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Engenheiro Coelho, SP 2º Semestre de 2015 Volume 24 Número 2

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Engenheiro Coelho, SP 2º Semestre de 2015 Volume 24 Número 2

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Editor: Rodrigo FollisEditor associado: Richard Valença

Conselho editorial: José Paulo Martini, Afonso Cardoso, Elizeu de Sousa, Adolfo Suárez,Emilson dos Reis, Rodrigo Follis, Ozeas C. Moura, Betânia Lopes, Martin Kuhn.

A Unaspress está sediada no Unasp, campus Engenheiro Coelho, SP.

Centro Universitário Adventista de São PauloFundado em 1915 — www.unasp.edu.br

Missão: Educar no contexto dos valores bíblicos para um viver pleno e para a excelência no serviço a Deus e à humanidade.

Visão: Ser uma instituição educacional reconhecida pela excelência nos serviços prestados, pelos seus elevados padrões éticos e pela qualidade pessoal e profissional de seus egressos.

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EXPEDIENTE

Acta Científica. Ciências Humanas, Engenheiro Coelho-SP, volume 24, número 2, Setembro - Dezembro de 2015.ISSN: 1519-9800.

Criada em 2002, a Acta Científica. Ciências Humanas tem trazido semestralmente ao leitor, ao longo dos úl-timos 16 anos, conteúdo de qualidade e confiabilidade sempre com temáticas interdisciplinares. A revista continuará a honrar seus compromissos com a Ciência. Entretanto, uma mudança bastante interessante foi introduzida: a Acta Científica Ciências Humanas (ACCH) mudou de assunto. A partir daquele ano, todas as publicações da revista passaram a ser direcionadas apenas ao mundo do Direito! E os frutos já começaram a ser vistos: a revista foi avaliada como B5 em Direito na última avaliação Qualis/Capes em 2017.

MISSÃO

Apresentar publicações inéditas na forma de artigos, ensaios, relatos de pesquisas de campo, entrevistas e re-senhas, a fim de colaborar com a divulgação de trabalhos científicos relacionados com assuntos de Direito e suas nuances, e fomentar o debate sobre as questões atuais no cenário educacional no país. A Acta Científica. Ciências Humanas aceita publicações em português, inglês e espanhol.

SISTEMA DE AVALIAÇÃO DE TRABALHOS

As contribuições são apreciadas, em primeiro lugar, pelo editor e editor associado, objetivando a ve-rificação dos requisitos formais de apresentação de trabalhos. Uma vez aceitos em primeira instância, os textos, sem identificação de autoria, são submetidos a dois pareceristas, membros do Conselho Editorial Consultivo. Em caso de pareceres contrários, o texto é submetido a um terceiro avaliador. Os resultados são comunicados aos autores, tanto em caso de rejeição, como de aprovação ou aprovação com necessidade de ajuste.

EDITOR-CHEFE

Dr. Carlos Alexandre Hees - Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)

COMITÊ EDITORIAL

Dr. Dilson Cavalcanti Batista Neto - Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)Dr. Carlos Alberto Ferri - Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)

CONSELHO EDITORIAL CONSULTIVO

Dra. Aparecida Luzia Alzira Zuin - Universidade Federal de Rondônia (UNIR)Dr. Carlos Alexandre Hees - Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)Dra. Denise Leal Fontes Albano - Universidade Federal de Sergipe (UFS)Dr. Dilson Cavalcanti Batista Neto - Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)Dr. José Antonio Remédio - Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)Dr. José Luiz Gavião de Almeida - Universidade de São Paulo (USP)Dr. Osvaldo Alves de Castro Filho - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS)Dr. Rennan Faria Kruger Thamay - Faculdade Autônoma de Direito (Fadisp)Dr. Ricardo Maurício Freire Soares - Universidade Federal da Bahia (UFBA)Dra. Verônica Teixeira Marques - Universidade Tiradentes (Unit) Sergipe/AlagoasDr. Carlos Alberto Ferri - Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)

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A Revista Acta Científica utiliza o Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas (SEER), software desenvolvido para a construção e gestão de publicações periódicas eletrônicas, traduzido e custo-mizado pelo Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT).

Esta revista se encontra sob a Licença Creative Commons Attribution 4.0.O Conselho Editorial não assume a responsabilidade pelo material publicado nesta revista. Os trabalhos publicados representam o pensamento dos autores.

Acta Científica. Ciências Humanas — Centro Universitário Adventista de São Paulo, v. 24, n. 2. (Setembro - Dezembro de 2015). Engenheiro Coelho: Unaspress — Imprensa Universitária Adventista, 2015.

Semestral

ISSN: 1519-9800.1. Interdisciplinar2. Ciências Humanas3. Ciências Sociais Aplicadas

A1882

FICHA CATALOGRÁFICA

UNASPRESSEditoração: Rodrigo FollisProjeto gráfico: Marcio TrinidadeDiagramação: Kenny ZukowskiRevisão e normatização: Nathália Lima

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SUMÁRIO

7 CAMPANHA ELEITORAL E REDES SOCIAIS: PARTICIPAÇÃO POPULAR POTENCIALIZADA E CONCRETIZAÇÃO DE CIDADANIA

André de Carvalho OkanoDaniel Orlandini JúniorIgor Emanuel de Souza Marques

23 JUSTIÇA RESTAURATIVA E MEDIÇÃO PENAL NO BRASIL: LIMITES E PERSPECTIVAS

Pâmela Burke BarbozaÁlvaro de Andrade Júnior

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CAMPANHA ELEITORAL E REDES SOCIAIS: PARTICIPAÇÃO POPULAR POTENCIALIZADA E CONCRETIZAÇÃO DE CIDADANIA

André de Carvalho Okano1

Daniel Orlandini Júnior2

Igor Emanuel de Souza Marques3

Resumo: A internet é a maior ferramenta tecnológica de inclusão e desenvol-vimento social deste século. Seu papel é central na concretização dos ideais de cidadania e na participação popular, especialmente com suas características de interatividade e instantaneidade. Além disso, o papel do marketing político ganha evidência e torna imprescindível a profissionalização da atividade publi-citária na seara política, podendo tornar a democracia mais participativa. Não obstante, a televisão ainda ser o principal veículo de comunicação em campa-nhas eleitorais e de ter o maior investimento. Com a ampliação do acesso e uso das novas tecnologias, este cenário tende a mudar e a internet, por possibilitar maior interatividade, poderá tornar-se o principal veículo para o exercício efe-tivo da cidadania.

Palavras-chave: Cidadania; Redes sociais; Processo eleitoral; Marketing político.

1 Mestre em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep). Advogado, mediador e conciliador judicial na Comarca de Artur Nogueira (SP). Professor do curso de Direito do Centro Universitário Adventista de São Paulo, Campus Engenheiro Coelho (Unasp). E-mail: [email protected]

2 Estudante do curso de Direito do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp). E-mail: [email protected]

3 Doutorando em Direito na Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo (Fadisp). Advogado, mediador e conciliador judicial na Comarca de Artur Nogueira (SP). Professor do curso de Di-reito no Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp). E-mail: [email protected]

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ELECTORAL CAMPAIGN AND SOCIAL NETWORKS: POPULAR PARTICIPATION AND citizenship CONCRETIZATION

Abstract: The internet is the vastest technological tool for inclusion and so-cial development of the century. It́ s role is central in solidifying citizenship ideals and popular participation, especially with its unique characteristics of interactivity and instantaneity. Furthermore, the political marketing role gains prominence and becomes crucial to professionalize advertising in the political realm, allowing democracy to be more participative. Nonetheless, television is still the main communication vehicle in electoral campaigns as it holds most of the investment. With the expansion of access and use of new technologies, this scenario tends to change and the internet, by providing greater interactivity, could become the primary vehicle towards the effective exercise of citizenship.

Keywords: Citizenship; Social networks; Electoral process; Political marketing.

Introdução

A presente pesquisa aborda a relação entre o processo eleitoral e a internet, com ênfase no uso das redes sociais, e a influência desses meios sobre os resul-tados de um período eleitoral. A partir da ideia de cidadania e a importância de sua concretização para a construção de uma democracia forte, busca-se apre-sentar as contribuições trazidas pela Internet para essa dinâmica, bem como analisar a forma como a Internet vem sendo utilizada por agentes políticos, per-passando a evolução legislativa na regulamentação do tema e de maneira pon-tual, demonstrando o entendimento jurisprudencial prevalecente.

Apresentamos, ainda, propostas de regulação para aperfeiçoar o aprovei-tamento das ferramentas e potencialidades da Internet, durante o processo elei-toral, indicando, por fim, algumas práticas dessa utilização em outros países.

Eleições como elemento de cidadania

Para compreender a importância das eleições para a concretização de um ideal de cidadania é preciso buscar a compreensão de seu conceito, especial-mente em seu desenvolvimento e construção histórica, pois, de acordo com

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Acta Científica. Ciências Humanas, Engenheiro Coelho, SP, p. 7-21, 2º semestre de 2015DOI: http://dx.doi.org/10.19141/1519-9800.actacientifica.v24.n2.p7-21

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Comparato (1993), “a etimologia já revela a essência da origem histórica”.4 As-sim, principalmente no mundo greco-romano, seriam cidadãos apenas “os ho-mens que participam do funcionamento da cidade-Estado, os titulares de direi-tos políticos [...] sem a mediação de representantes”.

A ideia de representação política, tão difundida hodiernamente, não se fazia presente na antiguidade clássica, é fruto da modernidade. Sua derivação encontra sua raiz especialmente da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que por sua vez resulta da Revolução Francesa de 1789 (CASTANHO, 2014, p. 14), tanto que na Constituição Francesa de 1791, estavam previstas as bases de um sistema representativo:

Artigo 2. A Nação é a única da qual emanam todos os poderes, mas não pode exercê-los senão por delegação. A Constituição france-sa é representativa: os representantes são os Corpos legislativos e o Rei. Artigo 3. O poder legislativo é delegado a uma Assembleia Nacional compos-ta por representantes temporários, livremente eleitos pelo povo, para ser por ela exercido, com a sanção do Rei, da maneira que será determinada logo em seguida.5

A Constituição Brasileira de 18246 também apresentava, em seu Capítulo 4º, a ideia de uma cidadania exercida por meio de representantes eleitos:

Art. 90. As nomeações dos deputados e senadores para a Assembleia Geral e dos membros dos Conselhos Gerais das Províncias serão feitas por eleições indiretas, elegendo a massa dos cidadãos ativos em assembleias paroquiais os eleitores de província e este os representantes da Nação e província. Art. 91. Têm voto nestas Eleições primariasI. Os cidadãos brasileiros, que estão no gozo de seus direitos políticos […]7

A manutenção desse sistema, todavia, segundo Castanho (2014, p. 14)

não assegura a cidadania de todos, pelo risco da “manutenção do poder por uma classe dirigente”. E nesse sentido, o conceito atual de cidadania não pode ser identificado simplesmente com a ideia de representação. A ideia-

-mestra da nova cidadania é a participação direta da pessoa humana (COM-PARATO, 1993).

4 Polites, que os romanos traduziram por cives, e o sócio da polis ou civitas (COMPARATO, 1993).5 Disponível em: <https://bit.ly/2NYGqCt>. Acesso em: 22 jul. 2015.6 Disponível em: <https://bit.ly/2BQKQnw>. Acesso em 15 mar. 2015.7 Disponível em: <https://bit.ly/2w4teFx>. Acesso em 15 mar. 2015.

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Com isso, surge a necessidade constante de se dar unidade e consistên-cia ao conceito de cidadania. Nesse contexto, ganha espaço a internet, com seu poder de movimentar as massas, revigorando a participação política, sendo capaz de “reformular a cidadania, ao estimular, entre outras coisas, a cultura da tolerância, do pluralismo, da participação, com reconhecimento e efetividade dos direitos de todos” (CASTANHO, 2014, p. 14, 15).8

Considerando os conceitos acima expostos concernentes à cidadania, nota-se que o processo eleitoral se torna um momento adequado e favorável ao exercício da cidadania, em razão das discussões pertinentes à comuni-dade de interesse coletivo. Nesse sentido, a internet se apresenta como fer-ramenta imprescindível desse processo de concretização da cidadania, pois abre diálogo franco e possibilidades de questionamentos diretos e públicos para os atores políticos, sendo confrontados cotidianamente e em tempo real.

Essa ideia que parece ser prejudicial à primeira vista, notoriamente aperfeiçoa de maneira direta o ideal de cidadania, de busca por um pro-cesso eleitoral que apresente efetivamente quais são as melhores propostas e personagens hábeis a cumpri-las. Sobre os benefícios da falta de consenso, assevera Bobbio (2002, p. 75):

Quero dizer que, num regime que se apoia no consenso não imposto a partir do alto, alguma forma de dissenso é inevitável e que apenas onde o dissenso é livre para se manifestar o consenso é real, e que apenas onde o consenso é real o sistema pode proclamar-se com justeza democrática. Por isto afirmo existir uma relação necessária entre democracia e dissen-so, pois, repito, uma vez admitido que a democracia significa consenso real e não fictício, a única possibilidade que temos de verificar se o con-senso é real é verificando o seu contrário. Mas como poderemos verificá-

-lo se o impedirmos?

Diante das dificuldades trazidas pela internet aos candidatos políticos, pelas características já apresentadas desta importante ferramenta tecnológi-ca, ganha realce a importância do marketing, com destaque para sua aplica-ção no cenário político.

8 Em dissertação intitulada E-democracia: a democracia do futuro?, Castanho (2009) demons-tra que a internet promove mecanismos de participação mais ágeis e amplos. A participação po-pular, mediada pelas tecnologias digitais, serviria como mais uma alternativa para a superação dos problemas existentes no modelo representativo, que deve ser revigorado, e não substituído.

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Acta Científica. Ciências Humanas, Engenheiro Coelho, SP, p. 7-21, 2º semestre de 2015DOI: http://dx.doi.org/10.19141/1519-9800.actacientifica.v24.n2.p7-21

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CAMPANHA ELEITORAL E REDES SOCIAIS: PARTICIPAÇÃO POPULAR POTENCIALIZADA E CONCRETIZAÇÃO DE CIDADANIA

Marketing político e seu papel na internet

Para Kotler (1998, p. 31), marketing “é a atividade humana dirigida à satisfação das necessidades e desejos através de um processo de troca». E par-tindo para a aplicação desse conceito ao cenário político, Passador (1999, p. 10) define o marketing político como “um conjunto de técnicas e procedimentos que tem como objetivo adequar um candidato ao seu eleitorado potencial, pro-curando fazê-lo, num primeiro momento, conhecido do maior número de elei-tores possível e, em seguida mostrá-lo diferente e melhor do que seus adversá-rios”.

No mesmo sentido, Silva (2002, p.18) afirma que o marketing político:

É uma aplicação do conceito original ao campo político. É, portanto, o con-junto e planos e ações desenvolvidos por um político ou partido político para influenciar a opinião pública em relação a ideias ou atividades que tenham a ver com eleições, programas de governo, projetos de lei, desempenho parla-mentar e assim por diante.

Para se ter uma ideia do impacto do marketing político no processo eleito-ral, Figueiredo (2008, p. 12) alerta que não acontecem milagres. É preciso que o candidato esteja bem posicionado em todos os ângulos.

Se o candidato ou produto está bem posicionado na mente do eleitor, o seu programa na TV pode ser até sofrível, mas ele ganha a eleição. O contrário nunca ocorre: um bom programa não elege um candidato mal posicionado na disputa eleitoral, pois a estratégia errada vai se revelar catastrófica se real-çada por uma boa propaganda.

É clara a importância de uma campanha eleitoral para que o eleitor conheça as propostas políticas de cada candidato, porém, o mesmo não pode apostar que somente tal estratégia será o suficiente para garantir que ele seja eleito. Uma propaganda política faz parte de uma das etapas finais do processo de marketing eleitoral, assim, o papel fundamental para chegar a essa etapa são as pesquisas, afinal, o candidato não é um produto, por isso sua reputação é de total relevância para o convencimento do eleitor.

As pesquisas eleitorais representam parte fundamental da campanha polí-tica, por ser um dos quesitos que acompanham todo o processo político, já que é necessário verificar durante todo o período como está a popularidade de cada candidato ou partido, verificando a cada momento como está a administração em todas as áreas, sugerindo ações (FIGUEIREDO, 2008, p. 14).

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Não se pode entrar em uma campanha política sem ter em mãos pesquisas sérias e componentes sobre os anseios, os problemas e as preocupações dos eleitores que se quer conquistar. É importante que tais pesquisas procurem indicar o perfil do candidato que o eleitor acredita ser capaz de responder a seus anseios e de solucionar os problemas apontados.

Tal conceito certamente não é novo em sua totalidade. Seu aspecto novo consiste na utilização do marketing político também nas mídias sociais.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de internautas brasileiros ultrapassou 100 milhões em 2015,9 sendo o Brasil o quarto país com maior número absoluto de usuários de internet, ficando atrás de Estados Uni-dos, Índia e China, segundo novo relatório da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).10 Tais referências ajudam a explicar o elevado interesse dos pesquisadores acerca das potencialidades da internet, em particular sua influência na área eleitoral.

Os avanços tecnológicos do século 20, especialmente na área da comuni-cação, têm facilitado o crescimento desses números e a participação popular na internet. E as redes sociais no século 21 potencializam tal participação, favore-cendo o debate franco e aberto.

Merece destaque a pesquisa conduzida pelo Facebook, em conjunto com a Universidade da Califórnia, apresentada na revista Nature (2012),11 intitulado

“Experimento no Facebook aumenta participação dos eleitores nos EUA” (tra-dução livre).12 Este artigo apresentou resultados de um estudo que demonstra como redes sociais influenciam diretamente as pessoas mais próximas e au-mentam a participação destas nas questões eleitorais.

Por meio de um experimento envolvendo 61 milhões de usuários da rede social, respondeu-se à pergunta do alcance da influência “na vida real” de uma postagem feita em rede social. Os resultados são surpreendentes, pois a esti-mativa dos pesquisadores foi de que, por causa de uma única mensagem no Facebook para o dia das eleições, outras 340 mil pessoas votaram nas eleições do Congresso dos EUA em 2010.

9 Disponível em: <https://glo.bo/2fy9fXb>. Acesso em: 15 jul. 2015. 10 Disponível em: <https://goo.gl/rkDaNw>. Acesso em: 15 jul. 2015.11 Disponível em: <https://go.nature.com/2zsvDNp>. Acesso em: 15 jul. 2015.12 Título original: “Facebook experiment boosts US voter turnout”.

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Acta Científica. Ciências Humanas, Engenheiro Coelho, SP, p. 7-21, 2º semestre de 2015DOI: http://dx.doi.org/10.19141/1519-9800.actacientifica.v24.n2.p7-21

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CAMPANHA ELEITORAL E REDES SOCIAIS: PARTICIPAÇÃO POPULAR POTENCIALIZADA E CONCRETIZAÇÃO DE CIDADANIA

Segundo os pesquisadores, este estudo teve o condão de ter sido o primeiro a demonstrar que as redes sociais provocam impacto e influenciam diretamente a realidade da vida em sociedade, inclusive sobre as eleições.

O procedimento para o estudo envolveu usuários do Facebook com mais de 18 anos, que acessaram sua página pessoal, em 2 de novembro de 2012, dia das eleições para o Congresso americano. 611 mil usuários (1% do total) rece-beu mensagens informativas que encorajavam o voto que registrava o número total de usuários que afirmavam já terem votado. O segundo grupo, composto de 60 milhões de usuários (98% do total) recebia as mesmas mensagens, com uma diferença: ao clicar no botão “votei”, ele também tinha acesso às fotos de seis de seus amigos que estariam, manifestamente, na lista de eleitores. O res-tante (1%) não recebeu mensagem alguma. Os pesquisadores afirmam que os grupos foram formados aleatoriamente.

No geral, o experimento teve um efeito interessante. Os pesquisadores concluíram de maneira conservadora que, em campanhas, as redes sociais po-dem aumentar o número de eleitores em cerca de 8%, enquanto campanhas por e-mail alcançam ganhos de 1%. Mas em razão do público das redes sociais ser grande, existe a expectativa de que tais números sejam ainda maiores (BOND et al., 2012).

Mas como toda ferramenta tecnológica, com potencial para movimen-tar as massas – que não é exclusividade do Facebook –, pode ensejar conflitos em razão da má utilização, e naturalmente traz consequências jurídicas.

Propagandas políticas em mídias sociais e efeitos jurídicos

A expansão dessa prática gerou preocupação com os abusos que poderiam ser praticados, motivo pelo qual o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estabeleceu limites para o uso desse instrumento. Uma das primeiras tentativas de regula-mentação da Resolução 22.718/07 (TSE, 2007),13 editada por força das eleições municipais de 2008. Sobre o tema vale destacar alguns dispositivos normativos:

Art. 1º  A propaganda eleitoral nas eleições municipais de 2008, ainda que realizada pela Internet ou por outros meios eletrônicos de comunicação, obe-decerá ao disposto nesta resolução.Art. 18. A propaganda eleitoral na Internet somente será permitida na página do candidato destinada exclusivamente à campanha eleitoral e na do partido político.

13 Disponível em: <goo.gl/ekfDm2>. Acesso em: 10 jul. 2015.

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Art. 20 - § 3º Não caracterizará propaganda eleitoral a divulgação de opinião favorável a candidato, a partido político ou a coligação, quando feita pela imprensa escrita, inclusive no respectivo sítio da internet, desde que não seja matéria paga, mas os abusos e os excessos, assim como as demais formas de uso indevido do meio de comunicação, serão apurados e punidos nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/90.

A Resolução 22.718 acabou por amordaçar as redes sociais da internet, no âmbito eleitoral.14

Após uma análise crítica feita por Cintra (2008)15 sobre o texto da Resolu-ção supracitada, é possível ter a impressão de que o TSE desconhece o funcio-namento da internet. Com tantos obstáculos à propaganda eletrônica vê-se que se põe também como obstáculo ao aparecimento de candidatos novos, que re-presentam a renovação da democracia, continuarão desconhecidos e ninguém conhecerá suas ideias e propostas.

A exposição das propagandas eleitorais em mídias sociais como Facebook, YouTube, Twitter etc. São ambientes de comunicação com um alcance quase im-possível de calcular, porém, com uma grande chance para que políticos ganhem maior visibilidade e acabem por conquistar um maior número de eleitores, au-mentando suas chances de votos, pois é notório que o público da internet vem crescendo consideravelmente nos últimos tempos com o avanço da tecnologia.

Não podemos deixar de mencionar que algo que se torna abrangente, com poder de alcance quase impossível de calcular, também passa a ser matéria de direito, já que problemas podem surgir com a utilização da nova ferramenta, principalmente no que diz respeito à exposição de opiniões e imagem de al-guém.

Mesmo tendo a criação da resolução para estabelecer limites a esse tipo de veiculação na internet, a intervenção não se mostrou suficiente, existindo ainda preocupações com outros fatores que foram surgindo no decorrer do tempo. Para regulamentar o tema, por meio da Lei nº 12.034/09 liberando o uso das mídias sociais para a exposição de campanhas eleitorais desde que respeitados os limites impostos pela lei, com se depreende:

Art. 57-B – A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas se-guintes formas: 

14 Cintra (2008) afirma que a propaganda eleitoral nas redes sociais existentes à época, foi com-batida pela pelo Poder Judiciário nos Estados do Ceará, de Goiás e de Minas Gerais.

15 Disponível em: <https://bit.ly/2zSf8ea>. Acesso em: 12 jul. 2015.

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Acta Científica. Ciências Humanas, Engenheiro Coelho, SP, p. 7-21, 2º semestre de 2015DOI: http://dx.doi.org/10.19141/1519-9800.actacientifica.v24.n2.p7-21

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CAMPANHA ELEITORAL E REDES SOCIAIS: PARTICIPAÇÃO POPULAR POTENCIALIZADA E CONCRETIZAÇÃO DE CIDADANIA

I - em sítio do candidato, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de serviço de internet estabelecido no País; II - em sítio do partido ou da coligação, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de serviço de internet estabelecido no País; III - por meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuita-mente pelo candidato, partido ou coligação; IV - por meio de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e asse-melhados, cujo conteúdo seja gerado ou editado por candidatos, partidos ou coligações ou de iniciativa de qualquer pessoa natural. 

Sobre essa norma, Pinto (2010)16 afirma:

A nova lei assegurou a livre manifestação do pensamento durante a campa-nha eleitoral, por meio da internet, vedado o anonimato e assegurado o direi-to de resposta no caso de divulgação de informações sabidamente inverídicas, caluniosas, injuriosas ou difamatórias, conferindo ao eleitor amplas possibi-lidades de se informar sobre os partidos e seus candidatos e de manifestar sua opinião sobre os mesmos.

Como é possível notar, a principal diferença trazida pela Lei 12.034/09,17 em relação à Resolução 22.718/07, é que abre para os eleitores a oportunidade de participar mais da política no Brasil, através de uma comunicação mais direta com partidos e candidatos, e ao candidato passa a ser assegurado o direito de se manifestar, porém, como já vimos, um grande problema de utilizar as mídias sociais para promover esse tipo de marketing é a organização dos candidatos. Sem mencionar ainda o fato de mídias sociais demandarem ainda uma res-ponsabilidade maior e melhor organização dentre os candidatos para, assim, alcançarem o êxito da total comunicação e participação de todos os cidadãos na política.

O art. 7º18 da Lei nº 12.034/2009 dá permissão ao uso da internet até mes-mo no dia da eleição, não se aplicando a restrição prevista no parágrafo úni-co do art. 240 do Código Eleitoral, que trata de propaganda em geral. Ficou

16 Disponível em: <https://bit.ly/2t7Sf0y>. Acesso em: 27 nov. 2015.17 Disponível em: <https://bit.ly/2ypwEWt>. Acesso em: 30 nov. 2015.18 Art. 7o Não se aplica a vedação constante do parágrafo único do art. 240 da Lei nº 4.737,

de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral, à propaganda eleitoral veiculada gratuitamente na internet, no sítio eleitoral, blog, sítio interativo ou social, ou outros meios eletrônicos de co-

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definido não haver limite temporal para a veiculação de propaganda política pela internet, até mesmo pela dificuldade de controle sobre manifestações de apoio, como se denota do exemplo jurisprudencial colacionado abaixo:

RECURSO. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. FACE-BOOK. PRÉVIO CONHECIMENTO. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A propagan-da eleitoral antecipada deve ser instruída com prova da autoria ou do prévio conhecimento do beneficiário. 2. Hipótese em que a divulgação irregular de panfleto no perfil do facebook do pré-candidato foi feita por terceiro, não ha-vendo prova do prévio conhecimento do demandado. 3. Recurso improvido. BRASIL. (TRE-PE. Recurso Eleitoral nº 7-77.2012.6.17.0005).19

Ainda em relação à propaganda eleitoral, salienta-se que os tribunais regio-nais têm se posicionado de forma a não aceitar essa rede como meio propício à prática de propaganda eleitoral, pois as manifestações se reduzem ao círculo de amizades. Como por exemplo:

RECURSO ELEITORAL - PROPAGANDA ELEITORAL REALIZADA NA ITERNET - UTILIZAÇÃO DE REDE SOCIAL - FACEBOOK - NÃO CA-RACTERIZAÇÃO - INEXISTÊNCIA DE PROPAGANDA IRREGULAR

- EXISTÊNCIA APENAS DE MANIFESTAÇÃO DE PREFERÊNCIA PO-LÍTICA SEM AFRONTA AO ORDENAMENTO JURÍDICO E À IGUAL-DADE DE OPORTUNIDADES ENTE OS CANDIDATOS. RECURSO CO-NHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A utilização por parte de eleitores de perfis e comunidades em sites de relacionamento na Internet, tais como Facebook, Orkut e MySpace para enaltecerem ou criticarem candidatos não configu-

municação do candidato, ou no sítio do partido ou coligação, nas formas previstas no art. 57-B da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997.

19 Juiz Relator Luiz Alberto G. de Faria, que motivou a sentença nos seguintes termos: “Na pre-sente hipótese, observo que o veículo utilizado para a divulgação da propaganda irregular foi o facebook, rede de informação social que, de fato, possibilita que alguém, na melhor ou pior intenção, faça constar do perfil de outrem conteúdo qualquer que desejar inserir, não se fa-zendo necessária para tanto a prévia aceitação daquele em cuja página far-se-á a inclusão do expediente. Tal prática é comum nesse sistema de comunicação, sendo conhecida na lingua-gem dos usuários como ‘marcar algo’. Dentro desse contexto, o prévio conhecimento a que se refere a legislação de regência como condição para a aplicação da reprimenda corresponden-te à conduta em apreço (art. 1o, §4°, daRes. TSE n° 23.370/11), tratando-se do meio de difusão em comento (facebook), mostra-se de difícil caracterização, de modo que tenho por plausível a alegação do suplicado, no sentido de que apenas teve conhecimento da postagem em seu perfil após a sua efetiva veiculação por um ‘seguidor’ seu”.

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ra propaganda eleitoral (TRE-MT. Processo nº 40827, Classe RE. Acórdão nº 22241, de 25/09/2012, Relator Doutor Sebastião de Arruda Almeida, publica-do em sessão, no dia 25/09/2012).20

Outro tema importante é sobre a vedação do anonimato nas propagandas eleitorais, pois de acordo com Madruga (2013, p. 21), o TSE já decidiu que:

A identificação do responsável direto pela divulgação não é elemento essen-cial para determinar a suspensão da propaganda, não sendo igualmente sufi-ciente a mera “alegação de ser o material anônimo”. Há que se demonstrar a

“violação das regras eleitorais” e “a ofensa a direito” daqueles que participam do processo eleitoral.21

Por fim, destaca-se que fica vedada a censura prévia dos programas elei-torais exibidos no rádio, televisão ou Internet (art. 61, §7º, da Lei nº 12.034/09), de modo que à propaganda eleitoral, exercida nos termos da lei, não pode ser imposta multa.

Todavia, se a Justiça Eleitoral entender irregular a propaganda, pode proi-bir sua veiculação, o que não constitui censura, mas obediência ao princípio da lisura e da legitimidade dos pleitos eleitorais e da igualdade de condições entre os concorrentes (CASTANHO, 2014, p. 208).

Experiências internacionais e perspectivas para as próximas eleições

Ao se fazer um panorama da importância da utilização da internet em campanhas eleitorais ao redor do mundo, Grosselli (2010, p. 8) identifica que, além das redes sociais, outras ferramentas são fundamentais nessa atividade, como o YouTube e a Wikipédia.

Segundo a mesma autora, a experiência francesa ao utilizar a internet como ferramenta para o marketing político teve êxito, visto que o candidato Nicolas Sarkozy apresentou suas propostas políticas através de vídeos online. Por outro lado, sua concorrente, Ségolène Royal, pediu a participação popular em seu site com comentários e depoimentos sobre suas propostas.

Nos Estados Unidos da América, a notoriedade e importância são ainda maiores do uso da internet como ferramenta de comunicação em campanhas presidenciais. Já no ano 2000, quando foi um dos pré-candidatos do partido

20 Disponível em: <https://bit.ly/2Lnnvmu>. Acesso em: 12 jun. 2015.21 Disponível em: <https://bit.ly/2JyU37Y>. Acesso em: 18 jun. 2015.

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republicano, ganhou visibilidade ao veicular banners em diversos sites divul-gando e pedindo apoio à sua pré-candidatura. Mas o primeiro candidato em uma corrida presidencial a conseguir de fato usar a internet como mais que uma ferramenta de comunicação de mão única, de acordo com Graeff (2009, p. 7), foi Howard Dean, pré-candidato democrata nas eleições de 2004 e então governador do estado de Vermont.

Nas eleições norte-americanas de 2008, a campanha presidencial de Ba-rack Obama conseguiu arrecadar doações em montante superior a meio bilhão de dólares pela internet. Além das doações online, outro recurso utilizado pela equipe de Obama foram as publicações de vídeos no YouTube, com forte apelo emocional a partir de depoimentos de pessoas que trabalharam durante a cam-panha. Houve vídeos (GROSSELLI, 2010, p. 9).

Portanto, é evidente que o uso da internet e das mídias sociais teve um papel importante nas escolhas de candidatos e nas eleições (GRAEFF, 2009, p. 16). Assim, percebe-se que um marketing político que não contemple atuação em redes sociais terá eficácia bastante reduzida.

Segundo o TSE,22 para o ano de 2018, continua proibida a propaganda eleitoral paga pela internet, que terá seu início previsto para o dia 16 de agosto de 2018. A novidade é que está autorizado o impulsionamento de conteúdo, desde que contratados exclusivamente por partidos, coligações e candidatos.

O uso da internet com certeza será um facilitador para que se consiga um maior alcance na divulgação do candidato, com o impulsionamento que deve alcançar um número ainda maior de pessoas, e com isso começará uma mudança no sistema de corrida eleitoral brasileira, que levará a informação a muito mais pessoas com um menor período.

A Lei nº 13.488/1723 autorizou o uso de redes sociais pagas para o impul-sionamento de publicações e inclusive de resultados em ferramentas de busca, o que promete ser a grande novidade das eleições de 2018 na internet.

Quanto ao custo, pode-se dizer que irá variar muito de candidato para candidato em função do alcance que ele necessitar para a divulgação de sua plataforma eleitoral e do grau de engajamento que pretende obter nas mídias sociais.

Quanto ao Marketing digital, a internet tem o seu destaque em termos de agilidade e rapidez no que diz respeito à transmissão de informações, sendo possível afirmar que, atualmente, opta-se por assistir menos televisão, ouvir menos rádio e, assim, atualizar-se mais por meio de notícias via internet, onde as informações são atualizadas em um espaço menor de tempo.

22 Disponível em: <https://bit.ly/2uLqRVU>. Acesso em: 10 jul. 2015.23 Disponível: <https://bit.ly/2BAVxfB>. Acesso em: 10 nov. 2015.

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A internet está nos conduzindo à mudarmos os paradigmas do marke-ting tradicional, gerando uma mudança bastante significativa. Enquanto o marketing tradicional mantém foco na satisfação das necessidades dos clientes por meio de trocas mutuamente benéficas, e com os profissionais de marke-ting controlando o processo de troca, o advento da internet possibilitou que os clientes tomem as rédeas da situação (OSTETTO, 2005).

Segundo a Academia de Marketing,24 a ideia da utilização de ações de mar-keting político nas mídias sociais já está nos projetos de vários candidatos. Para a próxima eleição, o que não se sabe é se os candidatos estão preparados para explorar ao máximo as mídias sociais. Com base nas últimas eleições, po-demos dizer que ainda não, os candidatos não entenderam que marketing elei-toral nas mídias sociais não é apenas se jogar para o formato digital as peças criadas para o marketing político convencional.

A elaboração de uma campanha política nas mídias sociais seria o passo posterior ao da decisão de se ter uma presença digital séria e bem estruturada. As ferramentas de mídias sociais em uma campanha eleitoral nada mais são do que um complemento de outras ações de presença digital como, por exemplo, a criação de um site ou blog onde o candidato possa apresentar seu perfil deta-lhado, ideias, propostas e programa de governo.

O uso das ferramentas de mídias sociais na campanha eleitoral só faz sentido se houver plena consciência por parte do candidato e sua equipe, que questionamentos nesse canal precisam ser respondidos, ou seja, é vital que haja interação entre as duas partes. O eleitor digital exige uma resposta para seus questionamentos de forma rápida e o silêncio por parte do candidato é um sinal imediato de desrespeito com esse eleitor.

Segundo Dantas (2008, p. 12), a importância do profissional de marketing reforça que, na trajetória política, e mesmo diante de gastos vultosos que um investimento nesta área possam resultar, posto que deve ser altamente profis-sionalizado este segmento, não havendo espaço para atuações amadoras. Ainda assim, os candidatos podem ter, segundo o referido autor, acesso fácil a serviços de profissionais de marketing, ainda que em regiões interioranas.

Considerações finais

Este estudo do uso do marketing político, com o uso das mídias sociais, oferece uma verdadeira noção do que serão as futuras eleições: batalhas acir-radas de publicidade com o uso acentuado em propagandas através da mídia

24 Disponível em: <https://bit.ly/2llQOHq>. Acesso em: 30 nov. 2015.

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social. É, de fato, um risco para quem achar que pode entrar neste campo de batalha sem os devidos preparos, é coisa para profissional. Os amadores que se aventurarem correm o sério risco de perder não só a batalha, mas também de ter a sua imagem atingida de alguma forma que poderá lhe colocar fora das eleições. Neste mundo do marketing, o investimento é, de certa forma, elevado. No entanto, se pode conseguir a tão sonhada cadeira a ser ocupada pelo político bem preparado e que tiver um melhor assessoramento, é preciso salientar que não se pode dizer que esse trabalho de profissional é caro se alcançar o seu objetivo.

Pôde-se perceber, com este artigo, que a legislação brasileira tem sido atua-lizada com frequência para se adequar às novas realidades da sociedade na era digital, de modo que o processo eleitoral possa ser uma oportunidade de con-cretização de ideais de cidadania e, consequentemente, de afirmação de uma democracia em desenvolvimento. E do outro lado dessa relação, não é concebí-vel, hodiernamente, um agente político que tenha pretensões reais em um pro-cesso eleitoral, que não invista de modo consistente em um marketing político em redes sociais e na interação instantânea e real com o eleitorado cada vez mais consciente.

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Acta Científica. Ciências Humanas, Engenheiro Coelho, SP, p. 7-21, 2º semestre de 2015DOI: http://dx.doi.org/10.19141/1519-9800.actacientifica.v24.n2.p7-21

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CAMPANHA ELEITORAL E REDES SOCIAIS: PARTICIPAÇÃO POPULAR POTENCIALIZADA E CONCRETIZAÇÃO DE CIDADANIA

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JUSTIÇA RESTAURATIVA E MEDIAÇÃO PENAL NO BRASIL: LIMITES E PERSPECTIVAS

Pâmela Burke Barboza1

Álvaro de Andrade Júnior2

Resumo: A pesquisa consiste em abordar o instituto da justiça restaurativa como método eficaz para a solução de conflitos penais em contraposição ao modelo jurisdicional retributivo. Por meio da aplicação pátria legislativa, bus-ca-se apresentar a inserção da mediação penal no ordenamento jurídico bra-sileiro frente aos reflexos internacionais que calcaram as bases destes estudos e aplicações. Outrossim, por meio do método científico dedutivo, é analisado por uma relação silogística ao estabelecer como premissas básicas as condições peculiares existentes em cada um dos procedimentos. Buscando proporcionar o acesso à justiça de forma célere como resposta ao equilíbrio das relações, ora rompido pelo conflito, observou-se a necessidade do empoderamento das par-tes para que sejam protagonistas das decisões a serem tomadas no decorrer da solução dos conflitos. O trabalho desenvolvido apresenta os questionamentos surgidos a respeito da adequação legislativa hodierna no que tange as medidas despenalizadora em comento.

Palavras-chave: Métodos alternativos de solução de conflitos; Justiça restaurativa; Mediação penal.

1 Graduanda em Direito no Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp). E-mail: [email protected]

2 Mestre em Direito pela Universidade Paulista. Delegado de polícia do Estado de São Paulo e professor no Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp). E-mail: [email protected]

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RESTORATIVE JUSTICE AND CRIMINAL MEDIATION IN BRAZIL:LIMITS AND PERSPECTIVES

Abstract: The research consists of approaching the institute of restorative justi-ce as an effective method for the resolution of criminal conflicts as opposed to the retributive jurisdictional model. Through the application of the legislative homeland, the intention is to present the insertion of criminal mediation in the Brazilian legal system in the face of the international reflexes that have shaped the bases of these studies and applications. Moreover, through the deductive scientific method is analyzed by a syllogistic relationship in establishing as ba-sic premises the peculiar conditions existing in each of the procedures. Seeking to provide access to justice swiftly as a response to the balance of relations, once broken by the conflict, the need for empowerment of the parties was observed to be protagonists of the decisions to be taken in the course of conflict resolu-tion. The work presented presents the questions raised regarding the current legislative adequacy regarding the measures decriminalizing in the comment.

Keywords: Alternative methods of conflict resolution; Restorative justice; Cri-minal mediation.

Introdução

O presente trabalho parte do cenário hodierno da tutela penal frente aos inúmeros desafios trazidos pela prestação jurisdicional e o sistema carcerário como um todo. Ante as circunstâncias desfavoráveis do modelo de justiça ba-seado na retribuição do mal ora causado, buscou-se a investigação da justiça sob uma nova ótica, quer seja, a restaurativa, que interpreta o direito penal através da participação mútua dos envolvidos com o objetivo precípuo de restaurar o status quo ante as relações ora abaladas, e estabelecer uma responsabilização adequada e provinda não arbitrariamente pelo Estado, mas do diálogo entre vítima e ofensor a partir de um denominador comum.

Sob a problemática de averiguar a importância dos meios alternativos de solução de conflitos na lide penal por meio da legislação pátria, almejou-se ava-liar as hipóteses de que a Mediação penal por meio da justiça restaurativa é instrumento idôneo e altamente eficaz no binômio de justiça, quer seja o de

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JUSTIÇA RESTAURATIVA E MEDIAÇÃO PENAL NO BRASIL: LIMITES E PERSPECTIVAS

responsabilização do infrator e reparação à vítima, uma vez que, pautada por princípios autônomos, cuja função é essencialmente restauradora, promovendo a aplicação da função social do direito e reestruturando a comunidade abalada pelo conflito.

Com o aumento da criminalidade e, por consequente, a superlotação car-cerária, o sistema judiciário permanece impossibilitado de atender toda a de-manda, resultando na aplicabilidade fria da lei sem tampouco atingir às expec-tativas de uma população sedenta por justiça. A pesquisa, sem a pretensão de esgotar o assunto, empenha-se em difundir o tema, ora ainda embrionário em terras brasileiras, a fim de que possa contribuir, ainda que minimamente, com a defesa de um viés prático da justiça sem delongas burocráticas, exaustivas e, na maioria das vezes, desproporcionais aos crimes de baixa ofensividade, ainda tratados pelo presente trabalho.

O trabalho se subdivide entre a abordagem conceitual da justiça restaura-tiva baseada em fundamentações históricas e internacionais somada aos prin-cípios que estruturam a natureza jurídica deste instituto em consonância com o direito penal.

Ademais, foi abordada a mediação penal como vertente da justiça restau-rativa e, por conseguinte, sua interpretação e aplicação dentre as respectivas provisões legais. Tomado isto, os resultados obtidos de uma aplicação restau-rativa essencialmente brasileira dotada de padrões históricos e socioculturais próprios.

Um novo foco sobre crime e justiça: a importância dos meios alternativos

de soluções de conflitos

O sistema punitivo tem passado por diversas transformações ao longo dos séculos. Há uma busca constante da afirmação do direito de punir pertencente ao Estado a fim de que este corresponda ao comportamento do indivíduo pau-tado pelo meio social no qual está inserido. A justiça moderna, no que tange a aplicação da pena, se mostra como um paradigma definido por padrões his-tóricos, éticos e culturais e, segundo Karen Matsui,3 como fruto de modelos e práticas autoritárias, intimidatórias, de uma epistemologia inquisitiva que de-turpa constantemente valores morais e antropológicos cristalizados como di-reitos humanos fundamentais. É necessário, segundo a autora, que a prática da democracia esteja aliada à justiça social, de forma que haja uma restauração da

3 Disponível em: <https://bit.ly/2I1ovXG>. Acesso em: 13 set. 2016.

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justiça criminal que inclua valores como o altruísmo e o diálogo, culminando precipuamente em um aprendizado comunitário4.

A evolução e a falibilidade das sanções criminaisAo decorrer da evolução do processo como forma de dizer o direito, as

penas paulatinamente foram modificadas quanto à sua função e forma de apli-cação. As primeiras aplicações de sanções pelo Estado mostravam-se deveras abusivas e sem qualquer correlação entre a severidade do delito cometido e a pena imposta. Tratavam-se de práticas severas sem qualquer mínima resguarda de conduções humanas básicas ou proporcionalidade. Apenas com o renasci-mento, as penas passaram a ser, nas palavras de Zehr (2008, p. 89), “racionais e suportáveis”, de forma a estabelecer certa proporcionalidade, coibindo arbitra-riedades que pudessem existir. A partir de então, a pena passa a ser aplicada de forma “científica”, sendo estabelecida de forma lógica segundo a gravidade do crime cometido.

Até então, as sanções colocam, de forma direta ou indireta, o corpo huma-no como um instrumento, para que sobre este incida o sofrimento da aplica-ção da pena. Seja com as práticas primitivas de se fazer a justiça com torturas, suplícios, trabalhos forçados ou até mesmo com a noção de enclausuramento, visando retirar deste indivíduo sua liberdade.

Segundo essa penalidade, o corpo é colocado num sistema de coação e de privação, de obrigações e de interdições. O sofrimento físico, a dor do cor-po, não são mais os elementos constitutivos da pena. O castigo passou de uma arte das sensações insuportáveis a uma economia dos direitos suspensos (FOUCAULT, 2014, p. 16).

Desta forma, conforme Matsui,5 a eficácia do cárcere está em atribuí-lo à fatalidade e não a uma intensidade de responsabilização que possa ser com-preendida de forma visível. Existe, portanto, uma carência de legitimidade na justiça criminal no tocante à coisificação da pessoa que denota um direito penal baseado no autor e em desrespeito aos direitos fundamentais previstos na Carta Magna.

Com uma constante evolução, o direito penal acompanhou as mudanças ocorridas na sociedade, conferindo certa humanização à tutela penal na prote-ção ao acusado modificando as formas de sanções com o intuito de substituir

4 Disponível em: <https://bit.ly/2I1ovXG>. Acesso em: 13 set. 2016.5 Disponível em: <https://bit.ly/2I1ovXG>. Acesso em: 13 set. 2016.

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Acta Científica. Ciências Humanas, Engenheiro Coelho, SP, p. 7-39, 2º semestre de 2015DOI: http://dx.doi.org/10.19141/1519-9800.actacientifica.v24.n2.p23-39

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JUSTIÇA RESTAURATIVA E MEDIAÇÃO PENAL NO BRASIL: LIMITES E PERSPECTIVAS

a vingança Estatal por ideais de recuperação e ressocialização. As penas passa-ram de abusivas e inadequadas para lógicas e proporcionais. Deixaram de ser vistas como arbitrárias e fontes de caprichos de autoridades, para serem notadas como racionais e suportáveis, fruto de previsão legislativa.

No início do século 20, novas formas com o intuito de reabilitação foram implementadas trazendo uma modalidade “terapêutica” para lidar com o deli-to. No entanto, essa forma alternativa pouco aderida entrou em desuso, sendo posteriormente extinta para dar lugar ao sistema de punição, como é conhecido hoje, pautado por leis de sentenciamento obrigatório como uma filosofia justa de aplicação do direito (ZEHR, 2008, p. 89).

Na busca de formas alternativas à privação de liberdade, Zehr (2008, p. 89) traça um paralelo deveras intrigante. Ele relata que, “ao invés de procurar alter-nativas à pena, o movimento em prol de alternativas oferece penas alternativas”. Diante disso, pode-se observar que os pressupostos de fundamento da prisão não são questionados, mas sim confirmados com o intuito de cumprir a pena sob os mesmos efeitos.

A esse respeito, Pallamolla (2009, p. 32) explica que a introdução de penas alternativas ao encarceramento, ao invés de substituir a pena de prisão, culmi-nou em um maior controle do Estado no âmbito formal apenas incrementando a pena privativa de liberdade sem, contudo, modificar a racionalidade do siste-ma penal.

Diante da aplicação mecânica das penas alternativas à prisão sem qualquer modificação no intuito de restauração da conduta então existente, não há razão para existirem medidas diversas ao cárcere dentro de um paradigma exclusi-vamente punitivo-retributivo, no qual, pela própria natureza dos mecanismos existentes, ou seja, a pena prevalecerá à imposição de qualquer que seja através da força estatal, impulsionada por fatores externos ao sistema (SICA, 2007, p. 9).

Observa-se que o crescimento exacerbado da população carcerária não é um reflexo positivo esperado ante às formas alternativas de prisão criadas pelo Estado. A supervisão deste apenas foi ampliada devido ao grande número de indivíduos sob vigilância. No entanto, as falhas do sistema criminal não foram supridas e as necessidades das partes envolvidas continuam desprovidas de so-luções adequadas.

A ideologia criminalizadora, com o intuito de combater o delito, é pauta-da pela criação desmedida de leis, aumento da gravidade das penas, priorida-de na aplicação das penas de privação de liberdade, flexibilização de direitos e garantias fundamentais culminando na fragilidade dos direitos, expansão do controle penal e do sistema carcerário como um todo através do fortalecimento da execução penal. Esses são fatores determinantes para a desorganização do ordenamento jurídico brasileiro pois, na maior parte das circunstâncias, são

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aplicadas leis ilegítimas, simbólicas, repressoras, desproporcionais e arbitrárias, incapazes de plena operatividade (SOUZA, 2011, p. 8).

Ainda que tenha ocorrido um avanço na aplicação das penas e medidas alternativas ao cárcere, não houve uma mudança significativa no índice de apli-cação das penas privativas de liberdade. Não é viável a aplicação desta medida a todos os casos concretos dos delitos tipificados em lei, haja vista, a grande demanda de crimes na sociedade, principalmente os de baixo potencial ofen-sivo que, quando não infundados, comumente não são esclarecidos de forma a atribuir os elementos necessários à aplicação da pena.

Pior seria ainda se a resposta estatal para todos esses crimes fosse a pena privativa de liberdade. Não haveria cidadão do lado de fora das grades! Desse ponto de vista, a impunidade, e não a criminalização, é a regra de funciona-mento do sistema penal (ZAFFARONI; PIERANGELLI, 2002).

A cultura da punição é expressa de forma vívida na sociedade apresentan-do a coerção como medida para a cura de todos os males. É deveras desafiador crer em alternativas que apostem na prescindibilidade do sistema penal, no en-tanto, é possível que haja formas alternativas de solução de conflitos que contri-buam para a atuação do próprio sistema de justiça criminal.

Busca-se desenvolver uma nova forma de compreender a justiça com o intuito de:

[…] tentar estabelecer novas formas de gerir um sistema penal hipertrofiado, saindo de um imobilismo cíclico que se limita a criticar o modelo vigente, propor e esperar por improváveis provimentos de descriminalização e des-penalização que nunca ocorrem – ou ocorrem de maneira tímida e inócua, certamente por serem medidas mais acessíveis, menos ousadas (SICA, 2007, p. 10).

A falibilidade do sistema penitenciário, bem como, a reforma do judiciá-rio, apontam para uma forma de “dizer o direito” mais humanizada, cidadã e democrática com o fim de abrigar um novo paradigma de aplicação do direito penal no contexto sócio jurídico brasileiro.

Rouland (2003, p. 131) apresenta uma série de propostas ante a realidade da justiça retributiva no sistema penal:

[…] devem aplicar uma justiça mais ‘social’ do que legal: tendem a descartar o formalismo, visam menos a aplicação do direito do que a restauração da paz social e a adesão das partes ao solucionamento do litígio, consideram o conflito mais como uma doença para curar do que um mal para reprimir.

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Ao decorrer da evolução do sistema penal, a pena adquiriu formas alterna-tivas para seu cumprimento, seja com a restrição de direitos ou prestações auxi-liares. Ainda há diversas reformulações propostas atualmente. Tais fatos, dados históricos, demonstram uma comutação na forma pela qual pode-se enxergar a justiça. Zehr (2008, p. 90) coloca esse pressuposto como uma lente pela qual ocorre a percepção da realidade, podendo surgir visões alternativas que permi-tam compreender a real necessidade da aplicação desse instituto como forma a garantir a aplicação da lei de modo justo, proporcional e eficaz.

Justiça restaurativa

A respeito da falibilidade do sistema punitivo, faz-se a seguinte indagação:

E se no final das contas, estivéssemos diante de um fenômeno mais amplo do que o simples mau funcionamento de um sistema punitivo? Sem aí, ao invés de reformas pragmáticas ou de aperfeiçoamentos tópicos, estivéssemos dian-te do desafio de reordenar a própria ideia de Justiça Criminal? Seria possível imaginar uma justiça que estivesse apta a enfrentar o fenômeno moderno da criminalidade e que, ao mesmo tempo, produzisse a integração dos autores à sociedade? Seria possível imaginar uma justiça que, atuando para além da-quilo que se convencionou chamar de prática restaurativa, trouxesse mais satisfação às vítimas e às comunidades? Os defensores da Justiça Restaurativa acreditam que sim (ROLIM, 2006, p. 90).

Diante das condições supramencionadas de que o instituto da pena não tem cumprido com a função precípua de reeducação do indivíduo e coibição da prática delitiva, esse resultado se dá, em grande parte, por causa de punições irracionais pautadas essencialmente pela violência, de modo a infligir no indi-víduo o ideal de sofrimento como elemento essencial da justiça, esta retributiva6 (SICA, 2007, p. 4).

Nós vemos o crime através da lente retributiva. O processo penal, valendo-se desta lente, não consegue atender a muitas das necessidades a vítima e do

6 A Justiça Retributiva é pautada pela aplicação do direito penal e processual penal como pode-se observar hodiernamente. Forma esta, essencialmente punitiva como sendo “O crime uma violação contra o Estado, definida [a justiça retributiva] pela desobediência à lei e pela culpa. A justiça determina a culpa e inflige dor no contexto de uma disputa entre ofensor e Estado, regida por regras sistemáticas” (ZEHR, 2008, p. 29).

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ofensor. O processo negligencia as vítimas enquanto fracassa no intento de-clarado de responsabilizar os ofensores e coibir o crime (ZEHR, 2008, p. 168).

Em contrapartida, a justiça restaurativa perfaz valores com o intuito de minimizar o exercício do poder estatal ante o sistema punitivo com o objetivo de substituí-lo por modalidades alternativas de solução de conflitos de forma efetiva.7

Por se tratar de uma denominação deveras recente no âmbito jurídico, seu conceito permanece inconcluso em relação à sua dinamicidade emergente.8

Sua contextualização é trazida sabiamente por Zehr (2008), que a aplica de forma prática através da necessidade de observação das relações interpessoais dentro do sistema penal. Desta forma, partindo do pressuposto de que, para esse novo enfoque da justiça, o crime seja uma violação de pessoas e relacio-namentos, cria a obrigação de corrigir os erros. A justiça assume, portanto, o papel de envolver a vítima, o ofensor e a comunidade na busca de soluções que promovam reparação, reconciliação e segurança.

É cabível, portanto, a esta justiça estimular o diálogo entre os envolvidos no litígio como forma de lograr êxito em estabelecer um acordo a respeito da resolução do problema. A Justiça Restaurativa é chamada a colocar esses indi-víduos envolvidos como sujeitos centrais do processo, cabendo a ela estipular a responsabilidade pelo cometimento do delito de forma que sejam assumidas, atender às necessidades oriundas da ofensa, a fim de que “um resultado indivi-dual e socialmente terapêutico seja alcançado” (PINTO, 2005, p. 20).

Para Scuro Neto (apud PINTO, 2005, p. 21), a justiça observada no aspecto restaurativo,

Significa dar resposta sistemática ás infrações e a suas consequências, en-fatizando a cura das feridas sofridas pela sensibilidade, pela dignidade ou reputação, destacando a dor, a mágoa, o dano, a ofensa, o agravo causado pelo malfeito, contando para isso com a participação de todos os envolvidos

7 A denominação Justiça Restaurativa é atribuída a Eglash (1977), que sustentou, em seu artigo, que haviam três respostas ao crime – a retributiva, baseada na punição; a distributiva, focada na reeducação; e a restaurativa, cujo fundamento seria a reparação.8 Apesar do uso de longa data, o tema abordado pela Justiça Restaurativa possui ainda divergências acerca da terminologia, como por exemplo: Justiça Restaurativa, Justiça Repa-radora, Justiça Reintegradora, Justiça Reintegradora, entre outras (BIANCHINI, 2012, p. 88). O termo “Restaurativa” acabou por prevalecer em português, embora pareça uma tradução imprópria de “Restorative Justice”. Alguns autores preferem por referenciá-la como “Justiça Restauradora”.

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(vítima, infrator, comunidade) na resolução dos problemas (conflitos) criados por determinados incidentes. Práticas de justiça com objetivos restaurativos identificam os males infligidos e influem na sua reparação, envolvendo as pessoas e transformando suas atitudes e perspectivas em relação convencio-nal com o sistema de justiça, significando, assim, trabalhar para restaurar, reconstituir, reconstruir de sorte que todos os envolvidos e afetados por um crime ou infração devem ter, se quiserem, a oportunidade de participar do processo restaurativo.

Desta forma, o crime passa a ser observado como uma ofensa contra a pessoa e não mais como o simples descumprimento legal e adequação típica, tendo como vítima o Estado que também é detentor do poder de punir. A justi-ça restaurativa não está preocupada apenas com uma resposta adequada ao cri-me, mas com uma solução que possa reparar a situação de forma a reestabelecer o “status quo ante” da relação dos sujeitos envolvidos.

Sica (2007, p. 12) interpreta a Justiça Restaurativa como sendo um “pro-cesso por meio do qual todas as partes com interesse numa particular situação problemática encontram-se para resolver como lidar com as consequências do fato [crime, ofensa e conflito] e suas implicações futuras”.

Nessa forma de justiça, a punição moral e o arrependimento do ofensor são elementos observados com maior amplitude e mais facilmente passíveis de resolução do que na forma tradicional punitiva, que seja o cárcere. Esse novo enfoque permite que, através do conhecimento das consequências, aferição dos danos, “olhar nos olhos da vítima novamente”, se procure uma forma de res-tauração junto ao legítimo interessado nessa resolução, quer seja o ofendido, e é mais que uma economia processual, mas sim uma possibilidade de acesso e realização da justiça (SPIGAROLI; AQUOTTI, 2014, p. 4).

A justiça restaurativa vê o crime como mais do que quebrar a lei – este tam-bém causa danos às pessoas, relacionamentos e à comunidade. Assim, uma resposta apenas deve abordar esses danos bem como a irregularidade. Se as partes estão dispostas, a melhor maneira de fazer isto e para ajuda-los a se reunirem com o fim de discutir a respeito destes danos e sobre como resol-ve-los. Outras abordagens são disponíveis se não há interesse das partes. Na maioria das vezes estas reuniões podem levar a mudanças transformadoras em suas vidas (SPIGAROLI; AQUOTTI, 2014, p. 4, tradução livre).9

9 Conceito de Justiça Restaurativa trazido pelo Programa Justice and Reconciliation: “A pro-gram of Prision Fellowship International. Texto original: “Restorative justice views crime as more than breaking the law – it also causes harm to people, relationships, and the commu-

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Trata-se, portanto de um modelo diferenciado de justiça que tem por intui-to priorizar a resolução do problema que causou o dano e não apenas o processo penal em si. O conceito de crime supra traz a ideia de que, para a justiça restau-rativa, o crime não se limita ao fato típico, antijurídico e culpável, mas implica em uma violação nas relações entre a vítima, o infrator e a comunidade, com-preendendo como forma de restauração identificar as necessidades e obrigações advindas do rompimento dessa relação.

Coaduna com esse entendimento a conceituação trazida pelo atual ins-trumento legislativo nacional, a Resolução do CNJ, de nº 225, de 31 de maio de 2016, que em seu artigo 1º traz a Justiça Restaurativa como parte de:

Um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e ativi-dades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, insti-tucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado (CNJ, 2016).10

Envolvendo a teoria conceitual da justiça restaurativa na visão de Maccold e Wachtel (2003, p. 3), ela deve abranger três especificidades: buscar saber quem foi prejudicado, quais as suas necessidades e como atendê-las da melhor forma:

Crimes causam danos a pessoas e relacionamentos, e que a justiça restaura-tiva não é feita porque é merecida e sim porque é necessária, através de um processo cooperativo que envolve todas as partes interessadas principais na determinação da melhor solução para reparar o dano causado pela transgres-são – a justiça restaurativa é um processo colaborativo que envolve aqueles mais diretamente afetados por um crime chamados de “partes interessadas principais” para determinar qual a melhor forma de reparar o dano causado pela transgressão (MACCOLD; WACHTEL, 2003, p. 3).

Através desse raciocínio, confirmado também por Alves (2012),11 a modali-dade restaurativa da justiça visa empoderar as partes com as devidas ferramentas

nity. So a just response must address those harms as well as the wrongdoing. If the parties are willing, the best way to do this is to help them meet to discuss those harms and how to about bring resolution. Other approaches are available if they are unable or unwilling to meet. Sometimes Those meetings lead to transformational changes in their lives”. Disponível em: <https://bit.ly/2ewvk8b>. Acesso em: 24 abr. 2015.10 Disponível em: <https://bit.ly/2z0nKil>. Acesso em: 12 jun. 2015. 11 Disponível em: <https://bit.ly/2Nq67dZ>. Acesso em: 12 jun. 2015.

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para a solução do próprio caso como sujeitos centrais do processo. Significa di-zer que essa justiça não é baseada única e exclusivamente na ausência de punibi-lidade, mas possui a capacidade de fazer com que a responsabilidade pelo delito seja assumida e seja alcançado um resultado tanto individual como socialmente terapêutico, promovendo a “cura” das relações interpessoais.

Cumpre salientar que estes “sujeitos centrais”, ao participares de forma conjunta para a elaboração de soluções a fim de que sejam restaurados frente aos traumas e perdas causados pelos crimes, através de diversos procedimentos e níveis de atuação restaurativa, representados na Figura 1.

Figura 1: Tipologia das práticas restaurativas:12

A mediação penal como prática restaurativa no Brasil: limites e perspectivas

12 Disponível em: <https://bit.ly/2K8j4vi>. Acesso em: 19 jan. 2015.

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O sistema penal brasileiro tem adotado a pena privativa de liberdade como solução prática para a punibilidade da maioria dos crimes tipificados pelo orde-namento jurídico pátrio como abordado no capítulo anterior.

Nesse sentido, “o Brasil de forma desapercebida tem adotado a perspecti-va do direito penal como um método de solução específica e; ou exclusiva dos problemas sociais infracionais evidenciados” (ALVES, 2012).13 Desta forma, o processo penal como como está constituído busca essencialmente a punição do infrator desde que cumpridas as devidas formalidades ignorando outros fa-tores atribuídos ao indivíduo criminoso. A justiça retributiva como instituída no país está vinculada ao ato cometido (passado) e não em formas para que o infrator não volte a cometer delitos e seja reinserido na sociedade (futuro). Em sua essência, busca resolver o processo e não o problema particular da relação abalada.

Movimentos tendentes a uma teoria mista da aplicação da pena passam a questionar a real finalidade deste instituto buscando uma resposta institucional ao crime.

A racionalidade penal moderna se baseia essencialmente na teoria da pena e demonstra que, no entendimento de Beccaria (1738-1794), o direito penal seria um sinônimo de pena e de punição para que houvesse um bem-estar comum, portanto detendo ao Estado o “freio” para as condutas desviadas do padrão legislativo com o poder de impor castigos. No entanto, passou-se a perceber que as garantias individuais e as expectativas legítimas das pessoas passaram a figurar em segundo plano. Desta forma, a pena como elemento central da ra-cionalidade penal moderna passa a ser discutida e pensada como uma desjudi-cialização da solução de conflitos. Diante da diversificação dos procedimentos de negociação pretende-se dispor ao indivíduo o acesso à justiça como meio de atingir a solução de conflitos (SICA, 2007, p. 137).

O real propósito é buscar dispor ao indivíduo o acesso à justiça como meio de atingir a resolução de conflitos através dos métodos alternativos de solução dos conflitos como a mediação. Tendo este por objetivo, paulatinamente, a jus-tiça restaurativa se insere no ordenamento jurídico brasileiro de forma a flexi-bilizar o sistema penal tradicional desenvolvendo-o por uma transformidade social, não com o intuito de deixar de punir, “mas de propor coerência a forma de punição, gerando satisfação às partes envolvidas na situação fática, quais sejam, infrator, vítima e sociedade” (ALVES, 2012).14

13 Disponível em: <https://bit.ly/2Nq67dZ>. Acesso em: 12 jun. 2015.14 Disponível em: <https://bit.ly/2Nq67dZ>. Acesso em: 12 jun. 2015.

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Pode-se dizer que seria uma reformulação da justiça tradicional com o intuito de trazer à tona direitos e garantias individuais para uma solução mais efetiva da lide penal e implicações conexas.

No entanto, ainda que as diretrizes para esse novo sistema estejam sen-do implantadas progressivamente, um dos maiores desafios é a delimitação de fronteiras de sua atuação.

Isso porque o modelo restaurativo coloca em cheque diversos fundamen-tos a respeito de “crime e castigo”, que estão arraigados tanto na cultura brasi-leira quanto em teorias provindas de outras localidades.

Pode-se perceber que “se a reserva legal é uma proteção do cidadão contra o arbítrio, pode admitir-se sua flexibilização para evitar a ação desnecessária do poder punitivo sobre o indivíduo”. Isso quer dizer para o autor um desapego ao sistema “dos delitos e das penas” em razão de o sistema restaurativo promover uma responsabilização na maioria dos casos de caráter não penal e, da mesma forma, incluído em alguns casos a existência do delito sem a existência da pena (SICA, 2007, p. 180).

O autor traz essa limitação do jus puniendi como uma nova forma de pen-sar o direito penal diante das circunstâncias hodiernas. Desta forma, em razão da intensa demanda de processos judiciais, da insegurança pública e do fre-quente fracasso das políticas públicas extrapenais de consequência à violência, as penas adquiriram uma conotação autoritária e essencialmente repressiva tor-nando inócuo o princípio da legalidade (SICA, 2007, p. 180)

Ferrajoli (2012) demonstra em consonância com o sistema garantista, que o direito penal tem como principal axioma o sistema retributivo, desta forma, sendo a pena uma consequência lógica ao crime, fundada na certeza e previ-sibilidade da implicação dos pressupostos formais. Do contrário, nega-se sua almejada racionalidade.

A flexibilização nacional parte do intuito de permitir, com enfoque deter-minado, a deliberação e participação da comunidade na administração de um poder que, enfim, dela emana conforme a Constituição Cidadã de 1988.em seu artigo 1º, parágrafo único ao afirmar que todo poder emana do povo.

Desta forma, ante o contexto social, Alves aduz que muitos fatos de reper-cussão enfatizem o enrijecimento do regime penal ora existente, a pensar de que na sua maioria é equívoco deixar que o clamor social prepondere à norma (ALVES, 2012).15

Pode-se interpretar que não há dúvidas que a justiça restaurativa traz, em sua essência e princípio, ideais válidos e benéficos entre as partes, no entanto, deve ela ser aplicada de acordo com os contextos sociais, políticos e econômicos

15 Disponível em: <https://bit.ly/2Nq67dZ>. Acesso em: 12 jun. 2015.

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pátrios. Ante, pois, não há uma única forma de implementação deste modelo, mas sim condições próprias para que seja desenvolvida de forma eficaz e aspec-tos peculiares quanto ao seu desenvolvimento em cada país.

No primeiro capítulo, foram abordados diversos exemplos de práticas res-taurativas desenvolvidas em diferentes países. Tomando por base as localidades pioneiras, foi formado o sistema restaurativo brasileiro como o conhecemos hoje, através de diversas práticas que serão abordadas a seguir. No entanto, é mister dizer que deve o legislador se abster de importar todos os mecanismos utilizados em outros países em razão destes portarem realidades totalmente diferente à do Brasil. Isso porque, nem tudo pode operar como o desejado na teoria, pois na prática, todo o sistema do ordenamento jurídico nacional, bem como o povo brasileiro, não está preparado para a justiça restaurativa de forma plena diante das limitações tanto individuais como coletivas.

No país, a discussão desse tema ainda é limitada e possui seus entraves, restrições e demarcações indefinidas, mas ainda que em passos curtos, cami-nha para um enlaçamento do novo modelo aos ideais funcionais já praticados de forma efetiva no Brasil.

Nos entendimentos de Pinto (2005), há uma compatibilização adequada da justiça restaurativa e do ordenamento jurídico brasileiro. Destarte, esse sistema (restorative diversion) é mais receptivo nos países baseados no common law em razão essencialmente da discricionariedade do promotor ante à possibilidade de dispor da ação penal (prosecutorial discretion). Nesse sistema há uma maior possibilidade de encaminhamento dos casos a programas autônomos diante de uma maior receptividade aos métodos alternativos de solução de conflitos, contrário ao nosso país, mais restritivo e questionador diante das possibilidades alternativas.

O modelo restaurativo começa a ser inserido de forma sutil através da Car-ta Magna Cidadã de 1988 e, posteriormente, com a Lei nº 9.099/95, permitindo certas inovações no âmbito social e informal.

Em seu artigo 98, a Constituição estabelece a criação dos Juizados Espe-ciais Criminais (JECRIM) e, com eles, a possibilidade de conciliação e mediação em procedimento oral e sumaríssimo, de infrações penais de menor potencial ofensivo. A partir de então, houveram diversas contribuições legislativas que implementaram, de forma efetiva, práticas com o intuito precípuo de solucionar os conflitos penais de uma nova forma, no caso, restaurativa.

Pode-se citar também o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê o modelo restaurativo essencialmente ao dispor a respeito do instituto da remissão em seu artigo 126,16 bem como demais mecanismos de exclusão,

16 Disponível em: <https://bit.ly/1MzlCIG>. Acesso em: 12 jun. 2015.

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suspensão ou extinção do processo referente à aplicação de medidas socioe-ducativas a adolescentes, previstas no artigo 112 e seguintes do diploma legal (ALVES, 2012).17

O estatuto em comento é pautado por valores constitucionais e procura, com a lei, inserir a criança e ao adolescente em conflito em um ambiente re-parativo através de um cunho pedagógico-educativo. A remissão concedida acarretará na exclusão do processo demonstrando claramente uma exceção ao princípio da indisponibilidade da ação penal. O instituto da remissão se faz presente no ECA não como instrumento de graça, mas como reconhecimento da responsabilidade pelo próprio adolescente de forma a reconhecer a condição da parte contraria (que foi lesada), condicionando sua liberdade de maneira inerente ao senso de responsabilidade. Ademais, a reparação do dano como prestação social construtiva, é uma imposição que pode ser suportada pelo me-nor infrator de maneira que conduza à sua responsabilização de forma eficaz (ALVES, 2012).18

Também, nos crimes contra idosos, é possível o processo restaurativo, conforme previsto pelo artigo 94 da Lei de nº 10.741/2003 – O Estatuto do Ido-so, que aponta o procedimento da Lei 9.099/1995 para crimes contra idosos cuja pena privativa de liberdade não ultrapasse 4 anos (PINTO, 2005).

Considerações finais

O desenvolvimento do trabalho buscou a análise dos procedimentos de justiça restaurativa abordando seu desenvolvimento até as práticas hodiernas. Como resultado de diversos projetos ao redor do mundo, a justiça restaurativa abriu caminhos para o desenvolvimento de diversas medidas legislativas para que pudesse ser inserida na esfera penal de forma efetiva.

Diante do cenário atual da mediação penal é possível compreender que ainda há um longo caminho a ser trilhado. O sistema permanece carente de aprimoramentos e adaptações para que seja estabelecido um modelo próprio brasileiro de forma a atingir os resultados necessários à prevenção da crimina-lidade e responsabilização adequada baseada em uma relação tripartite, quer seja: responsabilização, reparação e reintegração.

Em que se pese a influência da mediação penal no ordenamento jurídi-co brasileiro, esta surge em seu contexto de complementação à resposta es-tatal frente às necessidades sociais prementes de pacificação. Com um ideal

17 Disponível em: <https://bit.ly/2Nq67dZ>. Acesso em: 12 jun. 2015.18 Disponível em: <https://bit.ly/2Nq67dZ>. Acesso em: 12 jun. 2015.

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essencialmente integrativo, parte de princípios e valores como a intervenção mínima do Estado, devolvendo às partes a oportunidade de solucionar seus conflitos da forma que mais convier a ambos.

Dada a importância do tema abordado, e o não esgotamento teórico da pesquisa, torna-se necessário o desenvolvimento de investigações substanciais desta nova forma de dizer o direito pautada por ideias de dignidade humana e solicitude no trato dos conflitos que surgem perante a sociedade.

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