emergências psiquiátricas · 6 - dependência química – normalmente é suporte clínico no ps....
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Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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Emergências psiquiátricas
Quando falamos em emergências psiquiátricas descrevemos as situações em que existe um risco
significativo, tanto de morte quanto danos graves para o paciente ou para terceiros. A intervenção da equipe na
unidade de emergência é necessária e a busca pela rápida ação nos casos de urgência e emergência1 leva a
necessidade de conhecer os principais quadros sindrômicos e seu melhor manejo.
O objetivo de um bom atendimento de pronto socorro (PS) visa a estabilização do quadro, o
estabelecimento de uma hipótese diagnóstica e a exclusão de causas orgânicas com o posterior encaminhamento
para o correto tratamento (ambulatorial ou internação).
Agitação psicomotora é uma entidade muito comum no PS e as principais causas são descritas no quadro
abaixo:
Causas de agitação psicomotora
Quadros psicóticos / paranoides
Síndromes maníacas
Intoxicação ou abstinência por drogas
Síndromes fóbico-ansiosas
Transtornos da personalidade: antissocial, emocionalmente instável
Transtornos na infância: déficit de atenção e hiperatividade, autismo,
transtornos da conduta, deficiência intelectual
Agitação no paciente epiléptico e nos traumatismos cranianos, tumores
Distúrbios metabólicos: hipo/hiperglicemia, infecções, tireoideopatias,
uremia, insuficiência hepática
Síndromes psicorgânicas: delirium, demência
A presença de um transtorno mental não prediz, por si, um comportamento violento. A avaliação no PS
inclui a anamnese subjetiva (com o paciente) e anamnese objetiva (com familiares e amigos), o exame físico, exame
do estado mental e exames subsidiários (quando pertinentes). Devemos pesquisar e estar atendo para três grupos
principais de fatores determinantes para agitação psicomotora:
- Fatores de natureza orgânica: alterações repentinas de humor com irritabilidade, heteroagressividade. Outros apresentam confusão mental com rebaixamento de nível de consciência, desorientações no tempo-espaço e distúrbios da memória. Trauma craniencefálico, epilepsia, intoxicação por drogas, distúrbios metabólicos e abstinência.
- Sintomas psicóticos agudos: quadros psicóticos em bipolares, esquizofrênicos ou transtornos delirantes crônicos.
- Transtornos da personalidade: podem ocorrer reações agudas a situações que exijam novas formas de se ajustar a situações de estresse, conflitos familiares, separações e lutos. Comum em pacientes do tipo borderline e histriônicos.
1 Emergência: intervenção imediata ou inadiável como quadros de violência, tentativa de suicídio, estupor depressivo, mania com sintomas psicóticos, automutilação, severa autonegligência e juízo crítico muito comprometido. Urgência: situações de menor risco na qual as intervenções ocorrem num curto prazo, tais como: comportamentos bizarros, quadros agudos de ansiedade, síndromes conversivas e sintomas psicóticos.
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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Abaixo segue descrição de preditores de comportamento violento.
Hostil Agressivo Violento
Postura
Senta-se na beira da cadeira, evita olhar para o examinador; tom de voz elevado ou lacônico.
Não se senta e age de forma intimidadora. Faz ameaças verbais, fala palavrões e fala alto todo tempo.
Anda de um lado para outro. Diz que vai agredir ou acabou de agredir alguém.
Psicomotricidade
Inquieto, tamborila os dedos, aperta as mãos uma contra a outra, morde os lábios.
Quase agitado. Esmurra a parede, gesticula muito. Quebrou objetos em casa.
Agitado. Tem algo nas mãos para se defender ou agredir. Quebra objetos no ambiente.
Humor Demonstra irritação, falta empatia com o examinador.
Está raivoso. Demonstra ódio de todos.
Está furioso. Demonstra intenção de agir violentamente.
Risco
Alto Muito alto Iminente
Conduta
Tentar abordagem amigável e buscar convencer o paciente a se deixar medicar
Tentar diálogo com cautela e interromper a qualquer sinal de piora passando para a conduta do item VIOLENTO.
O sucesso com o diálogo é remoto e o processo de contenção deve ser iniciado.
Frente ao quadro de agitação psicomotora ou paciente violento devemos avaliar o paciente na presença de
membro da equipe de segurança do hospital, não deixar o paciente sozinho ou apenas com familiares, manter a
porta aberta durante a entrevista, se identificar de forma clara para o paciente informando seu nome e que se trata
de um profissional da saúde disposto a ajuda-lo, evitar confrontos e ameaças ao paciente, conter fisicamente
quando necessário, investigar consumo de bebida alcoólica e outras drogas.
A contenção física é um procedimento com indicação como medida de proteção do paciente e de outras
pessoas e tem uma finalidade terapêutica. Deverá ser seguida de medida química de sedação e cabe lembrar dos
cuidados quanto a perfusão dos membros contidos.
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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Pensar nas síndromes facilita.
As principais síndromes psiquiátricas encontradas nos atendimentos de PS são pormenorizadas a seguir:
1 – Psicóticas – as síndromes psicóticas se caracterizam por sintomas típicos como alucinações e delírios,
pensamento desorganizado e comportamento bizarro, como fala e risos imotivados. Alucinações auditivas que
comentam, comandam ou divulgam as ações; ideias delirantes com conteúdo paranoide/autorreferente. Dentre os
quadros mais comuns temos a esquizofrenia, transtorno delirante e as psicoses breves, reativas ou psicogênicas.
2 – Maníacas – a síndrome maníaca apresenta humor elevado, euforia, sentimento de engrandecimento,
taquipsiquismo, redução da necessidade de sono, fala rápida e pode perder a coerência lógica, distraibilidade,
agitação psicomotora, desinibição social e sexual. Quando apresentam delírio este tende a ser de grandeza, poder
ou místico-religioso. Dentre os quadros mais comuns se destaca o transtorno afetivo bipolar (TAB).
3 – Depressivas – as síndromes depressivas apresentam o humor triste, desânimo, perda do interesse, anedonia,
fadiga, perda da energia, baixa autoestima, prejuízo na concentração, pensamentos de morte, retardo/agitação
psicomotora. Nos quadros graves a presença do delírio tende a ser de ruína ou culpa, hipocondríaco ou de negação
de órgãos (Síndrome de Cotard).
4 – Ansiosas – as síndromes ansiosas podem ser divididas em 2 subgrupos: ou é constante e permanente (TAG –
ansiedade generalizada) ou há crises abruptas de maior ou menor intensidade (Pânico).
TAG – sintomas ansiosos excessivos na maior parte dos dias, preocupações, tensão, nervosismo e uma vida
angustiada. Dificuldade em relaxar, apresenta dores como cefaleias, dores musculares. (Dificilmente procuram um
PS e o tratamento deve ser orientado ambulatorialmente).
Pânico – crises intensas de ansiedade nas quais ocorre importante descarga do sistema nervoso autônomo
(taquicardia, sudorese fria, tremores, opressão torácica, formigamentos), sensação de despersonalização (corpo
leve, perda do controle) e/ou desrealização (sente o ambiente estranho).
Lembrar que condições clínicas apresentam sintomas ansiosos: fibrilação atrial, flutter, edema agudo de
pulmão, infarto agudo miocárdico, feocromocitoma, tireotoxicose, uso de drogas e medicamentos como beta 2
agonistas.
5 – Demenciais – declínio cognitivo com prejuízo em atenção, memória, aprendizado, linguagem, função executiva,
capacidade de reconhecer e identificar objetos e cognição social. Normalmente pacientes com quadros demenciais
são levados a um PS quando apresentam piora do quadro da agitação psicomotora com agressividade contra os
cuidadores ou quando apresentam algum comportamento que coloquem em risco sua segurança. Quadros
avançados de demência podem levar os pacientes a perda ponderal devido dificuldade de deglutição e quedas
frequentes. Lembrar que mesmo tendo demência uma pessoa pode descompensar e apresentar um quadro de
delirium!!!!
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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6 - Dependência Química – normalmente é suporte clínico no PS.
Intoxicação: síndrome reversível com alterações comportamentais ou mentais, como prejuízo do nível de
consciência e outras alterações cognitivas, beligerância, agressividade ou humor instável causada pela ingestão
recente de substância psicoativa.
Álcool – paciente apresenta hálito etílico, conjuntivas hiperemiadas; Alterações do afeto (excitação, alegria, irritabilidade); fala pastosa ou arrastada; Alterações do comportamento (impulsividade, agressividade, diminuição do desempenho motor e ataxia); Lentificação do pensamento, diminuição da capacidade de raciocínio e juízo crítico.
Aferir Pressão Arterial, glicemia capilar, saturação O2. Hidratação, antiemético. Não se dá benzodiazepínico!!!
Cocaína/crack – A intoxicação por cocaína pode causar aumento da pressão arterial, da frequência
cardíaca, da alta estima e do desejo sexual, euforia, sudorese, dilatação pupilar, entre outras. Em doses altas, pode causar comportamentos violentos, hipervigilância e paranoia, podendo evoluir com depressão do SNC.
Aferir PA, ECG – risco IAM. Se agitação ou ansiedade por ser útil o benzodiazepínico.
Abstinência: conjunto de sinais e sintomas que ocorrem após horas ou dias que o indivíduo cessa ou diminuir o uso de uma determinada substância psicoativa. Podem variar de ansiedade, inquietação, náusea, tremor, sudorese, podendo ocorrer em alguns casos convulsões e coma.
Álcool – tratamento com hidratação vigorosa IV, diazepam e tiamina (B1). (Abaixo destacamos a
síndrome de abstinência ao álcool).
Cocaína/crack – pode ocorrer fissura, agitação e ansiedade, com posterior cansaço e desejo intenso
de dormir. Com o passar dos dias pode apresentar diminuição da capacidade de sentir prazer, tédio e desmotivação.
Quando paciente com muita ansiedade / fissura pode ser indicado uso de benzodiazepínico.
7 – Síndromes mentais orgânicas: Delirium (Estado Confusional Agudo) – quadro de rebaixamento do nível da
consciência com alteração da atenção e da orientação; pensamento ilógico e discurso desorganizado; alucinações
visuais; irritação ou labilidade emocional; agitação ou lentificação psicomotora; alteração do ciclo sono-vigília.
Fatores de risco: idade, prejuízo cognitivo, distúrbios metabólicos, cirurgia, isolamento social, mudança de
ambiente, infecções.
Características clínicas comparativas entre delirium, demência, depressão e esquizofrenia.
Característica Delirium Demência Depressão Esquizofrenia
Inicio Agudo Insidioso Variável Variável
Curso Flutuante Progressivo Episódios que se repetem; sem deterioração
Surtos com possível deterioração
Reversibilidade Sim Não Sem prejuízos Com prejuízo afetivo e de personalidade
Nível de consciência Prejudicado Preservado Preservado Preservado, pode haver perplexidade
Atenção/memória Desatenção marcante, memoria ruim
Memória progressivamente pior
Atenção ruim, memória pouco prejudicada
Atenção ruim, memória pouco prejudicada
Delírio Efêmero, fragmentado
Paranoide, pouco elaborado
Congruente com humor
Frequente, pode ser elaborado
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8 – Dissociativas/Conversivas – pejorativamente conhecidos no meio médico de baixa formação e pouco
poder intelectual como “piti” ou “DNV” (Distúrbio Neurovegetativo). Quadros normalmente associados a
eventos como brigas ou nervosismo. Associados comumente a quadros histéricos caracterizando-se por
manifestações clinicas referentes ao corpo e à mente.
Quadros dissociativos –refere-se a uma quebra da unidade psíquica de forma parcial ou completa
que se manifesta pela desintegração de funções da memória, consciência, identidade e das sensações e
controle dos movimentos corporais (Amnésia dissociativa, Fuga dissociativa, Estupor dissociativo,
Transtorno de transe e possessão).
Quadros conversivos – transposição de um conflito psíquico em sintomas somáticos: sistema
neuromuscular voluntário (paralisias) ou sensório-perceptivo (anestesias). Transtornos motores como
flexão das mãos, Convulsões, Anestesia.
Crises dissociativas Crises convulsivas
Mais comum em mulheres Distribuição equilibrada entre os sexos
Antecedentes pessoais de personalidade histriônica, neurose histérica, ou conflitos psicológicos importantes
Podem ou não haver alterações psiquiátricas prévias; pode ser referido um perfil do tipo personalidade epiléptica
Predominam manifestações motoras, que tendem a ser mais bizarras (como ataque ao examinador durante a convulsão)
Segue os padrões dos diferentes tipos de crises epilépticas (as crises parciais complexas, com seus automatismos, também podem apresentar aspecto aparentemente bizarro)
Uma fase tônica precedendo a clônica é mais rara A fase tônica precede a clônica no tipo grande mal
O paciente quase sempre fica com os olhos fechados durante a crise
O paciente pode ter a crise com os olhos abertos
Quando o indivíduo prende a respiração, as extremidades quase sempre se apresentam relaxadas
Hipertonia generalizada
Atividade motora bilateral com preservação de consciência indica pseudocrise
Quando há atividade motora bilateral, a consciência deve estar sempre alterada (exceção: espasmos mioclônicos ou flexores)
Tende a surgir na presença de outras pessoas, durante o dia, após discussões ou brigas familiares; raramente surgem durante o sono
Pode surgir durante o sono ou quando o indivíduo está sozinho
Instalação costuma ser mais lenta que abrupta Instalação geralmente abrupta; pode haver o “grito epiléptico” precedendo a crise
Duração tende a ser mais longa que a de uma crise epiléptica
Duração mais curta, geralmente de segundos a poucos minutos
Geralmente não há confusão mental, obnubilação, tontura, cefaleia intensa ou hipotonia muscular após pseudocrise
Após a crise, podem ocorrer confusão mental e obnubilação, tontura, cefaleia intensa e hipotonia muscular
Raramente há liberação de esfíncteres durante a crise Pode haver liberação de esfíncteres durante a crise
EEG não demonstra alterações durante a crise; tende a ser normal nos períodos intercrises
O EEG pode demonstrar manifestações do tipo epiléptico na fase interictal; na fase ictal, sempre há manifestações no EEG
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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9 – Relacionadas ao consumo de alimentos: os transtornos da alimentação são a anorexia nervosa (perda
de peso por restrição da ingestão calórica, distorção da imagem corporal e pode ocorrer métodos
purgativos com vômitos, laxantes e exercícios físicos excessivos) e a bulimia nervosa (episódios de comer
compulsivo numa forma de descontrole com posterior desejo de controle do peso e uso de métodos como
vômitos, purgação, enemas, diuréticos). A indicação de internação de tais pacientes ocorre quando:
• IMC: abaixo da faixa de 13 a 14 kg/m2;
• Presença de alterações hemodinâmicas, hidroeletrolíticas e metabólicas importantes: hipotensão
arterial grave, bradicardia, hipotermia, hipoglicemia, hipopotassemia;
• Alterações físicas indicativas de ameaça imediata à sobrevivência da paciente: disfunção cardíaca, renal
ou hepática, sintomas de desidratação e desnutrição graves.
10 – Transtorno do espectro do autismo – déficits persistentes na comunicação social e na interação social em
múltiplos contextos. Déficit na reciprocidade socioemocional (com pouco interesse, emoção ou afeto, prejuízo no
contato visual, pouca expressão facial e prejuízo na comunicação não verbal, dificuldade em fazer amigos ou
ausência no interesse por outras crianças) e padrões restritivos e repetitivos do comportamento, interesses ou
atividades (estereotipias motoras, girar objetos, ecolalia, sofrimento a pequenas mudanças da rotina, interesses
fixos a um objeto, hipo ou hiper-reatividade a algum estimulo, seja dor, temperatura ou som).
11 – Deficiência intelectual – prejuízo desde o início do desenvolvimento que inclui déficit em funções intelectuais
como raciocínio, solução de problemas, planejamento, pensamento abstrato, aprendizagem acadêmica e prejuízo
em funções adaptativas socioculturais em relação a independência pessoal e responsabilidade social.
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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Dependência ao álcool e síndrome de abstinência
• 11% dos homens bebem diariamente / 90% é metabolizado no fígado a velocidade de 10g/h
• Alto valor energético / impede a neoglicogênese / tem pouca vitamina
• Deficiência de Tiamina, piridoxina, folatos e proteínas
• Metabolismo do álcool gera hipoglicemia, acidose lática, cetoacidose, hiperuricemia e
hipertrigliceridemia
Beber cronicamente leva o SNC a neuroadaptação com potencialização dos efeitos inibitórios do
GABA; logo, se deixar de beber ou reduzir a quantidade de álcool em quem é dependente há desequilíbrio
entre GABA (que deixa de funcionar) e uma maior atividade excitatório Glutamatérgica (e
noradrenérgica)...então temos os sintomas de hiperexcitabilidade neuronal !!!
Abstinência
12 – 18h sem álcool: ansiedade, irritabilidade, cefaleia, fraqueza, náusea, tremor
24 – 72h sem álcool: ↑ atividade autonômica: ↑PA, ↑ FC, ↑ TºC, sudorese, agitação psicomotora,
alucinações visuais/táteis, convulsão, delirium tremens - DT (que se caracteriza por alucinações visuais e
táteis, flutuação do nível de consciência (frequentemente com piora noturna – sundowning) e
desorientação. A mortalidade nos pacientes com DT varia de 5 a 25%).
Quais exames solicitar?
Hemograma Glicemia Sódio
Potássio Cálcio Magnésio
AST ALT Gama GT
Bilirrubinas Ureia Creatinina
Proteínas total e frações CPK Urina 1
Coagulograma ECG Raio X
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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Tratamento - Lembrar que:
1 – Diazepam ocupa o receptor GABA, então trata a falta do álcool→ Quadro leve 20 – 40mg/d e quadro
grave 10 – 20mg/h até sedação leve (Lorazepam é útil se paciente é hepatopata).
2 – Tiamina precisa ser reposta 300-500mg/d (alguns trabalhos variam entre 100 a 1500mg/d).
Síndrome de Wernicke-Korsakoff – devido a carência de vit B1 apresentando ataxia, confusão
mental e nistagmo/oftalmoplegia (Wernicke) e Confabulação e prejuízo na memória anterógrada e
retrógrada (Korsakoff).
3 – Antes de dar glicose para um etilista crônico é necessário repor tiamina, caso contrário uma iatrogênia
será feita levando a uma piora da Encefalopatia de Wernicke. A forma metabolicamente ativa da tiamina
é o pirofosfato de tiamina, que desempenha um papel importante como um
cofator no metabolismo da glicose. As enzimas que são dependentes da tiamina pirofosfato estão
associadas com o ciclo do ácido cítrico (ciclo de Krebs), que catalisam a oxidação do piruvato, α-
cetoglutarato e aminoácidos de cadeia ramificada. Assim, qualquer coisa que estimular o metabolismo da
glicose vai agravar essa deficiência de tiamina clínica ou subclínica existente.
4 – Magnésio é cofator na absorção de tiamina e potássio, logo se não conseguir dosar o magnésio sérico
pode ser feita reposição empírica.
Prescrições sugeridas nos quadros de abstinência ao álcool:
Quadro Leve
1 - Dieta geral
2 - Soro Fisiológico 1000ml IV 12/12h (poderá ser acrescido 1 ampola de complexo B)
3 - Tiamina 100mg/ml 1amp EV 8/8h por 3 dias (posteriormente prescrever Tiamina 300mg VO/d)
4 - Diazepam 10mg VO 6/6h (aumentar ou diminuir conforme grau de sedação do paciente)
Grave / Delirium tremens
1 - Jejum
2 - Soro Fisiológico 1000ml IV 8/8h Complexo B 1 ampola
3 – Soro Glicosado 10% 1000ml NaCl 10% 40ml IV 12/12h KCl 19,1% 10ml
4 – Sulfato de Magnésio 10% 1 ampola (10ml) 1x/dia Soro fisiológico 250ml
5 - Tiamina 100mg/ml 3 amp IV 8/8h por 3 a 5 dias
6 - Diazepam 10mg/2ml IV até sedação leve (pode ser necessário fazer 1 ampola a cada 5-10
minutos nos casos mais graves, e o objetivo é que o paciente pare de tremer, melhore os parâmetros de FC, PA,
Temperatura e fique num estado mais sonolento. Normalmente com o passar do tempo você perceberá que as
injeções de diazepam se tornam mais espaçadas e o nível de consciência do paciente não mais flutua permitindo
que a troca para diazepam VO seja realizada).
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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Depressão – sentimento de tristeza, autodesvalorização, culpa, anedonia, apatia,
redução energia / alteração sono e apetite / lentificação psicomotora, ideação suicida,
crises de choro
Inibidores da recaptação de serotonina Fluoxetina 20mg VO cedo (até 60mg/d) → não associar c/ tamoxifeno e
varfarina Sertralina 50mg VO cedo (até 200mg/d) → comum diarreia no início; bom pra
idosos Citalopram 20mg VO noite (até 60mg/d) → bom para idosos e polifarmácia Escitalopram 10mg VO noite (até 20mg/d)→ bom para idosos e polifarmácia
Inibidor da receptação de serotonina e noradrenalina Venlafaxina 75mg VO cedo (até 225mg/d)
Tricíclicos Amitriptilina 25mg VO noite, subindo dose semanalmente tendo efeito antidepressivo a partir de 75mg VO → boca seca, constipação, retenção urina; evitar em quem tem ideação suicida. Em dose baixa (10 a 25mg) tem boa ação na dor neuropática. Nortriptilina – 25mg VO noite, subindo dose semanalmente tendo efeito antidepressivo a partir de 75mg VO → boca seca, constipação, retenção urina; evitar em quem tem ideação suicida; bom para idosos.
Haloperidol (Haldol®)
Prometazina (Fenergan®)
Diazepam (Valium®)
Antipsicótico
Antagonista de dopamina (↓ DOPA)
Trata: esquizofrenia, mania aguda, delirium e para sedação
5mg VO e 5mg/ml IM
Anticolinérgico = age contra efeitos extrapiramidais
Anti-histamínico = sedativo
Antiemético e antivertigem
25mg VO e 50mg/2ml IM
Benzodiazepínico
Se liga ao receptor GABA
Efeito: anticonvulsivo, relaxante muscular, ansiolítico e sedativo
5 e 10mg VO e 10mg/2ml EV (lento e sem diluir)
Prescrições no pronto atendimento
Sedação - Haldol 1 amp + Fenergan 1 amp IM // Haldol 1amp + Midazolam 15mg/3ml IM
Sedação - Midazolam 15mg/3ml + Soro Fisiológico 7ml → aplicar EV lento 3 a 5ml (boa sedação para Tomografia)
Psicose - Haldol 5mg + Fenergan 25mg VO a noite
Mania - Haldol 5mg + Fenergan 25mg VO a noite e Diazepam 10mg 8/8h VO
Delirium - Haldol 5mg meio comprimido 12/12h
Crise de pânico / Dissociativo / Conversivo - Diazepam 10mg VO
Abstinência ao álcool - Leve (Diazepam 20-40 mg/d) e Grave (Diazepam 10-20 mg/h)
Onde existe Haloperidol 5mg VO pode ser substituído por Risperidona 2mg VO
Por Dr Osmar Henrique Della Torre
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Nome genérico Nome comercial Via oral Via parenteral
Haloperidol Haldol 5mg 5mg/ml
Prometazina Fenergan 25mg 50mg/2ml
Diazepam Valium 5 e 10mg 10mg/2ml
Midazolam Dormonid 15mg 5mg/5ml 15mg/3ml – usamos esse 50mg/10ml
Clonazepam Rivotril 0,25 / 0,5 / 2mg
Tiamina – vit B1 Benerva 300mg 100mg/ml
EXAME DO ESTADO MENTAL
É a pesquisa de sinais e sintomas do funcionamento mental através da entrevista psiquiátrica. Dividimos
de forma didática o funcionamento mental em Consciência, Atenção, Sensopercepção, Orientação, Memória,
Inteligência, Afetividade, Pensamento, Juízo Crítico, Conduta e Linguagem (CASOMI APeJuCoL).
APARÊNCIA - Observar o modo do paciente de andar, sua postura, roupas, adornos e maquiagem utilizados, sua
higiene pessoal, cabelos alinhados ou em desalinho, atitude (amigável ou hostil), humor ou afeto predominante,
modulação afetiva, sinais ou deformidades físicas importantes, idade aparente, as expressões faciais e o contato
visual.
FUNÇÕES MENTAIS
CONSCIÊNCIA - É o estado de lucidez ou de alerta em que a pessoa se encontra, variando da vigília, estupor e até o
coma. É o reconhecimento da realidade externa ou de si mesmo em determinado momento, e a capacidade de
responder aos seus estímulos.
ATENÇÃO - A atenção é uma dimensão da consciência que designa a capacidade para manter o foco em uma
atividade.
Vigilância: designa a capacidade de voltar o foco da atenção para os estímulos externos. Pode estar:
aumentada - hipervigil - podendo haver, neste caso, um prejuízo da atenção para outros estímulos; ou diminuída -
hipovigil - quando o paciente se torna desatento em relação ao meio.
Tenacidade: capacidade de manutenção da atenção ou de uma tarefa específica.
Concentração: é a capacidade de manter a atenção voluntária em processos internos do pensamento ou
em alguma atividade mental. O teste formal para a avaliação da concentração é o da subtração consecutiva do
número 7 a partir do número 100.
SENSOPERCEPÇÃO - Designa a capacidade de perceber e interpretar os estímulos que se apresentam aos órgãos
dos sentidos. Os estímulos podem ser: auditivos, visuais, olfativos, táteis e gustativos.
Ilusões: ocorrem quando os estímulos sensoriais reais são confundidos ou interpretados erroneamente;
geralmente ocorrem quando há redução de estímulos ou do nível de consciência (delirium); por exemplo, um cinto
é percebido como uma cobra, miragens no deserto (enxerga-se água nas dunas).
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Alucinações: ocorre a percepção sensorial na ausência de estímulo externo. Alucinações Visuais: são mais
características de transtornos mentais orgânicos, especialmente em estados de delirium e podem ser
amedrontadoras. Podem também ocorrer no luto normal (visão da pessoa falecida), em depressões psicóticas (ver-
se dentro de um caixão). Hipnagógicas: ocorrem imediatamente antes de dormir e sua ocorrência, quando
ocasional, é normal, porém, experiências repetidas representam invasões do sono REM na consciência;
Hipnopômpicas: precedem o acordar, geralmente nos estados semicomatosos.
Pseudoalucinações: são reconhecidas, percebidas como irreais, projetadas no mundo interno (“vem de
dentro da minha cabeça’) mas pouco nítidas, diferente das alucinações.
ORIENTAÇÃO - Capacidade do indivíduo de situar-se no tempo, espaço ou situação e reconhecer sua própria
pessoa.
MEMÓRIA - É a capacidade de registrar, fixar ou reter, evocar e reconhecer objetos, pessoas e experiências
passadas ou estímulos sensoriais. A memória é ainda dividida em memória declarativa ou verbal (de fatos, eventos,
nomes de pessoas) ou procedural: de habilidades ou procedimentos. Funcionalmente as áreas encefálicas
responsáveis pela memória podem ser divididas em: área de registro (córtex cerebral), área de consolidação ou
retenção (hipocampo), área de armazenamento (lobo temporal) e área de recuperação (dorso medial do tálamo).
Para fins de avaliação divide-se a memória em: sensorial, que recebe a informação dos órgãos dos sentidos e a
retém por breve período de tempo (0,5 segundos); imediata, responsável pelo registro de informações ouvidas nos
últimos 15 a 20 segundos; recente, que se divide em de curto prazo (5-10min) e de longo prazo (mais de 30 min); e
remota, que é a responsável pela retenção permanente de informação selecionada.
INTELIGÊNCIA - Capacidade de uma pessoa de assimilar conhecimentos factuais, compreender as relações entre
eles e integrá-los aos conhecimentos já adquiridos anteriormente; de raciocinar logicamente e de forma abstrata
manipulando conceitos, números ou palavras. Capacidade de resolver situações novas com rapidez e com êxito
mediante a realização de tarefas que envolvam a apreensão de relações abstratas entre fatos, eventos,
antecedentes e consequências, etc.
AFETIVIDADE e HUMOR - É a experiência imediata e subjetiva das emoções sentidas pelo paciente em relação ao
que o cerca, abrangendo desde sentimentos em relação a pessoas e ambientes até lembranças de fatos, situações,
ou pessoas do passado, bem como expectativas sobre o futuro. Humor é a tonalidade de sentimento predominante,
e mais constante, que pode influenciar a percepção de si mesmo, e do mundo ao seu redor (Eutimico – normal,
hipotimico hipertímico, elação/expansão do eu). Afeto é a experiência da emoção subjetiva e imediata, ligada a
ideias ou representações mentais e que pode ser observada pelas suas manifestações objetivas: alegre, triste,
embotado, expansivo, inapropriado ou incongruente, labilidade afetiva (rápidas alternações de afetos opostos,
indiferença afetiva ou "la belle indiference" (ocorre uma restrição importante na saúde ou vida do paciente, como
não conseguir movimentar um membro, e a reação deste é praticamente indiferente).
PENSAMENTO: É o conjunto de funções integrativas capazes de associar conhecimentos novos e antigos, integrar
estímulos externos e internos, analisar, abstrair, julgar, concluir, sintetizar e criar. A forma refere-se a como o
paciente concatena as ideias, em que sequência, se segue ou não as leis da sintaxe e da lógica. O normal é que a
produção do pensamento seja lógica (ou coerente), isto é, clara e fácil de seguir e entender. Diz-se que é ilógica
quando a sequência não segue as leis da lógica formal, ou seja, ocorrem inferências falsas ou indevidas; e que é
mágica quando não obedece às leis da realidade, tempo e espaço, envolvendo sorte, misticismo, poder a distância,
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força do pensamento para provocar ações, etc. O curso caracteriza-se pela quantidade de ideias que vêm ao
pensamento, podendo ser de abundante a escassa; e pela velocidade com que as ideias passam pelo pensamento,
de modo que o curso pode ser rápido, lentificado ou estar completamente bloqueado. O conteúdo do pensamento
são as ideias propriamente ditas, sua conexão ou não com a realidade, refletindo ou não aspectos reais do mundo
externo ou interno. A principal preocupação é a presença de ideias que sugiram que o paciente possa apresentar
um perigo para si ou para outros (por risco de suicídio, agressão, homicídio), o que reflete prejuízo no teste de
realidade e no juízo crítico. O conteúdo do pensamento expressa as preocupações do paciente, que podem ser
ideias supervalorizadas, ideias delirantes, delírios, preocupações com a própria doença, problemas alheios,
obsessões, fobias, etc.
JUÍZO CRÍTICO - É a capacidade para perceber e avaliar adequadamente a realidade externa e separá-la dos
aspectos do mundo interno ou subjetivo. Implica separar sentimentos, impulsos e fantasias próprios, de
sentimentos e impulsos de outras pessoas. Refere-se, ainda, à possibilidade de auto avaliar-se adequadamente e
ter uma visão realista de si mesmo, suas dificuldades e suas qualidades. A capacidade de julgamento é necessária
para todas as decisões diárias, para estabelecer prioridades e prever consequências. Insight é uma forma mais
complexa de juízo. Envolve um grau de compreensão do paciente sobre si mesmo, seu estado emocional, sua
doença e as consequências desta sobre si, pessoas que o cercam e sua vida em geral.
CONDUTA - São os comportamentos observáveis do indivíduo: comportamento motor, atitudes, atos, gestos,
tiques, impulsos, verbalizações, etc. A partir da observação do paciente durante a entrevista, de perguntas
objetivas ou de entrevistas com os familiares, pesquisa-se dados sobre os hábitos do paciente, como o que costuma
fazer todos os dias e em situações especiais (maneira como se diverte, trabalha, convive socialmente); procura-se
observar a movimentação do paciente (lento ou agitado), a forma como se expressa através da anamnese; e
procura-se alterações, indagando sobre o uso de drogas, roubos, tentativa de suicídio, hostilidade, compulsões,
impulsos, comportamentos agressivos, rituais, vida sexual, relacionamentos interpessoais, etc.
LINGUAGEM - É a maneira como a pessoa se comunica, verbal ou não verbalmente. Costuma-se dar mais ênfase à
fala, avaliando-se a quantidade (loquaz, prolixo, taciturno, não-espontâneo ou normal), velocidade ou fluxo
(verbalização rápida, lenta, hesitante, monótona) e qualidade (gagueira, ecolalia). Também é interessante se
observar o volume (alto ou baixo), a gramática e sintaxe, e o vocabulário ou escolha de palavras, o que possibilita
a realização de inferências sobre a organização do pensamento e cognição. Exemplos: disartria (dificuldade na
articulação da palavra), gagueira, bradilalia (falar muito devagar), taquilalia (falar muito rápido), ecolalia (repetir as
últimas palavras do interlocutor), afasia (não conseguir falar), logorreia (não parar de falar), mutismo (ficar
completamente quieto), vulgaridade (usar vocabulário de baixo calão), coprolalia (uso de palavras obscenas);
disgrafia (escrever palavras incorretamente); alterações da mímica facial (ausência, exagero, tiques). Neologismos
(invenção de palavras com significados particulares para o paciente), salada de palavras e associação por rimas
refletem um processo de pensamento disgregado.