ensaio de tracao

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ESTUDO COMPARATIVO DO COMPORTAMENTO MECÂNICO EM TRAÇÃO E FADIGA DE AÇOS COM MICROESTRUTURAS MULTIFÁSICAS P. R. N. Pivato 1 , A. J. Abdalla 2 , C. A. R. P. Baptista 1 , T. M. Hashimoto 3 , M. S. Pereira 3 , R. M. Anazawa 2, 3 1 Escola de Engenharia de Lorena - EEL/USP, Cx. postal 116, CEP 12602-810, Lorena/SP. Email: [email protected] 2 Inst.Estudos Avançados - IEAv / Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial /CTA 3 Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá - FEG/UNESP RESUMO Os aços comerciais 4340 e 300M são empregados nas indústrias aeronáutica e espacial. O presente trabalho avalia os efeitos da microestrutura nas propriedades mecânicas em tração e fadiga destes aços. Microestruturas multifásicas com diferentes teores de martensita, bainita, ferrita e austenita retida foram produzidas por tratamentos térmicos isotérmicos e intercríticos. As propriedades mecânicas foram avaliadas por meio de ensaios de tração e fadiga uniaxial. Os resultados mostraram que o comportamento mecânico em tração foi fortemente afetado pela microestrutura, enquanto nas curvas de fadiga o efeito não foi tão significativo. Para ambos os aços, as microestruturas predominantemente martensíticas mostraram melhor combinação das propriedades mecânicas em tração, mas apresentaram o pior comportamento em fadiga. Análises via MEV permitiram determinar os micromecanismos de fratura associados às condições microestruturais. Palavras-chave: aços mutifásicos, tratamentos térmicos, fadiga. INTRODUÇÃO Os aços comerciais AISI 4340 e 300M são amplamente utilizados nas indústrias aeronáutica e espacial por combinarem resistência e tenacidade, podendo trabalhar nos mais variados tipos e níveis de solicitações. Eles são considerados aços de ultra-alta resistência mecânica devido aos elevados valores dos limites de 17º CBECIMat - Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais, 15 a 19 de Novembro de 2006, Foz do Iguaçu, PR, Brasil. 6716

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ESTUDO COMPARATIVO DO COMPORTAMENTO MECÂNICO EM TRAÇÃO E FADIGA DE AÇOS COM MICROESTRUTURAS MULTIFÁSICAS

P. R. N. Pivato1, A. J. Abdalla2, C. A. R. P. Baptista1, T. M. Hashimoto3,

M. S. Pereira3, R. M. Anazawa2, 3 1 Escola de Engenharia de Lorena - EEL/USP, Cx. postal 116, CEP 12602-810,

Lorena/SP. Email: [email protected] 2 Inst.Estudos Avançados - IEAv / Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial /CTA

3 Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá - FEG/UNESP

RESUMO

Os aços comerciais 4340 e 300M são empregados nas indústrias aeronáutica e

espacial. O presente trabalho avalia os efeitos da microestrutura nas propriedades

mecânicas em tração e fadiga destes aços. Microestruturas multifásicas com

diferentes teores de martensita, bainita, ferrita e austenita retida foram produzidas

por tratamentos térmicos isotérmicos e intercríticos. As propriedades mecânicas

foram avaliadas por meio de ensaios de tração e fadiga uniaxial. Os resultados

mostraram que o comportamento mecânico em tração foi fortemente afetado pela

microestrutura, enquanto nas curvas de fadiga o efeito não foi tão significativo. Para

ambos os aços, as microestruturas predominantemente martensíticas mostraram

melhor combinação das propriedades mecânicas em tração, mas apresentaram o

pior comportamento em fadiga. Análises via MEV permitiram determinar os

micromecanismos de fratura associados às condições microestruturais.

Palavras-chave: aços mutifásicos, tratamentos térmicos, fadiga.

INTRODUÇÃO

Os aços comerciais AISI 4340 e 300M são amplamente utilizados nas

indústrias aeronáutica e espacial por combinarem resistência e tenacidade, podendo

trabalhar nos mais variados tipos e níveis de solicitações. Eles são considerados

aços de ultra-alta resistência mecânica devido aos elevados valores dos limites de

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escoamento e resistência à tração(1,2). O aço 4340 apresenta, boa forjabilidade e

usinabilidade, facilidade para tratamento térmico e baixa susceptibilidade à

fragilização por hidrogênio, além de resistência à fadiga, corrosão, corrosão sob

tensão, nucleação e propagação de trincas(1). O aço 300M vem sendo empregado

como substituto do 4340 devido a sua maior resistência mecânica em tração. Ele

difere do 4340 por conter alto teor de silício, teores de carbono e molibdênio

ligeiramente maiores e receber adição de vanádio. Estas modificações, aliadas ao

processamento via fusão por indução a vácuo e refusão a arco, proporcionam

melhores propriedades ao aço 300M(3). De fato, a tecnologia do aço 300M foi

desenvolvida como um melhoramento do aço 4340, baseando-se no estudo do

efeito dos elementos de liga nos aços em propriedades mecânicas como a

tenacidade, que são sensíveis aos tempos e temperaturas de austenitização e

revenimento(4). Embora seja consensual o avanço tecnológico do aço 300M em

relação ao 4340, principalmente ao que concerne à tenacidade(2), em diversas

aplicações ainda predomina o emprego do aço 4340, provavelmente devido a

fatores como o custo unitário dos componentes(1).

Esses aços são usualmente empregados na condição “temperado e revenido”,

em que a temperatura e o tempo de revenimento da microestrutura

predominantemente martensítica são escolhidos de acordo com o nível de dureza

requerido. Pelo fato de as transformações metalúrgicas ocorrerem a taxas

relativamente baixas, os tratamentos de têmpera e revenimento podem ser

empregados em peças com até 100 mm de espessura(5). A adoção de novos

tratamentos térmicos isotérmicos e intercríticos permite obter uma microestrutura

multifásica composta, além da martensita, pelas fases ferrita e/ou bainita, contendo

ainda teores expressivos de austenita retida(3). Além da fração volumétrica das

fases, esses tratamentos são empregados para controlar sua morfologia e o

tamanho de grão(6,7). A microestrutura multifásica combina microconstituintes duros

e dúcteis, abrindo um novo leque de possibilidades ao permitir ajustar os níveis de

resistência e ductilidade visando melhorar as propriedades mecânicas como

tenacidade e resistência à fadiga do aço(7,8).

A ocorrência de falhas por fadiga é uma das principais preocupações

relacionadas ao emprego estrutural de materiais. Dentre os vários métodos

existentes para a descrição dos diferentes aspectos do comportamento em fadiga, a

abordagem tradicional baseada nas conhecidas curvas S/N (relações tensão-vida) é

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a mais empregada em avaliações comparativas de materiais. Um trabalho recente(9)

demonstrou que a vida em fadiga (avaliada por meio de curvas S/N) do aço AISI

4140, submetido a diferentes tratamentos térmicos de têmpera e revenido, pode

sofrer alterações de até duas ordens de grandeza. Para se obter as curvas S/N,

lotes de corpos-de-prova cuidadosamente preparados são submetidos a

carregamentos cíclicos estacionários até a ruptura, relacionando-se um valor

nominal de tensão (que pode ser a amplitude ou a tensão máxima do ciclo) com o

número de ciclos para a falha. O conjunto de ensaios pode ser feito a um valor fixo

da tensão média ou da razão de tensão R (relação entre as tensões mínima e

máxima do ciclo)(5,10).

O presente trabalho tem como objetivo avaliar, por meio de curvas S/N, o

comportamento em fadiga dos aços AISI 4340 e 300M em diferentes condições

microestruturais. Vários tratamentos térmicos foram avaliados em um trabalho

anterior(7), em termos da microestrutura e propriedades em tração, e os mais

promissores foram selecionados para o presente estudo. Assim, os aços, após

austenitizados a 900°C, foram transformados por meio de tratamento isotérmico em

temperatura na região de formação da bainita (320°C) e tratamento na temperatura

intercrítica de 760°C. Os resultados dos ensaios de fadiga são relacionados às

propriedades mecânicas em tração e às características fractográficas observadas

em cada condição microestrutural.

MATERIAIS E MÉTODOS

A composição química dos aços AISI 4340 e 300M, determinada em um

trabalho anterior(7), encontra-se reproduzida na Tabela 1. Os corpos-de-prova para

os ensaios de fadiga, com seção retangular de espessura 3,2 mm e raio contínuo

entre as extremidades de agarre resultando em 6,35 mm de largura na seção de

teste, foram confeccionados segundo a norma ASTM E466. Todos os corpos-de-

prova foram inicialmente submetidos ao tratamento térmico de recozimento,

permanecendo a 950°C por 2 horas, com resfriamento controlado até 300°C

(20°C/min). Foi utilizado neste tratamento um forno GCA a vácuo com atmosfera

controlada. As amostras foram em seguida divididas em 3 lotes. O primeiro lote foi

mantido na condição de recozimento. O segundo foi austenitizado a 900°C por 20

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minutos e em seguida permaneceu por 10 minutos na temperatura intercrítica de

760°C, a partir da qual foi temperado em óleo, num procedimento que será

designado neste trabalho por tratamento intercrítico (IC). O terceiro lote, após

austenitizado de forma idêntica ao segundo, permaneceu por 15 minutos a 320°C e

foi em seguida resfriado em água, sendo este procedimento designado por

tratamento isotérmico (IT).

Tabela 1. Composição química dos aços 4340 e 300M (% em peso).

C S P Si Mn Cr Ni Mo Al V Cu

4340 0,39 0,0010 0,017 0,26 0,64 0,80 1,82 0,22 - - -

300M 0,39 0,0005 0,009 1,78 0,76 0,76 1,69 0,40 0,003 0,08 0,14

Após os tratamentos térmicos, os corpos-de-prova foram preparados com uma

seqüência de lixas com granulações de 220 a 600, resultando em uma rugosidade

superficial RA em torno de 0,1 µm. Para realizar os ensaios de fadiga foi utilizado um

sistema servo-hidráulico MTS 810.23M com 250 kN de capacidade. Adotou-se o

modo de controle de força e o carregamento foi aplicado com forma de onda

senoidal. Os ensaios foram realizados ao ar, em temperatura ambiente, com

freqüência de 20 Hz e razão de tensão (mínima/máxima) R = 0,1. Os níveis de

tensão máxima foram escolhidos de modo a situar as curvas S/N na faixa de 104 a

106 ciclos. Foram realizados pelo menos 16 ensaios para cada condição de material.

Após os ensaios, as superfícies de fratura de alguns dos corpos-de-prova foram

observadas ao microscópio eletrônico de varredura (MEV). Nestas análises foi

utilizado um equipamento LEO 1460 VP, operando no modo de elétrons

secundários.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As microestruturas obtidas através dos tratamentos térmicos adotados nesta

pesquisa foram semelhantes para os dois aços estudados e descritas

detalhadamente em trabalho anterior(7). As microestruturas recozidas apresentam-se

bastante complexas, sendo constituídas de martensita, bainita e carbonetos,

contendo ainda porções de ferrita e austenita retida. O tratamento IC, que privilegiou

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a formação da martensita, resultou ainda na formação da fase ferrítica, além da

bainita formada no resfriamento contínuo. A microestrutura obtida através do

tratamento IT é uma matriz complexa formada principalmente por bainita e ferrita

acicular.

PROPRIEDADES EM TRAÇÃO

As transformações microestruturais causadas pelos tratamentos térmicos foram

responsáveis por alterações nas propriedades mecânicas dos aços estudados. Na

Tabela 2 são mostrados os resultados de ensaios de tração(7), a serem levados em

conta na avaliação comparativa do comportamento em fadiga dos materiais. Os

níveis de resistência mecânica mais elevados do aço 300M em relação ao 4340

estão associados à presença do vanádio e de um alto teor de silício(3). Os resultados

dos ensaios de tração mostram que os tratamentos IC e IT promoveram aumentos

importantes dos limites de escoamento (σe) e resistência (σt) do aço AISI 4340, em

relação ao material recozido, e sem perda significativa da ductilidade medida pelo

alongamento (∆L) e pela estricção (RA). A resistência mecânica do aço 300M

também teve um ganho significativo com o tratamento IC, mas à custa de uma maior

redução da ductilidade. Observa-se, porém, que o tratamento IT promoveu uma

diminuição nos limites de escoamento e resistência deste aço, acompanhada

também por perda de ductilidade em relação ao material recozido. As propriedades

mecânicas do aço 300M nesta condição foram associadas à formação de bainita

superior e à presença de austenita retida. A boa ductilidade apresentada por ambos

os aços em decorrência do tratamento IC foi associada à fase ferrítica, enquanto a

martensita e bainita formadas possibilitaram atingir os altos níveis de resistência

observados.

Tabela 2. Propriedades mecânicas em tração dos aços estudados.

σe (MPa) σt (MPa) ∆L (%) RA (%) Tratamento

Térmico 4340 300M 4340 300M 4340 300M 4340 300M

Recozido 899 1.531 1.073 1.673 14,2 17,7 24 32

IC 1.672 2.035 2.028 2.154 13,1 14,8 27 41

IT 1.402 1.387 1.478 1.592 14,3 10,7 32 37

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COMPORTAMENTO EM FADIGA

As curvas S/N dos aços 4340 e 300M, nas diferentes condições

microestruturais, são apresentadas respectivamente nas Figuras 1 e 2. Para maior

clareza na visualização dos dados, plotaram-se os valores médios (média aritmética)

da vida em fadiga para cada nível de tensão máxima. Pode-se observar que ambos

os aços sofreram alterações semelhantes na resistência à fadiga em decorrência

dos tratamentos térmicos. Assim, o tratamento IC promove uma queda na curva S/N

em relação à condição recozida, sendo possível ainda observar que este efeito é

mais acentuado para o aço 300M. Por outro lado, o comportamento dos aços após o

tratamento IT é muito semelhante ao dos materiais recozidos. Relacionando-se

esses resultados com as propriedades em tração, fica evidente que a microestrutura

formada através do tratamento IC, apesar de apresentar a melhor combinação de

resistência e ductilidade, é a que possui o pior desempenho em fadiga.

10000 100000 1000000500

600

700

800

900

1000

1100

1200

1300

1400

S máx

[MP

a]

N [ciclos]

AISI 4340RecozidoICIT

Figura 1. Curvas de vida em fadiga do aço 4340.

A aparente discrepância entre os comportamentos em tração e fadiga desses

aços pode ser discutida em termos das microestruturas resultantes dos tratamentos

térmicos. Dentre os tratamentos térmicos empregados, o tratamento IC é o que

promove a formação de microconstituintes com a maior diferença de dureza entre si,

uma vez que neste tratamento é privilegiada uma combinação de fases contendo

principalmente martensita e ferrita. Como conseqüência, ocorre uma maior

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incompatibilidade de deformação entre as fases, fato que pode facilitar a nucleação

de trincas durante a aplicação de carregamentos cíclicos.

10000 100000 1000000700

800

900

1000

1100

1200

1300

1400

1500

N [ciclos]

300MRecozidoICIT

S máx

[MPa

]

Figura 2. Curvas de vida em fadiga do aço 300M.

Aplicando-se o modelo log-linear no ajuste numérico dos conjuntos de pontos

experimentais, pode-se obter estimativas da tensão Smax correspondentes a níveis

específicos de vida em fadiga. A Tabela 3 mostra os resultados desses cálculos para

3 níveis de vida: 1×104, 1×105 e 1×106 ciclos. Os resultados são apresentados em

termos absolutos e normalizados em relação ao limite de escoamento para cada

condição microestrutural. Esta tabela permite concluir que, em termos absolutos, o

aço 300M na condição IT é o que apresenta os maiores níveis de resistência à

fadiga. Porém, em relação ao limite de escoamento, o aço 4340 na condição

recozida é o que possui o melhor comportamento em fadiga.

Tabela 3. Resistência à fadiga para diferentes níveis de vida.

104 ciclos 105 ciclos 106 ciclos Condição do Material Smax (MPa) Smax/σe Smax (MPa) Smax/σe Smax (MPa) Smax/σe

Recozido 1.047 1,16 901 1,00 755 0,84 IC 1.165 0,70 927 0,55 689 0,41

4340

IT 1.110 0,79 916 0,65 722 0,51 Recozido 1.259 0,82 1.057 0,69 855 0,56

IC 997 0,49 893 0,44 789 0,39

300M IT 1.147 0,83 1.057 0,76 967 0,70

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Page 8: Ensaio de tracao

ANÁLISE FRACTOGRÁFICA

A Figura 3 mostra o aspecto macroscópico típico da fratura dos aços.

Predomina a aparência de fratura frágil, com pouca deformação e propagação em

planos bem definidos. O aço 4340 recozido (Fig.3a) apresentou característica típica

interessante: no momento da fratura por sobrecarga aparece uma trinca secundária

que não se desenvolve, mas deixa bem demarcada a região. O aço 300M recozido

(Fig.3b) apresenta alguma redução de área na região de fratura final. O aço 4340,

na condição de tratamento IC (Fig.3c), apresentou na maioria dos ensaios um

aspecto marcante, de mudança de direção no momento da propagação instável da

trinca e ruptura final por sobrecarga. Neste caso, o desvio se dá devido às partículas

duras (martensita ou bainita) que servem como obstáculo para as trincas em

propagação. A Figura 3d mostra uma superfície de fratura típica observada nos aços

tratados na condição IT: uma superfície plana, sem deformação aparente e com

clara distinção entre a região de propagação da trinca e a região de ruptura final.

(a) Aço 4340 Recozido

(b) Aço 300M Recozido

(c) Aço 4340 tratamento IC

(d) Aço 300M tratamento IT

Figura 3. Aspectos macroscópicos das superfícies de fratura por fadiga.

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As regiões de início e propagação da trinca nos aços recozidos (Figura 4)

evidenciam micromecanismos semelhantes. As trincas se desenvolvem na direção

radial através da extração de partículas das fases duras, formando picos e vales.

Notam-se microdeformações localizadas, resultantes das fases mais dúcteis que

envolviam as fases duras. Nos aços submetidos ao tratamento IC (Figura 5) também

se formam picos e vales nestas regiões, porém com menor intensidade. Nota-se um

refinamento no tamanho das partículas, com aparecimento de fases aciculares. As

deformações estão reduzidas a regiões ainda mais restritas. Aparecem também

alguns grãos rompidos de forma transgranular, evidenciando redução na ductilidade.

(a) Aço 4340

(b) Aço 300M

Figura 4. Região de início da trinca nos aços recozidos.

(a) Aço 4340

(b) Aço 300M

Figura 5. Região de início da trinca nos aços submetidos ao tratamento IC.

Para o tratamento IT, que produziu em ambos os aços uma microestrutura

predominantemente bainítica, a propagação inicial da trinca também ocorreu na

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Page 10: Ensaio de tracao

direção radial, formando picos e vales menos profundos que os observados na

condição recozida (ver Figura 6b). Nota-se, no entanto, que o micromecanismo

ativado difere do observado no aço recozido. Observa-se na Figura 6a que a

propagação ocorreu com a formação de degraus, deixando expostas plaquetas do

constituinte bainítico e pequenos alvéolos que circundam as facetas de grãos

expostos. Este aspecto dúctil ocorre, provavelmente, devido à austenita retida.

(a) Aço 4340

(b) Aço 300M

Figura 6. Região de início da trinca nos aços submetidos ao tratamento IT.

A Figura 7 mostra a fratura final, por sobrecarga, dos materiais estudados. O

aço 4340 recozido apresentou aspecto frágil, facetas de clivagem, marcas de rios,

presença de precipitados e trincas secundárias (Fig.7a). O aço 300M recozido

apresentou micromecanismos de fratura mais dúcteis. Nota-se a presença de muitos

“dimples” e deformações superficiais (Fig.7b). Na fratura final do aço 4340 com

tratamento IC (Fig.7c) aparece maior quantidade de alvéolos, devido à existência de

finas camadas de ferrita (formada na temperatura intercrítica) entre os grãos

martensíticos e a bainita. Em detalhe nota-se uma partícula solta e algumas trincas

presentes. No aço 300M (Fig.7d), não houve a formação da fase dúctil, devido à fácil

temperabilidade do mesmo. Observam-se algumas partículas soltas, trincas

secundárias e aparência generalizada de fratura transgranular, com rara presença

de alvéolos. As Figuras 7e e 7f, referentes ao tratamento IT, mostram a estrutura

bainítica rompida. No aço 300M (Fig.7f) os grãos são mais refinados e aciculares.

No aço 4340 (Fig.7e), nota-se que a bainita tem formato mais lenticular e que a fase

dúctil que a circunda tem tamanho maior, permitindo a formação de alvéolos

localizados.

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(a) Aço 4340 recozido

(b) Aço 300M recozido

(c) Aço 4340, tratamento IC

(d) Aço 300M, tratamento IC

(e) Aço 4340, tratamento IT

(f) Aço 300M, tratamento IT

Figura 7. Região de ruptura final por sobrecarga dos aços estudados.

CONCLUSÕES

O tratamento térmico IC, apesar de propiciar a melhor combinação de

resistência à tração e ductilidade nos aços 4340 e 300M, resulta em queda na

resistência à fadiga destes aços. O refinamento de grãos e a complexa coexistência

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de fases duras (bainita e martensita) e dúcteis (ferrita e austenita) multiplica a

quantidade de pontos críticos onde se iniciam as microtrincas. Em termos absolutos,

o aço 300M na condição IT apresenta a maior resistência à fadiga dentre os

materiais estudados. Em relação ao limite de escoamento, o aço 4340 recozido

apresenta o melhor comportamento em fadiga. Ficou evidente, porém, a queda na

resistência relativa à fadiga dos aços com microestrutura multifásica, quando

comparados aos aços recozidos. Todas as condições de material estudadas

apresentam fratura por fadiga com aspecto macroscópico frágil. Porém, os

micromecanismos ativados diferem entre as condições devido às particularidades

das estruturas multifásicas formadas nos tratamentos térmicos.

REFERÊNCIAS

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COMPARATIVE ANALYSIS OF MONOTONIC AND CYCLIC MECHANICAL

BEHAVIOR OF MULTI-PHASE STEELS

ABSTRACT

The aim of the present work is to perform a comparative study of the effects of

microstructure on the mechanical properties of the commercial steels AISI 4340 and

300M, widely employed in the aerospace industry. To do so, the materials were

intercritically and isothermally heat treated in order to achieve multiphase

microsctructures containing different amounts of martensite, bainite, ferrite and

retained austenite. The mechanical properties of the materials were evaluated by

means of tensile and fatigue tests. The results showed that the tensile properties of

these materials are dramatically changed by the microstructure, while the fatigue

behavior is not significantly affected. For both steels, the martensitic microstructure,

which showed the best compromise of strength and ductility, shows however the

worst fatigue behavior. The fracture surfaces of the samples were observed via SEM

in order to reveal the fracture mechanisms presented by these steels.

Key-words: Multi-phase steels, heat treatments, fatigue resistance.

17º CBECIMat - Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais, 15 a 19 de Novembro de 2006, Foz do Iguaçu, PR, Brasil.

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