13 a 50 anos deidade; 13.°, que deles se iriam eliminando osfalecidos e incapazes de serviço; e seriamreformados bienalmente; 14.°, que a repartiçãodos índios se fizesse por tempo de seis meses

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para Belém, e de quatro meses para S. Luiz(podendo permitir-se até seis); derrogada nestaparte a Lei do 1.° de Abril de 1680; 15.°, que arepartição seria em duas partes, e não mais emtrês (como fora ordenado), ficando uma nasaldeias, enquanto a outra ia ao sertão; 16.°, queos Padres da Companhia não seriamcontemplados nesta repartição por assim ohaverem eles pedido, dando-lhes o Governador,em compensação, para os seus serviços os dasaldeias de Pinaré e Gomary, ou de outras quepudessem (em falta) descer, com a condição denão servirem aos morados; 17.°, que para cadaresidência dos Padres em distância de 30 léguasde S. Luís e de Belém, o Governador daria 23índios; que nas outras residências se poderiamservir dos das aldeias próximas; 18.°, que arepartição dos índios pelos moradores seria feitapelo Governador, e em sua falta peloCapitão-Mor com assistência de duas pessoaseleitas pela Câmara, do Superior das Missões, ePárocos das aldeias, sem que nela fossemcontemplados o Governador e tais pessoas;expedindo-se licença aos moradores para irem àsaldeias receber os do seu quinhão; 19.°, queatenta a falta de índios nas aldeias de repartição,e tendo os moradores necessidade de ir ao sertãopor motivo de comércio, determinado que fosse onúmero de índios necessário para osacompanharem, apenas metade se tirasse dasaldeias ditas, e os outros das outras aldeias

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mediante o salário taxado; contempladostambém os moradores que tivessem escravospróprios, visto a necessidade de ficarem estesnas fábricas e o perigo de fugirem nos sertões;20.°, que algumas índias poderiam serrepartidas, a salário, pelos moradores parafazerem a farinha quando fosse tempoapropriado, e lhes criarem de leite os filhos, aarbítrio dos Missionários; 21.°, que as aldeiasfossem de 150 vizinhos, na forma do Regimentodado ao Governador; exceto quando secompusessem de nações inimigas, caso em quedentro do distrito das residências poderiam serestabelecidos em pequenas freguesias; 22.°, queos índios descidos de novo seriam isentos deservir por dois anos, por ser necessário estelapso de tempo para serem doutrinados na fé(primeiro motivo de sua redução ) e para fazeremsuas roças e se acomodarem à terra, antes quese arrependessem por causa do jugo do serviço;que a respeito de todos os índios descidos sedeveriam religiosamente observar os pactos quecom os mesmos se fizessem no sertão pelosmissionários, por ser isto conforme à fé pública,fundada no Direito Natural, Civil, e das Gentes;que, se não quisessem os índios descer, mas semostrassem inclinados a observar a Fé Cristãnos seus sertões, os Padres os estabelecessemem aldeias nos mesmos sertões do modo o maiscômodo — porque não permite a justiça que sejamtais homens obrigados a deixar as terras que

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habitam — quando não repugnam ser Cristãos, ealém disto é conveniente que as aldeias sedilatem pelos sertões para que se possam maisfacilmente penetrar e se tirem as vantagenspretendidas; 23.°, finalmente, que osGovernadores dessem aos Missionários todo oauxílio, ajuda, e favor para sua segurança nasentradas nos sertões, e para mais facilmentefazerem as missões; que, outrossim, a Junta dasMissões(233), à qual se daria Regimento, fizessecumprir e executar fielmente o presenteRegimento(234).

Dominava, porlanto, o sistema das leisúltimas, e o mencionado Regimento das Missõesdo Grão-Pará e Maranhão.

Mas em breve se lhe foram descobrindodefeitos e lacunas, que exigiram novasprovidências. Gomes Freire de Andrade, emJunta com o Governador Artur de Sá e Menezes,Padres Superiores, Ouvidor, e Desembargadores,tomou um Assento declaratório de váriosCapítulos do Regimento, o qual foi confirmadopelo Alvará de 22 de Março de 1688 com algunsnovos additamentos(235); consistindoprincipalmente no seguinte: 1.° que os índios ouíndias que casassem com escravas ou escravos,não pudessem servir aos senhores destes, nem aseus ascendentes, descendentes, ou parentesdentro do 2.° grau por Direito Canônico, pelo dolo

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que nisso poderia haver; 2.° que os que fossem àsaldeias com licença do Governador, aapresentariam logo aos missionários ou diretoresdelas; nem se demorariam aí mais de 3 dias,salvo por causa justa atestada pelosmissionários; tudo sob penas severas; 3.° quenos contratos com os índios interviesse oGovernador; mas com audiência do OuvidorGeral, quando fossem relativos a matérias deJustiça.

Outra importante alteração foi decretadapelo Alvará de 24 de Abril de 1688(236),ordenando-se que os resgates se fizessem àcusta da Real Fazenda, para o que se destinaramlogo 2.000 cruzados para o Pará e 4.000cruzados para o Maranhão; encarregados dosmesmos resgates os Prelados das missões: adistribuição dos índios resgatados seria feitapelas respectivas Câmaras, com autoridade doGovernador, e assistência do Ouvidor Geral,preterindo as pessoas que deles maiornecessidade tivessem para as suas lavouras eFazendas, as quais reembolsariam as despesasdo resgate em ordem a manter-se sempre aquelasoma para este fim designada, e mais pagariam3$000 de direitos por cabeça de índio, impostodestinado ao mesmo fim.

Porém a mais grave modificação foi a doAlvará de 28 de Abril do mesmo ano 1688(237),

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que derrogou em parte a Lei do 1.° de Abril de1680 e restabeleceu a de 9 de Abril de 1655 comalgumas alterações. — Refere o Alvará no seupreâmbulo que, segundo informações(238), eouvidas pessoas entendidas, com a providênciaabsoluta da Lei de 1680 proibitiva do cativeirodos índios ainda mesmo nos casos de guerrajusta e de resgates, se havia não só impedidoque se salvassem vidas e almas, porém que asguerras dos mesmos índios entre si e com oscolonos se houvessem tornado mais bárbaraspor se não pouparem as vidas, chegando osíndios a prenderem à corda os prisioneiros paradevorarem; ou, quando podiam, os iam venderaos estrangeiros, com grande dano do Estado: eque, sendo o principal intento no domínio dasConquistas a conservação delas pelo aumento daFé e liberdade dos índios, e chamá-los ao grêmioda Igreja, ficavam restabelecidos os resgates ecativeiros, do modo seguinte: l.° que os resgatesseriam feitos por conta da Real fazenda para comtodos os que se achassem cativos de outrosíndios, quer presos à corda para seremdevorados, quer dos cativados para seremvendidos a outras nações, contanto que nãorepudiassem eles os resgates por entenderemque outro meio tinham de livrarem a vida, e nãohouvesse influxo dos moradores para taiscativeiros; 2.° que para os resgates, modo defazê-los, distribuição dos resgatados, reembolsodas despesas à Fazenda, imposto, e outras

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particularidades, se observaria o Alvará anteriorde 24 de Abril (com pequenas modificações); 3.°que, quanto ao cativeiro dos aprisionados emguerra com os colonos, seria legítimo não sóquando em guerra defensiva contra as invasõesdos índios principalmente se estes se opusessemcom mão armada às entradas dos Missionáriosnos sertões e pregação do Evangelho, mastambém em guerra ofensiva que os colonosfossem obrigados a fazer-lhes para impedir suasinvasões; 4.° que, porém, se deveriam veriíicarexatamente as cláusulas aí declaradas para quetais guerras e cativeiros fossem legítimos, asaber: em guerra defensiva, somente no ato dainvasão dos índios contra as aldeias ou povoações,com efetiva hostilidade; e na ofensiva, o temorcerto e infalível da invasão dos mesmos, eesgotados os meios brandos, pacíficos, econciliatórios de os fazer desistir do seu intento,ou quando, tendo feito hostilidades graves enotórias, não dessem satisfação condigna;justificando-se além disto todos os fatos queconcluíssem pela legitimidade da guerra; 5.° queseriam livres todos os índios que por outrosmodos fossem de fato escravizados; 6.° que detudo se daria conhecimento ao Rei paraprovidenciar ulteriormente como melhorparecesse.

Mas. como sempre, aberta a porta à avidezdos colonos, a escravidão e a perseguição dos

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miseráveis Indígenas eram a conseqüêncianatural e forçosa dessa incessante perplexidadedo Governo da Metrópole em matéria de tantamonta; a inexecução das Leis, clara oudisfarçada, uma vez tolerada, animava novasviolações, autorizava novas e mais audazesexigências. Por modo que, como já anteriormentehavia mui bem dito o Padre Antônio Vieira emsuas cartas de 20 de Maio de 1653 e 4 de Abrilde 1654(239), — a título de resgates, não haviamsenão extorsões e impiedades — a Majestade eranomeada, mas não obedecida.

Apesar de todas as providências paraprevenir os abusos, apesar de haverem as C. R.de 15 de Março de 1696 e 20 de Novembro de1699(240) recomendado e incumbido semelhantematéria com grande interesse à Junta dasmissões, e de haver esta de sua parte concorridocom a sua boa vontade, suscitando mesmoprovidências já do governo da colônia, já do daMetrópole, nada podia impedir a violação dasdeterminações reputadas as mais salutares, asmais conciliatórias, ainda que se relaxassem osprincípios da verdadeira e rigorosa justiça,humanidade, e religião, no intuito da paz doEstado e obediência dos moradores.

Exemplo estrondoso deu-se com aexecução da última lei facultativa dos resgates ecativeiro dos índios; porquanto em menos de 3

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anos, não obstante a gravidade das penas pelasinfrações, haviam-se estas generalizado por talforma, que quase todos os moradores(241) seachavam nelas incursos por cativarem Índioscontra as determinações Régias e os interessespúblicos; sendo necessário que a piedade do ReiD. Pedro II acudisse aos povos com o perdão porAlvará de 6 de Fevereiro de 1691(242): em o qualigualmente se fizeram modificações das penas ese criou a de multa (o dobro do valor do índio)metade para o denunciante (compreendido opróprio índio escravizado) e a outra metade paraa redenção ou resgate deles, além de serem osinfratores obrigados a pagar-lhes em dobro osalário; e se mandou, outrossim que fossemimediatamente restituídos à sua liberdade todosos indevidamente cativados, e entregues aossuperiores das missões para os aldear.

Cresceram, porém, as reclamações dosmoradores pelos embaraços em que se viam porfalta de braços para as suas lavouras, segundopretendiam eles; quando o mal era, se podedizer, geral em toda a possessão portuguesa naAmérica, e derivava de várias causas, quais apeste, a opressão da indústria, lavoura, ecomércio por excessivos tributos e erradasprovidências, perseguições da Santa Inquisição,enfim má administração geral e até daMetrópole(243).

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A Câmara do Maranhão representou porvezes sobre a miséria em que dizia acharem-seos moradores por falta de escravos. Em respostalhe foi dirigida a C. R. de 20 de Novembro de1699(244) autorizando as entradas no sertãopara o resgate deles, a arbítrio da Junta dasMissões, observadas as leis a tal respeito.

Várias outras providências sobre asmissões e índios foram ainda tomadas, mas comreferência às leis últimas.

Em a Capitania de S. Paulo se haviaautorizado pelas C. R. de 26 de Janeiro e 19 defevereiro de 1696(245) as administraçõesparticulares de índios, com certas restrições,quais — de não servirem senão uma semana,mediante salário, e a outra para si, — não iremaos sertões senão os mais robustos, — não ser ajornada excedente a 4 meses; e isto com o fim dese proverem de braços para os seus serviços,satisfeitas assim as queixas dos moradores.

Ainda em princípios do século XVIII novasprovidências foram tomadas pela Metrópole emrelação aos índios, e a prover os colonos de gentepara os trabalhos. Várias Cartas Régias seexpediram, sobretudo para o Maranhão(246).

Os tratados com a França, do 4 de Marçodo 1700 e 11 de abril de 1713 proibiram

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reciprocamente a entrada de súditos das duasNações no território contestado entre ambaspara resgatarem índios, ou fazerem comércio deescravos índios(247).

Mas, como sempre, os abusos progrediam,e a tendência maliciosa para a opressão dosindígenas se tornava manifesta; do queresulavam o desrespeito às leis, a desordem dacolônia, as novas guerras que os índioslevantaram. Era por tal forma escandaloso oabuso, que a Provisão de 5 de Julho de 1715,expedida já por D. João V, mandou repreender oCapitão-mor José da Cunha d’Eça, por ter feitoprender o procurador dos índios, contra os seusprivilégios, pelo fato de estar ele requerendo abem dos mesmos e contra as violações das Leis.

Da mais notável é a Provisão de 9 deMarço de 1718(248) exemplar eloqüente daconstante perplexidade, luta, e eontradição doGoverno da Metrópole em semelhante matéria. —Acedendo (preâmbulo) às representações doGovernador, e tendo em vista os pareceres dasJuntas sobre descimentos de índios paraabastecer as aldeias, e as lavouras e fazendasdos moradores, e para a defensa do Estado,livrando-os sobretudo da barbaridade em quevivem, devorando-se uns aos outros; sobreconsulta do Conselho Ultramarino, foi decretado:1.° que, quanto aos descimenlos voluntários dos

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Índios que, a instâncias e diligências dosmissionários, se quisessem deixar conduzir ereduzir, tratados, não como escravos, mas comolivres, não podia haver dúvida que fossem lícitos;2.° que quanto, porém, aos descimentosforçados, precedendo ameaças ou força, podiahaver escrúpulo, porque — estes homens sãolivres e isentos de minha jurisdição (diz El-Rei) queos não pode obrigar a saírem, das suas terras paratomarem um modo de vida de que eles se nãoagradam, o que, se não é rigoroso cativeiro, emcerto ponto o parece pelo que ofende a liberdade.Contudo, se estes índios (continua a Provisão)são como os Tapuias bravos, que andam nus,não reconhecem Rei nem Governador, não vivemcom modo e forma de república, atropelam asleis da natureza, não fazem diferença de mãe efilha para satisfação da sua lascívia, comem-seuns aos outros, sendo esta gula a causainjustíssima das suas guerras, e ainda fora delasos excita a frecharem os meninos e inocentes,neste caso será permitido fazê-los baixar à forçae por medo para as aldeias, por ser isto conformeà opinião dos Doutores sobre a matéria; com asduas limitações referidas na mesma lei, a saber:1.° que se não façam tanto à força que hajammortes, exceto quando se torne indispensáveljusta defesa pela oposição dos mesmos índios;2.° que, se depois de aldeados, fugirem paraviverem como bravos com ofensa das leis danatureza, possam ser constrangidos a voltar,

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sem que sejam mortos, e não se entendendocativos os que voluntariamente tornarem.

O Governo da Metrópole, cedendo sempre,por uma ou por outra forma, às exigências doscolonos, também por sua parte entendia que dosíndios podia a seu bel-prazer dispor e lançar mãoquando e como lhe parecesse, não só para dá-losa serviço particular, mas para empregá-los nosserviços públicos: como se a necessidade de taisserviços particulares ou públicos, ainda com umfim pio, pudesse jamais autorizar tais violênciasà liberdade dos mesmos índios! como se autilidade do fim legitimasse os meios! Inúmerascartas Régias dão testemunho dessasdistribuições de índios(249); e algumas atéautorizaram a venda para certos fins, ainda emdatas próximas às leis que pareciam sustentaragora de modo mais permanente a sua liberdade,como v. g. a Carta Régia de 30 de Maio de 1718que autorizou o resgate de 200 índios para com oproduto da venda dos mesmos auxiliar-se aconstrução de uma nova Igreja Catedral noMaranhão(250).

Moradores, o próprio Governo (apesar dosseus escrúpulos), e até os Jesuítas, degeneradosdos seus primeiros e gloriosos tempos, todospraticavam de modo, que os índios eram de fato,contra algumas disposições humanas das leis,destinados só ao trabalho da colônia, e que neles

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se pretendia apenas um viveiro de trabalhadores,de cujas forças, sangue e indústria tirassem omaior proveito possivel, ainda com perigo e tristerealidade da sua progressiva diminuição edesaparição, de que já tanto se queixavam(251).A redução à Fé Católica, a civilização dosIndígenas não eram senão pretextos irrisórios desemelhante procedimento; o bem espiritual eraposto, de fato, à margem, a alma era no quemenos se pensava e se cuidava. A realidade, atriste verdade era — tirar do braço indígena omaior proveito material possível, reduzir osíndios a instrumento de trabalho, ainda mesmoaqueles que (quase por escárnio) se mandavamreputar livres, pois que de livres só tinham onome, estivessem aldeados ou em mãoparticular, ou até nos sertões, que lá mesmo osiam buscar para o serviço, quisessem ou nãoeles deixar as suas terras e bosques, as suaspobres choupanas, as suas canoas, a vida enfimque tanto amavam na liberdade(252).

Semelhante procedimento, e a tradição dasofensas praticadas sucessivamente por quasedois séculos, transmitida a todas as tribos(tradição que ainda hoje se conserva com ódioaos Portugueses), provocaram os índios aguerras contra os colonos. Por fins do séculoXVII foi o Rio Grande do Norte invadido por umachusma deles, que pôs em grave perigo aCapitania; acossados foram atacar a do

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Maranhão.

Os Paulistas, por seu lado,entranhavam-se por essa mesma época emnovas bandeiras a proverem-se de braços nossertões; foram, porém, derrotados(253). Mas oseu gênio e hábitos aventureiros os levaram aprosseguir em suas excursões, já não tanto paraaprenderem índios, como para descobriremminas de ouro; e assim chegaram eles às MinasGerais, Goiás e Mato Grosso, lançando osfundamentos de diversas povoações, para asquais eram atraídos os moradores da colônia eEstado em tal quantidade, que parecia quererdespovoar-se o litoral(254).

Ao menos, este novo emprego de suaatividade, o reforço do braço Africano, apersistência (embora ainda de algum modotímida) do Governo da Metrópole na proteção dosíndios, as emigrações destes para fugirem aocativeiro legalizado ou violento, e aos serviçosimpostos a título de civilizá-los, e outros fatosgraves que atraíam a atenção do Governo e dospovos, pareciam dar tréguas às perseguições quelhes faziam, e induzir os colonos a outras vias emeios de seu desenvolvimento.

Sobre os índios, ainda outrasdeterminações foram tomadas no reinado de D.João V, que, por falecimento de D. Pedro II em 9

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de Dezembro de 1706, governava o Reino;determinações que todavia se ressentem doespirito sempre contraditório da legislação até aípromulgada. A C. R. de 5 de Julho de 1715proibiu cativá-los injustamente, e a outra de 12de Outubro de 1719 providenciou sobre a suadistribuição pelos serviços (255).

Ao mesmo tempo, várias outrasprovidências se tomavam a bem da colônia. NaBahia um Sínodo Diocesano aprovara em 1707as Constituições Eclesiásticas do Arcebispo D.Sebastião Monteiro da Vide. A povoação ecolonização estendia-se pelo restante do litoral, etambém pelo interior; criando-se por istocapitanias novas Santa Catarina e S. Pedro doSul, destacadas de S. Paulo, e sujeitas ao Rio deJaneiro (4 de Janeiro de 1742); e independentesas de Minas Gerais (Alv. de 2 de Dezembro de1720), Goiás (Alv. de 8 de Novembro de 1744) eMato Grosso (Alv. de 9 do Maio de 1748). Para oSul (Santa Catarina principalmente) se promoviaa introdução de colonos dos Açores e Madeira;no entanto que para o Norte (Maranhão, Ceará eRio Grande) se remetiam os degradados,declarando-se mesmo que para aí se deviamentender os degredos para o Brasil (Decs. de 15de Setembro de 1717 e 22 de Março de 1722).Criaram-se Juízes de Órfãos, e novasOuvidorias, a fim de facilitar a administração daJustiça: e os Bispados do Pará (1720—Clemente

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XI), S. Paulo e Minas Gerais (6 de Dezembro de1745 — Candor lucis, aeternae — Benedito XIV).

Desordens internas se levantaram porvezes na Colônia, como em Minas Gerais entrePaulistas e Europeus, desordem de ManoelNunes Vianna 1708 (V. Rev. do Inst. Hist. VI,14); Bahia, motim Maneta, e Pernambuco,desordem dos Mascates. — Do estrangeirotambém sofria a colônia, já de Espanhóis no Rioda Prata, já de Franceses no Rio de Janeiro comas invasões de C. Duclerc e Duguay Trouin (1710e 1711). A paz de Utrecht, porém, trouxeratratados (1713) da maior importância para oBrasil.

Dir-se-ia que na primeira metade do séculoXVIII lavrava por todo o Estado Brasilicofermentação dos elementos morais e materiaispara o seu desenvolvimento, embora parecesseque a desordem e a confusão conspiravam paraa ruína da colônia. Já então contava elapoderosos elementos de força, vida e atividade; alavoura, a indústria, as letras mesmo denotavamo seu progresso.

A velha questão dos Indígenas, as guerrasdestes aos colonos e vice-versa, continuavam; eas leis de algum modo concorriam para manteresse lamentável estado. É assim que no Ceará,Piauí e Rio Grande do Norte eram os índios cruel

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e atrozmente perseguidos, a pretexto debarbaridades por eles cometidas; perseguiçãoautorizada pela C. R. de 20 de Abril de1708(256). Na Bahia assaltavam eles oscolonos(257). E com maior dano em Mato Grossoos canoeiros Paiaguás(258); fazendo os Paulistasvarias excursões para puni-los, aprisionandogrande número, mas sem que eles se dessem porvencidos(259).

No Maranhão as leis últimas sobre osíndios eram iludidas na sua execução pela mávontade dos colonos; de sorte que expediu-se oDec. de 13 de Abril de 1728 permitindo aosmoradores que, à sua custa, e competentementeautorizados, baixassem os gentios para suasfazendas, casas, lavouras e fábricas, peloproveito que daí vinha ao Estado, visto saírem dabarbaridade e virem para o grêmio da Igreja;ficando no arbítrio do Governador, Bispo,Ouvidor Geral, Vereador mais velho, e domissionário do respectivo distrito, resolveremsobre o tempo de serviço, salário a pagar, erecurso contra as vexações que seexercessem(260). Os Padres da Companhiaopuseram-se a isto e à respectiva deliberação daJunta, suscitando eles a execução e observânciasobretudo do Regimento das Missões. AsCâmaras do Pará, e do Maranhão, em 1732,representaram ao Rei(261), por intermédio doseu procurador Paulo da Silva Nunes, pedindo

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que se tirasse aos missionários a jurisdiçãotemporal das aldeias e dos índios, entregando-sea capitães Portugueses. Tão graves eram asacusações, que El-Rei mandou a sindicar oDesembargador Francisco Duarte Santos; o qual,depois de minuciosas indagações, deu o seuparecer em 15 de Julho de 1735(262) a favor daconservação desse poder temporal (aliás jáexplicado nas C. R. de 26 de Fevereiro de 1693 e27 de Março de 1721, conquanto não observadasna prática), chegando nesse seu parecer aconcluir que — a supressão de tal poder aosmissionários seria a ruína das aldeias (263).

Entretanto, já a Resol. de 13 de Abril de1734 havia disposto que se não pudesse fazerguerra ofensiva, sem que o Governadorremetesse primeiro o seu voto e o dos ministrosda Junta das Missões em segredo ao ConselhoUltramarino, para que este desse a últimadecisão(264).

Nova representação fizeram os povosdaquele Estado subir à presença do Rei, em datade 24 de Junho de 1734(265), em a quallongamente expuserão, a seu modo, as queixasque tinham contra os Jesuítas, e pediamprovidências.

Não podia, porém, tolerar-se que aColônia, e sobretudo o Maranhão e Pará,

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estivessem em contínua agitação por causa daliberdade ou escravidão de índios, com grandedetrimento da Religião, da catequese e civilizaçãodos mesmos, da paz do Estado e tranqüilidadedos povos, com habitual ofensa e desobediênciamesmo formal às leis. O erro estava emmanter-se aberta a porta ao cativeiro dos índios,franco em alguns casos, e disfarçado nos outrospelo modo por que se praticavam os descimentose serviços. El-Rei, em sua piedade e religião, quistentar ainda uma vez o auxílio da intervenção doChefe da Cristandade, para que, falando aocoração, à consciência, e inspirando aos colonoso amor do próximo, o temor de Deus, esentimentos mais humanos e cristãos,conseguisse a observância das leis promulgadas,e de outras providências que pretendia tomar deacordo com o Sumo Pontífice. Nova era se vaiabrir a favor dos Indígenas.

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BULA DE BENEDITO XIV A FAVOR DOS ÍNDIOS. —NOVAS PROVIDÊNCIAS SOBRE OS MESMOS. — GUERRADAS MISSÕES NO RIO DA PRATA. — OPOSIÇÃO NOAMAZONAS. — OS JESUÍTAS. — LEIS DE LIBERDADEABSOLUTA DOS ÍNDIOS. — NOVA FORMA DO SEUGOVERNO TEMPORAL. — DIRETÓRIO PARA O

MARANHÃO E PARÁ. — EXPULSÃO DOS JESUÍTAS. —DECADÊNCIA DAS ALDEIAS; DISPERSÃO DOS ÍNDIOS. —ABOLIÇÃO DO DIRETÓRIO. — NOVAS PROVIDÊNCIAS.

A instâncias do Rei D. João V expediu oSS. Padre Benedito XIV, a sua memorável Bulade 20 de Dezembro de 1741, em a qual,suscitando as dos seus antecessores Paulo III eUrbano VIII, proibia terminantemente quequalquer pessoa secular ou eclesiástica, dequalquer categoria que fosse, possuísse comoescravos os índios e os reduzisse a cativeiro porqualquer forma, sob as penas de excomunhãolatae sententiae; bula dirigida ao Arcebispo eBispos do Brasil, e outros domínios nas ÍndiasOcidentais e América(266).

Foi ela publicada no Pará pelo Bispo D.Frei Miguel de Bulhões, com muitas

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recomendações do Rei para que se fizesse efetivaa sua execução(267).

Mas, infelizmente, surgiu logo oposição dospovos, que o impediram, ficando assim suspensade fato; suspensão que durou alguns anos porentender o Bispo que, achando-se já entãoenfermo o Rei da moléstia de que veio a falecer,não devera agravar-lhe os padecimenlos com taisnotícias(268).

No entanto, era da Real intenção tomarenérgicas providências para que a liberdade dosdesgraçados indígenas fosse respeitada; e aindaquase em fins do seu reinado foi expedida umaResolução de 1748 proibindo que o Governadormandasse tropas para resgates de índios semque informasse primeiro, com o seu parecer e oda Junta, se haviam nos sertões índios nascondições da Lei de 1688 para seremresgatados(269).

A enfermidade do Rei e seu conseqüentefalecimento privaram-no dessa glória, reservadapela mão da Providência ao seu sucessor D. JoséI, que por morte de D. João V em 31 de Julho de1750 subiu ao Trono.

Desde logo cuidou o novo Rei, secundadopelo exímio e enérgico Ministro Sebastião José deCarvalho e Mello (depois Marquês de Pombal), de

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levar a cabo o intento de seu Augusto Pai.

Já no Regim. de 13 de Outubro de 1751,dado à Relação do Rio de Janeiro, segundacriada no Brasil (por Lei de 16 de Fevereiro de1751) à reclamação dos povos do Sul da colôniapela grande distância da da Bahia, serecomendava no § 28 ao Governador toda aproteção aos índios de modo idêntico ao que seachava disposto no Regimento da Relação daBahia(270).

Aquelie grande estadista, no intuito demaior desenvolvimento da riqueza, poder, einfluência do Reino, ao mesmo tempo que seocupava seriamente de excitar as forças daNação, dirigia as suas vistas de águia para ascolônias, merecendo-lhe especialíssima atençãoo Brasil pelos recursos que dele tirava aMetrópole, pela sua extensão, grandeza eriquezas naturais, e pelo seu progresso materiale intelectual não obstante as peias que o regimecolonial sempre opusera(271).

Uma das questões que trouxeconstantemente a colônia e a Metrópole emverdadeiro tormento foi a dos índios. Ainda noreinado último, como vimos, a execução da Bulade Benedito XIV tora impedida por oposição dopovo. Fazia-se, pois, necessária uma medidaterminante e com eficácia posta em execução

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para que cessasse de uma vez para sempresemelhante estado de cousas.

Outra gravíssima questão era a daextraordinária infuência dos Jesuítas, do seuimenso poder quer no Reino, quer na colônia,quer no Universo inteiro(272); chegando aconstituir quase que — Estado no Estado —, comgrave detrimento da causa pública.

Decidido o grande Ministro a atacar defrente e com vigor apenas se oferecesse ocasiãooportuna, esta surgiu naturalmente deacontecimentos da maior importância.

Poucos mezes antes do falecimento de D.João V se havia concluído com a Espanha otratado de limites das respectivas possessões naAmérica, em 13 de Janeiro de 1750; pelo qual sehavia igualmente convencionado a cessão dossete povos das missões em troca da colônia, queficaria pertencendo à Espanha(273). Ratificadopor D. José em 1751, tratou-se de dar-lheexecução, não obstante a intriga levantada pormão oculta para ser ele anulado. Por parte dePortugal, foi enviado para o Sul Gomes Freire deAndrade (depois Conde de Bobadela), CapitãoGeneral do Rio de Janeiro, S. Paulo, e Minas; oqual saiu do Rio em Fevereiro de 1752.Encetando os respectivos Comissários os seustrabalhos, viram-se impossibilitados de

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prosseguir (1753) em razão da oposição eresistência que lhes levantaram os índios,instigados e dirigidos pelos Padres das missõesdo Uruguai, onde, assim como no Paraguai,haviam os Jesuítas criado missões, verdadeirasRepúblicas de Índios, por eles governadas comosenhores absolutos sem obediência ao Rei, e empopulação superior a 100.000 almas, só eexclusivamente em proveito dos mesmos Padrese da sua Ordem(274).

Do lado do Norte (rios Madeira e Negro)não mais felizes foram os Comissários, sendo porparte de Portugal o Governador Capitão-GeneralFrancisco Xavier de Mendonça Furtado; porqueos Índios, aconselhados e insinuados pelosPadres, retiravam-se das aldeias, levandocomsigo os mantimentos, canoas e remeiros,impedindo deste modo que se prosseguisse nademarcação(275).

Achava-se, portanto, travada a lutadiretamente entre a Coroa e os Jesuítas. Antesde desfechar-lhes o golpe decisivo e mortal,cumpria desarmá-los. A liberdade dos Índios, poreles a principio em boa fé protegida contra oscolonos e ultimamente esquecida pelos proveitostemporais que dos seus serviços retirava aCompanhia, foi a própria arma de que se serviuo sagaz Ministro para quebrar o encanto dopoder e influência da Ordem.

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Por Lei de 6 de Junho de 1755 se suscitoua observância do Breve de Benedito XIV, de 20de Dezembro de 1741, assim como de várias leisdo Reino sobre a liberdade de pessoa, bens, ecomércio dos Índios do Pará e Maranhão(276). Opreâmbulo desta lei resume eloqüentemente tudoquanto se poderia dizer para justificarsemelhante decisão, nos termos seguintes — ....mandando examinar pelas pessoas do meuConselho e por outros Ministros doutos e zelososdo serviço de Deus e meu, e do bem comum dosmeus vassalos, que me pareceu consultar, asverdadeiras causas com que desde odescobrimento do Grão-Pará e Maranhão atéagora não só se não tem multiplicado e civilizadoos índios daquele Estado, desterrando-se dele abarbaridade e gentilismo, e propagando-se adoutrina Cristã, e o número dos Fiéis alumiadosda luz do Evangelho, mas antes pelo contráriotodos quantos Índios so desceram dos sertõespara as Aldeias, em lugar de propagarem eprosperarem nelas de sorte que as suascomodidades e fortunas servissem de estímuloaos que vivem dispersos pelos matos para virembuscar nas povoações pelo meio das felicidadestemporais o maior fim da bemaventurançaeterna, unindo-se ao grêmio da Santa MadreIgreja, se tem visto muito diversamente, que,havendo descido muitos milhões de Índios, seforam extinguindo(277), de modo que é muitopequeno o número das povoações e dos

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moradores delas, vivendo ainda esses poucos emtão grande miséria que, em vez de convidarem eanimarem os outros Índios bárbaros a que osimitem, lhes servem de escândalo para seinternarem nas suas habitações silvestres comlamentável prejuízo da salvação das suas almas,e grave dano do mesmo Estado, não tendo oshabitantes dele quem os sirva e ajude paracolherem na cultura das terras os muitos epreciosos frutos em que elas abundam: — foiassentado por todos as votos, que a causa que temproduzido tão perniciosos efeitos consistiu, econsiste ainda, em se não haverem sustentadoeficazmente os ditos índios na liberdade que a seufavor foi declarada pelos Sumos Pontífices e pelosSenhores Reis, meus predecessores,observando-se no seu genuíno sentido as leis poreles promulgadas .... cavilando-se sempre pelacobiça dos interesses particulares....

Conseguintemente, dispôs-se: 1.° que osÍndios são livres em tudo e por tudo, conforme aLei do 1.° de Abril de 1680, que se mandouobservar; 2.° que não houvessem maisadministrações, nem administradores; sendofacultado aos índios, como livres que são, servira quem bem quiserem, na forma da Lei de 10 deNovembro de 1647; 3.° que como tais ficariamsujeitos às leis por incorporados nos povosconfiados ao governo de El-Rei, e hábeis, comoos outros súditos, sem distinção nem exceção

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alguma, para todas as honras, privilégios, eliberdades; 4.° que a respeito dos entãopossuidos como escravos, o mesmo seentenderia, observado o § 9.° da Lei de 10 deSetembro de 1611; com exceção somente dosdescendentes de pretas escravas, quecontinuariam no domínio dos senhoresemquanto outra providência se não desse; 5.°que, porém, para obviar os abusos que estaexceção poderia criar, os índios se deveriam terpor livres só pela presunção do Direito Divino,natural e positivo a favor da liberdade;incumbindo a prova do contrário a quemrequeresse contra a liberdade, ainda sendo réu;6.° que estas questões seriam tratadassumariamente, pela verdade sabida, em uma sóinstância, e decididas em Junta composta doDiocesano, Governador, Superiores das Missõesde Jesus, Santo Antônio, Carmo, e Mercês,Ouvidor Geral, Juiz de Fora, e Procurador dosÍndios; sendo necessária pluralidade de votoscontra a liberdade, e bastando a seu favor oempate deles: devendo a apelação ser apenas noefeito devolutivo, e não suspensivo, para a Mesade Consciência e Ordens, onde seriam taiscausas decididas de preferência a quaisqueroutras; 7.° que, convindo promover a lavoura eindústria, interessando nisto reciprocamente osmoradores e os Índios, o Governador em Juntade Ministros letrados, e ouvindo o Governador eMinistros de S. Luís do Maranhão, com acordo

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das duas respectivas Câmaras, taxasse ossalários ou jornais devidos aos Índios conforme opreço comum do Estado; os quais seriam pagospor férias no fim de cada semana, em dinheiro,pano, ferramenta, ou outros objetos, comomelhor parecesse aos trabalhadores; autorizadaa sua cobrança executivamente, conforme o Alv.de 12 de Novembro de 1647, e abolidasquaisquer outras taxas; 8." que aos Índios ficavarestituído o livre uso dos seus bens, até agoraimpedido com manifesta violência,observando-se o §40 do Alv. do 1.° de Abril de1680(278); e conseqüentemente se deveriamerigir em vilas as aldeias que tivessem ocompetente número de índios, e em lugares asmais pequenas; repartindo-se pelos mesmos asterras adjacentes às suas respectivas aldeias;sustentando-se os índios no domínio e posse dasterras para si e seus herdeiros; e castigando-secom todo o rigor quem os perturbasse; 9.° que,sendo o principal fim dilatar-se a pregação doEvangelho e trazer os indígenas ao grêmio daIgreja, e sendo difícil persuadí-los a descer àspovoações, nos sertões fossem aldeados nasobredita forma, levantando-se Igrejas, econvidando-se missionários que os instruíssemna Fé; 10.° que aos mesmos Índios seria livre oseu comércio, ainda no sertão, por convir a elespróprios e aos moradores; cuidando-seigualmente da sua instrução civil.

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Em data de 7 de Junho do mesmo anoexpediu-se um Alvará, complementar da dita lei,abolindo inteira e absolutamente o podertemporal dos missionários de qualquer Religião,por incompatível com as obrigações dosacerdócio, e altamente contrário à boa ordem eadministração da justiça, como já fora decretadona Lei de 12 do Setembro de 1663, nele inserta esuscitada; e em conseqüência, dando nova formaao governo temporal dos Índios, determinou quenas Vilas fossem preferidos para JuizesOrdinários, Vereadores, e Oficiais de Justiça osÍndios naturais delas e dos seus distritos, sendoidôneos, e que as aldeias independentes dasVilas fossem governadas pelos seus respectivosprincipais, que teriam por subalternos osSargentos-mores, Capitães, Alferes, e meirinhosde suas nações; recorrendo as partes, quando sesentissem gravadas, aos Governadores e Juízesna forma das leis e ordens já expedidas.

O Alv. de 7 de Junho de 1755, queconfirmou a criacão de uma nova Companhia decomércio do Grão-Pará e Maranhão, dispôs nos§§11 e 12 sobre o modo de pagar os salários aosÍndios, como pessoas livres.

Já por C. R. de 3 de Março de 1755 sehavia criado a nova Capitania do Rio Negro noAlto Amazonas, e dado nova forma às fundaçõesde aldeias, repartição de terras pelos Índios, e

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outros objetos concernentes; providências que ajá citada Lei de 6 de Junho fez extensivas àsoutras(279).

Foram aquelas determinações, ao mesmotempo que a aurora da liberdade dos míserosindígenas, que por dois séculos e meio gemeramdebaixo da escravidão e da opressão a maisinjusta e violenta, raios fulminados com mãofirme e certeira contra a Companhia de Jesus.

Segundo ordens terminanles da Corte, foipelo Bispo do Pará publicada em Maio de 1757 aBula já referida de Benedito XIV, e pelosGovernadores as duas leis mencionadas(280).

Os Jesuítas eram assim derrotados; epunidos exatamente por onde haviam pecado.

No entanto, quer no Sul, quer no Nortecontinuavam eles a levantar embaraços aoscomissários encarregados da demarcação, de quefalamos, chegando ao extremo de se oporem pelaforça com os seus índios à execução do tratadode 1750(281).

Resolvido o Ministro a castigá-losseveramente, conseguiu do Sumo PontíficeBenedito XIV a bula do 1.° de Abril de 1758autorizando ao Cardeal Saldanha para reformara companhia de Jesus em Portugal e todos osseus domínios. Em conseqüência foi-lhes

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proibida a continuação do comércio, que faziamcom o maior escândalo, contra as proibiçõescanônicas, no Reino e colônias; assim comoconfessar e pregar(282).

Embalde tentaram eles a revogação doBreve da reforma ante a Cúria Romana; haviasoado a sua derradeira hora(283).

Um incidente da maior gravidade veioprecipitar os acontecimentos, favorecendo oplano do hábil Ministro. O atentado de 3 deSetembro de 1758 contra a vida de El-Rei D.José deu motivo ou pretexto a que se visse neleenvolvida a Companhia de Jesus. Por outro lado,a cólera (má conselheira) e o despeito por severem derrotados quase irremediavelmente,levaram os Jesuítas no Brasil a excessos, que sepodem qualificar verdadeira e formal rebeliãocontra o Governo, já por palavras, já porobras(284).

Ao mesmo tempo que o Rei, de acordo como Sumo Pontifice e Prelados Diocesanos, tomavaprovidências contra os Jesuítas quanto aoespiritual (C.R. de 15, 19, e 20 de Abril de 1759),igualmente as tomava quanto ao temporal,conducentes ao mesmo fim, mandando-osconservar reclusos por suspeitos esequestrar-lhes os bens (C. R. de 19 de Janeirode 1759), e tirando-lhes o direito de ensinar (C.

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R. de 28 de Junho de 1759).

Até que afinal, e pelas razões que fizeramurgente a sua deliberação, não obstantependerem da Cúria Romana reclamações, foiexpedida a enérgica Lei de 3 de Setembro domesmo ano de 1759, pela qual foram os Jesuítasdeclarados proscritos, desnaturalizados, eexpulsos do Reino e seus domínios(285).

Publicada no Brasil, foi ela executada comtal aparato, como se se tivera de combater algumformidável inimigo. Decretou-se, além disso, efez-se efetivo o seqüestro dos seus bens,incorporação ao Estado como vacantes, e venda,com exceção somente dos destinados ao cultoDivino (Alvará de 25 de Fevereiro de 1761,Provis. de 26 de Fevereiro e 4 de Março de 1773).

Alterada ficara profundamente, comovimos acima, a legislação sobre os Índios com asleis de 1755 já citadas. A estas, porém, haviaprecedido o Alvará de 4 de Abril do mesmo ano,em que, para se facilitar o casamento doscolonos com as índias em proveito reciproco deuns e outros, bem geral da colonização, edesenvolvimento do Estado, se declarou não sóque não havia nisto infâmia alguma, senão queao contrário seriam eles e os seus descendentesmerecedores de mais particular proteção, dando-se-lhes a preferência para os cargos, por capazes

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de qualquer emprego, honra, ou dignidade,proibindo-se que fossem injuriados com adenominação de caboclos, ou outrasemelhante(286),

Em execução das mesmas leis (de 1755),expediu o Governador Francisco Xavier deMendonça Furtado, para o estabelecimento daVila de Borba-a-Nova no Rio Madeira, umRegimento datado de 6 de Janeiro de 1756aprovado por C. R. de 7 de Julho de 1757(287); oqual se fez extensivo às demais Vilas, e serviu deexemplar ao outro mais desenvolvido, compostode 95 capítulos e datado de 3 de Maio de 1757,expedido pelo mesmo Governador para o Pará eMaranhão enquanto não fosse por S. M. ordenadoo contrário, nestes mesmos termos aprovado porAlv. de 17 de Agosto de 1758(288).

A este tempo já o Alv. de 8 de Maio de1758 havia feito extensivas a todo o Brasil as leisde 1755 sobre a liberdade de sua pessoa, bens, ecomércio, que em favor dos Índios se tinhamexpedido para o Estado do Norte, ficando assimem tudo e por tudo igualados nos mesmosfavores e garantias(289); suscitando-se aobservância das ditas leis por diversasresoluções, como v. g. em Goiás pela C. R. de 18de Outubro de 1758(290).

No Grão-Pará e Maranhão se executava o

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tão celebrado referido Regimento ou Diretóriocujas principais determinações são as seguintes:1.° que, atenta a lastimosa rusticidade eignorância com que alé então haviam sidoeducados os índios, e enquanto não tivessemcapacidade para se governarem, haveria umDiretor, nomeado pelo Governador; o qual sedeveria regular pelo que no mesmo se dispunha(Cap. 1.°); 2.° que, competindo o Governo nasVilas aos Juízes e outras autoridades, e nasaldeias independentes delas aos respectivosprincipais, o Diretor não teria em caso algumjurisdição coativa; devendo representar às ditasautoridades, e também ao Governador doEstado, para proverem de remédio; mas semprecom brandura e suavidade para que o horror docastigo não afugentasse os Índios das povoações(Cap. 2.°); 3.° que seria o principal cuidado dosDiretores a catequese e civilização dos mesmos,conforme as intenções e zelo dos Reis dePortugal (Cap, 3.°); 4.° que, quanto ao espiritual,ficava isto à vigilância do Prelado respectivo;devendo, porém, os Diretores prestar de suaparte todo o auxílio e favor, e ser os primeiros adarem o exemplo de respeito à Igreja (Cap.4°); 5.°que, quanto à civilização pelos meios temporais,cuidariam de fazer aprender a língua portuguesa,banido o perniciosíssimo abuso de conservaremos índios na ignorância dela; que se creariamescolas para um e outro sexo, onde se lhesensinaria também a doutrina Cristã, sendo os

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mestres pagos pelos pais ou em dinheiro ou emgêneros (Caps. 5.° a 8.°); 6.° que, tanto empúblico como no particular, dessem os Diretoresaos Índios a devida consideração conforme a suaposição, cargos, e cabedais, a fim de que istolhes servisse de estimulo a bem procederem; quenão fossem chamados negros, pela infâmia evileza que isto lhes trazia por equipará-los aos daCosta d’África como destinados para escravosdos brancos, segundo se pensava; que os Índiostomassem sobrenomes, com preferência defamílias Portuguesas, para evitar a confusão quedo contrário se seguia, e a vileza de o não terem;que cuidassem de aconselhar a conveniência deconstruírem casas à semelhança das dosPortugueses, para que não vivessem todospromiscuamente com ofensa da honestidade;que por conselhos procurassem banir os vícios esobretudo o da embriaguez, a que os índios seentregavam com paixão, mas sempre combrandura para que eles se não exasperassem efugissem; que cuidassem igualmente deconseguir que os índios deixassem de andar nus,persuadindo-os ao trabalho para se vestirem(Caps. 9 a 15); 7.° que, sendo um dos fins dasleis promulgadas concorrerem os Índios para obem do Estado, além do proveito próprio, pormeio da agricultura e do comércio, os Diretores otivessem em vista, aconselhando-os, eprometendo-lhes a preferência nas honras,privilégios, e empregos, conforme o seu trabalho;

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pedindo para os mesmos terras, se naspovoações não houvessem suficientes (Caps. 16a 19); 8.° que, havendo sido causas da misériapública não só a ociosidade, mas também oabuso de terem sido aplicados os Índios a serviçodos particulares, cuidassem os Diretores commais especialidade em que fizessem eles culturade mandioca (para farinha), feijão, milho, arroz,e outros gêneros alimentícios, assim como dealgodão e tabaco gêneros de grande interessecomercial (Caps. 20 a 26); 9.° que, a fim de serabençoado o trabalho dos Índios, se pagasse odízimo, isto é, a décima parte do produto daslavouras e dos gêneros que adquirissem;avaliadas para isto competentemente as roças, efeita a cobrança em tempo oportuno, ou aarrecadação dele para a Fazenda Real (Caps. 27a 33); 10.° que, em prêmio do seu trabalhoteriam os Diretores a 6.ª parte de todos os frutosdas lavouras dos Índios, bem como dos gênerosque estes adquirissem não sendo comestíveis,exceto se os vendessem ou fizessem outronegócio (Cap. 34); 11.° que, sendo o comércio umdos meios mais eficazes para completa felicidadedo Estado, riqueza dos povos, civilização dasNações, e poder das Monarquias, procurassemos Diretores fomentá-lo e desenvolvê-lo entre osÍndios, convidando-os mesmo a buscaremgêneros e drogas do sertão; mas que, atenta asua rusticidade e ignorância, não obstante aliberdade de comerciar também neles

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reconhecida, os Diretores interviessem sempre afim de regularem o preço dos frutos e valor dasfazendas, evitando dolo e fraude contra osÍndios; e que, quando preferissem receber emgêneros, não admitissein cousas supérfluas aosmesmos Índios, ou nocivas como a aguardente;punindo-se até quem introduzisse esta bebidanas povoações ou canoas sem licença (Caps. 35a 42); 12.° que os Diretores não poderiamcomprar aos Índios os ditos gêneros por si, nempor interposta pessoa, nem com eles fazernegócio ou contrato algum (Cap. 43); 13.° que emtodas as povoações houvesse um livro chamado— do Comércio — onde se lançassem todas astransações dos Índios, para que se conhecesse afidelidade e zelo, e se evitassem os enganos comque até então foram tratados (Cap. 44); 14.° queos Diretores provocassem os Índios a procurarpara o seu comércio as cidades, por ser de maiorproveito e reputação para os próprios índios, egeral do Estado (Cap. 45); 15.° que promovessemo comércio do sertão como da maior utilidadepelas drogas e gêneros que fornece, excitando-osà extração de resinas, óleos, manteiga detartaruga, cacau, cravo, salsa e outros gêneros,convidando-os a irem em ocasião oportuna e semprejuízo da cultura nas povoações, eobservando-se para isto o serviço das canoasconforme no mesmo Regimento se dispunha; eque de todo o dinheiro que liquidamenteimportasse a venda dos gêneros se deduzisse o

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dízimo para a Fazenda Real, as despesas daexpedição, a gratificação arbitrada ao cabo dacanoa, e a 6.ª parte para os Diretores,dístribuido-se o restante pelos Índios em partesiguais (Caps. 46 a 47); 16.ª que o dinheiropertencente aos Índios não lhes seria entreguepor incapazes de administrar, mas empregado nacompra de fazendas de que houvessem mister(Cap. 58); 17.ª que, devendo os Índios comoparte integrante do corpo social concorrer para asua conservação, e sendo a distribuição delespelos moradores de utilidade vital para aslavouras, fábricas, serviços e comércio comvantagens recíprocas de uns e outros, osDiretores cuidassem em que os Principais nãofaltassem com os índios aos moradores, aindaque com detrimento da maior utilidade dos mesmosÍndios; que a repartição se fizesse em duaspartes, sendo uma para se distribuir pelosmoradores para os ditos fins; devendo, para quese fizesse justa repartição, matricular-se todosos capazes de serviço, isto é, de 13 a 60 anos,matrícula revista todos os anos para a respectivainscrição e eliminação (Caps. 59 a 66); 18.ª que,a bem dos Índios, nenhum fosse dado a moradorpara fora da povoação sem licença escrita doGovernador, assim como a nenhum moradorfosse lícito retê-los além do tempo, sob penas aostransgressores (Cap. 67); 19.ª que, em bem dosÍndios, a importância integral dos salários seriapaga de pronto logo ao receberem-nos os

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moradores; mas que, entregue uma parte aoÍndio, as outras duas ficariam em depósito nocofre para lhe serem entregues no fim,perdendo-as ele, se fugisse antes de acabar otempo do serviço, a favor do morador; perdendo,porém, este não só a importância integral, masainda o dobro, se houvesse dado causa àdeserção (Caps. 68 a 70); 20.ª que, em todo ocaso, falecendo o Índio no trabalho ouimpossibilitando-se para ele, o morador seriaobrigado a pagar-lhe ou aos seus herdeiros osalário em proporção do serviço (Cap. 70); 21.ªque estas disposições seriam extensivas aosPrincipais e outros Índios, que mandassemÍndios ao sertão, depositando título ou crédito daimportância do salário se não tivessem dinheiro(Cap. 71); 22.ª que, preferindo os Índiosrecebê-los em fazendas, os Diretores nãoconsentissem que lh’as dessem por preçosexorbitantes, sob pena de responderem peloprejuízo (Cap. 72); 23.ª que, para se fiscalizareste importante assunto da distribuição dosÍndios, os Diretores remeteriam em cada ano aoGovernador uma relação circunstanciada (Cap.73); 24.ª que os Diretores cuidassem naconstrução de casas de Câmara e cadeia; assimcomo aconselhassem os Índios em construir parasi (Cap. 74); 25.ª que, sendo causa de seacharem abandonadas as povoações não só àsviolências dos habitantes que obrigaram osÍndios a fugir para os matos, mas o abuso de os

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reterem no serviço, os Diretores mandassemuma lista de todos os que se achassem ausentes,a fim de que, conhecido o motivo, se aplicasseremédio a tão grave mal (Cap. 75); 26.ª que,convindo que as povoações se aumentem e sejampopulosas, constando pelo menos de 150moradores, se poderiam reduzir as aldeias apovoações reunindo-as como melhor parecesse,mas sem violência dos Índios, sobretudo quandode nações diferentes; tentando-se, outrossim,para o mesmo fim o descimento de Índios, acargo dos Juízes e Principais das vilas e aldeias,ainda à custa de maior despesa da Real Fazendapor assim se dilatar a fé (Caps. 76 a 79); 27.ªque, convindo muito a bem da civilização dosÍndios a comunicação e comércio com osbrancos, e tendo mostrado a experiência que ocontrário tem resultado da odiosa separação emque até então uns e outros se conservaram, seriapermitido estabelecerem-se os de exemplarprocedimento nas povoações dos Índios, e atéauxiliados e considerados, distribuindo-se-lhesterras, sem prejuízo, porém, dos mesmos Índios,primários e naturais senhores delas; sujeitos acondições para que não abusassem dos Índios,não os vexassem, não lhes tirassem suas terras,não os indispusessem com os brancos, sobpenas mesmo de serem expulsos das povoaçõcs ede perderem tudo quanto aí tivessem (Caps. 80 a86); 28.ª que, para extinguir essa abominávelseparação de Índios e brancos, fomentassem os

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Diretores os casamentos de uns e outros, pornão haver nisto infâmia alguma; castigando-seos que, depois de casados, desprezassem osmaridos ou as mulheres só pela qualidade deÍndios (Cap. 87 a 91); 29.ª que antes de doisanos de assistência nas povoações não fossem osnovo-descidos do sertão obrigados a servir (Cap.94); 30.ª que, sendo os Diretores apenas unstutores dos Índios, tivessem muito em cuidadotratá-los sempre com prudência, suavidade ebrandura, tão recomendada nas leis; e que,esquecidos da própria conveniência, seentregassem exclusivamente aos interesses dosÍndios, de modo que estes buscassem afinalvoluntariamente as povoações; pois que destemodo se conseguiriam os altos e santíssimos finsdas leis, a saber: dilatação da Fé, extinção dogentilismo, propagação do Evangelho, civilizaçãodos Indígenas, bem comum dos vassalos,aumento da agricultura, introdução do comércio,e o estabelecimento, opulência e total felicidadedo Estado (Caps. 92 a 95).

Posto em execução este Regimento ouDiretório, começaram desde logo os abusoscontra os desgraçados Índios, que, livres emnome, se viam inteiramente sujeitos sobretudoaos Diretores; os quais, longe de protetores, seconstituiram verdugos, já no trato que davam aesses infelizes metendo-os em troncos emcárceres privados, e castigando-os até com

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açoites, já no modo desabrido e de desprezo comque se portavam mesmo para com os Principais,já nos excessos que cometiam, arrogando-seatribuições que lhes não competiam eexpressamente eram confiadas às autoridades, jápraticando mil outras violências e infrações,chegando ao excesso de impedirem que osPárocos doutrinassem os Índios na língua destesainda que ignorassem os mesmos Índios aportuguesa. Interessados os Diretores na 6.ªparte do produto das lavouras e comércio, esendo certo o lucro da extração das drogas dosertão, distraíam os índios quase exclusivamenteneste serviço, com prejuízo da lavoura e daspovoações, aplicando todos a este trabalho, semdistinção, contra as leis e o referido Diretório.Quando na lavoura, obrigavam os Índios atrabalho excessivo dia e noite pela esperança demaior vantagem no seu quinhão da 6.ª parte.Tais deduções se faziam no produto da vendados gêneros dos Índios, que estes quase nadarecebiam; e isto mesmo quase sempre em cousasinúteis. Se levavam os gêneros à capital,deduziam-se, além do dízimo para a RealFazenda, despesas, quinto para o cabo da canoa,6.ª parte para os Diretores, mais 3% para oTesoureiro, 2$000 de novos direitos, e o viáticopara a Igreja! A distribuição a particularesimportava violências, como anteriormente,obrigados os Índios, à simples ordem doGovernador, a abandonar tudo para servirem aos

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moradores; e em poder destes eram tratados piorque escravos, pois só cuidavam de tirar dosmesmos o maior serviço possível, chegando àinqualificável barbaridade de lhes deitarempimenta nos olhos se adormeciam prostrados defadiga. Se os Índios, assim cruelmente tratados,fugiam, eram perseguidos no sertão em seusmocambos; e se apreendidos, castigadosseveramente com trabalhos e calceta, sem direitoa prêmio ou salário algum. Pela faculdade deserem pagos dos seus serviços em gêneros,muitas vezes lhes davam pelo trabalho de ummês apenas duas varas de algodão (300 réis) eainda menos. Terras não lhes davam, vagandoeles por estas ou aquelas roças; e por últimoentranhando-se nos matos em ranchos, a quechamavam mocambos, fugindo afinal para osgentios do sertão.

O próprio Diretório, contradizendo emmuitas de suas disposições as salutaresdeterminações das leis últimas, e querendoconciliar a liberdade e proteção dos Índios com oserviço dos moradores e desenvolvimento dariqueza pública à custa do trabalho dessesmiseráveis, criou um verdadeiro labirinto quedeu origem a todos aqueles maus resultados; desorte que em sua execução tudo foi pelo piorcontra os Índios. Da liberdade de sua pessoa,bens e comércio tinham somente a belapromessa da lei; o fato era a continuação da

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vexação e opressão. D’onde resultou,naturalmente, não se conseguir fim algum dasleis nem do Diretório, quanto à civilização ecatequese.

Em data posterior a 1773(291), governandoo Pará João Pereira Caldas, dirigiu ao Rei umalonga representação o Dr. Antônio José Pestanada Silva, que servira de Ouvidor e IntendenteGeral dos Índios(292); em a qual luminosamenteexpôs o modo por que, sempre abusivamente, sepraticavam as leis e o citado Diretório,concluindo pela abolição deste, e oferecendobases para novo governo temporal dos Índios,assim como lembrando novos meios de sefomentar o desenvolvimento da lavoura ecomércio(293); porquanto, diz ele, — bem clarofica que de nada serviram as leis aos Índios paraserem amparados na sua liberdade. O Diretório éum labirinto ou mistura de determinações que dácausa a muitas ilusões e desacertos que hoje sepraticam no Estado. Sejam bons os Europeus, queserá supérfluo o constrangimento para os Índiosseguirem o útil, o honesto e o bem(294).Desempenhem-se as leis, seja completa aliberdade dos Índios, sejam livres suas pessoas,suas ações, e os seus bens, que haverão lavouras,domicílios estabelecidos, e o comércio se exercitarásem o descômodo e a violência das distribuições,sem opressão e constrangimento dos miseráveis. E,girando a correspondência por todos, e sem

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nenhum custo e com maravilha indizível, se verábrilhando a luz da Fé e a verdade do Evangelhopor todo o país, e se dilatará não só o grêmio daIgreja, mas também se estenderão os limites doImpério Português, por nós nunca d’antespresenciados.

Se no Norte do Estado do Brasil eramnegativos os resultados, também no Sul quase omesmo se dava, não porque fosem más as leis,porém porque a sua execução era má.

Em S. Paulo, v. g., D. Luiz Antônio deSouza expediu aos Diretores das aldeias umasInstruções, semelhantes ao Diretório de queacima falamos para o Pará. Os Índios, para nãorepartirem ou darem a 6.ª parte ao Diretor,abandonavam as aldeias. Ordenou ele que detudo quanto ganhassem os Índios se deduzisse aterça parte para o índio, dos outros dois terçostirasse o Diretor a sua 6.ª parte, e o mais fosserecolhido ao cofre para a Igreja e pároco; de sorteque, sendo o salário do Índio naquele tempo 100réis por dia, apenas recebia ele 33 réis para sesustentar a si, mulher e filhos! A miséria, adevassidão, o roubo, a fuga foram asconseqüências necessárias(295).

Se alguma aldeia ainda era entregue aoscuidados de Regulares, por exemplo aosCapuchos de Santo Antônio, como sucedeu em

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S.Paulo (1793) e outros lugares, eram os Índiossujeitos, não obstante as leis últimas, a umcélebre Regimento tomado em Capítulo no Rio deJaneiro aos 13 de Agosto de 1745, em o qual sóse respirava a prepotência, a barbaridade decastigos, açoites, e tronco, excomunhões, comose nos infelizes Índios se não vissem mais do queferozes inimigos votados ao rigor e àdestruição(296).

As perseguições cotinuavam, e até a vendados prisioneiros em proveito das bandeiras,contra a proibição das leis últimas, comosucedeu com os Caiapós e outros em a Capitaniade Goiás(297).

Por tal modo se executavam as referidasleis, no Brasil, e o célebre Diretório no Pará, queo próprio Governador desta Capitania D.Francisco de Souza Coutinho informou sobre istoao Governo da Metrópole; o qual expediu a CartaRégia de 12 de Maio de 1798, assinadajá peloPríncipe Regente, depois Rei D. João VI, que emnome de sua máe D. Maria I regia o Estadodesde que, tendo ela subido ao Trono porfalecimento de D. José (24 de Fevereiro de 1777)fora a mesma Rainha acometida em 1792 deenfermidade mental.

Nessa Carta Régia(298) se dispôs oseguinte: 1.° abolição do Diretório dos Índios;

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ficando estes resumidos aos seus direitos em péde igualdade com os demais vassalos livres, egovernados pelas mesmas leis; 2.° que, emconseqüência, nas relações com Índios a serviçose observassem as leis sobre deveres de amo ecriado; e que o Governador jamais dispusessearbitrariamente deles por qualquer motivo, aindado Real serviço, exceto para defesa da terra; 3.°que o Governador tivesse muito a peito aproteção aos Índios, quer aldeados e jácivilizados, quer dos ainda embrenhados nosmatos; 4." que se promovessem os casamentosdos brancos com Índias, isentando os parentespróximos de quaisquer serviços públicos porcerto número de anos; 5.° que se não fizesseguerra alguma aos Índios, nem se desse auxílio auns contra os outros; 6.° que só se lhes poderiafazer guerra defensiva, e isto mesmo em casoextremo; 7.° que ninguém empreendessedescimentos de índios, quer por conta própria,quer pela da Real Fazenda; 8.° que ninguémpudesse receber nem haver por qualquer formaescravos dos Índios, ainda que se alegasse opretexto de serem postos em liberdade; 9.° quefossem batizados aqueles que livrementeacompanhassem os moradores, e se cuidasse dasua educação e instrução, dando-se-lhes mesmoo privilégio de órfãos; 10.° que todos são livres; eaos moradores seria permitido fazer livrementecom eles o comércio, e estabelecer-se nas terrasdos mesmos índios com a devida licença do

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Governo; 11.° que os Eclesiásticos incumbidosda conversão dos Gentios, e cura das almas,seriam pagos pela Real Fazenda; 12.° que sedaria prêmio a todo aquele que reduzissequalquer nação de Gentio. Ainda outrasprovidências aí foram tomadas em ordem aconseguir-se a civilização dos Indígenas, paraproveito destes, bem da Igreja e do Estado;recomendando-se muito particularmente a suaexata observância.

O Governador promoveu efetivamente aexecução dessa determinação, expedindo asordens necessárias, como consta de sua respostade 30 de Abril de 1799(299); em a qual declaraque um dos efeitos imediatos foi recolher-se àspovoações muita gente que se achava ausentepor não ter casa nem roças.

Não obstante essa perpétua questão deíndios, o Brasil progredia; a população crescia;as letras e artes achavam cultores na colônia,chegando-se mesmo a fundar associaçõesliterárias na Bahia e Rio de Janeiro sob aproteção de alguns Governadores; escolasregulares se criaram, e também seminários; alavoura, a navegação eram protegidas;igualmente o comércio com a Metrópole,instituindo-se mesmo companhias de comércio;continuava a mineração do ouro, e novasdescobertas de diamantes, com grande proveito

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do Erário português; crescia a renda pública. Emtodos estes resultados se via a sabedoria, o tinoadministrativo e político do grande Ministro deD. José. Tratados de limites eram concluídos. Asede do Governo central foi transferida da Bahiapara o Rio de Janeiro, tendo os Governadores otítulo de Vice-Reis (1763 a 1808).

Aquela prosperidade da colônia sofreu,porém, ainda muito com o regime monopolistada Metrópole, e sobretudo com a demissão doexímio estadista, e falecimento do grande Rei,aos quais o Brasil tanto deveu, e deve.

.Mas, apesar de tudo, era já tão vigorosa aseiva da colônia, que alguns espíritos audazes egenerosos deixaram-se arrastar a uma tentativade emancipação política em Minas Gerais,expiando mártires da sua generosa idéia deliberdade(300). A emancipação do Brasil estavareservada pela Providência para tempos, éverdade, não muito remotos, e a outras mãos eelementos(301).

Deixemos, porém, tais assuntos;suspendamos também o estudo sobre acolonização; e voltemos aos nossos índios.Começa o século XIX; vejamos o que a respeitodeles se há feito, e o que é possivel fazer-se embem dos mesmos e da pátria.

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RESTAURAÇÃO DO SISTEMA DO TERROR CONTRA OSÍNDIOS. — GUERRA AOS MESMOS. — BANDEIRAS. —NOVAS PROVIDÊNCIAS PARA A SUA CATEQUESE E

CIVILIZAÇÃO. — SISTEMA MISTO.

Vigoram as leis últimas sobre liberdadedos índios.

Da compressão em que viviam quandomantida a escravidão, da sujeição aos senhores,da ausência de deliberação própria, da tutelaforçada enfim em que jazeram por anos e porséculos passaram quase sem transição para oestado de liberdade plena, extremo oposto;abandonados, portanto, a si mesmos, aos seuspróprios recursos, à sua própria e únicadeliberação, afinal internaram-se pelos sertões;as aldeias caíram em decadência e ruína; só amuitos esforços e à custa de grandes sacrifíciosse chegaram a manter ou a aldear, semvantagens notáveis para a sociedade(302).

A catequese pouco ou nada aproveitava; ainfluência fascinadora dos Jesuítas tinhadesaparecido, e os índios sem a direção desses

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Padres desnortearam completamente. Acivilização dos mesmos ressentiu-senecessariamente da supressão dos elementosque a entretinham. Por cúmulo de infelicidade, aintrodução de escravos Africanos concorreu nãopouco para impedir a civilização dos Indígenas;igualados àqueles como escravos eram do mesmomodo maltratados pelos colonos, e das relaçõescom os Africanos não podia vir senão aumento eagravação de elementos desfavoráveis àcivilização dos índios(303); das uniões lícitas(casamentos, ora tolerados, ora de algum mododificultados), ou ilícitas, com os dessa raçadecaída, proveio um cruzamento reputadodegradante, e realmente de perniciosa influênciafísica e moral para os mesmos índios, por formaque os colonos por vileza os denominaram emgeral negros, e foi preciso que a lei proibissetratá-los por tais(304); e dessas uniões resultouperpetuar-se na descendência índia, provenientede escravas de raça Africana, a escravidão, e sermantida por disposição da Lei não obstantehaver a mesma lei abolido a escravidão dosindígenas(305).

Por outro lado, os Índios conservandosempre vivas pela tradição as perseguiçõescruéis e a escravidão que sofreram dos colonos, enutrindo sempre indelével o ódio contra osPortugueses(306) assaltavam os habitantes emuma ou outra capitania. Os moradores não os

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poupavam; e ao mesmo tempo representaçõeseram levadas à presença do Príncipe Regente. Osistema do rigor foi de novo ensaiado, apesar daimproficuidade dele já demonstrada pelaincessante perplexidade do seu emprego e do damoderação durante perto de três séculos.

Em 1806 fez-se a guerra aos índios naBahia(307)

Achando-se já no Brasil (Janeiro de 1808)o Príncipe Regente com a Real Família, emconseqüência da invasão de Portugal peloexército Francês no reinado de Napoleão I,mandou-se fazer guerra ofensiva aos Botocudos,em Minas Gerais, pela C. R. de 13 de Maio de1808(308) dirigida ao Governador e CapitãoGeneral da Capitania: na qual se lê o seguinte:«Que desde o momento, em que receberdes estaMinha Carta Régia, deveis considerar comoprincipiada contra estes índios antropófagosuma guerra ofensiva, que continuareis sempreem todos os anos nas estações secas, e que nãoterá fim senão quando tiverdes a felicidade de vossenhorear das suas habitações, e de os capacitarda superiodade das minhas Reais armas, demaneira tal, que movidos do justo terror dasmesmas peçam a paz, e sujeitando-se ao docejugo das leis, e prometendo viver em sociedade,possam vir a ser vassalos úteis, como já o são asimensas variedades de índios, que nestes meus

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vastos Estados do Brasil se acham aldeados...Que sejam considerados como prisioneiros deguerra todos os índios Botocudos, que setomarem com as armas na mão em qualquerataque; e que sejam entregues para o serviço dorespectivo comandante por 10 anos, e todo o maistempo, em que durar sua ferocidade, podendo eleempregá-los em seu serviço particular duranteesse tempo, e conservá-los com a devidasegurança mesmo em ferros, enquanto não deremprovas do abandono da sua ferocidade oantropofagia.»

Por igual modo se mandou proceder contraos Bugres, em S. Paulo, pela C. R. de 5 deNovembro de 1808(309) dirigida ao Governador eCapitão General da capitania, onde se lê oseguinte: — Que não há meio algum de civilizarpovos bárbaros, senão ligando-os a uma escolasevera, que por alguns anos os force a deixar eesquecer-se da sua natural rudeza, e lhes façaconhecer os bens da sociedade... Que todo omiliciano, ou, qualquer morador, que segurar algumdestes Índios, poderá considerá-los por 15 anoscomo prisioneiros de guerra, destinando-os aoserviço que mais lhe convier.

O sistema de brandura ou humanidade,como se exprimem essas Cartas Régias, foi aíabandonado para se restaurar o do terror;pensamento manifestado ainda na C. R. de 2 de

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Dezembro de 1808(310) como proveitoso pelo quesuecedeu contra os Botocudos. Nessas CartasRégias eram restauradas também as bandeiras,quer de tropa de linha, ou de milicianos, quer departiculares, contra os índios; e a escravidão eradisfarçada em servidão temporária, e mesmoindefinida.

Mas de todas as determinações expedidasnessa época com tal intento sobressai a C. R. do1.° de Abril de 1809(311), altamenteinteressante, e na qual se lê: «Ao mesmocomandante ordenareis que quando sejaobrigado a declarar a guerra aos índios, queentão proceda a fazer e deixar fazer prisioneirosde guerra pelas bandeiras que ele primeiroautorizar a entrar nos campos; pois sem essapermissão nenhuma bandeira poderá entrar;bem entendido, que esta prisão ou cativeiro sódurará 15 anos, contados desde o dia em queforem batizados, e desse ato religioso, que sepraticará na primeira freguezia por ondepassarem, se lhes dará certidão, na qual sedeclare isso mesmo, excetuando porém osprisioneiros homens e mulheres de menor idade;pois que nesses o cativeiro dos 15 anos se contaráou principiará a correr, nos homens de 14 anos enas mulheres de idade de 12 anos; declarandotambém que o proprietário do índio guardarásempre a certidão para mostrar o tempo decativeiro que ele deve sofrer, e ficará exposto a

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declarar-se livre o índio, se acaso perder acertidão e não puder tirar outra, bem entendidoque os serviços do índio prisioneiro de guerra, deuns a outros proprietários, durará pelo espaço detempo, que haja de durar o seu cativeiro, esegundo mostrar a certidão que sempre o deveacompanhar. Os prisioneiros de guerra feitospela tropa se distribuirão pelos oficiais e soldadosda mesma tropa, à exceção daqueles que fornecessário deixar para o meu Real serviço.... Quefazendo partir o Comandante com a tropa delinha e artilharia.... proporcional à expediçãointentada, façais ir juntamente dois religiosos ousacerdotes de zelo exemplar e de luzes, quesejam encarregados não só de catequizar, batizare instruir os índios, mas de vigiar que com elesse não pratique violência alguma, senão aquelaque for necessária para repelir a sua naturalrudeza e barbaridade.»

Aqui manda-se fazer guerra ofensiva paraaterrar e subjugar os índios, quer pela tropa,quer por bandeiras; e, ao mesmo tempo que serecomenda a intervenção de religiosos quecatequizem, batizem, e instruam os índios, seordena que a tropa seja ajudada até deartilharia! e mais ainda, se restabelece aescravidão (embora temporária) dos prisioneiros,por 15 anos a contar do dia em que fossembatizados! sem excetuar os velhos, mulheres, ecrianças! não se devendo para os impúberes

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contar esses 15 anos senão desde que tivessemchegado à puberdade!

Os prisioneiros das bandeiras eramtransferíveis enquanto durasse o seu cativeiro; egarantido este aos proprietários pela certidão,que se lhes devia dar, do batismo do índio comessa declaração; à tropa doviam ser distribuídosos seus respectivos prisioneiros, em os quaistambém teria o seu quinhão o Real serviço!

De sorte que, pretendendo-se a catequesee civilização dos índios, tentava-se à força debaionetas e de metralha! Devendo-se-lhes fazerabraçar a religião de Cristo, comecava-se poravivar-lhes e aguçar o ódio contra os sectários eos Ministros dessa Santa e sublime religião! aágua do batismo, que para muitos foi e é a daredenção, para esses infelizes era a do cativeiro!

As conseqüências são fáceis de prever.Recrudescência do ódio e animosidade dos índioscontra os habitantes; fuga e dispersão dosmesmos, não sem inquietarem e trazerem emsobresalto os moradores; maior dificuldade paraatraí-los ao grêmio da religião e da sociedade.

O Regente já havia recebido váriasrepresentações e informações enviadas pelosGovernadores e Câmaras, sobressaindo nessaépoca a do Desembargador João Rodrigues de

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Brito, da Bahia, que reprovava o sistema dealdear os índios em povoações separadas, eentendia que só a estreita comunicação com agente civilizada podia excitar neles o apetite dascomodidades da vida social. Também era notávela Memória, que à Rainha D. Maria I, haviadirigido Domingos Alves Branco Moniz Barreto, aqual refere ele próprio (em outra sua Memóriacontra o tráfego e escravidão dos Africanos) forabem recebida e aprovada; aí propunha o seuautor um novo humanitário plano paracatequese e civilização dos Indígenas(312).

Prestando o Governo alguma atenção asemelhante assunto, não obstante o muito quetinha de providênciar para o Brasil e tambémpara Portugal e demais possessões em crise tãomelindrosa e grave, expediu a já citada C. R. de2 de Dezembro de 1808 para a civilização dosÍndios do Rio Doce(313), em a qual serecomendam os meios brandos para os Índiosque se queiram sujeitar voluntariamente, aintervenção de Eclesiásticos virtuosos que seencarreguem da redução e instrução, aedificação de Igrejas, e o aldeamento só quandoem grande número; que, sendo em pequenonúmero, fossem distribuídos pelos fazendeiros eagricultores com certas obrigações, servindo-ospor 12 anos, e por 20 sendo menores de 12 anosem compensação da educação e alimentação;que se permitisse nos aldeamentos

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estabelecerem-se famílias portuguesasmorigeradas e industriosas; e que se dariamprêmios aos fazendeiros que melhor tratassem osíndios e maior número civilizassem,promovessem casamentos, e mostrassem maiornúmero de nascimentos deles nas suasfazendas. Aí mesmo se reconhece que osDiretores abusavam e que os índios fugiam paraos bosques, nas palavras seguintes: «havendo aexperiência mostrado que as aldeias ou povoaçõesde índios não têm igualmente prosperado, antesvão em decadência, já pela natural indolência epouco amor deles ao trabalho, já pela ambiçãodas pessoas, que com o título de Diretores ououtro qualquer só têm em vista tirar partido degente grosseira, rústica e pouco civilizada, paraabsorverem à sua sombra os socorros dados pelaMinha Real Fazenda, que tendo sido muitoconsideráveis, têm sido em parte infrutíferos ...serão obrigados nas devassas anuaisdenominadas Janeirinhas a perguntarem pelosque desencaminham índios, ou os induzem afugir para os bosques e a subtrair-se àcivilização....»

Expediu ainda as C. R. de 28 de Julho de1809 e 5 de Setembro de 1811(314) sobrealdeamentos de várias tribos, quais os Puris eXamixunas, e redução de outras, quais osCanajás, Apinagés, Chavantes, Cherentes, eCanoeiros. Ao mesmo tempo que aí se declara

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que os índios são livres e que de não seremmantidos eficazmente na liberdade tem provindograndes males, e que se recomendam os meiosde brandura e o auxílio da Religião, também seordena o emprego da força como único meioextremo de os reduzir, e que sejam mesmodestruídos, se for necessário, embora sereconheça que a maior culpa está da parte doscolonos, moradores e até dos Diretores. Nacitada C. R. de 1809 (art. 7.° das Instruções quea acompanham) lê-se o seguinte: «A fim de queprospere o aldeamento, conservando-se os quepresentemente existem, e a fim de que seanimem outros muitos índios a descer dossertões é de suma necessidade que o Diretor lhesfaça ver, e que eles se convençam, de que sãointeiramente livres, e isentos de toda aescravidão, podendo dispor livremente de suaspessoas, sem outra sujeição temporal que nãoseja a que devem ter às leis do Soberano, a fimde viverem felizes à sombra delas na sociedadecivil e união cristã, tendo a honra de ficaremassociados aos mais vassalos de S. A. R.; sendocerto que, por se não haverem sustentado os Índioseficazmente na liberdade, é que se tem extinguidoo grande número das aldeias e povoações,desertando milhares de índios, internando-se outravez nas suas habitações silvestres, ediminuindo-se os braços que são necessáriospara cultivar a terra e colherem-se os muitos epreciosos frutos que ela é capaz de produzir.» —

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Na outra C. R. de 1811 se lê o seguinte:«Acontecendo que este meio não corresponda aoque se espera, e que a nação Canajá continuenas suas correrias, será indispensável usarcontra ela da força armada; sendo este também omeio de que se deve lançar mão para conter erepelir as nações Apinagé, Chavante, Cherente, eCanoeiro; porquanto, suposto que os insultos queelas praticam tenham origem no rancor queconservam pelos maus tratamentos queexperimentaram de alguns Comandantes dasaldeias, não resta presentemente outro partido aseguir senão intimidá-los, e até destruí-los, senecessário for, para evitar os danos quecausam.»

O sistema então seguido foi misto, querdizer, meios brandos e conciliatórios, ao mesmotempo que a força e o terror; se o índio não sequisesse sujeitar por bem, devia ser reduzido àforça contra sua vontade, ou perseguido comoinimigo a que se não desse quartel, e mesmodestruído, exterminado. Tal é o espirito, opensamento que se revela em todas essasdeterminações, e que foi expressamentemanifestado no Aviso de 11 de Dezembro de1811(315) nas palavras «deixando-se agora ver.... a esperança que pode haver de que seconsiga com os meios fortes acompanhados dosde brandura o efeito tão desejado da sua prontacivilização ... continuando a fazer-se-lhe uma

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dura guerra enquanto não quiserem pacificar-see viver debaixo da proteção das Leis.»

Foi um erro grave esse de pretendersubmeter, catequizar e civilizar os índios à forçade armas e pelo terror, não obstante parecer aogoverno que dele se colheria, ou se colhera,alguma das almejadas vantagens. A tristerealidade foi recrudescer o ódio dos mesmoscontra os cidadãos, e a destruição dos Índios, ousua dispersão fugindo assim à civilização, a quealiás eram convidados com pólvora e bala, e como cativeiro ou servidão.

E até (cousa notável) pela dubiedade daexpressão servo, que na acepção vulgar significaora escravo ora servo propriamente dito, resultouque Índios sujeitos apenas à administraçãofossem batizados como servos, pois que assimtambém eram denominados os administrados, elançados os registros respectivos em livroscomuns aos dos batismos dos escravos ecatecúmenos (conquanto aí mesmo sedistinguissem), como sucedia em S. Paulo. Daquiproveio originarem-se vexames, cativeiros ilegais,e questões que ainda hoje têm sido levadas aosTribunais(316).

No entanto, o coração bondoso do PríncipeRegente não deixava de recomendar também osmeios pacíficos e amigáveis na redução dos

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índios, e o bom tratamento deles, comodissemos. Ainda no Regimento de 13 de Maio de1812(317) dado à Relação do Maranhão, criadapor Lei de 23 de Agosto de 1811, modelado pelosda Bahia e Rio de Janeiro, no Tit. 2.° §15 se lê oseguinte: «Favorecerá os Gentios do distrito daRelação que estiverem em paz, não consentindopor modo algum que sejam maltratados, ouobrigados a serviços e trabalhos alguns porpreços e tempos arbitrários, que não sejamestipulados por mútuas convenções, da mesmamaneira que se observa com todos os outrosmeus vassalos. E mandará proceder com rigorcontra quem os maltratar ou molestar, dandoordens e providências para que se possamsustentar, e viver junto das povoações dosPortugueses, ajudando-se delas, de maneira queos que habitam no sertão folguem de vir para asditas povoações, e entendam que tenholembrança deles; guardando-se para este efeitointeiramente a lei, que sobre esta matériaordenou o Senhor Rei Dom Sebastião no ano de1570, e todas as mais leis, provisões e ordensexpedidas sobre a mesma matéria, e muitoespecialmente as que foram promulgadas eexpedidas pelo Senhor Rei D. José.»

Aqui se suscita a observância das leis afavor dos Índios, e com especialidade as de D.José 1.°. O que mais tarde foi repetido, quando,criada por Alv. de 6 de Fevereiro de 1821(318) a

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Relação de Pernambuco, se mandou que esta seregesse pelo Regimento dado à do Maranhão.

Várias providências ainda se tomaramsobre a civilização, educação, e aldeamentos dediversas tribos, no Maranhão por Prov. de 9 deSetembro de 1815 e 3 de Janeiro de 1816, em S.Pedro do Sul por Prov. de 8 de Janeiro de 1818, eassim em outros lugares do Estado(319).

A este tempo já o Brasil era elevado àcategoria de Reino, unido aos de Portugal eAlgarves, pela C. L. de 16 de Dezembro de1815(320), e governado por D. João VI, aclamadoe sagrado Rei (o 1.° em terra americana), porfalecimento em 20 de Março de 1816 de sua mãea Rainha D. Maria I.

Com a vinda da Família Real, com aelevação do Brasil à categoria de Reino, emborasob o mesmo cetro, com a abertura dos portos àsNações do mundo pela C. R. de 28 de Janeiro de1808, (alcançada a esforços do distinto BrasileiroJosé da Silva Lisboa, depois Visconde de Cairu),com as maiores franquezas outorgadas, com ainstituição de Tribunais e Repartiçõesindependentes dos da Metrópole, enfim com aorganização de sua administração própria,estava reconhecida a sua autonomia; estava feitaa sua independência, pelo menos nas idéias, noespírito público, e pelo conjunto do mecanismo

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governativo e administrativo do Estado.

O Rei, porém, desassombradodefinitivamente da invasão estrangeira emPortugal com a queda do grande Capitão doséculo em Waterloo, e chamado por força dosseus deveres à sede Metropolitana, deixou asterras brasileiras, que tanto amava(321), em 26de Abril de 1821; ficando por seu Lugar-Tenentee Regente o Príncipe D. Pedro(322).

As tentativas de emancipação política,malogradas em fins do século passado(1789–Minas Gerais), e em princípios do atual(1817–Pernambuco), agora achavam ensejooportuno(323). D. Pedro, Príncipe talhado paraherói dos belos tempos da Grécia e de Romaantigas, coroa a obra começada por seumagnânimo pai; e à face de Deus e do Mundoproclama nos Campos do Ipiranga em S. Paulo aindependência do Brasil (7 de Setembro de1822), que, em gratidão, lhe confere o título deseu Defensor Perpétuo, e o aclama seuImperador (12 de Outubro).

Ao passo que a consolidação daindependência e da nova ordem de cousasabsorvia os cuidados principais do Governo, nãodeixava este de atender a representações sobreos índios, e de tomar algumas providências; semque resolvesse cousa alguma de modo geral,

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mesmo porque havia sido convocada aAssembléa Constituinte e Legislativa Brasileira,aberta em 3 de Maio de 1823, e haviaintenção(324) de organizar os Poderes Políticosem forma constitucional, confiando-se aoLegislativo o direito de fazer Leis e revogá-las.

Dessas providências particulares esingulares temos exemplo na Port. de 18 de Abrilde 1822 que mandou proceder ex-ofíciorelativamente ao injusto cativeiro de índios doRio das Mortes em Minas, na Prov. de 9 de Maioe Port. de 3 de Junho de 1823 prestando auxíliopecuniário ao Governo de Minas para obter emanter a civilização dos Botocudos, na Port. de21 de Agosto do mesmo ano que ordenou paraMinas que não se lhes fizesse mal e antes fossemtratados com afabilidade, e em outrasdeterminações(325).

Mas, aberta a Assembléia GeralConstituinte e Legislativa Brasileira, a questãodos índios não podia deixar de ser aí aventada.José Bonifácio de Andrada e Silva ofereceu umaimportante memória e projeto para catequese ecivilização dos Indígenas(326). As idéias deliberdade, mais vivazes nessa época, fizeraminserir no Projeto de Constituição apresentado àConstituinte um artigo favorável aos índios, bemcomo um outro sobre a abolição gradual daescravidão dos negros(327). Dissolvida, porém, a

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Constituinte (12 Nov. 1823), e encarregada auma Comissão nomeada pelo Imperador D. Pedroa confecção do Código Constitucional ou LeiFundamental do Império, que foi promulgada ejurada em 25 de Março de 1824, aí nada deespecial se dispôs a tal respeito; só mais tardeteve isto lugar, como diremos.

Aquela Assembléia havia, no entanto,decretado(328) na Lei de 20 de Outubro de 1823(que extinguiu as Juntas Provisórias de Governoestabelecidas nas Províncias, e o confiou a umPresidente e Conselho) que incumbia aosPresidentes em Conselho promover as missões ecatequese dos índios (art. 24 e §9.°).

Esta disposição, pelo vago e indeterminadodela, era apenas tomada antes comorecomendação do que como rigoroso dever.Todavia, tratando-se da catequese de índios deS. Pedro do Sul, a Port. de 25 de Maio de 1825(329) deu providências de conformidade com adita Lei, recomendando os meios brandos, eamigáveis. Também o fizeram as Resols. ou Leisde 6 de Julho de 1832(330), tomadas sobreoutras dos Conselhos Gerais de Goiás e MinasGerais, relativamente aos Índios e sua educação.

Embora subsistissem ainda as C. R. de1808 e enxertado na legislação o sistema doterror e do cativeiro ou servidão, em verdadeiro

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antagonismo com o das leis de D. José I quecumulativamente se mantinham, o Governo,convencido mais uma vez, pela experiência, daineficácia de tal sistema e dos graves males queele importava, o foi abandonando; e nas diversasprovidências que tomou, ainda a respeito dosÍndios bravos e por acometimentos quepraticavam contra a gente civilizada, não deixavade recomendar a brandura, afabilidade, e oemprego de meios próprios e capazes de os atrairvoluntariamente, como se vê da Port. de 25 deOutubro de 1823 sobre os Canoeiros de Goiás,do Dec. de 12 de Maio de 1824 sobre os índios doRio Doce, das Port. de 16 de Novembro e 7 deDezembro de 1824 sobre a aldeia Graciosa emGoiás e ajustes com Chefes Cherentes(331), daPort. de 23 de Março de 1825 sobre os da vila deCimbres em Pernambuco, da Port. de 18 deOutubro do mesmo ano sobre os do Rio Negroque se mandaram sustentar em sua liberdade,do Av. de 9 de Março de 1830 sobre os de MatoGrosso(332).

O rigor, o terror continuava na legislaçãocomo arma a empregar, se as circunstâncias oexigissem na opinião dos Governantes; e tanto,que na Port. de 26 de Setembro de 1825(333) sedeclarou que aos Presidentes e Comandantesdas Armas pertencia a escolha e nomeação doComandante e força das bandeiras contra osÍndios.

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Semelhante sistema, porém, reprovadoformalmente em sábias leis anteriores, quederrogaram as que o haviam sancionado, denovo ensaiado em pleno século XIX e ainda umavez convencido de improfícuo, desumano,pernicioso, e adverso aos grandes fins daredução e civilização dos Indígenas, e mais aindaabsurdo pela coexistência do outro sistemadiametralmente oposto, dando em resultado umsistema misto, prenhe de contrasensos e derecíproca oposição, não podia prevalecer. Oestado da civilização, e as idéias clamavam poruma reforma; a intenção do legisladorconstituinte exigia providência quedesenvolvesse o seu pensamento, e deduzisse assuas conseqüências.

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DIREITO NOVO. — ABOLIÇÃO COMPLETA E DEFINITIVADO CATIVEIRO E SERVIDÃO DOS ÍNDIOS. — PROTEÇÃO

E FAVORES. — SISTEMA ATUAL — FUTURO DOSÍNDIOS ANTE A CIVILIZAÇÃO. — CONCLUSÃO.

Já não governava o Brasil o seu primeiroImperador, que havendo libertado do jugo daMetrópole um grande e nobre povo, e fundadoem terra Americana um invejado Império,cumprindo assim parte, gloriosa da sua missão,chamado pela Providência a outra igualmentegloriosa fora no Velho Mundo salvar também aMetrópole da reação do absolutismo contra asidéias liberais e constitucionais. A revolução de 7de Abril de 1831 elevou ao trono o Senhor DomPedro II, então menor; e o governo coube àRegência em nome do mesmo Augusto Senhor,que mais tarde (1840) o assumiu e é hoje oImperante.

Era azada a ocasião para se derrocar ocarunchoso e desumano sistema das Leis doterror e da escravidão contra os Índios.

Por honra dos poderes do Estado, por

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honra do país e da civilização, foi promulgada aLei de 27 de Outubro de 1831(334), que dispõe oseguinte: — Art. 1.° Fica revogada a C. R. de 5 deNovembro de 1808 na parte em que mandoudeclarar a guerra aos índios Bugres da provínciade S. Paulo, e determinou que os prisioneirosfossem obrigados a servir por 15 anos aosmilicianos ou moradores, que os aprendessem.— Art. 2.° Ficam também revogadas as C. R. de13 de Maio e de 2 de Dezembro de 1808 na parteem que autorizam na província do Minas Geraisa mesma guerra, e servidão dos Índiosprisioneiros. — Art. 3.° Os Índios todos até aquiem servidão serão dela desonerados. — Art. 4.°Serão considerados como órfãos, e entregues aosrespectivos Juízes para lhes aplicarem asprovidências da Ord. Liv. 1.° Tit. 88. — Art. 5.°Serão socorridos pelo Tesouro do preciso até queos Juízes de Órfãos os depositem onde tenhamsalários ou aprendam ofícios fabris. — Art. 6."Os Juízes de Paz nos seus distritos vigiarão, eocorrerão aos abusos contra a liberdade dosÍndios.

Foi, portanto, reprovado formalmente pelolegislador o sistema do terror e da perseguição;foi abolido de uma vez para sempre o cativeiro ouservidão mesmo temporária dos índios, aindaquanto a pretérito; foram eles equiparados aosórfãos e postos debaixo da proteção dosrespectivos Juízes; socorridos pelo Tesouro

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Público enquanto necessitassem; e finalmenteincumbida aos Juízes de Paz nos seusrespectivos distritos a defesa e guarda daliberdade dos mesmos Índios.

Ainda mais, a Resol. de 6 de Julho de1832(335) ordenou para Minas, que se criasseum colégio para educação da mocidade Indianade ambos os sexos, e deu-lhe organização;podendo ser admitidos também Índios adultosmas sem residência no colégio.

Continuavam os Ouvidores de Comarcas aser os Juízes privativos e administradores dosÍndios(336). Mas, extintos os Ouvidores pela Leide 20 de Novembro de 1832 (que criando oCódigo do Processo Criminal, e dispondoprovisoriamente sobre a Justiça Civil, deu novaforma à organização Judiciária), sem que estahouvesse tomado providências a tal respeito, aRegência decretou em 3 de Junho de 1833(337)que ficasse essa administração dos bens deÍndios a cargo dos Juízes de Órfãos enquanto aAssembléia Geral outra cousa não resolvesse: oque foi explicado no Aviso de 18 de Outubro domesmo ano(338), 13 de Agosto de 1834(339), eoutras Decisões; o contencioso passou para asJustiças ordinárias (L. cit. de 1832 Dispos. Prov.art. 20, Av. cit. de 1834).

Foi mais declarado por Aviso do 31 de

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Julho de 1834(340) que às Câmaras Municipaistambém incumbia velar em que os Juízes deÓrfãos cumprissem exatamente os seus deveresquanto aos Índios, e representar a favor destes.

A lei de 12 de Agosto de 1834(341),denominada Ato adicional à Constituição doImpério, extinguindo os Conselhos Gerais deProvíncia, e substituindo-os pelas AssembléiasLegislativas Provinciais, dispôs no art. 11 §5.°que competia às mesmas Assembléias promovercumulativamente com a Assembléa Geral e oGoverno a catequese e civilização dos Indígenas.

Todas as Autoridades eram, pois,chamadas a promover o maior bem dos Índios,em proveito deles e do país; a lei estava agoradecidida e francamente ao seu lado paraprotegê-los com verdade e eficácia. O sistema deprocedimento com esses infelizes, degradadosdescendentes de Eva, havia mudadointeiramente. Todos os favores, ainda demenores ou órfãos, lhes eram outorgados.

O Governo aproveitava na Marinha os quejulgava aptos para ela, como se vê da Circ. de 29de Maio e Aviso de 2 de Agosto de 1837(342),mas proibindo o emprego de meios violentos noengajá-los para tal serviço; sendo mais tardeexpressamente autorizado a contratá-los pela Lein.° 369 de 18 do Setembro de 1845 art. 5.°

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§17(343).

Continuava a manter-se a competênciados Juizes de Órfãos sobre a administração dosbens dos Índios, e se lê no Decreto n.° 143 de 15de Março de 1842 art. 5.° §12(344).

Convindo, porém, regular de modo geral emais uniforme o importante assunto dacatequese e civilização dos Índios, a Lei n.° 317de 21 de Outubro de 1843 art. 2.° §21 autorizouo Governo a fazê-lo, e no art. 36 dispôs sobre asestâncias e terrenos dos da Comarca de Missõesem S. Pedro do Sul que declarou nacionais; e jána Lei n.° 285 de 21 de Junho do mesmo anoart. 1.° fora ele autorizado a mandar virmissionários capuchinhos(345).

Para melhor execução desta última foiexpedido o Decreto n.° 373 de 30 de Julho de1844 regulando o modo de distribuição doscapuchinhos para as missões, e qual a suasujeição e relações para com os Bispos, e paracom os superiores locais e o Geral emRoma(346).

E em execução do art. 2.° §21 da citada Leide 21 de Outubro foi promulgado o Decreto n.°426 de 24 de Julho de 1845(347), que vigoraainda hoje.

Este Decreto pode-se denominar o

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Regimento (atual) das Missões, como no mesmose indica. — Suas disposições constam de 11artigos, dos quais o primeiro se desenvolve em38 parágrafos, o segundo em 18 parágrafos, oterceiro em 7 parágrafos e o sexto 7 parágrafos.— Em cada Província deve haver um DiretorGeral dos Índios, nomeado pelo Imperador. Emcada aldeia um Diretor nomeado pelo Presidente,sob proposta do Diretor Geral; um Tesoureiro,Almoxarife, e Cirurgião, cargos que dependem doestado e importância da aldeia, e que podem serexercidos pelo mesmo indivíduo; outros agentes,como pedestres, oficiais de ofício, etc; efinalmente de um missionário pelo menos. —Nos arts. 1.° e 10 se declaram quais asatribuições e obrigações do Diretor Geral; no art.2.° as do Diretor da aldeia; nos arts. 3.° e 4.° asdo Tesoureiro; no mesmo art. 4.° as doAlmoxarife; no art. 5.° as do Cirurgião (que éigualmente o encarregado da botica), e doenfermeiro; no art. 6.° as do missionário. —Finalmente, no art. 11 se confere, enquantoservirem, ao Diretor Geral a graduação honoráriade Brigadeiro, ao Diretor da aldeia a de TenenteCoronel, e ao Tesoureiro a de Capitão;facultando-se-lhes o uso do uniforme respectivoestabelecido para o Estado-Maior do Exército.

As idéias capitais desse Regulamento são:1.° conversão dos Índios ao cristianismo, e suaeducação religiosa, a cargo dos missionários; 2.°

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instrução primária, também a cargo dosmesmos; e criacão de aulas para ela, se omissionário não for suficiente; 3.° proibiçãoexpressa de força e violência para atrair osÍndios às aldeias, para a educação religiosa, nempara outros quaisquer fins de sua catequese ecivilização; 4.° instrução de Índios nas artesmecânicas segundo as suas propensões,promovendo-se para este efeito oestabelecimento de oficinas nas aldeias; 5.°,mais particularmente o aproveitamento deles nacultura ou lavoura; 6.°, demarcação dos distritosdas aldeias, e das terras concedidas aos Índiosem comum ou separadamente; podendo mesmode simples usufrutuários virem a serproprietários; 7.° proteção aos Índios, quer emsuas pessoas e liberdade, quer em seuscontratos, quer em seus serviços, quer em suasterras; 8.° proibição de serem dados a serviçoparticular; 9.°, procurar pelos missionários atrairos Índios selvagens, e aldeá-los ainda que emseparado; 10.°, proibição de irem de fora pessoasnegociar nas aldeias ou estabelecer-se nelas,salvo com licença; 11.°, promover os casamentosdos índios entre si, e com pessoas de outra raça;12.°, fazer expulsar das aldeias para além de 5léguas fora dos limites dos distritos respectivosas pessoas de caráter rixoso, de maus costumes,que introduzam bebidas espirituosas, ou tenhamenganado os Índios lesando-os; 13.°, proibição devexá-los com exercícios militares, contrariando

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aberta e desabridamente os seus hábitos ecostumes; 14.°, garantia de jornais ou salárioaos Índios quando chamados a serviço públicoou da aldeia; 15.° auxílios a bem de suasnecessidades, de sua saúde e bem estar; 16.°,proteção das aldeias pela força militar, quandonecessário; 17.°, proteção às viúvas e herdeirosdos Índios.

Por seu lado, ficam os Índios sujeitos: 1.°,a serviço público mediante salário, que deve sertaxado; 2.°, a serviço da aldeia, igualmente porsalário; 3.°, a alistamento para serviço militar,sem que todavia sejam vexados; 4.°, a prisãocorrecional até 6 dias, em certos casos, a arbítriodo Diretor.

O Maioral dos Índios deve ser consultado,para se ir de acordo com ele quanto ser possa,quando se tiver de designá-los para asplantações, e serviço da aldeia ou público.

As terras das aldeias, quando possam serdadas de aforamento, somente o serão paraedificar casas, e jamais para cultura.

Recomenda-se também no citadoRegulamento que as festas religiosas e civissejam feitas com a maior pompa; e que seintroduza nas aldeias o gosto pela músicainstrumental.

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O Diretor Geral e Diretores das aldeias sãoconstituídos procuradores dos Índios, e podemnomear quem os represente perante as Justiçase autoridades.

A força militar da aldeia pode ter umregulamento especial.

As próprias aldeias terão seus regimentosespeciais, e instruções, propostos ao GovernoImperial pelos Diretores Gerais.

O regime econômico e outros assuntosainda aí foram providênciados; incumbindo aosdiversos empregados os seus relatórios einformações; e recomendando-se finalmente aoDiretor Geral que exponha ao Governo osinconvenientes encontrados na execução domesmo Regulamento e de outros que sejamexpedidos, e indiquem as medidas que entendammais apropriadas ao grande fim da catequese ecivilização dos Índios.

O Governo tem-se mostrado solícito empromovê-la, protegendo-os ao mesmo tempo, e asaldeias ou colônias indígenas.

Mas a tendência bárbara, semprerenascente, de escravizar os Índios, apesar dorigor das leis penais e de outras medidas, fezexpedir a Circ. de 9 de Agosto de 1845(348)providênciando para que não fossem comprados

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nem escravizados os seus filhos. — Felizmente,para honra da nossa civilização, se algunsabusos se tem cometido contra a liberdade dessamísera gente por se manter ainda a odiosainstituição da escravidão que os provoca, nãosão todavia da natureza daquele que referetestemunha ocular, passado em Corrientes noano da Graça de 1866 em pleno século XIX, e emum Estado Republicano, quanto a Índios doChaco que eram vendidos de dia e empúblico(349)!

A fim de atrair os das vizinhanças doAraguaia e Tocantins providenciou-se no Av. de29 de Janeiro de 1849(350); e para a redução deoutros por territórios de S. Paulo até MatoGrosso, nos Avs. de 31 de Janeiro de 1849 e 21de Maio de 1850(351).

O Governo ainda reprovou por Av. de 15 deJunho de 1850(352) as hostilidades praticadaspelo Presidente de Mato Grosso contra os Índiosselvagens, meio que — longe de concorrer para oscivilizar e catequizar, tende de mais em mais aafugentá-los da sociedade, e a extinguí-los;recomendando, outrossim, abstenção de violência...a qual só pode ter cabimento para repelir osataques por eles cometidos ... e jamais para os irprocurar às matas, e exterminá-los.

Em auxílio dos esforços do Governo

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também se declarou o concurso de particulares esobretudo de associações, um dos maispoderosos elementos do progresso moderno: a —Sociedade contra o tráfico de Africanos, epromotora da colonização, e civilização dosIndígenas —, fundada na Capital do Império peloDr. Nicolau Rodrigues dos Santos França Leite eoutros distintos cidadãos, e aprovada por Av. de31 de Agosto de 1850(353) é disso exemplo; senegativos foram os resultados, ao menos houveboa vontade, e a manifestação de um grande,útil, humanitário e generoso pensamento.

Executava-se, pois, o citado Regimento dasMissões, de 1845, da melhor forma possível,como ensaio do novo sistema, em Mato Grosso,S. Paulo, Sul, Paraná, Amazonas, Pará, e outroslugares(354); e perdura como disposição geral.

O Governo tem sido habilitado comrecursos pecuniários, até por verba especial nasdiversas leis de Orçamento; verba que, sendo v.g. de 16:000$000 na Lei de 21 de Outubro de1843 art. 2.° §21, foi elevada até 80:000$000,como se vê nas de data mais recente. Eefetivamente tem despendido em auxílio dascolônias indígenas, em gratificações a DiretoresGerais, a Caciques de Índios, a capuchinhos, eem outros misteres a bem da catequese ecivilização, como se vê de atos de diversas datasquais o Av. de 31 de Agosto de 1859, 10 de

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Agosto de 1864, 29 de Agosto, 28 e 30 deNovembro do mesmo ano, e outros sobretudo de1864(355).

Contratou-se a vinda de missionárioscapuchinhos, que têm sido empregados em tãopiedoso e útil ministério; e ainda recentemente,em oficio de 25 de Julho de 1865(356) serecomenda que venham com brevidade.

Têm sido nomeados Diretores Gerais, eDiretores de aldeias; e tentado enfim o maiordesenvolvimento das colônias indígenas, e acivilização dos Índios.

Em falta de Diretores, continuaram osJuízes de Órfãos como administradores(357).

Os frutos, porém, não têm correspondido àexpectativa, conquanto não hajam sido de todoperdidos o trabalho e despesas. Algumas aldeiastêm-se mantido, embora a custo; tal é a misériaem outras, que nem vestuário ou roupa tinhamos Índios, sendo necessário ordenar-se que v. g.se repartisse com eles a de uma colônia militar,e pagar-lhes vestuário em valor de 450$000,como sucedeu com a colônia anexa à militar deUrucu(358). Atualmente contam-se mais oumenos 67 aldeias com uma população Índia de22.000 almas(359). Outras têm sidoabandonadas pelos Índios que ou se confundem

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na massa geral da população, e assim se tem jádeclarado oficialmente dando-se por extintas asaldeias(360), ou fogem para o sertão, para osseus mocambos, preferindo a vida selvagem, deinteira e primitiva liberdade, aos cômodos davida civilizada, que para eles são verdadeirosincômodos, vexames, e constrangimento. Asterras abandonadas, como da Nação, têm sidomandadas incorporar nos bens nacionais, ereputar terras públicas devolutas para seremaproveitadas na forma da Lei(361).

Os Índios bravos continuam a incomodarcom suas correrias, assaltando as fazendas, osviandantes, os povoados(362), até os própriosmocambos ou quilombos de negros(363); assimcomo a destruirem-se reciprocamente(364).

A vindita particular há sido por seu ladoexercida contra os Índios. Ainda em 1864 naBahia foram eles perseguidos(365), e em 1865 osChavantes em S. Paulo foram surprendidos nassuas aldeias, sofrendo verdadeira caçada(366).

O Governo, a fim de proteger os habitantesno Paraná e Mato Grosso autorizoudestacamentos de linha(367); e contra osGuajajaras no Maranhão também foram tomadasprovidências em 1866(368).

No intuito de desenvolver a população do

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Império por todos os meios, e de promover asubstituição do trabalho escravo pelo livre, nãoera possível que o Governo deixasse de insistirem aproveitar também os destroços da raçaindígena, hoje quase extinta e reduzida a muipouco(369); conquanto tão limitada sobretudoem relação ao vastíssimo território do Estado,não era nem é para desprezar atenta aproporcionalmente diminuta população queconta o Brasil(370), a conseqüente escassez enecessidade de braços; menos ainda é paraabandonar a idéia de civilizá-los, e deixar depersistir em chamá-los ao grêmio da sociedade.

Mas o Regimento das Missões de 1845, emsua execução, mostrou-se defeituoso. Por outrolado, os abusos contra os desgraçados Índiospraticavam-se quase como em todos os temposanteriores, partindo mesmo dos Diretores, que,em vez de protetores, se têm quase no geralmostrado ou indiferentes, ou perseguidores. Eaté, por falta de pessoal habilitado, as aldeiasnão têm sido regidas convenientemente, nemtem sido possível, desenvolver o sistema de taiscolônias e do citado Regimento.

De modo que já nas Intrs. de 25 de Abrilde 1857(371), expedidas para as do Paraná eMato Grosso aquele Regulamento foi alterado; noAv. n.° 29 de 19 de Maio de 1862(372)igualmente, conferindo-se aos Índios a

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propriedade de terras que lhes fossem dadasdesde que aí se estabelecessem com efetivacultura e habitação por 5 anos ao menos; nasIntrs. de 13 de Maio de 1864(373), em ofício de26 ao Diretor da colônia do Ribeirão das Lagesno Mucuri, tratando-se também dos Indígenas,alterações se fizeram; e ainda nas Instrs. de 24de Dezembro do mesmo ano(374) expedidas parao estudo do rio Ivaí que comunica Mato Grossocom o litoral no Paraná, e em bem dacolonização e catequese.

Os Diretores cuidam principalmente emtirar dos Índios o maior proveito possível, não embem dos mesmos Índios, das aldeias e do país,mas seu próprio; pouco ou nada se importamcom o bem estar desses infelizes, seudesenvolvimento, civilização e progresso(375);enlevam-se nas honras militares que lhes dá agraduação conferida polo citado Regimento, emdiscutir se devem ter o tralamento de Senhoriaou Excelência(376), e em outras futilidadessemelhantes(377). Abusam, além disso, contraos Índios, retendo-os presos correcionalmentemais dos 6 dias permitidos naqueleRegulamento; e pretendendo que não possameles recorrer ao habeas-corpus, sendo necessárioque o Governo decidisse que este remédiotambém era extensivo, ainda em tal caso, aosÍndios(378).

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Novas providências se fazem necessárias.O Governo já o tem demonstrado por fatos, comodissemos, e ainda ultimamente por atos de1866(379), e francamente o expôs perante oCorpo Legislativo(380). Já em 1864 fora propostona Câmara dos Deputados um aditivo aoOrçamento da Agricultura(381) autorizando oGoverno a reformar aquele Regulamento de1845, e a chamar Padres Trapistas paradirigirem colônias agrícolas de Indígenas. Esuscitou-se caloroso debate na mesma Câmarasobre os Índios e sobre a readmissão deJesuítas(382).

Sejam ou não chamados de novo Jesuítas,ou continuem os Capuchinhos(383), ou sejamconvidados outros Clérigos Regulares ouSeculares, pois que todos receberam a missão depregar o Evangelho e propagar as doutrinas deCristo, como declarou o Divino Mestre(384), e olembra a L. de 12 de Setembro de 1663, o que écerto é que só o missionário sinceramentedevotado pode alcançar alguns benéficosresultados(385). O poder da Religião Cristã,insinuada por meios brandos e suasoríos, emanifestada no culto externo pela imponentemajestade das suas festas religiosas, é o maisforte meio para a conversão dos selvagens; a suacivilização deve necessariamente começar por aí;na gente civilizada mesmo, é pela religião quecomeça a educação, pois que é ela o primeiro

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pasto do espirito e da moral nos verdes anos, ecujas impressões nunca mais ou muitodificilmente se apagam(386). A Religião Cristã,além do elemento divino o mais filosófico esublime, além do culto o mais respeitável e dignoda grandeza do Criador, é ou contém ao mesmotempo um verdadeiro Código dos deveres dohomem, admirável pela sua simplicidade esuculento laconismo, concebido em princípios outeses claras, e incontestáveis por serem leisgravadas por Deus no coração humano, e queseguidas conscienciosamente dispensariam todoesse aparatoso amontoado de leis, qual outraBahel, e que quanto mais crescem maisdemonstram a decadência do povo(387).

Conviria que os Índios, durante certoperíodo, tivessem Juízes privativos para suascausas civeis e crimes, atenta a sua rusticidadee ignorância, os seus usos e costumes, a suaeducação; e mesmo, que tivessem legislação àparte, que os regesse nesse período; o processoprincipalmente devera ser modificado, brevidadee favores; decidir-se mais ex aequo et bono, e emforma paternal, do que pelo rigor do Direito.

Deve-se evitar que sejam eles governadosou administrados por diretores que só visem avaidade ou o interesse próprio(388), assim como,que sejam vexados pela presença de soldados(por via de regra má gente), por aparatos bélicos

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que os amedrontem ou afugentem, e por serviçosexcessivos.

A instrução primária(389); as artesmecânicas; a lavoura; e outras semelhantesocupações; a marinha mesmo(390) e oexército(391) para os que se mostrassemdispostos e inclinados ao serviço militar; amarinha mercante; as belas artes; eis já nãopequeno campo para a educação eaproveitamento dos Índios. Mas tambémpoderiam ser facultados os estudos secundários,e superiores aos que se mostrassem com aptidãopara eles, e mesmo o Clericato(392), enfim todosos ramos da aplicação variadíssima da atividadehumana, tanto quanto o suportem as inclinaçõese a vontade de cada um: não devem os Índiosficar condenados à lavoura e a certas indústriassomente como servos adscriptícios, que nistomesmo parece perpetuar-se o sistema daescravidão disfarçada. Deve-se alargar o círculo,abrir o campo em que eles possam ser úteis a sie ao país.

Conviria, outrossim, facilitar quanto fossepossível a sua comunicação e trato com a gentecivilizada, de modo a conseguir-se o mais brevepossível que eles se confundissem na massageral da população como os demais cidadãos, enão ficassem segregados da sociedade debaixo detutela forçada quase perpetuamente e como que

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constituindo nação a parte; os favores e a tutelanão devem anular a atividade e a iniciativaindividual, reduzir o homem a autômato com opretexto de o julgarem indefinidamente incapazde se reger; com tal sistema nem se atende aograve mal que ele importa para a unidadenacional.

Faz-se igualmente necessário tratar daabolição da escravidão, que na legislação aindase mantém, dos Africanos e seus descendentes,para que cesse de uma vez para sempre o abusoque se tem conservado entre alguns Índios devenderem as mulheres e os filhos(393), e deserem também reduzidos criminosamente, masde fato, a escravos, por desumana e metálicagente civilizada.

Quais as naturais habilitações edisposições dos Índios, para as indústrias, paraas artes e belas artes, para a cultura do espírito,para o emprego da atividade do homem noilimitado campo do seu desenvolvimento, já odissemos sucintamente no Cap. 4.°; e disso dãotestemunho irrecusável sobretudo os Jesuítas, eescritores antigos e modernos(394).

Que resultados se tenham colhido quantoà população, bem se deixam ver pelo matiz deraça indígena em todas as Províncias do Império,e com especialidade nas do Norte por mais

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predominante em algumas(395); abastecendohoje de modo notável o exército oriundos dela, edistinguindo-se muitos outros em diversasindústrias e profissões.

Quanto aos serviços que são eles capazesde prestar, com verdadeira abnegação,fidelidade, coragem, sobretudo na guerra, ficoudemonstrado à evidência pelo que dissemos nosCapítulos antecedentes; Tibiriçá, Ararigboia,Camarão, e outros são nomes de gratarecordação. Serviços foram tais de alguns, quemereceram o prêmio dos beneméritos; Camarãov. g. foi agraciado com a Comenda da Ordem deCristo, o tratamento de Dom, e foro de fidalgo,além de ser nomeado general dos Índios da suanação(396); e ainda por Decreto de 25 deFevereiro de 1819(397) isensões de tributosforam dadas como recompensa aos que osprestaram por ocasião da revolução de 1817 emPernambuco(398). Mesmo agora, por ocasião dainjusta e bárbara guerra que nos moveu esustenta o Paraguai, os Índios têm prestado bonsserviços, sobretudo em Mato Grosso, quais osTerenas e outros; socorrendo até commantimeníos e gados, e recolhendo nas suasaldeias famílias que a estas se haviamabrigado(399).

A imaginação dos nossos romancistas epoetas também tem achado na história dos

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indígenas assunto digno não só da literaturaligeira ou amena, mas da clássica; desde oromance modesto e simples até a epopéia, aí têmeles bebido fatos que a imaginação desenvolve, ereveste das galas do belo e do maravilhoso; Fr.José de Santa Rita Durão, Basílio José da Gama,D. J. Gonçalves de Magalhães, A. GonçalvesDias, e outros talentos dessa ordem não sededignaram de o fazer; Caramuru, Uruguai,Confederação dos Tamoios, Timbiras bem orevelam.

Mas, descendo dessas regiões, que aalguns tem por tal forma transviado apretenderem nos Índios uma civilização ehabilitações que não tinham nem têm, apesar decapazes de adquirí-las se bem dirigidos, porémde fato mui distantes do homem civilizadosuperior pela instrução e educação, não somostambém da outra opinião extrema, sustentadaainda por um belo e laborioso talento, quepretende que só a força pode domar o Índio, efazê-lo entrar na sociedade, que só por ela e pelaservidão ou sujeição forçada poderá conseguir-sea sua redução(400). Estas doutrinas jáanteriormente haviam sido vitoriosamentecombatidas; e ainda ultimamente pelo ilustreescritor do Timon Maranhense, João FranciscoLisboa, de saudosa memória, assim como peloameno e laborioso autor da História da fundaçãodo Império Brasileiro, e por outros. Entre aqueles

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extremos está como única verdadeira e preferívela opinião destes últimos. Felizmente aquelasidéias de terror, força, sujeição coacta não têmhoje prosélitos; a experiência levou a convicçãoaos ânimos dos incrédulos; as idéias e sãosprincípios alcançaram afinal a vitória.

Entre perseguir os Índios, dar-lhes caçacomo animais ferozes ou daninhos, destruí-los,exterminá-los ou afugentá-los, — e deixá-loslivres divagar pelos sertões na sua vida errantecomo nos primitivos tempos, não há que hesitar;se não quiserem pelos meios brandos e suasóriosabraçar a vida civilizada, não devem ser a istoconstrangidos pela força, pelo cativeiro ouservidão, e menos ainda perseguidos edestruídos; o homem civilizado, por isso que o é,não se deve mostrar bárbaro como o selvagem,ou mais bárbaro do que ele; se atacado,defenda-se, porque é este o Direito natural, maslimite-se na defesa ao que for estritamenteindispensável e justo(401); qualquer excesso nãotem razão de ser, degenera em crime e emvingança ou ferocidade.

Não queremos dizer que demos de mão àcatequese e civilização dos Indígenas; este fimnão deve ser abandonado. Referimo-nos somenteaos meios. Se houvesse quem entendesse que sópelo terror, pela perseguição, pelo cativeiro, issose poderia conseguir, decididamente seria muito

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preferível deixá-los em paz no seu estadoselvagem; o tempo e a Providência fariam o que ohomem não pudesse.

À proporção que o Estado crescer empopulação, em facilidade de comunicações porterra e por água, à proporção que o território sefor cobrindo de mais povoados, e se foremdescortinando os sertões (onde principalmenteeles hoje se abrigam), o facho da civilizaçãoabrirá caminho, espancando as trevas daselvageria, e ou eles se hão de necessariamenteacolher nos braços do homem civilizado econfundir-se assim na massa geral dapopulação, ou serão forçados a ceder o camponessa luta desigual, em que a vitória, conquantoincerta na época, é certa e infalível, por ser odecreto de Deus Onipotente na ordemprovidencial das Nações, manifestada pelaHistória do Mundo.

FIM DA 2.ª PARTE.

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(l) Humboldt— Vue des Cordillères et monumensdes peuples indigènes de l’Amerique. — Essaipolitique sur le royaume de la Nouvelle Espagne.

(2) Quais eram as tribos aborígenes que habitaramcada uma das Provincias do Império ao tempo emque o Brasil foi conquistado.... quais emigraram epara onde.... foram questões propostas noInstituto Histórico e Geográfico Brasileiro, e poreste aprovadas (Rev. IX, 363); desenvolvidas emrelação à Bahia pelo Coronel Inácio Accioli deCerqueira e Silva (Rev. XII, 143). — De modomais geral foram tratadas pelo distinto Dr.Antônio Gonçalves Dias, de saudosa memória,no seu precioso trabalho intitulado — O Brasil eOceania —, cujo manuscrito, reputado perdido,foi restituído ao mesmo Instituto em 1866 peloDr. A. H. Leal, por intermédio do Dr. CláudioLuiz da Costa, e tem de ser impresso na Revista,conforme a deliberação já tomada em 1853 (Rev.XVII, 578). — Em relação à América geral, entreoutros, escreveu o Padre Fr. Gregório Garcia —Orígen de los Indios de el nuevo Mundo — 1729;Belocc — Histoire d’Amerique et d’Oceanie 1844;E. B. d’E. — Essai sur cette question: quand et

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comment l’Amérique a-t-elle été peuplée d’hommeset d’animaux — 1767.

(3) V. Gabriel Soares (Rev. XIV); Gandavo (Rev.XXI, 367); Southey, Hist. do Brasil traduzida porCastro e comentada pelo Cônego Dr. J. C.Fernandes Pinheiro; F. A. de Varnhagen, Hist.geral do Brasil; Accioli. Mem. já cit.; JoaquimNorberto de Souza e Silva, Memória histórica edocumentada das aldeias de Índios da Provínciado Rio de Janeiro, laureada pelo Inst. Hist. (Rev.XVII, 109).

(4) V. Alcide d’Orbigny — L’homme Americain. —De l’Amerique meridionale considérée sur lesraports physiques et moraux. — Auguste de St.Hilaire — Voyaqe aux sources du Rio de S.Francisco et dans la province de Goyaz.

(5) Refere o Padre Antônio Vieira que só no Paráe Maranhão mais de 100 eram as línguas; refereGama (Mem. Hist. da província de Pernambuco)que 150 dialetos eram falados: pode-se dizer quetantos, quantas as tribos, nações, ou cabildasdisseminadas pelo vasto território do Brasil. —Tupininquins, de costumes mais brandos, não seconfundiam com os terríveis Aimorés, nem comos valentes Tamoios; ainda hoje as tribosexistentes se distinguem perfeitamente,Botocudos, Coroados, e um sem número deoutras.

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(6) V. Caminha, Carta a El-Rei D. Manoel (nasNotícias Ultramarinas, IV); Cartas Jesuíticas(manuscrito da Biblioteca Pública do Rio deJaneiro, de que possuo cópia feita por meufinado pai); Gabriel Soares, Gandavo, e outros jácit.; J. F. Lisboa — Timon Maranhense: Lery,Hans Staden — Viagens; príncipe Maximiliano —Viagem; Debret — Viagem pitoresca; Padre JoãoDaniel — Tesouro descoberto no Rio Amazonas(Rev. II, III); Simão de Vasconcelos — Crônica daCompanhia de Jesus; J. de Laet; St. Hlaire;Ferdinand Denis; Jaboatão — Crônica Seráfica daProvíncia de Santo Antônio do Brasil. — RochaPitta — América Portuguesa; Beauchamp — Hist.do Brasil, traduzida e comentada por Pedro Joséde Figueiredo; Charlevoix — Histoire duParaguay; D. J. Gonçalves de Magalhães OsIndígenas perante a História (Rev. XXII, 3); alémde outros muitos escritos quer especiais, quergerais ou diversos.

(7) V. Padre Manoel da Nóbrega — Informação doscasamentos dos Índios do Brasil (Rev. VIII, 234);Coronel J. J. Machado de Oliveira — Qual era acondição social do sexo feminino entre osIndígenas no Brasil (Rev IV, 168).

(8) Idem. — Varnhagen, Hist. geral do Brasil

(9) V. Rev. do Inst. I, 209; Gabriel Soares cit.;Varnhagen cit.

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(10) Cônego Dr. J. C. Fernandes PinheiroEpisódios da história pátria.

(11) A da transmigração — V. Varnhagen — Hist.Ger. — São muito conhecidas as cerimônias doscruentos festins das tribos antropófagas desdeque era apreendido o inimigo ou a vítima até serdevorada.

(12) V. Lery; Histoire d’un voyage fait en la terredu Brésil; Southey, Hist. do Bras.: Magalhães —Memória já cit.; Cartas Jesuíticas, etc. — E até arespeito da valentia das próprias mulherescorreu o mito das Amazonas; sobre o qualdiscursou em uma interessante memória ofinado poeta Dr. A. Gonçalves Dias (Rev. do Inst.XVIII, 5).

(13) O mesmo ainda hoje se nota.— Varnhagencit.

(14) Garcilazo (Peru); Herrera (Índias); Solis(México). — V. Les Incas por Marmontel; Colombo(poema por M. de A. Porto-Alegre, Cantos 21 a23.

(15) Magalhães cit. Rev. XXII, 3.

(16) Varnhagen cit.; J. J. Machado de Oliveira —Memória em desenvolvimento do programa doInst. Hist. sobre as idéias de divindade eimortalidade da alma entre os Indígenas (Rev. VI,

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133).

(17) Lery cit.; Machado de Oliveira— Memóriacit.; Cônego Fernandes Pinheiro; Magalhães —Memória já cit. (Indígenas perante a História). Alenda das montanhas azuis, e outras, assim comoo ceremonial de enterrarem conjuntamente como cadáver certos objetos de seu uso, e para umfim d’além túmulo, são indícios veementes dessacrença.

(18) A. Gonçalves Dias — Introdução a Berredo;J. F. Lisboa — Timon Maranhense;Desembargador R. de S. da Silva Pontes —Memória em desenvolvimento do programa doInst. Hist. sobre a construção de templos eestátuas em Missões (Rev. IV, 65).

(19) Varnhagen — Hist. Ger.

(20) São disto testemunho as primeiras relaçõesdas descobertas, começando pela muitoconhecida carta de Pero Vaz de Caminha; dãotestemunho os Jesuítas, os Franceses, ospróprios Portugueses; a história (como veremosno desenvolvimento deste trabalho) o demonstra.

(21) Guaicurus ou Índios cavaleiros (Rev. do Inst.Hist. I, 21).

(22) Varnhagen — Hist. Ger.; Lisboa — Timon; J.Norberto — Memória já cit.; Bellegarde —Hist. do

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Brasil; Dr. J. M. de Macedo —Hist. do Brasil.D’entre as inúmeras tribos (160 mais ou menos)espalhadas por tão vasto território apontaremospor mais importantes as seguintes: Tupininquinse Tupinaes (Porto Seguro e Ilhéus); Tupinambás(Bahia e Norte); Tamoios (Rio de Janeiro);Guaianazes (S. Vicente, S. Paulo); Goitacazes(Campos); Aimorés (Ilhéus); Tabaiares e Caetés(Pernambuco); Pitaguares (Itamaracá, Parahyba,Rio Grande do Norte); Tabajares (Ceará);Timbiras, Amoipiras, Taramambezes, Tapuias,etc. (Maranhão. Pará, Amazonas); Coroados(Minas Geraes); Guaicurús. Paiaguás, Guaranis,etc. (Goiás, Mato-Grosso e Sul). — Qual apopulação indígena ao tempo da descoberta? —Eis um problema impossível de resolver. — OPadre Antônio Vieira pretendia que muitosmilhões de Inciios tivessem descido dos sertões, eassim se lê também na L. de 6 de Junho de1733. Mas parece haver exageração, como bempondera J. F. Lisboa no seu Timon Maranhense(II, 233). — Varnhagen na Hist. Ger. (I, 98) elevaapenas a um milhão. — Sem nos emaranharmosem semelhante questão, diremos apenas que,para serem arrebanhados, aldeados,escravizados, maltratados, e mortos aosmilhares, para sofrerem, como sofreram, osÍndios as perseguições e guerras de entre si, e,pior ainda, o extermínio dos conquistadores,perdurando ainda até nossos dias, quer dizer,por perto de 4 séculos, parece evidentemente

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diminuto o cálculo do ilustre autor da HistóriaGeral do Brasil

(23) Varnhagen — Hist. Ger. I, 126.

(24) Mello Freire, Dir. Civ. Liv. II tit. I §5

(25) Carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei D.Manoel do 1.° do Maio de 1500; dita de MestreJoão, de igual data. — Relação da viagem deCabral (Col. de Notícias para a Hist. e Geogr. dasnações ultramarinas, pela Academia Real dasCiências de Lisboa tomo II n. 3).

(26) Deste fato existe um monumento em tela naAcademia das Belas Artes do Rio de Janeiro, peloaproveitado autor Victor de Meirelles.

(27) Carta 1.ª do Américo na Col. cit. II, n. 4; Fr.Francisco de S. Luiz — Índice Cronológico. — OVisconde de Santarém — Recherches sur AmericVcspuce — pronuncia-se contra este. — Mas oSr. Varnhagen o combate vitoriosamente, tirandoa lume as dúvidas e a verdade.

(28) Varnhagen — Hist. Ger. I, 20.

(29) Idem I, 21.

(30) V. Fr. Francisco de S. Luiz — índiceCronológico. — Os Portugueses em África, Ásia,América e Oceania (Obra clássica).

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(31) Varnhagen — Hist. Ger. I, 23 e 427.

(32) Varnhagen — Hist. Ger. I,23; Lisboa — TimonII.

(33) Herrera — Década III, L. 8.° Cap. 10;Varnhagen cit. I, 34.

(34) Navarrete — Col. de Viag. III, 23, 24, 544,547, 553, 534; Abreu Lima — SynopsisCronológica.

(35) Varnhagen — Hist. Ger. I,26.

(36) V. Accioli — Mem. Hist. da Bahia; MelloMorais — Brasil Histórico; Varnhagen — OCaramuru perante a História, memória premiadapelo Instituto Histórico Brasileiro, e impressa naRev. X, 129.

(37) Varnhagen — Hist. Ger. I,33,34.

(38) Ferdinand Dénis — Génie de la navigation.

(39) Varnhagen cit.

(40) Idem.

(41) Roteiro de Pero Lopes, irmão de MartimAfonso, publicado e anotado por F. A. deVarnhagen. — As cartas régias determinando aexpedição e contendo as instruções a MartimAfonso são datadas de 20 de Novembro de 1530.

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(42) Roteiro cit.

(43) Se africanos ou não, é ponto duvidoso(Varnhagen — Hst. Ger. I, 49). Mas é mais depresumir que fossem Índios por não serfacilmente crível que reexportassem Africanos.

(44) Pero Lopes — Roteiro cit.

(45) Varnhagen — Hist. Ger, I,30,

(46) Pero Lopes, Roteiro cit.; Fr. Gaspar da Madrede Deus — Memórias para a Hisóoria da Capitaniade S. Vicente.

(47) Por doações de 1534 e 1535. — V. Ayres doCasal — Corografia Brasílica.

(48) Carta de El-Rei D. João III a Martim Afonsoem 28 do Setembro de 1532.

(49) Varnhagen — Hist. Ger. , I; Lisboa Timon II,III.

(50) Idem. — As doações, os forais, os regimentosespeciais, e a legislação geral da Metrópole emtudo quanto se não opusesse às determinaçõespeculiares para a colônia, tal foi o regimelegislativo do nascente Estado. — Dessasdoações e forais alguns vêm transcritos noTimon.

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(51) V. Oeuvres de Don Barthélemy de las Casas,précédées de sa vie, por J. A. LLorente; Herrera— Historia general de las Índias; Raynal —Histoire Philosophique et politique desétablisseméns et du commerce des Européensdans les Deux-Indes.

(52) Herrera cit. Dec. I, L. 9.° cap. 5.°

(53) Damião do Góes — História de Portugal;Alexandre Herculano — Hist. de Portugal.

(54) Las Casas — Oeuvres cit.

(55) Guedes Aranha (em data posterior) tambémassim pensava e dizia que os Índios tinham sidocriados para servirem aos brancos(Timon II).

(56) Oeuvres de las Casas, precédées de sa vie jácit.

(57) V. g. a que se levantou entre Espanha ePortugal depois da descoberta do Novo Mundopor Colombo, e antes da do Brasil por Cabral,resolvida por Alexandre VI na tão célebre Bula de4 de Maio de 1493, à qual se seguiu o tratado deTordesilhas de 7 de Junho de 1494, confirmadoposteriormente pela Bula de 24 de Janeiro de1506. (V. Visconde de Santarém — Quadroelementar, etc.; Cantu — Histoire Universelle XIII).

(58) Adiante diremos. — Em 1537 se expediram

197

várias Bulas, citadas em Las Casas (Oeuvres); B.da Silva Lisboa (Annaes do Rio de Janeiro); J.Norberto (Memória já cit.), e em outros.

(59) Las Casas — OEuvres.

(60) Damião de Góes — Hist. de Portugal;Varnhagen — Hist. Ger. I, 23.

(61) Varnhagen cit. I, 174.

(62) V. Cap. 3.° e seguinte. — A Lei de 1570 eoutras o dizem alto e bom som; e jáanteriormente isto se relata no Regimento dado aTomé de Souza em 1548, assim como se provacom outros documentos da época.

(63) Madre de Deus — Capitania de S. Vicente.

(64) Hist. Ger. cit.; Gama — Memórias dePernambuco. — Os Índios Tabyra, Hagibe ePiragibe lhe foram de grande préstimo;aliando-se aos Tabajaras bateu os temíveisCaetés (Gama cit. I, 96).

(65) Hist. Ger. cit.; Braz da Costa Rubim —Memórias sobre a Capitania do Espírito Santo(Rev. do Inst. Hist. XIX, 336; XXIII, 113). —Vasconcellos —Ensaio.

(66) Hist. Ger. cit. I, 153.

198

(67) Fr. Gaspar — Capitania de S. Vicente;Varnhagen — Hist. Ger. cit.

(68) Hist. Ger. cit. I. 156.

(69) Hist. Ger. cit. I, 161.

(70) Hist. Ger. cit. I, 164; J. Norberto — Memóriajá cit. (Rev. do Inst. Hist. XVII, 109).

(71) Hist. Ger. cit. I, 167; Accioli —Memórias.

(72) Coruja — Hist. do Brasil pag. 22; Accioli —Mem.; Corogr.

(73) V. Crônica de D. João III; Annaes por Fr. Luizde Souza, publicados por Alexandre Herculano.

(74) Varnhagen cit.; Lisboa — Timon; Cônego Dr.J.C. Fernandes Pinheiro na — BibliotecaBrasileira pag. 309; Dr. C. A. de Souza Filgueiras— Reflexões sabre as primeiras épocas da Históriado Brasil (Rev. do Inst. Hist. XIX. 398).

(75) Varnhagen - Hist. Ger. I,187.

(76) Varnhagen — Hist. Ger. I, 190.

(77) Idem; Lisboa — Timon; Cônego Dr. J. C.Fernandes Pinheiro na Bibliotheca Bras. pag.309.

199

(78) V. Lisboa — Timon III, 304; Avcioli —Mem.

(79) Lisboa III, 318.

(80) Lisboa cit. III, 311; Rev. do Inst. XVIII, 166(manuscrito oferecido por Sua Majestade oImperador).

(81) Varnhagen — Hist. Ger. I,195.

(82) Lisboa — Timon III, 315.

(83) Lisboa — Timon III, 353.

(84) Cônego Dr. Fernandes Pinheiro ua Bibl.Bras, já cit. — Com o volver dos tempos econseqüentes abusos, essa concentraçãotornou-se excessiva e vexatória; por forma que jáem carta de 14 de Dezembro de 1655 o PadreAntônio Vieira se queixava dizendo que — haviaum só entendimento, uma só vontade, e um sópoder, e este é de quem governa.

(85) Accioli — Mem.; Varnhagen I, 197; Lisboa —Timon; e outros.

(86) Simão de Vasconcellos — Crônica daCompanhia de Jesus do Bispado do Brasil. — OsJesuítas não foram os primeiros padres ereligiosos que vieram ao Brasil. Os Franciscanos,v. g., os haviam precedido; porquanto, criada em1503 a primeira feitoria denominada Santa Cruz,

200

aí estiveram dois, que levantaram templo, etentaram a redução e catequese dos Índios,segundo refere Fr. Antônio da Piedade naCrônica da Província da Arrabida (Varnhagen —Hist. Ger. I, 425). Mais tarde outras OrdensReligiosas se introduziram; e por tal forma, quefoi necessário que o governo da Metrópoletomasse providências a respeito (Hist. Ger. cit.,293; Lisboa — Timon); e algumas tratavammesmo da catequese, e chegaram a dirigiraldeias, sobretudo no Norte do Brasil, comoforam os de Santo Antônio, S. Francisco, N. S.do Carmo, Mercês, etc. (V. Jaboatão — OrbeSeráfico). — Porém nenhuns outros Padresprestaram os mesmos serviços nem conseguiramos mesmos resultados (Cônego FernandesPinheiro — Ensaio sobre os Jesuítas — Rev. doInst. XVIII, 67; Breves reflexões sobre o sistemade catequese seguido pelos Jesuítas, — Rev. XIX,379).

(87) Varnhagen — Hist. Ger. I, 197.

(88) Lisboa — Timon II, III.

(89) Varnhagen cit. I, 201.

(90) A instituição é de Santo Inácio de Loyola em15 de Agosto de 1534, aprovada pelo Papa PauloIII (Bula de 27 de Setembro de 1540 —Regiminimilitantis Ecclesiae). — V. Histoire de la

201

Compagnie de Jesuspor Cretineau-Joly;Balthazar Telles — Crônica da Companhia deJesus da província de Portugal; Simão deVasconcellos — Crônica da Companhia de Jesusdo Estado do Brasil; Southey — Hist. of Brasil;Guioberti — Il Jesuíta moderno.

(91) Accioli — O Jesuíta Manoel da Nóbrega, (Rev.do Inst. VII. 406).

(92) Cartas Jesuíticas; Varnhagen cit. I, 202.

(93) De que compôs uma gramática; sendo maistarde composta outra pelo Padre Luiz Figueira(Jesuíta).

(94) Hist. Ger. cit. I, 204.

(95) Lisboa — Timon III; Varnhagen — Hist.Ger. I.

(96) Timon cit. III, 478.

(97) A Bula é do 1.° de Março de 1555 — Superspecula militantis Ecclesiae.

(98) Por Leonardo Nunes, e Diogo Jacome.

(99) V. Accioli — O Jesuíta José de Anchieta (Rev.do Inst. VII, 551); Pereira da Silva — PlutarcoBrasileiro; Varões ilustres; Simão de Vasconcellos- Vida do Padre José de Anchieta.

(100) Fr. Gaspar — Capitania de S. Vicente;

202

Noticia na Rev. do Inst. II, 423; Simão deVasconcellos cit. — Em o dia 25 do Janeiro aí sedisse a primeira missa. — V. Pedro Taques —Hist. da Capitania de S. Vicente — na Rev. doInst. IX.

(101) Hist. Ger. cit. I, 215.

(102) Em 1570 (Accioli cit.; Simão deVasconcellos cit.)

(103) Hist. Ger. I, 225; Timon; — Cartas deManoel da Nóbrega.

(104) Existe na Academia das Belas Artes do Riode Janeiro uma grande tela comemorando atotão estupendo (esboço do finado distintoprofessor Mello).

(105) Hist. Ger. I, 221; — Parecer sobre a obra —Reflexões críticas, etc., na Rev. do Inst. Hist. II,111.

(106) Monsenhor Pizarro. — Memórias do Rio deJaneiro; B. da Silva Lisboa — Annaes; — CônegoFernandes Pinheiro — França Antártica (Rev.XXII, 3).

(107) Distinguiu-se, entre outros, o ÍndioRoniam-Bebe ou Cunhambebe (Thevet; — V.Rev. do Inst. XIII, 517).

203

(108) Hist. Ger. I; — Timon II.

(109) A esta Carta régia fazem alguns remontar ocativeiro legal dos Índios no Brasil, conquantoexistisse de fato muito antes (Timon II, 380). Masjá no Regim. dado a Tomé de Souza em 1548 sefalia em cativar o gentio por direito do vencedor;e o fato era de algum modo tolerado pelogoverno. Já antes mesmo desse Regimento, emC. R. de 1532 a Martim Afonso de Souza se lê afaculdade de cativarem os colonos os gentios, eaté de os mandarem vender a Lisboa livres desisa.

(110) Accioli — Mem.; Monsenhor Pizarro - Mem.

(111) Hist. Ger. I, 238, 242. — Rubim - Mem. jácit.

(112) Hist. Ger. I, 233, 236.

(113) Hist. Ger. I, 237.

(114) Idem, 241.

(115) Vida de José de Anchieta por Accioli, ePereira da Silva; — Simão de Vasconcellos —Crônica cit. — Foi por esta ocasião que compôsele o seu afamado poema da vida da SantíssimaVirgem em 4172 versos latinos, que escrevia naareia da praia do mar, e retinha de memória!

204

(116) O sistema destes Padres na catequese dosÍndios se vê ingenuamente exposto nas CartasJesuíticas, das quais algumas já se achampublicadas. (V. Cônego Fernandes Pinheiro —Breves Reflexões, etc, na Rev. do Inst. Hist. XIX.379).

(117) Carta de Mem de Sá de 30 de Março de1560.

(118) V. Rev. do Inst. III, 366; XIV, 374, 391.

(119) Carta de Ruy Pereira de 1560; — Hist. Ger.I, 244.

(120) Pizarro, e Lisboa — Memórias, e Annaes cit.— C. Fernandes Pinheiro — França Antártica.

(121) Lisboa — Annaes do Rio de Janeiro.

(122) Depois do batismo Martim Afonso — V.pelo Cônego Januário da Cunha Barbosa na Rev.do Inst. Hist. IV. 207.

(123) Annaes e Memóriasreferidos; — Crônica.

(124) Varnhagen — Hist. Ger. I, 238, 239.

(125) Varnhagen — Hist. Ger. I. 260.

(126) Vem extratada na Synopsis de FigueiredoII, 132, e inserta na L. de 22 de Agosto de 1587;— lê-se a sua íntegra em Varnhagen — Hist. Ger.

205

I, 268.

(127) Diz o seguinte: — D. Sebastião, etc. Façosaber aos que esta lei virem, que sendo euinformado dos modos ilícitos que se tem naspartes do Brasil em cativar os gentios das ditaspartes, e dos grandes inconvenientes que dissonascem, assim para as consciências das pessoasque os cativam pelos ditos modos, como para oque toca a meu serviço, e bem, e conservação doestado das ditas partes, e parecendo-me queconvinha muito ao serviço de Nosso Senhorprover nisso em maneira que se atalhasse aosditos inconvenientes, mandei ver o caso na Mesada Consciência, pelos deputados do despachodela, e por outros letrados; e conformando-menisso com sua determinação e parecer: Defendoe mando que daqui em diante se não use nasditas partes do Brasil dos modos que se até orausou em fazer cativos os dilos gentios, nem sepossam cativar por modo nem maneira alguma,salvo aqueles que forem tomados em guerrajusta que os Portugueses fizerem aos ditosgentios, com autoridade e licença minha, ou domeu Governador das ditas partes, ou aquelesque costumam saltear os Portugueses, e a outrosgentios para os comerem; assim como são os quese chamam Aimorés e outros semelhantes. E aspessoas que pelas ditas maneiras lícitascativarem os ditos gentios serão obrigadasdentro de dois meses primeiros seguintes, que se

206

começarão do tempo em que os cativarem,fazerem escrever os ditos gentios cativos noslivros das Provedorias das ditas partes para sepoder ver e saber quais são os que licitamenteforam cativos. E não o cumprindo assim no ditotempo de dois meses: Hei por bem que percam aação dos ditos cativos e senhorio. E os gentiosque por qualquer outro modo e maneira foremcativos nas ditas partes declaro por livres, e queas pessoas que os cativarem não tenham nelesdireito nem senhorio algum.

(128) De l573, ou anterior.

(129) Hist. Ger. já cit. I, 273,

(130) A divisão foi cfTcilunda pela C. R. de 10 deDezembro de 1572. (V. Hist. Ger. cit. I, 489.)

(131) Hist. Ger. I. 273.

(132) Monsenhor Pizarro — Memórias II, 113.

(133) Em 31 de Janeiro 1580.

(134) Simão de Vasconcellos — Crônica já cit.; eoutros.

(135) Vem citada na L. de 6 de Junho de 1733: eem Figueiredo Synopsis Cronológica I. 152, II,238.

207

(136) Figueiredo —Synopsis II, 238

(137) Hist. Ger. I, 315 e nota 5.

(138) Hist. Ger. I, 308.

(139) Idem, 312.

(140) Idem, 491.

(141) Citada nas Leis de 30 de Julho de 1609, e10 de Setembro de 1611: e extratada naSynopsis de Figueiredo II, 271, e melhor nasditas Leis.

(142) Citada e extratada na L. de 30 de Julho de1609; também referida por Figueiredo —Synopsis II, 274, e João Pedro Ribeiro — ÍndiceCronológico I, 22.

(143) L. cit. de 11 de Xovcmbro de 1593.

(144) Consultas de 31 de Janeiro e 21 de Julhodo 1603 (Hist. Ger. I, 316).

(145) Hist. Ger. I, 316 e 473

(146) Vem citada nas Leis de 1609 e 1611 de queadiante trataremos; a sua íntegra se lê na Col.de Coimbra, e na moderníssima Col. de Leis porAndrade.

(147) Col. de Coimbra, e de Andrade. — De

208

efêmera duração foram estas providênciasabsolutamente negativas da escravidão dosindígenas.

(148) Já então vigoravam as OrdenaçõesFilipinas desde 1603, sem prejuízo porém dasleis especiais da colônia.

(149) V. Razão do Estado do Brasil no governo doNorte somente assim como o teve D. Diogo deMenezes até o ano de 1612; — Gabriel Soares —Notícia, etc.

(150) Rev. do Inst. Hist. XII, 7.

(151) A pureza da instituição foi-se perdendocom o desenvolvimento das conquistasespirituais dos Jesuítas em todo o globo, e maisainda pela superveniente ambição de mando,poderio, e riquezas; Acquaviva não é Loyola (V.Guioberti — II Jesuita moderno).

(152) Hist. Ger. I.

(153) Southey — Hist. of Brasil. — Bandeirasdenominavam-se a reunião de indivíduosarmados, com destino a internarem-se pelasterras e sertões a prear, e perseguir Índios,pretextando debelá-los.

(154) Col. de Coimbra, e de Andrade.

209

(155) Já existia a Relação da Bahia, criada por L.de 1588, mas instalada só em 1609 com o seuRegim. de 7 de Março deste ano.

(156) Anteriormente era taxado pelas Câmaras,com a singularidade de ser a taxa o máximo dopreço (4$000 réis); o que importava (se lícitofosse o negócio) verdadeira transação leonina emdetrimento dos miseráveis índios (V. J. Norberto— Memória já cit.)

(157) Esta cláusula deu lugar a sériascontestações entre os Jesuítas e os Bispos.

(158) Berredo — Annaes Hist. do Maranhão

(159) Berredo — cit., — Lisboa — Tim II, III.

(160) Idem.

(161) Hist. Ger. I, 333; — Lisboa — Timon II, III,28.

(162) Hist. Ger. I, 335; — Southey — Hist.

(163) V. Barlœus — Rerum.... in Brasilia....gestarum sub Præfectura... Comitis Mauritii.

(164) Hist. Ger.I, 350.

(165) Timon III; — Hist. Ger. I.

(166) Timon III.

210

(167) Timon III.

(168) S. Leopoldo Annaes, 231.

(169) V. Barlœus já cit.; Netscher — LesHollandais au Brésil.

(170) Na frase incisiva do ilustre autor do TimonMaranhense.

(171) Southey — Hist. of Brasil II, 317.

(172) Este Padre compôs um — Vocabulário, arte,e tesouro da língua guarani.

(173) Hist. Ger. I,406.

(174) Rev. do Inst. Hist. III, 113, XII, 13. — PedroTaques — Notícia histórica da expulsão dosJesuítas do colégio de S. Paulo (Rev. XII, 5).

(175) Rev. III, 117, XII, 10 - Pedro Taques cit.

(176) Pedro Taques cit. (Rev. XII); Fr. Gaspar daMadre de Deus — Memórias e Noticia.

(177) Pedro Taques cit. (Rev. XII, 27 e 28).

(178) Hist. Ger. I, 414.

(179) Accioli - Mem. I. 416.

(180) V. Barlœus já cit.; Netscher cit.; Rocha

211

Pitta cit.; Duarte de Albuquerque — Memóriasdiárias da guerra de Pernambuco; — Ericeira —Portugal restaurado; — Calado — ValerosoLucideno; — Fr. Rafael de Jesus — CastriotoLusitano; — Brito Freire — Historia Brasílica; —Fr. Gioseppe di S. Theresa — Istoria delle guerredel Regno del Brasile; — Cônego Dr. FernandesPinheiro — Brasil Holandês (Rev. do Inst. XXIII,67); J. M. de Macedo — Dúvidas sobre algunspontos de História Pátria (Rev. XXV. 3).

(181) Hist. Ger. II, 2 — Foi o primeiro o PríncipeD. Teodósio, filho do Rei D. João IV.

(182) Timon III — Desde o Rio Grande do Norteaté S. Vicente.

(183) Col. de Coimbra. — Desde 1626 se haviaextinguido, destinando-se às despesas da guerrae defesa do Estado as somas respectivas.

(184) Assim se lê no Alvará de 10 de Novembrode 1647.

(185) Col. do Desembargador Delgado; Col. deAndrade. — Vem inserto na Lei de 6 de Junho de1755.

(186) Hist. Ger. II, 41 nota 5.

(187) Timon III.

212

(188) V. Berredo — Annaes cit.; André de Barros— Vida do Padre Antônio Vieira; J. F. Lisboa —Timon IV.

(189) Col. de Andrade; Berredo cit. fl. 426.

(190) Timon III.

(191) Hist. Ger. II, 63.

(192) Referida e extratada na Lei do 1.° de Abrilde 1680. — V. Melo Morais — Corographia III,393.

(193) Os quais poderiam ser acompanhados deescolta militar, inteiramente à sua disposição.

(194) André de Barros Cit.; Hist. Ger. II, 64.

(195) André de Barros cit.; Timon cit.

(l96) Timon III, IV.

(197) Hist. Ger. II, 40.

(198) V. Rev. do Inst. Hist. XII, 30.

(199) Timon III.

(200) Berredo cit. n.° 1039 a 1076; Timon cit. III,IV.

(201) Inserta na Lei de 7 de Junho de 1733

213

(202) Esta exclusão deu lugar a vivasreclamações; porque, diziam os colonos, assimnão haveria quem quisesse fazer entradas, desdeque nenhuma vantagem tirava.

(203) Timon III, IV.

(204) Idem III.

(205) Timon III.

(206) Idem.

(207) Idem.

(208) Mello Morais — Corographia cit, III, 396

(209) Timon III.

(210) Idem.

(211) Timon III.

(212) Hist. Ger. II, 66 e 75; Timon cit.

(213) Por Bulas de Inocêncio XI de 16 deNovembro de 1676.

(214) Por Bula de 30 de Agosto de 1677.

(215) Berredo — Annaes n.° 1196.

(216) Em 1676. — S. Leopoldo — Annaes § 233.

214

(217) B. da Silva Lisboa-Annaes I, 139.

(218) Idem IV, 271.

(219) Accioli — Mem., I, 113.

(220) Hist. Ger. II, 74.

(221} A Lei vem inserta na Lei de 6 de Junho de1733 (Col. cit,) — E a Provisão em Timon III.

(222) J. F. Lisboa — Timon III, 183, 303 a 305.

(223) Timon III, 186 e 187.

(224) Além de fazendas e gêneros, obrigavam-seos contratadores ou assentistas a meter nacolônia 10.001 negros, à razão de 500 por ano(V, Timon cit. III, 189).

(225) A. Gonçalves Dias na Rev. do Inst. Hist.XIV, 378; Timon III.

(226) Timon III, 235 a 237.

(227) Timon III, 253, 393 a 397.

(228) Como declarou a Lei de 19 de Fevereiro de1696 (Timon III, 255).

(229) Timon III, 257; Mello Morais — Corographia.

(230) Timon cit. 261 em diante.

215

(231) Timon III, 277. — Este Regimento comvárias Decisões posteriores foi impresso epublicado, de ordem régia, avulso, em 1724 porManescal em Lisboa (J. P. Ribeiro — Índice I,249). Dele dão notícia todos os escritores, eainda ultimamente também em Mello Morais —Corographia cit. — Na Biblioteca Pública destaCorte existe um exemplar manuscrito, cópia dodito impresso .

(232) Padre José de Morais — Memórias sobre oMaranhão, publicadas por Cândido Mendes deAlmeida em 1860; e por Mello Morais naCorographia.

(233) Do Maranhão e Pará, que efetivamente aífunecionou.

(234) Tal é em extrato o disposto nos 23Capítulos do tão celebrado Regimento dasMissões para redução do gentio do Estado doMaranhão e Pará ao grêmio da Igreja, e repartiçãodo serviço dos índios que depois de reduzidosassistem nas aldeias. — Para fazê-lo servi-me domanuscrito (hoje quase ilegível) acima referido,em falta do impresso. — Aproveito a ocasião paraagradecer ao digno bibliotecário Fr. Camilo deMonserrate a sua bondade para comigo.

(235) V. o manuscrito referido.

(236) Idem; J. Pedro Ribeiro — Índice cronológico

216

de leis.

(237) V. o manuscrito supra referido.

(238) O Governador do Maranhão Gomes Freirede Andrade, em ofício de 13 de Outubro de 1685,havia representado sobre o estado de atenuaçãodas Capitanias por falta de cabedais e de braços;e lembrava, entre outras providências, apermissão dos resgates, até com grandevantagem (pensava ele) da Fazenda Pública,abastecendo-se destarte os moradores,aliviando-os dos assentistas, e evitando que osíndios buscassem os estrangeiros para lhesvenderem os escravos. Dizia ele — resgatarÍndios, que vivem em contínuas guerras,comendo-se uns aos outros, por não haver quemlhes compre os prisioneiros, que neste desamparoperdem a vida e a salvação. Grande barbaridade édeixá-los perecer por este modo, quando as razõespara permitir-se o cativeiro dos negros de Guinénão são tão justificadas....; mandarem-se aoresgate Oficiais de Fazenda acompanhados deReligiosos da Companhia. Poder-se-á comprar cadaescravo por quatro ou cinco mil réis, a troco deferramentas, velórios, e outras bagatelas: evendendo-se depois por trinta, não só lucrará S. M.um grande avanço, como ficarão os moradoresremediados para beneficiarem os seus engenhosdesmantelados; o que com índios forros jamaispoderão conseguir, porque, além de os não haver,

217

sabida cousa é que o trabalho das suas fábricassó escravos podem suportar... Sem a permissão deescravos nunca poderá este Estado ser nada,tendo aliás tanto com que ser grande. Além de queé de receiar que, não podendo os índios fazerconosco o comércio, busquem para ele osestrangeiros confinantes. {Timon III, 280).

(239) Mello Morais-Corographia IV, 129, 130.

(240) Idem IV, 130, 131.

(241) Diz o próprio Alvará de 6 de fevereiro de1691.

(242) V. manuscrito já cit.; — e MoraisCorographia IV, 131.

(243) Hist. Ger. II, 89 e seguintes.

(244) Manuscrito já cit. Bib. Pub.

(245) Hist.Ger. II, 98.

(246) Desembargador M. Fernandes Thomaz -Repertório de leis extravagantes.

(247) V. o texto destes tratados na obramonumental do sábio e distinto Brasileiro Dr.Joaquim Caetano da Silva — L’Oyapoc etl’Amazone..

(248) Manuscrito cit. Bib. Pub. — Timon III, 136.

218

(249) Timon III, 440 nota.

(250} Idem III, 440.

(251) Padre Antônio Vieira. — Pretende quemuitos milhões de índios foram assim destruídospelos colonos; e dizia que estes só queriam dosangue vermelho dos mesmos tirar o ouro amarelo.

(252) Padre Antônio Vieira. — V. Timon III, e IV

(253) Hist. Ger. II. 95 e 98.

(254) Monsenhor Pizarro — Memórias; — Fr.Gaspar — Cap. de S. Vicente; — Alencastre —Annaes da Província de Goyaz — (Rev. do Inst.Hist. XXVII); - Padre L. A. da Silva Souza —Memória sobre Goyaz (Rev. XII, 429).

(255) Fernandes Thomaz — Repertório — V.índios.

(256) Hist. Ger. II, 162.

(257) Idem II, 164.

(258) Idem II, 169 e 171.

(259) Idem II, 172.

(260) Moraes — Corographia III, 184.

(261) Idem IV, 138.

219

(262) Moraes — Corographia IV, 123 a 130.

(263) Idem IV, 135 e 136.

(264) Idem III, 400.

(265) Idem III, 123.

(266) Col. de Breves, e Leis Régias.... expedidossobre a liberdade... dos índios do Brasil, etc.

(267) Col. cit. n.° 4 pag. 14.

(268) Idem.

(269) Moraes — Corographia cit. III, 400.

(270) Col. do Desembargador Delgado.

(271) V. A administração de Sebastião José deCarvalho e Mello, Marquês de Pombal — 4 vol.

(272) v. Col. de Breves e Leis Régias, etc., Cit.; —Cretineau — Joly; Guioberti.

(273) S. Leopoldo Annaes; — V. de Santarém —Quadro elementar.

(274) Col. de Breves e Leis Régias cit; — PadreGay — República Jesuítica do Paraguay (Rev. doInst. XXVI); — Reúublica Jesuítica no Uruguay eParaguay (Rev. IV, 265).

220

(275) Relação abreviada, etc., na cit. Col. deBreves e Leis Régias; — Varnhagen — Hist. Ger.II, 194.

(276) Col.de Breves cit.; Col. de Leis peloDesembargador Delgado.

(277) Assim o dizia também o Padre Vieira.Parece exagerado o cálculo. Mas, se se referir aonúmero de índios que foram sucessivamentedestruídos desde os primeiros tempos, não oserá, como se lê em uma memória doDesembargador Carvalho e Albuquerque, de queadiante falarei. Da América Espanhola refere oPadre Las Casas que em meio século destruíramos conquistadores para cima de 13 milhões deíndios.

(278) Que diz o seguinte: — E para que os ditosgentios que assim descerem, e os mais que há depresente, melhor se conservem nas aldeias, Heipor bem que sejam senhores de suas fazendas,como o são no sertão, sem lhes poderem sertomadas nem sobre elas se lhes fazer moléstia. Eo Governador, com parecer dos ditos Religiosos,assinará aos que descerem do sertão lugaresconvenientes para neles lavrarem e cultivarem, enão poderão ser mudados dos ditos lugarescontra sua vontade, nem serão obrigados a pagarforo ou tributo algum das ditas terras, ainda queestejam dadas em sesmarias a pessoas

221

particulares, porque na concessão destas sereserva sempre o prejuízo de terceiro, e muitomais se entende e quero se entenda serreservado o prejuízo e direito dos índios,primários e naturais senhores delas.

(279) Manuscrito referido B. P. f. 113 a f. 117.

(280) Col. de Breves e Leis Régias já cit.

(281) Relação abreviada, etc, na Col. cit.

(282) Col. cit.

(283) Posteriormente foram expulsos de França,Espanha, Nápoles; e afinal abolida a Ordem porBula de Clemente XIV, de 1773.— Mais tarde (7de Agosto de 1814) foi ela restabelecida peloPapa Pio VII.

(284) Relaçãocit.; — Hist. Ger. II.

(285) Expedida mais tarde definitivamente a Bulade extinção da Ordem de 21 de Julho de 1773 —Dominos ac redemptor, etc, foi ela auxiliada emsua execução pela L. de 9 de Setembro de 1773.

(286) Col. de Leis cit.; Timon III; — FernandesThomaz — Repert.

(287) Manuscripio já cit. da B. P.; — Moraes —Coroqraphia IV, 134.

222

(288} Col. do Desembargador Delgado.

(289) Idem.

(290) Alencastre já cit. (Rev. XXVII, 143); sendoanteriormente sujeitas aí as aldeias ao regimemilitar constante do Reg. de 13 de Junho de1754.

(291) Nem o impresso, nem o manuscrito quetive em vista, trazem a data; mas induz-se dotexto.

(292) M. S. já cit. da B. P.; M. Morais —Corographia IV, 122 a 185. — Conquanto oimpresso não seja textualmente idêntico aomanuscrito referido, todavia não pode restardúvida, conferindo-se (como fiz) um e outro.

(293) Entre estes era o de promover-se aintrodução e comércio dos escravos de Angola eGuiné, para alívio dos índios, proveito dosmoradores, desenvolvimento da agricultura, etc.,além da vantagem espiritual de serem reduzidosà fé católica os negros!

(294) Assim o afirma ele por experiência própria;declarando haver conseguido por trabalho seu eà expensas suas o descimento de muitos índios,quando magistrado na Capitania do Rio Negro.

(295) José Arouche de Toledo Rendon — Memória

223

sobre as aldeias de índios da Província de S. Paulo— (Rev. do Inst. Hist. IV, 293).

(296) Coronel J. J. Machado de Oliveira Noticiaraciocinada sobre as aldeias de índios da Provínciade S. Paulo (Rev. do Inst. Hist. VIII, 204).

(297) Alencastre — Annaes da Província de Goyaz(Rev. XXVII, 160, 161).

(298) Publicada na Rev. do Inst. Hist. XX, 433.

(299) Rev. cit. XX, 445.

(300) Chamada a conspiração do Tiradentes (V.José de Rezende Costa na Rev. do Inst. Hist.VIII, 297; — Dr. A. Pereira Pinto em aConfederação do Equador — Rev. cit. XXIX, 36).— De 1789 - 1792.

(301) Desde a vinda da Família Real, em 1808,maiores franquezas ao Estado, abertura dosportos ao estrangeiro, elevação do Brasil a Reinoem 1815, a emancipação política de 1822proclamada nos gloriosos campos do Ipiranga eraconseqüência necessária. Tais são os arcanos dasabedoria Divina, ainda no mundo moral, e naordem providêncial das Nações.

(302) Hist. Ger. II, 301 e 302. — V. Reflexõeseconômico-políticas pelo Desembargador Manoelde Matos Pinto de Carvalbo e Albuquerque,

224

oferecidas ao Marquês de Aguiar, Ministro eSecretário dos Negócios do Reino, 1814;manuscrito da Bib. Flum. nesta Corte; aproveitoo ensejo para agradecer ao respectivobibliotecário o Sr. Martins a leitura destemanuscrito. Deplora o seu autor o estado dedesgraça das aldeias e dos Índios nos termosseguintes ... que havendo descido dos sertõesinumeráveis gentios por mais de dois séculos seforam sempre gradualmente extinguindo, de modoque nos últimos anos do reinado do Sr. D. João Vapenas se conservaram alguns daquelesdesgraçados nas primeiras aldeias em que seestabeleceram sem ordem nem formalidadealguma. Vivendo ainda esses poucos em tãogrande abatimento e miséria que, em vez deatraírem por força das comodidades próprias osBárbaros seus Nacionais, lhes serviam pelocontrário do maior escândalo e estímulo para maisabominarem a nossa comunicação e trato;embrenhando-se nas suas antigas habitaçõessilvestres, com lamentável prejuízo da salvação detantos milhões de almas; e com o mais consideráveldano dos verdadeiros interesses do Estado. E comefeito teriam chegado a extinguir-se de todo nasaldeias das Capitanias do Sul, se estas de algumaforma não participassem também das paternaisprovidências que o Sr. Rei D. José I foi servido darpara o restabelecimento do Pará e Maranhão pelassábias leis de 4 de Abril, 6 e 7 de Junho de 1775,8 de Maio e 17 de Agosto de 1758.

225

(303) V. Cônego Januário da Cunha Barboza. —Se a introdução dos escravos Africanos no Brasilembaraça a civilização dos nossos indígenas?(Rev. do Inst. Hist. I, 143); — José SilvestreRebello — sobre a mesma questão. (Rev. I, 133).

(304) Diretório já cit. de 1737 aprovado pelo Alv.de 1738.

(305) L. de 6 de Junho de 1755 § 4.° — que diz oseguinte: — Desta geral disposição (de seremlivres todos os índios) exceto somente os oriundosde pretas escravas, os quais serão conservados nodomínio dos seus atuais senhores, enquanto Eunão der outra providência sobre esta matéria.

(306) Como se reconhece formalmente na C. R.de 5 de Setembro de 1811. Ainda hoje subsisteintenso esse ódio tradicional. (V. Dr. Couto deMagalhães — Memória sobre o rio Araguaia).

(307) Accioli — Memória (Rev. do Inst. Hist. XII,143)

(308) Col. de Leis — Ouro Preto.

(309) Idem.

(310) Col. de Leis — Ouro Preto.

(311) Hist. Ger. II, 321.

226

(312) Em Outubro de 1788. — Publicada na Rev.do Inst. Hist. XIX, 33. — Em 1814 tambémofereceu ao Príncipe Regente D. João umamemória notável o Desembargador Carvalho eAlbuquerque já cit., em que expunha as suasidéias sobre catequese, que em substância são:1.°, estabelecimento de colônias de índios depreferência nas costas marítimas pela maiorfacilidade e vantagem da agricultura e comércio;2.°, distribuição de terras, e tombo delas para ascolônias; 3.°, distribuição das mesmas pelosíndios; 4.°, providências sobre a povoação,estabelecimento dos índios, despesas para isso;sobre alimentação, vestuário, habitações,instrumentos agrícolas, etc.; 5.°, hospitais,médicos, boticas; 6.°, instrução religiosa,propagação da fé católica, igrejas, sacerdotes; egoverno espiritual dos índios; 7.°, educação,escolas, ofícios mecânicos; 8.°, casamentos dosíndios, e suas comodidades; 9.°, governotemporal, organizado por decúrias e centúrias,com seus inspetores e Intendentes de polícia,Capitães-mores, etc.; e uma junta com jurisdiçãocoativa mais em forma paternal do que judicial(V. Reflexões, etc., parte 2.ª tits. 2 a l3 — M. S.da Bibl. Flum.) — Mais modernamente o ilustreBrasileiro José Bonifácio (1823) à AssembléiaConstituinte (impressa na Rev. do Inst. Hist. XII,228). — E ainda em 1839 o distinto literatoCônego Januário da Cunha Barboza, emdesenvolvimento ao prograuima do Inst. Hist. —

227

Qual seria o melhor sistema de colonizar os índiosentranhados em nossos sertões... (Rev. II, 3).—Outras memórias, até especiais sobre civilizaçãode Botocudos, e outras tribos, existem; o queprova a importância da questão e o interesse quebeneméritos hão por ela tomado.

(313) Col. de Leis — Ouro Preto.

(314) Col. de Leis — Ouro Preto.

(315) Col. de Leis — Ouro Preto.

(316) V. g. na causa cível vinda por apelação daprovíncia de S. Tanto em 1864 à Relação daCorte, apelantes Josefa Maria do Carmo eoutros, apelados Silvestre e outros.

(317) Col. de Leis cit.

(318) Col. de Leis cit.

(319). Col. de Leis por Nabuco.

(320) Col. de Leis. - Ouro Preto.

(321) J. M. Pereira da Silva. mdash; Fundação doImpério Brasileiro.

(322) Pereira da Silva. — Fundação do ImpérioBrasileiro.

(323) V. Pereira da Silva cit.; A. Pereira Pinto —

228

A Confederação do Equador (Rev. do Inst. Hist.XXIX, 36).

(324) V. Pereira da Silva cit; sobre as basesfundamentais de governo.

(325) Col. Nab.

(326) Na Rev. do Inst. Hist. XII, 228.

(327) V. Diário da Constituinte; — A Constituinteperante a História por F. J. M. Homem de Mello.

(328) Col. de Leis — Ouro Preto. — Os decretosdessa 1.ª Assembléia eram promulgadosindependente de sancão, na forma do Dec. de 23de Agosto de 1823.

(329) Col. Nab.

(330) Col. de Leis.

(331) Cunha Matos — Repert. V. índios.

(332) Col. Nab.

(333) Col. Nab.

(334) Col. do Leis

(335) Col. Leis.

(336) V. Dec. de 3 de Junho de 1833 pr. (Col. de

229

Leis.)

(337) Col. cit.

(338) Furtado — Repert.

(339) Col. de Leis.

(340) Col. cit.

(341) Col. de Leis.

(342) Idem.

(343) idem.

(344) Idem.

(345) Col. de Leis.

(346) Col. Leis. — Novo plano das missões dosCapuchinhos foi organizado por estes, eapresentado ao Governo (V. Relat. do M. daAgric. de 1865).— V. nota 385.

(347) Col. de Leis. — V. nota 385.

(348) Jornal do Commercio 222; Furtado —Repert.

(349) V. Courrier de la Plata extratado no DiárioOficial e Jornal de 21 de Novembro de 1866.

230

(350) Dr. Furtado — Repert. cit.

(351) Idem.

(352) Col. de Leis - addit.

(353) Col. cit. — addit. — V. Dr. A. Pereira Pintono seu — Direito Internacional I, 353 nota.

(354) Não é, portanto, de todo exato o que se lênos — Apontamentos Jurídicos do Dr. J. F.Silveira da Motta. V. Índios, quando diz que esseRegulamento não tem tido execução. — OsRelatórios dos Presidentes de Província, e doGoverno provam a exatidão do que dizemos.

(355) Col. de Leis; Diário Oficial. — Aindarecentemente se mandou dar a Fr. Caetano deMessina 1:200$000 para despesas a bem dacatequese (Av. de 31 de Outubro de 1866 — noDiário Oficial de 14 de Dez.); assim como a Fr.Antônio Ganges a ajuda de custo de l:200$000, ese lhe arbitrou 1:200$000 como Diretor nomeadopara o aldeamento de Ipiabanha em Goiás (Avs.de 13 e 17 de Nov.de 1866 no Diário Oficial de 15e 16 de Dez.)

(356) Diário Oficial de 31 de Agosto.

(357) J. F. Silveira da Motta — Apont. Jurid. — V.índios; não obstante haver o Governo deixadoindecisa essa competência (V. Av. de 17 de

231

Outubro de 1846 e 24 de Agosto de 1847).

(358) Av. de 28 de Abril de 1865 (Diário Oflcíal de8 de Junho), Av. de 7 de Novembro de 1865(Diário Oficial de 8 de Dezembro) — Sobrealdeamentos em S. Paulo, V. Diário Oficial de 26de Novembro de 1864.

(359) Não há estatística exata; mas deduz-se doRel. do Min. da Agric. de 1865 e sobretudo do de13 de Maio de 1866. — A Província do Amazonassó por si contém 38 aldeamentos com 17.385índios; e o Pará 10 com 3.200 índios; S. Pedrodois com 839. — Na capital do Amazonas há umestabelecimento para educação dos filhos dosíndios; o qual tem dado bons resultados (Relat.cit. de 1866).

(360) O Av. de 20 de Maio de 1862 (Col. de Leis -adit.) extinguiu aldeamentos em S. 1'aulo,Pernambuco, e Sergipe; o Av. de 25 de Outubrode 1865, (Diário Oficial de 16 de Novembro) naProvíncia do Rio de Janeiro. — V. Relat. do Min.da Agric. de 1865 e 1866.

(361) Avs. 172 de 21 de Outubro de 1852, n.°273 de 18 de Dezembro de 1852, n.° 44 de 21 deJaneiro de 1856.

(362) V. g. no Amazonas (Relat. do Presidente daProvíncia do 1.° de Outubro de 1864); MatoGrosso (V. Jornal, Sup. de 9 de Novembro de

232

1864, pag. 1 col. 6ª; os Coroados no Paraná(Diário Oficial de 18 de Outubro de 1866, pg. 3col. 1.ª); no Maranhão os Guajajáras (DiárioOficial de 29 de Novembro de 1866, pag. 4 col.1.ª); em Mearim (Maranhão) sublevaram-se osdas aldeias (provocados por empregadossubalternos da Diretoria), uniram-se a outros emnúmero superior talvez a mil, atacaram aguarnição, moradores, famílias, (Diário Oficial eCorreio Mercantil de 29 de Dezembro de 1866;Diário Oficial de 12 de Janeiro de 1867, pag. 3.ª);e ainda em Outubro de 1866 os selvagens doJavari (Amazonas) flecharam pessoas daexpedição encarregada da demarcação de limitesdo Império, morrendo o Capitão Tenente SoaresPinto (V. Diário Oficial de 9 e 10 de Janeiro de1867); e outros perseguem os destacamentosmilitares, de que têm particular ojeriza (DiárioOficial de 12 de Janeiro de 1867)

(363) V. g. em Maracassumé no Maranhão(Jornal de 31 de Março de 1865).

(364) V. g. no Amazonas em 1865. (Relat. doPresidente da Prov. de Maio de 1865). — DiárioOficial de 25 de Outubro.

(365) V. Correio Mercantil de 4 de Dezembro pag.1 col. 2.ª

(366) V. Jornal do Comércio de 23 de Outubro.

233

(367) Av. do l.° e 26 de Agosto de 1864 — DiárioOficial de 2 e 17 de Setembro.

(368) Diário Oficial de 28 de Novembro de 1866,pag. 4 col. 1.ª

(369) Da estatística da população, organizada em1817 e 1818 pelos governadores, de ordem doGoverno, e transcrita por Balbi na — Statistiquede Portugal et du Brésil — vê-se que, sobre umapopulação de 3.817.900 almas, os Índiosaldeados e pacíficos orçavam por 250.000 (V.Hist. da Fund. do Imp. IV, 261). Henry Hill, em asua Memória de 1817, orçava apenas em1000.000 os Índios domesticados, e em 500.000os bravos (V. Rev. do Inst. XXIX — l.ª parte, pag.178, calculando o total da população em3.300.000 almas. O Conselheiro A. H. Velloso deOliveira em a sua informação — A igreja do Brasil—, de 1819. calculando o total da população em4.396.132 indivíduos, aí comprende 800.000índios bravos, o mínimo que lhe é possíveladmitir (Rev. cit. XXIX — 1.ª pag. 179). OSenador C. Baptista de Oliveira em 1850calculou a população do Brasil em 8.020.000almas, sendo 2.500.000 escravos; sem dizercousa alguma quanto aos índios (Rev. do Inst.Hist. XV, 113). O Sr. Sebastião Ferreira Soaresnos seus — Elementos de estatística, 1865 —orçando a população do Império em 11.780.000habitantes, dos quais deduz 1.400.000 escravos,

234

computa no restante 10.380.000 livres, 500.000indígenas, sem distinção (1, 43). O PadrePompeu na sua — Geographia, 1864 — calculaem 10.100.000 habitantes, dos quais 1.700.000escravos; além de mais de 200.000 índiosdisseminados pelos sertões do Amazonas, Pará,Maranhão, Piauí, Minas, Goiás, Mato Grosso eParaná.

(370) V. nota antecedente. — Orçando mais oumenos a população do Brasil em 10.000.000,distribuída por uma superfície de 256.886 léguasquadradas (Humboldt), cabem 30 ou 40habitantes por légua quadrada! É quase umdeserto! Cem milhões aí viveriam comodamente(V. Padre Pompeu cit; Ferreira Soares cit.)

(371) Não vem na Col.; porém delas faz menção oofício de 12 de Abril de 1865, que também nãovem na Col. mas se lê no Diário Oficial desse ano,e o Relat. do Min. da Agric. de 15 de Maio de1866.

(372) Col. — adit. — Não obstante o Reg. de1845, que exigia maior prazo; não obstante a leide terras de 1850 e seu Reg. de 1854. — OGoverno tem providênciado para que os índiossejam mantidos na posse e domínio das suasterras e propriedades.

(373) Não vem na Col.

235

(374) V. Diário Oficial do 1.° de Janeiro de 1865.

(375) V. Fala dirigida à Assembléia Provincial doPará em 15 de Agosto de 1884 pelo Presidente(Diário Oficial, Sup. de 21 de Fevereiro de 1865);Relat. do Presidente do Amazonas do 1.° deOutubro de 1864; Relat. dos Presidentes do Paráe Amazonas em 1865, e 1866; Relat. do Mini daAgric. de 15 de Maio de 1866.

(376) V. Ofi. de l8 de Julho de 1865 (Diário Oficialde 30 de Agosto).

(377) V. g. se constituindo advogado para defesade índios podem conceder-lhe honras de Diretord’aldeia; resolvendo o Governo pela negativa (Av.de 22 de Outubro de 1864 no Diário Oficial do 1.°de Novembro: se os Diretores gozam somente dashonras militares ou também das isenções eprivilégios; decidindo o Governo que só dashonras (Av. de 28 de Outubro de 1864, DiárioOficial de 4 de Novembro).

(378) Av. de 30 de Agosto de 1865 (Diário Oficialde 2 de Setembro).

(379) V. Relat. do Min. da Agricultura, etc., em1865 e 1866. — Ainda recentemente, contra osistema do Reg. cit. de 1845, foi nomeado Diretordo aldeamento de Ipiabanha em Goiás oCapuchinho Fr. Antônio de Gange (Av. de 13 deNovembro de 1866 (V. nota 383).

236

(380) V. Relat. cit. sobretudo de 1866. — NosRelatórios anteriores do Ministério do Império (acujo cargo estava a catequese e civilização dosindígenas) se acham notícias a respeito. Criado onovo Ministério da Agricultura, Comércio eObras Públicas, passou para este, ficando aCargo especial da Diretoria das terras públicas ecolonização a catequese e civilização dos Índios,as missões e aldeamentos dos indígenas (L. 1067de 28 de Julho de 1860, Dec. n.° 2747 de 16 deFevereiro de 1861, art. l.° n.° 14, art. 11 n.° 3); eportanto nos Relatórios respectivos se dá contadeste importante assunto.

(381) Diário Oficial de 4 de Junho de 1864.

(382) V. discurso do Dr. J. M. de Macedo em 8 deAbril de 1864 no Jornal do Comércio, Sup. de 13desse mês. — O Papa tentou obter de D. João VIa volta dos Jesuítas; mas o Rei opôs-se (V.Pereira da Silva — Fundação do Império IV).

(383) Os Capuchinhos têm prestado muito bonsserviços, como tem sido reconhecido econfessado pelo Governo (Relat. do Min. doImpério de 1863, e outros; e modernamenteRelat. do Min. da Agric.), e pelos Presidentes deProvíncia (Relat. destes). Ainda em 1884 foramCherentes aldeados em Goiás por esforços domissionário (Jornal de 13 de Dezembro).

237

(384) Euntes ergo docete omnes gentes (S. Mat.Cap. 28 v. 19 e 20). Sicut misit me Pater, et egomitto vos, S. João Cap. 20 v. 21).

(385) V. Relat. do Presidente do Amazonas do 1.°de Outubro de 1864 (Diário Oficial de 10 de Maiode 1865); Relat. dos Presidentes do Pará eMaranhão em 1866 (Jornal, Sup. de 7 de Julho).A história que vimos de esboçar prova àevidência a verdade da proposição enunciada. Aconcordata com a Santa Sé de 28 de outubro de1862 sobre a vinda de missionários Capuchinhoso confirma; garantindo-se-lhes maior latitude eliberdade de ação no exercício de suas funçõescivilizadoras. O Reg. de 23 de Abril de 1857, e ooutro de 1862 atribuem a alta direção dosaldeamentos ao elemento religioso, alteradas,portanto, neste sentido as administrações dosaldeamentos (V. Relat. do Min. da Agric. de 15 deMaio de 1866).

(386) Na Constituição do Arcebispado da Bahiaisto se recomenda em relação a todos, livres ounão, brancos, Índios, ou negros.

(387) Tácito — Annaes

(388) Conquanto seja nossa opinião que não deveo governo temporal ser exercido exclusivamentepelo missionário, todavia entendemosconveniente que tenha este uma certa

238

autoridade temporal paternal, principalmentenas primeiras fases da catequização; destinado oÍndio a fazer parte da comunhão social, suaeducação deve ser dirigida a este grande fim, enão a segregá-lo da sociedade civil. — Osresultados dependem não só das leis, massobretudo dos incumbidos da sua execução; einfelizmente bom pessoal é raro.

(389) O estudo das línguas indígenas não seriapara desprezar, atenta sobretudo a necessidadedo seu conhecimento para chamar os índiosbravos; os Jesuítas assim procederam, ecolheram grandes vantagens (V. Varnhagen naRev. do Inst. Hist. III, 53). Ainda ultimamente foiautorizada a nomeação de Intérprete por Av. de28 de Novembroi de 1864, (Diário Oficial de 24 deDezembro); o que prova a necessidade daqueleestudo e conhecimento. E já na C. R. de 28 deJulho de 1809 se exigia que o Diretor fosseinteligente do idioma dos índios.

(390) Sobre aquisição de índios paraguarnecerem canoas de serviço em S. Pedro doSul e no Amazonas V. Av. de 16 de Abril de 1861(Boletim Oficial), e de 11 de Outubro de 1864(Diário Oficial de 22).

(391) Alguns têm sido agregados até a colôniasmilitares, como v. g. na do Urucu; o índios têmsido fardados e armados para defesa das aldeias.

239

(392) De se ordenarem índios, que tivessemvocação para o estado sacerdotal, poderia virgrande vantagem para por meio deles se obtermais facilmente a redução e civilização dosselvagens.

(393) V. g. no rio Madeira (Diário Oficial de 29 deDezembro de 1864).

(394) V. Cartas Jesuíticas; — Gabriel Soares; —Gandavo; — Jaboatão; — Padre João Daniel; —Alex. Rodrigues Ferreira; — Lery; — Varnhagen;— J. F. Lisboa; — Magalhães; — A. GonçalvesDias; — Cônego Fernandes Pinheiro; e outrosdistintos Brasileiros e estrangeiros.

(395) Timon III contra a Hist. Ger.

(396) D. Antônio Filipe Camarão nos — Ensaiosbiográficos — dto Dr. Moreira de Azevedo. — V.também D. Clara Felipa Camarão (mulher domesmo) por J. N. de Souza e Silva na Rev. doInst. X, 387.

(397) Dr. Furtado — Repert.

(398) Pereira da Silva — Fundação do Império.

(399) Diário Oficial de 23 de Outubro de 1866;Ofício do Presidente de Goiás em 6 de Outubrode 1866 no Diário Oficial de 21 de Novembro.

240

(400) Varnhagen na Hist. Ger. do Brasil.

(401) Como ainda não há muito foi declarado noAv. 68 de 9 de Fevereiro de 1863.

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