ensino de ciências paraná

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  • GOVERNO DO PARANSECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAO DO PARAN

    DEPARTAMENTO DE EDUCAO BSICA

    DIRETRIZES CURRICULARES DA EDUCAO BSICACINCIAS

    PARAN2008

  • Cincias

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    GOVERNADOR DO ESTADO DO PARANRoberto Requio

    SECRETRIA DE EDUCAO DO ESTADO DO PARANYvelise Freitas de Souza Arco-Verde

    DIRETOR GERALRicardo Fernandes Bezerra

    SUPERINTENDENTE DA EDUCAOAlayde Maria Pinto Digiovanni

    CHEFE DO DEPARTAMENTO DE EDUCAO BSICAMary Lane Hutner

    COORDENAO DAS DIRETRIZES CURRICULARES ESTADUAISMaria Eneida Fantin

    EQUIPE TCNICO PEDAGGICA DA DISCIPLINA DE CINCIASDanislei BertoniEveraldo dos SantosMarcos RochaRonival Jos TononTnia Mara Cabral

    LEITORES CRTICOS DA DISCIPLINA DE CINCIASSandro Aparecido dos Santos UNICENTRO Campus GuarapuavaJulio Murilo Trevas UNICENTRO Campus GuarapuavaCarlos Eduardo Stange UNICENTRO Campus Guarapuava

    LEITORES CRTICOS DA REA PEDAGGICA EDUCACIONALIria Brzezinski Universidade Catlica de GoisLia Rosenberg Consultora independenteMarcia Angela da Silva Aguiar Universidade Federal de PernambucoSofia Lerche Vieira Universidade Estadual do CearWalter Esteves Garcia Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico

    PROJETO GRFICO E DIAGRAMAOJam3 Comunicao

  • AGRADECIMENTOS

    Agradecemos de modo especial aos professores das escolas que, desde 2003, participaram dos eventos propostos pela Secretaria de Estado da Educao, contribuindo com argumentaes fundamentadas tanto em sua prtica de ensino quanto em suas leituras tericas e fizeram leituras crticas das diversas verses preliminares enviadas s escolas. Destacamos, tambm, o trabalho dos professores dos Ncleos Regionais de Educao e da Secretaria de Estado da Educao que, ao longo desse perodo, coordenaram discusses e sistematizaram os textos em suas diversas verses preliminares, at chegarmos a estas diretrizes curriculares, agora oficialmente publicadas.

  • CARTA DA SECRETRIA DA EDUCAO

    A escola pblica vem sendo replanejada no Estado do Paran nos ltimos anos e isso traz uma luz diferenciada para a prtica pedaggica, sustentada por uma intensa discusso sobre as concepes terico-metodolgicas que organizam o trabalho educativo. Essas reflexes, sobre a ao docente, concretizaram-se na crena do professor como sujeito epistmico e da escola como principal lugar do processo de discusso destas Diretrizes Curriculares que agora so oficialmente publicadas.

    Quando assumimos a gesto governamental, em 2003, com o ento secretrio Mauricio Requio, um olhar para dentro das escolas permitiu identificar a ausncia de reflexo sistematizada sobre a prtica educativa que ali ocorria, e o foco da formao continuada, ento oferecida, fugia da especificidade do trabalho educativo e situava-se em programas motivacionais e de sensibilizao, em sua grande maioria.

    Tais polticas educacionais, estabelecidas no final da dcada de 1990, alteraram a funo da escola ao negligenciar a formao especfica do professor e esvaziar as disciplinas de seus contedos de ensino, de modo que o acesso cultura formal ficou mais limitado, principalmente para as camadas socialmente marginalizadas.

    Contrapondo-nos a esta concepo, salientamos que, para a maioria da populao brasileira, a escola constitui a alternativa concreta de acesso ao saber, entendido como conhecimento socializado e sistematizado na instituio escolar. Sob esta perspectiva de escola pblica, construmos essas Diretrizes Curriculares, por meio de uma metodologia que primou pela discusso coletiva ocorrida, efetivamente, durante os ltimos cinco anos e envolveu todos os professores da rede.

    Com essas Diretrizes e uma formao continuada focada nos aspectos fundamentais do trabalho educativo pretendemos recuperar a funo da escola pblica paranaense que ensinar, dar acesso ao conhecimento, para que todos, especialmente os alunos das classes menos favorecidas, possam ter um projeto de futuro que vislumbre trabalho, cidadania e uma vida digna.

    Yvelise Freitas de Souza Arco-VerdeSecretria de Estado da Educao do Paran

  • Secretaria de Estado da Educao do Paran

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    CARTA DO DEPARTAMENTO DE EDUCAO BSICA

    Voc est recebendo, neste caderno, um texto sobre concepo de currculo para a Educao Bsica e as Diretrizes Curriculares Estaduais (DCE) de sua disciplina.

    Esses textos so frutos de um longo processo de discusso coletiva, ocorrido entre 2004 e 2008, que envolveu os professores da Rede Estadual de Ensino e, agora, se apresentam como fundamento para o trabalho pedaggico na escola.

    Durante os anos de 2004, 2005 e 2006 a Secretaria de Estado da Educao promoveu vrios encontros, simpsios e semanas de estudos pedaggicos para a elaborao dos textos das Diretrizes Curriculares, tanto dos nveis e modalidades de ensino quanto das disciplinas da Educao Bsica. Sua participao nesses eventos e suas contribuies por escrito foram fundamentais para essa construo coletiva.

    Ao longo dos anos de 2007 e 2008 a equipe pedaggica do Departamento de Educao Bsica (DEB) percorreu os 32 Ncleos Regionais de Educao realizando o evento chamado DEB Itinerante que ofereceu, para todos os professores da Rede Estadual de Ensino, dezesseis horas de formao continuada. Em grupos, organizados por disciplina, esses professores puderam, mais uma vez, discutir tanto os fundamentos tericos das DCE quanto os aspectos metodolgicos de sua implementao em sala de aula.

    Ainda em 2007 e 2008, as Diretrizes Curriculares Estaduais passaram por leituras crticas de especialistas nas diversas disciplinas e em histria da educao. Tais leitores, vinculados a diferentes universidades brasileiras, participaram, tambm, de debates presenciais com as equipes disciplinares do DEB, com vistas aos necessrios ajustes finais dos textos.

    Assim, os textos que compem este caderno se apresentam na seguinte ordem e estrutura: o primeiro, sobre a Educao Bsica, inicia com uma breve discusso sobre as formas histricas de organizao curricular, seguida da concepo de currculo proposta nestas diretrizes para a Rede Pblica Estadual, justificada e fundamentada pelos conceitos de conhecimento, contedos escolares, interdisciplinaridade, contextualizao e avaliao.

    O segundo texto refere-se sua disciplina de formao/atuao. Inicia-se com um breve histrico sobre a constituio dessa disciplina como campo do conhecimento e contextualiza os interesses polticos, econmicos e sociais que interferiram na seleo dos saberes e nas prticas de ensino trabalhados na escola bsica. Em seguida, apresenta os fundamentos terico-metodolgicos e os contedos estruturantes que devem organizar o trabalho docente.

  • Cincias

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    Anexo a esse documento, h uma relao de contedos considerados bsicos para as sries do Ensino Fundamental e para o Ensino Mdio. Tais contedos foram sistematizados a partir das discusses realizadas nos encontros descentralizados (DEB-Itinerante) e devero ser ponto de partida para organizao das Propostas Pedaggicas Curriculares das escolas da Rede Estadual de Ensino.

    Assim, com orgulho que disponibilizamos, Rede Pblica Estadual de Educao, o documento das Diretrizes Curriculares Estaduais para a Educao Bsica. Considera-se que os textos esto agora devidamente amadurecidos e, por isso, voc os recebe nesse caderno, oficialmente publicados.

    Nossa expectativa que estas Diretrizes fundamentem o trabalho pedaggico e contribuam de maneira decisiva para o fortalecimento da Educao pblica estadual do Paran.

    Mary Lane HutnerChefe do Departamento de Educao Bsica

  • Secretaria de Estado da Educao do Paran

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  • Cincias

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    SUMRIO

    A EDUCAO BSICA E A OPO PELO CURRCULO DISCIPLINAR

    1 OS SUJEITOS DA EDUCAO BSICA

    2 FUNDAMENTOS TERICOS

    3 DIMENSES DO CONHECIMENTO

    3.1 O CONHECIMENTO E AS DISCIPLINAS CURRICULARES

    3.2 A INTERDISCIPLINARIDADE

    3.3 A CONTEXTUALIZAO SCIO-HISTRICA

    4 AVALIAO

    5 REFERNCIAS

    DIRETRIZES CURRICULARES DA DISCIPLINA DE CINCIAS

    INTRODUO

    1 DIMENSO HISTRICA DA DISCIPLINA

    1.1 SOBRE O OBJETO DE ESTUDO

    1.2 CONSIDERAES ACERCA DO CONCEITO DE CINCIA

    1.3 CONSIDERAES ACERCA DA HISTRIA DA CINCIA

    1.3.1 Estado pr-cientfico

    1.3.2 Estado cientfico

    1.3.3 Estado do novo esprito cientfico

    1.4 O ENSINO DE CINCIAS NO BRASIL

    1.4.1 A disciplina de Cincias no currculo das escolas brasileiras

    2 FUNDAMENTOS TERICO-METODOLGICOS

    2.1 CONSIDERAES A RESPEITO DOS MTODOS CIENTFICOS

    2.2 FORMAO DE CONCEITOS CIENTFICOS NA IDADE ESCOLAR

    2.3 CONHECIMENTO CIENTFICO ESCOLAR

    2.4 APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA NO ENSINO DE CINCIAS

    3 CONTEDOS ESTRUTURANTES

    3.1 ASTRONOMIA

    3.2 MATRIA

    3.3 SISTEMAS BIOLGICOS

    3.4 ENERGIA

    3.5 BIODIVERSIDADE

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    SUMRIO

    4 ENCAMINHAMENTOS METODOLGICOS

    4.1 ASPECTOS ESSENCIAIS PARA O ENSINO DE CINCIAS

    4.1.1 A histria da cincia

    4.1.2 A divulgao cientfica

    4.1.3 As atividades experimentais

    4.2 CONSIDERAES SOBRE OS ELEMENTOS DA PRTICA PEDAGGICA PARA O ENSINO DE CINCIAS

    4.2.1 A Abordagem Problematizadora

    4.2.2 A Relao Contextual

    4.2.3 Relao Interdisciplinar

    4.2.4 Pesquisa

    4.2.5 Leitura cientfica

    4.2.6 Atividade em grupo

    4.2 7 Observao

    4.2.8 Atividade Experimental

    4.2.9 Recursos instrucionais

    4.2.10 Ldico

    5 AVALIAO

    6 REFERNCIAS

    ANEXO: Contedos Bsicos da disciplina de Cincias

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    As etapas histricas do desenvolvimento da humanidade

    no so formas esvaziadas das quais se exalou a vida

    porque a humanidade alcanou formas de desenvolvimento

    superiores, porm, mediante a atividade criativa da

    humanidade, mediante a prxis, elas se vo continuamente

    integrando no presente. O processo de integrao ao

    mesmo tempo crtica e avaliao do passado. O passado

    concentra no presente (e portanto aufgehoben no sentido

    dialtico) cria natureza humana, isto , a substncia que

    inclui tanto a objetividade quanto a subjetividade, tanto as

    relaes materiais e as foras objetivas, quanto a faculdade

    de ver o mundo e de explic-lo por meio dos vrios

    modos de subjetividade cientificamente, artisticamente,

    filosoficamente, poeticamente, etc. (KOSIK, 2002, p. 150).

    A EDUCAO BSICA E A OPO PELO CURRCULO DISCIPLINAR

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    As etapas histricas do desenvolvimento da humanidade

    no so formas esvaziadas das quais se exalou a vida

    porque a humanidade alcanou formas de desenvolvimento

    superiores, porm, mediante a atividade criativa da

    humanidade, mediante a prxis, elas se vo continuamente

    integrando no presente. O processo de integrao ao

    mesmo tempo crtica e avaliao do passado. O passado

    concentra no presente (e portanto aufgehoben no sentido

    dialtico) cria natureza humana, isto , a substncia que

    inclui tanto a objetividade quanto a subjetividade, tanto as

    relaes materiais e as foras objetivas, quanto a faculdade

    de ver o mundo e de explic-lo por meio dos vrios

    modos de subjetividade cientificamente, artisticamente,

    filosoficamente, poeticamente, etc. (KOSIK, 2002, p. 150).

    A EDUCAO BSICA E A OPO PELO CURRCULO DISCIPLINAR

  • Secretaria de Estado da Educao do Paran

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    1 OS SUJEITOS DA EDUCAO BSICA

    A escola pblica brasileira, nas ltimas dcadas, passou a atender um nmero cada vez maior de estudantes oriundos das classes populares. Ao assumir essa funo, que historicamente justifica a existncia da escola pblica, intensificou-se a necessidade de discusses contnuas sobre o papel do ensino bsico no projeto de sociedade que se quer para o pas.

    A depender das polticas pblicas em vigor, o papel da escola define-se de formas muito diferenciadas. Da perspectiva das teorias crticas da educao, as primeiras questes que se apresentam so: Quem so os sujeitos da escola pblica? De onde eles vm? Que referncias sociais e culturais trazem para a escola?

    Um sujeito fruto de seu tempo histrico, das relaes sociais em que est inserido, mas , tambm, um ser singular, que atua no mundo a partir do modo como o compreende e como dele lhe possvel participar.

    Ao definir qual formao se quer proporcionar a esses sujeitos, a escola contribui para determinar o tipo de participao que lhes caber na sociedade. Por isso, as reflexes sobre currculo tm, em sua natureza, um forte carter poltico.

    Nestas diretrizes, prope-se uma reorientao na poltica curricular com o objetivo de construir uma sociedade justa, onde as oportunidades sejam iguais para todos.

    Para isso, os sujeitos da Educao Bsica, crianas, jovens e adultos, em geral oriundos das classes assalariadas, urbanas ou rurais, de diversas regies e com diferentes origens tnicas e culturais (FRIGOTTO, 2004), devem ter acesso ao conhecimento produzido pela humanidade que, na escola, veiculado pelos contedos das disciplinas escolares.

    Assumir um currculo disciplinar significa dar nfase escola como lugar de socializao do conhecimento, pois essa funo da instituio escolar especialmente importante para os estudantes das classes menos favorecidas, que tm nela uma oportunidade, algumas vezes a nica, de acesso ao mundo letrado, do conhecimento cientfico, da reflexo filosfica e do contato com a arte.

    Os contedos disciplinares devem ser tratados, na escola, de modo contextualizado, estabelecendo-se, entre eles, relaes interdisciplinares e colocando sob suspeita tanto a rigidez com que tradicionalmente se apresentam quanto o estatuto de verdade atemporal dado a eles. Desta perspectiva, prope-se que tais conhecimentos contribuam para a crtica s contradies sociais, polticas e econmicas presentes nas estruturas da sociedade contempornea e propiciem compreender a produo cientfica, a reflexo filosfica, a criao artstica, nos contextos em que elas se constituem.

    Essa concepo de escola orienta para uma aprendizagem especfica, colocando em perspectiva o seu aspecto formal e institudo, o qual diz respeito aos conhecimentos historicamente sistematizados e selecionados para compor o currculo escolar.

    Nesse sentido, a escola deve incentivar a prtica pedaggica fundamentada em diferentes metodologias, valorizando concepes de ensino, de aprendizagem (internalizao) e de avaliao que permitam aos professores e estudantes conscientizarem-se da necessidade de ...uma transformao emancipadora. desse modo que uma contraconscincia, estrategicamente concebida como alternativa necessria internalizao dominada colonialmente, poderia realizar sua grandiosa misso educativa (MSZROS, 2007, p. 212).

    Um projeto educativo, nessa direo, precisa atender igualmente aos sujeitos, seja qual for sua condio social e econmica, seu pertencimento tnico e cultural e s possveis necessidades especiais para aprendizagem. Essas caractersticas devem ser tomadas como potencialidades para promover a aprendizagem dos conhecimentos que cabe escola ensinar, para todos.

    2 FUNDAMENTOS TERICOS

    Pensar uma concepo de currculo para a Educao Bsica traz, aos professores do Estado do Paran, uma primeira questo a ser enfrentada. Afinal, o que currculo?

    Sacristn fala de impresses que, tal como imagens, trazem mente o conceito de currculo. Em algumas dessas impresses, a ideia de que o currculo construdo para ter efeitos sobre as pessoas fica reduzida ao seu carter estrutural prescritivo. Nelas, parece no haver destaque para a discusso sobre como se d, historicamente, a seleo do conhecimento, sobre a maneira como esse conhecimento se organiza e se relaciona na estrutura curricular e, consequncia disso, o modo como as pessoas podero compreender o mundo e atuar nele.

    [...] o currculo como conjunto de conhecimentos ou matrias a serem superadas pelo aluno dentro

    de um ciclo nvel educativo ou modalidade de ensino a acepo mais clssica e desenvolvida;

    o currculo como programa de atividades planejadas, devidamente sequencializadas, ordenadas

    metodologicamente tal como se mostram num manual ou num guia do professor; o currculo,

    tambm foi entendido, s vezes, como resultados pretendidos de aprendizagem; o currculo

    como concretizao do plano reprodutor para a escola de determinada sociedade, contendo

    conhecimentos, valores e atitudes; o currculo como experincia recriada nos alunos por meio da

    qual podem desenvolver-se; o currculo como tarefa e habilidade a serem dominadas como o caso

    da formao profissional; o currculo como programa que proporciona contedos e valores para

    que os alunos melhorem a sociedade em relao reconstruo social da mesma (SACRISTAN,

    2000, p. 14).

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    1 OS SUJEITOS DA EDUCAO BSICA

    A escola pblica brasileira, nas ltimas dcadas, passou a atender um nmero cada vez maior de estudantes oriundos das classes populares. Ao assumir essa funo, que historicamente justifica a existncia da escola pblica, intensificou-se a necessidade de discusses contnuas sobre o papel do ensino bsico no projeto de sociedade que se quer para o pas.

    A depender das polticas pblicas em vigor, o papel da escola define-se de formas muito diferenciadas. Da perspectiva das teorias crticas da educao, as primeiras questes que se apresentam so: Quem so os sujeitos da escola pblica? De onde eles vm? Que referncias sociais e culturais trazem para a escola?

    Um sujeito fruto de seu tempo histrico, das relaes sociais em que est inserido, mas , tambm, um ser singular, que atua no mundo a partir do modo como o compreende e como dele lhe possvel participar.

    Ao definir qual formao se quer proporcionar a esses sujeitos, a escola contribui para determinar o tipo de participao que lhes caber na sociedade. Por isso, as reflexes sobre currculo tm, em sua natureza, um forte carter poltico.

    Nestas diretrizes, prope-se uma reorientao na poltica curricular com o objetivo de construir uma sociedade justa, onde as oportunidades sejam iguais para todos.

    Para isso, os sujeitos da Educao Bsica, crianas, jovens e adultos, em geral oriundos das classes assalariadas, urbanas ou rurais, de diversas regies e com diferentes origens tnicas e culturais (FRIGOTTO, 2004), devem ter acesso ao conhecimento produzido pela humanidade que, na escola, veiculado pelos contedos das disciplinas escolares.

    Assumir um currculo disciplinar significa dar nfase escola como lugar de socializao do conhecimento, pois essa funo da instituio escolar especialmente importante para os estudantes das classes menos favorecidas, que tm nela uma oportunidade, algumas vezes a nica, de acesso ao mundo letrado, do conhecimento cientfico, da reflexo filosfica e do contato com a arte.

    Os contedos disciplinares devem ser tratados, na escola, de modo contextualizado, estabelecendo-se, entre eles, relaes interdisciplinares e colocando sob suspeita tanto a rigidez com que tradicionalmente se apresentam quanto o estatuto de verdade atemporal dado a eles. Desta perspectiva, prope-se que tais conhecimentos contribuam para a crtica s contradies sociais, polticas e econmicas presentes nas estruturas da sociedade contempornea e propiciem compreender a produo cientfica, a reflexo filosfica, a criao artstica, nos contextos em que elas se constituem.

    Essa concepo de escola orienta para uma aprendizagem especfica, colocando em perspectiva o seu aspecto formal e institudo, o qual diz respeito aos conhecimentos historicamente sistematizados e selecionados para compor o currculo escolar.

    Nesse sentido, a escola deve incentivar a prtica pedaggica fundamentada em diferentes metodologias, valorizando concepes de ensino, de aprendizagem (internalizao) e de avaliao que permitam aos professores e estudantes conscientizarem-se da necessidade de ...uma transformao emancipadora. desse modo que uma contraconscincia, estrategicamente concebida como alternativa necessria internalizao dominada colonialmente, poderia realizar sua grandiosa misso educativa (MSZROS, 2007, p. 212).

    Um projeto educativo, nessa direo, precisa atender igualmente aos sujeitos, seja qual for sua condio social e econmica, seu pertencimento tnico e cultural e s possveis necessidades especiais para aprendizagem. Essas caractersticas devem ser tomadas como potencialidades para promover a aprendizagem dos conhecimentos que cabe escola ensinar, para todos.

    2 FUNDAMENTOS TERICOS

    Pensar uma concepo de currculo para a Educao Bsica traz, aos professores do Estado do Paran, uma primeira questo a ser enfrentada. Afinal, o que currculo?

    Sacristn fala de impresses que, tal como imagens, trazem mente o conceito de currculo. Em algumas dessas impresses, a ideia de que o currculo construdo para ter efeitos sobre as pessoas fica reduzida ao seu carter estrutural prescritivo. Nelas, parece no haver destaque para a discusso sobre como se d, historicamente, a seleo do conhecimento, sobre a maneira como esse conhecimento se organiza e se relaciona na estrutura curricular e, consequncia disso, o modo como as pessoas podero compreender o mundo e atuar nele.

    [...] o currculo como conjunto de conhecimentos ou matrias a serem superadas pelo aluno dentro

    de um ciclo nvel educativo ou modalidade de ensino a acepo mais clssica e desenvolvida;

    o currculo como programa de atividades planejadas, devidamente sequencializadas, ordenadas

    metodologicamente tal como se mostram num manual ou num guia do professor; o currculo,

    tambm foi entendido, s vezes, como resultados pretendidos de aprendizagem; o currculo

    como concretizao do plano reprodutor para a escola de determinada sociedade, contendo

    conhecimentos, valores e atitudes; o currculo como experincia recriada nos alunos por meio da

    qual podem desenvolver-se; o currculo como tarefa e habilidade a serem dominadas como o caso

    da formao profissional; o currculo como programa que proporciona contedos e valores para

    que os alunos melhorem a sociedade em relao reconstruo social da mesma (SACRISTAN,

    2000, p. 14).

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    Essas impresses sobre currculo podem ser consideradas as mais conhecidas e corriqueiras, porm, nem todas remetem a uma anlise crtica sobre o assunto.

    Quando se considera o currculo to somente como um documento impresso, uma orientao pedaggica sobre o conhecimento a ser desenvolvido na escola ou mera lista de objetivos, mtodos e contedos necessrios para o desenvolvimento dos saberes escolares, despreza-se seu carter poltico, sua condio de elemento que pressupe um projeto de futuro para a sociedade que o produz. Faz-se necessria, ento, uma anlise mais ampla e crtica, ancorada na ideia de que, nesse documento, est impresso o resultado de embates polticos que produzem um projeto pedaggico vinculado a um projeto social.

    Assim, da tentativa de responder o que currculo, outras duas questes indissociveis se colocam como eixos para o debate: a inteno poltica que o currculo traduz e a tenso constante entre seu carter prescritivo e a prtica docente.

    Como documento institucional, o currculo pode tanto ser resultado de amplos debates que tenham envolvido professores, alunos, comunidades, quanto ser fruto de discusses centralizadas, feitas em gabinetes, sem a participao dos sujeitos diretamente interessados em sua constituio final. No caso de um currculo imposto s escolas, a prtica pedaggica dos sujeitos que ficaram margem do processo de discusso e construo curricular, em geral, transgride o currculo documento.

    Isso, porm, no se d de forma autnoma, pois o documento impresso, ou seja, o estabelecimento de normas e critrios tem significado, mesmo quando a prtica procura contradizer ou transcender essa definio pr-ativa (de currculo). Com isso, ficamos vinculados a formas prvias de reproduo, mesmo quando nos tornamos criadores de novas formas (GOODSON, 1995, p. 18).1

    Entretanto, quando uma nova proposio curricular apresentada s escolas, como fruto de ampla discusso coletiva, haver, tambm, criao de novas prticas que iro alm do que prope o documento, mas respeitando seu ponto de partida terico-metodolgico.

    Em ambos os casos, mas com perspectivas polticas distintas, identifica-se uma tenso entre o currculo documento e o currculo como prtica. Para enfrentar essa tenso, o currculo documento deve ser objeto de anlise contnua dos sujeitos da educao, principalmente a concepo de conhecimento que ele carrega, pois, ela varia de acordo com as matrizes tericas que o orientam e o estruturam. Cada

    1 Esses vnculos, em geral, buscam atrelar a concepo terica e poltica do currculo distribuio de verbas destinadas educao, avaliao dos materiais didticos a serem comprados e distribudos para as escolas, e ao tipo de formao continuada oferecida aos professores.

    uma dessas matrizes d nfase a diferentes saberes a serem socializados pela escola, tratando o conhecimento escolar sob ticas diversas. Dessa perspectiva, e de maneira muito ampla, possvel pensar em trs grandes matrizes curriculares2, a saber:

    O currculo vinculado ao academicismo e ao cientificismo

    No currculo vinculado ao academicismo/cientificismo, os saberes a serem socializados nas diferentes disciplinas escolares so oriundos das cincias que os referenciam. A disciplina escolar, assim, vista como decorrente da cincia e da aplicabilidade do mtodo cientfico como mtodo de ensino. Esse tipo de currculo pressupe que o processo de ensino deve transmitir aos alunos a lgica do conhecimento de referncia. [...] do saber especializado e acumulado pela humanidade que devem ser extrados os conceitos e os princpios a serem ensinados aos alunos (LOPES, 2002, p. 151-152).

    Embora remeta-se ao saber produzido e acumulado pela humanidade como fonte dos saberes escolares, podendo-se inferir o direito dos estudantes da Educao Bsica ao acesso a esses conhecimentos, uma das principais crticas ao currculo definido pelo cientificismo/academicismo que ele trata a disciplina escolar como ramificao do saber especializado, tornando-a refm da fragmentao do conhecimento. A consequncia disso so disciplinas que no dialogam e, por isso mesmo, fechadas em seus redutos, perdem a dimenso da totalidade.

    Outra crtica a esse tipo de currculo argumenta que, ao aceitar o status quo dos conhecimentos e saberes dominantes, o currculo cientificista/academicista enfraquece a possibilidade de constituir uma perspectiva crtica de educao, uma vez que passa a considerar os contedos escolares to somente como resumo do saber culto e elaborado sob a formalizao das diferentes disciplinas (SACRISTAN, 2000, p. 39). Esse tipo de currculo se concretiza no syllabus ou lista de contedos. Ao se expressar nesses termos, mais fcil de regular, controlar, assegurar sua inspeo, etc., do que qualquer outra frmula que contenha consideraes de tipo psicopedaggico (SACRISTN, 2000, p. 40).

    O currculo vinculado s subjetividades e experincias vividas pelo aluno

    O currculo estruturado com base nas experincias e/ou interesses dos alunos faz-se presente, no Brasil, destacadamente, em dois momentos: nas discusses

    2 Adaptadas de Sacristan, 2000, p. 39-53 e Lopes, 2002.

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    Essas impresses sobre currculo podem ser consideradas as mais conhecidas e corriqueiras, porm, nem todas remetem a uma anlise crtica sobre o assunto.

    Quando se considera o currculo to somente como um documento impresso, uma orientao pedaggica sobre o conhecimento a ser desenvolvido na escola ou mera lista de objetivos, mtodos e contedos necessrios para o desenvolvimento dos saberes escolares, despreza-se seu carter poltico, sua condio de elemento que pressupe um projeto de futuro para a sociedade que o produz. Faz-se necessria, ento, uma anlise mais ampla e crtica, ancorada na ideia de que, nesse documento, est impresso o resultado de embates polticos que produzem um projeto pedaggico vinculado a um projeto social.

    Assim, da tentativa de responder o que currculo, outras duas questes indissociveis se colocam como eixos para o debate: a inteno poltica que o currculo traduz e a tenso constante entre seu carter prescritivo e a prtica docente.

    Como documento institucional, o currculo pode tanto ser resultado de amplos debates que tenham envolvido professores, alunos, comunidades, quanto ser fruto de discusses centralizadas, feitas em gabinetes, sem a participao dos sujeitos diretamente interessados em sua constituio final. No caso de um currculo imposto s escolas, a prtica pedaggica dos sujeitos que ficaram margem do processo de discusso e construo curricular, em geral, transgride o currculo documento.

    Isso, porm, no se d de forma autnoma, pois o documento impresso, ou seja, o estabelecimento de normas e critrios tem significado, mesmo quando a prtica procura contradizer ou transcender essa definio pr-ativa (de currculo). Com isso, ficamos vinculados a formas prvias de reproduo, mesmo quando nos tornamos criadores de novas formas (GOODSON, 1995, p. 18).1

    Entretanto, quando uma nova proposio curricular apresentada s escolas, como fruto de ampla discusso coletiva, haver, tambm, criao de novas prticas que iro alm do que prope o documento, mas respeitando seu ponto de partida terico-metodolgico.

    Em ambos os casos, mas com perspectivas polticas distintas, identifica-se uma tenso entre o currculo documento e o currculo como prtica. Para enfrentar essa tenso, o currculo documento deve ser objeto de anlise contnua dos sujeitos da educao, principalmente a concepo de conhecimento que ele carrega, pois, ela varia de acordo com as matrizes tericas que o orientam e o estruturam. Cada

    1 Esses vnculos, em geral, buscam atrelar a concepo terica e poltica do currculo distribuio de verbas destinadas educao, avaliao dos materiais didticos a serem comprados e distribudos para as escolas, e ao tipo de formao continuada oferecida aos professores.

    uma dessas matrizes d nfase a diferentes saberes a serem socializados pela escola, tratando o conhecimento escolar sob ticas diversas. Dessa perspectiva, e de maneira muito ampla, possvel pensar em trs grandes matrizes curriculares2, a saber:

    O currculo vinculado ao academicismo e ao cientificismo

    No currculo vinculado ao academicismo/cientificismo, os saberes a serem socializados nas diferentes disciplinas escolares so oriundos das cincias que os referenciam. A disciplina escolar, assim, vista como decorrente da cincia e da aplicabilidade do mtodo cientfico como mtodo de ensino. Esse tipo de currculo pressupe que o processo de ensino deve transmitir aos alunos a lgica do conhecimento de referncia. [...] do saber especializado e acumulado pela humanidade que devem ser extrados os conceitos e os princpios a serem ensinados aos alunos (LOPES, 2002, p. 151-152).

    Embora remeta-se ao saber produzido e acumulado pela humanidade como fonte dos saberes escolares, podendo-se inferir o direito dos estudantes da Educao Bsica ao acesso a esses conhecimentos, uma das principais crticas ao currculo definido pelo cientificismo/academicismo que ele trata a disciplina escolar como ramificao do saber especializado, tornando-a refm da fragmentao do conhecimento. A consequncia disso so disciplinas que no dialogam e, por isso mesmo, fechadas em seus redutos, perdem a dimenso da totalidade.

    Outra crtica a esse tipo de currculo argumenta que, ao aceitar o status quo dos conhecimentos e saberes dominantes, o currculo cientificista/academicista enfraquece a possibilidade de constituir uma perspectiva crtica de educao, uma vez que passa a considerar os contedos escolares to somente como resumo do saber culto e elaborado sob a formalizao das diferentes disciplinas (SACRISTAN, 2000, p. 39). Esse tipo de currculo se concretiza no syllabus ou lista de contedos. Ao se expressar nesses termos, mais fcil de regular, controlar, assegurar sua inspeo, etc., do que qualquer outra frmula que contenha consideraes de tipo psicopedaggico (SACRISTN, 2000, p. 40).

    O currculo vinculado s subjetividades e experincias vividas pelo aluno

    O currculo estruturado com base nas experincias e/ou interesses dos alunos faz-se presente, no Brasil, destacadamente, em dois momentos: nas discusses

    2 Adaptadas de Sacristan, 2000, p. 39-53 e Lopes, 2002.

  • Secretaria de Estado da Educao do Paran

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    dos tericos que empreenderam, no pas, a difuso das ideias pedaggicas da Escola Nova3, e na implementao do projeto neoliberal de educao, difundido no documento chamado Parmetros Curriculares Nacionais.

    Fundamentando-se em concepes psicolgicas, humanistas e sociais, esse tipo de currculo pressupe que

    Numa relao comparativa concepo de currculo cientificista, centrado em planos de estudos, o currculo como base de experincias pe seu foco na totalidade de experincias vivenciadas pelo aluno, a partir de seus interesses e sob tutela da escola que,

    [...] os aspectos intelectuais, fsicos, emocionais e sociais so importantes no desenvolvimento da

    vida do indivduo, levando em conta, alm disso, que tero de ser objeto de tratamentos coerentes

    para que se consigam finalidades to diversas, ter-se- que ponderar, como consequncia inevitvel,

    os aspectos metodolgicos do ensino, j que destes depende a consecuo de muitas dessas

    finalidades e no de contedos estritos de ensino. Desde ento, a metodologia e a importncia da

    experincia esto ligadas indissoluvelmente ao conceito de currculo. O importante do currculo a

    experincia, a recriao da cultura em termos de vivncias, a provocao de situaes problemticas

    [...] (SACRISTN, 2000, p. 41).

    [...] nesse contexto, era vista como a instituio responsvel pela compensao dos problemas

    da sociedade mais ampla. O foco do currculo foi deslocado do contedo para a forma, ou seja,

    a preocupao foi centrada na organizao das atividades, com base nas experincias, diferenas

    individuais e interesses da criana (ZOTTI, 2008).

    As crticas a esse tipo de currculo referem-se a uma concepo curricular que se fundamenta nas necessidades de desenvolvimento pessoal do indivduo, em prejuzo da aprendizagem dos conhecimentos histrica e socialmente construdos pela humanidade. Alm disso, a perspectiva experiencial reduz a escola ao papel de instituio socializadora, ressaltando os processos psicolgicos dos alunos e secundarizando os interesses sociais e os conhecimentos especficos das disciplinas. Essa perspectiva considera que o ensino dos saberes acadmicos apenas um aspecto, de importncia relativa, a ser alcanado. Uma vez que esta concepo de currculo no define o papel das disciplinas escolares na organizao do trabalho pedaggico com a experincia, o utilitarismo surge como um jeito de resolver esse problema, aproximando os contedos das disciplinas das aplicaes sociais possveis do conhecimento.3 A Escola Nova foi um importante movimento de renovao da escola tradicional. Fundamentava o ato pedaggico na ao, na atividade da criana e menos na instruo dada pelo professor. Para John Dewey, um dos idealizadores da Escola Nova, a educao deveria ajudar a resolver os problemas apresentados pela experincia concreta da vida. Assim, a educao era entendida como processo e no como produto. Um processo de reconstruo e reconstituio da experincia; um processo de melhoria permanente da eficincia individual (GADOTTI, 2004, p. 144).

    Tanto a concepo cientificista de currculo, quanto aquela apoiada na experincia e interesses dos alunos.

    [...] pautam-se em uma viso redentora frente relao educao e sociedade, com respostas

    diferenciadas na forma, mas defendendo e articulando um mesmo objetivo adaptar a escola e o

    currculo ordem capitalista, com base nos princpios de ordem, racionalidade e eficincia. Em vista

    disso, as questes centrais do currculo foram os processos de seleo e organizao do contedo e

    das atividades, privilegiando um planejamento rigoroso, baseado em teorias cientficas do processo

    ensino-aprendizagem, ora numa viso psicologizante, ora numa viso empresarial (ZOTTI, 2008).

    O currculo como configurador da prtica, vinculado s teorias crticas

    O currculo como configurador da prtica, produto de ampla discusso entre os sujeitos da educao, fundamentado nas teorias crticas e com organizao disciplinar a proposta destas Diretrizes para a rede estadual de ensino do Paran, no atual contexto histrico.

    No se trata de uma ideia nova, j que, num passado no muito distante, fortes discusses pedaggicas se concretizaram num documento curricular que se tornou bastante conhecido, denominado Currculo Bsico4. Esse documento foi resultado de um intenso processo de discusso coletiva que envolveu professores da rede estadual de ensino e de instituies de ensino superior. Vinculava-se ao materialismo histrico dialtico, matriz terica que fundamentava a proposta de ensino-aprendizagem de todas as disciplinas do currculo. Chegou escola em 1990 e vigorou, como proposio curricular oficial no Paran, at quase o final daquela dcada.

    Estas Diretrizes Curriculares, por sua vez, se apresentam como frutos daquela matriz curricular, porm, duas dcadas se passaram e o documento atual tem as marcas de outra metodologia de construo, por meio da qual a discusso contou com a participao macia dos professores da rede. Buscou-se manter o vnculo com o campo das teorias crticas da educao e com as metodologias que priorizem diferentes formas de ensinar, de aprender e de avaliar. Alm disso, nestas diretrizes a concepo de conhecimento considera suas dimenses cientfica, filosfica e artstica, enfatizando-se a importncia de todas as disciplinas.

    Para a seleo do conhecimento, que tratado, na escola, por meio dos contedos das disciplinas concorrem tanto os fatores ditos externos, como aqueles determinados pelo regime scio-poltico, religio, famlia, trabalho quanto as caractersticas sociais e culturais do pblico escolar, alm dos fatores especficos do sistema como os nveis de ensino, entre outros. Alm desses fatores, esto os

    4 As discusses que culminaram na elaborao do currculo bsico ocorreram no contexto da reabertura poltica, na segunda metade dos anos de 1980, quando o Brasil saa de um perodo de 20 anos submetido ditadura militar.

  • Cincias

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    dos tericos que empreenderam, no pas, a difuso das ideias pedaggicas da Escola Nova3, e na implementao do projeto neoliberal de educao, difundido no documento chamado Parmetros Curriculares Nacionais.

    Fundamentando-se em concepes psicolgicas, humanistas e sociais, esse tipo de currculo pressupe que

    Numa relao comparativa concepo de currculo cientificista, centrado em planos de estudos, o currculo como base de experincias pe seu foco na totalidade de experincias vivenciadas pelo aluno, a partir de seus interesses e sob tutela da escola que,

    [...] os aspectos intelectuais, fsicos, emocionais e sociais so importantes no desenvolvimento da

    vida do indivduo, levando em conta, alm disso, que tero de ser objeto de tratamentos coerentes

    para que se consigam finalidades to diversas, ter-se- que ponderar, como consequncia inevitvel,

    os aspectos metodolgicos do ensino, j que destes depende a consecuo de muitas dessas

    finalidades e no de contedos estritos de ensino. Desde ento, a metodologia e a importncia da

    experincia esto ligadas indissoluvelmente ao conceito de currculo. O importante do currculo a

    experincia, a recriao da cultura em termos de vivncias, a provocao de situaes problemticas

    [...] (SACRISTN, 2000, p. 41).

    [...] nesse contexto, era vista como a instituio responsvel pela compensao dos problemas

    da sociedade mais ampla. O foco do currculo foi deslocado do contedo para a forma, ou seja,

    a preocupao foi centrada na organizao das atividades, com base nas experincias, diferenas

    individuais e interesses da criana (ZOTTI, 2008).

    As crticas a esse tipo de currculo referem-se a uma concepo curricular que se fundamenta nas necessidades de desenvolvimento pessoal do indivduo, em prejuzo da aprendizagem dos conhecimentos histrica e socialmente construdos pela humanidade. Alm disso, a perspectiva experiencial reduz a escola ao papel de instituio socializadora, ressaltando os processos psicolgicos dos alunos e secundarizando os interesses sociais e os conhecimentos especficos das disciplinas. Essa perspectiva considera que o ensino dos saberes acadmicos apenas um aspecto, de importncia relativa, a ser alcanado. Uma vez que esta concepo de currculo no define o papel das disciplinas escolares na organizao do trabalho pedaggico com a experincia, o utilitarismo surge como um jeito de resolver esse problema, aproximando os contedos das disciplinas das aplicaes sociais possveis do conhecimento.3 A Escola Nova foi um importante movimento de renovao da escola tradicional. Fundamentava o ato pedaggico na ao, na atividade da criana e menos na instruo dada pelo professor. Para John Dewey, um dos idealizadores da Escola Nova, a educao deveria ajudar a resolver os problemas apresentados pela experincia concreta da vida. Assim, a educao era entendida como processo e no como produto. Um processo de reconstruo e reconstituio da experincia; um processo de melhoria permanente da eficincia individual (GADOTTI, 2004, p. 144).

    Tanto a concepo cientificista de currculo, quanto aquela apoiada na experincia e interesses dos alunos.

    [...] pautam-se em uma viso redentora frente relao educao e sociedade, com respostas

    diferenciadas na forma, mas defendendo e articulando um mesmo objetivo adaptar a escola e o

    currculo ordem capitalista, com base nos princpios de ordem, racionalidade e eficincia. Em vista

    disso, as questes centrais do currculo foram os processos de seleo e organizao do contedo e

    das atividades, privilegiando um planejamento rigoroso, baseado em teorias cientficas do processo

    ensino-aprendizagem, ora numa viso psicologizante, ora numa viso empresarial (ZOTTI, 2008).

    O currculo como configurador da prtica, vinculado s teorias crticas

    O currculo como configurador da prtica, produto de ampla discusso entre os sujeitos da educao, fundamentado nas teorias crticas e com organizao disciplinar a proposta destas Diretrizes para a rede estadual de ensino do Paran, no atual contexto histrico.

    No se trata de uma ideia nova, j que, num passado no muito distante, fortes discusses pedaggicas se concretizaram num documento curricular que se tornou bastante conhecido, denominado Currculo Bsico4. Esse documento foi resultado de um intenso processo de discusso coletiva que envolveu professores da rede estadual de ensino e de instituies de ensino superior. Vinculava-se ao materialismo histrico dialtico, matriz terica que fundamentava a proposta de ensino-aprendizagem de todas as disciplinas do currculo. Chegou escola em 1990 e vigorou, como proposio curricular oficial no Paran, at quase o final daquela dcada.

    Estas Diretrizes Curriculares, por sua vez, se apresentam como frutos daquela matriz curricular, porm, duas dcadas se passaram e o documento atual tem as marcas de outra metodologia de construo, por meio da qual a discusso contou com a participao macia dos professores da rede. Buscou-se manter o vnculo com o campo das teorias crticas da educao e com as metodologias que priorizem diferentes formas de ensinar, de aprender e de avaliar. Alm disso, nestas diretrizes a concepo de conhecimento considera suas dimenses cientfica, filosfica e artstica, enfatizando-se a importncia de todas as disciplinas.

    Para a seleo do conhecimento, que tratado, na escola, por meio dos contedos das disciplinas concorrem tanto os fatores ditos externos, como aqueles determinados pelo regime scio-poltico, religio, famlia, trabalho quanto as caractersticas sociais e culturais do pblico escolar, alm dos fatores especficos do sistema como os nveis de ensino, entre outros. Alm desses fatores, esto os

    4 As discusses que culminaram na elaborao do currculo bsico ocorreram no contexto da reabertura poltica, na segunda metade dos anos de 1980, quando o Brasil saa de um perodo de 20 anos submetido ditadura militar.

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    saberes acadmicos, trazidos para os currculos escolares e neles tomando diferentes formas e abordagens em funo de suas permanncias e transformaes.

    Tais temas foram o mote das discusses propostas para os professores durante o processo de elaborao destas Diretrizes, trabalhados numa abordagem histrica e crtica a respeito da constituio das disciplinas escolares, de sua relevncia e funo no currculo e de sua relao com as cincias de referncia.

    Na relao com as cincias de referncia, importante destacar que as disciplinas escolares, apesar de serem diferentes na abordagem, estruturam-se nos mesmos princpios epistemolgicos e cognitivos, tais como os mecanismos conceituais e simblicos. Esses princpios so critrios de sentido que organizam a relao do conhecimento com as orientaes para a vida como prtica social, servindo inclusive para organizar o saber escolar.

    Embora se compreendam as disciplinas escolares como indispensveis no processo de socializao e sistematizao dos conhecimentos, no se pode conceber esses conhecimentos restritos aos limites disciplinares. A valorizao e o aprofundamento dos conhecimentos organizados nas diferentes disciplinas escolares so condio para se estabelecerem as relaes interdisciplinares, entendidas como necessrias para a compreenso da totalidade.

    Assim, o fato de se identificarem condicionamentos histricos e culturais, presentes no formato disciplinar de nosso sistema educativo, no impede a perspectiva interdisciplinar. Tal perspectiva se constitui, tambm, como concepo crtica de educao e, portanto, est necessariamente condicionada ao formato disciplinar, ou seja, forma como o conhecimento produzido, selecionado, difundido e apropriado em reas que dialogam mas que constituem-se em suas especificidades.

    3 DIMENSES DO CONHECIMENTO

    Fundamentando-se nos princpios tericos expostos, prope-se que o currculo da Educao Bsica oferea, ao estudante, a formao necessria para o enfrentamento com vistas transformao da realidade social, econmica e poltica de seu tempo. Esta ambio remete s reflexes de Gramsci em sua defesa de uma educao na qual o espao de conhecimento, na escola, deveria equivaler ideia de atelier-biblioteca-oficina, em favor de uma formao, a um s tempo, humanista e tecnolgica.

    Esta ser uma de suas ideias chaves at o final da vida. O homem renascentista, para ele (Gramsci)

    sintetiza o momento de elevada cultura com o momento de transformao tcnica e artstica

    da matria e da natureza; sintetiza tambm a criao de grandes ideias terico-polticas com a

    experincia da convivncia popular. Sem dvida, deve ele estar imaginando o homem renascentista

    como um Leonardo da Vinci no seu atelier-biblioteca-oficina: as estantes cheias dos textos clssicos,

    as mesas cheias de tintas e modelos mecnicos; ou ento escrevendo ensaios polticos e culturais

    como um Maquiavel que transitava da convivncia ntima com os clssicos historiadores da literatura

    greco-romana, para a convivncia, tambm ntima, com os populares da cidade de Florena.

    luz desses modelos humanos, Gramsci sintetiza, no ideal da escola moderna para o proletariado,

    as caractersticas da liberdade e livre iniciativa individual com as habilidades necessrias forma

    produtiva mais eficiente para a humanidade de hoje (NOSELLA, p. 20).

    Esse o princpio implcito nestas diretrizes quando se defende um currculo baseado nas dimenses cientfica, artstica e filosfica do conhecimento. A produo cientfica, as manifestaes artsticas e o legado filosfico da humanidade, como dimenses para as diversas disciplinas do currculo, possibilitam um trabalho pedaggico que aponte na direo da totalidade do conhecimento e sua relao com o cotidiano.

    Com isso, entende-se a escola como o espao do confronto e dilogo entre os conhecimentos sistematizados e os conhecimentos do cotidiano popular. Essas so as fontes scio-histricas do conhecimento em sua complexidade.

    Em breve retrospectiva histrica, possvel afirmar que, at o Renascimento, o que se entendia por conhecimento se aproximava muito da noo de pensamento filosfico, o qual buscava uma explicao racional para o mundo e para os fenmenos naturais e sociais.

    A filosofia permite um conhecimento racional, qual um exerccio da razo. [...] A partir do sculo

    VI a.C., passou a circunscrever todo o conhecimento da poca em explicaes racionais acerca do

    cosmo. A razo indagava a natureza e obtinha respostas a problemas tericos, especulativos. At

    o sculo XVI, o pensamento permaneceu imbudo da filosofia como instrumento do pensamento

    especulativo. [...] Desta forma, a filosofia representou, at o advento da cincia moderna, a

    culminncia de todos os esforos da racionalidade ocidental. Era o saber por excelncia; a filosofia

    e a cincia formavam um nico campo racional (ARAUJO, 2003, p. 23-24).

    Com o Renascimento e a emergncia do sistema mercantilista de produo, entre outras influncias, o pensamento ocidental sofreu modificaes importantes relacionadas ao novo perodo histrico que se anunciava. No final do sculo XVII, por exemplo, Isaac Newton, amparado nos estudos de Galileu, Tycho Brahe e

  • Cincias

    23

    saberes acadmicos, trazidos para os currculos escolares e neles tomando diferentes formas e abordagens em funo de suas permanncias e transformaes.

    Tais temas foram o mote das discusses propostas para os professores durante o processo de elaborao destas Diretrizes, trabalhados numa abordagem histrica e crtica a respeito da constituio das disciplinas escolares, de sua relevncia e funo no currculo e de sua relao com as cincias de referncia.

    Na relao com as cincias de referncia, importante destacar que as disciplinas escolares, apesar de serem diferentes na abordagem, estruturam-se nos mesmos princpios epistemolgicos e cognitivos, tais como os mecanismos conceituais e simblicos. Esses princpios so critrios de sentido que organizam a relao do conhecimento com as orientaes para a vida como prtica social, servindo inclusive para organizar o saber escolar.

    Embora se compreendam as disciplinas escolares como indispensveis no processo de socializao e sistematizao dos conhecimentos, no se pode conceber esses conhecimentos restritos aos limites disciplinares. A valorizao e o aprofundamento dos conhecimentos organizados nas diferentes disciplinas escolares so condio para se estabelecerem as relaes interdisciplinares, entendidas como necessrias para a compreenso da totalidade.

    Assim, o fato de se identificarem condicionamentos histricos e culturais, presentes no formato disciplinar de nosso sistema educativo, no impede a perspectiva interdisciplinar. Tal perspectiva se constitui, tambm, como concepo crtica de educao e, portanto, est necessariamente condicionada ao formato disciplinar, ou seja, forma como o conhecimento produzido, selecionado, difundido e apropriado em reas que dialogam mas que constituem-se em suas especificidades.

    3 DIMENSES DO CONHECIMENTO

    Fundamentando-se nos princpios tericos expostos, prope-se que o currculo da Educao Bsica oferea, ao estudante, a formao necessria para o enfrentamento com vistas transformao da realidade social, econmica e poltica de seu tempo. Esta ambio remete s reflexes de Gramsci em sua defesa de uma educao na qual o espao de conhecimento, na escola, deveria equivaler ideia de atelier-biblioteca-oficina, em favor de uma formao, a um s tempo, humanista e tecnolgica.

    Esta ser uma de suas ideias chaves at o final da vida. O homem renascentista, para ele (Gramsci)

    sintetiza o momento de elevada cultura com o momento de transformao tcnica e artstica

    da matria e da natureza; sintetiza tambm a criao de grandes ideias terico-polticas com a

    experincia da convivncia popular. Sem dvida, deve ele estar imaginando o homem renascentista

    como um Leonardo da Vinci no seu atelier-biblioteca-oficina: as estantes cheias dos textos clssicos,

    as mesas cheias de tintas e modelos mecnicos; ou ento escrevendo ensaios polticos e culturais

    como um Maquiavel que transitava da convivncia ntima com os clssicos historiadores da literatura

    greco-romana, para a convivncia, tambm ntima, com os populares da cidade de Florena.

    luz desses modelos humanos, Gramsci sintetiza, no ideal da escola moderna para o proletariado,

    as caractersticas da liberdade e livre iniciativa individual com as habilidades necessrias forma

    produtiva mais eficiente para a humanidade de hoje (NOSELLA, p. 20).

    Esse o princpio implcito nestas diretrizes quando se defende um currculo baseado nas dimenses cientfica, artstica e filosfica do conhecimento. A produo cientfica, as manifestaes artsticas e o legado filosfico da humanidade, como dimenses para as diversas disciplinas do currculo, possibilitam um trabalho pedaggico que aponte na direo da totalidade do conhecimento e sua relao com o cotidiano.

    Com isso, entende-se a escola como o espao do confronto e dilogo entre os conhecimentos sistematizados e os conhecimentos do cotidiano popular. Essas so as fontes scio-histricas do conhecimento em sua complexidade.

    Em breve retrospectiva histrica, possvel afirmar que, at o Renascimento, o que se entendia por conhecimento se aproximava muito da noo de pensamento filosfico, o qual buscava uma explicao racional para o mundo e para os fenmenos naturais e sociais.

    A filosofia permite um conhecimento racional, qual um exerccio da razo. [...] A partir do sculo

    VI a.C., passou a circunscrever todo o conhecimento da poca em explicaes racionais acerca do

    cosmo. A razo indagava a natureza e obtinha respostas a problemas tericos, especulativos. At

    o sculo XVI, o pensamento permaneceu imbudo da filosofia como instrumento do pensamento

    especulativo. [...] Desta forma, a filosofia representou, at o advento da cincia moderna, a

    culminncia de todos os esforos da racionalidade ocidental. Era o saber por excelncia; a filosofia

    e a cincia formavam um nico campo racional (ARAUJO, 2003, p. 23-24).

    Com o Renascimento e a emergncia do sistema mercantilista de produo, entre outras influncias, o pensamento ocidental sofreu modificaes importantes relacionadas ao novo perodo histrico que se anunciava. No final do sculo XVII, por exemplo, Isaac Newton, amparado nos estudos de Galileu, Tycho Brahe e

  • Secretaria de Estado da Educao do Paran

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    Kepler, estabeleceu a primeira grande unificao dos estudos da Fsica relacionando os fenmenos fsicos terrestres e celestes. Temas que eram objeto da filosofia, passaram a ser analisados pelo olhar da cincia emprica, de modo que das explicaes organizadas conforme o mtodo cientfico, surgiram todas as cincias naturais (ARAUJO, 2003, p. 24).

    O conhecimento cientfico, ento, foi se desvinculando do pensamento teocntrico e os saberes necessrios para explicar o mundo ficaram a cargo do ser humano, que explicaria a natureza por meio de leis, princpios, teorias, sempre na busca de uma verdade expressa pelo mtodo cientfico.

    A dimenso filosfica do conhecimento no desapareceu com o desenvolvimento da razo cientfica. Ambas caminharam no sculo XX, quando se observou a emergncia de mtodos prprios para as cincias humanas, que se emanciparam das cincias naturais. Assim, as dimenses filosfica e cientfica transformaram a concepo de cincia ao inclurem o elemento da interpretao ou significao que os sujeitos do s suas aes o homem torna-se, ao mesmo tempo, objeto e sujeito do conhecimento.

    Alm disso, as cincias humanas desenvolveram a anlise da formao, consolidao e superao das estruturas objetivas do humano na sua subjetividade e nas relaes sociais. Essas transformaes, que se deram devido expanso da vida urbana, consolidao do padro de vida burguesa e formao de uma classe trabalhadora consciente de si, exigem investigaes sobre a constituio do sujeito e do processo social. So as dimenses filosfica e humana do conhecimento que possibilitam aos cientistas perguntarem sobre as implicaes de suas produes cientficas. Assim, pensamento cientfico e filosfico constituem dimenses do conhecimento que no se confundem, mas no se devem separar.

    Temas que foram objeto de especulao e reflexo filosfica passaram da por diante pelo crivo

    do olhar objetivador da cincia. [...] As cincias passaram a fornecer explicao sobre a estrutura

    do universo fsico, sobre a constituio dos organismos e, mais recentemente, sobre o homem

    e a sociedade. A filosofia passou a abranger setores cada vez mais restritos da realidade, tendo,

    no entanto, se tornado cada vez mais aguda em suas indagaes; se no lhe dado mais abordar

    o cosmo, pois a fsica e suas leis e teorias o faz mais apropriadamente, o filsofo se volta para a

    situao atual e pergunta-se: o que faz de ns este ser que hoje somos? (o) que o saber, (o) que

    o conhecer e de como se d a relao entre mente e mundo (ARAUJO, 2003, p. 24).

    Por sua vez, a dimenso artstica fruto de uma relao especfica do ser humano com o mundo e o conhecimento. Essa relao materializada pela e na obra de arte, que parte integrante da realidade social, elemento da estrutura de tal sociedade e expresso da produtividade social e espiritual do homem

    (KOSIK, 2002, p. 139). A obra de arte constituda pela razo, pelos sentidos e pela transcendncia da prpria condio humana.

    Numa conhecida passagem dos Manuscritos econmico-filosficos, Karl Marx argumenta que o homem se afirma no mundo objetivo, no apenas no pensar, mas tambm com todos os sentidos (MARX, 1987, p. 178) e os sentidos no so apenas naturais, biolgicos e instintivos, mas tambm transformados pela cultura, humanizados.

    Para Marx, o capitalismo e a propriedade privada determinam a alienao dos sentidos e do pensamento, reduzindo-os dimenso do ter. Portanto, a emancipao humana plena passa, necessariamente, pelo resgate dos sentidos e do pensamento.

    Para o ouvido no musical a mais bela msica no tem sentido algum, no objeto. [...]

    A formao dos cinco sentidos um trabalho de toda histria universal at nossos dias. O

    sentido que prisioneiro da grosseira necessidade prtica tem apenas um sentido limitado

    (MARX, 1987, p. 178).

    O conhecimento artstico tem como caractersticas centrais a criao e o trabalho criador. A arte criao, qualidade distintiva fundamental da dimenso artstica, pois criar fazer algo indito, novo e singular, que expressa o sujeito criador e simultaneamente, transcende-o, pois o objeto criado portador de contedo social e histrico e como objeto concreto uma nova realidade social (PEIXOTO, 2003, p. 39).

    Esta caracterstica da arte ser criao um elemento fundamental para a educao, pois a escola , a um s tempo, o espao do conhecimento historicamente produzido pelo homem e espao de construo de novos conhecimentos, no qual imprescindvel o processo de criao. Assim, o desenvolvimento da capacidade criativa dos alunos, inerente dimenso artstica, tem uma direta relao com a produo do conhecimento nas diversas disciplinas.

    Desta forma, a dimenso artstica pode contribuir significativamente para humanizao dos sentidos, ou seja, para a superao da condio de alienao e represso qual os sentidos humanos foram submetidos. A Arte concentra, em sua especificidade, conhecimentos de diversos campos, possibilitando um dilogo entre as disciplinas escolares e aes que favoream uma unidade no trabalho pedaggico. Por isso, essa dimenso do conhecimento deve ser entendida para alm da disciplina de Arte, bem como as dimenses filosfica e cientfica no se referem exclusivamente disciplina de Filosofia e s disciplinas cientficas. Essas dimenses do conhecimento constituem parte fundamental dos contedos nas disciplinas do currculo da Educao Bsica.

  • Cincias

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    Kepler, estabeleceu a primeira grande unificao dos estudos da Fsica relacionando os fenmenos fsicos terrestres e celestes. Temas que eram objeto da filosofia, passaram a ser analisados pelo olhar da cincia emprica, de modo que das explicaes organizadas conforme o mtodo cientfico, surgiram todas as cincias naturais (ARAUJO, 2003, p. 24).

    O conhecimento cientfico, ento, foi se desvinculando do pensamento teocntrico e os saberes necessrios para explicar o mundo ficaram a cargo do ser humano, que explicaria a natureza por meio de leis, princpios, teorias, sempre na busca de uma verdade expressa pelo mtodo cientfico.

    A dimenso filosfica do conhecimento no desapareceu com o desenvolvimento da razo cientfica. Ambas caminharam no sculo XX, quando se observou a emergncia de mtodos prprios para as cincias humanas, que se emanciparam das cincias naturais. Assim, as dimenses filosfica e cientfica transformaram a concepo de cincia ao inclurem o elemento da interpretao ou significao que os sujeitos do s suas aes o homem torna-se, ao mesmo tempo, objeto e sujeito do conhecimento.

    Alm disso, as cincias humanas desenvolveram a anlise da formao, consolidao e superao das estruturas objetivas do humano na sua subjetividade e nas relaes sociais. Essas transformaes, que se deram devido expanso da vida urbana, consolidao do padro de vida burguesa e formao de uma classe trabalhadora consciente de si, exigem investigaes sobre a constituio do sujeito e do processo social. So as dimenses filosfica e humana do conhecimento que possibilitam aos cientistas perguntarem sobre as implicaes de suas produes cientficas. Assim, pensamento cientfico e filosfico constituem dimenses do conhecimento que no se confundem, mas no se devem separar.

    Temas que foram objeto de especulao e reflexo filosfica passaram da por diante pelo crivo

    do olhar objetivador da cincia. [...] As cincias passaram a fornecer explicao sobre a estrutura

    do universo fsico, sobre a constituio dos organismos e, mais recentemente, sobre o homem

    e a sociedade. A filosofia passou a abranger setores cada vez mais restritos da realidade, tendo,

    no entanto, se tornado cada vez mais aguda em suas indagaes; se no lhe dado mais abordar

    o cosmo, pois a fsica e suas leis e teorias o faz mais apropriadamente, o filsofo se volta para a

    situao atual e pergunta-se: o que faz de ns este ser que hoje somos? (o) que o saber, (o) que

    o conhecer e de como se d a relao entre mente e mundo (ARAUJO, 2003, p. 24).

    Por sua vez, a dimenso artstica fruto de uma relao especfica do ser humano com o mundo e o conhecimento. Essa relao materializada pela e na obra de arte, que parte integrante da realidade social, elemento da estrutura de tal sociedade e expresso da produtividade social e espiritual do homem

    (KOSIK, 2002, p. 139). A obra de arte constituda pela razo, pelos sentidos e pela transcendncia da prpria condio humana.

    Numa conhecida passagem dos Manuscritos econmico-filosficos, Karl Marx argumenta que o homem se afirma no mundo objetivo, no apenas no pensar, mas tambm com todos os sentidos (MARX, 1987, p. 178) e os sentidos no so apenas naturais, biolgicos e instintivos, mas tambm transformados pela cultura, humanizados.

    Para Marx, o capitalismo e a propriedade privada determinam a alienao dos sentidos e do pensamento, reduzindo-os dimenso do ter. Portanto, a emancipao humana plena passa, necessariamente, pelo resgate dos sentidos e do pensamento.

    Para o ouvido no musical a mais bela msica no tem sentido algum, no objeto. [...]

    A formao dos cinco sentidos um trabalho de toda histria universal at nossos dias. O

    sentido que prisioneiro da grosseira necessidade prtica tem apenas um sentido limitado

    (MARX, 1987, p. 178).

    O conhecimento artstico tem como caractersticas centrais a criao e o trabalho criador. A arte criao, qualidade distintiva fundamental da dimenso artstica, pois criar fazer algo indito, novo e singular, que expressa o sujeito criador e simultaneamente, transcende-o, pois o objeto criado portador de contedo social e histrico e como objeto concreto uma nova realidade social (PEIXOTO, 2003, p. 39).

    Esta caracterstica da arte ser criao um elemento fundamental para a educao, pois a escola , a um s tempo, o espao do conhecimento historicamente produzido pelo homem e espao de construo de novos conhecimentos, no qual imprescindvel o processo de criao. Assim, o desenvolvimento da capacidade criativa dos alunos, inerente dimenso artstica, tem uma direta relao com a produo do conhecimento nas diversas disciplinas.

    Desta forma, a dimenso artstica pode contribuir significativamente para humanizao dos sentidos, ou seja, para a superao da condio de alienao e represso qual os sentidos humanos foram submetidos. A Arte concentra, em sua especificidade, conhecimentos de diversos campos, possibilitando um dilogo entre as disciplinas escolares e aes que favoream uma unidade no trabalho pedaggico. Por isso, essa dimenso do conhecimento deve ser entendida para alm da disciplina de Arte, bem como as dimenses filosfica e cientfica no se referem exclusivamente disciplina de Filosofia e s disciplinas cientficas. Essas dimenses do conhecimento constituem parte fundamental dos contedos nas disciplinas do currculo da Educao Bsica.

  • Secretaria de Estado da Educao do Paran

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    Sem contedo no h ensino, qualquer projeto educativo acaba se concretizando na aspirao de

    conseguir alguns efeitos nos sujeitos que se educam. Referindo-se estas afirmaes ao tratamento

    cientfico do ensino, pode-se dizer que sem formalizar os problemas relativos aos contedos no

    existe discurso rigoroso nem cientfico sobre o ensino, porque estaramos falando de uma atividade

    vazia ou com significado margem do para que serve (SACRISTN, 2000, p. 120).

    5 As disciplinas tcnicas dos cursos de Ensino Mdio Integrado devem orientar-se, tambm, por essa compreenso de conhecimento, pois a cincia, a tcnica e a tecnologia so frutos do trabalho e produtos da prtica social. Participam, portanto, dos saberes das disciplinas escolares.

    [...] A reflexo sobre a justificativa dos contedos para os professores um motivo exemplar

    para entender o papel que a escolaridade em geral cumpre num determinado momento e, mais

    especificamente, a funo do nvel ou especialidade escolar na qual trabalham. O que se ensina,

    sugere-se ou se obriga a aprender expressa valores e funes que a escola difunde num contexto

    social e histrico concreto (SACRISTN, 2000, p. 150).

    3.1 O CONHECIMENTO E AS DISCIPLINAS CURRICULARES

    Como saber escolar, o conhecimento se explicita nos contedos das disciplinas de tradio curricular, quais sejam: Arte, Biologia, Cincias, Educao Fsica, Ensino Religioso, Filosofia, Fsica, Geografia, Histria, Lngua Estrangeira Moderna, Lngua Portuguesa, Matemtica, Qumica e Sociologia5.

    Nestas Diretrizes, destaca-se a importncia dos contedos disciplinares e do professor como autor de seu plano de ensino, contrapondo-se, assim, aos modelos de organizao curricular que vigoraram na dcada de 1990, os quais esvaziaram os contedos disciplinares para dar destaque aos chamados temas transversais.

    Ainda hoje, a crtica poltica de esvaziamento dos contedos disciplinares sofre constrangimentos em consequncia dos embates ocorridos entre as diferentes tendncias pedaggicas no sculo XX. Tais embates trouxeram para [...] o discurso pedaggico moderno um certo complexo de culpa ao tratar o tema dos contedos (SACRISTN, 2000, p. 120). A discusso sobre contedos curriculares passou a ser vista, por alguns, como uma defesa da escola como agncia reprodutora da cultura dominante. Contudo,

    preciso, tambm, ultrapassar a ideia e a prtica da diviso do objeto didtico pelas quais os contedos disciplinares so decididos e selecionados fora da escola, por outros agentes sociais. Quanto aos envolvidos no ambiente escolar, sobretudo aos professores, caberia apenas refletir e decidir sobre as tcnicas de ensino.

    Os estudos sobre a histria da produo do conhecimento, seus mtodos e determinantes polticos, econmicos, sociais e ideolgicos, relacionados com a histria das disciplinas escolares e as teorias da aprendizagem, possibilitam uma fundamentao para o professor em discusses curriculares mais aprofundadas e alteram sua prtica pedaggica.

    Nessa prxis, os professores participam ativamente da constante construo curricular e se fundamentam para organizar o trabalho pedaggico a partir dos contedos estruturantes de sua disciplina.

    Entende-se por contedos estruturantes os conhecimentos de grande amplitude, conceitos, teorias ou prticas, que identificam e organizam os campos de estudos de uma disciplina escolar, considerados fundamentais para a compreenso de seu objeto de estudo/ensino. Esses contedos so selecionados a partir de uma anlise histrica da cincia de referncia (quando for o caso) e da disciplina escolar, sendo trazidos para a escola para serem socializados, apropriados pelos alunos, por meio das metodologias crticas de ensino-aprendizagem.

    Por serem histricos, os contedos estruturantes so frutos de uma construo que tem sentido social como conhecimento, ou seja, existe uma poro de conhecimento que produto da cultura e que deve ser disponibilizado como contedo, ao estudante, para que seja apropriado, dominado e usado. Esse o conhecimento institudo. Alm desse saber institudo, pronto, entretanto, deve existir, no processo de ensino/aprendizagem, uma preocupao com o devir do conhecimento, ou seja, existem fenmenos e relaes que a inteligncia humana ainda no explorou na natureza. Portanto, de posse de alguns conhecimentos herdados culturalmente, o sujeito deve entender que isso no todo o conhecimento possvel que a inteligncia tem e capaz de ter do mundo, e que existe uma conscincia, uma necessidade intrnseca e natural de continuar explorando o no saber (CHAU, 1997), a natureza (VASQUEZ, 1997).

    Como seleo, tais contedos carregam uma marca poltica, so datados e interessados e, nesse sentido, alguns saberes disciplinares, considerados importantes no passado, podem estar, aqui, excludos do campo de estudos da disciplina. Outros contedos estruturantes, ainda que mais recorrentes na histria da disciplina, tm, nestas diretrizes, sua abordagem terica reelaborada em funo das transformaes sociais, polticas, econmicas e culturais ocorridas recentemente.

    Ao vincular o conceito de contedo estruturante tanto a uma anlise histrica quanto a uma opo poltica, considera-se que

  • Cincias

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    Sem contedo no h ensino, qualquer projeto educativo acaba se concretizando na aspirao de

    conseguir alguns efeitos nos sujeitos que se educam. Referindo-se estas afirmaes ao tratamento

    cientfico do ensino, pode-se dizer que sem formalizar os problemas relativos aos contedos no

    existe discurso rigoroso nem cientfico sobre o ensino, porque estaramos falando de uma atividade

    vazia ou com significado margem do para que serve (SACRISTN, 2000, p. 120).

    5 As disciplinas tcnicas dos cursos de Ensino Mdio Integrado devem orientar-se, tambm, por essa compreenso de conhecimento, pois a cincia, a tcnica e a tecnologia so frutos do trabalho e produtos da prtica social. Participam, portanto, dos saberes das disciplinas escolares.

    [...] A reflexo sobre a justificativa dos contedos para os professores um motivo exemplar

    para entender o papel que a escolaridade em geral cumpre num determinado momento e, mais

    especificamente, a funo do nvel ou especialidade escolar na qual trabalham. O que se ensina,

    sugere-se ou se obriga a aprender expressa valores e funes que a escola difunde num contexto

    social e histrico concreto (SACRISTN, 2000, p. 150).

    3.1 O CONHECIMENTO E AS DISCIPLINAS CURRICULARES

    Como saber escolar, o conhecimento se explicita nos contedos das disciplinas de tradio curricular, quais sejam: Arte, Biologia, Cincias, Educao Fsica, Ensino Religioso, Filosofia, Fsica, Geografia, Histria, Lngua Estrangeira Moderna, Lngua Portuguesa, Matemtica, Qumica e Sociologia5.

    Nestas Diretrizes, destaca-se a importncia dos contedos disciplinares e do professor como autor de seu plano de ensino, contrapondo-se, assim, aos modelos de organizao curricular que vigoraram na dcada de 1990, os quais esvaziaram os contedos disciplinares para dar destaque aos chamados temas transversais.

    Ainda hoje, a crtica poltica de esvaziamento dos contedos disciplinares sofre constrangimentos em consequncia dos embates ocorridos entre as diferentes tendncias pedaggicas no sculo XX. Tais embates trouxeram para [...] o discurso pedaggico moderno um certo complexo de culpa ao tratar o tema dos contedos (SACRISTN, 2000, p. 120). A discusso sobre contedos curriculares passou a ser vista, por alguns, como uma defesa da escola como agncia reprodutora da cultura dominante. Contudo,

    preciso, tambm, ultrapassar a ideia e a prtica da diviso do objeto didtico pelas quais os contedos disciplinares so decididos e selecionados fora da escola, por outros agentes sociais. Quanto aos envolvidos no ambiente escolar, sobretudo aos professores, caberia apenas refletir e decidir sobre as tcnicas de ensino.

    Os estudos sobre a histria da produo do conhecimento, seus mtodos e determinantes polticos, econmicos, sociais e ideolgicos, relacionados com a histria das disciplinas escolares e as teorias da aprendizagem, possibilitam uma fundamentao para o professor em discusses curriculares mais aprofundadas e alteram sua prtica pedaggica.

    Nessa prxis, os professores participam ativamente da constante construo curricular e se fundamentam para organizar o trabalho pedaggico a partir dos contedos estruturantes de sua disciplina.

    Entende-se por contedos estruturantes os conhecimentos de grande amplitude, conceitos, teorias ou prticas, que identificam e organizam os campos de estudos de uma disciplina escolar, considerados fundamentais para a compreenso de seu objeto de estudo/ensino. Esses contedos so selecionados a partir de uma anlise histrica da cincia de referncia (quando for o caso) e da disciplina escolar, sendo trazidos para a escola para serem socializados, apropriados pelos alunos, por meio das metodologias crticas de ensino-aprendizagem.

    Por serem histricos, os contedos estruturantes so frutos de uma construo que tem sentido social como conhecimento, ou seja, existe uma poro de conhecimento que produto da cultura e que deve ser disponibilizado como contedo, ao estudante, para que seja apropriado, dominado e usado. Esse o conhecimento institudo. Alm desse saber institudo, pronto, entretanto, deve existir, no processo de ensino/aprendizagem, uma preocupao com o devir do conhecimento, ou seja, existem fenmenos e relaes que a inteligncia humana ainda no explorou na natureza. Portanto, de posse de alguns conhecimentos herdados culturalmente, o sujeito deve entender que isso no todo o conhecimento possvel que a inteligncia tem e capaz de ter do mundo, e que existe uma conscincia, uma necessidade intrnseca e natural de continuar explorando o no saber (CHAU, 1997), a natureza (VASQUEZ, 1997).

    Como seleo, tais contedos carregam uma marca poltica, so datados e interessados e, nesse sentido, alguns saberes disciplinares, considerados importantes no passado, podem estar, aqui, excludos do campo de estudos da disciplina. Outros contedos estruturantes, ainda que mais recorrentes na histria da disciplina, tm, nestas diretrizes, sua abordagem terica reelaborada em funo das transformaes sociais, polticas, econmicas e culturais ocorridas recentemente.

    Ao vincular o conceito de contedo estruturante tanto a uma anlise histrica quanto a uma opo poltica, considera-se que

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    Ento, o conhecimento que identifica uma cincia e uma disciplina escolar histrico, no estanque, nem est cristalizado, o que caracteriza a natureza dinmica e processual de todo e qualquer currculo.

    Assim, nessas diretrizes, reconhece-se que, alm de seus contedos mais estveis, as disciplinas escolares incorporam e atualizam contedos decorrentes do movimento das relaes de produo e dominao que determinam relaes sociais, geram pesquisas cientficas e trazem para o debate questes polticas e filosficas emergentes.

    Tais contedos, nas ltimas dcadas, vinculam-se tanto diversidade tnico-cultural6 quanto aos problemas sociais contemporneos7 e tm sido incorporados ao currculo escolar como temas que transversam as disciplinas, impostos a todas elas de forma artificial e arbitrria.

    Em contraposio a essa perspectiva, nestas diretrizes, prope-se que esses temas sejam abordados pelas disciplinas que lhes so afins, de forma contextualizada, articulados com os respectivos objetos de estudo dessas disciplinas e sob o rigor de seus referenciais terico-conceituais.

    Nessa concepo de currculo, as disciplinas da Educao Bsica tero, em seus contedos estruturantes, os campos de estudo que as identificam como conhecimento histrico. Dos contedos estruturantes organizam-se os contedos bsicos a serem trabalhados por srie, compostos tanto pelos assuntos mais estveis e permanentes da disciplina quanto pelos que se apresentam em funo do movimento histrico e das atuais relaes sociais. Esses contedos, articulados entre si e fundamentados nas respectivas orientaes terico-metodolgicas, faro parte da proposta pedaggica curricular das escolas.

    A partir da proposta pedaggica curricular, o professor elaborar seu plano de trabalho docente, documento de autoria, vinculado realidade e s necessidades de suas diferentes turmas e escolas de atuao. No plano, se explicitaro os contedos especficos a serem trabalhados nos bimestres, trimestres ou semestres letivos, bem como as especificaes metodolgicas que fundamentam a relao

    O envelhecimento do contedo e a evoluo de paradigmas na criao de saberes implica a seleo

    de elementos dessas reas relativos estrutura do saber, nos mtodos de investigao, nas tcnicas

    de trabalho, para continuar aprendendo e em diferentes linguagens. O contedo relevante de uma

    matria composto dos aspectos mais estveis da mesma e daquelas capacidades necessrias para

    continuar tendo acesso e renovar o conhecimento adquirido (SACRISTN, 2000, p. 152-153).

    6 Nesse aspecto destaca-se a necessidade do trabalho pedaggico com a histria da cultura afro-brasileira, africana e indgena, conforme preconizam as leis 10.639/03 e 11.645/08.

    7 Dentre os problemas sociais contemporneos esto a questo ambiental, a necessidade do enfrentamento a violncia, os problemas relacionados sexualidade e drogadio.

    ensino/aprendizagem, alm dos critrios e instrumentos que objetivam a avaliao no cotidiano escolar.

    3.2 A INTERDISCIPLINARIDADE

    Anunciar a opo poltico-pedaggica por um currculo organizado em disciplinas que devem dialogar numa perspectiva interdisciplinar requer que se explicite qual concepo de interdisciplinaridade e de contextualizao o fundamenta, pois esses conceitos transitam pelas diferentes matrizes curriculares, das conservadoras s crticas, h muitas dcadas.

    Nestas diretrizes, as disciplinas escolares so entendidas como campos do conhecimento, identificam-se pelos respectivos contedos estruturantes e por seus quadros tericos conceituais. Considerando esse constructo terico, as disciplinas so o pressuposto para a interdisciplinaridade. A partir das disciplinas, as relaes interdisciplinares se estabelecem quando:

    conceitos, teorias ou prticas de uma disciplina so chamados discusso e auxiliam a compreenso de um recorte de contedo qualquer de outra disciplina; ao tratar do objeto de estudo de uma disciplina, buscam-se nos quadros conceituais de outras disciplinas referenciais tericos que possibilitem uma abordagem mais abrangente desse objeto.

    Desta perspectiva, estabelecer relaes interdisciplinares no uma tarefa que se reduz a uma readequao metodolgica curricular, como foi entendido, no passado, pela pedagogia dos projetos. A interdisciplinaridade uma questo epistemolgica e est na abordagem terica e conceitual dada ao contedo em estudo, concretizando-se na articulao das disciplinas cujos conceitos, teorias e prticas enriquecem a compreenso desse contedo.

    No ensino dos contedos escolares, as relaes interdisciplinares evidenciam, por um lado, as limitaes e as insuficincias das disciplinas em suas abordagens isoladas e individuais e, por outro, as especificidades prprias de cada disciplina para a compreenso de um objeto qualquer. Desse modo, explicita-se que as disciplinas escolares no so hermticas, fechadas em si, mas, a partir de suas especialidades, chamam umas s outras e, em conjunto, ampliam a abordagem dos contedos de modo que se busque, cada vez mais, a totalidade, numa prtica pedaggica que leve em conta as dimenses cientfica, filosfica e artstica do conhecimento.

    Tal pressuposto descarta uma interdisciplinaridade radical ou uma antidisciplinaridade8, fundamento das correntes tericas curriculares denominadas ps-modernas.

    8 A ideia de antidisciplinaridade fruto das discusses tericas de alguns estudos culturais educacionais. Tais estudos constituem um novo campo do saber que, entre outras caractersticas, prope refletir sobre a extenso das noes de educao, pedagogia e currculo para alm dos muros da escola; a desnaturalizao de teorias e disciplinas instaladas no aparato escolar; a visibilidade de dispositivos disciplinares na escola e fora dela; a ampliao e complexificao das discusses sobre identidade e diferena e sobre

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    Ento, o conhecimento que identifica uma cincia e uma disciplina escolar histrico, no estanque, nem est cristalizado, o que caracteriza a natureza dinmica e processual de todo e qualquer currculo.

    Assim, nessas diretrizes, reconhece-se que, alm de seus contedos mais estveis, as disciplinas escolares incorporam e atualizam contedos decorrentes do movimento das relaes de produo e dominao que determinam relaes sociais, geram pesquisas cientficas e trazem para o debate questes polticas e filosficas emergentes.

    Tais contedos, nas ltimas dcadas, vinculam-se tanto diversidade tnico-cultural6 quanto aos problemas sociais contemporneos7 e tm sido incorporados ao currculo escolar como temas que transversam as disciplinas, impostos a todas elas de forma artificial e arbitrria.

    Em contraposio a essa perspectiva, nestas diretrizes, prope-se que esses temas sejam abordados pelas disciplinas que lhes so afins, de forma contextualizada, articulados com os respectivos objetos de estudo dessas disciplinas e sob o rigor de seus referenciais terico-conceituais.

    Nessa concepo de currculo, as disciplinas da Educao Bsica tero, em seus contedos estruturantes, os campos de estudo que as identificam como conhecimento histrico. Dos contedos estruturantes organizam-se os contedos bsicos a serem trabalhados por srie, compostos tanto pelos assuntos mais estveis e permanentes da disciplina quanto pelos que se apresentam em funo do movimento histrico e das atuais relaes sociais. Esses contedos, articulados entre si e fundamentados nas respectivas orientaes terico-metodolgicas, faro parte da proposta pedaggica curricular das escolas.

    A partir da proposta pedaggica curricular, o professor elaborar seu plano de trabalho docente, documento de autoria, vinculado realidade e s necessidades de suas diferentes turmas e escolas de atuao. No plano, se explicitaro os contedos especficos a serem trabalhados nos bimestres, trimestres ou semestres letivos, bem como as especificaes metodolgicas que fundamentam a relao

    O envelhecimento do contedo e a evoluo de paradigmas na criao de saberes implica a seleo

    de elementos dessas reas relativos estrutura do saber, nos mtodos de investigao, nas tcnicas

    de trabalho, para continuar aprendendo e em diferentes linguagens. O contedo relevante de uma

    matria composto dos aspectos mais estveis da mesma e daquelas capacidades necessrias para

    continuar tendo acesso e renovar o conhecimento adquirido (SACRISTN, 2000, p. 152-153).

    6 Nesse aspecto destaca-se a necessidade do trabalho pedaggico com a histria da cultura afro-brasileira, africana e indgena, conforme preconizam as leis 10.639/03 e 11.645/08.

    7 Dentre os problemas sociais contemporneos esto a questo ambiental, a necessidade do enfrentamento a violncia, os problemas relacionados sexualidade e drogadio.

    ensino/aprendizagem, alm dos critrios e instrumentos que objetivam a avaliao no cotidiano escolar.

    3.2 A INTERDISCIPLINARIDADE

    Anunciar a opo poltico-pedaggica por um currculo organizado em disciplinas que devem dialogar numa perspectiva interdisciplinar requer que se explicite qual concepo de interdisciplinaridade e de contextualizao o fundamenta, pois esses conceitos transitam pelas diferentes matrizes curriculares, das conservadoras s crticas, h muitas dcadas.

    Nestas diretrizes, as disciplinas escolares so entendidas como campos do conhecimento, identificam-se pelos respectivos contedos estruturantes e por seus quadros tericos conceituais. Considerando esse constructo terico, as disciplinas so o pressuposto para a interdisciplinaridade. A partir das disciplinas, as relaes interdisciplinares se estabelecem quando:

    conceitos, teorias ou prticas de uma disciplina so chamados discusso e auxiliam a compreenso de um recorte de contedo qualquer de outra disciplina; ao tratar do objeto de estudo de uma disciplina, buscam-se nos quadros conceituais de outras disciplinas referenciais tericos que possibilitem uma abordagem mais abrangente desse objeto.

    Desta perspectiva, estabelecer relaes interdisciplinares no uma tarefa que se reduz a uma readequao metodolgica curricular, como foi entendido, no passado, pela pedagogia dos projetos. A interdisciplinaridade uma questo epistemolgica e est na abordagem terica e conceitual dada ao contedo em estudo, concretizando-se na articulao das disciplinas cujos conceitos, teorias e prticas enriquecem a compreenso desse contedo.

    No ensino dos contedos escolares, as relaes interdisciplinares evidenciam, por um lado, as limitaes e as insuficincias das disciplinas em suas abordagens isoladas e individuais e, por outro, as especificidades prprias de cada disciplina para a compreenso de um objeto qualquer. Desse modo, explicita-se que as disciplinas escolares no so hermticas, fechadas em si, mas, a partir de suas especialidades, chamam umas s outras e, em conjunto, ampliam a abordagem dos contedos de modo que se busque, cada vez mais, a totalidade, numa prtica pedaggica que leve em conta as dimenses cientfica, filosfica e artstica do conhecimento.

    Tal pressuposto descarta uma interdisciplinaridade radical ou uma antidisciplinaridade8, fundamento das correntes tericas curriculares denominadas ps-modernas.

    8 A ideia de antidisciplinaridade fruto das discusses tericas de alguns estudos culturais educacionais. Tais estudos constituem um novo campo do saber que, entre outras caractersticas, prope refletir sobre a extenso das noes de educao, pedagogia e currculo para alm dos muros da escola; a desnaturalizao de teorias e disciplinas instaladas no aparato escolar; a visibilidade de dispositivos disciplinares na escola e fora dela; a ampliao e complexificao das discusses sobre identidade e diferena e sobre

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    3.3 A CONTEXTUALIZAO SCIO-HISTRICA

    A interdisciplinaridade est relacionada ao conceito de contextualizao scio-histrica como princpio integrador do currculo. Isto porque ambas propem uma articulao que v alm dos limites cognitivos prprios das disciplinas escolares, sem, no entanto, recair no relativismo epistemolgico. Ao contrrio, elas reforam essas disciplinas ao se fundamentarem em aproximaes conceituais coerentes e nos contextos scio-histricos, possibilitando as condies de existncia e constituio dos objetos dos conhecimentos disciplinares.

    De acordo com Ramos [p. 01, 2004?],

    Sob algumas abordagens, a contextualizao, na pedagogia, compreendida como a insero

    do conhecimento disciplinar em uma realidade plena de vivncias, buscando o