entrevista a andreas mörschel

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20 Entrevista Traço

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Entrevista a Andreas Mörschel sobre o seu percurso em Portugal e o facto de ter escolhido a capital lusa para se instalar pessoal e profissionalmente.

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“Juntamos dois ou três gabinetes e criamos um pool de conhecimentoe uma capacidade de resposta muito superior à nossa, mantendo a

nossa estrutura na mesma pequena e flexível. Somos grandes quando

é preciso ser”Texto: Ana Rita Sevilha | Fotos: João Reis e D.R.

AndreasMörschel

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“Podemos dizer que o mundo da arquitectura na Alemanha ou em França é mais exigente do que em Portugal no que

toca a realização dos projectos.”

FAndreas Mörschel chegou a Portu-gal em 1999, com intenção de tra-

balhar durante um ano ou dois e depoisregressar a Alemanha, actualmente já soma14. A Traço foi ao encontro deste alemãoformado em Estugarda, na Technische Uni-versität, e na Faculdade de ArquitecturaUniversidade do Porto (FAUP), mas se-deado bem no centro de Lisboa, na Avenidada Liberdade.

“Quando me mudei, era para ficarum ano ou dois”Depois da formação em Estugarda e de umestágio em Hamburgo, Andreas Mörscheldecidiu dedicar um ano a fazer Estudos In-ternacionais. Foi nesse âmbito que acaboupor passar pela Faculdade de Arquitecturada Universidade do Porto (FAUP), em 1995,onde ficou um ano. “Estudei com o ÁlvaroRocha e o José Gigante, e depois em 1996voltei para a Alemanha”, explicou à Traço.Como recordação deste tempo ficou-lheuma experiência agradável e positiva. “Fizmuitos amigos no Porto e durante os anosseguintes fui mantendo sempre o contactoe uma relação de amizade com muitas pes-soas. Achei os portugueses acolhedores ehospitaleiros. Foi de facto uma experiênciafantástica e divertida”. Corria o ano de1999 quando Andreas estava a trabalhar emBerlim, onde, explica, “na altura não haviaassim tanto trabalho”. “Tinham passadodez anos da queda do muro e existia umapequena bolha imobiliária. Não havia pro-jectos nem trabalho e eu decidi fazer umavisita a Portugal para rever uns amigos ever se nessas férias arranjava um trabalho.Arranjei trabalho no terceiro dia e mudei-me em Janeiro de 1999 para o Porto.

No PortoDepois de ter estudado na FAUP duranteum ano, integrou o gabinete do arquitectoPedro Balonas, e ainda tirou uma Pós-Gra-duação em Gestão de Construção e Imobi-liária. Em 2004 chegou um convite aoatelier de Pedro Balonas, por parte da Joséde Mello Saúde, para os concursos das Par-cerias Público Privadas (PPP) dos Hospi-tais, que o Governo na altura estava alançar. “Mudei-me para Lisboa, formámosum novo gabinete, a BMM - Balonas, Me-nano & Mörschel e ganhámos dois dos con-cursos, o Hospital de Braga e o Hospital de

Vila Franca de Xira”. Contudo em 2009 che-gou à conclusão que o futuro passava porum gabinete em nome individual e assimnasceu a Mörschel Arquitectos situado naAvenida da Liberdade. Um atelier de arqui-tectura luso-germânico integrado numarede internacional de um grupo alargado dearquitectos, designers e engenheiros.

“É fundamental um maior inte-resse dos media nos concursos pú-blicos”Andreas, que nunca exerceu na Alemanhapor conta própria, vai lá com frequência, esabe da realidade da profissão através dosseus contactos profissionais e amigos. ÀTraço revelou as principais diferenças entrea realidade alemã e a portuguesa. “Podemosdizer que o mundo da arquitectura na Ale-manha ou em França é mais exigente doque em Portugal no que toca a realizaçãodos projectos. A maior diferença está na fasedo projecto de execução, na preparação docaderno de encargos, nos mapas de quanti-dades, que são mais exigentes e depoisclaro, na coordenação e controlo da obraque fica a cargo do arquitecto.” Como re-sultado os honorários são superiores, mastambém as responsabilidades. Para alémdisso, Andreas Mörschel revela que na Ale-manha a arquitectura “é exercida numaforma muito profissional e tem outro esta-tuto na sociedade. O arquitecto e a arqui-tectura são mais reconhecidos”. Andreasexplica ainda que projectos públicos e nãosó, são objecto de concursos, com júris in-dependentes de especialidade, mais trans-parentes e os critérios não são tãoburocráticos como cá. O concurso de arqui-tectura é uma forma de promover não só aboa qualidade arquitectónica mas tambémpermite ao poder político autopromover-secom exposições e publicações de projectosde qualidade em vez de escolher projectosde forma menos clara. Em Portugal, sãoraros os casos em que as várias soluções ar-quitectónicas resultado de um concurso, sãoapresentadas e publicadas e em que o júri“defende” a sua escolha. “Deverá haver ummaior interesse dos media especializados,mas também da comunicação social, jor-nais, revistas pelos concursos, os resultadose a qualidade dos projectos. Seria uma coisafundamental”, sublinha. Andreas lamenta ofacto de em Portugal não existir uma cul-

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tura de concursos. “Não percebo porquenão existe”, refere “e não deve ser por faltade oportunidades. As escolas da parque es-colar por exemplo deviam ter sidos todaslançadas por concurso público, para evitaralguns dos desastres cometidos.”

“A arquitectura portuguesa tem bom nome na praça”Para Andreas Mörschel, a arquitectura por-tuguesa “tem bom nome na praça. Bastapensar que só Pritzkers há dois”. Mas não ésó isso. Segundo o mesmo “os arquitectosportugueses têm uma boa formação, existe

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os alemães fazem-no, mas quem é muitobom em exportar arquitectura são os ingle-ses” refere. “São bem organizados tem for-tes representações corporativas, tem edominam uma legislação abrangente quetambém é fácil de exportar (é em inglês). Oproblema deles é que os ateliês têm custosaltos e assim os honorários tem de ser ele-vados. Também a arquitectura deles é cara.A arquitectura portuguesa não é cara, nemas soluções construtivas. O nosso problemaé que lutamos todos sozinhos, enquanto osingleses não, devíamos aprender”.

Atelier em Lisboa, mas trabalho láfora“Em termos de encomenda fiz e faço muitotrabalho lá fora”. Colocando em percenta-gem, Andreas revela à Traço que 80% doseu trabalho é realizado fora de Portugal.“Acho que a minha geração foi a pioneirano aproveitamento verdadeiro do programaErasmus na Europa. O resultado é quetemos uma vasta rede de contactos criadonos tempos da faculdade e encontramos-nos hoje em dia espalhados pela Europafora, Madrid, Paris, Toulouse, Londres, Co-lónia, Munique, Lisboa, etc. Estas ligaçõesinternacionais são muito interessantestanto ao nível da cooperação como na sim-ples troca de informações. Estamos hoje emdia a aproveitar muito esta rede. A coope-ração internacional é para nós cada vezmais importante, existem imensas siner-gias”. O arquitecto revela ainda que no ate-lier têm tido “cooperações pontuais emprojectos específicos. Juntamos dois ou trêsgabinetes e criamos um pool de conheci-mento e uma capacidade de resposta muitosuperior à nossa, mantendo a nossa estru-tura na mesma pequena e flexível. Somosgrandes quando é preciso ser. Trabalhamosem equipa, partilhamos know-how, riscos,custos e obviamente também os lucros.Temos tido bons resultados com esta estra-tégia”. Andreas revela que a Líbia foi ummercado interessante, mas a revolução ob-rigou-o a “congelar” os projectos que estavaa desenvolver, no entanto mantém contactocom as pessoas de lá e conta voltar aindaeste ano. Neste momento, o atelier acaboude entregar dois projectos em França – umterminal da Audi e um concurso por con-vite para um edifício de uma Faculdade,ambos os projectos desenvolvidos em par-ceria com um atelier em Paris. Diz que tra-balha mais lá fora porque gosta. Tambémdesenvolve trabalhos em Portugal como porexemplo a reconstrução / remodelação deum edifício de gaveto na Rua Augusta emLisboa por um fundo de investimento ouduas moradias particulares na Comporta.

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aqui muita capacidade. Pode não ser a me-lhor de todas, mas não é nada má. Nuncatrabalhei com pessoas pouco qualificadas.Acho que em geral são muito motivados etanto os projectos como a linguagem arqui-tectónica própria desenvolvidas são bas-tante interessantes”. No entanto, a leiturade um alemão a exercer em Portugal é a deque “essa capacidade é pouco aproveitadatanto cá dentro como lá fora, porque cádentro é pouco reconhecido e lá fora amaioria dos portugueses foca-se muito nospaíses onde dominam a língua, como An-gola, Moçambique, Brasil. E assim ficam

logo com um mercado mais limitado”.Acrescenta que os gabinetes portuguesessão pequenos, quando comparados com aescala internacional. Na Alemanha, gabine-tes muito profissionais com mais de 100 co-laboradores não são uma excepção. Osmaiores gabinetes contam com 300 ou 400colaboradores. Em Estugarda, uma cidadecom cerca 500.000 habitantes no sudoesteda Alemanha, existem pelo menos dez ga-binetes que têm mais de oitenta arquitectosa trabalhar. “Size matters no mercado inter-nacional”. “A arquitectura portuguesa podeser uma oportunidade, pode ser exportada,

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IntroduçãoO sector Bab al Madina é um dos sete maiores projectos urbanísticos, que integram o Masterplan de Tripoli.Localizado na parte Sudeste da cidade, está conectado a outros dois grandes projectos de escala urbana, o “Al Jumhuriyah street-development project”, e o “Tri-poli-Greenbelt”.A extensão de 1,7km entre o primeiro anel viário da cidade e a rua "AlJumhuriya"; é uma das principais portas da cidade e a principal entrada para o centro dacidade a partir de Sudeste.O desenvolvimento deste vazio industrial num animado pedaço de cidade, pretende ser motor do desenvolvimento de bairros vizinhos, cosendo o tecido urbanoexistente ligando Este com Oeste, e contendo um programa misto, de habitação, serviços e equipamentos, tendo em conta o que já existe nas proximidades ecolmatando as lacunas locais.

Contexto Histórico de TripoliTripoli é uma cidade mediterrânea, com um património urbano e arquitectónico notável.A Cidade antiga, a Medina, é organizada de acordo com uma métrica de ruas ortogonais, herdadas das antigas rotas romanas. O distrito Otomano / Italiano estásituado entre a Praça Verde e a Praça da Argélia. O período Italiano dotou a cidade de um grande património arquitectónico, tal como palácios, mesquitas, 'ga-lerias', residências, e edifícios residenciaisO cenário urbano de Tripoli é caracterizado pela preservação dessas áreas e pela diversidade dos seus distritos, mantendo um carácter peculiar relacionado comas várias tipologias de malhas urbanas.

Contexto Histórico de Bab Al MadinaBab al Madina é uma das históricas entradas na cidade.A antiga muralha da cidade, onde é hoje a rua 'Tariq al Jala' ou 'Wall Street', cruza o sector Bab al Madina a Sul. A extinta linha ferroviária, que data do períodoitaliano, servia um importante lugar de produção das indústrias da Lancia, que se encontravam no sector Bab al Madina antes de chegar à estação central de "ShariumNasr". Esta longa área industrial fragmentou a malha urbana por um longo período de tempo, o seu enorme potencial manteve-se suspenso até à actualidade.

Diagnóstico & ObjectivosPara a integração desta parte da cidade no seu contexto urbano, social e económico, no espaço e no tempo, é necessário que haja uma compreensão profundada cidadania de Tripoli, da sua sociedade e da sua cultura.Três questões principais foram analisadas no contexto socioeconómico de forma geral, de forma a compreender a estrutura da cidade de Tripoli:• Os vazios urbanos com suas redes hierárquicas, infra-estruturas,e fluxos de tráfego.• O edificado, com os seus elementos históricos, morfologia urbana, as tipologias da malha urbana, programas, cérceas e as relações entre espaço público e privado.• O espaço verde como suporte para a cidadania, para melhorias climáticas e de identidade.

Os Vazios UrbanosO sector de Bab al Madina é fragmentado por infra-estruturas rodoviárias que criam enormes pedaços de cidade sem qualquer continuidade ou qualidade ur-bana. A eliminação destas barreiras e uma reorganização geral ao nível da rua, proporcionará continuidade e qualidade, que por sua vez irá também definir umanova identidade como porta da cidade.Uma nova estratégia de tráfego urbano vai permitir estabelecer as ligações Este-Oeste e revitalizar as zonas degradadas circundantes, para que tenham umaevolução económica / social positiva. O impacto da mobilidade individual para o centro da cidade é enorme e prevê-se que aumente nos próximos anos. Umanova abordagem à rede de transportes públicos vai ajudar a prevenir o aumento de quantidade de carros e permitir a humanização de grande parte dos bairrostípicos para os cidadãos.

O EdificadoNos últimos anos, Tripoli foi um destino-alvo para a população das zonas rurais do país. Este êxodo rural é um fenómeno mundial que está ligado, neste caso, auma melhoria da qualidade de vida em Trípoli. A recente produção da maioria das habitações e residências parecem não estar adaptadas nem às exigências davida doméstica Líbia, nem ao clima local.Assim o desenho urbano desenvolve uma morfologia urbana bastante densa como princípio, e consequentemente o ambiente das ruas será mais fresco, eassim mais propício a ruas animadas, e ao comércio e serviços virados para a rua; por outro lado a densidade permite uma vivência de bairro mais acentuada,fortalecendo a cultura local e abrindo o empreendimento ao exterior. Para o Bab al Madina foram desenvolvidas tipologias de habitação tendo em conta não sóos costumes e tradições locais mas também as novas formas de agregados familiares que vão surgindo cada vez mais, antecipando a evolução social e demo-gráfica. Procurando uma população de cidadãos verdadeiramente diversificada, uma mistura geral; social, étnica e etária, e ainda uma mescla proporcionandooportunidades a vários tipos e tamanhos de serviços, de estruturas comerciais e de equipamentos comunitários, escolas, mesquitas etc. O novo bairro Bab alMadina será a residência e o local de trabalho para milhares de cidadãos, cumprindo com as suas necessidades ao longo do tempo. Flexibilidade e tipologiasmistas permitem a adaptabilidade do projecto no tempo e no espaço. Uma qualidade da vida social equilibrada compreende essa flexibilidade de uso e de va-riação de suas necessidades o que implica um conceito flexível e misto. O projecto Bab al Madina tem a oportunidade de desenvolver novas tipologias de cons-trução e programáticas de modo a manter a atractividade económica, o bem-estar social e o respeito pelo ambiente da região. Um dos objectivos da propostaé que as tipologias sejam desenvolvidas de uma forma dinâmica sobre o contexto Líbio, permitindo que o resultado final seja mais diversificado e ao mesmotempo mais adaptado.Sobre os programas urbanos e tipologias adoptados no Bab al Madina compreende três temas principais:• Programa: Uma mistura de funções. A capital líbia é conhecida por uma vida de rua muito rica com base na sobreposição de usos comerciais e de habitação.

Este princípio será preservado e adaptado permitindo o surgimento de novos programas urbanos.• Flexibilidade: Para uma sociedade em evolução. O agregado familiar Líbio tem grandes amplitudes, desde famílias muito numerosas com três ou mais gera-

ções até casais jovens ou famílias monoparentais, o que significa que a adaptabilidade de espaço a novas exigências é uma necessidade importante. As ti-pologias propostas reflectem essa preocupação e tentam oferecer novas tipologias de habitação para novas demandas e usos económicos A abordagem espacialvai oferecer a oportunidade de ajustar os layouts, tanto quanto possível a diferentes funções e unidades de vida.

• Princípio Bioclimático: Variações sobre as soluções tradicionais. Normalmente, as soluções arquitectónicas locais são moldadas para atender ao clima. Pá-tios, varandas e vegetação, são eficientes elementos arquitectónicos protegem da radiação solar. As tipologias propostas melhorarão o desempenho das so-luções tradicionais de modo a alcançar um sistema sustentável e economicamente adaptado às condições locais.

O projecto integrou a exposição geral de projectos da Nonabia, bienal internacional de arquitectura de São Paulo, que ocorreu no final de 2011.

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