entrevista feita com o bando vira saia. por flávio ulhôa

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Entrevista realizada por Flávio Ulhôa com o bando Vira Saia para a concepção de sua monografia de final de curso na UFOP (MG), em que discute sobre a realidade das bandas independentes mineiras. Salvador (BA) / Ouro Preto (MG) 2013. Música. Pesquisa. Indústria fonográfica. Música e Internet. Produção. Criação.

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Page 1: Entrevista feita com o bando Vira Saia. Por Flávio Ulhôa

Entrevista realizada por Flávio Ulhôa com o bando Vira Saia para a concepção de sua

monografia de final de curso na UFOP (MG), em que discute sobre a realidade das bandas

independentes mineiras.

Salvador (BA) / Ouro Preto (MG)

2013.

Música. Pesquisa. Indústria fonográfica. Música e Internet. Produção. Criação.

Flávio: Pude perceber que há um trabalho de pesquisa musical por parte do grupo, que busca

resgatar o que há de mais rico na cultura regional de Minas Gerais. Como é feita essa pesquisa?

qual a relação do grupo com as festas regionais do interior de Minas? Quais dessas festas vocês

destacariam? qual a relação do grupo com o folclore mineiro?

Mo: Olha só: a pesquisa que fazemos em relação à música popular brasileira não se limita

apenas à música mineira, ela é muito mais abrangente. Nossa pesquisa atualmente está focada

nas manifestações musicais, folclóricas e culturais afro-ameríndias brasileira. Estamos fazendo

uma investigação que vai além das fronteiras de Minas, buscamos analisar as origens (que vêm

desde a África, Europa, chegam ao Brasil pelas cidades portuárias e se encontram com as

tradições indígenas), as transformações advindas dessa mistura, seu desenvolvimento com o

passar do tempo e suas possibilidades de mistura e evolução (isso já entra na parte de criação

ou re-criação, quando nos apropriamos dessas manifestações musicais e elas se fusionam com

nossas composições.)

Quanto à música mineira e todo seu universo, com certeza, é algo que lidamos com muito

respeito. Tuca, por exemplo, desenvolveu um trabalho muito bacana de resgates de calangos

na região interiorana chamada “Palmital”, de onde vem sua família. É uma região quase

“selvagem” ainda, com costumes antigos, preservados, festas populares, sobretudo religiosas,

onde, com certeza a questão da “oralidade” é super importante para a perpetuação da tradição

Page 2: Entrevista feita com o bando Vira Saia. Por Flávio Ulhôa

musical/cultural. O que ele fez foi registrar o canto de pessoas da região com um pequeno

gravador.

Também trabalhou em um projeto bacana com Ian Guest, um projeto que começou quando

foram encontradas partituras antigas em um casarão em Monsenhor Horta, em 2006. Partituras

de criações musicais assinadas por músicos do vilarejo. As partituras foram encontradas no

meio de escombros antigos e lixo. Então um grupo de estudantes de histórias do ICHS foi até o

local, higienizou as partituras, levou-as para Mariana. Ian teve acesso a esses documentos e os

transcreveu, criando harmonias modernas para as músicas. Então, com Tuca e outros músicos

fez uma série de apresentações de algumas das músicas encontradas.

Em 2009 fiz com uma amiga italiana um documentário que trata justamente dessa questão da

música de Ouro Preto e Mariana (comé que eu faço pra aprender a música da sua terra) e

coletamos tanto material que não demos conta de usar tudo o que registramos.......

Tuca: Tocamos congado, folia, canções de roda e ciranda na grande maioria coletadas nas

andanças pelos distritos, subdistritos e rocas pelas redondezas do caminho do ouro. Bacalhau,

Vargem, Palmital, Engenho D’água, Ribeirão do Carmo, Lavras Nova, onde participamos das

festas, e em alguns casos sendo festas dentro da comunidade das nossas famílias, ajudando na

condução da festa por tradição familiar mesmo. Existe a festa de 3 de maio no Palmital, distrito

de Mariana onde o ha o esquema de festeiros onde participo com minha família que e a festa

do cruzeiro e da bandeira do santo divino que já existe há mais de cem anos.

Flávio: Há uma grande influência Afro na música de vocês. Vocês vivem de fato essa cultura, no

sentido de participar de cultos, organizações ou alguma religião dessa cultura?

Déi: A cultura afro é de modo geral tradicionalmente oral e viva, então vejo que é de perto que

artistas e músicos se abastecem, n vejo como entrar no mar sem se molhar, como se

influenciar sem vivenciar.

Tuca: Sim, cada um da sua maneira... mas reconhecemos que dentre as variadas raízes que

compõe o que e a música brasileira passada e atual a África foi a grande mãe, cedendo seu

peito cheio de raízes e forca representada principalmente pelos tambores e culinária que

trouxeram os africanos. No vira saia tentamos mostrar o que todos sabem que existe mas

dificilmente se conhece que e a identidade do brasileiro que vem dos povos nativos (do índio) e

do africano. Reforçar essa cultura indenitária e regrar com boa música e demais artes

envolvidas....

Mo: Pra mim essa pergunta é um pouco descolocada.................... viver a dita “cultura afro”

não implica em, obrigatoriamente, participar de religiões, cultos, organizações, na minha

opinião.

Todos nós, brasileiros, mesmo que inconscientemente, vivemos dentro de um Brasil com

imensas influências afro..... e afro, de africana, de vários países da África (já que os escravos

que vieram para o Brasil, vieram de diferentes partes da África....). Mesmo sem saber, falamos

um português africanizado (mais de 8.000 vocábulos que usamos no Brasil têm raízes

africanas), nossa comida é totalmente influenciada pela culinária afro, nossa música, então,

nem se fala, nosso jeito de dançar, nosso jeito de falar, até nosso jeito de andar...

Então isso é uma coisa, até mesmo o mais branco brasileiro vive a cultura afro... não tem como

escapar......

No caso do vira saia, posso dizer que, além de vivermos essa cultura naturalmente (por sermos

brasileiros), nós temos consciência disso e sim, vamos a batucadas, terreiros de candomblé

(sendo que, quanto a acreditar ou não na religião, cada indivíduo do grupo tem suas próprias

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crenças e deve responder por si....), vamos aos congados, aos candombes, buscamos esses

resquícios tão presentes de africanidade no Brasil conscientemente. Aqui em salvador essa

História já está bem mais digerida pela sociedade. Os negros têm bastante consciência de seu

valor, buscam reencontrar-se e reconectar-se com sua ancestralidade, com sua origem, origem

de seu povo, saber de sua história, entender sua história... claro que não se pode generalizar,

muita gente ainda vive com preconceitos e feridas mal cicatrizadas. Em Ouro Preto e Mariana

estamos carecas de saber da importância que o negro teve e tem na construção social. Mas os

negros vivem acuados.... as negras alisam seus cabelos, os terreiros de umbanda e candomblé

ainda são vistos como “coisa do capeta”, sendo que a senhora que vai à Igreja, quando tem

algum problema assim vai correndo na benzedeira. Mas a pressão que a Igreja Católica exerceu

sobre a sociedade mineira foi muito pesada. Pra mim, foi massacrante! Na nossa região, os

índios, coitados, foram completamente disseminados. E os negros (entre os que não morreram

dentro das minas e os que fugiram para os quilombos) foram calados e se acostumaram a ficar

calados! Aí entra, por exemplo, a importância que uma figura como chico rei teve na nossa

história pra sacudir o negro, pra que os congados não se calem. Esse se tornou um ícone, né?

Aí vem o sincretismo, que transforma Yemanjá em Nossa Senhora para que os negros possam

rezar em paz e sem medo para seus orixás. Mas é melhor não começar a falar muito de

questões religiosas........

Flávio: Ao eleger as músicas do repertório da banda há algum critério especial quanto a melodia

ou a letra? Quais principais temas que tratam as letras elegidas e compostas pelo Vira Saia?

Déi: Assim, eu sou da Cidade Baixa em Salvador um local com manifestações muito marcadas

como a Segunda Gorda da Ribeira e a Lavagem do Bonfim essas coisas povoam minha cabeça

desde sempre e há grande musicalidade nessas festas não apenas sonora mas no jeito das

pessoas, no sincretismo todo, os capoeiras, as baianas, as carroças enfeitadas de fitinha, o

cozido (que é um prato com legumes e carne)... então as letras quanto as melodias trazem de

certa forma esse universo que já é musical só falta mesmo pormos no tom.

Tuca: Transitamos entre a música tonal e modal. Músicas de transe e de gozo mesmo...de

saber pra onde requebrar a cintura e o momento de arrepiar os cabelos. Gostamos dessa coisa

de mexer com o corpo, a mente e aquela sensação quando parece que você sai do chão sem

sair do lugar. A música levando pra lugares desconhecidos dentro da pessoas e que faz pensar.

Mo: Nossa! A questão do repertório sempre dá pano pra manga!!!! KKKKkkkk Temos em nosso

repertório mais de 400 músicas! Acho que até hoje nunca fizemos duas apresentações com o

mesmo repertório!

Pra escolha das músicas sempre pensamos no lugar e na proposta da apresentação, antes de

tudo... A partir daí, pensamos nas músicas que têm mais a ver e fazemos blocos de ritmos e de

estilos. Agora estamos trabalhando bastante com esses blocos rítmicos... Então vamos fazendo

a conexão entre as músicas, às vezes criando um enredo entre as letras, fazendo uma trilha

musical... A temática “afro” é sempre constante, mas não nos prendemos nem limitamos nosso

trabalho a esse tema. A questão religiosa vem sempre, também, mas sempre causa conversa

depois, já que as músicas chamadas “pontos” não devem ser tocadas em qualquer lugar...

Hoje estamos também dando prioridade às nossas músicas autorais, por mais que não sejam

conhecidas... Estamos cada vez mais incorporando nossas criações às apresentações e o

resultado vem sendo positivo... a gente consegue perceber o que nossas canções geram no

público.

Flávio: Vocês agora estão produzindo na Bahia. Por que esse deslocamento?

Tuca: Já estamos nos aprofundando na cultura ameríndia há um tempo. Ficar e vivenciar isso

na Bahia já fazia parte dos planos. Eu estou tentando mestrado em antropologia cultural em

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Salvador e Mo se aprofundando em dança afro e jogamos capoeira, frequentamos as rodas de

samba e diversos eventos. Já no Vira tocamos jongo, cateretê, samba de roda, samba xula,

cacuriá, catira e vários outros ritmos não tano conhecidos para o dito grande público, as vezes

chamados de massa. Esperamos estar trazendo novos temperos pra esse imenso bolo chamado

música popular.

Mo: A primeira razão dessa mudança foi justamente dar suporte à nossa pesquisa referente às

manifestações musicais e artísticas afro-ameríndias brasileiras. A Bahia é de uma profunda

riqueza dessas manifestações, que até os dias de hoje se mantêm ativas. É um berço de

tesouros culturais, a Bahia. Aqui as manifestações se mantiveram ainda em nível folclórico. O

samba, por exemplo, dizem que nasceu aqui, no interior de Cachoeira e Santo Amaro, nas

plantações de cana-de-açúcar. O Samba de roda. Depois é que os baianos o levaram para o Rio

de Janeiro, onde tomou caráter mais espetaculoso e cosmopolita. Mas a raíz de tudo está aqui.

Em muitos sentidos parece que a Bahia está parada no tempo, no bom sentido da coisa. Os

baianos também são excepcionais compositores, escritores, dançarinos. São mestres. Em

Salvador temos a oportunidade de desfrutar de muita arte, de oficinas, de muita cultura, e, se

procurarmos bem, gratuitamente! Então essa estância aqui está rendendo ótimos frutos ao Vira

Saia e a cada um de nós, individualmente. As parcerias com os compositores, por exemplo,

gerou um novo disco, com poesia riquíssimo e muito swing. Agora o processo está em

andamento e estamos tentando viabilizar a gravação dessas músicas com qualidade

profissional, com músicos de qualidade. Acho que estamos nesse ponto: ou vai ou racha! Um

período de ideias, projetos, buscas.

Saímos de Minas porque não dava mais para ficar só ali, onde estávamos. Precisávamos

expandir nossos horizontes pessoais e profissionais. Claro que não foi fácil vir pra cá, começar

uma vida do zero, nosso grupo não era conhecido por ninguém e pouco a pouco estamos

desenvolvendo um trabalho, priorizando cada vez mais por sua qualidade, abrindo mão de tocar

em qualquer lugar, como foi no ano passado. Esse ano estamos mais cautelosos, mas

interiorizados, já que almejamos por coisas maiores...

Flávio: Qual a diferença no cenário da música independente e alternativa da Bahia e de Minas?

Tuca: Posso só te antecipar pelo pouco tempo e que em salvador a poesia está mais viva em

todos os cantos e lugares. Dentro do ônibus, balsas, pelas ruas e sua cidade em geral. Isso e

claro ajuda pra encontrar ótimos letristas. Já em Minas pela tardia escola barroca a riqueza

melódica é fenomenal. Não é à toa que existem músicas com melodias lindas como as

composições do Milton Nascimento, Beto Guedes, Toninho Horta em contraponto com a

sofisticação rítmica de um Gabi Guedes (Orquestra Rumpilezz), Carlinhos Brown, etc. E o ritmo

x melodia!

Mo: Antes de mais nada, existe uma diferença primordial da nossa realidade baiana e mineira

que é: aqui vivemos na capital do estado, e em Minas estamos no interior, apesar de que Ouro

Preto e Mariana fazem parte do grande eixo artístico e cultural de Minas.

São cenários por si só bastante diferentes, cada um com suas particularidades, claro, benefícios

e malefícios, no que diz respeito ao crescimento do grupo.

Salvador é uma grande cidade nordestina. Diferenças gritantes entre ricos e pobres, muito lixo

por todas as partes, miséria urbana, etc. Um porto, por onde, historicamente, já circularam

muitas pessoas de todas as partes do mundo. A circulação de cultura por aqui é enorme, a

quantidade de programação cultural gratuita, é impressionante... Ano passado vivíamos no

Pelourinho, e pudemos vivenciar de perto esse frenesí artístico que rola por lá: atrações

incríveis por R$5,00, R$1,00 ou gratuitas... vários editais de cultura, várias possibilidades. Tudo

isso vimos e vivenciamos também o outro lado: o lado do músico que não é conhecido, o lado

do músico que ganha R$5,00 pra tocar a noite inteira... (quando a coisa é gratuita, o público

adora, mas na hora de pagar, ui!) Então percebemos que se não começássemos a nos articular

Page 5: Entrevista feita com o bando Vira Saia. Por Flávio Ulhôa

burocraticamente falando, ou seja, correr atrás de editais do governo, da prefeitura, de festivais

etc., seria difícil crescer apenas tocando em barzinhos...

Participamos de várias iniciativas artísticas, pois morávamos no miolo da cultura da Bahia:

rodeados de artistas antigos, puta talentosos, mas todos pobres aos 70 anos... e foi

maravilhoso conhecer o universo dessas pessoas, ter contato com elas, participar de seus

eventos, mas não podíamos parar por ali... Então esse ano nos mudamos pro outro lado da

cidade, atualmente moramos em uma antiga comunidade de pescadores que está ao lado do

Rio Vermelho, que é um dos centros culturais promissores da cidade. Ou seja: ainda vivemos

em um gueto, mas rodeado de “riqueza” material – pessoas com mais alcance financeiro.

Então, ao que tudo indica, vamos correr atrás para que o trabalho possa evoluir em vários

sentidos. E, claro, ainda estamos super conectados com os artistas do Pelourinho, com certeza

os mais autênticos daqui, mas que, infelizmente, não se unem. Grandes artistas, cada um

encarcerado em sua própria bolha.... Então esse ano creio que vamos experienciar uma outra

Salvador... e o Vira Saia vai se mover de maneira diferente, também.... é como se o grupo já

estivesse tomando vida própria! Sinto que ainda está por vir essa explosão aqui em Salvador...

que o terreno ainda é desconhecido...

Ao mesmo tempo, em Mariana e Ouro Preto, a cena independente está cada vez mais

organizada. O trabalho desenvolvido por Coletivos está fazendo toda a diferença para a

evolução da realidade artística local. E acho que isso, ao vir pra cá, não me sinto presa a

Salvador, ao contrário, estamos cada vez mais conectados a Minas, mas ao mesmo tempo, ao

mundo todo... São essas redes artísticas que perpassam as fronteiras físicas, são essas redes

que vão salvar os músicos, os artistas de nossa época, elas servem pra promover essa conexão

entre artistas independentes, ou seja, interdependentes, porque acredito que, o artista

totalmente “independente” está fadado ao fracasso, porque é justamente essa

interdependência na independência que vai gerar a conexão, que por sua vez vai gerar a

evolução desses artistas...

Enfim, eu já sabia disso, mas apenas atualmente estou me dando conta do que é o Vira Saia

verdadeiramente, e o Vira Saia é muito mais do que apenas um grupo musical: é um coletivo

de artes e artistas, mas sem dizê-lo ou admiti-lo. A maioria do público conhece apenas nosso

trabalho musical, mas temos trabalhos independentes significativos na área da música, da

literatura, do vídeo, da arte-educação. E acho que isso é importante: manter esses trabalhos,

não importando onde estamos, continuar gerando essas conexões entre os artistas e as

comunidades ao nosso redor, para que

Flávio: Qual o grande desafio de ir contra tudo o que impõe as grandes gravadoras

musicalmente falando?

Tuca: Hoje o mercado fonográfico está mais acessível a qualquer musico muito mais que

qualquer outro período na história. Funciona como a descoberta da formula da soda...todos

sabem mas só os melhores e mais bem preparados e que sobressaem e viram uma Coca Cola

ou um droga pesada...

Mo: Acho que o principal é: não sei mais qual o papel das gravadoras tradicionais no contexto

do mercado fonográfico mundial, na atualidade. E creio que nem elas próprias sabem mais de

seu próprio papel.

Mas aí eu te faço uma pergunta: quais são as imposições das grandes gravadoras???

Flávio: A internet tem papel determinante, hoje, na divulgação do grupo? ela é o principal meio

de divulgação?

Page 6: Entrevista feita com o bando Vira Saia. Por Flávio Ulhôa

Tuca: Sim ela e o meio mais próximo de modelo democrático de divulgação de informação ou

qualquer tipo de propaganda para alcançar multidões pelo menos de internautas. Salve a santa

net.

Mo: Com certeza a internet tem um papel fundamental na divulgação de nosso trabalho, e

acho que é uma realidade global, a realidade de muitas bandas.

Inclusive tenho a consciência de que ainda não usamos nem 10% dessa ferramenta e todas as

suas possibilidades... Tenho amigos na Europa, por exemplo, que já financiaram discos

independentes através da ajuda de programas que existem por lá, que te contactam a

“mecenas” virtuais, que dão dinheiro para bancar seu projeto...

Inclusive o papel da internet para a cena musical mundial vem transformando o papel das

grandes gravadoras e sua relação com artistas e público no geral. O fenômeno download, mp3,

tudo isso ainda é tão “novo” de certa maneira, ainda não se sabe no que isso vai dar... Outro

dia mesmo eu li que a Trama Virtual (“maior plataforma de música independente virtual no

Brasil”) fechou. Fechou. E o Bôscoli, empresário, músico, um dos donos do espaço alegou que o

fim do site é “consequência da mudança do cenário musical na internet”. Ou seja: o espaço

existia há dez anos, e foi esse o tempo das grandes e rápidas transformações da internet na

vida do cenário musical. Furacões, tendências, a pós-modernidade fazendo tudo voar pelos

ares. Virtuais.

Tem gente que fala que quem faz música eletrônica não é músico, é designer de som; com os

programas de computador que existem hoje, qualquer pessoa pode “construir” sua música,

brincando... e depois, pode sim, postar na internet, qualquer um pode ter um perfil no

Myspace, no Soundcloud, nisso ou naquilo... Qual o valor do produto “CD”, do produto “livro”

hoje em dia? Todos esses objetos estão sofrendo uma ressignificação... o mundo virtual está

devorando a realidade, de certa maneira... E um produto físico como um “CD” passa a ter um

valor mais simbólico do que prático. Por exemplo: quando vendemos um “CD” do Vira Saia, as

pessoas pagam R$10,00 por um cd copiado em casa, com uma capa xerocada, com um estojo

de plástico.... sendo que ali na esquina ela pode comprar um cd pirata do Roberto Carlos (que é

um artista de renome nacional) por R$5,00. Ou seja: quando compra um cd do Vira Saia, o

comprador não está pagando pelo valor físico do produto CD, ele está pagando por um objeto

com uma áurea artística, como um pão artesanal... está pagando por todo o processo pelo qual

passou aquele objeto: sua gravação independente, sua concepção independente e seu

potencial e singularidade...

Flavio: Vocês creem que é possível e esperam um dia fazer sucesso nacional?

Déi:: “A felicidade é minha voz microfonada

No alto-falante dos vendedores da lapa

Um, dois, três testando o som que eu vou gravar

Felicidade para a rádio que tocar”

Eu faço músicas para fazer sucesso nacional. Quiçá mundial, a net ta ai.