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Alexandre Medeiros &Cleide Farias de Medeiros

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Editora Livraria da FísicaSão Paulo

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Copyright c© Editora Livraria da Física

a. Edição

Editor: J R M

Diagramação: R M J & M M

Capa: Arte AtivaImpressão: Gráfica Paym

Dados Internacionais de Catalogação e Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

M, AlexandreEinstein e a educação / Alexandre Medeiros & CleideFarias de Medereiros.São Paulo: Editora Livraria da Física, .

. Cientistas — Educação . Educação — Finalidades eobjetivos . Einstein, Albert, –

I. Medeiros, Cleide Farias de. II. Título.

- CDD-

Índice para catálogo sistemático:

. Educação

Impresso no Brasil

Editora Livraria da FísicaTelefone / Fax

www.livrariadafisica.com.br

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Sumário

A , iii

I , v

A E P P A M ,

A E S J E L

G ,

A E E E A ,

E E E P

Z ,

E versus W ,

A T P ,

A A O, E P

U B ,

E P U Z ,

D C E P R Z ,

A L E B: ,

I, H B H ,

I C E E

D ,

S I E E

D ,

A E B L J S ,

E Q D ,

B ,

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Apresentação

Nste admirável trabalho, erguido com a ajuda de uma

bibliografia estruturada em mais de títulos, Alexan-dre Medeiros e Cleide Farias de Medeiros presenteiam-

nos com uma nova visão de Einstein, o maior físico dos temposmodernos.

Einstein é apresentado aqui através de sua trajetória desde oseu tempo de estudante rebelde, ante o autoritarismo do sistemade ensino germânico, até o de conferencista famoso requisitadopara expor as suas idéias em dezenas de países — inclusive, em, no Brasil.

O mito de que Einstein teria sido um mau aluno é totalmenteinfundado. Acontecia que as primeiras escolas freqüentadas porEinstein tinham métodos pedagógicos muito rígidos, tornando-oum aluno entediado. Felizmente, na escola da cidade suíça deAarau, Einstein veio a encontrar os métodos preconizados porPestalozzi despertando-o para os prazeres de uma educação fun-dada na liberdade e na responsabilidade. Não admira, então, queEinstein, como mostram os autores, tenha sentido uma grandeafinidade com John Dewey, o Mestre da Columbia University,quando já nos seus tempos de América.

Os autores demonstram, com um grande número de exem-plos, que as três grandes virtudes de Einstein em relação ao en-sino foram: a Imaginação, a Humildade e o Bom Humor. A

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Imaginação tinha sido uma das suas qualidades supremas comoum investigador científico - inventando as Experiências em Pen-samento (Gedanken Experiments) como um reforço às suas te-orias. Humildade não lhe faltava, pois, nunca desejou passar avida nas alturas como um “Herr Professor” e isto lhe valeu terum humor especial ao longo de toda a vida.

Alexandre e Cleide Medeiros mostram, igualmente, que muitocedo Einstein percebeu a relação que existe entre a Educação e aluta pela Liberdade e Justiça Social. É nesta linha de pensamentoque Einstein se alia com Dewey, Charles Chaplin e outras mentesprivilegiadas para defender Bertrand Russell quando este grandefilósofo inglês foi impedido, em , de assumir uma cátedrado New York City College sob uma acusação indevida de imo-ralidade.

É sobre este Albert Einstein, preocupado com os caminhosda Educação e com o Futuro da Humanidade que Alexandre eCleide Medeiros falam neste livro que, certamente, influenciaráas mentes de muitos educadores no Brasil e não apenas de Mes-tres de Física e de Matemática.

Considero um privilégio o de ter podido apresentar este livrovalioso aos leitores brasileiros.

Recife, de janeiro de .

R F

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Introdução

O assinalou os cem anos da Teoria da Relativi-dade e do Annus Mirabilis de Albert Einstein, um pontode virada na história da Ciência e uma autêntica revolu-

ção na forma de se pensar e de interpretar a realidade do espaçoe do tempo. Mas, Einstein não foi apenas um pensador revo-lucionário no tocante às suas idéias sobre a Física, foi tambémum grande professor e conferencista assim como um pensadorcrítico notável na elaboração de suas concepções epistemológicase educacionais. Um verdadeiro arauto da liberdade e do pen-samento criativo, Einstein defendeu posições epistemológicas eeducacionais que valorizam a produção do conhecimento e querepresentam um corte radical com o ensino tradicional de suaépoca. Tais posições, ainda hoje, podem encantar tantos quantosse debrucem em analisá-las.

Combatendo a repetição e o autoritarismo, freqüentementepresentes nas relações pedagógicas, Einstein advogava uma alter-nativa mais aberta e mais humana para a educação. Cultura, es-pírito crítico, busca dos fundamentos, ética e consciência social,aliados à criatividade, imaginação e intuição, são apenas algumasdas palavras-chave subjacentes à sua visão de Educação.

A importância do pensamento de Einstein sobre a educação,embora bem menos estudada do que o seu trabalho científico,tem merecido também a atenção de vários autores, ainda que demodo um tanto episódico. Barry (), por exemplo, acentuou

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que Einstein traduziu em uma filosofia da educação o conjuntodas suas visões sobre os diversos fatores e as diversas instituiçõesque influenciam as qualidades humanas: a família, a igreja e a pá-tria, dentre outros. Barry ressaltou, ainda, o fato de que Einsteinpercebia com bastante clareza a dependência que as experiênciashumanas, principalmente no âmbito da instituição Escola, guar-davam em relação às estruturas sociais nas quais o homem estavainserido. Caulley (), por sua vez, destacou o papel de Einsteincomo um avaliador informal, sempre engajado em uma contínuaatribuição de valores a vários aspectos da vida, inclusive à educa-ção. Robinson (), por outro lado, apontou várias falhas exis-tentes nos métodos modernos de ensinar a Física e ressaltou queboa parte dessas falhas poderia ser corrigida com um currículoholístico inspirado nos trabalhos científicos e nas contribuiçõeseducacionais de Einstein. Também Maffet Jr (), apontou, demodo semelhante, a possibilidade da construção de um currículoholístico igualmente baseado nas considerações educacionais deEinstein. Segundo Maffet Jr, um tal currículo holístico deveriaopor-se ao dualismo e ao reducionismo cartesianos presentes noatual paradigma do currículo universitário.

Uma leitura das muitas biografias disponíveis de Einstein nãoé, entretanto, uma garantia da obtenção de informações acuradassobre as suas qualidades como estudante e como professor, nemtambém sobre o seu pensamento educacional. Boa parte dessasbiografias foi escrita antes que se conhecessem as muitas revela-ções trazidas pelos documentos pessoais de Einstein, disponibili-zados nos últimos anos. Por isso, boa parte do que afirmamos nopresente livro está baseada em informações recentes provenientesde cartas e de outros documentos pessoais relevantes contidosnos “Collected Papers of Albert Einstein”. Desta forma, algunsmitos consagrados sobre o mesmo são colocados em xeque aolongo do presente livro.

A pesquisa bibliográfica que fizemos para a realização destaobra foi ampla, tendo demandado um demorado estudo com-parativo de muitas e variadas fontes devidamente apontadas nabibliografia ao final desta obra. De um tal estudo comparativo,que não se restringiu à análise do pensamento educacional de

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Einstein, mas que incluiu, também, o de vários filósofos e edu-cadores, emergiu uma imagem de um Einstein verdadeiramentecomprometido com a causa educacional em seu sentido maisamplo.

Einstein foi sempre um perspicaz observador da natureza hu-mana e das suas idiossincrasias. Ainda quando estudante, osseus relatos sobre as atitudes dos seus professores já revelavamum aguçado senso crítico capaz de discernir com precisão entrea simples competência técnica de um bom expositor e as quali-dades humanas necessárias a um verdadeiro educador. Tanto emsuas memórias quanto em suas cartas, as personalidades dos seusex-professores mostram-se presentes através de suas observaçõesque revelam a sutileza da sua sensibilidade.

Em sua idade madura, Einstein vai mesclar essas suas influên-cias através do contato, ainda que indireto, com o trabalho ecom as obras de vários educadores produzindo, assim, as suaspróprias reflexões educacionais. Essas reflexões corporificam-sede um modo esparso em vários pontos de seus escritos e encon-tram o seu ápice na sua famosa alocução “Sobre a Educação”; umverdadeiro libelo sobre a profunda ligação entre a liberdade e acriatividade na escola.

Não bastasse, entretanto, a agudeza da percepção de Einsteinpara os fenômenos da educação, percepção esta revelada desdeos seus tempos de estudante, nem mesmo a felicidade com queexpressa os seus pensamentos educacionais na maturidade, en-contramos ainda em Einstein, sobretudo, uma lição de coerênciaentre aquilo que observava, aquilo que pensava e aquilo que faziano tocante à educação. Deste modo, é extremamente reveladorobservarmos não apenas o seu pensamento educacional, mas,também, as características principais da sua própria prática en-quanto professor.

A presente obra inicia-se com o estudo biográfico de Einsteincomo estudante na Escola e na Universidade; passa pelas suastentativas de obter um emprego de professor e pela sua carreiraacadêmica para, finalmente, desaguar na análise de suas belasconsiderações educacionais.

Esperamos que uma leitura reflexiva desta obra possa servir de

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inspiração para todos aqueles que vêem na educação um meiopara a construção de uma sociedade melhor, mais justa e maishumana.

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A Educação Primária do

Pequeno Albert em Munique

A E nasceu na pequena cidade de Ulm, no sul

da Alemanha, em de março de . Embora tenhanascido com um crânio enorme que preocupou a sua

mãe, Pauline Einstein, o problema logo desapareceu. O pequenoAlbert revelou-se um bebê doce e calmo, segundo a descrição desua avó materna Jette Koch.

Logo após o nascimento de Albert, em , a família mudou-se para Munique. Lá, o seu pai Hermann Einstein e o seu tio,Jakob Einstein, fundaram uma pequena indústria de materiaiselétricos. Dois anos depois, a firma já havia crescido a ponto deadquirir o controle acionário de uma outra empresa de aparelhosmecânicos e aquecedores, a Kiessling & Co. Por essa época elesjá fabricavam, com sucesso, dínamos, lâmpadas de arco voltaicoe lâmpadas incandescentes. Em , os dois irmãos venderamas suas ações desta firma e investiram o capital obtido e maisalguns empréstimos da família na ampliação da J. Einstein & Co.O pequeno Albert, portanto, já nasceu literalmente em meio aodesenvolvimento da indústria elétrica alemã e isso deve ter in-fluenciado decisivamente a sua educação. Não é de se espan-tar, portanto, que ele tenha desenvolvido um grande interessena idade adulta pelos problemas do Eletromagnetismo e maisespecificamente pelas questões da natureza e da propagação da

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radiação eletromagnética. Dos problemas advindos destas duasquestões nasceria a Física Moderna no século XX.

O pequeno Albert, entretanto, não mostrou nenhum desen-volvimento precoce; muito pelo contrário, ele aprendeu a falartardiamente, talvez até perto dos três anos de idade, segundo assuas próprias memórias. Este seu relato autobiográfico, porém,não está de acordo com o testemunho de sua avó materna, se-gundo Hoffmann & Dukas. Jette Koch recordava-se das idéiasesquisitas do pequeno Albert já aos seus dois anos de idade. In-felizmente, ela não deixou registradas que idéias eram essas. Detodo modo, parece patente que ainda que o pequeno Albert tenhatido sérias dificuldades em aprender a falar, ele não veio a falartão tarde quanto os seus biógrafos costumavam supor até recen-temente. Qualquer que tenha sido, entretanto, a sua demoraem aprender a falar, esta questão tem sido alvo de intenso de-bate interpretativo, com muitos estudiosos conjecturando sobrea possibilidade de ter sido este seu atraso um caso de dislexia.

Segundo o próprio Einstein, os seus pais chegaram a consul-tar um médico pensando que ele fosse retardado. Entretanto,a referida demora parece ter-se devido mais ao fato de que opequeno Einstein tinha um desejo, desde muito cedo, de apenasfalar sentenças completas. De acordo com Folsing, um de seusmelhores biógrafos, se alguém lhe perguntava algo, ele elaboravaantes a resposta completa na cabeça e a balbuciava para si mesmo,testando-a, antes de falar com segurança em voz alta. Esta atitudereflexiva, porém, às vezes dava a impressão de que Einstein estavasimplesmente repetindo o que já havia dito em voz baixa.

O menino Einstein era um garoto diferente dos demais; pa-cato, que não gostava de brincar de lutas nem de esportes emgeral, mas que adorava brincar sozinho com jogos de peças me-tálicas para armar construções. Ele também passava horas sim-plesmente construindo altos castelos de cartas ou brincando comuma pequena máquina a vapor que o seu tio Caesar Koch havialhe dado de presente. Os outros meninos, muito naturalmente, oachavam simplesmente um tanto esquisito.

Aos cinco anos de idade, ele ganhou uma bússola do seu paie aquele presente causou-lhe uma enorme impressão. Em suas

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Notas Autobiográficas, ele relata o conflito cognitivo em que seviu envolvido pela dimensão de mistério oriunda daquele inusi-tado brinquedo. Einstein reporta-se ao fato de lembrarmos comestranheza e de forma espontânea de determinadas experiências.Ele assinala que essas “lembranças inquisitivas” ocorrem quandoa experiência entra em conflito com conceitos bem estabelecidosem nossas mentes. Ele evoca, neste sentido, o presente da bússolacomo um exemplo:

“aos quatro ou cinco anos, experimentei esse sentimento quandomeu pai mostrou-me uma bússola. O fato de a agulhacomportar-se de uma certa forma que não se encaixava entre ostipos de ocorrências que podiam ser colocados no mundoinconsciente dos conceitos (eficácia produzida pelo ‘toque’direto). Lembro-me ainda – ou pelo menos creio que me lembro– que essa experiência causou-me uma impressão profunda eduradoura. Deveria haver algo escondido nas profundezas dascoisas. Aquilo que o homem conhece desde a infância nãoprovoca esse tipo de reação; ele não se surpreende com o vento ea chuva, com a lua, nem com o fato de essa mesma lua não cairdo céu ou com as diferenças entre a matéria viva e a matériasem vida.”

Ainda quando tinha apenas cinco anos de idade, a sua mãecontratou uma professora particular para lhe preparar para osditames da vida escolar. A professora, entretanto, não parece tertido sucesso em sua tentativa de enquadrar o pequeno Einsteinnos rigores da educação formal. Diante de tal tentativa de enqua-dramento, ele demonstrou, então, um temperamento instável epassou a reagir de modo imprevisível ao ser contrariado: ficavapálido e às vezes até enfurecido. Certa vez, ele chegou a jogaruma cadeira em sua professora que, apavorada, fugiu para nuncamais retornar. Outra vez, ele atirou uma panela na cabeça desua irmã mais nova, Maja. Aos sete anos, entretanto, justamentena idade em que entrou para a escola primária, todas aquelasinstabilidades de comportamento e aqueles repentinos acessos decólera terminaram subitamente e o pequeno Einstein tornou-se

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novamente uma criança tão calma quanto havia sido enquantoainda bebê. Ele passou a adotar uma atitude completamentediferente quando algo o contrariava: aprendeu a usar a pode-rosa arma dos mais fracos, porém inteligentes: a ironia. Einsteinparece, no entanto, ter tido desde cedo uma certa consciênciada força daquela arma e só a usava em caso de ser visivelmentecontrariado. No mais das vezes o seu sorriso era simplesmente tí-mido, inocente e amistoso. Ele quase sempre sorria timidamentediante das agruras do mundo.

O pequeno Albert foi colocado para estudar na escola maispróxima de sua casa, que era uma instituição católica. Os seuspais eram judeus, mas não ortodoxos e assim respeitavam apenasparte das tradições judaicas, não tendo muito apego à religião.Na escola, Einstein mostrou-se um menino retraído, tímido edistraído, sempre envolto em seus próprios pensamentos. Apesardisso, ele não era um garoto triste; muito pelo contrário, ele es-tampava quase sempre, de forma contemplativa, aquele aludidosorriso tímido nos lábios e exibia uma atitude positiva em re-lação às dificuldades encontradas. A sua postura contemplativae o seu sorriso freqüente foram, no entanto, muitas vezes con-fundidos com um sinal de desafio ou de desatenção para comos seus professores. Há de se admitir, entretanto, que Einsteinsempre cultivou, por toda a sua vida, essa atitude de ter sempreum sorriso nos lábios, por vezes inocente, por vezes amistoso,mas algumas vezes também bastante irônico. Por toda a sua vidaele sempre foi dotado também de um fino senso de humor que olevava freqüentemente a rir de si mesmo, atitude que já na idadeadulta muito viria a divertir os seus alunos. Ele, freqüentemente,falava de modo irônico, torcendo as suas próprias crenças e destemodo muitos tomavam como a mais pura verdade coisas queele afirmava apenas como uma ironia. Na infância e mesmo nasua juventude, na escola secundária, entretanto, essa sua formade reagir às agressões do mundo exterior com nuances do seusorriso seria algo que desagradaria profundamente a muitos dosseus professores.

Logo após os dois primeiros anos na escola elementar, Eins-tein já mostrava um talento especial tanto em Latim quanto em

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Matemática. Ele, tempos depois, recordar-se-ia de que o estudodo Latim lhe atraia pela sua estrutura lógica o que evidentementeacontecia também com a Matemática.

De especial importância, aos doze anos de idade, já então naescola secundária, foi o seu contato com um estudante de Medi-cina, Max Talmey, que visitava regularmente a casa de seus pais.Talmey conversava de igual para igual com Einstein e lhe deu depresente vários livros que despertaram o seu interesse pelo estudoda Ciência e da Filosofia. Dentre os muitos livros de divulgaçãocientífica trazidos por Talmey, estavam por exemplo, “Força eMatéria”, de Buchner, que apresentava para um público alemãoas idéias dos materialistas franceses de um modo um tanto di-luído. Outra obra apresentada a Einstein por Talmey foram oscinco volumes do naturalista alemão Alexandre von Humboldt,intitulados “Cosmos: uma Tentativa de Descrição do Mundo Fí-sico”. Também “A Origem das Espécies” de Darwin, foi trazidopor Talmey para a apreciação de Einstein.

A leitura de todos aqueles livros, certamente, causou no jovemEinstein um tremendo impacto intelectual. Einstein relata emseu “Como Vejo o Mundo” que o maior impacto causado poraquelas leituras na juventude foi o desenvolvimento de uma des-crença total nos ensinamentos religiosos sobre a criação do mun-do e sobre o seu funcionamento. Einstein jamais retornaria àsua atitude religiosa piegas que desenvolvera ainda quando cri-ança. Na maturidade, ele conciliaria a sua crença em Deus com aprópria ordem existente na Natureza, assumindo, assim, a visão,como costumava assinalar, do Deus de Spinoza.

Dentre as muitas obras de divulgação científica que Talmeypresenteou a Einstein, uma delas merece uma menção toda es-pecial pela enorme importância da influência por ela exercidasobre a formação do seu pensamento: a série de livros intitulados“Ciência para o Povo” de Aaron Bernstein.

Aaron Bernstein, como bem observa Denis Overbye, era o CarlSagan da sua época, ou seja, um escritor de divulgação cientí-fica de grande sucesso no século XIX. Bernstein enfatizava, den-tre outras coisas, que deveria existir uma unidade subjacente àsforças da Natureza, idéia esta que muito impressionou o jovem

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Albert. Bernstein também recorria a determinadas imagens eà realização de certos experimentos em pensamento como umauxílio visual para a compreensão dos muitos fenômenos físicosdiscutidos com os seus leitores. Como enfatiza Gregory, Berns-tein no volume da sua extensa obra, em um daqueles tais ex-perimentos em pensamento, imaginava, por exemplo, um indi-víduo viajando através de uma linha telegráfica junto com umsinal elétrico. Uma clara influência deste tipo de representaçãoimagética utilizada por Bernstein sobre o pensamento de Einsteinpode ser encontrada, por exemplo, no fato de que este utiliza-ria um experimento em pensamento bastante semelhante algunsanos depois, aos dezesseis anos de idade, quando já estudandoem Aarau, para conjecturar a respeito da propagação da luz. Aimagem criada por Einstein, como um experimento hipotético,seria a de um viajante olhando para um espelho e acompanhandoum raio de luz. Este experimento em pensamento constituir-se-ia, segundo ele mesmo certa vez relatou em uma palestra nacidade de Kyoto, no Japão, em , no germe que o levaria aodesenvolvimento posterior da Teoria da Relatividade.

Einstein era também incentivado pelo seu tio Jakob que o pre-senteava com livros e com problemas engenhosos de Matemática.Ele estabelecia com o jovem Einstein uma espécie de brincadeira,pois sempre que este conseguia resolver os tais engenhosos pro-blemas de Álgebra – e isso era bastante freqüente – o seu tiocomemorava efusivamente como se comemora atualmente umgol em uma partida de futebol.

Certa vez, o seu tio Jakob despertou a sua atenção para o Teo-rema de Pitágoras. O jovem Albert sentiu pela primeira vez umaestranha sensação intelectual, a clara percepção de que estavadiante de um tipo de afirmação que não era óbvia por si mesma eque por isso necessitava de uma demonstração logicamente con-vincente. Provar aquele famoso teorema por esforço próprio foialgo que ele conseguiu apenas após três semanas de um tremendoesforço de reflexão. A prova por ele obtida não era absoluta-mente algo original, como supôs, equivocadamente, a sua irmãMaja na biografia por ela escrita tempos depois do seu já entãofamoso irmão. A prova obtida por Einstein estava baseada na

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semelhança de triângulos retângulos e era algo novo apenas paraele mesmo. No entanto, o que houve de mais espetacular naqueleseu primeiro contato com a Geometria foi a sua descoberta demodo completamente independente de que aquilo era algo quenecessitava ser provado e que uma tal prova era de fato possívelde ser obtida por um raciocínio lógico. Einstein sempre acentuoueste ponto em suas recordações daquele marcante episódio.

É importante notar que esta necessidade de demonstração éalgo psicológico típico do indivíduo engajado intelectualmentecom o problema em questão.

Aos doze anos, Einstein teve o seu primeiro contato com umverdadeiro livro de Geometria, também trazido por Talmey, pos-sivelmente o livro de Spieker. Tempos depois ele se recordaria queo padrão de organização lógica da Geometria causara-lhe umaimpressão tão forte que passara a tê-la, desde então, como algopraticamente sagrado. Ele relata, também, que naquela mesmaépoca, quando não tinha nenhum problema especial para ocupara sua mente, ele adorava reconstruir certas demonstrações mate-máticas e certas questões de Física que há muito ele já conheciaas respostas. Como ele mesmo esclarece, não havia nenhum ob-jetivo prático naquele seu costume, mas apenas uma oportuni-dade de ocupar o seu pensamento com coisas que lhe davam umenorme prazer intelectual.

Com o impulso dado por Talmey e pelo tio Jakob, Einsteinlogo alçaria, já aos treze anos, vôos próprios bem mais altos es-tudando sozinho a Geometria Analítica e o Cálculo Diferenciale Integral assim como empenhando-se a fundo no estudo dasobras filosóficas de Kant.

Einstein reporta-se também ao conflito cognitivo causado pelacerteza matemática:

“aos doze anos experimentei minha segunda sensação de espanto,de natureza completamente diversa da primeira, provocada porum livrinho de Geometria Plana de Euclides, que veio ter àsminhas mãos no início do ano escolar. Ali estavam afirmaçõescomo, por exemplo, a interseção das três alturas do triângulonum determinado ponto que – embora não fosse evidente –

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podia ser provada com tal certeza que qualquer dúvida estavafora de cogitação. Esta certeza lúcida impressionou-meprofundamente.”

Outro ponto importante na educação de Einstein foi a influên-cia exercida sobre ele pela música. Sua mãe, desde cedo, o intro-duziu nos estudos musicais e nos necessários exercícios de rotinavisando a aquisição de destreza na execução musical. Desde osseis anos de idade, ele já tinha aulas de violino com um certoSr. Schmied, mas a simples prática das técnicas de execução mu-sical causava-lhe um visível aborrecimento. Outros professoresforam contratados e despedidos pela sua mãe. Einstein comen-taria já na maturidade que ele não havia tido sorte com todosaqueles professores, pois para eles a música não ia muito alémdo mero aspecto mecânico. O interesse pela música em Einsteinfoi realmente despertado apenas quando ele tomou contato comas obras de Bach e de Mozart. A perfeição dos concertos deBach e das sonatas de Mozart encantou o jovem Einstein. Oseu desejo de reproduzi-las levou-o a buscar o aperfeiçoamentode sua técnica de execução musical. Einstein lembraria, temposdepois, deste fato ao afirmar que:

“o amor é um professor melhor do que o sentido da obrigação, aomenos para mim.”

A música seria sua companheira inseparável pelo resto da vida,seria um refúgio e uma fonte de inspiração pela concentraçãoque lhe propiciava. Sua irmã, Maja, relata em suas memórias quevárias vezes testemunhou Einstein resolver seus problemas mate-máticos logo após uma sessão de violino ou de piano. SegundoMaja, ele tocava de forma extremamente concentrada, quase co-mo se estivesse ausente, mas de repente interrompia a sua execu-ção musical e exclamava como um Arquimedes: “consegui!” So-bre esse seu enorme poder de concentração, Einstein costumava,entretanto de forma modesta dizer, já em sua idade adulta, que:

“eu não possuo nenhum dom especial, apenas souapaixonadamente curioso. Não se trata, pois, de uma questão dehereditariedade.”

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Ainda na escola primária, ele já demonstrara a sua aversão aaprender por pura memorização, como era o costume tradicio-nal. Na verdade, ele parecia tentar simplesmente ignorar tudoaquilo que não lhe interessasse enquanto dedicava-se com firmepropósito e concentração a tudo aquilo que realmente atraísse oseu interesse. Apesar desta atitude, não muito apreciada pelosprofessores, ele se revelaria um bom estudante, o melhor da suaturma, ao contrário do que muitos dos seus biógrafos mais anti-gos costumam assinalar, cultivando o mito do eterno mau aluno.

Na verdade, só recentemente, com o acesso liberado, ao menosem parte, a uma verdadeira montanha de documentos, cartas epapéis pessoais de Einstein (The Collected Papers of Albert Einstein– University of Princeton) é que se pôde ter acesso a um conjuntode informações bem mais próximas da realidade histórica a seurespeito. Deste modo, biógrafos mais recentes de Einstein, comoAlbrecht Folsing, Denis Brian, Abraham Pais, Dennis Overbye,Gerald Holton, Roger Highfield & Paul Carter, dentre outros,puderam ajudar a construir um quadro bem mais preciso doque aquele até então tradicionalmente apresentado pelos seusbiógrafos clássicos como, por exemplo, Philipp Frank, Carl Se-elig e Ronald Clark. Sem esse acesso documental mais preciso,as primeiras biografias estavam baseadas apenas em entrevistascom amigos de Einstein ou com ele próprio e continham, assim,naturais equívocos originários de lapsos de memória ou de livresreconstruções mentais da história.

Repetindo essas versões clássicas, Brown afirmou, por exem-plo, que Einstein: “como estudante não se revelara especialmenteaplicado ou promissor. Alguns lembrar-se-iam dele como um jo-vem arrogante e de trato difícil, que costumava faltar às aulas . . . ”.Como procuramos mostrar neste livro, isto apenas em parte éverdadeiro.

De fato, as suas notas só passaram a não mais refletirem asua real capacidade de aproveitamento quando as agruras da es-cola tornaram-se simplesmente insuportáveis para o seu espíritoindômito e isso só veio a se dar a partir da fase seguinte de suaeducação, já no Luitpold Gymnasium, ainda em Munique.

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A Educação Secundária do

Jovem Einstein noLuitpold Gymnasium

E entrou para o Gymnasium em outubro de , com

apenas nove anos e meio de idade e ali permaneceria pelospróximos seis anos e meio, até dezembro de , quando

abandonaria aquela escola sem chegar a obter um diploma.A sua educação primária na escola católica próxima da sua casa

havia transcorrido sem grandes problemas. Einstein não poderiadizer que havia sido feliz ali, mas ao menos guardava boas re-cordações do seu professor de religião, um fato particularmenteinteressante por ser ele judeu e a escola católica. Embora, desdecriança ele não procurasse brincar com outras crianças exerci-tando voluntariamente uma certa espécie de solidão, as boas no-tas obtidas por ele na escola primária não haviam dado margema qualquer tipo de preocupação.

A atmosfera do Luitpold, entretanto, era bem mais austera doque a da escola primária e naquele ambiente mais carregado asdificuldades não tardariam a surgir. Mesmo assim, Einstein con-tinuou tirando quase sempre boas notas em quase todas as maté-rias. Essa mudança da escola primária para o Gymnasium seriasempre lembrada por ele de uma forma marcadamente irônica.

Ele se recordaria tempos depois dos professores da escola pri-mária como parecendo sargentos e os do Luitpold Gymnasium

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como parecendo tenentes. O fato é que Einstein sempre detestouos comportamentos padronizados que não fossem produtos deuma reflexão racional e deste modo ele abominava a disciplinarígida e os métodos severos de ensino da escola tradicional alemã.Esse seu desagrado radicava também em sua atitude de pavorna infância ao ver os soldados alemães marchando pelas ruascomo autômatos, como seres sem uma vontade própria, em suaspróprias palavras. Daí nasceria, também, a sua forte repulsa aomilitarismo e ao autoritarismo germânicos.

Em depoimentos proferidos já na maturidade, Einstein exi-biu sempre um claro desagrado com quaisquer formas de auto-ritarismo típicas das instituições em relação aos indivíduos. Aeducação primária e secundária recebidas em Munique trans-formaram-no, assim, em um revoltado, ainda que de um modonão muito bem articulado, contra o sistema escolar germânico econtra o próprio Estado alemão.

Latim e Grego eram o centro da educação no Luitpold Gym-nasium e embora as Ciências e a Matemática tivessem tambémos seus espaços no currículo estudado, estes eram bem menosrelevantes do que aqueles então reservados para as humanidades.Pode parecer paradoxal que o Luitpold tivesse um enfoque maiornas humanidades e que um tal enfoque aparentemente huma-nista não tivesse despertado o interesse de Einstein, pois ele veioa se notabilizar como um cientista com uma forte sensibilidadehumanista e cultural. O próprio Einstein, entretanto, esclareceesta aparente contradição em seus escritos: “quando recomendocom ardor as ‘humanidades’, quero recomendar essa cultura viva, enão um saber fossilizado, sobretudo em história e filosofia”. O pontode discórdia, portanto, estava no tratamento sem vida e voltadopara a simples memorização das humanidades no Luitpold, alémdo que exercido de uma maneira essencialmente autoritária.

Tem havido recentemente alguns sérios questionamentos a res-peito da extensão em que a educação desenvolvida no LuitpoldGymnasium, na época em que Einstein ali estudou, correspon-dia, de fato, à imagem de conservadorismo e opressão comu-mente retratada por Einstein em suas lembranças daquela época.Autores como Lewis Pyenson e Kamal Datta têm apontado que

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a educação germânica, como um todo, era alvo de um vigorosodebate nas duas últimas décadas do século XIX.

Esse debate educacional era, ao nosso ver, um reflexo da pró-pria história da unificação da Alemanha em torno da Prússianos anos como um resultado do desenvolvimento capita-lista então experimentado. Como assinalam Cocho, Schwartz eHobsbawm, a unificação de uma pátria germânica na forma deuma grande e poderosa nação, a Alemanha, surgiu, no final doséculo XIX, como uma necessidade de quebrar antigas barreirasalfandegárias instituídas desde a Idade Média entre os muitos es-tados germânicos independentes e constituintes do antigo impé-rio. É de fundamental importância perceber-se, neste contexto, oextraordinário desenvolvimento econômico experimentado pelaAlemanha naquele período, que em apenas vinte anos conseguiurivalizar e até mesmo ultrapassar a Inglaterra em vários setoresprodutivos. Enquanto a antiga e mundialmente hegemônica es-trutura produtiva inglesa havia sido construída nos últimos du-zentos anos e estava toda ela assentada na potência da máquinaa vapor, a Alemanha tomou um rumo de desenvolvimento in-dustrial bastante acelerado e completamente diferente, optandopor basear a sua estrutura produtiva nas bem mais modernas emuito mais eficientes máquinas elétricas. O confronto dessasduas potências econômicas ao final do século XIX foi, assim,também, o confronto de duas diferentes estruturas produtivas,uma fundada na máquina a vapor e a outra filha da segundarevolução industrial trazida com o desenvolvimento do Eletro-magnetismo.

Embora os estudos do Eletromagnetismo tenham surgido naInglaterra, eles praticamente em nada contribuíram para alterar asua enorme e então já mundialmente hegemônica estrutura pro-dutiva. A Alemanha, por seu lado, beneficiou-se, exatamente, deter tido de partir praticamente do zero em várias áreas industriaise tomou assim o rumo de um desenvolvimento distinto e bemmais acelerado.

Outra diferença marcante entre esses dois distintos padrõesde desenvolvimento industrial foi o papel jogado pela educaçãoem cada um desses casos. O desenvolvimento industrial inglês,

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enquanto um resultado da máquina a vapor, havia sido cons-truído lentamente e não estava diretamente atrelado ao desen-volvimento científico. A própria máquina a vapor havia sidoela mesma uma criação empírica de técnicos e inventores quasesempre sem uma formação acadêmica. A compreensão dos prin-cípios básicos que regiam o funcionamento da máquina a vaporsó começou a surgir em plena metade do século XIX e foi a des-coberta desses fundamentos que deu origem ao desenvolvimentoda Termodinâmica. Assim, a ciência da Termodinâmica é filhadas técnicas da máquina a vapor e não o contrário. No caso doEletromagnetismo, entretanto, a coisa foi completamente dife-rente: as máquinas elétricas, os gigantescos geradores que impul-sionaram um novo tipo de indústria foram todos eles produtosderivados da nova ciência do Eletromagnetismo. Surgia, destemodo, o conceito de Tecnologia, ou seja, de uma conquista téc-nica intencionalmente baseada em um estudo prévio da Ciência.Neste contexto, a educação científica e tecnológica adquiriu naAlemanha, nas duas últimas décadas do século XIX, um valoreconômico que teria sido antes simplesmente impensável. Estefoi, ao nosso ver, o grande motor dos intensos debates por refor-mas educacionais surgidos na Alemanha exatamente na época donascimento de Einstein.

O referido debate centrava-se, principalmente em torno dasreformas curriculares necessárias de serem implementadas noensino secundário, ao nível do Gymnasium. Embora tenha taldebate se iniciado ao norte, nas regiões mais desenvolvidas in-dustrialmente, como a Prússia, ele logo se estendeu ao sul daAlemanha alcançando conseqüentemente as escolas de Munique.A questão central era o pleito dos reformistas, sintonizados como progresso industrial, para que fosse reduzido o papel centraldesempenhado até então no currículo do ensino secundário pe-los estudos clássicos das humanidades, mais especificamente doLatim e do Grego. Tais reformistas propunham que um papelcentral semelhante na educação secundária deveria ser atribuídoàs Ciências Naturais e à Matemática. Dentre os mais ativos de-fensores deste tipo de reforma educacional estava o grande fí-sico e filósofo Ernst Mach. Em um discurso proferido em ,

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quando Einstein tinha apenas sete anos de idade e estava en-trando na escola primária, Mach declarou que considerava algointeiramente anômalo que futuros cientistas, engenheiros e mé-dicos devessem ter a sua educação monopolizada pelos estudosclássicos de caráter filológico. Para ele, apenas uma instruçãocentrada nas Ciências e na Matemática poderia fornecer umamelhor formação geral para os estudantes visto que apenas estasmatérias mostravam como elucidar “a organização econômica ea associação orgânica dos novos conceitos”. Os “novos conceitos”a que Mach fazia referência eram exatamente aqueles exigidospelas novas transformações sociais surgidas com o desenvolvi-mento industrial capitalista.

O ponto de vista oposto ao da modernização educacional pre-conizada por Mach era de um caráter bem mais conservador eera também bastante representativo, ainda que tenha ele vindo aser derrotado pelos reformistas naquele embate que durou pra-ticamente duas décadas. Um dos principais representantes dosconservadores era um professor secundário de Heildelberg: Gus-tav Uhlig. Uhlig conseguiu recolher em uma petição ao governomais de assinaturas de professores, um terço das quais erade professores universitários. Nesta petição era exposta a convic-ção de que a nação germânica deveria ser sempre grata à educa-ção secundária tradicional oferecida no Gymnasium e centradano estudo das humanidades e mais especificamente das línguasclássicas e que deste modo aquela ‘fórmula bem sucedida’ deveriaser preservada a qualquer preço. Apenas pequenas mudançascurriculares eram vistas por aqueles mais conservadores comocoisas aceitáveis. Ao final do século XIX, a vitória da posiçãodos reformistas foi simplesmente avassaladora, pois ela estavafundada não apenas em simples divergências de opinião, masprincipalmente na força de uma nova ideologia requerida pelasociedade industrial capitalista.

Nos anos em que Einstein cursou a sua escolarização secundá-ria na Alemanha, aquele debate por reformas educacionais nãoestava ainda resolvido. A questão, portanto, a se levantar é deque lado estava o Luitpold Gymnasium em meio daquele intensodebate. Uma análise cuidadosa dos fatos históricos ocorridos

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não deixa qualquer margem de dúvida: o Luitpold estava certa-mente do lado dos reformistas, ainda que uma tal reforma aindaestivesse em fase embrionária de implementação. Na verdade,o estudo do Latim e do Grego ainda desempenhava um papelcompulsório e importante no ensino naquela instituição, mas aescola começava a colocar uma ênfase cada vez maior no ensinoda Matemática e das Ciências em seu currículo, assim como dedi-car uma atenção maior ao estudo da língua e da literatura alemãe não apenas dos clássicos gregos e latinos.

Exemplos dessa nova postura educacional vivida no Luipoldpodem ser encontrados em várias situações ocorridas duranteo período em que Einstein ali estudou. No ultimo ano e meio,por exemplo, que passou naquela escola, Einstein utilizou umlivro-texto de Ciências Naturais de um autor chamado Josef Krist(“Os Fundamentos da Ciência Natural”). Krist era um opositorda tradição conservadora das escolas prussianas, nas quais a Fí-sica era ensinada como sendo apenas uma parte da Matemática.Discordando daquela visão tradicional, Krist enfatizava em seulivro as bases empíricas da Física e das outras ciências da Na-tureza e tratava as deduções das leis físicas como exercícios deuma lógica indutiva. Poder-se-ia dizer, assim, que em oposiçãoa um ensino mais formal, ele subscrevia quase que por completoo ideário positivista de produção do conhecimento preconizadopor Ernst Mach.

Não se sabe, porém, até que ponto o professor de Física deEinstein no Luitpold Gymnasium, Joseph Ducrue, seguia, de fatoou não, aquele novo tipo de orientação pedagógica indutivista,que para aquela época era algo realmente revolucionário. Detodo modo, tenha sido ou não influenciado, já àquela época, pelaabordagem epistemológica de Mach, Einstein receberia, comcerteza, posteriormente uma tal influência quando estudante naETH, em Zurique e esta viria a desempenhar um papel muitoimportante na formação inicial da sua visão de mundo. Em suaidade madura, porém, Einstein rejeitaria vigorosamente a pos-tura positivista de Mach, considerando-a insuficiente para darconta da complexidade da produção do conhecimento científico.

Um outro ponto importante a ser destacado neste contexto e

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que de certo modo atenua a importância de qualquer possívelinfluência exercida sobre Einstein pelo seu professor de Físicano Luipold é o fato de que no tempo em que os conteúdos daFísica vieram a ser lecionados a Einstein naquela escola, ele jáestava bem mais adiantado naqueles assuntos devido aos seuspróprios estudos, fazendo com que qualquer tipo de abordagemlhe parecesse então irrelevante.

Embora não se saiba, ao certo, a extensão em que o profes-sor Joseph Ducrue foi ou não eficaz em comunicar a Einsteinuma visão das bases empíricas da Ciência, pode-se afirmar, poroutro lado, com bastante certeza que a influência exercida peloseu professor de Matemática no Luipold Gymnasium entre

e , Adolf Sickenburger, foi realmente de grande importância.Sickenburger era de fato um excelente professor de Matemática eum adepto entusiasta das reformas educacionais então em curso.Ele era, inclusive, o autor de um consagrado livro-texto de Mate-mática Elementar que havia sido não uma decorrência de quais-quer esquemas teóricos já existentes, mas sim o resultado das suasreflexões sobre a sua experiência de vinte anos de ensino no Luit-pold Gymnasium. Sickenburger era, também, um homem atentopara todas as inovações pedagógicas veiculadas sobre a EducaçãoMatemática no principal periódico daquela área em sua épocana Alemanha, o Zetschrift fur mathematischen und naturwissens-chaftlichen Unterrich. Como ressalta Kamal Datta, Sickenburgertentava apresentar todas as suas idéias do modo mais simples eintuitivo possível, sem se preocupar demais com a questão dorigor matemático, que ele acreditava não ter lugar em textos ele-mentares. Além disso, ele procurava mostrar a Matemática nãoapenas como um produto da razão pura, mas também, as suasconexões e a sua utilidade em relação às coisas do dia-a-dia.

Um fato interessante deve ser relembrado. Não se sabe aocerto qual foi o pequeno livro de Geometria que Einstein haviaganhado aos doze anos de idade e que lhe causara “uma impressãoindescritível”, para usar as suas próprias palavras. Ele mesmodescreveu a qualidade maior daquele texto como sendo a de nãodemonstrar muito preocupação com o rigor lógico, mas sim ade ser escrito com a intenção deliberada de enfatizar os pontos

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principais daquela matéria de uma forma clara e resumida. Estasua descrição coincide com a que se pode atribuir ao livro deGeometria escrito pelo seu professor Sickenburger e existe umaforte possibilidade de que de fato tratava-se do mesmo, emboranão se possa afirmar isso de um modo conclusivo.

Alguns conceituados biógrafos de Einstein, como Folsing, porexemplo, têm levantado a hipótese de que aquela obra de Geo-metria que havia encantado Einstein aos seus doze anos de idadeteria sido, na verdade, o livro de um outro autor, Theodor Spie-ker. O livro de Spieker, no entanto, era concebido em uma linhade apresentação muito semelhante à do livro de Sickenburger,o que dificulta uma perfeita identificação. De todo modo, Sic-kenburger era, sem sombra de dúvidas, um excelente professorde Matemática e o seu livro era largamente apreciado pelos seuscolegas e pelos estudantes em geral. E Einstein, com certeza,deveria estar entre os apreciadores daquela obra do seu professorde Matemática.

Sob vários aspectos, portanto, o Luipold Gymnasium era, naverdade, uma escola moderna e sintonizada com as novas ten-dências de reformas educacionais preconizadas naquela época.Poder-se-ia dizer efetivamente que o Luitpold era de fato ‘umaboa escola do seu tempo e da sua época’. As notas obtidas porEinstein em Latim, Grego, Matemática e em Alemão refletem,sem qualquer dúvida, o seu bom aproveitamento e detonam porcompleto o velho mito de ter sido ele um mau aluno na escolasecundária.

Além de tudo isso, o diretor do Luitpold Gymnasium era umindivíduo liberal, o Dr. Wolfgang Markhausen, que era costu-meiramente relembrado por muitos dos seus estudantes comoum homem bastante simpático e generoso. Alguns estudantesdo Luitpold devem ter guardado diferentes recordações daquelaescola. Abraham Fraenkel, por exemplo, que ali estudou poucotempo depois de Einstein e que viria a tornar-se um grande mate-mático no século XX, guardou excelentes impressões do Luitpold.O seu tempo vivido naquele local foi descrito por ele como tendosido “nove anos felizes”.

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Por que, então, Einstein guardou sempre recordações tão a-margas do Luitpold Gymnasium? Por que uma escola tida à suaépoca, como um exemplo de uma instituição de ensino moderna,sintonizada com as reformas educacionais preconizadas por Er-nst Mach causara em Einstein uma impressão tão negativa?

Alguns historiadores mais recentes, como Harvey Brown, porexemplo, têm apontado esse fato como uma contradição no dis-curso de Einstein a respeito da sua vivência escolar. Esta avalia-ção, entretanto, não nos parece correta por diversos motivos.

Em primeiro lugar, há de se salientar que as inovações educa-cionais introduzidas no Luitpold e de resto na educação alemãcomo um todo, visavam um objetivo muito claro, o de adequaro ensino às novas necessidades trazidas pelo desenvolvimento domodo de produção capitalista. Neste sentido, o novo enfoquede um ensino mais voltado para a Ciência e para a Matemáticaera um fato inconteste. Que um tal ensino estivesse tambémcalcado em leituras epistemológicas mais recentes, oriundas dospensamentos de Mach, isso também parece inquestionável.

Uma outra questão bastante distinta é saber até que ponto orelacionamento humano entre professores e alunos e a própriaatmosfera da escola como um todo refletia um clima ameno epropício ao desenvolvimento da auto-estima e da autoconfiançaou estava ainda fundado simplesmente nos velhos ditames do ri-gor, da obediência e dos intermináveis exercícios de repetição. Amodernidade preconizada na reforma educacional alemã não es-tava imbuída de nenhuma preocupação humanista, de nenhumaintenção de atender aos mais nobres desejos de felicidade e de de-senvolvimento pessoal do ser humano como um todo. Era antesde tudo uma reforma utilitarista, ditada por interesses sociais eeconômicos de uma classe dominante que necessitava organizarem linhas mais lucrativas a produção e a reprodução da forçade trabalho. O homem, a sua felicidade e a sua realização pes-soal não eram o centro daquele processo de reforma educacional;mas, sim, os interesses da produção capitalista.

Ainda que a personalidade do diretor da escola pudesse seradmirável e que também a conduta de um ou outro professor

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pudesse ser igualmente digna de nota, a atmosfera global da edu-cação alemã era ditada muito mais por uma pressa burguesa ematingir novos padrões de eficiência produtiva, padrões estes nun-ca antes imaginados. O custo humano podia ser tremendo, masos objetivos práticos eram muito claros e precisavam ser cum-pridos.

Outro ponto importante ainda a ser destacado é o fato de queno tempo em que Einstein ali estudou, as reformas educacionaisainda estavam sendo implementadas, o que poderia, ao menosem parte, justificar a contradição da experiência vivida por Eins-tein com o já mencionado depoimento de felicidade dado porAbraham Fraenkel. Outra questão, ainda, é o fato evidente deque as interações entre professores e alunos poderiam certamenteexperimentar variações de caráter puramente idiossincrático. Eum outro ponto a ser levantado ainda é a própria confiabilidadedaqueles depoimentos contraditórios, tanto o de Einstein quantoo de Fraenkel, pelo alto grau de envolvimento emocional contidonos mesmos.

Certo, porém, é que em uma época de intensa concentraçãoindustrial e de um crescente militarismo na Alemanha, a disci-plina e a obediência cegas eram de fato palavras de ordem. Oespírito reinante na sociedade germânica como um todo no finaldo século XIX e por extensão nas escolas alemãs, não deixa mar-gem de dúvidas e pode ser percebido muito bem nas própriaspalavras proferidas pelo seu todo poderoso primeiro ministro,Otto von Bismarck, em , um ano antes do nascimento deEinstein:

“as grandes questões sociais dos nossos dias não se decidirão comresoluções e com votos majoritários, mas sim com sangue e ferro.”

Deste modo, não parece absolutamente contraditório queEinstein, como um amante da liberdade, não tenha apreciadonem um pouco as tais ‘modernidades’ da nova escola germânica,modernidades estas que permitiam conciliar os novos conteúdoscurriculares a serem lecionados e as novas formas de exposiçãopreconizadas com o fato real e claramente relatado por Einstein

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de que os professores costumavam punir as respostas erradas dosseus alunos com dolorosos castigos corporais.

No Luitpold Gymnasium de Munique, Einstein não teve cer-tamente uma experiência feliz, revelando-se mais uma vez umaluno retraído e problemático e que instintivamente não supor-tava a atmosfera autoritária e as técnicas pedagógicas de auto-matização características da escola tradicional. Apesar de algunspontos positivos como, por exemplo, o bom equipamento das es-colas, a característica central da educação primária e secundáriaalemã era a de ser toda ela impregnada pelo forte espírito mili-tarista que impunha como metodologia pedagógica os exercíciosde repetição e o princípio da obediência absoluta. Havia uma ên-fase exagerada na ordem e na disciplina. Isto afetava fortementeos sentimentos do jovem Einstein que se até os nove ou dez anosde idade não havia ainda encontrado formas de exprimir comveemência o seu desagrado e a sua crítica, passou a encontrá-lasquando no Luitpold Gymnasium.

Mesmo em tais circunstâncias, o velho mito de Einstein comoum mau aluno, não resiste às pesquisas históricas mais recentes.Ainda que ele tenha lidado com dificuldades de adaptação bemmais sérias que aquelas já enfrentadas anteriormente na escolaprimária, as notas obtidas por Einstein no Gymnasium estavamlonge de poderem ser consideradas baixas. Nem isso, entretanto,o livrou do caráter traumático daquela experiência de estudar sobconstante stress em um clima repressivo no qual todo e qualquerpensamento crítico ou criativo não era algo bem visto. Ele, mui-tas vezes, viveu em silêncio aquela atmosfera carregada de opres-são. Suas únicas defesas eram as faltas às aulas e o riso constante,às vezes, certamente carregado de um tom irônico que irritavaprofundamente os seus professores. Einstein saiu-se muito bemem Matemática, matéria na qual ele estava já muito à frente doconteúdo lecionado na escola. Física era ensinada apenas no sé-timo período e quando isso veio a acontecer não chegou a mo-tivar Einstein, pois ele já havia estudado por conta própria bemmais do que o conteúdo apresentado na escola.

Os conflitos de Einstein na escola atingiram um ponto má-ximo exatamente no sétimo período quando o seu professor de

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Grego, Joseph Degenhart, na qualidade de seu novo “ordinarius”,e assim responsável pelo acompanhamento direto das suas tare-fas escolares, disse-lhe categoricamente que ele, Einstein, nuncaconseguiria ser nada na vida e que ficaria muito feliz se ele nãoassistisse mais às suas aulas. Quando Einstein lhe retrucou quenão compreendia aquela afirmação, pois não havia cometido ne-nhuma falta, o professor respondeu-lhe de forma direta:

“sim, é verdade, mas, você senta ali na fila de trás e fica sorrindoo tempo todo e isso contribui para diminuir o respeito da classepor mim.”

É difícil saber se de fato, naquele momento, o sorriso de Eins-tein, mencionado pelo professor, havia sido mal interpretado ouse era mesmo a sua arma preferida da ironia contra o poder es-tabelecido do autoritarismo. Não sabemos com precisão, mascerto é que essa sua atitude de enfrentar as autoridades de ummodo irônico e às vezes quixotesco, manteve-se até o final da suavida. Ele apenas substituiu, ao longo da vida os seus moinhosde vento a serem os seus objetos de ataque; mas, o juízo de va-lor que a sociedade lhe atribuía, este certamente foi mudandoà proporção que Einstein veio a se tornar um homem famoso eposteriormente uma celebridade mundial.

O que de início era visto como atos inconvenientes ou mesmode insolência de um jovem rebelde passou, paulatinamente, aolongo do tempo, a ser visto apenas como esquisitices ou comoexcentricidades de um gênio. A sua atitude de confronto corajosocom os excessos cometidos pelo poder estabelecido manteve-sesempre acesa ao longo de toda a sua vida e pode ser bem aquila-tada pelo conteúdo de uma mensagem sua, em , já perto desua morte, à rainha mãe da Bélgica. Naquela carta, Einstein afir-mou, sem meias palavras, em relação à sua situação nos EstadosUnidos, onde havia se exilado desde :

“eu tenho me tornado um certo tipo de ‘enfant terrible’ na minhanova terra mãe devido à minha inabilidade em manter osilêncio e em engolir tudo o que acontece ali.”

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Na verdade, apesar das suas boas notas na escola – nunca é de-mais repetir este ponto – Einstein simplesmente detestava profes-sores autoritários, estudantes servis e um ensino por pura memo-rização. Ele não suportava aqueles métodos de ensino mecânicose sem sentido; em suma, tudo aquilo que caracterizava o LuitpoldGymnasium em sua visão. Apesar da seriedade desses conflitos,Einstein impressionou positivamente o seu professor de Mate-mática, o que não chega a ser de se admirar e tinha mesmo umótimo relacionamento com pelo menos um dos seus mestres, oDr. Ferdinand Ruess. Ruess era professor de Latim e Alemão etambém o seu primeiro “ordinarius” (o professor responsável pororientar os deveres de casa dos alunos). Apesar de Einstein nuncater tido um interesse especial pelo estudo das línguas, ele apreci-ava o estudo do Latim, por considerá-lo uma língua que seguiaum certo padrão lógico de estruturação. Além disso, o professorRuess dava uma grande ênfase ao estudo da obra de Kant quejá era, desde antes, do agrado de Einstein. Ruess introduziu-oainda nas leituras de Shakespeare e de Goethe. Segundo o pró-prio Einstein, a sua admiração pelo professor Ruess provinha daforma como este tratava os seus alunos.

“Diferentemente dos demais professores, Ruess comunicava aosestudantes um grande entusiasmo pela beleza do mundoclássico. A afinidade dos alunos para com aquele professor, quesozinho conseguia satisfazer a curiosidade intelectual dos seusalunos, era tão grande que era um prazer ficar assistindo as suasexplicações mesmo após encerrado o tempo da aula.”

A paixão de Einstein pela filosofia de Kant era tão grande que,como relata um de seus colegas de escola, Fritz Genewin, Einsteincostumava conversar com ele instruindo-o alegremente sobre osensinamentos contidos na “Crítica da Razão Pura”, de Kant. Ge-newin lembra também, com grata recordação, do quanto ele a-prendia sobre o pensamento de Kant naquelas conversas comEinstein. Esta não é, no entanto, uma impressão que possa serfacilmente generalizada. Pela solidão que Einstein costumava ex-perimentar na escola, aquelas suas tentativas de conversar com

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outros companheiros, além de Genewin, sobre aqueles temas fi-losóficos tão profundos, não deveriam encontrar, provavelmente,nos mesmos uma grande ressonância nos seus interesses e nassuas preocupações pessoais.

Em , a situação econômica da família Einstein sofreu umsério revés com a falência de sua firma de materiais elétricos emMunique, devido à forte concentração produtiva ocasionada pelaconcorrência existente no desenvolvimento capitalista. Eles de-cidiram, então, mudar-se para Milão onde viriam a abrir umanova firma na mesma área de atuação industrial. Maja, a irmãmais nova de Einstein seguiu com os seus pais para a Itália en-quanto o jovem Albert foi deixado em Munique, residindo emuma pensão, para que pudesse concluir os seus estudos no Luit-pold Gymnasium. Aquela parece ter sido realmente uma decisãotrágica que precipitou os acontecimentos que levariam Einstein aabandonar a escola apenas seis meses depois e a rejeitar logo emseguida a cidadania germânica.

Em dezembro de , Einstein tinha apenas quinze anos deidade e ainda estava com a sua educação básica incompleta,quando decidiu, mesmo assim, interromper os seus estudos noLuitpold Gymnasium em Munique por discordar frontalmentedos rígidos métodos pedagógicos ali então adotados. Ele conse-guiu um atestado médico com o irmão do seu amigo Max Talmeye convenceu o diretor da escola de que precisava reunir-se aosseus pais na Itália por estar à beira de uma exaustão nervosa.O diretor não colocou qualquer objeção, parecendo na verdade,apesar de sua fama de liberal ter aceitado com alegria o fato depoder livrar-se daquele aluno rebelde e questionador da ordemestabelecida. Segundo conta o próprio Einstein, ele certamentequeria muito reencontrar os seus pais na Itália, mas o principalmotivo de haver abandonado a escola em Munique foi o fatodele não suportar mais os métodos monótonos e mecanizadosde ensino adotados no Luitpold.

Em sendo verídica esta afirmação de Einstein, boa parte dosdecantados novos métodos de ensino adotados no Gymnasiumde Munique não passava de belas afirmações contidas em folhasde papel. Elas seriam exemplos vivos do que ainda acontece nos

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dias atuais em vários lugares do mundo: reformas educacionaisque se restringem aos documentos oficiais sobre novos conteú-dos curriculares, mas cujos efeitos práticos não chegam nuncaàs salas de aula reais. Einstein alegava, ainda, que devido à suamemória não muito boa para recordar de palavras sem sentidoele sentia grande dificuldade com certos assuntos e o esforço feitopara superar aqueles obstáculos parecia-lhe sem qualquer propó-sito prático. Assim, ele nos conta:

“eu preferia, por isso, suportar todas as formas de puniçõesexistentes em vez de ter de aprender toda aquela tagarelice porpura repetição.”

Einstein antes de viajar, ainda conseguiu com o seu professorde Matemática uma carta de recomendação dando conta do seualto desempenho naquela matéria. O professor afirmou naquelacarta que Einstein era tão proficiente em Matemática que haviamuito pouco que ele ainda pudesse ensinar-lhe.

É importante assinalar que alguns biógrafos de Einstein têmdisputado esta idéia de que ele pediu voluntariamente para sairdo Gymnasium em Munique. Enquanto a quase absoluta totali-dade deles tem adotado a versão de que Einstein, de fato, abando-nou a escola voluntariamente, Ronald Clark, um dos seus gran-des biógrafos, defende a posição de que Einstein foi simplesmen-te expulso da mesma. Pesquisas mais recentes, entretanto, pare-cem apontar, de fato, decisivamente na direção de uma tomadade decisão voluntária da parte de Einstein, ainda que catalisadapela atitude bastante rude do seu professor e novo “ordinarius”,já assinalada anteriormente.

O fato é que logo após obter aquela carta de recomendação doseu professor de Matemática, Einstein viajou sozinho para Milãoe foi encontrar-se com os seus pais que o receberam com grandesurpresa e com uma certa preocupação com o seu futuro. Foi na-quele mesmo natal que Einstein convenceu o seu pai a escrever àsautoridades germânicas solicitando a sua desistência de manter acidadania alemã. Naquele momento, entretanto, Einstein aindanão estava ainda em condições de requerer a cidadania suíça, o

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que ele só conseguiria finalmente concretizar em outubro de ,mais de um ano após a conclusão do seu curso de Física na ETH.

As razões da sua renúncia à cidadania alemã, tornando-se umindivíduo sem pátria durante longo tempo, não são muito claras.Algumas vezes tem sido sugerido que ele detestava toda e qual-quer forma de serviço militar, mas isso não parece fazer sentido,ao menos em sua juventude, pois ele viria tempos depois a seoferecer para o serviço militar na Suíça, embora viesse a ser re-cusado por ter pés chatos. O que parece mais digno de crédito éque ele repelisse com veemência o militarismo alemão e a rígidadisciplina associada ao mesmo. Enquanto o serviço militar naSuíça tinha apenas um caráter de defesa da pátria, na Alemanhaele era algo agressivo e carregado de um forte sentimento naci-onalista, expansionista e imperial, o que Einstein rejeitava comtodo o vigor.

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A Educação de Einstein na

Escola de Aarau

L rotineiras,

Einstein aproveitou aquele período para apreciar as be-lezas da Itália e conviver mais de perto com os problemas

técnicos e científicos ligados ao Eletromagnetismo, na indústriada sua família, então instalada em Pavia. A extensão que uma talinfluência pode ter exercido na formação de sua visão de mundono campo da Física, e mais especificamente dos fenômenos ele-tromagnéticos, de onde nasceria tempos depois a sua Teoria daRelatividade, não deve jamais ser subestimada. Ele se dedicoua estudar Física por conta própria tendo lido sozinho o Manualde Física de Jules Violle. Já nessa época, o seu poder de concen-tração parecia algo impressionante; pois, mesmo em um ambi-ente muito barulhento, ele parecia abstrair-se por completo domundo exterior e mergulhar profundamente em seus própriospensamentos.

Por influência de seu pai, Einstein chegou a considerar a pos-sibilidade de estudar Engenharia e decidiu ingressar no ensinosuperior de forma direta, mesmo sem haver ainda concluído asua escolaridade básica. Isto era permitido em casos especiaisem algumas instituições como na Escola Politécnica de Zurique(ETH) que se destinava a formar especialistas em Engenharia

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assim como também professores secundários de Física e de Ma-temática. Einstein decidiu, assim, prestar exames para entrarna ETH com a intenção inicial de tornar-se um engenheiro ele-tricista.

Naquele período em que estava morando na Itália entre e e preparando-se ainda para prestar os exames de admissãona ETH, Einstein escreveu o seu primeiro ensaio conhecido sobreum assunto científico, um estudo sobre “o estado do éter no campomagnético” e enviou-o ao seu tio César Koch o qual morava naBélgica. O ensaio é o primeiro registro escrito conhecido do tipode preocupação que levaria Einstein tempos depois à criação daTeoria da Relatividade. Naquela carta, Einstein pede desculpas aoseu tio por estar enviando-lhe um ensaio científico que talvez elenão compreendesse; mas, justifica-se pelo envio dizendo, em tomde brincadeira, que aquela era uma maneira do seu tio perceberque ele estava lutando contra os maus hábitos dos seus pais denão gostarem de escrever. De todo modo, o texto não parece tersido escrito originalmente para o tio, pois logo nas suas primeiraslinhas, como observa Holton, ele se refere de modo impessoal aum possível leitor do mesmo: “eu espero que a indulgência doleitor interessado venha a corresponder aos modestos sentimentoscom os quais eu ofereço estas linhas”. Este trecho inicial daqueleensaio dá a entender que Einstein tinha em mente uma platéiamais ampla para o seu discurso. Sobre qual teria sido esta talpossível platéia, não há qualquer evidência histórica conhecida.

Para ter o direito de prestar o exame de admissão especial paraa Escola Politécnica de Zurique, Einstein teve de obter a permis-são do seu diretor, o professor Albin Herzog. Ele, além de nãohaver àquela época completado ainda a sua educação secundáriaera também dois anos mais jovem do que a idade normal dosestudantes admitidos na ETH. A excelente carta de recomenda-ção dada pelo seu professor de Matemática em Munique pesoufavoravelmente à obtenção da permissão de prestar aquele exameespecial.

Einstein, entretanto, não foi aprovado naquela sua primeiratentativa de entrar na ETH no outono de , devido ao seuconhecimento haver sido considerado como insuficiente nas ci-

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ências naturais descritivas (Biologia) e principalmente devido àsua fraca performance no exame de Francês. Einstein, no en-tanto, destacou-se de tal modo nas provas de Matemática e deFísica que recebeu o convite do professor desta última matéria,o Dr. Heinrich Weber, para assistir como ouvinte às suas aulasna ETH. O diretor da ETH, o Dr. Albin Herzog, recomendou,entretanto, que ele concluísse antes os seus estudos secundáriosna Escola Técnica da cidade de Aarau, a apenas quilômetrosde Zurique e capital do cantão de Aargau. Einstein aceitou aquelarecomendação do diretor da ETH e concluiu com sucesso, no anoseguinte, os seus estudos secundários naquela escola.

Todo o sistema escolar do cantão de Aargau era bem conhecidona Suíça pelo caráter secular e liberal de sua tradição educacional.Quando Einstein entrou na ‘Kantonsschule’ de Aarau em outubrode , ela consistia, na verdade, na junção de duas escolas emuma única instituição: um Gymnasium com cinqüenta e cincoalunos e uma ‘Gewerberschulle’ (uma ‘Escola Técnico-Comercial’)com noventa alunos. Não era, assim, uma instituição grande,mas o seu prédio era imponente, o seu equipamento dos maismodernos e o seu professorado dos mais bem preparados daregião.

Três cientistas dominavam o desenvolvimento da escola de Aa-rau naquela época. O primeiro deles era o Dr. August Tuchsmidtque havia sido anteriormente assistente de Física do professorWeber na ETH. Tuchsmidt além de um excelente professor deFísica de Einstein era também o diretor da escola. Ele havia equi-pado o laboratório da mesma com o que havia de mais modernoem termos de equipamentos de ensino. No seu acervo incluíam-se dínamos e outros equipamentos eletrotécnicos e o referidolaboratório estava em pleno crescimento no ano em que Einsteinali estudou. Tuchsmidt era um professor de Física de primeiraordem e um indivíduo em alerta em relação ao desenvolvimentodaquela ciência em sua época. Como lembra Schwartz, ele cos-tumava enfatizar que a grande questão da Física a ser resolvida,então, era a resolução da visão mecânica newtoniana do mundocom as novas equações do Eletromagnetismo. Esta questão seria

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o fulcro das preocupações de Einstein que o levariam posterior-mente ao desenvolvimento da Teoria da Relatividade.

O segundo cientista a influenciar a escola era o Dr. HeinrichGanter que lecionava Matemática a Einstein. Ele era um indiví-duo mais convencional do que Tuchsmid. Ganter, embora nãofosse um matemático de alto nível era capaz de ensinar muitascoisas que muitos outros professores, talvez até com um maiorpreparo que o dele, não conseguiam fazer com a mesma facili-dade. Ele era também autor de um livro de Geometria Analíticaem parceria com um professor da ETH. Segundo um dos seusestudantes, Ernst Meissner, Ganter era lembrado principalmentepor ser um professor que não apenas transmitia aos seus alunosos conteúdos a serem lecionados preparando-os para uma futuracarreira profissional, mas que também tentava tocar os seus co-rações e educar o caráter dos mesmos. Segundo Meissner, se to-dos os professores fossem como Ganter não haveria necessidadede reformas educacionais. O aproveitamento de Einstein nasdisciplinas de Matemática ensinadas por Ganter foi excepcional,tendo tirado a nota máxima , em todas elas.

O terceiro cientista a influenciar os destinos da escola em Aa-rau era o Dr. Friedrich Muehlberg, um verdadeiro cientista quenaquela época com cinqüenta e cinco anos de idade era um dosmaiores geólogos da Suíça. Muehlberg havia escrito um impor-tante tratado com mais de mil páginas sobre a Geologia glacialde Aargau. Ele lecionava a Einstein Química, Geografia Físicae História Natural. Apesar destas matérias não estarem entreas favoritas de Einstein, ele e Muehlberg tornaram-se grandesamigos. Einstein, muito tempo depois, em uma conversa comPeter Bucky, relembraria do professor Muehlberg como alguémcuja filosofia de educação o havia tocado profundamente. Comocurador do museu de história natural da escola, ele estava semprelevando os seus alunos para passear ao ar livre e apreciar as ma-ravilhas da natureza. Para Einstein, o que mais lhe impressionaranaquele professor havia sido a sua habilidade espiritual, o seugosto pela descoberta de coisas novas e o seu desejo de infundirnos seus alunos o germe da curiosidade científica. Aquilo, paraMuehlberg, era algo mais importante do que o ganho momen-

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tâneo do conhecimento. Por seu lado, Einstein havia causadonaquele seu estimado professor uma ótima impressão e este otinha na conta de um aluno muito inteligente.

Einstein sempre recordaria com grande satisfação daquele anovivido em Aarau e sua escola particularmente permaneceria paraele como a mais prazerosa imagem de um tipo de instituição cul-tural onde reinava uma grande liberdade no ensino e na apren-dizagem. Aquela era uma liberdade tradicional de Aargau e quenão guardava qualquer semelhança com as reformas educacio-nais operadas na Alemanha. Em Aargau a modernização educa-cional não estava restrita apenas aos conteúdos a serem leciona-dos e à abordagem epistemológica a ser adotada. As moderniza-ções educacionais que haviam acontecido em Aargau incluíam,sobretudo uma atenção especial na melhoria do relacionamentohumano na escola. Era uma reforma claramente inspirada napedagogia humanista de Pestalozzi.

A experiência vivida por Einstein na cidade de Aarau, a atmos-fera liberal da escola inspirada na pedagogia de Pestalozzi, assimcomo o tratamento amigável dispensado pelos seus professores,iriam marcar profundamente e de forma bastante positiva o es-pírito de Einstein.

Durante a sua estada em Aarau, Einstein hospedou-se na casade um professor da escola, Jost Winteler a quem ele se afeiçooua ponto de considerá-lo como um segundo pai. Einstein, porseu lado, era tratado como um membro da família Winteler eparticipava regularmente das suas animadas discussões e das suasdivertidas reuniões musicais.

Winteler não chegou a ser professor de Einstein, mas exerceusobre ele uma considerável influência. De fato, Einstein semprese referiu desde então a Jost Winteler de forma carinhosa comopapa Winteler. Winteler era um verdadeiro humanista e um ho-mem de convicções políticas progressistas. Do ponto de vistaeducacional, Winteler era de fato um seguidor dos ensinamentosde Pestalozzi e um crítico contundente dos tradicionais métodosde ensino germânicos baseados na disciplina, em uma obediênciacega e em uma aprendizagem por repetição, métodos estes que

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Einstein tanto detestava. Portanto, ainda que indiretamente, Pes-talozzi exerceu uma influência decisiva sobre a visão de educaçãode Einstein. A própria tradição liberal da educação no cantão deAargau radicava nas influências recebidas de Pestalozzi.

Aqui cabem, portanto, algumas palavras sobre Pestalozzi e so-bre a sua obra, para que possamos avaliar melhor a extensão emque Einstein, que havia estudado com satisfação em uma escolade inspiração pestalozziana, foi indiretamente influenciado pelasua pedagogia.

Heinrich Pestalozzi (–) foi um educador suíço cujapregação da liberdade e dos métodos ativos de ação ligados às vi-das das crianças muito influenciou outros educadores mais mo-dernos. Pestalozzi não foi propriamente um filósofo; mas, sim,rigorosamente, um pedagogo. Seus conceitos de liberdade e deação, nos quais se fundamenta toda a sua pedagogia, são deri-vados da obra filosófica e educacional de Immanuel Kant (–). Por outro lado, a própria pedagogia kantiana radica nospreceitos educacionais estabelecidos pelos novos ideais de vida ede educação traçados pelo pensador suíço Jean Jacques Rousseau(–). No sentido educacional, Kant pode ser tido mesmocomo o maior dos discípulos de Rousseau.

Os escritos de Rousseau atribuem ao ser humano uma novaconcepção de dignidade e de exercício da cidadania. Rousseauabraçou a idéia de uma educação de acordo com a natureza hu-mana e a real natureza do homem deveria, para ele, ser encon-trada nos sentimentos comuns a todos e não em uma razão res-trita a alguns poucos. Kant, em sua Pedagogia, aceita completa-mente este ideal de Rousseau de uma educação de acordo coma natureza humana e pensa mesmo que as disposições iniciaisda criança estão todas direcionadas para a bondade, para a liber-dade e para o desenvolvimento físico e mental nos seus primeirosanos de vida. Kant, entretanto, distingue-se de seu grande mestreRousseau, por traçar de modo mais definido uma distinção entrea natureza humana primitiva e a natureza humana que requeruma educação para ser construída. Em decorrência disto, Kantinsiste na necessidade de estabelecer limites para os impulsos da

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criança, sem que esses limites, entretanto, sejam estabelecidos detal modo a gerarem um antagonismo com a liberdade.

Por sua vez, Pestalozzi, influenciado por Kant, pelos seus ide-ais de sociedade e pela sua concepção geral de desenvolvimentomental, tentou construir uma pedagogia nova que conciliasse oslimites estabelecidos por Kant com a liberdade pregada por Rous-seau no âmbito da Escola. O essencial para Pestalozzi era a livreação aliada ao desenvolvimento da responsabilidade pessoal decada aluno. Diferentemente das considerações educacionais deKant, que eram essencialmente filosóficas, Pestalozzi revelou-seum pedagogo prático cuja teoria educacional decorria de suaspróprias experiências concretas no âmbito de suas escolas. Dadaa esta característica mais prática de sua atividade pedagógica, ainfluência educacional por ele exercida foi ainda maior do que adesses seus dois grandes predecessores.

Muitas escolas pelo mundo receberam uma forte influênciada pedagogia de Pestalozzi, principalmente na Suíça e, dentreelas, a de Aarau destaca-se como um dos mais belos exemplos.Como lembra Soetard, Pestalozzi, que nasceu e viveu boa parteda sua vida em Zurique, desenvolveu as suas primeiras experiên-cias pedagógicas justamente no cantão de Aargau, onde chegouinclusive a adquirir um pedaço de terra nos anos e fundarali a sua primeira escola para crianças pobres das redondezas.Naquela escola, Pestalozzi ensinava às crianças a conduzirem osseus próprios trabalhos de modo prático, tecendo e costurando oalgodão. Naqueles dias, aquela era uma experiência educacionalbastante original que fundamentava a sua crença no desenvol-vimento da autodisciplina das crianças desenvolvida através daaprendizagem adquirida nos seus próprios trabalhos. A experi-ência educacional de Pestalozzi em nenhum outro lugar ganhoutantos adeptos quanto em Aargau que havia presenciado direta-mente as suas bem sucedidas experiências.

Pestalozzi, tido por muitos como o pai da educação moderna,inspirou diretamente os trabalhos de Froebel e de Herbart e oseu nome está associado com todos os movimentos por reformaseducacionais que surgiram de forma apaixonada no século XIX.As suas idéias e as suas experiências pedagógicas influenciaram

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ainda, de forma direta ou indireta, as concepções dos criado-res do Movimento Escola Nova no século XX. John Dewey é,certamente, o mais importante nome deste movimento e do re-cebimento e da reelaboração de uma tal influência educacionalrecebida de Pestalozzi. Deste modo, as semelhanças porventuraexistentes entre as posturas educacionais de Einstein e de Deweynão podem jamais ser creditadas a um mero acaso. Este, entre-tanto, é um tema bem mais complexo que radica também em umconjunto de outras influências recebidas nas formações tanto deEinstein quanto de Dewey e será abordado, em detalhes, maisadiante na seqüência deste livro.

Na escola de Aarau, além do respeito pelos alunos, da práticada livre ação e do desenvolvimento da responsabilidade pessoaldos educandos, havia ainda uma forte ênfase na necessidade depropiciar aos mesmos os meios para que se desse um desenvol-vimento intelectual harmonioso. Um dos pontos enfatizados emuma tal abordagem inspirada na pedagogia de Pestalozzi era atentativa de desenvolver nos alunos o raciocínio por imagens enão apenas aquele fundado na expressão verbal. Como assinalaThomas Hughes, Pestalozzi havia sido um apaixonado advogadoda compreensão visual e a escola de Aarau, dentro deste contexto,dava uma ênfase especial em seu currículo às atividades com de-senhos, aos trabalhos práticos de laboratório, ao uso de mapas ea outras formas de expressão visual. Este tipo de educação cer-tamente atuou como um fermento intelectual para alguém comoEinstein que já trazia consigo uma forte tendência em raciocinarpor imagens. Ali o seu pensamento floresceu e já aos dezesseisanos, enquanto ainda estudante de Aarau, Einstein desenvolveriao seu primeiro e famoso “experimento em pensamento”, relaci-onado com um sujeito hipotético que com um espelho na mãoviajava em um raio de luz. Embora os detalhes da discussão deste“experimento em pensamento” não sejam pertinentes no escopodeste presente livro, cabe salientar que este “experimento” foi tal-vez um dos primeiros passos na longa caminhada de Einstein emdireção ao desenvolvimento da Teoria da Relatividade.

A influência de Pestalozzi na concepção educacional de Eins-tein pode ser aquilatada pelas suas próprias palavras ao se lem-

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brar muito depois de sua experiência na escola de Aarau compa-rando-a com a do Luitpold Gymnasium:

“pelo seu espírito liberal e pela simples seriedade dos seusprofessores, que não estava baseada em nenhuma autoridadeexterna, essa escola deixou em mim impressões inesquecíveis. Acomparação com os seis anos de escolaridade no autoritárioGymnasium alemão me fez entender claramente asuperioridade de uma educação voltada para a livre ação e paraa responsabilidade social em relação a uma outra fundada naautoridade e na ambição. A verdadeira democracia não é umailusão vazia.”

Ao final daquele ano feliz na escola de Aarau, em setembro de, Einstein fez o seu exame de ‘Matura’, que equivalia à conclu-são do curso secundário. O exame consistia de uma parte escritae de uma outra oral e eram ambas preparadas pelos professoresda própria escola. As sete provas escritas foram realizadas nodias , e de setembro daquele ano. Em Matemática foramdados três problemas, dois de Geometria e um de Álgebra. Osalunos podiam consultar as suas tábuas de logaritmos na provade Matemática, assim como os seus dicionários nas provas delíngua estrangeira; francês, no caso de Einstein. Na prova deFísica, o examinador anotou que Einstein havia sido o último achegar na sala e o primeiro a sair. Dentre os nove candidatos quese submeteram ao exame naquele ano em Aarau, Einstein foi oque obteve a maior média global: , para um máximo possívelde ,. Em valores equivalentes da nossa escala usual aquela suanota correspondia aproximadamente a uma média de ,.

A conclusão bem sucedida dos estudos secundários de Einsteinem Aarau veio acompanhada na prova de redação de francês, deuma verdadeira declaração da sua mudança de planos profissi-onais, do seu desejo de ser professor. Dissertando sobre seusdesejos profissionais, ele foi bem claro ao afirmar que:

“eu cursarei a Politécnica de Zurique. Eu ficarei lá por quatroanos para estudar Matemática e Física. Minha idéia étornar-me um professor no campo das ciências naturais.”

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Para alcançar o primeiro lugar entre os nove alunos que pres-taram o exame final naquele ano, Einstein obteve notas exce-lentes em Física e em Matemática e também ótimas notas emQuímica, História Natural e Alemão. Sua menor nota foi emFrancês. Naquela escala de notas que variava de a , ele obtevea nota máxima de , em Matemática (Álgebra, Geometria, Tri-gonometria, Geometria Analítica e Geometria Descritiva) e emFísica. Em Química ele tirou , o que equivale a um em nossaescala tradicional que vai de zero a dez. Seu desempenho maisfraco foi em Francês, em que ele tirou apenas um , enquantotanto em Alemão quanto em Italiano obteve a nota .

Os ensaios escritos por Einstein como parte dos seus examesfinais eram verdadeiros modelos de simplicidade e de lucidez. Asua abordagem dos problemas matemáticos era sempre tão sim-ples quanto possível. Se Einstein havia entrado na escola cantonalde Aarau, um ano antes, como um jovem precoce de anos deidade, aquele ano passado em Aarau o havia convertido em umjovem mais maduro, confiante naquilo em que pretendia investiro seu tempo nos anos seguintes: no estudo da Física e da Ma-temática. Possivelmente, aquele ano de escolaridade em Aaraufoi de uma importância bem maior para o desenvolvimento in-telectual de Einstein do que viriam a ser os aspectos mais formaisda sua educação na Escola Politécnica de Zurique. Pode-se, atémesmo, especular que nas experiências de Einstein com o ensinosecundário na Suíça encontram-se as verdadeiras origens da suapostura de abordar a realidade física como um todo.

Tempos depois, em suas conversas com Peter Bucky, Einsteinrelataria que quando ainda estudante em Aarau ele começara apensar seriamente em se tornar um professor, mas um profes-sor muito especial, do tipo que ele gostaria de ter tido. Nestesentido, Einstein, na verdade, mesclou as influências positivas dasua adolescência na escola de Aarau com as recordações amargasda sua vivência no Gymnasium em Munique. Ele se imaginouensinando para crianças e confessou a Bucky que naquela épocaem que havia concluído os seus estudos em Aarau ele havia pen-sado seriamente que ficaria muito feliz se pudesse vir a ensinarde acordo com o seu próprio estilo, tornando as crianças felizes

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e guiando-as de um modo que ele sentia que lhe havia faltado nasua própria infância em Munique.

A seqüência seguinte dos eventos ocorridos na vida de Einsteinjamais o aproximou do ensino para as crianças, o que talvez tenhasido, entretanto um feliz acontecimento para o progresso da Ci-ência. Não podemos saber se ele teria, de fato, sido tão bem suce-dido no ensino infantil quanto veio a ser como o grande cientistaem que veio a se tornar. Podemos apenas conjecturar a esserespeito. Ele, porém, nunca perdeu de vista, durante toda a suavida, o seu amor pela educação dos mais jovens. Isso fica patenteda análise dos eventos biográficos descritos na seqüência deste li-vro e principalmente das suas declarações pedagógicas analisadasdetalhadamente nos últimos capítulos desta presente obra.

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Einstein como Estudante na

Escola Politécnica de Zurique

U em Aarau e tendo

sido aprovado nos exames finais, Einstein foi finalmenteadmitido na ETH de Zurique para o curso de habilita-

ção como professor de Física e Matemática. Se quando haviaprestado o primeiro exame na ETH, um ano antes, Einstein pen-sara em seguir a carreira de engenheiro eletricista, o ano passadoem Aarau contribuíra decisivamente para mudar a sua aspira-ção profissional. Certamente, em sua intenção de ser professor,Einstein não se espelhava nos seus antigos e autoritários mestresem Munique. O seu modelo de educação e a sua decisão de serprofessor parecem ter sido, de fato, moldados durante aquele anoem que estudou em Aarau.

O ano de , no qual Einstein iniciou os seus estudos naETH, foi marcado pela nova falência da indústria elétrica de seupai, desta vez na cidade de Milão. Einstein ficou, assim, sem con-dições de sustentar os seus estudos em Zurique e eles vieram a sercusteados apenas com a ajuda de uma tia, irmã de sua mãe, cujasituação econômica era bem mais confortável que a de seus pais.

Mesmo levando uma vida extremamente simples em Zurique,Einstein teve algumas vezes de dar aulas particulares para com-plementar a pequena mesada dada por sua tia. A sua situação

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econômica era ainda mais delicada porque ele poupava sempreum pouco dos seus parcos recursos com a intenção de vir a pagarno futuro as caras taxas para a obtenção da almejada cidada-nia suíça.

A entrada de Einstein na ETH foi cercada por muitas expec-tativas de sua parte. De certo modo, ele havia se identificadode tal maneira com o tipo de educação liberal que recebera emAarau que guardara por algum tempo a expectativa de encontrarna ETH uma atmosfera acolhedora semelhante. Cedo, porém,ele se desencantaria com aquela sua expectativa otimista.

A ETH havia sido fundada em e logo ganhara reputaçãointernacional pela qualidade do seu ensino e da pesquisa ali de-senvolvida nas áreas de Engenharia e das Ciências Aplicadas. Oprimeiro professor de Matemática da ETH foi o grande RichardDedekind, a quem se deve o célebre estudo sobre o problema dadensidade da reta numérica enquanto o seu primeiro professorde Física foi o não menos famoso Rudolph Clausius, um dos cri-adores da moderna Termodinâmica. Foi durante a sua estada naETH que Clausius chegou ao conceito de entropia e à segunda leida Termodinâmica. Lá ensinou, também, por um breve espaçode tempo, Friedrich Kohlrausch, que depois viria a substituirHelmholtz na direção do conceituado Instituto Físico-Técnico deBerlim. Dentre os alunos famosos da ETH, antes do período emque Einstein ali estudou, destaca-se o nome de Konrad WilhelmRoentgen, o descobridor dos raios X e primeiro ganhador doprêmio Nobel de Física, em .

O nome ETH significa em alemão Eidgenössische TechnischeHochschule (Escola Politécnica Federal), mas aquela instituiçãosó veio a ganhar realmente esta denominação a partir de quando se tornou uma instituição federal e passou a oferecerestudos de PhD. Até então, ela era uma instituição cantonal echamava-se apenas de Escola Politécnica de Zurique. Rigoro-samente, portanto, a denominação de ETH é posterior à épocaem que Einstein estudou naquela escola (de outubro de ajulho de ). Ainda assim, por uma questão de brevidade,nós sempre nos referiremos, neste livro, àquela instituição comoa ETH.

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Einstein matriculou-se no departamento VI da ETH, ou seja,na Escola para Professores Especializados em Matemática e Assun-tos Científicos. A sua seção era a VI-A, a de Matemática, Física eAstronomia, que na época da matrícula de Einstein, em outubrode , contava com apenas estudantes nos diversos anos docurso, incluindo os onze estudantes da turma inicial de Einstein.Isso em meio a um total de estudantes matriculados em todaa ETH, principalmente nos cursos de Engenharia.

O departamento VI da ETH, diferentemente dos outros de-partamentos daquela instituição de ensino superior, não pres-crevia um currículo definido para os seus estudantes. Em vezdisso, cada aluno tinha um plano de estudos que era elaboradono início de cada semestre. Einstein seguiu um plano de estudoso mais aproximadamente possível daquele dirigido a um estu-dante de Física. Apesar disso, ele não teve a possibilidade de fazervárias disciplinas de Física Teórica assim como de participar deseminários de pesquisa em Física, pois tais atividades não foramoferecidas nos seus dois últimos anos de estudo na ETH.

Era requerido dos estudantes que assistissem ao menos a umadisciplina eletiva a cada semestre, disciplina esta que fosse alheiaao seu campo principal de estudos. Einstein assistiu a mais doque o número mínimo de tais disciplinas. Dentre estas discipli-nas, ele incluiu cursos de Filosofia, de Política e de Economia.

Mostramos a seguir uma relação dos professores de Einstein naETH e das suas respectivas disciplinas, segundo Seelig e Trbuho-vic. A relação contém as disciplinas matemáticas (ai incluídasas de Mecânica e de Astronomia) assim como as eletivas de for-mação mais geral, mas não aquelas relacionadas com a Física. Agrade das disciplinas cursadas na área da Física será exibida umpouco mais adiante, ainda neste mesmo capítulo.

Apesar de ser uma escola tradicional, a orientação e a avali-ação dos estudos na ETH estavam longe de poderem ser tidascomo ortodoxas. Cada aluno tinha uma espécie de registro dasdisciplinas que havia cursado onde eram colocados os resultadosdas avaliações obtidas nas mesmas. No final de cada semestre,cada estudante recebia o seu boletim contendo as notas obtidasnaquele período, mas é importante salientar que nem todas as

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Disciplinas Matemáticas

Professor Disciplinas cursadas

Prof. Dr. Adolf Hurwitz Cálculo Diferencial – Cálculo Integral– Equações Diferenciais

Prof. Dr. Wilhelm Fiedler Geometria Descritiva – GeometriaProjetiva

Prof. Dr. Albin Herzog Mecânica

Prof. Dr. Carl Friedrich Geiser Geometria Analítica – Determinantes– Cálculo Infinitesimal – TeoriaGeométrica dos Invariantes

Prof. Dr. Hermann Minkowski Geometria dos Números – Teoriadas Funções – Teoria do Potencial– Funções Elípticas – MecânicaAnalítica – Cálculo Variacional –Álgebra – Equações DiferenciaisParciais – Aplicações da MecânicaAnalítica

Prof. Dr. Ferdinand Rudio Aplicações da Mecânica Analítica

Prof. Dr. Arthur Hirsch Teoria da Integral Definida – Teoriadas Equações Diferenciais Lineares

Prof. Dr. Alfred Wolfer Introdução à Astrofísica – Introduçãoà Astronomia – Mecânica Celeste –Astronomia Prática

disciplinas cursadas eram avaliadas em termos de notas. Paraalgumas disciplinas bastava a presença do estudante e a sua parti-cipação regular nas atividades da mesma. As disciplinas nas quaisos estudantes recebiam notas tinham as suas avaliações feitas emuma espécie de ‘conselho de classe’ de todos os professores daseção à qual eles pertenciam. As decisões de tais avaliações erambaseadas nos relatórios individuais de cada aluno elaborados acada três meses pelos professores das respectivas disciplinas. Aofinal de cada ano letivo, essas decisões tomadas nas tais reuniões

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Disciplinas Eletivas de Caráter Geral

Professor Disciplinas cursadas

Prof. Dr. August Stadler Teoria do Pensamento Científico –Filosofia Kantiana

Privatdozent Dr. Ernest Fiedler Projeções Gnômicas

Prof Dr. Carl Friedrich Geiser Balística Exterior

Prof. Dr. Albert Heim Antropologia – Geologia dasMontanhas

Prof. Dr. Wilhelm Occhsli Política Suíça – A História daCultura Suíça na Idade Média ea Reforma

Dr. Julius Platter Negócios Bancários e Bolsa deValores – A Conseqüência Socialdo Livre Mercado – Fundamentosde Economia

Prof. Dr. Jakob Rebstein As Bases Matemáticas da Estatísticae os Seguros Pessoais

Privatdozent Dr. Robert Saitschik Os Trabalhos de Goethe e aFilosofia

dos professores determinavam a condição de cada estudante seraprovado para o ano seguinte ou de ser reprovado.

Havia apenas dois exames gerais durante todos os quatro anosdo curso. O primeiro, após o término do segundo ano, era ochamado ‘exame intermediário’. Ele consistia de uma argüiçãooral sobre os assuntos até então estudados e era um tipo de ava-liação que para muitos, como Einstein, assumia a característicade algo bastante estressante e desmotivador. A aprovação na-quele exame elevava o estudante ao ciclo de estudos seguintesmais profissionais, no qual as disciplinas tinham um caráter maisespecificamente ligado à área de concentração do mesmo e que ohabilitavam já a trabalhar em uma pesquisa orientada com vistas

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à escrita de uma dissertação de conclusão de curso necessáriapara a obtenção final do Diploma. Einstein fez os seus examesintermediários em outubro de e guardou daquela época asmais amargas recordações possíveis, apesar de ter obtido, então,as melhores notas da sua turma. Dos cinco exames realizados eletirou a nota máxima de , em duas matérias e , em cada umadas três outras. Deste modo a sua média foi de ,. Seu amigoMarcel Grossmann ficou em segundo lugar, obtendo uma médiaigual a ,.

O sofrimento e o desencanto oriundos da preparação para a-queles exames de meio de curso foram, de fato, um divisor deáguas para Einstein em sua experiência como estudante na ETH.Aqueles exames forçaram-lhe a estudar coisas que muitas vezesnão lhe interessavam e a seguir por pura obrigação os passos deoutros cujas orientações ele não julgava as mais pertinentes. Eleteve de passar todo o verão preparando-se com afinco para os taisexames e, ao final dos mesmos, o esforço feito para manter aquelarotina estafante causou-lhe um tremendo desconforto. Mesmotendo tido sucesso e tirado as melhores notas da sua turma, Eins-tein simplesmente detestou aquela experiência. Em suas própriaspalavras:

“quando alguém tem que prestar um exame como esse, ele sesente responsável por tudo aquilo que pensa e que faz como seestivesse em uma instituição penal.”

Se por um lado, as insatisfações de Einstein com a ETH atin-giram um limite na época dos exames intermediários, é precisoadmitir que elas já haviam tido inicio anteriormente. Para com-preender-se a origem dessas insatisfações de Einstein e do seudesagrado crescente com os professores é necessário analisar maisdetalhadamente como era o ensino de Física e de Matemáticanaquela instituição no final do século XIX.

As disciplinas oferecidas na ETH nos primeiros semestres doscursos de Física e de Matemática eram cursadas em conjunto comos cursos de Engenharia. Deste modo, era grande o número dealunos nas salas de aulas. O ensino da Física, nesse contexto, era

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apenas uma simples extensão do tratamento matemático habi-tualmente dispensado na formação dos engenheiros. A ênfaseno primeiro semestre era colocada integralmente na formação deuma base matemática, principalmente nos fundamentos do Cál-culo Diferencial e Integral e da Geometria Analítica. No segundoe no terceiro semestres estudava-se, também, a Mecânica, que eravista como uma simples extensão da Matemática. O professorde Mecânica era o próprio diretor da ETH – Albin Herzog – ea disciplina era cursada por aproximadamente estudantes.Em uma carta dirigida a Mileva – que havia se afastado da ETHapós o segundo semestre do curso para estudar como ouvintena Universidade de Heidelberg – Einstein manifesta claramente asua impressão sobre a disciplina de Mecânica. Segundo ele, Her-zog ensinava basicamente Dinâmica e Resistência dos Materiais.Para Einstein, a parte de Resistência dos Materiais era clara e boa,mas a parte fundamental da Dinâmica era um tanto superficial, oque ele, entretanto, considerava natural em um curso massificadocomo aquele.

As impressões iniciais de Einstein sobre os seus professoresnos primeiros semestres do curso foram muito positivas, masessa impressão mudaria radicalmente com o decorrer do tempo.Einstein refere-se, por exemplo, ainda no início do seu curso, àslições de Geologia do professor Zauber como sendo aulas magis-trais e às aulas de Cálculo Diferencial e Integral do professor CarlGeiser como sendo verdadeiras obras-prima da arte pedagógica.Seu encanto inicial era total e a sua maior satisfação veio a par-tir do terceiro semestre (o semestre de inverno de –) aocomeçar a assistir às aulas de Física do professor Heinrich Weber.

Apenas a partir do terceiro semestre, o estudante começavarealmente a estudar disciplinas específicas de Física. Só então,eram abordados assuntos como Termodinâmica, Eletricidade eMagnetismo, conduzidos por um dos catedráticos, o professorWeber. Weber era essencialmente um físico experimental, o que,entretanto, não se constituía em nenhuma exceção. Na verdade,a Física Teórica, enquanto uma matéria de estudo com indepen-dência própria, seria algo que só viria a ser construído nas duasprimeiras décadas do século XX. No século XIX, mesmo os teóri-

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cos mais célebres, como, por exemplo, Maxwell, Kelvin, Clausius,Hertz e Boltzmann conciliaram os seus trabalhos teóricos comatividades práticas. Weber, entretanto, era essencialmente umexperimental e o seu lado teórico era bem menos desenvolvido.Não é de se espantar, portanto, que o seu curso tivesse, assim,um tratamento bastante fenomenológico e que o conhecimentodos instrumentos e das práticas de laboratório fosse uma partefundamental do seu enfoque empirista. Os registros deixados porEinstein em seu caderno de anotações dão um testemunho vivodo conteúdo daquelas aulas. Tais registros encontram-se hojedisponíveis nos “Arquivos Einstein” na Universidade de Jerusaléme podem ser acessados “on line” por todos aqueles interessados noassunto.

De um modo geral, a impressão inicial deixada em Einsteinpelas aulas de Weber foi realmente da mais completa admiração.Segundo Einstein, Weber lecionava sobre Termodinâmica comtal maestria que ao final de cada aula ele sempre ficava espe-rando ansiosamente pela aula seguinte. Einstein, até então, to-mava cuidadosamente as suas próprias notas de aula e esperavamesmo compartilhá-las com Mileva após o seu esperado retornode Heidelberg. Que ele, até então, apreciava o seu curso e era, atémesmo, um aluno atento, pode ser depreendido de sua afirmaçãopara Mileva de que em seu retorno à ETH ela encontraria tudo oque pudesse necessitar registrado em suas notas de aula.

Ao longo de todo o curso, Einstein matriculou-se em pratica-mente todas as disciplinas oferecidas por Weber, apesar de queo seu interesse pelas suas aulas tenha vindo a tornar-se cada vezmenor. Na formação acadêmica de Einstein, em Física, a figurade Weber esteve sempre presente; algumas vezes de modo impor-tante, mas outras vezes de um modo apenas formal. É interes-sante que se observem as disciplinas específicas de Física cursadaspor Einstein ao longo de todo o seu curso, as notas obtidas e aabsoluta predominância de Weber, praticamente como seu únicoprofessor daquela matéria.

A tabela seguinte assinala todas as disciplinas de Física cursa-das por Einstein desde o terceiro semestre do seu curso (semestrede inverno de –) até o seu final (semestre de verão de

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). Observe-se que, como já assinalamos anteriormente, emnem todas as disciplinas existia uma avaliação com a atribuiçãode uma nota. Um detalhe importante é observar que a notamáxima era , e não , e a nota mínima era , e não zero.Deste modo, um , obtido na ETH equivaleria em nossa escaladecimal a uma nota ,. A nota mínima para a aprovação emqualquer disciplina era , o que equivaleria a um , em nossaescala tradicional. Entretanto, nos exames gerais, tanto no exameintermediário quanto no exame final, o estudante precisava atin-gir uma média global igual ou superior a , (, na nossa escalausual) para ser aprovado.

Foi justamente no terceiro semestre do curso, quando se co-meçava a estudar as disciplinas de Física Geral, que começarama surgir as primeiras insatisfações de Einstein e os seus primeirosconflitos com os professores. Isso se deu, de início, na parteintrodutória da Física experimental.

Aquela parte prática e introdutória da Física era conduzidapelo professor Johannes Pernet e as suas aulas eram tidas porEinstein como, no mínimo, maçantes e dispensáveis. Ele pas-sou, então, a faltar rotineiramente àquelas aulas e nas vezes quecomparecia ao laboratório para fazer as práticas, fazia-as de ummodo completamente independente, sem dar uma maior aten-ção às instruções do professor. Aquela sua atitude fez com que eleobtivesse ao final daquela disciplina a nota mais baixa possível deser atribuída aos estudantes: ,. Além disso, pela sua atitude deinconformismo ao lançar, certa vez, na lata de lixo, as instruçõesdadas pelo professor daquela disciplina, ele recebeu ainda umarepreensão formal no semestre de inverno de –. Aquelefato teve a sua origem, na verdade, na exigência costumeira dePernet de que os seus alunos fizessem todos os procedimentospráticos rigorosamente da maneira que ele lhes indicava. Eins-tein, porém, sempre conseguia obter os resultados experimentaisdesejados utilizando procedimentos alternativos que ele mesmoconsiderava mais fáceis e mais sensatos. Os resultados obtidospor ele não estavam errados, mas aquela sua atitude de inde-pendência irritava profundamente o professor Pernet. Pernetchegou a reclamar ao seu assistente daquela atitude de Einstein,

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Disciplinas de Física cursadas por Einstein na ETH

Disciplina Professor Semestre Nota

Física Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deInverno -

,

Física Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

,

Princípios,Aparatos eMétodos deMedida daEletrotecnologia

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deInverno -

Sem nota

OscilaçõesElétricas

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deInverno -

Sem nota

Laboratório deEletrotecnologia

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deInverno -

,

Introdução àFísica Prática

Prof. Dr.Johannes Pernet

Semestre deInverno -

Sem nota

Física Práticapara Iniciantes

Prof. Dr.Johannes Pernet

Semestre deInverno -

,

Princípios,Aparatos eMétodos deMedida daEletrotecnologia

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

Sem nota

Laboratório deEletrotecnologia

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

Sem nota

continua na próxima página ...

tendo, porém o referido assistente feito-lhe ver que, apesar da-quilo, Einstein sempre obtinha os resultados corretos. Aquilo,entretanto, não satisfazia a Pernet, que queria ser obedecido àrisca em todos os procedimentos experimentais. Einstein conhe-

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Disciplinas de Física cursadas por Einstein na ETH

Disciplina Professor Semestre Nota

TrabalhoCientífico noLaboratório deFísica

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

,

Introdução àEletromecânica

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

Sem nota

CorrentesAlternadas

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

Sem nota

Sistemas deCorrenteAlternadae Motoresde CorrenteAlternada

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deInverno -

Sem nota

Sistemas deMedidas ElétricasAbsolutas

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deInverno -

Sem nota

TrabalhoCientífico nosLaboratórios deFísica

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deInverno -

,

TrabalhoCientífico nosLaboratórios deFísica

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

,

Introduçãoà Teoria dasCorrentesAlternadas

Prof. Dr.Heinrich Weber

Semestre deVerão

Sem nota

cia bem aquela opinião intransigente de Pernet e embora não aconfrontasse diretamente, resistia obstinadamente em seguir as

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tais instruções, insistindo em manter a sua independência em ob-ter os resultados esperados por outros caminhos alternativos. As-sim, por estar convicto de que as instruções dadas pelo professorlhe seriam de muito pouca valia, ele, um certo dia, simplesmenteas descartou por completo, jogando-as na lata do lixo; mas, tevea infelicidade de ter aquela sua atitude flagrada por Pernet o quedesencadeou o conflito que resultou na sua repreensão formalpor parte do diretor da escola.

Além disso, talvez mesmo por nunca seguir aquelas maçantesinstruções do seu professor, Einstein teve, certa vez, o azar decausar uma explosão no laboratório ferindo seriamente a suamão direita. Aquele acontecimento acidental deve ter sido inter-pretado por Pernet como uma clara confirmação do seu juízo devalor sobre Einstein enquanto um estudante desatento e relapso.

Para Pernet, Einstein era, de fato, apenas um estudante re-lapso e por isso ele, um dia, confrontou-o com uma observaçãobastante rude perguntando-lhe por que em lugar de estudar umassunto difícil como a Física, ele não preferia estudar algo maisameno como Medicina, Direito ou Línguas. Einstein, segundocitam vários de seus biógrafos, reagiu então com um misto deamargura e ironia ao dizer:

“porque, senhor professor, eu tenho ainda menos talento paraesses assuntos. Por que eu não deveria, ao menos, tentar aminha sorte com a Física?”

Na segunda metade do curso, nos semestres finais que se se-guiram após os exames intermediários, Einstein resolveu defini-tivamente exercer a sua liberdade e buscar os seus próprios ca-minhos. As faltas às aulas tornaram-se, então, uma rotina na suavida acadêmica, o que só contribuiria para agravar ainda maiso seu relacionamento já um tanto precário com os professores.As notas de aula de seu colega Marcel Grossmann e o incentivoencontrado nos estudos em conjunto com Mileva foram, então,as suas tábuas de salvação. Tempos depois, quando do trágicofalecimento de Grossmann em , Einstein prestaria condolên-cias à viúva daquele seu amigo relembrando os seus tempos deestudantes na ETH:

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“Eu me lembro dos nossos dias de estudantes. Ele um estudanteexemplar, eu um indivíduo desordenado e sonhador. Ele, embons termos com os professores, eu um pária, descontente epouco estimado. Mas, nós éramos bons amigos e nossasconversas com café gelado no Metropole todas as semanas estãoentre as minhas mais felizes recordações. Então, ao final dosnossos estudos, eu fui subitamente abandonado por todos,sentindo-me perdido nos limiares da vida. Mas, ele ficou ao meulado e graças a ele e ao seu pai eu obtive o posto com Haller noEscritório de Patentes”

Se com o professor Pernet o relacionamento de Einstein mos-trou-se conflituoso desde o início, fazendo inclusive com que elenunca mais se matriculasse em nenhuma outra disciplina condu-zida pelo mesmo, com o professor Weber o seu relacionamentofoi inicialmente muito diferente. Weber reconhecera, desde cedo,o talento de Einstein, ainda quando da ocasião do seu primeiroteste para entrar na ETH. Einstein, por seu lado, como já assi-nalamos anteriormente, admirava a capacidade de Weber e o seubrilhantismo como expositor. Aquela admiração para com o seumestre, entretanto, foi paulatinamente mudando com o decorrerdo tempo em função da insistência de Weber em lecionar apenasos conteúdos clássicos da Física omitindo a Teoria Eletromagné-tica de Maxwell e todas as contribuições mais recentes que fossemposteriores aos trabalhos de Helmholtz. Essa impressão da ati-tude de Weber é confirmada por Louis Kollros, que foi colega deEinstein. De certo modo, porém, podemos dizer que a insatisfa-ção crescente de Einstein com as aulas de Weber decorria tambémda própria concepção do ensino de Física na ETH. A própriagrade curricular das disciplinas de Física cursadas por Einstein,exibida acima, já ilustra em parte a origem dessas insatisfações.

O ensino e a pesquisa em Física na ETH eram desenvolvidosno Instituto de Física, uma parte da seção VI-A (Física, Matemá-tica e Astronomia). O Instituto havia sido construído em edispunha de laboratórios muitos bem equipados, contando como que havia de mais moderno naquela época. No tempo em queEinstein ali estudou, uma área de pesquisas prioritária no Insti-tuto era a Eletrotecnologia, o que mostra como a ETH era uma

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instituição voltada prioritariamente para as aplicações práticasda Física na Engenharia. Havia duas cátedras de Física no Insti-tuto, a de Física Matemática e Técnica que pertencia a HeinrichWeber e a de Física Experimental que era ocupada por JohannesPernet. Esses dois professores tinham ainda vários assistentes queos auxiliavam na condução das suas várias atividades docentes.

O conjunto de disciplinas de Física cursado por Einstein foimuito diferente dos currículos de Física atuais, não apenas, evi-dentemente, pela não existência ainda de conteúdos mais mo-dernos, mas também pela excessiva concentração de disciplinasmais técnicas, características de um curso de Engenharia Elé-trica. Poder-se-ia até dizer que a formação em Física que Einsteinrecebeu na ETH foi realmente a de um engenheiro eletricista.Se ele não houvesse estudado por conta própria a Física da suaépoca como um todo, a sua formação global em Física teria sidomuito deficiente em comparação com a que ele poderia ter ob-tido em outros cursos de Física em universidades européias maistradicionais.

Apenas a título de comparação, vale observar que a sua co-lega Mileva Maric, no semestre em que se ausentou de Zuriquepara estudar na Universidade de Heidelberg (terceiro semestredo curso, no inverno de -), teve contato com as mais re-centes pesquisas em Física da época nas aulas de Philipp Lenard.Isso pode ser constatado, por exemplo, pela leitura de uma cartaenviada por ela para Einstein quando ela ainda estava estudandoem Heidelberg. Em um certo trecho da carta, ela afirma, porexemplo, que:

“foi realmente muito agradável a aula de ontem do professorLenard; agora ele está falando sobre a teoria cinética dos gases.Parece que as moléculas de oxigênio viajam a uma velocidade demais de metros por segundo. Após calcular e calcular, o bomprofessor estabeleceu equações, diferenciou, integrou, substituiue finalmente mostrou que as moléculas em questão realmente semovem a uma tal velocidade, mas que elas viajam apenas adistância de / da grossura de um fio de cabelo”

Em contraste com um ensino mais avançado como os de Hei-

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delberg, Munique ou Berlim, onde as pesquisas mais recentes emFísica eram discutidas com os estudantes, o professor Weber, naETH, mal fazia referência à Teoria Eletromagnética de Maxwell.Aquilo causava um sério desagrado para Einstein que passou,então, a faltar às aulas regularmente para estudar em casa ouno laboratório, por conta própria, os clássicos da Física e parainteirar-se também dos seus avanços mais recentes. Aquela suaatitude de independência foi interpretada por Weber, um ho-mem orgulhoso de sua posição hierárquica – diretor do Institutode Física da ETH –, como um claro sinal de desatenção à suaautoridade acadêmica. Para complicar ainda mais este quadro,Einstein insistia em tratar Weber apenas como “Herr Weber” (se-nhor Weber), nunca se dirigindo a ele de um modo mais formale respeitoso, como “professor Weber”.

O passo seguinte neste relacionamento crescentemente difícilentre Einstein e Weber foi o inevitável surgimento de discus-sões entre os mesmos, cada vez mais freqüentes. Essas discus-sões eram geradas, por um lado, pela intransigência orgulhosa deWeber em manter a sua autoridade e, por outro lado, pela firmeindependência da parte de Einstein, independência esta, vista porWeber como uma simples insolência de um aluno talentoso, masexcessivamente rebelde para o seu gosto.

Weber chegou a dizer a Einstein, certa vez, que ele era umsujeito muito esperto, mas que nunca deixava que alguém lheensinasse alguma coisa. Essa, entretanto, parece uma crítica umtanto injusta. A questão, na verdade, não era que Einstein nãoquisesse aprender nada com os outros; mas, sim, que ele nãoqueria aprender aquilo que eles queriam lhe ensinar.

Analisando-se com a devida perspectiva histórica aquela situ-ação e tendo em vista os ortodoxos padrões de comportamento ede hierarquia vigentes naquela época na ETH, não é difícil de secompreender o constrangimento do orgulhoso professor Weber.Entretanto, a imagem de Einstein como um indivíduo insolente,da forma que passou a ser visto por muitos de seus professores,não corresponde exatamente à realidade da sua personalidade.Ele poderia ser mais bem descrito como alguém para quem aliberdade de escolha e de ação era um valor absolutamente es-

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sencial e que, além disso, facilmente entrava em conflito comqualquer tipo de constrangimento a que fosse submetido. Seriamais justo, portanto, ver Einstein simplesmente como um espí-rito livre e indômito, sempre disposto a pagar o alto preço da sualiberdade.

Apesar de que Einstein não estava ausente de culpa nos con-flitos com os seus professores, é preciso admitir que muitos deleseram, de fato, arrogantes e autocráticos. Einstein considerava al-guns deles simplesmente como irracionais ou mesmo como gros-seiros e não se importava que eles percebessem aquela sua im-pressão. Fiedler, por exemplo, seu professor de Geometria Des-critiva, segundo Einstein relata em carta endereçada a Mileva,era uma pessoa extremamente indelicada, chegando mesmo a sergrosseiro e que apesar de brilhante era infelizmente terrivelmentepedante.

Os atritos de Einstein com outros professores podem, na ver-dade, ser creditados tanto a certas características das personali-dades intransigentes de alguns dos seus mestres quanto ao pró-prio gênio rebelde e indômito de Einstein, sempre disposto aaceitar abertamente novos desafios em nome da sua liberdadede pensamento e de ação. A sua mudança de avaliação quantoao professor Weber é, assim, um assunto complexo que mereceuma análise mais acurada e cuja origem pode ser encontrada nãoapenas nas questões curriculares, mas também no entrechoquede duas personalidades fortes, a personalidade de Weber mar-cada pela apreciação da sua própria autoridade e a de Einsteincentrada na sua liberdade de pensamento e de ação.

Apesar das queixas de Einstein em relação aos conteúdos deFísica lecionados por Weber e da sua conseqüente decisão de au-sentar-se voluntariamente de boa parte das suas aulas, não sedeve inferir deste fato que a influência de Weber sobre a carreiraacadêmica de Einstein tenha sido de menor importância, comoequivocadamente costumam assumir muitos dos seus biógrafos.

Para que se compreenda melhor esta questão, seria interes-sante colocar em perspectiva, um pouco mais detalhadamente,o próprio trabalho acadêmico de Weber. Só assim, a sua impor-tância para a obra de Einstein pode ser devidamente apreciada.

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Einstein versus Weber

N XIX, Weber não foi certa-

mente um homem dos mais preocupados com os maisrecentes temas da Física de seu tempo. Mesmo assim,

uma parte respeitável dos resultados do seu trabalho experimen-tal desenvolvido até então exerceu uma influência considerávelsobre Einstein, influência esta que costuma, entretanto, ser fre-qüentemente subestimada por vários dos seus biógrafos e histo-riadores da ciência.

De fato, do mesmo modo que os trabalhos experimentais dePhilipp Lenard foram importantes para Einstein por colocaremà sua disposição uma série de resultados que seriam por ele con-venientemente interpretados no seu trabalho de de março de (aquele que lhe renderia, tempos depois, em , o prê-mio Nobel), assim também o trabalho experimental de Weberfoi igualmente relevante para Einstein naquele mesmo trabalho.

Naquele seu célebre trabalho de de março de – inti-tulado, “A Respeito de um Ponto de Vista Heurístico Relacionadocom a Emissão e Transformação da Luz” – Einstein introduziu ahipótese dos ‘quanta’ de luz para conseguir explicar quatro gran-des mistérios da Física clássica. Esses quatro mistérios eram, asaber: a origem da luminescência, o efeito fotoelétrico, a variaçãoanômala dos calores específicos com a temperatura e a radiaçãode corpo negro. Para dar conta daqueles quatro fenômenos, com

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a sua hipótese revolucionária dos quanta de luz, Einstein teve dese debruçar sobre os dados experimentais clássicos disponíveisàquela época sobre aqueles assuntos. Os trabalhos de Lenardforam, por exemplo, a sua principal fonte de dados experimentaisa serem explicados sobre o efeito fotoelétrico com a introduçãoda sua revolucionária hipótese.

Mas, onde entra Weber em tudo isso?Heinrich Weber havia sido exatamente o primeiro cientista a

descobrir experimentalmente que as variações dos calores espe-cíficos com a temperatura para os elementos boro, carbono esilício, desobedeciam à lei de Dulong-Petit. Ele havia realizadotais experimentos quando ainda trabalhava como assistente deHelmholtz, nos laboratórios de Física da Universidade de Berlim.

Weber havia começado a sua carreira acadêmica obtendo o seuPhD em como físico experimental trabalhando em certasaplicações tecnológicas da Óptica na Universidade de Jena, soba orientação de Ernst Abbe. Ele guardaria para sempre aquelaatitude experimental do seu primeiro mestre, assim como aquelatendência de trabalhar nas aplicações da Física à Tecnologia. ComHelmholtz, já na primeira metade da década de ,Weber man-teria a mesma linha experimental, ampliando então os seus ho-rizontes para os problemas das aplicações térmicas e da nascentetecnologia da indústria elétrica. O seu primeiro trabalho sobre avariação anômala dos calores específicos com a temperatura seriadaquela época, de . O segundo trabalho realizado por elesobre aquele mesmo assunto seria de , quando já começara atrabalhar como professor catedrático na ETH de Zurique.

Os estranhos resultados encontrados por Weber sobre as varia-ções anômalas dos calores específicos com a temperatura perma-neceriam por muito tempo como um dos grandes mistérios daFísica clássica e apenas em um tal mistério viria finalmentea ser resolvido, justamente por Albert Einstein. Einstein, inclu-sive, menciona naquele seu famoso trabalho de março de osdados experimentais coletados por Weber nos anos de e .

A partir de , já como professor catedrático de Física Ma-temática e Técnica na ETH, Weber contribuiria decisivamenteno desenvolvimento do instituto de Física daquela instituição e

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na construção dos seus formidáveis laboratórios de Física Apli-cada. Exatamente naqueles laboratórios, em , ele viria a pro-duzir o mais importante trabalho experimental de sua vida: adeterminação semi-empírica de uma lei para a radiância de umcorpo negro.

Aquele seu trabalho sobre a radiação de um corpo negro seguiauma linha de pesquisa inaugurada anos antes por Kirchhoff eestava rigorosamente dentro do programa de pesquisas traçadopor Helmholtz como uma das prioridades para o Instituto Físico-Técnico de Berlim (PTR), criado no ano anterior de . Otrabalho feito por Weber na ETH corrigia uma fórmula anteriorpara aquele mesmo problema obtida por Albert Michelson emBerlim, sob a orientação de Helmholtz. Embora a fórmula deWeber para o corpo negro não fosse, certamente, algo defini-tivo, ela veio a servir de base para a obtenção da famosa lei dodeslocamento de Wien, que por sua vez serviu de suporte paraos trabalhos de Planck em . Deste modo, as pesquisas ex-perimentais realizadas por Weber serviram de uma base dupla(calores específicos e radiação de corpo negro) para o trabalhode Einstein de março de e para um outro de .

É um fato historicamente documentado que Weber apresentouo problema da radiação de corpo negro para os seus estudan-tes da ETH no curso conduzido por ele no verão de sobre“Princípios, Aparatos e Métodos de Medidas em Eletrotecnolo-gia”. Einstein era um dos alunos inscritos naquela turma. Apreocupação pedagógica de Weber não era certamente a de ex-plorar as fronteiras mais recentes da Física; mas, sim, primor-dialmente, a de introduzir os seus estudantes nos tópicos maisavançados a respeito dos problemas relacionados com a ilumi-nação elétrica. Esse era o seu verdadeiro motivo para estudar aradiação de corpo negro, o mesmo motivo que guiava tambémas pesquisas aplicadas realizadas no Instituto Físico-Técnico deBerlim, acrescido naquela instituição alemã das possíveis aplica-ções daquele mesmo problema também no campo da siderurgia.Essa preocupação com os problemas da radiação de um corponegro mostra, certamente, uma forte sintonia entre as intençõesde pesquisa de Weber e parte daquelas que tempos depois viriam

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a construir a extraordinária reputação científica de Einstein e quelhe valeriam um prêmio Nobel.

Não se pode garantir, entretanto, que Einstein tenha sido apre-sentado pela primeira vez àquele problema da radiação de umcorpo negro nas aulas de Weber e nem mesmo que ele tenhaassistido a tais aulas.

Na verdade, um pouco antes, ainda em de março de ,em uma carta endereçada a Mileva, Einstein já se referia ao fatode que as suas preocupações com a questão da radiação estavamcomeçando a tomar corpo e que ele se sentia curioso em desco-brir se alguma coisa de grande valor não poderia sair dali. Ele,entretanto, não deixa claro naquela carta qual seria exatamente ocerne da sua atenção no estudo da radiação eletromagnética.

Um pouco depois, já em agosto daquele mesmo ano, portantoainda antes do mencionado curso de Weber na ETH, Einstein es-creveria novamente para Mileva dando conta de que estava lendoa obra de Helmholtz pela primeira vez. Ele, no entanto, pareciaestar mais preocupado àquela época com a questão do éter e dapropagação da radiação eletromagnética. Não há qualquer refe-rência sua, então, ao problema da radiação de um corpo negro.

Em suas cartas a Mileva, nas quais ele sempre relatava os as-suntos que estava estudando, também as referências à lei de Du-long-Petit aparecem apenas em março de . No mês seguinte,em abril de , Einstein escreveu novamente para Mileva refe-rindo-se, pela primeira vez, às suas reservas quanto ao estudo dePlanck sobre a radiação e à ligação do problema da natureza daradiação com a questão do calor latente.

É muito difícil traçar com precisão a origem exata das preo-cupações de Einstein com o problema da natureza da radiação eda sua interação com a matéria, problema este que o conduziriaao trabalho revolucionário da quantização geral da energia emmarço de . Fato é, entretanto, que Einstein já no seu trabalhode , sobre uma análise geral da Teoria Molecular do Calormencionava já, explicitamente, a lei do deslocamento de Wien, aqual por sua vez havia sido derivada, como já dissemos antes, dalei semi-empírica para a radiação de um corpo negro propostapor Weber em .

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Se as únicas influências exercidas por Weber sobre a obra deEinstein estivessem restritas apenas a essas duas questões, o seulugar na história da Ciência já estaria suficientemente garantido.Mas, a influência de Weber sobre Einstein não se restringe apenasa essas duas importantes questões. De certo modo, Weber podeser considerado também como uma ponte entre o magistral pro-grama de pesquisa do seu grande mestre Hermann Helmholtze o pensamento revolucionário de Albert Einstein. A reverên-cia de Weber pelo trabalho de Helmholtz e o seu apreço peloseu programa de pesquisa parecem ter sido, de fato, amplamentecompartilhados por Einstein, certamente até de um modo aindabem mais intenso.

No coração da filosofia de Helmholtz estavam o conceito decausalidade e os princípios organizadores neokantianos da Na-tureza, com uma ênfase especial por ele atribuída à questão dasmedidas na Ciência. A busca de Helmholtz pelo estabelecimentode novos fundamentos para a Física e a sua idéia de que um talestabelecimento seria possível com base no desenvolvimento daschamadas ‘teorias de princípios’ seria algo que Einstein assumi-ria de um modo muito mais forte que o próprio Weber. Nestesentido, o germe das chamadas ‘teorias de princípios’ far-se-ianotar com o máximo brilhantismo no advento da Teoria da Re-latividade. A esse respeito da sua reverência pelo pensamento deHelmholtz, Einstein afirmaria, de forma inequívoca, em marçode , em uma carta dirigida a Mileva, que:

“mais e mais eu me admiro com o pensamento livre e original deHelmholtz.”

Uma outra influência ainda exercida por Weber sobre Einsteinfoi a do seu apreço pelas aplicações tecnológicas, apreço este queEinstein compartilharia e conservaria por toda a sua vida. Em-bora tenha sido Einstein sempre um físico teórico por excelência,as aplicações tecnológicas foram algo sempre de grande impor-tância para ele.

Desde as primeiras influências recebidas neste sentido, aindana infância, na indústria de materiais elétricos da sua família,

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passando pela formação tecnológica que veio a receber de Weberna ETH, Einstein sempre cultivou um certo apreço pelas aplica-ções práticas da Física. A sua ocupação posterior no Escritóriode Patentes em Berna apenas acentuaria essa sua tradicional ati-tude de valorização das aplicações tecnológicas da Ciência. Já naidade madura Einstein inventaria vários artefatos tecnológicos echegaria, inclusive, a obter diversas patentes para os mesmos.

Weber foi assim bem mais importante na formação de Einsteindo que tradicionalmente se costuma acreditar. Ele exerceu sobreEinstein influências científicas diretas, influências filosóficas in-diretas e ajudou, ainda, a incentivar o seu apreço pela tecnologia.

Além de todas essas influências conjuntas, Weber serviu tam-bém de modelo para Einstein ao menos em alguns aspectos doseu modo de ensinar e de encarar a Física.

As habilidades de ensino de Weber, assim como as suas atitu-des em geral com relação à produção do conhecimento na Físicacertamente influenciaram Einstein, tanto positivamente quantonegativamente. Weber era um professor excelente e isso era ad-mitido até mesmo pelos seus maiores inimigos, como o seu co-lega de ETH o professor Johannes Pernet. Pernet, de fato, es-creveu certa vez a Helmholtz, em , em uma ocasião em queWeber esteve doente e afastado de suas atividades de ensino portodo um semestre, afirmando que os alunos lamentavam profun-damente o fato de terem de perder as suas aulas magistrais.

Segundo Pierre Weiss, que foi o sucessor de Pernet na ETH,quando do seu falecimento em , Weber era um professor queinspirava realmente os seus alunos. Pelo menos deles fizeramo PhD sob a sua segura orientação e um deles, Charles EdouardGuillaume, chegou mesmo a ser laureado com o prêmio Nobel deFísica em , um ano antes de Einstein receber aquela mesmacomenda.

Weber costumava ensinar através de exemplos, apresentandode modo simples as leis elementares da Física e os seus resultadosexperimentais concretos vistos como aplicações das mesmas. Istopode ser evidenciado claramente nas próprias anotações das suasaulas tomadas em por Einstein.

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Weiss observa ainda que as aulas de Weber eram simultane-amente elegantes e precisas e nota também que todos aquelesque tinham a oportunidade de assisti-las guardavam das mesmasuma impressão inesquecível. Para os alunos de Weber, a Físicaaparecia como uma autêntica revelação.

Diferentemente de Helmholtz, Weber não parecia estar inte-ressado nos pontos de vistas mais gerais, mas ele fazia, mesmoassim, com que a Física ganhasse vida para os seus alunos nasquestões particulares que abordava. Em suas aulas a Física ja-mais aparecia como algo morto. Como Weiss assinala, ela eratrazida à vida pela didática magistral do professor Weber. Weber,certamente, deu vida às suas aulas de Física no tempo em que eleensinou a Einstein na ETH.

Em fevereiro de , Einstein escreveu a Mileva dando conta,efetivamente, da sua admiração pelo excelente professor de Físicaque Weber então lhe parecia ser. Mesmo cinqüenta anos maistarde, já perto de sua morte, Einstein escreveu a um correspon-dente reafirmando que ele

“valorizava Weber como um professor muito talentoso, comoalguém que apresentava a essência das coisas e queeconomicamente limitava a diversidade.”

Como veremos mais adiante, neste livro, Einstein quando pro-fessor procuraria também dar vida às suas aulas de Física e fre-qüentemente utilizaria também, com tal finalidade, o recurso dasaplicações e dos exemplos dos mais variados. Neste campo pe-dagógico, Einstein viria a ser, porém, bem mais ousado e liberalque o seu antigo mestre na ETH. Como veremos, tanto no campocientífico quanto no campo pedagógico, Einstein foi muito alémdas influências recebidas.

Na segunda metade do seu curso na ETH, embora Einstein es-tivesse constantemente entediado com a necessidade de ter de as-sistir às suas aulas e sempre disposto a faltá-las, ele, apesar disso,adorava trabalhar nos excelentes laboratórios de Física da ETHque Weber sempre colocava à sua disposição, pois como profes-sor ele valorizava extremamente o papel das medidas na Física.Já na maturidade, Einstein escreveu certa vez que:

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“eu trabalhava nos laboratórios de Weber com fervor e paixão.”

Por outro lado, a atitude inicial de Einstein, até , com re-lação à importância da Matemática na Física, pode ser vista tam-bém como um reflexo da influência de Weber sobre ele. Nestecaso, infelizmente, uma influência bastante negativa, pois We-ber jamais se destacou exatamente pelos seus dotes matemáticos.Com efeito, como Einstein escreveria posteriormente:

“não estava claro para mim enquanto ainda estudante que umaabordagem mais profunda do conhecimento dos princípiosbásicos da Física está intimamente ligada com os maisintrincados métodos matemáticos. Isso só me ocorreu após anosde trabalho científico independente.”

Para corroborar esta visão de que a abordagem matemáticade Weber para a Física era algo que de certo modo deixava bas-tante a desejar é ilustrativo mencionar que Einstein, certa vez,após assistir, a uma aula de Minkowski sobre o fenômeno dacapilaridade, no último semestre de seu curso na ETH, disse aoseu colega Louis Kollros que aquela havia sido a primeira aulaverdadeira de Física-Matemática que ele havia assistido na ETH.Aquela observação encerrava, certamente, uma crítica ainda quevelada à tradicional abordagem quase exclusivamente fenomeno-lógica de Weber.

O sentido aqui empregado para a expressão ‘abordagem fe-nomenológica’ refere-se apenas ao fato de que Weber dava umaatenção especial à análise dos fenômenos estudados, sem preocu-par-se em demasia com uma descrição matemática mais porme-norizada dos mesmos. Do ponto de vista epistemológico, Webertinha convicções positivistas atribuindo, assim, um papel essen-cial ao papel das observações e das medidas rigorosas, sem qual-quer preocupação com a mediação das teorias já presentes emtais observações. Deste modo, a caracterização de sua aborda-gem como ‘fenomenológica’ diz respeito apenas a este aspectodo pouco compromisso com a descrição matemática dos fenô-menos estudados e não tem, portanto, nenhuma relação coma expressão ‘fenomenológica’, bem mais complexa, contida nas

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análises filosóficas de pensadores como Edmund Husserl e Mar-tin Heidegger.

De todo modo, aquela aula teórica de Minkowski sobre capi-laridade deve ter causado, realmente, uma forte impressão sobreEinstein, pois o seu primeiro trabalho científico, publicado naAnnalen der Physik em março de , versava exatamente so-bre aquele tema. Apesar daquela sua admiração episódica daabordagem matemática mais precisa contida nas aulas de Min-kowski, Einstein não chegou a atribuir à mesma, quando aindaestudante, o seu devido valor. Talvez influenciado pela aborda-gem bem mais fenomenológica de Weber, Einstein consideravainicialmente como um simples exagero o emprego de tanta Mate-mática no estudo da Física. Uma evidência daquela sua atitude deentão foram as suas constantes faltas às aulas de Minkowski, quecostumava por isso mesmo referir-se a Einstein, com um certodesdém, como um “cachorro preguiçoso”. Tempos depois, após, quando já envolvido com os terríveis problemas matemáti-cos trazidos pelo desenvolvimento da sua Teoria da RelatividadeGeral, Einstein se arrependeria amargamente de não haver sa-bido valorizar devidamente, quando ainda estudante na ETH, overdadeiro papel da Matemática na criação e no desenvolvimentoda Física.

Uma vez registradas todas essas influências, diretas e indiretas,positivas e negativas, de Weber sobre Einstein, cabe perguntar-se,então, a partir de que momento o relacionamento entre os doisatingiu o seu ponto de ruptura e em que circunstâncias isso sedeu. Há várias evidências de que este tal ponto de ruptura norelacionamento entre eles não se deu antes que Einstein viesse aconcluir o seu curso de graduação, em julho de .

É preciso notar, por exemplo, que apesar das constantes faltasde Einstein às aulas de Weber, ele sempre tirara excelentes notasem Física até o final do curso. Isto deve ter dado a Einsteina falsa sensação de que as coisas entre ele e o professor Webercorriam bem, apesar dos atritos constantes. Einstein costumavafreqüentar regularmente e com visível prazer os excelentes labo-ratórios de Weber, empenhando-se de modo independente nosseus estudos.

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Se aquela atitude de independência de Einstein podia parecercertamente para Weber como algo próximo de uma insolência,ele não deve, entretanto, ter deixado transparecer de forma claraaquela sua opinião para Einstein. Os atritos entre Weber e Eins-tein devem ter mantido-se, até a conclusão do curso, dentro delimites que confundiram a percepção de Einstein sobre o exatojuízo de valor que o seu mestre fazia a seu respeito.

O que, decerto, pode-se inferir do estudo das documentaçõesatualmente disponíveis sobre a vida de Einstein é que um in-divíduo orgulhoso como Weber deve ter exercido a sua poucatolerância até o limite do possível no seu tenso relacionamentocom Einstein até a conclusão do curso pelo mesmo. Weber, cer-tamente, não desejava prolongar nem mais um pouco aquele tipode convívio que ele considerava como, no mínimo, inconvenientee desrespeitoso da parte daquele estudante rebelde. Deste modo,muito naturalmente, Weber não convidou Einstein para ser seuassistente logo após a conclusão do curso. Não porque faltasse aEinstein o necessário talento, mas porque o relacionamento entreos dois era, também para Weber, algo extremamente desgastante.A recusa de Weber em convidar Einstein para trabalhar como seuassistente deveria ter sido assim entendida por este como umaclara sinalização de que aquele relacionamento profissional nãopoderia mesmo ter mais nenhum futuro promissor.

O próprio desempenho de Einstein no seu exame final de cur-so, muito aquém de sua capacidade, também deve ter contri-buído para reforçar em Weber aquela sua impressão de Einsteincomo um estudante que apesar de talentoso era, porém, displi-cente e rebelde.

O exame final, ao término do curso, incluía tanto uma avalia-ção oral quanto a apresentação da dissertação orientada (Diplo-marbeit). Dos onze alunos que se matricularam no primeiro anoem , incluindo Einstein, apenas nove chegaram ao quartoano do curso. Desses nove, apenas cinco prestaram os examesfinais em julho de e dentre esses cinco estudantes, apenasquatro deles foram aprovados. Einstein foi um daqueles apro-vados, mas justamente aquele que obteve a menor média geral,conforme mostram as tabelas seguintes.

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Notas de Einstein em seu exame final naETH em julho de

Matéria Nota Peso Pontos obtidos

Física Experimental , ,Física Teórica , ,

Astronomia , ,

Teoria das Funções , ,Tese de Graduação , ,

Total de Pontos Obtidos ,

Classificação dos alunos no exame final daETH em julho de

Estudante Pontos obtidos

º Louis Kollros ,

º Marcel Grossmann ,º Jakob Ehrat ,

º Albert Einstein ,º Mileva Maric (reprovada) ,

Em , Einstein contou a Schilpp que para fazer o examefinal na ETH, em seu tempo de estudante, “era preciso que se en-chesse a mente com todos aqueles assuntos exigidos para os exames,quer se gostasse ou não”. Com um certo exagero, ele completouainda que:

“aquele tipo de coerção teve um tal efeito impeditivo sobre mimque após passar nos exames finais eu me vi em uma situação naqual a simples consideração de qualquer problema científico meparecia como algo completamente desagradável por um anointeiro.”

Embora a primeira parte de sua afirmação a Schilpp seja real-mente bastante sincera, a segunda parte é um evidente exageroda parte de Einstein, pois ele não apenas iniciou os seus estudos

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de PhD com Weber já no inverno de -, como chegou atémesmo a ter o seu primeiro artigo aceito, sobre capilaridade, paraa Anallen der Physik, em dezembro de , artigo este que seriapublicado em março do ano seguinte.

Um fato, entretanto, parece inconteste: se no exame interme-diário Einstein havia sido o melhor da sua turma, ele, depoisdisso, relaxara os seus estudos formais a tal modo que no examefinal viera a ser aprovado apenas como o último colocado de suaturma. Einstein, realmente, havia preferido seguir livremente osseus próprios caminhos naqueles dois últimos anos do curso naETH. Apesar de Weber reconhecer que não faltava talento a Eins-tein, ele não admirava nem um pouco a sua falta de disciplina eaquela sua independência rebelde nos estudos.

Einstein concluiu o seu curso na ETH em julho de tendorecebido um Diploma que o habilitava a ensinar Matemática eFísica na escola secundária. Para lecionar em uma Universidade,era preciso, costumeiramente, começar como assistente de algumprofessor e fazer o PhD para poder concorrer então a um postode privatdozent, uma espécie de professor particular sem um con-trato de trabalho com a Universidade. Algumas universidadespermitiam que ocasionalmente candidatos com muito talento ecom comprovada e relevante contribuição científica pudessemconcorrer a um posto de privatdozent mesmo sem terem aindaum PhD, mas isso era uma exceção e não uma regra. Deste modo,a obtenção de um cargo de assistente parecia ser realmente omelhor caminho para iniciar uma carreira acadêmica, ao mesmotempo em que se cursava um doutorado com o objetivo de alcan-çar um dia um posto permanente de professor universitário.

Mileva Maric, a única aluna da turma e que viria a ser a pri-meira esposa de Einstein a partir de janeiro de , foi reprovadaem Teoria das Funções, embora ela tivesse se saído muito bem emFísica e nas demais disciplinas. Dos cinco estudantes que presta-ram os exames finais, apenas Einstein e Mileva concentraram osseus estudos em Física, os três outros, Marcel Grossmann, LouisKollros e Jakob Ehrat, optaram pela Matemática.

Daqueles quatro estudantes que concluíram o curso de Mate-mática e Física em , três deles obtiveram, de imediato, indi-

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cações para trabalharem como assistentes na ETH. Louis Kollrosfoi ser assistente do professor Hurwitz, Marcel Grossmann foi serassistente do professor Fiedler e Jakob Ehrat do professor Rudio.Apenas Einstein foi preterido naquela escolha.

Weber tinha, naquela época, duas vagas disponíveis para a con-tratação de seus auxiliares, mas preferiu indicar dois engenheirosmecânicos, Gustav Grossmann e Karl Schild, como seus assisten-tes no laboratório de Física preterindo, assim, o jovem físico Al-bert Einstein. Aquele gesto de Weber, como o de uma autoridadeferida em seus próprios brios parece haver colhido Einstein desurpresa. Einstein esperara ansiosamente por um convite paraser assistente de Weber, mas parece jamais haver entendido bema psicologia envolvida naquele ato de escolha. O seu compor-tamento livre e independente, mais uma vez, cobrava-lhe umalto preço.

Se com Weber a possibilidade de Einstein obter um cargo deassistente mostrara-se praticamente impossível, as suas tentati-vas, nos meses seguintes, de obter um posto semelhante com ou-tros professores da ETH também não vieram a se mostrar igual-mente viáveis. Aquela dificuldade pode ser tida, em parte, comodevida à própria oposição de Weber; mas, de outra parte, podeser também atribuída ao fato de que Einstein tentava naquelemomento ser assistente de professores a cujas aulas ele havia an-tes faltado freqüentemente e de forma totalmente voluntária.

Antes, porém, de adentrarmos nos detalhes das suas muitastentativas de obter um posto alternativo de assistente cabe anali-sarmos melhor as razões de ter sido ele preterido por Weber e de,ainda assim, ter iniciado os seus estudos de PhD sob a orientaçãodo mesmo.

Para se compreender as razões de Einstein ter sido preteridopor Weber como seu assistente, basta que se atente para o tensorelacionamento já descrito entre os dois. A recusa de Weber emescolher Einstein para ser seu assistente havia sido, como disse-mos anteriormente, uma clara indicação de sua parte de que eledesejava pôr um fim àquele convívio conflituoso. Deste modo, ainsistência de Einstein em prolongar aquele relacionamento pro-fissional veio a ter causas simplesmente desastrosas.

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Que o relacionamento entre Einstein e Weber, entretanto, sóveio realmente a se acirrar após a conclusão do curso pode seraquilatado pelo próprio fato de que Einstein mesmo já tendosido rejeitado por Weber para ser seu assistente, ainda o procu-rou para que o mesmo viesse a ser o orientador da sua pesquisavisando a obtenção de um PhD na Universidade de Zurique.

A título de esclarecimento, cabe assinalar aqui que a ETH à-quela época ainda não oferecia o título de PhD, mas havia umacordo para que alguns dos seus professores orientassem estu-dantes visando a obtenção de um doutorado na vizinha Univer-sidade de Zurique.

O fato de Einstein ainda haver procurado Weber para orientara sua pesquisa de PhD no inverno de - evidencia nãoapenas que o relacionamento entre eles não havia atingido aindao seu já aludido ponto de ruptura; essa procura evidencia tam-bém, que Einstein, apesar de nunca haver apreciado a pouca mo-dernidade dos cursos conduzidos por Weber e mesmo já tendosido rejeitado por ele como seu assistente, ainda o consideravacomo alguém capaz de ser de alguma utilidade no seu trabalhode pesquisa. A partir de que momento, exatamente, o relacio-namento entre eles atingiu o seu ponto de ruptura é algo queanalisaremos a seguir.

Por todo o inverno de -, Einstein ainda insistiu emfazer o PhD sob a orientação de Weber, ao mesmo tempo emque continuava a procurar por um cargo de assistente com ou-tros professores em várias universidades da Europa. No fundo,Einstein percebia também, de um modo bastante prático, queele precisava de uma recomendação do seu principal professorpara obter algum cargo de assistente e por isso não se afastou deimediato do mestre que havia desprezado os seus serviços.

Nesse meio tempo, um novo ponto de discórdia entre os nos-sos dois personagens surgiu na escolha do tema de pesquisa doPhD de Einstein. Einstein, já havia feito a sua “Diplomarbeit”(dissertação de graduação) sob a orientação de Weber sobre umtema do agrado do seu mestre, um estudo experimental de umtópico relacionado à condução do calor. Era uma tradição ger-mânica, seguida por Weber, que os professores escolhessem os te-

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mas de pesquisa dos seus estudantes, embora isso pudesse ser cui-dadosamente negociado, desde que fosse algo que se enquadrassedentro da tradição de pesquisa do mestre. Após haver seguidofielmente a orientação de Weber no seu trabalho de graduação,Einstein, agora já graduado, resolveu inovar e escolher ele mesmoo novo tema da pesquisa. Embora aquele procedimento de esco-lha não fosse, certamente, do agrado de Weber, Einstein escolheuinicialmente um tema que interessava muito ao mesmo: o datermoeletricidade. Quase de imediato, porém, Einstein decidiupor conta própria, mudar o seu tema de pesquisa para as ‘forçasmoleculares’, algo que estava longe de interessar ao velho Weber.

É difícil determinar com exatidão se esse episódio, foi de fato,a causa do rompimento definitivo de um relacionamento já de hámuito bastante tenso ou se foi, na verdade, mais um efeito destemesmo relacionamento. Certo é que aquele novo episódio deindependência estudantil deve ter desagradado profundamenteo velho e orgulhoso mestre, já farto das ‘diabruras’ daquele seudiscípulo rebelde.

Talvez, a partir desse episódio, possa ter iniciado-se a supostaperseguição movida por Weber, na visão de Einstein, contra a suapessoa e contra as suas tentativas de obter um cargo de assistente.Não se pode, entretanto, garantir que tal perseguição tenha, defato, existido, ao menos na dimensão imaginada por Einstein.

Weber, certamente, não deve ter se mostrado nem um poucopropenso a ter Einstein mais tempo em sua companhia; mas, porque haveria de persegui-lo, ainda na condição de seu orienta-dor? Não teria sido mais simples e prático recusar definitiva-mente aquela orientação livrando-se da sua companhia impor-tuna de uma vez?

Admitir que Weber tenha, de fato, continuado a ser orientadorde Einstein, ainda no inverno de –, ao mesmo tempoem que prestava as piores referências possíveis sobre o mesmo, aquem quer que o consultasse, implica em assumir a respeito deWeber uma imagem seguramente torpe e maquiavélica.

Apesar do seu gênio forte, do seu zelo talvez excessivo pela suaprópria autoridade acadêmica e até mesmo do seu orgulho feri-

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do, nada disso assegura suficientemente que tenha ele agido real-mente de maneira tão vil quanto aquela imaginada por Einstein.

Admitir, entretanto, que Einstein estivesse completamente e-quivocado em sua avaliação e que houvesse apenas desenvolvidouma certa mania de perseguição com relação a Weber, seria ima-ginar leves traços de uma certa esquizofrenia na personalidade deEinstein.

Não sabemos ao certo o que realmente ocorreu. Nem Einsteinnem Weber talvez o soubessem. Cada um tinha, certamente, asua própria versão daqueles fatos ocorridos.

Finalmente, em março de , como uma última conseqüên-cia de todos esses desencontros, Einstein desistiu definitivamentede continuar a estudar com Weber para obter o seu PhD. Emlugar de continuar a ser seu orientando, ele escreveu a Weber e lhefez saber a sua versão dos fatos: que ele tinha plena consciênciada perseguição que este movia contra ele e instou-o a parar depersegui-lo de uma vez por todas e

“não fazer pelas costas aquilo que não tinha coragem de fazerpela frente.”

Por essa época, Einstein parece haver desistido também decontinuar a tentar obter um cargo de assistente em uma outrauniversidade. Por um curto espaço de tempo ele ainda parece terpensado prosseguir naquela busca infrutífera contando com pos-síveis, mas improváveis recomendações de seus ex-professoresem Aarau e até mesmo e em Munique. Ele mudou a direçãodas suas tentativas na Europa central e do norte e chegou aindaa escrever para alguns professores na Itália. Logo, entretanto,parece haver desistido daquelas tentativas de sucesso duvidoso eresolveu procurar um emprego mais modesto que lhe garantisse,ao menos, o seu sustento. Aquele era, sem dúvida, um triste iní-cio para uma carreira acadêmica e científica que viria, entretanto,a ser bastante gloriosa.

Enquanto isso, Mileva Maric, então namorada de Einstein,permanecia obrigatoriamente ainda sob a influência de Weber.Ela estava já trabalhando na sua tese de doutorado com o velho

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mestre, mas ao mesmo tempo preparando-se ainda para repetiro seu exame final de graduação no segundo semestre daquelemesmo ano. A situação não deve ter sido das mais fáceis paraMileva que relatou em cartas à sua grande amiga Helene Kau-fler os muitos atritos tidos naquela época com o professor We-ber por tentar ela defender Einstein das acusações lançadas peloseu mestre.

Mileva, de fato, enfrentou naquele ano um conjunto de sériasdificuldades, além das preocupações naturais de estar ela ten-tando conciliar a sua pesquisa de PhD com a sua preparaçãopara repetir os exames de final de curso. Àquelas dificuldadesnaturais dos seus estudos e da sua pesquisa deveriam ser soma-dos, agora, os novos problemas advindos da transferência dosrancores de Weber com Einstein para a sua pessoa. Acrescente-seainda os problemas decorrentes de uma gravidez não planejadae fora do casamento que surgiria em abril daquele mesmo anoem meio a uma sociedade extremamente conservadora. Some-sea tudo isso, também, as dificuldades econômicas e a sua saúdedebilitada, além das perseguições e das provocações sofridas daparte da mãe de Einstein e pode-se ter então uma leve idéia dosenormes obstáculos enfrentados por Mileva naquele ano de .

O fato de ter vindo ela a ser novamente reprovada em Teoriadas Funções, no segundo semestre daquele mesmo ano, apesar deter passado bem em todas as outras matérias, não pode, portanto,ser tido como uma surpresa, diante de tantas dificuldades enfren-tadas. Mileva tirou um quatro naquela disciplina, o que equivalea um seis em nossa escala tradicional. Apesar de que Teoria dasFunções não era exatamente uma disciplina central no seu cursoe de que a avaliação final era tradicionalmente obtida, como jásalientamos antes, em uma espécie de ‘conselho de classe’ dosprofessores, ela não deve ter contado com a menor boa vontadeda parte do seu orientador e assim sendo aquela sua nota não foisequer arredondada.

Vale salientar ainda que em alguns casos, dependendo do de-sempenho do estudante, a nota obtida em uma prova podia atémesmo ser desconsiderada, como acontecera, por exemplo, como próprio Einstein no meio do curso ao ter sido ele reprovado

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com a nota mínima por Pernet e não ter sido depois nem aomenos obrigado a repetir aquela disciplina.

Mileva sempre creditou, em cartas às suas amigas, o fato denão haver ela conseguido concluir o seu curso à atitude vingativae desleal do professor Weber. A esse motivo principal nós po-deríamos acrescentar também as conseqüências desastrosas paraela da “língua ferina” de Einstein e do próprio conselho que elamesma havia dado a Einstein para que ele não mais tolerasse assupostas perseguições movidas por Weber.

Após esse relato da verdadeira história de desentendimentosque foi o relacionamento acadêmico entre Weber e Einstein, pa-rece ilustrativo que atentemos também para como o agravamen-to deste relacionamento se deu em meio às muitas tentativas en-cetadas por Einstein para obter um cargo de professor assistenteem várias universidades européias. É importante que se percebatambém como essas tentativas estiveram vinculadas a um dosmotivos últimos que contribuíram para envenenar de vez as re-lações entre Weber e Einstein, ou seja, a mudança do seu tema depesquisa.

Por que uma tal mudança de tema pareceu algo tão importantepara Einstein naquela época, a ponto de criar um novo ponto deatrito com Weber?

Estas são perguntas que procuraremos responder no capítuloque se segue.

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As Tentativas de ser Professor

E , mais ou menos duas semanas após o

exame final, Einstein mantinha ainda suas esperanças deser escolhido para assistente por um dos matemáticos na

ETH. Ele parecia tão confiante no sucesso daquela sua tentativaque chegou a rejeitar a oferta de um emprego em uma companhiade seguros que um colega seu havia lhe feito e relatou essa suadecisão em uma carta a Mileva.

Ele passou as férias de verão, até setembro daquele ano, com osseus pais em Milão. Em uma outra carta a Mileva, ele contou aboa novidade de que um assistente do professor Hurwitz estariaassumindo um emprego permanente em uma escola e que aquilo,certamente, abriria uma vaga de assistente para ele.

No final de setembro, Einstein escreveu para o professor Hur-witz abordando-lhe sobre a possibilidade de obter a tal vaga deassistente e o fez da forma mais modesta possível. Hurwitz deveter ficado surpreso com o fato de que aquele estudante antes fal-toso quisesse agora, depois de formado, ser seu assistente. Hur-witz deve ter levantado educadamente um tal ponto com Eins-tein, pois este lhe escreveu uma outra carta na qual tentava ex-plicar as razões daquelas faltas, mas o fez de um modo um tantocínico, tentando distorcer os fatos em lugar de simplesmente pe-dir desculpas. Ele disse a Hurwitz que:

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“por causa da minha falta de tempo, eu não pude tomar partenos seminários de Matemática... Eu não tenho nada a dizer emmeu favor exceto que eu assisti a maior parte das aulas que meforam oferecidas.”

O professor Hurwitz não deve ter acreditado naquela frágilargumentação de Einstein e mais uma vez ele viria a ser preteridoem uma escolha para um cargo de assistente. Entretanto, no iní-cio de outubro daquele mesmo ano ele ainda estava confiante emobter o referido posto, pois escreveu a Mileva dizendo que apesarde Hurwitz não haver ainda lhe escrito, até aquele momento, eleestava confiante de que certamente obteria o cargo pretendido.Logo após retornar a Zurique, entretanto, ele se deu conta danova realidade adversa.

A sua situação financeira ficou insustentável. Sem contar maiscom a ajuda da mesada enviada pela sua tia, que havia sido sus-pensa logo após ele haver concluído o seu curso, Einstein foi obri-gado, então, a sustentar-se apenas com o parco rendimento deaulas particulares esporádicas. Ele deixa isso claro em uma cartaenviada a uma amiga de Mileva, Helene Kaufler, afirmando queele e Mileva estavam sobrevivendo apenas com aulas particulares.

Mileva, naquela época, estava ainda preparando-se para repe-tir o seu exame final de graduação no ano seguinte; mas, desdejá, havia sido aceita por Weber para iniciar a sua pesquisa comvistas ao seu PhD.

Einstein também planejava fazer o seu PhD e deste modo pro-curou Weber propondo-lhe o desenvolvimento de uma pesquisaexperimental sobre o efeito termoelétrico de Thomson. Aqueletipo de pesquisa era, certamente, do agrado de Weber e, alémdisso, os seus laboratórios eram, sem dúvida, a melhor opçãopara uma tal abordagem daquele problema. Contudo, a opçãode Einstein por um estudo experimental duraria muito pouco,como veremos a seguir.

Não tendo obtido boas notas em seu exame de conclusão decurso, Einstein logo resolveu escrever um artigo de pesquisa queuma vez publicado em alguma revista importante pudesse vir aaumentar as suas chances de obtenção de um posto de assistente

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em uma outra universidade. Inspirado pela aula teórica sobrecapilaridade do professor Minkowski, que ele havia assistido noúltimo semestre do curso, Einstein escolheu aquele tema para asua pesquisa.

A capilaridade é um fenômeno que se manifesta, por exemplo,na misteriosa propriedade dos líquidos subirem através de vasosde vidro bem estreitos (capilares). Para os atomistas, aquele fenô-meno era um claro resultado das interações entre os átomos e asmoléculas individuais do vidro e do líquido. Einstein decidiu,então, adotar este tipo de referencial teórico atomista em suaanálise do problema ampliando as possibilidades explicativas doque havia aprendido sobre forças intermoleculares nas própriasaulas do professor Weber. Aquela, entretanto, não parece tersido, sob vários aspectos, uma escolha feliz; mas, Einstein demo-rou bastante a se dar conta das múltiplas conseqüências daquelasua escolha.

O desenvolvimento desta primeira pesquisa teve, de fato, vá-rias conseqüências na vida de Einstein. A primeira delas foi que oseu total envolvimento com este trabalho e a sua crença no valorcientifico do mesmo levou-o a propor a Weber a mudança dotema da sua pesquisa de PhD, até então sobre o efeito Thomson,para o tema das forças intermoleculares.

Aquela súbita tentativa de mudar o tema da pesquisa do seudoutorado foi um novo e decisivo ponto de atrito no relaciona-mento entre os dois. Uma abordagem teórica do tema das forçasintermoleculares, diferentemente daquele estudo ligado ao efeitoThomson, não era absolutamente algo do interesse do professorWeber. Ainda assim, a orientação com Weber e o seu própriorelacionamento com o mesmo só viriam a ser rompidos no iniciode março do ano seguinte.

Einstein, enquanto isso, continuou envidando todos os esfor-ços possíveis para obter um cargo de assistente em uma universi-dade européia. Neste sentido, o artigo a ser publicado sobre o seuestudo da capilaridade parecia-lhe uma arma fundamental paraa obtenção de sucesso naquele empreendimento. O artigo foiaceito pela Annalen der Physik em de dezembro de , massó viria a ser publicado em primeiro de março do ano seguinte.

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O intenso envolvimento de Einstein com a interpretação porele atribuída à capilaridade, um típico exemplo de um fenômenode interfaces, foi tal que ele chegou mesmo a imaginar que esti-vesse próximo de realizar uma grande descoberta científica na-quela área. Ao final das suas férias de verão, em de outubrode , Einstein escreveu entusiasmado a Mileva afirmando-lheque os resultados por ele obtidos em Zurique sobre a capilaridadepareciam realmente completamente novos, apesar de sua simpli-cidade. Ele, de fato, esperava poder descobrir uma nova lei daNatureza naqueles estudos.

O tempo, entretanto, mudaria completamente aquela suaperspectiva a respeito daquela sua primeira pesquisa sobre a ca-pilaridade. A sua avaliação crítica, tempos depois, sobre os mé-ritos reais daquele seu primeiro artigo cientifico veio a ser com-pletamente diferente das expectativas iniciais por ele guardadas.Tempos depois, ficou bastante claro para ele que aquele seu pri-meiro trabalho era algo simplesmente insignificante. Ele chegou,mesmo, a afirmar isso com bastante clareza. Ele, de fato, nãoconseguira achar nenhuma nova lei da Natureza, como preten-dera logo de início.

Os resultados por ele obtidos foram na verdade, pífios e mes-mo a sua hipótese sobre as forças de interação entre duas mo-léculas, que ele um tanto superficialmente ligara com a lei dagravitação newtoniana, logo pareceria, também como algo insus-tentável. Naquela época em que o artigo foi escrito, entretanto,nada disso estava claro para Einstein e durante quase dois anosele continuou investindo fortemente as suas energias nas possi-bilidades a serem abertas por aquela sua abordagem do referidotema. Assim, em dezembro de , quando aquele seu primeiroartigo foi aceito pela revista Annalen der Physik, Einstein julgouequivocadamente que estaria, então, suficientemente preparadopara empreender novas tentativas de obtenção de um cargo deassistente em uma universidade. Ele parecia tão excitado comaquele trabalho que durante um bom tempo tentou desenvolvê-lo ainda um pouco mais. A sua idéia era a de estender o seu es-tudo das forças intermoleculares dos fenômenos entre superfícies

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(capilaridade) para as soluções líquidas e daí, então, generalizá-lapara os gases.

Ainda em setembro do ano seguinte de , Einstein man-tinha bem vivo aquele seu entusiasmo com o referido trabalho,revelando mesmo, como expressou em uma carta ao seu amigoMarcel Grossmann, a sua intenção de adotar aquele mesmo temana sua nova tentativa de obter o seu PhD sob a orientação deAlfred Kleiner, na Universidade de Zurique. Ele, de fato, chegoua publicar, no início de , um segundo artigo, naquela mesmalinha, sobre as forças intermoleculares em soluções salinas. Nada,também, de grande valor, como ele perceberia tempos depois.

A sua intenção na pretendida pesquisa de PhD era exatamenteaquela, já antes aludida, de estender a referida abordagem dasforças intermoleculares para os gases. Em de novembro de, ele escreveu o mencionado artigo sobre os gases no qualadotava aquela sua nova abordagem e submeteu o mesmo, comosendo a sua pretendida tese de PhD, ao professor Alfred Kleiner,na Universidade de Zurique, chegando mesmo a fazê-lo de formaoficial com o pagamento da necessária taxa de inscrição de francos suíços.

A sua confiança na aprovação daquele seu trabalho por Kleinere na conseqüente obtenção, em tempo recorde, do título de PhD,já no início de , era total. Isso pode ser percebido claramenteem uma carta entusiasmada que ele enviou a Mileva naquelamesma época. As coisas, entretanto, não sairiam como ele haviaplanejado. Em de fevereiro de , para sua decepção, eleapenas obteve de volta os seus francos por ter sido a suatese rejeitada sumariamente por Kleiner. Einstein não pareceter absorvido muito bem, logo de início, aquela nova decepçãoe chegou mesmo a fazer, em uma nova carta enviada a Mileva,alguns comentários depreciativos sobre a capacidade científica deKleiner. No fundo, entretanto, Kleiner parece haver ficado sim-plesmente temeroso de aprovar um trabalho que levantava vá-rias questões que entravam em choque com certas consideraçõesmantidas pelo grande físico teórico austríaco Ludwig Boltzmann.

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Voltando a dezembro de , podemos encontrar Einsteinainda ocupado em suas tentativas de obter um cargo de assis-tente em uma universidade européia. Mesmo antes de ter o seuartigo sobre capilaridade aceito pela Annalen der Physik, ele en-viou uma cópia preliminar do mesmo ao professor Boltzmann,então catedrático de Física Teórica na Universidade de Leipzig,solicitando-lhe a sua opinião sobre aquele trabalho. Boltzmann,um dos grandes criadores da Mecânica Estatística e um dos mai-ores físicos teóricos de todos os tempos, nem ao menos se dignoua responder à carta enviada por Einstein.

Em de março de , logo após a publicação do referido ar-tigo sobre capilaridade, Einstein enviou uma carta a Otto Wiener,na Universidade de Breslau, falando a respeito daquele seu tra-balho e consultando-o sobre a possibilidade da obtenção de umposto de assistente com o mesmo em sua Universidade. Einsteinnão chegou nem ao menos a enviar uma cópia do seu artigo aWiener, tendo, em vez disso, solicitado ao mesmo que este procu-rasse o referido trabalho na biblioteca da sua Universidade. Wi-ener, um conhecido físico experimental, parece também não terdado a menor atenção àquele pedido, pois também não enviou aEinstein nenhuma resposta sobre o assunto.

Em de março de , Einstein enviou uma cópia do seu ar-tigo ao famoso físico-químico Wilhelm Ostwald indicando aindaque havia sido muito influenciado pelos trabalhos do mesmonaquela sua pesquisa. Ele pedia os comentários de Ostwald sobreo seu trabalho e apresentava-se a ele como um físico matemá-tico consultando-lhe sobre a possibilidade de que os seus serviçospudessem ser de alguma utilidade como assistente de Ostwald.Einstein também deixava claro, de forma bastante humilde, queele era um estudante sem quaisquer recursos financeiros e queum emprego daquele tipo seria uma condição básica para que elepudesse vir a prosseguir nos seus estudos e nas suas pesquisas.

Alguns dias depois, não tendo recebido ainda nenhuma res-posta de Ostwald, Einstein escreveu-lhe novamente usando a des-culpa de que não se lembrava se havia colocado o seu endereço nacarta anterior. O truque não parece haver funcionado e Ostwaldnão perdeu tempo em responder a Einstein.

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Conhecedor daquela situação, Hermann, o pai de Einstein,enviou uma carta, sem o seu conhecimento, ao professor Ostwaldimplorando que o mesmo aceitasse o seu filho como assistente.Parece que Einstein, de fato, jamais soube daquela atitude deses-perada de seu pai. Fato é, entretanto, que nem assim Ostwaldescreveu a Einstein. Ele deve ter simplesmente deixado de lado ooferecimento dos serviços profissionais daquele, até então, ilustredesconhecido.

É irônico notar, entretanto, que anos depois, em , quandoEinstein já era então uma personalidade em ascensão no mundoda Ciência, Ostwald foi o primeiro cientista de renome a indicaro nome de Einstein para o prêmio Nobel de Física. Ele repetiriaaquela mesma indicação no ano seguinte, de , assim comotambém nos anos de e . É difícil saber se ao fazer aquelasindicações posteriores do nome de Einstein para o maior prêmiomundial concedido a um cientista, Ostwald tinha em mente queaquele indivíduo era exatamente o mesmo que anos antes elenem ao menos se dignara a responder uma simples carta.

Ainda no início de março de , Einstein soube que o físicoEduard Riecke, de Goettingen, havia anunciado em um perió-dico a existência de duas vagas de assistente. Riecke, entretanto,havia colocado explicitamente a exigência de que os candidatosdeveriam já possuir o título de PhD. Mesmo sem ter ainda aqueletítulo, Einstein procurou o seu amigo e professor na ETH, AlfredStern, também amigo de Riecke, para que ele o auxiliasse natentativa de obter aquele cargo.

Não se sabe, ao certo, se Stern chegou a interceder junto aRiecke em favor de Einstein, nem ao menos se uma tal possívelintervenção poderia ter surtido o efeito desejado. Certo é queEinstein parece ter ficado bastante confiante na obtenção de umadaquelas vagas, apesar de não preencher todos os requisitos exi-gidos para o cargo. Foi o fracasso dessa sua tentativa de obteruma vaga de assistente com Riecke que serviu de espoleta paraque ele atribuísse a Weber a razão daquele seu insucesso.

Em de março de , Einstein já tinha conhecimento darecusa de Riecke e escreveu a Mileva atribuindo a Weber as razõesde seus infortúnios e a certeza de que o mesmo estava dando as

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piores referências possíveis a seu respeito aos professores que oconsultavam. Na mesma carta, Einstein diz também que resolveuaceitar o conselho dado por Mileva e que em conseqüência dissohavia escrito para Weber que “não fizesse pelas costas aquilo quenão fazia pela frente”. Temos ai, com certeza, o rompimento finaldo relacionamento entre Einstein e o seu professor. Em umaoutra carta a seu amigo Marcel Grossmann, Einstein repete asmesmas acusações a Weber.

Em uma segunda carta enviada a Mileva, sobre este mesmoassunto, Einstein refere-se às explicações pouco convincentes deWeber do seu insucesso na obtenção de uma vaga com Riecke.Ele não torna explícitos quais teriam sido os argumentos de We-ber, mas deixa bem claro que Weber chegou a responder a suamensagem, pois afirma que considera que uma tal resposta haviasido insuficiente, pelo fato da mesma não se referir à existênciade uma segunda vaga.

Somos levados a crer que, aparentemente, Weber deve ter ditoa Einstein que ele não teria mesmo os requisitos para obter aquelavaga com Riecke, mas Einstein havia centrado a sua atenção nofato de que existiam, na verdade, duas vagas disponíveis.

Em de abril de , Einstein enviou vários cartões postaiscom respostas pagas para diversos físicos em várias universidadesda Europa. Não se conhece uma relação completa daqueles cien-tistas para os quais Einstein enviou as suas correspondências, masao menos dois deles guardaram tais cartões sem respondê-los:Heike Kamerlingh Onnes de Leyden e Carl Paalzow de Berlim.

Por um breve espaço de tempo, Einstein ainda insistiu em ob-ter um posto de assistente, desta vez na Itália. Ele alegava, paraisso, que as suas chances naquele país seriam bem maiores, poisele poderia contar com a indicação de alguns amigos. Além disso,ele também lembrava que na Itália, diferentemente dos países decultura germânica, praticamente não havia o maior dos obstácu-los por ele enfrentado, os preconceitos anti-semitas. Esta é umaalegação que no caso específico de Weber e mesmo da própriaETH, não é de fácil constatação. De fato, não há qualquer regis-tro de atividades anti-semitas da parte de Weber e vale salientar,

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ainda, que a ETH possuía nos seus quadros vários professores ju-deus, dentre eles o grande Hermann Minkowski. Por outro lado,ainda, dois dos ex-colegas de Einstein que haviam conseguido,diferentemente dele, obter postos de assistente na ETH, eramigualmente judeus: Jakob Ehrat e Marcel Grossmann. Algunsautores têm levantado a hipótese de que Einstein não era bemaceito por ser um ‘suíço de papel’ ou seja, por ser um suíço ape-nas por naturalização. Esse argumento também não nos parecemuito consistente, pois o seu colega Marcel Grossmann, além dejudeu era também um estrangeiro, procedente da Hungria.

As novas tentativas de Einstein de obter um posto de assis-tente na Itália também não tiveram o êxito por ele esperado. Elenão conseguiu obter um tal cargo nem com o professor Battelli,em Pisa nem com o famoso físico Augusto Righi, em Bolonha.E em tais casos, a influência de Weber foi, com toda certeza,inexistente.

Aquilo tudo era, entretanto, apenas o início da sua extenuantee infrutífera busca de um emprego de professor. Para comple-tar todo aquele quadro de fracassos, Einstein, sem emprego esem qualquer outro meio de sustento, foi obrigado a retornartemporariamente, em março de , à casa dos seus pais emMilão, apesar das dificuldades financeiras que os mesmos entãoenfrentavam.

No seu retorno a Zurique, Einstein encontrou muitas dificul-dades econômicas para se manter, apesar de levar uma vida ex-tremamente simples. Além de dar ocasionalmente algumas au-las particulares, ele também ganhava alguns poucos recursos fa-zendo cálculos para o diretor do Observatório Federal de Zuri-que, o seu ex-professor de Astronomia, Alfred Wolfer.

Finalmente, em maio de , Einstein conseguiu uma indica-ção para lecionar como professor substituto temporário de Ma-temática, por apenas dois meses (de de maio a de julho) emuma Escola Técnica secundária na cidade de Winterthur, entreZurique e Berna. Einstein não chegou a se candidatar para estecargo de professor substituto. Ele foi indicado pelo próprio mes-tre que haveria de substituir, Jakob Rebstein (–) e que oconhecia desde o tempo em que Einstein havia estudado na ETH.

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Rebstein havia sido assistente do professor de Mecânica AlbinHerzog de a e havia sido também professor de Einsteinno semestre de inverno de –.

Apesar da simplicidade daquele seu primeiro emprego e doelevado número de aulas semanais que ele teria de lecionar, Eins-tein recebeu a notícia daquela sua primeira colocação profissio-nal com grande alegria e determinação.

Em uma carta a Mileva, ele afirma que em caso de confirmaçãode um tal emprego:

“você pode imaginar quão feliz eu ficarei! Certamente que euterei de ensinar trinta horas por semana e isso inclui atéGeometria Descritiva, mas o valente suabiano não está comreceio.”

É interessante notar que apesar de haver renunciado à cida-dania germânica, Einstein freqüentemente referia-se a si mesmocomo natural da Suabia, uma região do sul da Alemanha com tra-dições culturais marcadamente diferentes das regiões bem maisindustrializadas do norte.

A confirmação daquele seu primeiro emprego, entretanto, nãofoi imediata e Einstein não parece ter tomado nenhuma atitudepara encaminhar o processo de sua contratação, pelo menos é oque pode se depreender das palavras a ele dirigidas por Milevaem uma carta datada de de Maio de :

“por que você não escreve uma vez mais para Winterthurperguntando sobre o emprego de professor? Apesar de tudo,talvez eles pensem que a coisa já esteja resolvida; que você foiconvidado e que está de acordo; ou eles tencionam aindaescrever para você uma vez mais?”

Com a confirmação do trabalho, ainda que temporário, emWinterthur e afastado por longo tempo de sua namorada, Eins-tein reencontrou-a na cidade de Como na Itália, dez dias antes deassumir o referido emprego. A felicidade deste encontro idílico,reforçada pela crença na obtenção de uma colocação profissio-nal, parece ter favorecido a intimidade do casal o que resultaria

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em janeiro do ano seguinte no nascimento de sua filha Lieserl,um acontecimento que traria, entretanto, trágicas conseqüênciaspara a vida dos dois, principalmente, para Mileva.

A alegria provocada em Einstein pela obtenção daquele seuprimeiro emprego pode ser evidenciada também nas suas pró-prias palavras em uma carta endereçada ao seu estimado amigo econselheiro Alfred Stern:

“eu estou fora de mim de alegria por ter recebido a confirmaçãoda minha colocação. Eu não tenho idéia de quem merecomendou porque tanto quanto eu saiba nenhum dos meusprofessores tem uma boa palavra para dizer de mim e eu não mecandidatei para o posto, mas fui convidado”

Einstein deixa também claro para o velho Stern, a sua enormealegria em conseguir aquele emprego como professor ao relatara sua decisão de cruzar os Alpes andando para assumir o seuemprego:

“daqui a alguns dias eu atravessarei o Splugen a pé paracombinar a minha felicidade com a mais prazerosa obrigação.”

É interessante, porém, observar que Einstein refere-se freqüen-temente senão à perseguição, ao menos à falta de solidariedadedos seus professores para consigo. Entretanto, ele jamais refletesobre o quanto uma tal atitude dos seus mestres poderia ser, aomenos em parte, uma conseqüência da sua própria forma deafrontar qualquer tipo de autoridade. Além disso, não é de todoverdade que todos os professores da ETH tivessem para com eleuma atitude inamistosa ou até mesmo de perseguição, como a-quela que costumava atribuir a Weber. Sua própria carta a Al-fred Stern, também professor na ETH, é uma clara demonstraçãodisso. Ele mesmo admite a Mileva que “o velho Stern ficou muitofeliz com a minha colocação em Winterthur”. O fato, porém, é queStern era professor de História, não havendo sido professor deEinstein e que em tal condição pouco podia fazer para ajudá-lo aobter qualquer colocação profissional.

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Por outro lado, entretanto, já na sua chegada a WinterthurEinstein tem a grata surpresa de descobrir que a sua indicaçãopara o posto de professor substituto havia partido do próprioprofessor no referido colégio, Jakob Rebstein, seu ex-professorna ETH. Além disso, Einstein admite também em uma outracarta para Mileva, datada de de Maio de , que tambémo seu ex-colega de classe na ETH, Jakob Ehrat, havia contribuídopositivamente para aquela sua indicação bem como um outroex-professor seu na ETH, Ernst Amberg.

Ernst Amberg havia sido assistente dos professores Adolf Hur-witz e Carl Friedrich Geiser na ETH de Zurique. Amberg leci-onara a Einstein no primeiro ano letivo do seu curso na ETH(semestre de inverno de –) em três disciplinas. A sua atu-ação docente junto a Einstein havia sido exercida não exatamentena qualidade de professor de tais disciplinas, mas na de assistentedas mesmas. Einstein assistira apenas a algumas das suas aulasque eram uma espécie de reforço das aulas dos professores dasreferidas disciplinas. Este procedimento clássico nas universida-des européias era conhecido com o nome de Repetitorien.

Tendo tomado conhecimento daquelas ajudas, Einstein tentouentão timidamente redimir-se, junto a Mileva, do seu exageradopessimismo, da sua quase mania de perseguição, escrevendo-lhea esse respeito que: “parece, de todo modo, que ainda existem pes-soas bem intencionadas”. Ele descreve com entusiasmo a sua che-gada a Winterthur e o seu encontro com Rebstein, assim como asua preocupação educacional: “eu preciso ter uma oportunidadede ver como terei de ensinar. Eu estou muito ansioso em começar nomeu emprego”.

A alegria de Einstein pela obtenção deste primeiro e tão sim-ples emprego de professor substituto era também compartilhadapor Mileva Maric. Em uma carta escrita à sua amiga HeleneKaufler, ainda em maio de , ela afirmava que:

“desde o início de maio Albert tem estado em Winterthur (elesubstituiu um professor de Matemática por um mês). Em demaio eu fui a Como onde Alguém esperava por mim com osbraços abertos e um ‘coração palpitante’ /.../ Albert está muito

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feliz em Winterthur; se ao menos ele pudesse conseguir um talemprego para sempre. Ele está tentando através de um bomconhecido obter um emprego em uma companhia de seguros”

Apesar da alegria pela obtenção deste primeiro emprego, Eins-tein não parece ter tido a mesma expectativa que Mileva; ele ain-da reservava algumas observações mais ácidas sobre aquilo queum tal emprego pudesse lhe trazer no futuro. O seu desejo de de-dicar-se à pesquisa científica não havia sido simplesmente substi-tuído pelo seu declarado amor ao ensino. Ao contrário, olhandopara o exemplo dos colegas de Winterthur ele teme pelo pior.Ele teme, sobretudo, o acomodamento natural que uma situaçãomais estável possa lhe trazer. Ele escreve a Mileva sobre os seuscolegas e sobre uma tal situação de uma forma que demonstrao seu receio ou mesmo um certo pessimismo: “infelizmente, nin-guém na Escola está atualizado com a Física Moderna e eu já tentei,em vão, entrar em contato com todos eles. Será que eu me tornariatão intelectualmente preguiçoso se as coisas fossem bem para mim?Eu penso que não, mas o perigo realmente parece ser grande”. Eletambém informa a Mileva que a alternativa de um emprego emuma companhia de seguros parece de difícil obtenção.

De todo modo, a sua experiência docente em Winterthur pa-rece ter sido agradável, pois em ocasiões posteriores, já quandofuncionário do Escritório de Patentes em Berna, Einstein pensa-ria algumas vezes em obter aquele posto em definitivo. Poucose sabe de concreto sobre essa sua primeira experiência pedagó-gica, mas alguns dos seus biógrafos, dentre eles Seelig e Michel-more, assinalam que Einstein, ainda muito jovem, teria enfren-tado naturais problemas de indisciplina em suas primeiras aulasem Winterthur.

Seelig relata que um dos seus alunos ficou balançando ruidosa-mente a cadeira para frente e para trás produzindo um incômodorangido. Einstein, calmamente e com uma fina ironia olhou parao menino e perguntou-lhe em tom suave e irônico: “é você ou éa cadeira que está fazendo esse barulho?” Apesar desses distúrbiosjuvenis iniciais, a sua inteligência e o seu bom humor, como as-sinala Denis Brian, ajudaram-no a contornar aquela situação e a

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ganhar rapidamente a simpatia dos seus alunos. Além disso, a ati-tude pedagógica adotada por Einstein teria sido, já desde então,eminentemente socrática. Em lugar de repreender os seus alunos,ele simplesmente bombardeava-os com perguntas inquietantes,explorando, desta forma, os limites dos seus conhecimentos efazendo-lhes ver o quanto eles ainda precisavam refletir sobre oassunto e o quanto poderiam assim aprender. A se julgar pelo seudesejo posterior de retornar àquele posto, presume-se que ele te-nha sido bem sucedido em suas tentativas de lidar socraticamentecom as suas turmas em Winterthur.

A caracterização da atitude socrática de Einstein como profes-sor pode ser encontrada também nos testemunhos de diversos deseus ex-alunos e de muitos daqueles que simplesmente tiveram oprivilégio de conviver com ele. David Reichinstein, por exemplo,um professor de Química da Universidade de Zurique e que foicolega de Einstein no final da primeira década do século XX,referia-se explicitamente ao mesmo como um segundo Sócratesque adotava sempre uma atitude viva e estimulante em todas assuas argumentações.

Ao final de sua estada como substituto na escola de Winterthur,após o retorno do professor da disciplina, mesmo com a suaatuação como professor substituto tendo transcorrido sem quais-quer problemas, Einstein não foi convidado para manter-se noemprego de forma definitiva. Deste modo, no início de julhode , ele se viu novamente desempregado. As únicas boasnotícias naquele período foram a sua recente obtenção da cida-dania suíça e a sua dispensa do serviço militar por ter pé chato evarizes. Com grande dificuldade, Einstein permaneceu residindona mesma pensão em Winterthur até outubro daquele mesmoano e as suas restrições pessimistas anteriores sobre os perigos deum emprego mais estável parecem haver sucumbido diante dasagruras trazidas pela sua nova condição de desempregado. Eleescreveu, nessa época, a Mileva em um tom bem mais humilde econformado:

“sobre o nosso futuro eu decidi o seguinte: eu procurarei umemprego imediatamente, não importa quão modesto ele seja.

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Meus objetivos científicos e a minha vaidade pessoal não meimpedirão de aceitar o mais subordinado dos papéis.”

Na incerteza de obter o esperado emprego na companhia deseguros, Einstein candidatou-se, naquele mesmo mês de julho,a uma vaga para ensinar Matemática em uma escola na cidadepróxima de Frauenfeld. Ele parece haver pedido o auxílio de JostWinteler, professor da escola de Aarau – na casa de quem elehavia residido – segundo conta Mileva em uma de suas cartas.Winteler já havia lhe recomendado para lecionar em uma outraescola técnica em Burgdorf, próxima a Berna, mas a sua can-didatura, por razões desconhecidas, não havia sido aceita pelasautoridades locais.

Não se sabe se Winteler chegou a fazer também a sua indica-ção em Frauenfeld, pois Mileva lhe sugeriu que se apresentasseele mesmo à escola: “o professor Winteler já o recomendou emFrauenfeld? Não seria uma boa idéia você mesmo se apresentar àspessoas certas? Esse é o costume de onde eu venho; eu não sei comoé feito aqui”. Ele esperou ansiosamente por uma resposta posi-tiva, mas no início de setembro as suas esperanças terminaram,pois a referida escola preferiu dar a vaga ao seu ex-colega Mar-cel Grossmann. Einstein, entretanto, não podia se lamentar porhaver sido preterido em favor de Grossmann. Afinal, Grossmannera seu amigo, desde os tempos de estudantes na ETH e váriasvezes o havia socorrido com as suas cuidadosas anotações dasaulas. Além disso, Grossmann sempre o tratara e o incentivaracomo se ele fosse um futuro gênio ainda não reconhecido pelosoutros e estava também tentando ajudá-lo a obter um empregono Escritório de Patentes em Berna. E, além de tudo isso, Gros-smann sempre havia sido um estudante exemplar e melhor queele em Matemática. Deste modo, Einstein escreveu a Grossmanncongratulando-se sinceramente com o mesmo pela sua obtençãoda vaga de professor em Frauenfeld.

A situação foi apenas um pouco aliviada quando Einstein leuum anúncio no Jornal dos Professores da Suíça sobre a necessi-dade de um professor particular, uma espécie de tutor, para uma

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escola-internato na vizinha cidade de Schaffhausen. Com a reco-mendação do seu amigo e ex-colega da ETH o engenheiro Con-rad Habicht, que morava em Schaffhausen, Einstein obteve aque-le emprego que consistia em ser uma espécie de preceptor de doisalunos, um deles um jovem inglês, de dezenove anos chamadoLouis Cahen e que se preparava para fazer os seus exames paraestudar Arquitetura em Zurique, na ETH. Segundo o relato deLoria, Einstein teria ficado tão entusiasmado, logo de início, emensinar àqueles dois jovens em Schaffhausen que ao sentir queos seus métodos de ensino não estavam em sintonia com os dosoutros professores, pediu para ser ele o único responsável peloensino daqueles dois alunos. Praticamente nada se sabe a respeitoda identidade do segundo aluno de Einstein e os registros daquelaépoca em Schaffhausen são todos devidos à sua interação comaquele jovem estudante inglês, Louis Cahen.

Einstein, que era apenas um pouco mais velho do que o seuestudante, rapidamente estabeleceu com ele um relacionamentobastante amistoso. Seelig descreve o relacionamento dos doiscomo revestido mesmo de um caloroso entusiasmo. Dois cader-nos de anotações de Cahen, daquela época, repletos de fórmulase de figuras geométricas, ainda existem hoje em dia e revelamas correções respeitosas e as inúmeras sugestões registradas nosmesmos por Einstein, sugestões estas que denotam uma preo-cupação constante de Einstein enquanto educador: a de jamaisferir a auto-estima dos seus alunos. Este é um ponto importantee recorrente na experiência pedagógica de Einstein. Como ve-remos, na seqüência deste livro, praticamente todos os relatoscolhidos dos alunos que ele viria a ter em anos posteriores nasuniversidades de Zurique, Praga, ETH, Berlim e em Princeton,são unânimes em apontar esta sua característica marcante de sa-ber respeitar e de valorizar profundamente a auto-estima dosmesmos.

Tempos depois, em conversa com Peter Bucky, Einstein con-taria que quando professor, ao auxiliar um estudante a resolveros seus problemas, ele não se preocupava apenas em ensinar-lhecomo poderia obter as respostas certas. Ele se preocupava, sobre-tudo, em fazê-lo de um modo que não abafasse a sua curiosidade

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ou o seu sentimento quanto à sua própria capacidade de resolvera questão. O que estava em jogo, para Einstein, não era apenaso desenvolvimento da habilidade de resolver um problema espe-cífico, mas principalmente o respeito pela auto-estima do estu-dante e o conseqüente desenvolvimento da sua autoconfiança.

Em Schaffhausen, Einstein atuou dedicadamente como pre-ceptor do jovem estudante inglês por alguns meses, mas rapida-mente entrou em choque frontal com os métodos conservadoresda escola, com a rígida disciplina da mesma e, sobretudo com amesquinhez do seu diretor, um certo Dr. Jakob Nuesch.

Em uma determinada ocasião, por exemplo, ao simplesmentereclamar das condições insatisfatórias em que ele fazia as suasrefeições na própria casa do diretor, Einstein ouviu do mesmo ahumilhante resposta:

“você deveria estar satisfeito com o tratamento que estárecebendo.”

Tudo naquela escola lhe fazia lembrar o seu próprio sofrimen-to como aluno do Luitpold Gymnasium em Munique, assim comoas suas desventuras também com os professores da ETH. Certa-mente, Schaffhausen não era Munique e os métodos educacio-nais adotados na Suíça também não eram exatamente os mes-mos rígidos métodos de sua terra natal, a Alemanha; mesmoassim, as convicções educacionais de Einstein da necessidade deum mínimo de rotina e de um mínimo de disciplina eram muitodiferentes daquela do seu patrão, Jakob Nuesch. Nuesch nãoadmirava em nada o estilo liberal de ensino adotado por Einsteine este, por seu turno, não estava disposto a aceitar os preceitos pe-dagógicos de influência germânica do patrão. Para Nuesch, a boaeducação havia de ser constituída baseada na célebre trindadetão fortemente rejeitada por Einstein: aprendizagem por memo-rização, disciplina rígida e um apego excessivo à autoridade doprofessor. Para Nuesch, Einstein exercia uma má influência sobreos alunos e aquele seu modo liberal de ensino poderia ser vistocomo o início de uma indesejada revolução. Como resultadode um tal conflito, já no final daquele ano, após apenas quatro

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meses de trabalho, Einstein estava novamente desempregado emZurique.

Em dezembro de , a situação econômica de Einstein erarealmente desesperadora: desempregado, sem esperança de obteruma colocação em nenhuma universidade, simplesmente à pro-cura de um emprego qualquer, até mesmo em uma companhiade seguros, o que chegou seriamente a cogitar, e com um filhoprestes a nascer no mês de janeiro de .

A possibilidade da obtenção de um emprego de técnico exa-minador no Escritório de Patentes da Suíça, em Berna, fez comque ele se mudasse para esta cidade no verão de , mesmoantes que uma tal indicação viesse a ser efetivada. Einstein haviasido indicado para aquele cargo pelo pai do seu amigo MarcelGrossmann, que era amigo do diretor daquela repartição pú-blica, o engenheiro mecânico Friedrich Haller. Haller precisavade alguém com qualificações profissionais que lhe permitissemanalisar, sobretudo as novas invenções aparecidas no campo daEletrotecnologia e as qualificações de Einstein pareciam encaixar-se, perfeitamente, em um tal perfil profissional desejado.

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A Academia Olímpia,

o Escritório de Patentese a Universidade de Berna

N de , afastado de Mileva, que permanecia

adoentada na casa de seus pais, na Sérvia, com a filharecém-nascida do casal, Einstein aguardava em Berna,

ansiosamente, a confirmação do seu emprego no Escritório dePatentes. Sem os recursos financeiros mínimos para a sua própriamanutenção, ele recorreu mais uma vez a dar aulas particulares,anunciadas em um jornal local, para garantir a sua sobrevivência.Nessa época, ele escreveu a Mileva:

“as aulas particulares não estão indo mal. Eu já consegui doiscavalheiros como alunos, um engenheiro e um arquiteto e tenhomais algumas outras expectativas. Eu vou ensinar aos dois emconjunto um certo tipo de curso particular e devo receber francos de cada um por cada aula. Isso não é tão mal assim. Asaulas começarão depois de amanhã à noite”

Um desses alunos era Maurice Solovine, um jovem arquitetoromeno, estudante de filosofia e literatura na Universidade deBerna e curioso em conhecer os problemas filosóficos da FísicaModerna. O outro aluno era o seu amigo, o engenheiro Conrad

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Habicht que, como dissemos antes, fazia então o seu doutoradoem Matemática na Universidade de Berna. O convívio com essesalunos e amigos não poderia ter sido mais profícuo. Rapida-mente, eles transformaram as aulas em animadas discussões edenominaram de forma irônica as suas freqüentes reuniões de‘Academia Olímpia’.

Finalmente, em de junho de , Einstein foi admitidocomo técnico de terceira categoria no Escritório de Patentes. Nooutono de , Einstein receberia a notícia devastadora da mortedo seu pai e que precipitaria sérias mudanças de rumo em suasdecisões. Sua mãe, em conseqüência das dificuldades financeiras,teve de trabalhar como governanta e ir morar com uma irmã naAlemanha. Einstein viu-se, então, na difícil situação de ter nãoapenas de manter a si mesmo como também de buscar condiçõeseconômicas para casar-se e para ajudar à sua própria mãe. Emjaneiro de , Einstein ele se casou com Mileva em Berna tendoSolovine e Habicht como únicas testemunhas.

Talvez com receio do conservadorismo e do preconceito dasociedade suíça contra a presença de filhos gerados fora do casa-mento e temendo perder o seu emprego público, seu único meiode subsistência, Einstein deixou a filha recém-nascida na Sérviaaos cuidados da família de Mileva. Não se sabe ao certo de quemfoi tal decisão, se foi de Einstein isoladamente, da própria Milevaou se foi uma decisão conjunta do casal. Os indícios, entretanto,não apontam para uma participação ativa de Mileva nesta deci-são. Os detalhes de uma tal história são ainda hoje obscuros eo aprofundamento e a análise da mesma estão completamentefora do escopo deste presente livro. As referências de qualquertipo à sua filha Lieserl, entretanto, terminam seguramente emsetembro de . Não se sabe ao certo se ela faleceu ou se foidada para adoção àquela mesma época. Certo é que este acon-tecimento, ainda hoje envolto em mistérios, tornou-se algo quemuito contribuiu para amargurar posteriormente a vida conjugalde Einstein e Mileva.

Apesar da sua vida conjugal ter tornado-se com o passar dotempo cada vez mais difícil, o relacionamento de Einstein como seu filho Hans-Albert Einstein, nascido em , parece ter

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sido feliz e de tal modo informal que uma das recordações maisantigas de Hans Albert a respeito de sua infância era a de seu paiAlbert construindo um pequeno carrinho com caixas de fósforo.Segundo Hans Albert: “este era um dos melhores brinquedos queeu tinha naquela época e ele funcionava. A partir de uma pequenalinha, algumas caixas de fósforo e coisas assim ele podia fazer ascoisas mais belas”. Hans Albert relembra, também, que a edu-cação em sua casa era concebida como um programa contras-tante com o da escola. Einstein, por exemplo, tentava sempreinteressar o seu filho pela música embora não tenha obtido, deinício, nenhuma resposta positiva. Este episódio é recontadopor Folsing e encontra-se originalmente no livro de memóriasde Hans Albert escrito após a sua morte por sua esposa ElizabethRoboz-Einstein. Hans-Albert, além de ter tornado-se um reno-mado engenheiro hidráulico de projeção internacional – cons-truindo importantes barragens por todo o mundo – e de ter sidoprofessor titular nas Universidades da Califórnia e de Iowa, veiotambém a se tornar um talentoso pianista e a encontrar, comoAlbert e como Mileva, um real prazer na execução musical.

Einstein trabalhou como examinador de patentes no Escritó-rio de Berna de a . Aqueles foram anos de rápido de-senvolvimento das indústrias de motores elétricos, telefones etelégrafos sem fio. Os inventores que conduziram, àquela época,o desenvolvimento da tecnologia elétrica eram de um tipo pos-terior a Edison, pois eram principalmente indivíduos com trei-namento universitário e que sabiam lidar bem com os fenômenosdas ondas eletromagnéticas, ao invés de apenas com os mais an-tigos sistemas de telégrafos com fio e circuitos de correntecontínua.

Einstein passou os dois primeiros anos no Escritório de Pa-tentes com o status de um funcionário provisório enquanto eraensinado pelo seu diretor, o engenheiro Friedrich Haller, na lei-tura e na interpretação dos argumentos e dos diagramas contidosnos requerimentos dos inventores assim como na preparação deespecificações sistemáticas. Com os seus poderes de conceitu-ação e de síntese, Einstein rapidamente aprendeu a interpretare a compreender em profundidade os desenhos e os diagramas.

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Einstein, assim preparado, exigia clareza tanto verbal quanto vi-sual dos inventores que requeriam as suas patentes. Haller insistiaque os examinadores cultivassem uma atitude extremamente crí-tica com relação aos reclamos dos inventores, assumindo comopremissa básica que tudo que eles diziam em seus requerimentosera falso. Einstein reconheceu posteriormente que aquele tipo deatitude contribuíra para afiar a sua argúcia e que ele se tornou,então, um grande discípulo de Haller.

Einstein reconheceu, posteriormente, a contribuição que a suaexperiência como um examinador de patentes deu ao seu própriodesenvolvimento intelectual.

“A formulação das afirmações sobre patentes foi uma bençãopara mim. Ela me deu a oportunidade de pensar sobre Física.”

Aquela atividade também o ajudou a aprender a expressar-sede um modo mais preciso. Muito tempo depois, já ao completar anos de idade, ele escreveu que

“uma profissão prática foi uma salvação para um homem do meutipo; uma carreira acadêmica compele um jovem para aprodução cientifica e apenas as personalidades mais fortespodem resistir à tentação de uma analise superficial.”

A leitura e a análise dos requerimentos de patentes e dos dese-nhos neles contidos parecem ter cultivado não apenas a sua ima-ginação visual, mas, também, o seu conhecimento dos princípiosfísicos subjacentes aos funcionamentos práticos dos dispositivosdaqueles inventores.

Einstein havia, providencialmente e ainda que por casualidade,obtido um emprego que estava muito alinhado com o seu pró-prio modo de pensar e que fazia com que ele pudesse experien-ciar no mesmo um agradável exercício de imaginação científicae tecnológica. Mesmo os procedimentos formais favoreceram ainclinação natural de Einstein para o lançamento de críticas epara a busca de contradições.

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Logo no início do seu trabalho no Escritório de Patentes emBerna, Einstein tornou-se amigo de Joseph Sauter, um engenhei-ro que havia estudado, assim como ele próprio, na ETH. Sauter,que era oito anos mais velho que Einstein e havia cursado a ETHbem antes dele, havia sido assistente, por um breve espaço detempo, do professor Weber, coisa que Einstein tentara conseguirsem obter sucesso. Sauter era muito interessado nos problemasda Física e Einstein mostrou-lhe os seus três artigos que haviapublicado até então na Annalen der Physik. O primeiro artigo eraaquele sobre Capilaridade ao qual já nos referimos anteriormentee os outros dois seguintes eram sobre Termodinâmica. Sauterchegou mesmo a apontar um pequeno erro cometido por Eins-tein em seus trabalhos de Termodinâmica o que foi reconhecidopor ele com humildade e sem qualquer constrangimento. Sauterapresentou Einstein a um outro amigo seu, o Dr. Paul Gruner,que lecionava Física em uma escola secundária e que era, alémdisso, privatdozent na Universidade de Berna. A amizade queEinstein veio a travar com Gruner fez com que ele considerasse apossibilidade de obter também um posto de privatdozent naquelamesma Universidade.

Logo em , no segundo ano de sua estada em Berna, Eins-tein escreveu ao seu grande amigo Maurice Solovine dando contadaquela sua decisão de tornar-se privatdozent. Na mesma carta,Einstein considerava também a possibilidade de vir a desistir daconclusão dos seus estudos para a obtenção de um doutorado.Isso devia-se, provavelmente, ao fato de ele estar ainda ressentidocom a sua primeira tentativa fracassada de submeter uma tesede PhD à Universidade de Zurique, pois a mesma havia sidorejeitada no ano anterior pelo seu orientador, o professor AlfredKleiner. De todo modo, a obtenção de um posto de privatdozentera uma condição básica para que ele algum dia pudesse vir a sercontratado como professor por alguma Universidade.

Aquela posição acadêmica era obtida através de um exame detítulos e da apresentação de uma tese especial de habilitação paraa mesma. A obtenção da posição de privatdozent não impli-cava em nenhum contrato com a Universidade; mas, apenas, naobtenção de uma permissão especial para dar aulas particulares

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para os alunos da mesma. Deste modo, um privatdozent nãotinha nenhum salário regular e ganhava apenas aquilo que os seusalunos lhe pagavam diretamente pelas aulas dadas. Era uma espé-cie de professor particular reconhecido pela Universidade. Aindaassim, uma tal posição acadêmica não era de fácil obtenção.

A maior parte das Universidades exigia que o candidato já ti-vesse inicialmente um título de PhD e que, além disso, ele sub-metesse uma tal tese especial de habilitação ao referido posto.Entretanto, algumas universidades, como a de Berna, admitiamem seus regimentos que em condições muito especiais, conside-rando-se a alta relevância dos trabalhos científicos já desenvolvi-dos por um certo candidato, ele pudesse vir a ser dispensado dasreferidas exigências. Em tais casos muito especiais, bastaria aocandidato, possuidor deste notório saber, submeter um simplescurriculum vitae à instituição.

Einstein, que já tentara anteriormente abreviar outras exigên-cias legais como a da apresentação de um diploma do colégioem sua primeira tentativa de entrada na ETH, imaginava agorapoder fazer algo semelhante conseguindo uma permissão paralecionar na Universidade sem ter ainda um PhD e sem nem aomenos ter de submeter qualquer tese de habilitação. Se antes,ao tentar estudar pela primeira vez na ETH, ele havia confiadoem seus bons conhecimentos de Matemática, atestados pelo seuex-professor em Munique, ele agora confiava no valor dos seustrês trabalhos até então publicados na Annalen der Physik paracontornar aquela nova exigência. Assim, ele submeteu apenas oseu curriculum vitae e algumas cópias daqueles seus três trabalhosà Universidade de Berna. Esta, todavia, nem ao menos se dignoua analisar os referidos documentos. As autoridades da Univer-sidade devem ter pensado simplesmente que estavam diante deum candidato sem a necessária titulação e que valorizava excessi-vamente o seu próprio curriculum. Einstein parece ter absorvidobem o golpe e tomado a decisão de prosseguir nos seus estudospara a obtenção do PhD.

Finalmente, em , Einstein defendeu a sua tese de PhD naUniversidade de Zurique, sob a orientação do professor Kleiner.Naquele mesmo ano, Einstein publicou não apenas a sua tese de

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doutorado como também mais quatro outros artigos na concei-tuada revista Annalen der Physik.

Esses cinco trabalhos viriam a revolucionar a Física por com-pleto, estabelecendo fortes evidências da natureza atômica damatéria, lançando as bases da Teoria Quântica – com as explica-ções rigorosas da radiação de corpo negro, do efeito fotoelétrico,da luminescência e da variação dos calores específicos atômicos– além de desenvolver a Teoria da Relatividade Restrita, que alte-rava os velhos conceitos newtonianos de tempo e de espaço.

A sua explicação do efeito fotoelétrico, apresentada naqueleano, lhe valeria anos depois o prêmio Nobel de Física de .A Física jamais experimentou um ano tão revolucionário quantoaquele e a sua história costuma ser dividida em duas etapas: antese depois do Annus Mirabilis de Einstein de . Nem assim, comtodos aqueles trabalhos, Einstein conseguiu de imediato uma co-locação para ensinar em nenhuma universidade. O reconheci-mento geral do mérito dos seus trabalhos de também não foiimediato. Ainda que alguns físicos proeminentes, como Planck,Wien e Sommerfeld, por exemplo, tenham reconhecido rapida-mente o valor científico dos trabalhos de Einstein, a maior partedos físicos ou não os compreendeu de imediato ou simplesmenteignorou-os por completo. Assim, Einstein continuou a trabalharno Escritório de Patentes até .

O status científico de Einstein começou, na verdade, a mudarpositivamente, de um modo mais amplo, apenas após a sua for-mulação, em , do Princípio da Equivalência, que se constitui-ria posteriormente na célula mater da sua Teoria da RelatividadeGeral. Um outro fator positivo para o seu reconhecimento acadê-mico foi a publicação, ainda em , pelo seu ex-professor Her-mann Minkowski (então lecionando em Goettingen), de umanova e mais rigorosa formulação matemática para a Teoria daRelatividade Restrita. Minkowski, quando professor de Einsteinna ETH, não havia tido um bom conceito sobre ele, referindo-seironicamente ao mesmo, como já dissemos, como um “cão pre-guiçoso” devido às suas faltas constantes às suas aulas.

Minkowski tornara-se agora um dos principais artífices da am-pla aceitação da Teoria da Relatividade pelos físicos após a publi-

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cação em do seu famoso artigo sobre a mesma. Esta pu-blicação de Minkowski, juntamente com uma célebre palestrasobre a estrutura matemática da Relatividade apresentada porele em , ajudou decisivamente a abrir as portas do mundoacadêmico para Einstein. Pode-se até especular o quão frutíferapoderia ter sido uma colaboração acadêmica entre os dois, a par-tir de um possível reencontro de Einstein com o seu ex-professor.Isso, entretanto, não foi possível, pois, Minkowski faleceu em de janeiro de , sem chegar a ver o sucesso do “cão preguiçoso”ser fomentado pela oportunidade daquela sua contribuição.

A escalada do reconhecimento acadêmico de Einstein prosse-guiu em com um convite da Universidade de Genebra paraoutorgar-lhe o seu primeiro título de Doutor honoris causa, emcomemoração aos anos daquela instituição fundada por Cal-vino. Junto a outras personalidades de renome mundial, comoMadame Curie, Ernest Solvay, Wilhelm Ostwald, Einstein rece-beu a sua comenda em um suntuoso banquete realizado no salãonobre daquela Universidade. Seguindo a sua verve irônica, Eins-tein – de acordo com o seu próprio relato a Carl Seelig – teria ditodurante a solenidade a alguém sentado ao seu lado:

“você imagina o que Calvino teria feito se estivesse aqui? Ele teriaerguido uma enorme estaca e queimado-nos em uma fogueirapor tão culposa extravagância.”

Dois meses depois daquele evento em Genebra, Einstein re-cebeu em Berna o físico berlinense Rudolf Ladenburg, que lhetransmitiu um convite oficial para apresentar uma conferênciano Congresso de Físicos de Língua Germânica a ser realizado emSalzburg naquele mesmo ano de . Após haver recebido o seuprimeiro título de Doutor honoris causa em Genebra, Einsteinpreparava-se agora para apresentar o seu primeiro trabalho emum congresso científico. Ele já tinha então quase trinta anos ecerta vez confidenciou a um colega, com uma ponta de ironia, aoportunidade que lhe abrira aquele evento, dizendo que ele atéentão:

“nunca havia conhecido pessoalmente um físico de verdade.”

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A acolhida a Einstein no congresso de Salzburg foi a mais re-ceptiva possível. O grande Max Planck, diretor do Instituto deFísica da Universidade de Berlim, convidou-o para escrever umprefácio para o seu novo livro intitulado “Para onde vai a Ci-ência?”. Einstein, humildemente, respondeu-lhe que seria umapresunção de sua parte apresentar Planck ao público, pois o des-cobridor da Teoria Quântica não precisava da luz refletida deuma luminária qualquer menos brilhante que a sua própria.

Paradoxalmente, naquele mesmo congresso, a apresentação daRelatividade Restrita ficou ao encargo de Max Born, um físicotrês anos mais jovem do que Einstein, que havia sido aluno deMinkowski em Goettingen. Segundo Born,

“as preocupações de Einstein já estavam muito além daRelatividade Restrita, cuja apresentação ele deixava paraprofetas menores, enquanto ele mesmo ponderava sobre os novosenigmas surgidos da estrutura quântica da luz e certamentesobre a Gravitação e a Relatividade Geral, que àquela épocaainda não estava pronta para uma discussão”

A palestra de Einstein – ainda àquela época um simples fun-cionário do Escritório de Patentes – foi intitulada: “O Desenvol-vimento da Nossa Visão da Natureza e da Constituição da Radi-ação” e passou desde então a ser considerada como um marcono desenvolvimento da Física. Naquela memorável apresentação,ele vislumbrou com clareza a necessidade do desenvolvimento deuma nova teoria para a radiação que unificasse as suas naturezasondulatória e corpuscular. Foi tão arrojado em sua exposiçãoque o próprio Planck, o primeiro a lhe interrogar, afirmou pe-remptoriamente que aquilo lhe parecia um passo que, em suaopinião, ainda não era absolutamente necessário. Einstein res-pondeu argumentando que a emissão de energia na forma de luzcausava uma mudança de massa e que os processos elementaresde emissão se davam não como uma onda esférica, como exigia ateoria clássica, mas como uma radiação direta, como uma agulha.Tempos depois, Lise Meitner, então uma estudante de Planck,

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ainda se recordaria do enorme impacto causado por aquela pa-lestra de Einstein na comunidade dos físicos presentes.

De volta do Congresso de Salzburg para Berna, Einstein en-contrava-se ainda na paradoxal situação de ser uma celebridadeem ascensão e não ter, entretanto, ainda um emprego perma-nente como professor em uma Universidade.

Apesar de todas as dificuldades e afastado do meio acadêmico,Einstein continuou a publicar regularmente trabalhos relevantesem importantes revistas, principalmente na Annalen der Physik.Entretanto, apenas em , ele conseguiu obter, ainda assimcom grande dificuldade, o tão simples e almejado cargo de pri-vatdozent, na Universidade de Berna, que como dissemos antesera uma espécie de professor particular universitário sem salárioe com as aulas pagas diretamente pelos alunos obtidos; um passo,porém, necessário na carreira de tradição germânica de profes-sor universitário, mais ainda para alguém como Einstein a quemnunca tinha sido oferecido antes um trabalho de Assistente.

Já em , incentivado pelo seu ex-orientador no PhD, Al-fred Kleiner, na Universidade de Zurique e pelo professor Gru-ner, Einstein havia se candidatado pela segunda vez a uma posi-ção de privatdozent na Universidade de Berna, uma posição quepela sua informalidade poderia ser perfeitamente conciliada como seu emprego de técnico no Escritório de Patentes. Einsteincandidatou-se para lecionar Física Teórica e submeteu como umaprova da sua capacidade o seu curriculum vitae e cópias dos seusartigos publicados em na Annalen der Physik, incluindo aía sua tese de PhD. Entretanto, ainda desta segunda vez, Eins-tein insistiu em ter os seus méritos avaliados segundo a regra deexceção, sem apresentar a esperada tese de habilitação ao cargo.Como a resposta não foi imediata, Einstein, com uma mistura dasua natural impaciência em aguardar os acontecimentos com umcerto otimismo, resolveu escrever uma carta ao professor Grunerque também o havia incentivado na apresentação de sua candi-datura. Nesta carta, Einstein demonstrava, já de forma clara asua preocupação educacional afirmando a convicção de que a suatarefa de ensinar, caso a sua candidatura viesse a ser aceita, deve-ria ser algo produtivo para os seus estudantes. Para concretizar

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este seu desejo, ele enfatizava essa sua convicção educacional deum modo um tanto ansioso: “eu deveria dar um curso capaz dedesenvolver e fomentar o interesse de certos estudantes. O tempoque eu terei de gastar nas aulas deverá ser usado da melhor formapossível, isto é, eu gostaria de apresentar uma aula adaptada aograu de conhecimento e aos interesses dos estudantes”. Em seguida,ele completa o seu pensamento com uma espécie de reverênciaao professor Gruner: “talvez fosse também lucrativo se as minhasaulas pudessem ser um tipo de suplemento para as suas duas aulas”.

Apesar do interesse educacional demonstrado por Einstein, aavaliação dos seus méritos acadêmicos, mais uma vez, não foidas melhores. O seu artigo sobre a Relatividade foi tido sim-plesmente como “incompreensível” pelo professor Aimé Foster, aquem havia sido encaminhada a referida análise, enquanto o ar-tigo sobre a sua tese tratava-se, segundo o mesmo Foster, apenasde “um exemplo divertido de um trabalho acadêmico comum quepode ser encontrado em qualquer lugar”. Einstein ainda tentou,como um reforço, juntar um outro artigo ainda não publicado,mas isso não foi aceito e a sua candidatura à posição de privat-dozent foi mais uma vez rejeitada pela Universidade de Berna.Aquela segunda rejeição da tentativa de tornar-se privatdozentfoi, para Einstein, um tremendo choque e uma nova decepção.Em que pese o grosseiro erro de avaliação, na verdade, Fostersimplesmente não queria a contratação de um privatdozent comas credenciais pouco convencionais de Einstein até aquela épocae que além de tudo não se submetesse a apresentar uma esperadatese de habilitação. Mais uma vez, o choque entre o apego às re-gras manifesto pelas autoridades conservadoras e a tendência deEinstein de desafiar as regras estabelecidas e de encontrar atalhos,custar-lhe-ia muito caro.

Se após , com as fortes evidências astronômicas favoráveisà Relatividade Geral, Einstein viria a se tornar uma celebridademundial, recebendo inúmeros convites para lecionar nas maisprestigiosas universidades do mundo, a sua situação, entretanto,na primeira década do século XX era bem diferente, apesar delejá haver publicado, até então, vários trabalhos que depois viriama ganhar notoriedade mundial. Se Einstein, já perto do final

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da primeira década do século XX, era visto por alguns físicosnotáveis – como Planck, Wien e Sommerfeld – como um jovemfísico de enorme talento, ele ainda era visto, entretanto, por ou-tros simplesmente como um rebelde e indesejável contestador daautoridade dos professores; como alguém para quem as regras es-tabelecidas eram feitas apenas para serem desobedecidas. E, alémdisso, havia ainda o preconceito de ser Einstein um judeu e umhomem que, embora já beirando os trinta anos, ainda preferia acompanhia de estudantes.

Diante das dificuldades encontradas para tornar-se professoruniversitário, Einstein chegou mesmo a procurar um cargo per-manente para ensinar Física ou Matemática em alguma escola.Entretanto, devido em parte à interferência de Kleiner, seu an-tigo orientador, Einstein resolveu fazer uma terceira tentativa eapresentar desta vez a tal tese de habilitação exigida pela Univer-sidade de Berna. Em de fevereiro de ele comunicou aoprofessor Grunner aquela sua decisão e logo após, ao submeter areferida tese, foi aceito finalmente como privatdozent na referidaUniversidade.

Aos vinte e nove anos, Einstein começava tardiamente e demodo bastante acanhado, a sua carreira acadêmica. Como oposto de privatdozent era algo praticamente simbólico e não ga-rantia em absoluto o seu sustento nem o da sua família, Einsteinprecisou conciliar o horário de suas aulas naquela nova funçãocom o seu emprego no Escritório de Patentes. Ele foi, assim, obri-gado a assumir a sua única turma em horários tidos por todoscomo bastante inconvenientes em um país europeu, iniciando àssete horas da manhã às terças e aos sábados. Sua primeira aulacomo privatdozent versou sobre a “Teoria da Radiação”; mas, ocurso concentrou-se sobre a Teoria Molecular do Calor no se-mestre de verão de . Ele tinha inicialmente apenas três alu-nos: os seus colegas do Escritório de Patentes Michelle Besso eHeinrich Schenk e mais Lucien Chavan, um outro amigo quetrabalhava nos Correios e que já havia tomado aulas particularescom ele anteriormente no início de sua estada em Berna. Pelomenos Chavan assistia a todas as aulas e o seu caderno de anota-ções ainda existe preservado hoje em dia. De todo modo, como

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assinala Brian, seria mesmo pouco provável que Einstein, pu-desse àquela altura, ainda enquanto um professor iniciante, atrairum grande número de estudantes. Einstein mesmo se confessavaàquela época como sendo um professor ainda um tanto inseguroe considerava as suas aulas como sem muito brilho. Como vere-mos, essa situação mudaria bastante nos anos seguintes, apesarde que Einstein jamais viria a se converter em um professor dotipo metódico e tradicional. No semestre seguinte, no inverno de-, um primeiro aluno regular, Max Stern, somou-se aosseus três amigos para seguir o seu curso de Teoria da Radiação.Stern não era um estudante de Física, mas um aluno de Matemá-tica com interesse em ciência. No semestre seguinte, no verão de, os seus três amigos não mais se matricularam em seu curso,restando apenas Max Stern. Einstein quebrou, então, de vez comtoda e qualquer formalidade e passou a lecionar ao seu estudanteem sua própria casa, mas logo após cancelou o curso.

As condições, entretanto, estavam mudando. Desde o ano an-terior (), ele havia sido sondado pelo seu ex-orientador oprofessor Alfred Kleiner para ocupar um cargo permanente deProfessor Associado na Universidade de Zurique. A coisa, en-tretanto, não ocorreu de forma tranqüila, como possa parecer àprimeira vista. Em , Kleiner, que já havia ajudado Einstein aobter o cargo de privatdozent, assistiu a uma das aulas de Einsteinem Berna e como um resultado do que presenciou, ele mudouradicalmente de opinião sobre a oportunidade de sua indicação.O entusiasmo de Kleiner na contratação de Einstein decresceu,pois ele achou, segundo conta Philipp Frank, que o conteúdoapresentado por Einstein não estava de acordo com o nível cor-reto dos estudantes. Além disso, a maneira muito solta com queEinstein conduzia então as suas lições, sem um rígido plano deaula, não se encaixavam na visão educacional um tanto ortodoxade Kleiner. O próprio Einstein admitiu posteriormente ao seuamigo Laub que naquele dia a sua aula não havia sido mesmodas melhores, em parte porque ele não havia se preparado muitobem e em outra parte porque ele havia ficado nervoso ao se sentirfiscalizado por Kleiner. Ao comentário de Kleiner de que aqueletipo de aula não se adequaria às exigências da Universidade de

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Zurique, Einstein respondeu dizendo apenas que não pretendiamesmo ser indicado para lecionar na Universidade de Zurique.Talvez ele estivesse mesmo sendo sincero, pois aquela era umaUniversidade cantonal e não uma instituição federal de maiorprestígio, como a ETH, por exemplo. De todo modo, Einstein,àquela época, não estava em condições de fazer tais escolhas.

Por outro lado, quaisquer que fossem as reais intenções deKleiner, outros fatores estavam também em jogo. Kleiner tinha,então, como seu assistente um jovem físico, Friedrich Adler, quehavia sido colega de Einstein na ETH e que era filho do influ-ente político Viktor Adler, fundador do Partido Social Demo-crata. Friedrich era um ativista político militante e o seu pai que-ria vê-lo afastado da política e por isso desejava que ele seguisse acarreira como físico. A maior parte do comitê de educação, res-ponsável pela referida nomeação, era constituída por membrosdo Partido Social Democrata. Em condições ideais, isso não teriaa menor importância, mas o fato é que o cargo foi oferecido aAdler. A perda do cargo não parece haver preocupado Einsteinque escreveu a um amigo dizendo que o caso não havia dado emnada; mas, que apesar de tudo, ele estava feliz. O caso, entretanto,não estava terminado. O jovem Friedrich Adler era um homemde excepcional integridade e cujas atitudes políticas o levariama ser preso alguns anos depois. Tendo ele tomado ciência deque Einstein teria aceitado o cargo, caso este lhe houvesse sidooferecido, Adler escreveu para o comitê de educação de formadura e contundente: “se é possível obter um homem como Eins-tein para a nossa universidade, seria um absurdo escolher-me. Eupreciso ser bastante franco e dizer que a minha habilidade como pes-quisador em Física não pode ter a mais leve comparação com a deEinstein. Uma tal oportunidade de conseguir um homem que possabeneficiar-nos tanto quanto elevar o nível geral da universidade nãodeveria jamais ser perdida por qualquer simpatia política”. Adlerdirigiu-se de forma semelhante ao seu pai e a Kleiner instando-osa terminarem a disputa e fazerem uma firme recomendação paraa indicação de Einstein.

Nesse meio tempo, Einstein decidido a abandonar o seu postono Escritório de Patentes continuou a sua procura por um ou-

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tro emprego de professor mesmo sem ser em uma universidade.Tentou obter, sem sucesso, um lugar no Colégio Técnico de Win-terthur, onde já havia lecionado temporariamente alguns anosantes. Tentou também uma colocação no Ginásio Cantonal deZurique para lecionar Matemática, igualmente sem um resultadopositivo. O seu desejo de ensinar parecia genuíno, pois, quarentaanos depois ainda recordando de tal época diria que: “ensinar ésempre algo satisfatório quando se tem o interesse dos mais jovens”.Em uma outra ocasião, dirigindo-se a uma jovem que iniciava asua carreira de professora escolar, afirmou que: “eu teria tomadoa mesma opção para mim mesmo no início da minha carreira, maseu não consegui encontrar um emprego”.

As tentativas mal sucedidas de Einstein de obter um empregoforam atenuadas, em face da postura de Adler, com a obtençãodo cargo pretendido na Universidade de Zurique. Ainda assim,Einstein precisou convencer Kleiner de que ele tinha algum ta-lento enquanto professor e teve, assim, de apresentar uma con-ferência em Zurique antes da sua contratação pela Universidade.A conferência teve lugar na Sociedade de Física em Zurique emmeados de fevereiro de e segundo Einstein informou poste-riormente a Laub, dessa vez, ele havia se saído muito bem, poisKleiner aprovara a qualidade da sua apresentação, ainda que elanunca viesse a ser totalmente do agrado do seu ex-orientador. Ojulgamento de Kleiner não deixa dúvidas quanto à sua impressãopessoal dos talentos de Einstein como professor. Após enfatizaras qualidades de Einstein como pesquisador, ele acrescentou que:

“o Dr. Einstein provará ser de grande valia também comoprofessor, pois ele é muito inteligente e consciencioso para nãoestar aberto a aceitar conselhos sempre que necessário.”

Em julho de , Einstein pediu demissão do Escritório dePatentes em Berna o que causou sério constrangimento ao seuchefe, o Sr. Haller que, de início, mostrou-se surpreso e recusou-se a aceitar o seu pedido; mas, finalmente, consentiu admitindoque as motivações de Einstein eram de fato o ensino e a pesquisa

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científica. Einstein mudou-se, então, para Zurique e em outu-bro de assumiu o seu posto de Professor Associado naquelauniversidade. O salário, porém, era baixo e o casal Einstein teveaté mesmo de admitir alguns estudantes como hóspedes em suaresidência para complementar o seu baixo rendimento.

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Einstein como Professor na

Universidade de Zurique

O Einstein passou na Universidade de

Zurique, de outubro de a abril de , foram muitoprodutivos. Ele publicou onze trabalhos científicos na-

quele período, conciliando satisfatoriamente as suas pesquisasteóricas com as suas tarefas de ensino.

Einstein mostrou-se um professor muito popular devido emparte ao seu não apego às convenções e devido também ao seufreqüente bom humor. As suas lembranças amargas do LuitpoldGymnasium assim como as alegres recordações da escola em Aa-rau, certamente, o impediam de ajustar-se aos moldes tradicio-nais de conduta dos professores da universidade.

Logo ao iniciar o seu trabalho docente em Zurique, Einsteinescreveu para Jakob Laub: “eu me sinto muito próximo dos meusestudantes e espero estar apto para dar algumas idéias a algunsdeles”. Apesar dessa demonstração de alegria, o jovem profes-sor logo descobriu que o ensino lhe trazia também grandes de-mandas: “eu estou levando minhas aulas muito seriamente, o quesignifica que tenho de dedicar uma boa quantidade de tempo emseu preparo. Seis horas por semana mais um seminário noturnopodem não soar como algo muito ruim, mas é um bocado”. Apesar

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da sua preocupação com o tempo tomado pelas atividades de en-sino em aulas e preparações, Einstein conseguia ver nas mesmasalgo de positivo para os seus estudos: “meu tempo real livre émenor do que em Berna, mas aprende-se um bocado fazendo isso”.Na verdade, Einstein sentia a falta de tempo para a sua pesquisajustamente porque se dedicava com afinco às suas atividades deensino, não apenas conduzindo as aulas, mas preparando-as eauxiliando os seus alunos.

Ele também escreveu a Sommerfeld, um professor reveren-ciado pelos seus estudantes em Munique, que aquele seu novocargo de professor em Zurique trazia-lhe mais demandas do queele esperara e acrescentou que isso se devia à sua memória nãomuito boa assim como ao fato de que, até então, ele havia sepreocupado com o ensino apenas como um amador.

Na verdade, Einstein era realmente um iniciante na atividadedocente. As duas aulas semanais que lecionara em Berna comoprivatdozent para os seus três amigos dificilmente poderiam serconsideradas como um treinamento adequado para as necessi-dades gerais de um curso universitário. Ele estava em alerta paraeste fato e por isso mesmo não aceitou um convite, feito àquelaépoca por um editor para escrever um livro sobre a Teoria daRelatividade, pois, como se justificou: “como eu tenho pouca ex-periência de ensino seria uma completa irresponsabilidade assumiroutras obrigações antes de me tornar familiarizado com a minhanova profissão”. Einstein logo percebeu que uma carga horáriacom muitas aulas tinha o seu preço. No semestre de verão de, além das suas aulas e seminários, ele ficou responsável pelostrabalhos práticos diários para os estudantes mais avançados, queeram em número de doze, naquele semestre. Para aliviar aqueletrabalho, ele contava com a ajuda de seu assistente o Dr. LudwigHopf, que havia feito o seu PhD com Sommerfeld em Munique.Einstein e Hopf haviam se conhecido no Congresso de Salzburge os seus interesses científicos haviam apresentado uma grandesintonia.

As habilidades de ensino de Einstein haviam, de fato, melho-rado consideravelmente, mas não a sua aparência. À primeiravista, os estudantes viam o novo professor como um jovem de-

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sajeitado usando calças muito curtas e segurando um pequenopedacinho de papel, do tamanho de um simples cartão de visitas,no qual ele colocava apenas os pontos principais de sua aula.

Hans Tanner, um dos seus alunos em Zurique e que chegou ainiciar o PhD sob a sua orientação, via como uma vantagem ofato de Einstein usar apenas pequenos rascunhos como notas deaula. Segundo Tanner:

“Einstein tinha de desenvolver tudo por si mesmo, de modo quenós ganhávamos um insight direto sobre as suas técnicas detrabalho. Nós estávamos aptos, assim, para testemunharfreqüentemente os curiosos caminhos ao longo dos quais umresultado científico é algumas vezes obtido. Este tipo departicipação no processo criativo da ciência pode não ter sidosempre fácil para estudantes acostumados a métodos de ensinomais pedagogicamente estruturados.”

Apesar dessa informalidade, segundo Tanner, logo após algu-mas poucas palavras, Einstein conseguia capturar rapidamentea atenção e conquistar o coração de todos os alunos. Ele enco-rajava os alunos a interromperem a sua exposição do assunto sequalquer coisa não lhes parecesse clara. Durante os intervalos,Einstein segurava um ou outro estudante pelo braço e o atraiaamistosamente para discutir com ele o assunto apresentado. Naspróprias palavras de Tanner:

“quaisquer problemas de compreensão eram aliviados pelo fatode que o professor Einstein tinha o que naqueles dias podia serchamado de um relacionamento totalmente não profissional e,de fato, informal com os seus estudantes, como ele mesmo haviaprometido ter em carta ao reverenciado professor Sommerfeld.Assim, Einstein encorajava os seus estudantes a lhe fazeremperguntas em qualquer momento de suas aulas sempre que ascoisas não parecessem claras para os mesmos. E este métodoacadêmico provou-se bem sucedido. Não demorou muito atéque nós abandonássemos toda a nossa timidez e receio deperguntar questões tolas.”

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Tanner relembra ainda que Einstein era um professor muitoseguro e que em uma única vez demonstrou sentir alguma difi-culdade:

“ele parou subitamente no meio de uma aula e disse ‘deve haveralguma transformação matemática boba a qual eu não consigoachar neste momento. Algum de vocês pode, por favor, indicarqual seja?’ Naturalmente, nenhum de nós conseguiu. ‘Entãodeixem um quarto de uma página em branco. Não vamosperder tempo. A resposta é a seguinte’. Uns dez minutos depoisEinstein parou subitamente no meio de uma demonstração.‘Consegui!’ De início, nós não entendemos o que ele queriadizer. Mesmo durante um complicado desenvolvimento de umtema, ele ainda encontrava tempo para refletir sobre a naturezadaquela particular transformação da qual não se lembraraantes. Isso era típico de Einstein”

Adolf Fisch, um antigo amigo da cidade de Aarau e que na-quela ocasião era um de seus alunos em Zurique, relembra queEinstein levava muito a sério a questão de oferecer a seus estu-dantes algo novo e substancial e perguntava repetidamente aosmesmos se eles estavam compreendendo. Por isso, nos intervalos,ele era freqüentemente rodeado pelos seus alunos e alunas quequeriam sempre lhe fazer novas perguntas. Ele sempre tentavaresponder todas as questões de uma maneira paciente e amigável.No seu primeiro semestre em Zurique, ele ensinou Mecânica,Termodinâmica, Eletricidade, Magnetismo e alguns tópicos deFísica Teórica. Suas aulas de inicio tinham poucos alunos, o queera causado pelo pouco interesse dos alunos pela Física e nãopor qualquer inabilidade do professor. Aos poucos, entretanto,o número de alunos foi aumentando e de repente, em lugar dosquatro alunos iniciais ele já tinha vinte e quatro estudantes, den-tre eles o próprio Fisch.

Adler, que ainda mantinha um posto de assistente na univer-sidade, observava também que enquanto as suas próprias aulastinham em geral apenas quatro alunos – o que estava dentro doesperado para uma universidade pequena como a de Zurique –

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os estudantes buscavam com maior freqüência assistir às aulasde Einstein como se todos tivessem de fazer os seus exames comele. Adler também observava que Einstein ensinava de formaprecisa e clara e que raramente usava notas de aula, mas apenaso seu “cartão de visitas”. O bom humor irreverente e por vezesquixotesco que ele demonstrava em suas aulas divertia os seusestudantes e a si mesmo. Em janeiro de , Einstein escreveu aum amigo dizendo que

“ensinar também me dá um grande prazer, principalmenteporque eu vejo que os meus alunos realmente apreciam o seutrabalho.”

O seu modo sempre paciente e amistoso de responder às per-guntas dos alunos fazia com que quase todos o adorassem, poisviam nele um professor diferente dos demais, que os tratava deigual para igual. Este seu modo informal de tratar os alunos inco-modava, porém, a alguns colegas mais conservadores que apreci-avam serem tratados com a esperada reverência formal devido aoposto que ocupavam e que viam a atitude de Einstein enquantoprofessor como subvertedora da boa ordem estabelecida. Apesardisso, Einstein insistia em tratar todos da mesma maneira, comrespeito e camaradagem, mas sem o uso de qualquer reverên-cia especial. Apesar dessa divergência de opiniões com algunsdos seus colegas, Einstein relacionava-se bem com todos eles,constituindo-se realmente em um espécime raro: um exemplode um bom colega de departamento. Esse seu relacionamentofácil, apesar das suas atitudes informais e da sua conhecida rebel-dia contra os excessos de autoridade, devia-se em boa parte aofato de que ele sabia conciliar bem, com alunos ou com colegas,um tratamento amistoso com um profundo respeito pelas idéiasdos outros. Os exemplos desse tipo de atitude foram muitosao longo de sua vida. Einstein tinha fora de sala de aula umrelacionamento igualmente amistoso com os seus alunos e cos-tumava convidá-los para tomar café e conversar animadamentesobre temas científicos e filosóficos, de modo semelhante ao quefizera no início de sua estada em Berna na denominada AcademiaOlímpia.

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Hans Tanner recorda-se, por exemplo, que certa vez ele mos-trara a alguns alunos, em sua casa, um artigo de Planck e lhes pas-sara o texto dizendo: “esta manhã eu recebi este artigo de Planckno qual parece haver um equívoco. Vejam se vocês conseguem en-contrar o erro enquanto eu faço um pouco de café”. Como os alunosnão conseguiram achar o erro, ele voltou, logo após, e prosseguiu:“nós não vamos dizer-lhe que ele cometeu um erro. O resultado estácorreto, mas a prova contém uma falha. Nós simplesmente vamosescrever a ele e dizer-lhe como a prova pode ser obtida. A questãoprincipal é o conteúdo, não a Matemática”.

Essa mesma atitude de possuir ao mesmo tempo um espíritoessencialmente crítico, mas de manter também um profundo res-peito em relação ao pensamento dos outros, Einstein aplicavacom todos, dos mais respeitados cientistas aos seus estudantese também às pessoas mais simples. Um exemplo dessa igualdadede tratamento dispensada aos outros pode ser encontrado em umcaso ocorrido quando ele já era um homem de idade avançada eresidia em Princeton. Segundo conta Gustav Bucky, um amigoque conviveu muitos anos com ele, Einstein recebeu uma carta,certa vez, de um jovem estudante contendo algumas proposiçõesmatemáticas, mas sem as suas respectivas demonstrações. O seucorrespondente afirmava que havia chegado às mesmas por puraintuição, mas que não tinha certeza se as mesmas eram válidas e,deste modo, pedia a opinião de Einstein sobre o assunto. Eins-tein disse a Bucky que aquelas eram de fato proposições muitointeressantes e que lhe pareciam originais. Einstein rapidamenteconseguiu demonstrar a validade das mesmas e corrigiu algunscálculos enviados pelo seu correspondente, mas não os envioude imediato para o mesmo, segundo explicou a Bucky, pois nãodesejava competir com aquele jovem em relação à prioridade da-queles cálculos. Ele apenas escreveu que as proposições, de fato,estavam corretas e que ele havia feito os cálculos e que os mesmosestariam à sua disposição a qualquer momento que ele os dese-jasse. Einstein, afirmou, porém, que seria melhor que ele mesmoainda tivesse uma chance de encontrar a solução por si próprioe assim ter a certeza e o prazer de que o fizera por seus própriosméritos. Bucky adorou a sutileza da atitude de Einstein. Segundo

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a sua observação, a maioria dos professores que recebessem umtal pedido e se prontificassem a ajudar aquele jovem, apenas en-viariam a resposta correta e dariam o assunto por encerrado.Einstein, entretanto, não se preocupara apenas em ajudar a tirara dúvida sobre a exatidão daquelas proposições matemáticas; elese preocupara também com a própria auto-estima do jovem quelhe fizera aquele questionamento.

O relacionamento de Einstein com os seus colegas em Zuri-que era realmente inteiramente amigável. Mesmo com Kleiner,seu ex-orientador de PhD, um professor tradicional e que nãoapreciava os seus métodos de ensino mais informais, Einsteindemonstrava ter uma enorme compreensão. Ele escreveu ao seuamigo Besso: “Kleiner é diferente, mas tolerável”. Para Laub, elechegou mesmo a descrever Kleiner como uma pessoa muito agra-dável: “ele está me tratando como um amigo e não mantém nadacontra mim”. Dois meses depois, ele escreveu novamente a Laubdizendo-lhe que apesar de Kleiner, o chefe do Instituto, não serum físico excepcional, ele era, porém, uma pessoa esplêndidade quem ele aprendera realmente a gostar. Na verdade, comoassinala Folsing, já tendo Einstein observado a elite da ciênciareunida no congresso de Salzburg, ele evidentemente mantinhaapenas uma visão tolerante da mediocridade profissional de Klei-ner. O lado humano do relacionamento profissional, porém,falava mais alto para Einstein:

“parece que a reputação científica e as qualidades pessoais nemsempre caminham lado a lado. Para mim, uma pessoaharmoniosa é mais válida do que o mais sofisticado criador defórmulas ou inventor de sistemas.”

O seu relacionamento fácil com os colegas não impediu queos mesmos vissem o seu comportamento informal como pro-fessor como algo um tanto excêntrico. Para a maior parte dosmesmos, ele se comportava como se ainda fosse um estudantecom uma língua ferina usando roupas desajeitadas e balançandoum relógio de corrente. Definitivamente, ele não se ajustava àboa imagem aceita de um verdadeiro professor suíço. Com a

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exceção de alguns poucos físicos e matemáticos, poucos entãoestavam atentos para o fato de que aquele jovem e desajeitadoprofessor era um dos maiores gigantes jamais surgidos no campoda ciência.

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Da Curta Estada em Praga ao

Retorno a Zurique

R, o impacto dos trabalhos científicos de Eins-

tein foi aumentando a sua reputação como um grandepesquisador. Uma celebridade em ascensão, Einstein

percebia, desde então, que as muitas tarefas de ensino cobravam-lhe um preço muito alto. Por esta razão e pelo baixo salário naUniversidade de Zurique, ele aceitou um convite para assumiruma cátedra de Física Experimental na Universidade de Praga.Como professor titular em Praga, ele teria uma menor carga deensino e um salário bem mais alto.

A sua saída de Zurique foi profundamente lamentada pelosestudantes que protestaram junto à direção da universidade nosentido de fazer todos os esforços possíveis para valorizar e man-ter o seu querido professor. Eles apontaram que Einstein de umamaneira admirável havia sido bem sucedido em apresentar osdifíceis problemas da Física Teórica de um modo tão claro e com-preensível para os mesmos que era sempre um grande prazer as-sistir às suas aulas. Além disso, segundo eles, Einstein conseguiaestabelecer um relacionamento tão cordial com os seus ouvintesque eles estavam convencidos de que aquele tipo de ensino seriaum grande benefício para a universidade.

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A estada em Praga não foi das mais felizes. Conflitos étni-cos, água poluída, mosquitos, sujeira e o desagrado de sua pri-meira esposa, Mileva Maric, com a cidade abreviaram a sua per-manência naquela universidade. Por outro lado, o próprio en-sino não lhe parecia tão prazeroso em Praga. Os seus estudantespareciam-lhes menos interessados e menos trabalhadores do queos da Suíça. Eles não pareciam simpatizar com os estudos cien-tíficos. Após um ano de ensino infrutífero, Einstein desejava ar-dentemente ter estudantes mais inteligentes; mas, acima de tudo,era a falta de interesse dos mesmos por um assunto que ele achavatão belo que o tornava deprimido. Como já observara Tanner,a ausência de interesse e de participação dos alunos no tipo deaula analítica e criativa que Einstein costumava adotar poderiaser, em parte, creditada ao fato deles estarem acostumados e aco-modados a métodos de ensino mais tradicionais e voltados maispara a memorização do que para a reflexão. Mesmo assim, haviaalgumas gratas exceções em Praga como se pode depreender dasobservações de Gerhard Kowalewski sobre as aulas de Einstein.Para ele, Einstein tinha uma maneira essencialmente modesta deagir com a qual ele conquistava todos os corações. Ele falavade um modo vivo e claro, de uma maneira absolutamente nãoformal incluindo, de forma natural e de vez em quando, umtoque relaxante de bom humor. Muitos ouvintes surpreendiam-se como a Teoria da Relatividade nas apresentações de Einsteinpoderia parecer algo tão simples.

Max Brod que também conviveu com Einstein em Praga re-lembra que freqüentemente ele o surpreendia e deixava-o entu-siasmado ao testemunhar a facilidade com a qual ele se conduzianas discussões e nas disputas de opiniões. Einstein intencional-mente experimentava mudar o seu ponto de vista e de vez emquando adotava, tentativamente, uma visão oposta àquela atéentão por ele assumida, enfocando o problema, deste modo, porum ângulo totalmente novo. Ele parecia deliciar-se em explorartodas as possibilidades do tratamento científico de um assuntocom um arrojo incansável. Sempre com virtuosidade e com umaclara intenção de divertir-se intelectualmente, ele nunca se auto-restringia a evitar qualquer multiplicidade do tratamento das

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idéias e ainda assim retinha sempre uma compreensão cheia decriatividade e confiança.

O modo heterodoxo e informal de ensino adotado por Eins-tein, com mudanças propositais e constantes de enfoque que vi-savam explorar os muitos ângulos dos assuntos tratados, certa-mente, exigia dos alunos uma ativa participação intelectual nemsempre fácil de ser obtida quando o interesse pelo assunto nãoatingia os níveis desejados. Neste sentido, Heinrich Zangger, umamigo que privou de sua intimidade, fornece-nos um retrato fielde Einstein como professor:

“ele não era um bom professor para alunos preguiçosos quequisessem meramente preencher os seus cadernos com as suasnotas de aula e, então, aprender por memorização para osexames. Ele não era um expositor linear; mas, qualquer um quedesejasse aprender honestamente e profundamente a construiras suas idéias físicas, a examinar cuidadosamente todos ospressupostos, a ver as falhas e os problemas, a rever aconfiabilidade das suas reflexões encontraria em Einstein umprofessor de primeira classe porque tudo isso emergia de formaimpressionante em suas aulas as quais exigiam participaçãointelectual e envolvimento em toda a extensão dos problemasabordados.”

Zangger também desmente qualquer possível desinteresse deEinstein pelo ensino. Ele insiste no ponto de que Einstein apenasdesejava freqüentemente mais tempo para refletir sobre as suaspesquisas e que justamente por levar o ensino muito a sério, estelhe tomava muito tempo de trabalho. Além disso, por ele de-senvolver um tipo de ensino reflexivo, crítico e altamente partici-pativo, Einstein necessitava de estudantes realmente motivadose que se dispusessem a um efetivo envolvimento intelectual enão apenas de alunos com um comportamento passivo, de merosreceptores de um conhecimento já pronto e acabado.

Otto Frisch conta que Einstein tinha um maravilhoso poderde concentração e que este parecia ser o grande segredo do seu

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sucesso. Ele podia pensar por horas seguidas com uma concen-tração profunda do tipo que mesmo a maior parte dos físicos só écapaz de manter por alguns segundos de cada vez. Ele conta que,certa vez, Einstein havia marcado um encontro com um amigoem uma ponte quando ainda trabalhava em Praga. O amigoatrasou-se umas duas horas e chegou correndo ao tal encontro,encontrando Einstein encostado no parapeito da ponte e comum ar pensativo. O amigo aproximou-se envergonhado e pediudesculpas a Einstein. Este, entretanto, disse-lhe calmamente quenão se importasse, pois ele conseguia pensar do mesmo modoem qualquer lugar.

Durante a sua curta estada em Praga, Einstein foi convidadopara assumir uma cátedra na Universidade de Utrecht assim co-mo também uma outra na Universidade de Leiden. Em ambosos casos, a figura de Lorentz estava por trás de tais convites. Eins-tein teve dificuldade em não aceitá-los; mas, terminou cedendoa um outro convite que lhe tocava pessoalmente, da sua antigaescola, a ETH de Zurique. Convidado por Marcel Grossmann,seu ex-colega de classe e na ocasião diretor da Politécnica, o seuprimeiro impulso deve ter sido o de aceitar de imediato. Entre-tanto, mesmo desejando afastar-se de Praga, Einstein não levouem conta apenas os seus interesses pessoais e, apesar de aceitar,alegou que seria melhor assumir o cargo no início do próximoano acadêmico porque aquilo seria o melhor no interesse do en-sino do que assumir um curso em andamento.

A cátedra na ETH era de Física Teórica, o que se ajustava bemmais aos seus interesses pessoais do que a de Física Experimentalque até então ocupava na Universidade de Praga. Além disso, assuas obrigações de ensino foram definidas de um modo não usualpara um professor tão jovem como ele àquela época. O simplesfato de que a cátedra em Zurique não lhe atribuía quaisquer obri-gações de ter de conduzir aulas de Física geral para turmas muitograndes ou de ter de supervisionar trabalhos de laboratório já eraalgo bastante atrativo e em sintonia com os desejos de Einstein.Ele teria que ensinar apenas a estudantes mais experientes osquais deveriam se constituir em um pequeno grupo de alunosmotivados e com um treinamento básico o que lhes possibilitaria

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um benefício especial das características peculiares de Einsteincomo professor. Que tais ajustes se adequavam perfeitamente aosanseios de Einstein pode-se depreender de suas palavras a AlfredStern:

“dá-me um grande prazer ter a possibilidade de trabalhar comoprofessor na Suíça.”

Naquele mesmo ano de , Einstein recusou um convite paraapresentar uma série de palestras como professor visitante naUniversidade de Columbia, em Nova York. Segundo ele afir-mou ao seu amigo Zangger, ele então não tinha qualquer apreçopelo negócio rentável de grandes conferências públicas. O futuro,entretanto, com as dificuldades financeiras e os apelos da famalhe fariam mudar completamente esta perspectiva. Ele, de fato,viria a se tornar depois um verdadeiro palestrante itinerante. Namesma época, Einstein declinou também de um convite paratrabalhar no Instituto Físico-Técnico de Berlim assim como tam-bém de um outro para lecionar na Universidade de Viena.

Apesar de tal atitude em recusar os convites, ele aceitou daruma palestra em Viena na qual ficou marcada uma de suas prin-cipais características como professor – a de criar metáforas comoilustrações divertidas. Naquela ocasião, Einstein para falar daTeoria da Relatividade lançou mão de uma ilustração na qualdois físicos acordavam-se de um sono profundo e notando queestavam em um quarto fechado com paredes opacas, emboraequipados com todos os instrumentos e apesar de todos os seusesforços, não estavam aptos para descobrir se o seu quarto estavaem repouso sobre algum corpo celeste ou se alguma força externaatuando sobre o mesmo lhe comunicava um movimento unifor-memente acelerado. Este tipo de ‘experimento em pensamento’era algo freqüente tanto em suas pesquisas quanto em suas aulas.

Naquela mesma palestra de Viena ficou patente também umaoutra característica marcante de Einstein – a elegância e a sutilezacom que conduzia as suas argumentações quando frontalmentequestionado. Naquela ocasião, o professor Gustav Mie provo-cou uma discussão apaixonada, ficando muito zangado porque

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Einstein não havia mencionado uma teoria de sua autoria. Eins-tein calmamente explicou que ele não havia falado sobre a teoriado professor Mie porque, nela, a equivalência entre a massa e ainércia não eram estritamente observadas. Com uma sutil ironia,ele observou então que seria ilógico partir de certos postulados elogo depois não mais aderir aos mesmos. Mie retrucou publica-mente com uma ameaça de que em breve publicaria um tratadono qual seria mostrado que a teoria de Einstein de modo seme-lhante não necessitava da equivalência entre a inércia e a massa.Einstein sugeriu então que a discussão daquela questão poderiaser postergada até que o professor Mie houvesse publicado assuas suspeitas sobre aquele ponto. De fato, Mie veio a escreverposteriormente um artigo violentamente polêmico; mas, Eins-tein elegantemente encarou a crítica de uma forma positiva:

“eu fico encantado que os meus colegas estejam preocupados coma minha teoria, mesmo que no momento apenas com a intençãode destruí-la.”

O caráter altamente especulativo de suas idéias sobre a Rela-tividade Geral, que àquela época ainda não possuíam absolu-tamente evidências observacionais, despertou as mais variadascríticas dos seus opositores. Einstein, todavia, manteve-se fiel àlinha de raciocínio que a sua intuição lhe indicava. Os poucosindícios que então visualizava de uma teoria ainda em formaçãoe já sob ataque recebiam de Einstein uma visão irônica e elegante.Confrontado com as críticas e diante das poucas evidências dis-poníveis, Einstein reagiu de forma irônica dizendo que:

“eu sei que a natureza está nos mostrando apenas a cauda doleão. Mas eu não tenho dúvida de que o leão pertence à cauda.”

Philipp Frank, que foi seu sucessor em Praga, lembra que nooutono de Einstein havia escrito para Sommerfeld, professorde Física Teórica em Munique, dizendo-lhe que estava então to-talmente envolvido com a tentativa de solução dos problemas dagravitação e que nunca antes um tal processo parecera-lhe tão

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doloroso. Apesar disso, lembra-se Frank, Einstein nunca dei-xou que as suas ocupações de pesquisa interferissem na seriedadecom que ele encarava as suas atividades de ensino. Frank dá aindao seu testemunho de que, ao substituir Einstein, os seus estudan-tes lembravam-se entusiasticamente de Einstein e afirmavam queele costumava convidá-los a procurá-lo com os seus problemassempre e a qualquer momento que eles sentissem a necessidadede ajuda. As palavras de Einstein haviam ficado gravadas namemória de seus estudantes em Praga. Na mesma época emque escrevera para Sommerfeld dando-lhe conta do seu dolorosoprocesso de pesquisa, lembra Frank, Einstein dizia calmamenteaos seus estudantes:

“eu sempre estarei disponível para recebê-los. Vocês nunca meperturbarão, pois eu posso interromper o meu trabalho aqualquer momento e reassumi-lo imediatamente tão logo que ainterrupção tenha terminado”

Einstein retornou a Zurique em outubro de para assumiro cargo de professor de Física Teórica no novo departamentoVIII da ETH, que havia sucedido a seção VI-A onde ele haviaestudado. As negociações haviam começado desde setembro doano anterior e o convite havia partido, como mencionamos, deMarcel Grossmann, seu ex-colega de classe e, então, diretor dodepartamento de Física e Matemática da ETH. Era um tanto irô-nico que Einstein fosse convidado para trabalhar na instituiçãoonde havia estudado, a mesma que o havia rejeitado anos atrás,logo após a conclusão do seu curso. Einstein sentiu-se atraídotambém com o convite para reformular o então desatualizadocurrículo do curso de Física que tanto o atormentara nos temposde estudante. Ele escreveu ao seu amigo e professor da ETHAlfred Stern: “Aleluia!”, logo após a confirmação da sua indica-ção, declarando a alegria de toda a sua família com a notícia doretorno a Zurique.

Einstein ocupou o posto de professor catedrático de Física Teó-rica na ETH em de outubro de e permaneceria ali até a suamudança para Berlim na primavera de . Na ETH, Einstein

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assumiu três horas de aulas semanais de Mecânica Analítica eduas horas de aulas de Termodinâmica além de um semináriode pesquisas com os estudantes mais avançados sobre artigos aserem escritos em Física.

Segundo Otto Stern – que havia vindo para Zurique justa-mente para trabalhar com Einstein – as suas aulas eram sempreexcelentes; mas, não eram coisas destinadas a iniciantes. Isso,entretanto, estava bem de acordo com a intenção da adminis-tração da universidade de que fosse oferecido algo especial aosestudantes mais avançados. A iniciativa era muito interessante,pois Einstein sempre desenvolvia os seus raciocínios de um modobastante sofisticado e acima de tudo revestido de um tratamentofísico sempre muito especial. Esse tipo de enfoque ocorria tam-bém nos colóquios de pesquisa conduzidos por ele, segundo ostestemunhos de muitos de seus ex-participantes.

Os colóquios eram uma atividade extra que Einstein havia es-tabelecido para si mesmo. Em acréscimo às suas aulas e ao semi-nário com os estudantes, Einstein decidiu, por vontade própria,conduzir também um colóquio semanal sobre Física aberto atodos os interessados, incluindo aí os colegas e os estudantes emgeral. A sua iniciativa de organizar tais colóquios, apesar delejá ter uma considerável carga de trabalho, demonstra o quantoas atividades de ensino e o contato com os estudantes e os co-legas eram-lhe algo prazeroso. Einstein, na verdade, simples-mente retomava, assim, um costume que havia estabelecido parasi mesmo anteriormente já no período de a quandoestivera lecionando na Universidade de Zurique.

Os colóquios liderados por Einstein em Zurique tornaram-seuma referência importante na comunidade internacional dos fí-sicos pela reputação daquele que os conduzia e serviram de palcono qual vários jovens físicos de talento iniciaram as suas ativida-des de pesquisa. Ninguém deixava de se sentir em casa naqueleambiente efervescente em que os colóquios vieram a se trans-formar. Uma seleção, ainda que pequena, das impressões guar-dadas daquelas reuniões pelos seus participantes pode ser algobastante ilustrativo para que se possa perceber parte do talentoe das qualidades humanas de Einstein como professor. Um tal

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apanhado das opiniões dos participantes daqueles memoráveiseventos conduzidos por Einstein em Zurique foi recolhido recen-temente por Boris Yavelov () e nos permite tecer um quadromais próximo da realidade do que era a atitude de Einstein paracom os seus alunos e colegas.

Max von Laue, por exemplo, que pouco depois viria a ganharo prêmio Nobel em Física pelos seus trabalhos sobre Raios X,era um dos participantes daqueles colóquios. Ele relembra queEinstein mantinha vivas discussões com os presentes sobre osmais novos desenvolvimentos na Física e que embora os encon-tros tivessem lugar no prédio do Instituto de Física da ETH, osprofessores e estudantes da Universidade tinham livre acesso ecompareciam também em grande número. Após as discussões,Einstein sempre convidava a todos aqueles que quisessem para ircom ele comer no restaurante Kronenhalle, onde as discussõesprosseguiam em um tom ainda mais informal. As mais vivasdiscussões sobre a nascente Teoria Atômica tomavam lugar emtais reuniões nas quais jovens estudantes como Herzfeld e OttoStern (futuro prêmio Nobel de Física) gravitavam em torno dafigura magnética de Einstein. Tal comportamento também eraválido mesmo para visitantes ilustres como Paul Ehrnfest, colegade Lorentz na Holanda.

Um outro participante regular dos colóquios era David Rei-chinstein que viria a escrever em uma bela biografia de Eins-tein. Reichinstein relembra que além de discutir com os parti-cipantes os mais interessantes temas da pesquisa em Física daépoca, Einstein sempre se portava de modo calmo, falando emvoz baixa e com os olhos profundamente pensativos e que eletambém jamais assumia um tom professoral; mas que, pelo con-trário, primava sempre por sua extrema cordialidade. Naquelesencontros, novos artigos eram lidos em voz alta sendo seguidospor uma ativa discussão. Após tais discussões, Reichinstein con-firma as lembranças de Laue de que Einstein sempre convidavaos presentes para tomar café com ele e que em tais ocasiões, aconversa prosseguia de modo ainda mais informal.

Imperceptivelmente, Einstein tornou-se o mestre de todos a-queles participantes, mesmo dos seus colegas professores, no sen-

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tido mais direto da palavra. Reichinstein também recorda que emuma única vez Einstein não os convidou para tomar café após ocolóquio, em sua simplicidade, ele lhes explicou que a sua esposaestava lavando roupas e que ele precisava tomar conta do bebê.Naquela sua simplicidade, ele também nunca se pretendia comoo dono da verdade. Certa vez, conta-nos ainda Reichinstein,Laue discordou veementemente de Einstein sobre uma questãoda Teoria da Relatividade. Einstein simplesmente sorriu para eleamistosamente e disse-lhe

“afinal, não é de todo necessário que todos os físicos devamconcordar com isso.”

Adriaan Fokker, um físico que viria depois a ser professor deAbraham Pais, famoso biógrafo de Einstein, relembra como Eins-tein era ponderado ao criticar certas idéias que para muitos pare-ciam como coisas absurdas. Quando Bohr, por exemplo, lançouem a sua explicação revolucionária para as séries espectrais,muitos o tomaram inicialmente como um herege. Otto Stern eMax von Laue comentaram durante um colóquio que a expli-cação de Bohr parecia-lhes romper com o Eletromagnetismo deMaxwell e que era assim, para eles, algo sem nenhum sentidoe que se ao final aquela teoria se mostrasse vitoriosa, eles cer-tamente abandonariam a Física. Stern e von Laue, entretanto,não tardariam em mudar radicalmente de opinião e em se torna-rem grandes articuladores das idéias de Bohr. Einstein, naquelamesma ocasião mostrou-se bem mais comedido e não reagiu deimediato; mas, ao contrário, manteve-se calado e pensativo. Rei-chinstein recorda, porém, que apesar de cauteloso ao fazer as suascríticas, os comentários de Einstein e as suas objeções à lógicacomumente aceita, invariavelmente, impressionavam a sua au-diência. Ele freqüentemente vestia as suas objeções em um tomdivertido, quase cômico; as suas piadas, o seu bom humor e asua argúcia estavam muito além da capacidade de descrição dosparticipantes.

Frank, que conheceu Einstein muito bem, ainda em Praga,recorda-se que o grande cientista nunca parecia irritado, dife-rentemente de muitos dos seus colegas, quando certas questões

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ingênuas lhes eram dirigidas. Em tais ocasiões, Einstein sempredemonstrava uma enorme paciência ao tentar explicar aquilo quelhe havia sido perguntado e, deste modo, as discussões prosse-guiam de um modo vivo e amistoso. Sua atitude em relaçãoaos estudantes era caracterizada, principalmente, por esse tomamistoso e pela presteza em ajudá-los. Quando um estudantetinha realmente um problema no qual estivesse profundamenteinteressado, mesmo se aquele fosse um problema muito simples,Einstein mostrava-se sempre pronto para dedicar qualquer quan-tidade necessária de tempo e de esforço para ajudá-lo a resolvero tal problema.

Em um ponto todos concordavam: apesar de sempre amistoso,Einstein jamais concordava com qualquer coisa que ele conside-rasse errada. As suas célebres disputas com Bohr e com Nernst,que duraram por toda a sua vida, provam tal ponto para além dequalquer dúvida.

A imagem mítica que foi construída tempos depois de queEinstein não teria o menor interesse em educar os seus estudantesnem de longe resiste aos depoimentos daqueles que o tiveramcomo professor em Zurique. E existem muito mais evidênciasdos notáveis dotes de Einstein como professor, segundo tambémassinala Seelig.

O que ficou marcado na memória de todos os que acompanha-ram os colóquios de Einstein em Zurique entre e foi queeles estavam diante de um mestre com um enorme potencial in-telectual e que apresentava as suas lições na forma de fascinantese frutíferas discussões científicas. Ficava patente, também, paratodos aqueles estudantes e professores entusiastas, presentes na-queles colóquios, que eles estavam diante de um grande homemsequioso de compartilhar com eles o seu conhecimento e as suasidéias e dotado de pródigas habilidades de ensino além do quepossuído por um enorme desejo de comunicar-se da forma maisaberta possível com os seus colegas e com os seus estudantes.

Apesar da satisfação com que Einstein desenvolvia as suas ati-vidades educacionais, o seu envolvimento crescente em um tra-balho de pesquisa extenuante fez com que ele passasse a ver cres-centemente aquelas suas atividades de ensino como um empeci-

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lho que o afastava da construção de sua teoria da gravitação. Elese sentia assoberbado com as suas aulas e seminários e esse foium dos mais fortes motivos por ele alegado para aceitar o novoconvite para trabalhar em Berlim, na Academia de Ciências e naUniversidade, onde não teria mais obrigações de ensino¹.

Quando o seu amigo Ehrenfest questionou-o sobre aquela suadecisão temerária de voltar à Alemanha, Einstein respondeu-lheque a sua atitude ímpar devia-se ao fato de que aquela cargaelevada de aulas estava mexendo com os seus nervos e que emBerlim ele não teria mais que ensinar.

Isso pode parecer um tanto estranho para alguém que durantesete anos trabalhando em um escritório de patentes havia dese-jado constantemente um cargo de professor. Porém, a seriedadecom que Einstein encarava o ensino pode ser mais bem aquila-tada pelas suas reflexões sobre o período em que havia passadoem Praga. Lá, quando as suas pesquisas teóricas não pareciamavançar no passo desejado, ele havia visto o ensino como ummodo honesto de ganhar a sua vida. Einstein chegou mesmo adizer a Hugo Bergmann, que em Praga: “todas aquelas semanascaçando um fantasma teriam sido perdidas se eu não tivesse dadoas minhas aulas e feito assim algo de útil”. O fato, portanto, deEinstein reclamar da sua enorme carga de trabalho de ensinonão deve mesmo ser visto como um sinal de qualquer desinte-resse de sua parte por tais atividades; mas, muito pelo contrá-rio, como um resultado do seu total envolvimento e da sua ex-trema dedicação às tarefas educacionais. Mesmo uma autora nãomuito simpatizante com a figura de Einstein, como a biógrafa deMileva, Desanka Trbuhovic-Gjuric, assinala essa sua dedicaçãoextremada ao ensino e chega mesmo a apontá-la como um dosfatores, ainda que não o principal, que teriam levado Einsteina dedicar cada vez menos tempo à sua própria família contri-buindo, assim, para uma crise em seu casamento. Trbuhovic-Gjuric assinala que Einstein

“mantinha com os seus alunos uma bonita relação humana.Ajudava-os nos seus trabalhos e encaminhava-os até aautonomia para que eles aprendessem a ver por si mesmos

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aquilo que era essencial nos fenômenos e nas suas inter-relações.Queria que as suas aulas fossem tal como ele e Mileva haviamdesejado que fossem quando eram estudantes. /.../ Albert nãopassava muito tempo em casa, ocupado com o seu trabalhodocente. Sua relação com os seus alunos era tão estreita queestes, inclusive, traziam os seus próprios problemas para asua casa”

Einstein estava naquela época profundamente empenhado nodesenvolvimento da sua Teoria da Relatividade Geral e trabalhavana mesma pelas madrugadas até a exaustão. Assim, o convite quelhe foi feito para trabalhar em Berlim deve ter-lhe parecido, defato, muito tentador. Em primeiro lugar, um tal convite haviapartido de duas sumidades como Max Planck e Walther Nernst,que haviam ido a Zurique especialmente para convidá-lo. Estefato constituía-se em uma verdadeira honraria. Além disso, doponto de vista prático, as condições oferecidas eram também ex-cepcionais. Ele se tornaria um membro da prestigiosa AcademiaPrussiana de Ciências, assumiria uma cátedra de Física Teóricana Universidade de Berlim e se tornaria ainda o diretor do Ins-tituto de Física Teórica Kaiser Wilhelm, a ser ainda criado. Etudo isso acompanhado por um generoso salário e uma completaliberdade para dedicar-se inteiramente à pesquisa, sem quaisquerobrigações de ensino. Era, sem dúvida, uma oferta extraordi-nária, sobretudo para um físico tão jovem como ele. Após umbreve momento inicial de hesitação, diante de tão extraordináriaoferta, Einstein aceitou-a no mesmo dia. Ele tinha boas razõesprofissionais para aceitar o convite. Berlim era um centro muitoimportante em Física no qual ele poderia trabalhar lado a ladocom outros cientistas de renome internacional. E poderia, alémdisso, fugir da rotina de muitas horas de ensino, visto que na-quele semestre em Zurique ele assumira uma carga de trabalhodocente incompatível com a importância das suas atividades depesquisa entre aulas, seminários e orientações de estudantes. Eleescreveu para Lorentz afirmando que não poderia resistir:

“à tentação de aceitar um cargo que me livra de todas as minhas

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obrigações de modo que eu possa me dedicarlivremente a pensar”

Como já assinalamos anteriormente, à primeira vista, podemesmo parecer estranho que alguém que tenha tido palavras tãogenerosas, em várias ocasiões, em relação à educação tenha ela-borado tais pensamentos. Entretanto, o verdadeiro significadodaquelas palavras de Einstein de satisfação em livrar-se das tare-fas de ensino deve ser buscado realmente mais na fuga de uma ro-tina estafante de trabalho docente, que sufocava a sua necessidadede reflexão – coisa que praticamente todos os professores conhe-cem bem – e não em um qualquer desagrado face à educação emgeral. A prova maior disso é que Einstein, mesmo dispensadoformalmente de toda e qualquer tarefa docente, jamais se furtouvoluntariamente em seu longo período em Berlim de continuarlecionando Física e apresentando os seus seminários. Se em umprimeiro momento, porém, o afastamento das tarefas de ensinopareceu-lhe como uma feliz oportunidade, ele, voluntariamente,não se beneficiou de um tal afastamento em épocas posteriores.Ao contrário, o que ele fez ao longo da sua longa estada em Ber-lim foi dosar, ao seu modo, a sua contribuição à educação dosmais jovens – entre cursos, palestras e seminários – com as suasatividades de pesquisa. E não existe prova maior de amor a umacausa do que a dedicação voluntária.

Notas do Capítulo

. Na verdade, Einstein tinha também outros motivos, talvez até bem mais fortesque aquele alegado. O seu casamento com Mileva havia atingido um estágio decompleta ruína e ele havia recentemente, em uma visita a Berlim, reencontradouma prima sua, Elza Lowenthal, então viúva e com duas filhas. Einstein viuem Elza uma possibilidade de refazer uma vida conjugal, o que de fato viria aacontecer algum tempo depois.

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A Longa Estada em Berlim:

1914 a 1932

J B, em abril de , Einstein foi

logo convidado por um importante jornal para escreverum artigo dirigido ao grande público sobre a sua Teoria

da Relatividade. Einstein aceitou o desafio daquele trabalho dedivulgação e o resultado foi tão bem sucedido que ele se viu com-pelido no ano seguinte a escrever um livro sobre o assunto. Antesdisso, entretanto, em julho de , ele ministrou uma palestra naAcademia Prussiana de Ciências que viria a ficar famosa. O temaabordado era uma reflexão sobre os métodos na Física Teórica,na qual ele assinalava a sua posição de que o ponto central de taismétodos era a descoberta dos princípios gerais da Natureza.

Em outubro do mesmo ano, ele ministraria duas outras pales-tras na Academia de Ciências das quais resultaria um conjunto deanotações de cinqüenta e cinco páginas sobre a Teoria da Relati-vidade. Aquelas notas viriam a se constituir, no ano seguinte, emum embrião de um livro sobre a Relatividade dirigido aos seuscolegas físicos em geral. De início, Einstein reagiu à idéia de pro-duzir aquele livro alegando em carta a Lorentz que não possuíao poder da comunicação. Em função disso, ele pedia a Lorentz,um mestre das boas apresentações, que escrevesse aquele livropara ele. Lorentz agradeceu, mas recusou o convite, instando-o aassumir ele mesmo a iniciativa daquele empreendimento. Talvez

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por sua modéstia ou timidez, Einstein houvesse exagerado na suaabsolutamente não existente dificuldade de comunicação. Fato éque, compelido por Lorentz, Einstein viu-se obrigado ele mesmoa dar conta daquela iniciativa. O livro veio a sair apenas emmarço de e foi um sucesso entre os colegas físicos que se es-palharia rapidamente por todo o mundo em diversas traduções.Mas, aquele não era ainda o livro que ele pensara em escreverlogo após haver publicado aquele artigo, em , em um jornalde Berlim. De fato, o livro sobre a Relatividade e dirigido a umpúblico bem mais amplo só veio a ser publicado no final de .Aquele livro de divulgação foi um sucesso tão grande que nosdois primeiros anos vendeu um total de . exemplares. Odinheiro ganho com os direitos autorais veio em hora certa. Emplena primeira guerra mundial, carente de recursos e com a suafamília passando dificuldades em Zurique, ele remeteu todo olucro obtido com o referido livro para Mileva e os seus dois filhos.

Logo ao assumir o seu novo cargo em Berlim, em , Einsteinhavia mantido-se afastado do ensino e totalmente dedicado àsua pesquisa teórica. Foi uma época difícil, separado da família,em plena guerra, com uma inflação galopante e envolvido dia enoite com as enormes complexidades de concluir a sua Teoriada Relatividade Geral. Finalmente, no final de , ele chegoua uma forma daquela teoria que lhe pareceria, até aquele mo-mento, bastante satisfatória. A publicação da mesma saiu em e foi seguida de todos aqueles trabalhos de escrita de livrosjá anteriormente mencionados.

Aquele foi um período de muita ocupação incluindo inúmerosproblemas familiares e o seu envolvimento mais recente com anecessidade de dar um parecer técnico – como consultor contra-tado por um tribunal de justiça alemão – sobre uma disputa depatentes entre uma firma alemã e uma outra americana¹.

Apesar das muitas ocupações, ele havia assumido, volunta-riamente, desde o semestre de verão de as suas atividadesdocentes da cátedra na Universidade de Berlim. Einstein deu, na-quela ocasião, um curso de Relatividade, seguido no semestre deinverno de - de um outro curso de Mecânica Estatística.Em pleno turbilhão da conclusão de sua Teoria da Relatividade

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Geral, ele se impôs voluntariamente aquela atividade de ensino.Essa sua atitude voluntária e em meio a um mar de outras ocupa-ções e de preocupações pode dar uma idéia do seu compromissocom a educação dos mais jovens.

Quantos, em tais circunstâncias e livres de quaisquer obriga-ções de ensino, teriam feito o mesmo?

A enorme carga de trabalho conjunta, já que Einstein traba-lhava incansavelmente em sua pesquisa, cobrou um preço altoe ele adoeceu seriamente do estômago, ficando aos cuidados deElza, sua prima e futura esposa, por um longo tempo. Ele semanteve, novamente, afastado das atividades de ensino durantea continuação de ; mas, reassumiu, mais uma vez de formavoluntária, tais atividades pedagógicas no semestre de verão de conduzindo a partir de então, alternativamente, dois cursos:um de Relatividade e mais uma vez um outro de Mecânica Esta-tística. As turmas, entretanto, eram muito pequenas devido aoafastamento de muitos estudantes com a guerra. Apenas aquelesinaptos para o serviço militar ou os feridos podiam participar desuas aulas quase vazias. E a freqüência teria sido ainda menorcaso as autoridades não houvessem liberado a presença das mu-lheres na Universidade desde ².

Mesmo assim, Einstein encontrava prazer em lecionar aos seuspoucos estudantes.

Desde o início de , Einstein passou a receber constante-mente as visitas de Max Wertheimer, então um jovem professorde Psicologia da Universidade de Berlim. Wertheimer assistia àsaulas de Einstein e conversava demoradamente com o mesmo. Oobjetivo de Wertheimer era o de explorar os meandros e os segre-dos do que ele denominava de um “pensamento produtivo”. Ins-pirado naquelas aulas e nas conversas com Einstein, Wertheimerfoi um dos pioneiros da importante escola psicológica da Gestalt.Suas observações daquela época vieram a se concretizar, temposdepois, em um livro famoso intitulado “Productive Thinking”.

Nesse seu livro “Pensamento Produtivo”, Wertheimer analisaos modos habitualmente usados na utilização de conceitos fami-liares e a necessidade de alargarem-se e superarem-se tais modosde utilização na tentativa de resolução de problemas. De especial

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importância nesta sua descrição é o relato feito por ele do pen-samento de Einstein que conduziu à formulação bem sucedidada teoria da Relatividade. Ele analisou, com todo o cuidado,os passos decisivos e revolucionários tomados por Einstein noprocesso de cognição. A produção do novo tinha sempre a difi-culdade de se confrontar com a forte imagem já anteriormentebem estabelecida da Mecânica Newtoniana.

Wertheimer destaca especialmente a complexidade de seremsuperadas as antigas relações estruturais estabelecidas, pela velhateoria, entre as partes e o todo ou aquilo que ele denomina asua gestalt ou configuração. Ele destaca as inúmeras mudançasde enfoque assumidas por Einstein na tentativa de buscar umnovo enquadramento mais produtivo dos conceitos e de como,neste esforço cognitivo, não apenas emergia uma nova estruturaorganizacional dos referidos conceitos, mas também como elesmesmos sofriam alterações radicais conferidas por essa nova es-trutura.

A relevância dos princípios da Teoria da Gestalt para o ensinoforam amplamente demonstradas por Wertheimer e tal relevân-cia tornou-se a base da sua crítica enfática ao ensino por repe-tição e por práticas rotineiras sem criatividade cuja fundamen-tação teórica deriva-se das teorias associacionistas da aprendiza-gem. Tomando a inspiração colhida na análise do pensamentode Einstein, Wertheimer mostrou como a simples inculcação deregras e de princípios através de práticas de simples memorizaçãomuito raramente conduzem a um pensamento produtivo.

Wertheimer mostrou, ainda, que freqüentemente em tais casosde ensino por memorização as respostas dos estudantes eramrepetições irrefletidas dos materiais estudados. Em tais casos,para ele, a ausência de um pensamento produtivo era demons-trada pela inabilidade dos estudantes em resolverem variações deproblemas originalmente apresentados aos mesmos.

Claramente inspirado no pensamento produtivo de Einstein,Wertheimer afirmou, com bastante propriedade, que os insightsna resolução dos problemas são bem mais prováveis quando osprofessores arranjam os seus problemas de um modo tal que avisão do todo esteja claramente disponível ao estudante.

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Deste modo, uma aprendizagem que possa conduzir a um pen-samento produtivo parece-nos, metaforicamente, estar baseadana relação dialética entre o vôo de uma águia – em sua tentativade captar o todo – e no passeio explorador de um tatu, buscandoas profundidades do assunto enfocado.

Muitos anos depois, Wertheimer ainda se relembraria das au-las de Einstein com saudade daqueles tempos pioneiros da cons-trução da sua Teoria da Gestalt para a qual Einstein havia ser-vido brilhantemente como um modelo inspirador. Deste modo,levando-se em conta as inúmeras possibilidades de aplicaçõeseducacionais abertas pela teoria da Gestalt assim como a sua e-norme influência no desenvolvimento posterior de todas as cor-rentes da Psicologia Cognitiva, pode-se ter, por um outro ângulo,uma real dimensão da importância e do valor educacional dopensamento de Einstein.

Entretanto, não apenas a moderna Psicologia beneficiou-seda inspiração trazida diretamente pelo pensamento de Einstein.Também a Filosofia da Ciência deve boa parte do seu desenvolvi-mento no século XX às inspirações oriundas do seu pensamentona tentativa de superação do indutivismo ingênuo. Karl Pop-per, um dos pioneiros da moderna Filosofia da Ciência, creditavadeclaradamente a inspiração original para a construção da suaTeoria do Falseacionismo Epistemológico a uma observação cui-dadosa do pensamento de Einstein.

A influência de Einstein sobre o pensamento de Popper é bas-tante perceptível e foi reconhecida pelo próprio Popper. Em umdepoimento concedido a Whitrow, por ocasião do cinqüente-nário da Teoria da Relatividade, Popper referiu-se de maneirainequívoca a essa influência recebida:

“a influência de Einstein sobre o meu pensamento foi imensa. Euposso mesmo dizer que o que eu fiz foi, principalmente,explicitar certos pontos que estão implícitos no trabalho deEinstein.”

Essa enorme influência exercida pelas concepções filosóficasde Einstein sobre os modernos filósofos da ciência pode ser aqui-latada, por exemplo, em outro trecho do depoimento de Popper

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a respeito da atitude de Einstein frente à produção do conheci-mento e particularmente ao seu combate ao verificacionismo:

“esta, eu senti, era a verdadeira atitude científica. Ela eratotalmente diferente da atitude dogmática que constantementereivindicava encontrar ‘verificações’ para as suas teoriasfavoritas. Assim, eu cheguei, ao final de , à conclusão de quea atitude científica era a atitude crítica, a qual não buscaverificações, mas sim testes cruciais; testes que poderiam refutara teoria testada, embora eles nunca pudessem vira comprová-la.”

Se considerarmos a profundidade e a extensão das interaçõessurgidas mais recentemente entre os campos da Filosofia da Ci-ência e da Educação em Ciências, poderemos por mais um outroângulo, apreciar a enorme importância educacional do pensa-mento de Einstein.

Em , Einstein recebeu um convite para retornar a Zuri-que. Seria um trabalho conjunto na ETH e na Universidade e asautoridades de Zurique prometiam-lhe uma oferta economica-mente vantajosa. Ele, entretanto, temendo a aproximação comMileva, que até então não lhe havia concedido o divórcio, e nãoquerendo também abandonar os seus colegas em plena guerra,preferiu permanecer em Berlim. Mesmo assim, ele aceitou daruma seqüência de palestras em Zurique no ano seguinte.

O ano de , na verdade, marca um ponto de inflexão naimagem mundial de Einstein. Os resultados surpreendentes daobservação do eclipse do Sol por uma equipe de astrônomos in-gleses, chefiadas por Sir Arthur Eddington, confirmaram plena-mente o desvio da luz previsto por Einstein em sua Teoria daRelatividade Geral. Aquele fato inusitado para o grande públicotrouxe-lhe o renome mundial.

Do dia para a noite, após o eclipse de , Einstein tornou-seuma celebridade mundial passando a ser assediado incessante-mente pela mídia e a ser convidado, como nunca antes, para darconferências em várias partes do mundo. A partir desse período,

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as suas ausências de Berlim para realizar algumas viagens pro-longadas apresentando as suas muitas conferências agendadas,tornaram-se uma rotina e contribuíram para afastá-lo ainda maisda sua já apenas episódica condição de docente em Berlim. Eleque, de há muito tempo, não costumava mais dar cursos regular-mente em Berlim, mas apenas quando as circunstâncias lhe pa-recessem convenientes, suspendeu de uma vez as suas atividadesde ensino e assumiu a sua nova condição de viajante da ciênciae da paz apresentando conferências pelo mundo inteiro. Por umlado, aquelas palestras atendiam às suas necessidades econômi-cas, cada vez maiores devido à inflação galopante na Alemanhado pós-guerra e que eram ainda mais exacerbadas pela obriga-ção de manter a sua família em Zurique e o seu filho Eduardconstantemente internado em hospitais. Além disso, aquelas suaspalestras eram muito bem vistas pelo novo governo alemão queprocurava através das mensagens e dos contatos de Einstein rom-per o isolamento internacional a que a Alemanha havia estadosujeita naquele período. Einstein, apesar das muitas críticas querecebia dos seus adversários, inclusive na própria Alemanha, erade longe o melhor ‘relações públicas’ de uma pátria que ele sem-pre relutou em assumir. Esses fatos todos, bem como as suasconotações políticas são descritos de maneira muito precisa porvários de seus maiores biógrafos, principalmente por AlbrechtFolsing, Abraham Pais e Denis Brian, dentre os mais recentes.

Naquilo que nos interessa mais de perto neste livro, qual seja asua atividade educacional e docente, parece interessante observarque Einstein passou a ser admirado não apenas como um íconemundial da ciência, mas também pelas suas qualidades de oradore de expositor brilhante, por grandes platéias do mundo afora. Ésobre esse aspecto de sua vida, sobre essa sua condição de grandepalestrante e de divulgador da ciência e da paz que procuraremos,agora, nos concentrar.

Nessa época, por toda a década que se avizinhava dos anos

e até mesmo até os primeiros anos da década seguinte, Einsteinvisitou vários países. Ele foi várias vezes aos Estados Unidos emexcursões demoradas, foi ao oriente médio e mesmo até o ex-tremo oriente, ao Japão e à China e visitou também a América

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do Sul, em particular a Argentina, o Uruguai e o Brasil, sem falarnas suas muitas e regulares viagens pela Europa naquele mesmoe efervescente período. Em todos os lugares por onde passava, asimpressões deixadas eram sempre muito fortes e deixaram bemregistradas as suas qualidades humanas, a sua condição de umcientista notável e os seus dotes de um grande palestrante e co-municador.

Em , Einstein ministrou uma conferência sobre a Teoriada Relatividade na Academia de Ciências de Berlim. Pouco de-pois, ele repetiu aquela mesma palestra para os estudantes daUniversidade de Berlim. Leopold Infeld estava entre os presentese ficou muito impressionado com a qualidade da sua exposição:“ninguém que estudasse a Teoria da Relatividade poderia deixar deficar impressionado com a profundidade e com a simplicidade dasidéias filosóficas de Einstein e com o charme com o qual ele explicavaaquelas idéias”. Infeld assinala ainda que “todos ficavam fascinadoscom Einstein pelo brilho dos seus olhos, pela sua timidez, pela suagentileza, pelo seu delicioso senso de humor e pelo fato de que eleparecia conseguir transformar as coisas mais triviais em sabedoria”.

A sua premiação, ainda que um tanto tardia, com o prêmioNobel de – conferido em , recebido apenas no ano se-guinte de – foi apenas um detalhe a mais na sua já festejadareputação internacional. A concessão do prêmio Nobel a Einsteinnaquela ocasião era mais uma necessidade da própria FundaçãoNobel para não cair no descrédito popular do que uma verda-deira necessidade para a consagração definitiva de Einstein en-quanto uma personalidade de destaque internacional. E isso foiclaramente expresso naquela época à Academia Sueca, instituiçãoconcedente da tão prestigiosa outorga, por muitas personalida-des de renome³.

Em meio à fama mundial conquistada após os resultados sur-preendentes das observações dos eclipses de , o interesse peloseu curso dado em Zurique ainda naquele mesmo ano – na ver-dade, um conjunto de palestras – foi enorme e em conseqüên-cia o curso contou com o elevado número de estudantes; umrecorde em se tratando de um curso para estudantes de Física erelacionado a um tema tão avançado. Einstein, entretanto, con-

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fessou a um amigo, ao final do curso que aquela atividade deensino intensiva havia sido exaustiva, que ela lhe secara a gar-ganta e os pulmões. Naquela mesma época, ele continuava aindaa conduzir as suas duas aulas semanais de Física Teórica na Uni-versidade de Berlim.

No clima revolucionário da Alemanha do pós-guerra, as sim-patias políticas de Einstein eram claramente com os movimen-tos de esquerda. Ele que havia participado de inúmeros movi-mentos pacifistas durante a guerra, incomodando com isso asautoridades alemãs, agora se via envolvido com uma militânciaainda mais ativa. Foi nesta mesma época que ele deu uma célebrepalestra destinada a angariar fundos para a causa dos estudantessocialistas e na qual ele discorreu sobre um dos seus temas pre-feridos: a necessidade de promover uma maior e mais harmo-niosa justiça social. Nessa mesma época, ele se tornou tambémprofessor visitante na Universidade de Leyden, com a obrigaçãode passar de três a quatro semanas por ano trabalhando naquelainstituição.

Suas palestras, desde então, eram sempre superlotadas. Mes-mo as suas aulas normais na Universidade de Berlim atraíam umpúblico extra de visitantes que queria apenas conhecer o famosocientista. Aquele clima de um autêntico festival incomodava osseus alunos regulares, pois muitos visitantes após alguns momen-tos retiravam-se ruidosamente atrapalhando a compreensão daaula. Eles chegaram mesmo a protestarem junto às autoridadesda Universidade. Einstein mostrava-se sempre mais tolerantecom todo aquele assédio, apesar de que o mesmo também o in-comodava. Ele sugeriu e foi atendido com a criação de palestrasespecialmente destinadas ao grande público. Desta forma, elelivrava os seus alunos regulares do referido incômodo ao mesmotempo em que atendia a curiosidade dos inúmeros visitantes.

A inflação galopante reinante na Alemanha naquela época o-brigou Einstein a aceitar os convites de palestras regiamente pa-gas nas universidades americanas que ele, antes, já havia recu-sado. Inaugurava-se, assim, uma nova época para Einstein, ade um viajante e divulgador da ciência. Ele reagia com bomhumor ao assédio às vezes inconveniente dos muitos que o tra-

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tavam como uma celebridade. Em uma ocasião, por exemplo,durante uma cerimônia que acompanhava uma palestra sua emPraga e após vários discursos de autoridades presentes diante deuma audiência fútil, Einstein foi convidado também a proferiralgumas palavras. Ele se levantou e disse que melhor do queescutar as suas palavras seria ouvir Mozart. Tomou, então, do seuviolino e simplesmente executou uma partitura daquele grandemestre da música clássica em substituição ao seu tão esperadodiscurso. Einstein era freqüentemente surpreendente, em todosos sentidos.

As muitas palestras que ele apresentava pelo mundo sempreencantavam os presentes. Testemunhos deste fascínio exercidopela sua personalidade magnética e pela sua oratória inspiradapodem ser facilmente encontrados na literatura a seu respeito enos fornecem uma descrição bastante ilustrativa de como era oseu desempenho em tais ocasiões.

Em uma palestra, por exemplo, sobre Geometria e Experiên-cia, dada em Berlim em fevereiro de , Einstein parece ter con-vencido todos os acadêmicos e mesmo aqueles até então aindaem dúvida de que eles possuíam em seu quadro, segundo Fol-sing, um verdadeiro mestre da retórica científica, alguém quecombinava uma apresentação substantiva e atrativa em um no-tável grau.

Outros exemplos interessantes do seu comportamento nas pa-lestras podem ser retirados também dos muitos colóquios de Fí-sica durante o seu longo período em Berlim, de a . Osjovens pesquisadores, ansiosos em conquistarem um lugar ao solna excitante atmosfera científica de Berlim encontravam sempreem Einstein um indivíduo democrático, invariavelmente cordiale mesmo amigável, receptivo e conseqüentemente sempre dis-posto a ajudá-los. Ele parecia neutralizar com o seu bom humoro inevitável halo de autoridade científica que o cercava. Noscolóquios, ele não fazia qualquer distinção entre discutir comum estudante ou com um membro da academia. Os estudantesadoravam aquilo de serem tratados como iguais, mas os demaisacadêmicos não apreciavam a sua atitude da mesma maneira.

Em , após uma certa pausa, Einstein reassumiu as suas

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atividades acadêmicas na Universidade de Berlim. Ele era mar-cadamente diferente dos demais professores que se vestiam demaneira formal, liam em voz alta as suas notas de aula e trata-vam os estudantes como meros subalternos. Apenas Schroedin-ger assemelhava-se a Einstein em sua conduta informal com osestudantes e em sua maneira pouco cuidada de se vestir. Eles,aliás, eram grandes amigos e já haviam trocado intensa corres-pondência antes de encontrarem-se em Berlim.

A conduta segura, porém liberal, amistosa e estimuladora deEinstein nos seminários em Berlim é testemunhada por vários deseus ex-alunos. Em conjunto com Max von Laue, Nernst e LiseMeitner, Einstein costumava estimular os estudantes de Físicacomentando de forma crítica, polida e sempre bem humoradaas idéias expostas nos seminários. Certa vez, Esther Salaman,então uma jovem estudante de Física, estava apresentando o seuseminário com a sala em semi-escuridão para que os slides apre-sentados fossem visíveis. Ela relembra que a figura de Einstein nafila da frente sorrindo amistosamente para ela parecia dizer-lhepara não se preocupar. Em meio à sua exposição que tratavade um problema envolvendo trabalhos em radioatividade desen-volvidos bem àquela época em Cambridge, ela foi interrompidapor um jovem professor da Universidade que lhe apontou umaabordagem alternativa para aquela questão de uma maneira tãocomplicada que Salaman simplesmente não conseguiu acompa-nhar os seus argumentos. Na confusão que se estabeleceu em suacabeça, ela se viu em dificuldades para prosseguir o seu seminá-rio. Einstein percebeu a situação e imediatamente veio em seusocorro. Ele se virou para o colega e disse polidamente: “muitointeligente, mas não verdadeiro”. Em seguida, ele sintetizou tudoque havia entendido e o que não havia entendido sobre o pro-blema de uma forma tão clara que todos os presentes se derampor satisfeitos.

Apesar de apresentar-se sempre cordial com os estudantes, E-instein era extremamente crítico e segundo Max Herzburger, en-tão estudante de Física em Berlim, ele freqüentemente acompa-nhava-o em caminhadas pelo parque conversando sobre os pro-blemas da Física. Segundo Herzburger, Einstein não tomava nada

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como certo apenas por estar escrito nos livros. Ele estava semprelevantando questões com argúcia e que levavam freqüentementea uma compreensão mais profunda dos problemas enfocados.

Dennis Gabor, que viria a ser um dos inventores do microscó-pio eletrônico e a ganhar o prêmio Nobel de Física em pelosseus trabalhos sobre a holografia, também foi aluno de Einsteinem Berlim. Gabor relembra com saudade aqueles seus temposde estudante e em especial a figura de Einstein. Para Gabor,ninguém jamais amou a ciência de uma forma tão apaixonadaquanto Einstein. Ainda assim, aquela sua paixão era carregada deuma grande humildade. Gabor recorda que Einstein costumavaressaltar o quanto era pequena a contribuição do ser humanopara a compreensão do mundo e que a beleza do todo é que eraalgo admirável.

Um outro estudante de Einstein em Berlim e que viria, tam-bém, a ganhar um prêmio Nobel de Física em foi EugeneWigner. Wigner é outro que sempre guardou gratas recordaçõesda conduta de Einstein como professor. Ele recorda que era Maxvon Laue quem orientava os estudantes na escolha dos temasdos seminários a serem por eles apresentados. Os temas sempregiravam em torno dos resultados de publicações recentes e aosestudantes era pedido que fizessem uma revisão do problemae uma análise crítica do mesmo. Quando a revisão era feita acontento e a exposição era capaz de fornecer uma visão clarado problema, nenhum comentário surgia da fila da frente, ondesempre se sentava Einstein. Entretanto, se a revisão do problematratado não era suficientemente clara, as questões seguramentesurgiam, especialmente da parte de Einstein. Ele estava semprepronto para comentar, para argüir ou para questionar sobre qual-quer artigo que não fosse apresentado de forma suficientementeclara. Uma das frases preferidas de Einstein, em tais ocasiões, era:“Oh, não! As coisas não são tão simples assim”. Wigner assinala,entretanto, que apesar dessa postura sempre crítica, Einstein ja-mais tentava ostentar a sua própria importância intelectual. Elenem ao menos cogitava em fazer algo desse tipo. Uma de suasmaiores qualidades como professor era exatamente a de jamaisintimidar ninguém. Ao contrário, ele aceitava as regras de um se-

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minário, compreendia que a inteligência humana é limitada, queninguém pode encontrar tudo sozinho e que todos precisavamcolaborar. Wigner assinala que talvez por isso ele jamais tenha sesentido nervoso naqueles seminários, pois Einstein fazia-o sentirque ele era alguém necessário. Para Wigner, Einstein trabalhavade uma forma simples e de um modo prestativo, sempre dispostoa auxiliar os outros. Ele era mais um amigo do que um profes-sor. Os seus pensamentos freqüentemente se tornavam filosófi-cos. Einstein era também um homem solitário que gostava demeditar sobre o mundo enquanto caminhava sozinho. Mas, eleincentivava alguns alunos a procurá-lo e Wigner era um daquelesfelizardos a visitá-lo em sua casa. Einstein conversava não apenassobre a Física, mas também sobre os problemas sociais e polí-ticos em geral. Einstein sabia ouvir atentamente e sempre comgrande interesse. Segundo Wigner, a personalidade de Einsteinera quase mágica. Parecia impossível surpreendê-lo no campo daFísica. Ele parecia antever todas as coisas de maior importânciae os conceitos pareciam ocorrer para ele como se já estivessemcompletamente compreendidos. As falhas e as implicações dosmesmos ele as via quase que de imediato.

Leopold Infeld, um outro de seus estudantes em Berlim e que,posteriormente, veio a ser seu assistente e colaborador em Prin-ceton, conta também como foi bem recebido por Einstein emsua sofrida chegada a Berlim. Para o seu espanto, um simplestelefonema foi já o suficiente para que Einstein o convidasse parair até a sua casa e expor os problemas que estava enfrentando.

Einstein não era apenas um homem muito inteligente, ele hu-mildemente sabia também apreciar como poucos a inteligênciados que o cercavam. Essa sua qualidade era vista, sobretudopelos seus estudantes, com grande admiração, pois esse compor-tamento de Einstein, freqüentemente, elevava-lhes a auto-estima.Certa vez, um jovem físico, Leo Szilard – que depois se tornariaseu colaborador em vários trabalhos e invenções – então estu-dante de PhD em Berlim, sob a orientação de Max von Laue,procurou Einstein para mostrar-lhe um problema na Teoria daRelatividade com o qual ele estava tentando trabalhar. O pro-blema resistia a qualquer tipo de solução, mas Szilard estava con-

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vencido de que o mesmo poderia ser resolvido. Certa manhã,ele acordou e teve uma súbita idéia de como resolver o referidoproblema, mas mostrou-se inseguro diante daquela solução. Ele,então procurou Einstein e lhe expôs o problema e a sua novaidéia. Szilard conta que Einstein, de imediato, disse-lhe:

“Isso é impossível. Isso não pode ser feito”.“Sim, mas, eu fiz”, insistiu Szilard.“Como você fez isso?”, questionou Einstein.Szilard relata que quando explicou a Einstein a solução que

havia encontrado, os olhos de Einstein brilharam de alegria eentusiasmo. Aquela atitude de Einstein deu a Szilard a necessáriasegurança para submeter o referido problema ao seu orientador,von Laue, que logo aceitou o mesmo como a sua tese de PhD.

Esse episódio é bastante ilustrativo em vários sentidos, poisrevela-nos a extrema abertura que Einstein tinha para com osseus estudantes. Apesar de ser ele uma sumidade e de ser respei-tado por todos como o maior de todos os físicos, ele não infundiaqualquer temor em seus estudantes. Muito pelo contrário, estespreferiam procurá-lo antes mesmo de mostrar as suas idéias aosseus orientadores. Outro ponto importante nesse episódio é a ca-pacidade e a humildade de Einstein em admirar a inteligência dosoutros. De fato, como relata William Lanouette, Einstein semprese mostrou um grande admirador do “pensamento lateral” deSzilard, apesar de manter freqüentemente discussões intelectuaisacaloradas com o mesmo.

De a , Einstein praticamente não deu aulas na Uni-versidade de Berlim. As suas atividades como professor ficaramrestritas, então, às muitas conferências apresentadas pelo mundoafora. Deste modo, quando ele anunciou, em , a sua decisãode apresentar novamente uma palestra em Berlim, aquele acon-tecimento despertou um enorme interesse, tanto pela sua ini-gualável reputação científica quanto pelas suas qualidades de serconsiderado, então, um brilhante e consagrado orador. Naquelaocasião, o seu colega Fritz Haber observou, apropriadamente,que: “a maior parte dos acadêmicos consegue, após a devida pre-paração, comunicar, com um maior ou um menor esforço, as suasidéias para grandes audiências, mas a combinação de capacidade

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profissional, habilidade de apresentação e um certo encantamentopessoal, que é necessário para despertar a atenção da audiência,dificilmente pode ser encontrada em tão alta perfeição quanto se vênas palestras de Einstein”. Este nos parece, de fato, sem qualquersombra de dúvida, um testemunho inequívoco das qualidades deEinstein como um brilhante orador.

As qualidades de Einstein como um grande orador, que tocavao coração e as mentes dos ouvintes, poucas vezes foram tão bemexpressas quanto na breve saudação que ele fez por ocasião dacomemoração dos cinqüenta anos do doutorado de Max Planck.Naquela oportunidade, Einstein falou de improviso, mas as suaspalavras e as suas comparações inspiradas calaram fundo nospresentes:

“o templo da ciência apresenta-se como um edifício de milformas. Os homens que o freqüentam, bem como as motivaçõesgerais que para ali os levam, revelam-se bem diferentes. Um seentrega à ciência com o sentimento de felicidade que a potênciaintelectual superior lhe causa. Para ele, a ciência é o esporteadequado, a vida transbordando de energia, a realização detodas as ambições. Assim deve ela se manifestar! Muitos outros,porém, estão igualmente neste templo exclusivamente por umarazão utilitária e não oferecem em troca a não ser a suasubstância cerebral! Se um anjo de Deus aparecesse e expulsassedo templo todos os homens dessas duas categorias, o temploficaria bem vazio; mas, mesmo assim, ainda se encontrariamhomens do passado e do presente. Entre estes encontraríamosnosso Planck. É por isso que o estimamos.”

Em , Einstein estava no auge da sua fama e as suas con-ferências pelo mundo eram sempre cada vez mais concorridas.Falando quase sempre em alemão para grandes audiências, Eins-tein estava em sua melhor forma como um brilhante conferen-cista. Segundo Szilard, Einstein não denotava jamais qualquervaidade e falava para milhares de pessoas do mesmo modo queconversava com os seus amigos.

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Otto Frisch é outro físico de destaque que também testemu-nha a simplicidade do relacionamento com Einstein. No finalda década de , ele era ainda bem jovem e estava começando atrabalhar no Instituto Físico-Técnico de Berlim, quando foi apre-sentado a Einstein por sua tia, a física Lise Meitner, famosa porsua descoberta da fissão nuclear em conjunto com Otto Hann.Lise simplesmente parou de repente na entrada da Universidadee disse a Frisch: “este é Einstein. Deixe-me apresentá-lo”. Frischconfessa que ficou um pouco confuso tentando transferir rapi-damente a pilha de livros que estava carregando para a mão es-querda e ainda puxar a manga do seu casaco para que pudessecumprimentar Einstein. Enquanto isso, Einstein esperava pa-cientemente sorrindo e com o braço esticado em sua direção.Frisch afirma que nunca havia visto alguém tão simpático e in-formal. Frisch acrescenta afirmando que quando Einstein saiuda Alemanha no final de em só não ficou na Inglaterra por-que os ingleses lhe pareceram muito formais e ele não suportavanenhum tipo de formalidade.

Notas do Capítulo

. Einstein havia trabalhado em Berna, na primeira década do século XX, comotécnico em um escritório de Patentes e nunca perdeu totalmente o contato comaquele terreno das invenções tecnológicas.

Já na condição de professor de Física Teórica na Universidade de Berlim ele foiconvidado a elaborar um parecer técnico para um tribunal alemão que julgavauma disputa de patentes entre duas firmas de materiais náuticos. A elaboraçãodaquele parecer foi, em vários sentidos, muito proveitosa para Einstein em umassunto que merece, na verdade, um estudo à parte. O caso tratava de umapatente sobre o funcionamento de uma bússola giroscópica. O estudo do referidoassunto conduziu Einstein a desenvolver um trabalho científico sobre o Eletro-magnetismo com De Haas e na seqüência a aplicar tais conhecimentos obtidosno posterior aperfeiçoamento do próprio instrumento.

De fato, passada a referida disputa judicial, na qual ele havia atuado apenascomo árbitro, Einstein envolveu-se profundamente com o problema em si, já en-tão na qualidade de inventor. Como resultado de um tal esforço, ele conseguiriaaperfeiçoar enormemente o referido instrumento e obter patentes que viriam alhe render bons dividendos.

Este é um assunto pouco explorado da vida de Einstein, o da sua interaçãocom os experimentos e com a tecnologia, mas que merece um estudo bem mais

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cuidadoso. Pode-se mesmo creditar boa parte do desenvolvimento do seu “pen-samento produtivo” a tais atividades bem pouco conhecidas do grande público,pois são pouco exploradas em suas biografias mais tradicionais.

. Até aquela época, as mulheres podiam freqüentar apenas algumas universi-dades germânicas, como a de Heidelberg, por exemplo, e mesmo assim semque fosse permitido a elas se matricularem como alunas regulares com direitoà obtenção de um diploma.

Nas poucas universidades em que tal consentimento era dado, até , elasapenas podiam participar como ouvintes. Foi nessa condição de ouvinte, inclu-sive, que a sua primeira mulher, Mileva Maric, havia freqüentado um semestre docurso de Física em Heidelberg em . Em todo o mundo de cultura germânica,Zurique, na Suíça, havia sido pioneira, já no século XIX, em permitir a matrícularegular de mulheres em seus cursos universitários.

. Embora tenha ganhado o prêmio Nobel apenas em (referente ao anoanterior de ), Einstein já há muito tempo fazia por merecer uma tal comenda.

As indicações do seu nome para a referida premiação iniciaram-se já em

com Wilhelm Ostwald e prosseguiram nos anos seguintes com inúmeras indica-ções propostas pelos mais distintos cientistas de todo o mundo. Dentre as muitasproposições que apontavam uma grande diversidade dos seus trabalhos comomerecedores de um prêmio Nobel, algumas destacam-se entre as demais.

Já em , Ostwald ao indicá-lo para o Nobel, seguindo a opinião de Planck,comparava o trabalho revolucionário da Teoria da Relatividade de Einstein aos deCopérnico e de Darwin. Planck sempre referia-se a Einstein como um novo Co-pérnico. Em , Bernhard Naunym não perdeu a oportunidade para alfinetar aAcademia Sueca e lembrá-la de que raramente ela teria uma outra oportunidadecomo aquela de premiar alguém com a enorme significância de Einstein. As in-dicações continuaram, ano após ano, seguindo-se aos montes, sem que a referidapremiação viesse a ser concedida a Einstein. Neste meio tempo, há de se destacarque alguns trabalhos de valor bastante duvidoso foram premiados pela Academiasueca com o prêmio Nobel de Física.

Em , Pierre Weiss elaborou a mais extensa lista dos trabalhos de Einsteinmerecedores de um prêmio Nobel. Nunca em toda a história alguém mereceratanto aquela premiação.

Se alguns cientistas tornaram-se notáveis por produzirem em sua vida umgrande trabalho merecedor do prêmio Nobel, ali estava uma enorme lista detrabalhos merecedores do mesmo, todos eles realizados por um único indivíduo.Ainda assim, Einstein não foi premiado naquela época. Os seus trabalhos sobre oefeito fotoelétrico, sobre o movimento Browniano, sobre a Relatividade especial,sobre a Relatividade geral, sobre os calores específicos atômicos e até mesmoos seus trabalhos mais desconhecidos como o da explicação do fenômeno daopalescência crítica, todos eles foram várias vezes indicados como merecedoresdo prêmio Nobel.

Em , o grande Lorentz indicou-o à Academia Sueca não apenas comomerecedor do prêmio Nobel, mas como um dos maiores cientistas de todos ostempos. Entretanto, o prêmio Nobel, mais uma vez, não lhe foi concedido.

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Em , o consagrado astrônomo inglês Sir Arthur Eddington revoltado coma atitude da Academia Sueca indicou o nome de Einstein como o de alguémacima de todos os seus contemporâneos, como alguém acima mesmo de todosos cientistas de todos os tempos; mesmo do grande Isaac Newton.

A necessidade daquela premiação para a comunidade científica internacionalnão se tratava mais de prestar uma homenagem a Einstein, mas de legitimarou não o valor do próprio prêmio Nobel. Claramente, o valor de Einstein naconsideração dos seus pares já superava em muito o valor daquela comenda. Oprêmio de , entretanto, exatamente naquele mesmo ano, não foi concedido aninguém.

Em um fato inusitado, o prêmio Nobel de foi guardado para ser conce-dido apenas no ano seguinte. Em , as indicações do nome de Einstein já seacumulavam por todos os lados, vindas dos maiores cientistas de todo o planeta.Brillouin foi o mais direto e claro de todos eles. Ele acusou frontalmente a Aca-demia, como já havia feito antes Naunym, de estar perdendo uma oportunidaderara. Mas, desta vez, ele foi além em seu discurso. Como assinala Pais (), elenão se referiu apenas à oportunidade rara de premiar o maior vulto da ciência detodos de tempos; ele questionou a própria credibilidade histórica da Academia:“imaginem por um momento o que a história registrará, daqui a uns cinqüentaanos, se o nome de Einstein não aparecer na lista dos premiados”.

Aquela ameaça parece ter surtido o devido efeito; pois, como lembrou Lo-rentz, a Academia Sueca resolveu finalmente premiar, na verdade, a si mesma aooutorgar-se a honra de conceder a Einstein o seu prêmio Nobel. Nunca em todaa história da celebrada premiação do Nobel a própria instituição concedente doprêmio pareceu necessitar tanto daquela homenagem.

Claramente, a credibilidade e o valor do cientista premiado excedia em muitoo valor do próprio prêmio aos olhos da comunidade internacional.

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Imaginação, Humildade e

Bom Humor

E , em uma palestra na Universidade de Princeton, Eins-

tein teve mais uma vez a oportunidade não apenas de de-monstrar a sua retórica brilhante, mas também as suas res-

postas irônicas e ao mesmo tempo elegantes e bem humoradas.Ao falar sobre a sua teoria da relatividade que tomava como certoo resultado negativo do experimento de Michelson-Morley, Eins-tein foi aparteado pelo professor Dayton Miller de Cleveland. Se-gundo Miller, ele havia repetido os experimentos de Michelson-Morley com uma precisão maior e havia conseguido medir omovimento da Terra através do éter. Se o resultado de Millerestivesse correto, toda a teoria da relatividade entraria em co-lapso. Entretanto, para Einstein, aquilo era um completo nonsense. Todavia, por uma questão de etiqueta, Einstein jamaispoderia declarar aquilo de público. Percebendo a sutileza dodetalhe questionado, Einstein sorriu para o professor Miller edisse-lhe:

“o Senhor Deus é sutil; mas malicioso, ele não é.”

De fato, as medidas de Miller revelaram-se, posteriormente,completamente equivocadas e a intuição de Einstein mais uma

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vez mostrou-se correta. A sua alusão à sutileza do Senhor, ne-gando a sua malícia, descrevia bem a sua crença sobre as dificul-dades de se compreender os desígnios da Natureza. Enquanto osresultados de Miller são hoje uma mera curiosidade histórica, afrase de Einstein de que ‘o Senhor é sutil’ encontra-se gravada napedra do hall que dá acesso ao auditório no qual aquela palestrafoi proferida.

A partir de , com a ascensão do nazismo na Alemanha,Einstein fixou sua residência definitivamente nos Estados Uni-dos, em Princeton. Ele continuou ainda apresentando ocasio-nalmente as suas palestras em território americano; mas, nuncamais retornaria à Europa e nem faria mais nenhuma viagem maislonga até o final de sua vida. Aqueles anos na América forammarcados por uma crescente militância política em prol da pazmundial e pela resistência ao perigo oferecido pelo nazismo. Asua participação no episódio que levou à tomada de decisão dogoverno norte-americano em fabricar a bomba atômica precisaser analisada cuidadosamente dentro de um tal contexto. Umatal análise criteriosa daqueles acontecimentos foge aos propósitosbem delimitados deste presente livro, mas pode ser encontradaem obras de grande valor acadêmico como as de Albrecht Folsinge de Denis Brian e principalmente no excelente livro de AbrahamPais “Einstein Viveu Aqui”.

A nossa atenção concentra-se agora sobre a riqueza da intera-ção humana e educacional de Einstein com aqueles que tiveram afelicidade de interagirem mais de perto com ele na qualidade deseus assistentes. Em Princeton, então trabalhando no Institutode Pesquisas Avançadas, ele nunca mais viria a lecionar regular-mente, embora ocasionalmente ainda conduzisse alguns cursosna Universidade vizinha com o mesmo nome daquela cidade.

Nas décadas seguintes de e os seus contatos com oscolegas e com os estudantes ficaram cada vez mais restritos àspoucas palestras que ainda proferia ocasionalmente, aos semi-nários em que costumava às vezes assistir e principalmente àsconversas diretas com aqueles auxiliares que tiveram a rara opor-tunidade de privar de sua intimidade. Ainda assim, o volumede informações recolhido daquele período no que toca ao seu

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relacionamento humano e pedagógico com os seus próximos ébastante considerável.

Como já assinalamos, Einstein gostava de ensinar e a sua formade abordar e de conduzir os assuntos abordados era bastante pe-culiar. Isso pode ser depreendido dos depoimentos de muitosque com ele conviveram. Banesh Hoffmann, que foi assistente deEinstein em Princeton, descreve-o como uma pessoa surpreen-dente. Ele conta que já na primeira vez que falou com Einstein,em seu gabinete, tentou demonstrar-lhe o seu interesse pessoalpela Relatividade apresentando-lhe alguns cálculos. Einstein pe-diu que ele escrevesse os referidos cálculos no quadro negro, oque ele fez apressadamente. Einstein, então, calmamente, lhedisse: “por favor, vá devagar. Eu não compreendo as coisas ra-pidamente”. Uma tal observação pode parecer realmente algosurpreendente, principalmente partindo de alguém com a esta-tura intelectual de Einstein; mas, no fundo tem um significadoprofundo. Einstein não era do tipo de dar respostas rápidas; mas,sim, de refletir bastante antes de dar uma opinião. E esta buscade respostas pensadas pode estar relacionada ao fato dele, em suainfância, ter demorado tanto tempo para falar fluentemente.

A atitude analítica e reflexiva de Einstein podia ser claramentetestemunhada também na sua maneira peculiar de ensinar. Elenão se exasperava com as dúvidas dos seus estudantes e, segundoHoffmann, parecia encontrar um grande prazer em explicar osdetalhes do que queria comunicar. Ele fazia muitas perguntas,mas não perdia a paciência, mostrando-se igualmente feliz seconseguia ou não escutar as respostas certas.

Um outro de seus estudantes famosos, Nathan Rosen, que co-mo Hoffmann foi também seu auxiliar em Princeton, conta queesse seu modo analítico e reflexivo mostrava-se mais claramentequando ele tentando comunicar suas idéias pensava em voz alta.Em tais ocasiões, quando construindo alguma teoria, ele procu-rava explicitar os pressupostos que alicerçavam o raciocínio a serseguido e freqüentemente perguntava a si mesmo em voz alta seum certo pressuposto era razoável para que se pudesse adotá-lo.Algumas vezes, quando ele considerava diferentes possibilidades,ele costumava dizer: “deixe-me ver, se eu fosse Deus, qual delas

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eu escolheria?” E, sempre guiado por um fino senso estético daharmonia matemática ele geralmente escolhia a alternativa maissimples.

Banesh Hoffmann recorda-se que ele e Leopold Infeld, quandoeram assistentes de Einstein, faziam os cálculos e resolviam asequações para Einstein. “Nós fazíamos o trabalho sujo”, recordaHoffmann e “ao apresentarmos a ele os nossos cálculos eles sempreresultavam em discussões acaloradas, mas não discussões no sen-tido de ficarmos zangados, pois Einstein nos deixava sentir como sefôssemos companheiros de trabalho iguais a ele mesmo”. As suasreuniões de trabalho eram como as de um quartel general noqual algumas decisões eram tomadas. Mesmo após os cálculosserem exibidos, as idéias de Einstein pareciam transcender a Ma-temática e muitas vezes vinham na direção contrária do que sepoderia esperar. Em seu pensamento criador, Einstein era gui-ado pelas suas intuições matemáticas, por imagens e não apenaspelo formalismo matemático das apresentações já acabadas. Elesempre alertava Hoffmann e Infeld para a necessidade de elesserem arrojados e de nunca desistirem diante das dificuldadesmatemáticas surgidas. O ponto, entretanto, que mais marcouHoffmann, foi algo que já havia sido assinalado antes por muitosdos alunos de Einstein: o tratamento de igualdade que ele sempredispensava a todos que com ele interagiam.

“Ele me fazia sentir como se eu estivesse em casa e que as minhasvisões seriam ouvidas e respeitadas e que ninguém jamais ririade mim”

Abraham Pais, que foi assistente de Niels Bohr na Dinamarcae, posteriormente, colega de Bohr e Einstein em Princeton, éoutro que testemunha a personalidade sempre amistosa de Eins-tein. Ele recorda que desde a primeira vez que encontrou Eins-tein pessoalmente ficou fascinado com o brilho dos seus olhos,com a sua cortesia e com a sua amabilidade. Pais conta aindaque foi Bohr quem o apresentou a Einstein, de quem ele viria ase tornar depois um dos seus maiores biógrafos. Pais, naquelaépoca, era apenas um jovem físico e ficou impressionado com o

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jeito amistoso e com a abertura que Einstein possibilitava em suasconversas, mesmo com pessoas desconhecidas e jovens como ele.

John Kemeny, que foi assistente de Einstein em e em ,também dá um testemunho semelhante. Ele conta que Einsteintinha um jeito maravilhoso de deixar as pessoas à vontade. Logono seu primeiro encontro com Einstein, Kemeny que era, então,um jovem matemático de apenas vinte e dois anos de idade aindafazendo o seu PhD sobre um problema de lógica matemáticaconta que Einstein lhe perguntou o que ele estava estudando.Kemeny sabia que estava trabalhando em algo muito específicoque embora fosse importante para ele, não tinha jamais a di-mensão das preocupações de Einstein. Ainda assim, ele explicoudetalhadamente o seu trabalho levando mais de meia hora paraisso enquanto Einstein escutava-o calado e pacientemente. Ele,de repente, se deu conta de que estava tomando o tempo doprofessor e fez menção de abreviar a conversa, mas Einstein pediuque ele continuasse. Após algum tempo, Einstein fez-lhe umasérie de perguntas para compreender melhor o seu trabalho oque deixou o jovem Kemeny muito feliz por aquele inusitadointeresse. Só então, Einstein olhou para ele calmamente e disse:

“isso tudo é muito interessante. Deixe-me agora lhe explicar emque é que eu estou trabalhando”

Kemeny relembra o seu espanto ao perceber que só então Eins-tein passara a descrever a sua pesquisa e ainda assim de um modobastante humilde, como se aqueles dois trabalhos, o seu e o deletivessem a mesma importância.

Não apenas no relacionamento com os seus assistentes Eins-tein demonstrava uma enorme simplicidade, disponibilidade ebom humor. Essa sua atitude de vida era sempre a mesma diantede todos. Principalmente diante dos mais jovens isso fazia comque ele estabelecesse com facilidade uma relação pedagógica, emsua mais alta dimensão ética, com todos aqueles que travavamcontato consigo. São muitos os exemplos que podem ilustrar essetipo de relacionamento amistoso e cordial.

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Em , o médico e inventor americano Gustav Bucky quetrabalhava em Berlim costumava visitar Einstein em sua casa decampo em Caputh. O filho de Gustav, Thomas Becky, entãoum garoto de treze anos, relembra aqueles momentos vividos nacompanhia de Einstein.

“Einstein tornou-se meu segundo pai. Eu não hesitava emdiscutir política com ele, em expressar as minhas opiniões. Enunca ficava receoso de desafiá-lo para um debate, pois elemostrava-se receptivo mesmo com as opiniões, ainda emformação, de um adolescente. Einstein era muito tolerante, masele não gostava de aduladores, esquivava-se deles e os evitava.Quando eu lhe apresentava uma idéia sem sentido, ele memostrava quão louco eu era, mas sempre com muito respeito. Eleme explicava dizendo: ‘Ah, você está enganado!’ E então,pacientemente, mostrava-me porque. Mas, se alguém expressavaa sua opinião de um modo arrogante ou emocional, ele ointerrompia com lógica e mostrava-se aborrecido com aquelaatitude. Einstein era muito polido e às vezes fingia concordarcom as opiniões dos outros apenas para não as incomodar, maslogo depois retornava para o seu próprio modo de ver o assuntoou, como costumava dizer, para a sua maneira de tornar a vidamais simples.”

Como exemplo desse tipo de atitude, Thomas relata que Eins-tein costumava se barbear apenas com o uso de uma lâmina eágua. Thomas o persuadiu a usar creme de barbear. Ele achoumaravilhoso, pois, pela primeira vez, ele podia barbear-se sem secortar. “Você sabe, ele realmente funciona”, disse Einstein. “Elenão puxa a barba”. Daquele dia em diante, Einstein passou a usarregularmente o creme de barbear, até que o tubo se acabou. Daíem diante, ele voltou a se barbear apenas com a navalha e água,como sempre havia feito.

Um outro exemplo semelhante de mudança de atitude paraagradar algum amigo pode ser encontrado em um outro caso

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relatado por Thomas Bucky. Einstein costumava caminhar len-tamente escrevendo em seu caderno de anotações enquanto fu-mava tranqüilamente o seu cachimbo. O pai de Thomas, o mé-dico Gustav Bucky, aconselhou-o a parar de fumar por motivode saúde. Einstein não queria aborrecer o seu amigo, mas fumarera uma das suas diversões prediletas. Assim, ele parou de fumarquando Gustav estava por perto.

Thomas Bucky relata que Einstein nunca perdia a calma e quenunca parecia zangado, amargurado, preocupado, impaciente ouambicioso. Ele parecia imune a esses tipos de sentimentos. En-tretanto, ele tinha uma atitude de timidez em relação a todas aspessoas. Mas, ele estava constantemente sorrindo e freqüente-mente rindo de si mesmo.

Ao caminhar na rua as pessoas algumas vezes olhavam paraele de relance como se alguma coisa mística os tivesse tocado. Enesses momentos, elas sorriam para ele. Quando Einstein perce-bia aqueles sorrisos, ele sempre sorria de volta denotando alegria.Ele amava as pessoas simples, não complicadas que, na verdade,mesmo sem reconhecê-lo sentiam o seu ar humano.

Essa atitude de viver sorrindo vinha desde a sua infância e podejá ser constatada na foto de sua turma no Luitpold Gymnasium.Apesar de Einstein detestar a disciplina militar e a rigidez dosmétodos pedagógicos germânicos, ele encarava a vida com oti-mismo e vivia sorrindo. Essa sua atitude foi várias vezes malinterpretada por seus professores.

Einstein, ainda segundo Thomas Bucky, era uma pessoa mo-desta. Certa vez ele disse a Frida, mãe de Thomas:

“vocês todos me superestimam. Eu não sou nem especialmenteinteligente nem tenho qualquer predicado especial. Eu, apenas,sou muito, muito curioso.”

O bom humor de Einstein revelava-se também em ocasiõesmais sutis, quando era freqüentemente questionado e tentavaresponder de forma enfática, mas sem ferir aquele que o ques-tionava.

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Em sua primeira visita aos Estados Unidos, em , um re-pórter perguntou a Einstein o que ele achava da opinião do pro-fessor de Astronomia Charles Lane Poor que havia afirmado queenquanto as leis de Newton podiam explicar todos os fenômenosfísicos, a Teoria da Relatividade não podia ser provada. Einsteinrespondeu de uma forma epistemologicamente precisa e delicio-samente irônica:

“em um certo sentido, nenhuma teoria pode ser provada de umaforma absoluta. Qualquer teoria tenta explicar certos fatos e éaceitável se aqueles fatos se ajustam na concepção geral dateoria. Mas, nenhuma teoria pode explicar totalmente todos osfatos. E nesse sentido, eu concordo que a teoria não pode serprovada”

Ainda naquela primeira viagem pelos Estados Unidos, Einsteindeu quatro conferências no “City College of New York”. IsidoreRabi, que assistiu àquelas quatro palestras e na época estava ape-nas começando a sua pós-graduação, lembra que Einstein falousobre a Física de fronteira daquela época, particularmente sobrea Teoria Quântica e que ele como conferencista era um modeloda mais absoluta clareza e que possuía um fino senso de humor.

Philipp Frank, que substituiu Einstein em Praga e foi um dosseus principais biógrafos, recorda que embora não fosse um cí-nico, Einstein via a vida do dia-a-dia de modo cômico, semprerevestido de um peculiar senso de humor. As conversas habituaisde Einstein eram uma mistura de piadas e de situações que exi-biam freqüentemente o ridículo de certas situações cotidianas,deixando por vezes os seus interlocutores sem saber se deveriamrir ou protestar.

O bom humor de Einstein era algo constante e não apenas re-servado como ornamento para as suas palestras e para as suas au-las. Nas reuniões de trabalho com os seus assistentes, ele semprese mostrava sorridente e brincalhão. Também com as crianças elese comportava da mesma maneira. Thomas Bucky relembra queEinstein conseguia tornar engraçado praticamente tudo e queestava quase sempre com um sorriso estampado na face.

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Apesar do seu constante bom humor, Einstein é descrito fre-qüentemente como tendo sido uma pessoa tímida, por vezes he-sitante. “Ele não era do tipo de dar um tapinha nas costas”, comolembra Thomas Bucky, mas era sempre gentil e manifestava-sesempre com grande consideração pelas opiniões dos outros, exa-tamente como o oposto de uma pessoa pomposa.

O bom humor de Einstein era às vezes caracterizado simples-mente pelo seu uso não convencional das palavras. Essa imagemé fornecida por Stanislaw Ulam, um de seus estudantes nos cur-sos ocasionais que dava em Princeton, como aquele ministradosobre os seus estudos a respeito da Teoria do Campo Unificadopara vinte estudantes no verão de . Ulam recorda de certasfrases excêntricas e bem humoradas de Einstein, como referir-secom freqüência, por exemplo, a certas fórmulas de um modoengraçado, rotulando-as como “muito boas”.

O bom humor de Einstein convivia também, lado a lado, como seu amor ao conhecimento e com a sua modéstia e simplici-dade. Naquele mesmo ano de , um outro estudante, HenryBecky, recorda que Einstein comportava-se como um eterno emodesto estudante, pois ele, já então uma verdadeira celebridadecostumava assistir pacientemente e de forma atenta as aulas deTopologia do professor Tucker. Becky relata que inicialmente ha-via três estudantes nas aulas de Tucker, mas que um deles desistiue ele, Becky, ficou na incrível posição de ser o único “colega” deEinstein. Einstein comportava-se de um modo tão natural queera como se dissesse: “espere aí um pouco, que eu vou com você”.

O bom humor de Einstein assim como o tratamento igualitá-rio por ele sempre dispensado aos que com ele interagiam, fo-ram também testemunhados por Valentin Bargmann e por PeterBergmann, seus dois assistentes em Princeton no ano de .Bargmann, um matemático e refugiado alemão relata que por teruma clara consciência da estatura intelectual de Einstein e de sa-ber estar diante de um dos maiores cientistas de todos os tempos,sentiu-se, de início, um tanto atemorizado ao procurá-lo. En-tretanto, Einstein mostrou-se, desde o início, tão amistoso e in-formal que após uns poucos instantes eles já estavam discutindocomo se fossem dois velhos amigos. Valentin Bargmann relata

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que ele achava aquela atitude de Einstein simplesmente extraor-dinária, impressão esta que era igualmente compartilhada peloseu outro assistente Peter Bergmann. As discussões eram abertas,sem haver da parte de Einstein nenhuma pretensão de colocar-senas mesmas como sendo ele uma autoridade. Bargmann enfatizaque Einstein tratava os seus assistentes como iguais a ele e queessa simplicidade era o seu verdadeiro charme, não importa comquem ele estivesse falando. Bargmann também faz alusão ao risofarto de Einstein e aos seus olhos vivos, sempre muito brilhantes,que denotavam uma profunda atenção e argúcia. Ele brincavacom praticamente tudo e, certa vez, ainda segundo Bargmann,diante de uma imagem de Newton, ele se virou para Banesh Hoff-mann e disse em um tom irônico:

“muitos dos grandes homens estão entre os dois sexos.”

Bargmann assinala que Einstein era um indivíduo que se mos-trava sempre muito à vontade, sem qualquer tipo de sofisticaçãoe que a sua forma costumeiramente relaxada de se vestir, comcalças frouxas, sem meias e com os cabelos despenteados, eracostumeiramente mal interpretada por muitos como um sinal detotal desatenção. Muitas das coisas que Einstein dizia eram tam-bém mal interpretadas, pois ele freqüentemente falava em umtom irônico e as pessoas interpretavam ao pé da letra. Einsteinestava sempre brincando e costumeiramente contando piadas,algumas delas, com um marcado sentido irônico frente ao valorconferido ao conhecimento.

Cornelius Lanczos, que foi por um breve tempo assistente deEinstein em Berlim, dizia que o senso de humor de Einstein ra-dicava na visão de Schopenhauer para quem o homem obcecadocom a sua própria miséria não se mostrava, entretanto, disposto aser trágico, mas que estava irremediavelmente condenado a per-manecer preso em uma autêntica tragicomédia. A única salvaçãopara ele seria o seu senso de humor que ele deveria sempre man-ter vivo enquanto ainda pudesse respirar. Esta era, realmente, atônica do bom humor de Einstein, um verdadeiro mecanismode defesa, sempre zombando das suas próprias dificuldades e

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sempre ironizando o que lhe parecia desajeitado ou tudo aquiloem que ele não via sentido.

O bom humor de Einstein fazia parte do seu modo de ser ede encarar a vida, sem jamais manifestar preocupações materiaisou com as opiniões contrárias dos seus oponentes. Afinal, comodizia Schopenhauer em seu “Aforismos sobre a Sabedoria da Vida”,“o que um homem é contribui muito mais para a sua felicidadedo que o que ele tem ou de como ele é visto pelos outros”. ParaSchopenhauer “o homem pode fazer o que ele queira, mas nãopode desejar o que ele deseja”. Esse pensamento de Schopenhauer,segundo o próprio Einstein, sempre o acompanhou em todas assituações de sua vida e serviu para reconciliá-lo com as açõesdas outras pessoas, mesmo quando elas se mostravam profunda-mente dolorosas para ele. Ainda segundo ele mesmo, era um talpermanente estado de alerta para a impossibilidade da liberdadedo desejo que preservava Einstein de levar todas as coisas e a simesmo muito a sério e de perder a calma com as ações humanas.

Mesmos diante de grandes dificuldades, Einstein desenvolveucomo poucos a capacidade de dosar as suas ações temperando-assempre com uma certa dose de bom humor. Um exemplo dramá-tico dessa sua atitude sempre positiva diante das adversidades davida é mencionado por Trbuhovic-Gjuric. Quando já velho, em, Einstein recebeu a notícia de que a sua primeira mulher, Mi-leva Maric, estava muito doente e que o seu filho mais novo, Edu-ard, ou Tete, como era carinhosamente chamado, encontrava-setambém gravemente enfermo e internado em um sanatório naSuíça. Einstein escreveu, naquela ocasião, uma carta dramáticaao Dr. Zurcher, filho de um grande amigo seu agradecendo-lhepor sua ajuda. Em um trecho daquela carta ele diz: “agradeço-lhede todo o coração. Se se vende a casa e Tete pode ficar sob o cuidadode alguma pessoa de confiança quando Mileva já não estiver aqui,eu também poderei morrer em paz”. Entretanto, apesar de tama-nha adversidade, ele ainda guardava a mesma atitude positiva desempre. Na mesma carta, ele complementa: “mas o principal émanter o bom humor e fazer o que a cada um lhe permitam as suasescassas forças”.

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George Wald, um biólogo ganhador do prêmio Nobel de Me-dicina contava que Einstein dizia certas coisas engraçadas, in-clinava-se para trás, abria os braços e não apenas sorria, massoltava então uma sonora gargalhada. Os presentes muitas vezesdivertiam-se mais com o seu riso farto do que mesmo com o queele havia dito.

John Kemeny, um matemático americano que foi assistente deEinstein em Princeton no final dos anos , conta que Einsteincostumava contar piadas e que uma das suas preferidas, que li-dava com o valor do conhecimento, era a exibida a seguir.

Um homem chega a uma oficina e pede para consertar o seucarro que está lhe dando muitos problemas. O mecânico exa-mina todo o automóvel atentamente, pára subitamente, e dá umchute no carro. Imediatamente após o chute, o carro passa afuncionar perfeitamente. O dono do veículo fica muito contentecom o ocorrido e pede então a conta ao mecânico. Este lhe cobra dólares pelo conserto, o que o dono do carro considera sim-plesmente um absurdo. Ele zangado pede, então, ao mecânicoque especifique item por item a conta do tal serviço. O mecânico,em resposta, escreve: trabalho de chutar o carro, centavos;saber onde dar o chute, dólares e centavos. E Einsteinsempre completava sorrindo:

“como vocês vêem não é o chute o que importa; o que importa ésaber onde chutar.”

Abraham Pais conta que certa vez, no final dos anos , eleestava no gabinete de Bohr e este estava pensando em voz altasobre as críticas de Einstein à Mecânica Quântica, quando, derepente, Einstein entrou no gabinete sem que Bohr percebesse.Ele esgueirou-se de fininho em direção da caixa de fumo de Bohre abriu-a tirando um pouco para o seu cachimbo sem pedir per-missão ao dono. Pais, conhecendo o jeito brincalhão de Einstein,observou em voz alta para que os dois ouvissem: “que coisa feia,professor Einstein; o senhor roubando fumo”. Einstein sorriu eexplicou a Pais e a Bohr que o seu médico o fizera prometer que

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ele nunca mais iria comprar fumo e desta forma só lhe restavafurtar um pouco o dos amigos.

Conta Otto Frisch que quando a fissão nuclear tornou-se algopatente, muitos cogitaram sobre a possibilidade do aproveita-mento prático da energia que poderia ser então liberada. Eins-tein, entretanto, de início, não acreditou em uma tal possibi-lidade prática e expressou a sua opinião de modo bastante di-vertido quando questionado a esse respeito. Ele achava que ogrande problema seria como mirar as partículas alfa no núcleoatômico sem perder uma grande quantidade de energia em umtal processo. Einstein, entretanto, não expressou uma tal discor-dância de uma forma tão direta; mas, sim, com uma brincadeira,dizendo que aquilo seria “tão difícil quanto atirar em papagaiosno escuro”.

Algumas vezes os questionamentos a que Einstein era subme-tido o obrigavam a elaborar com muito cuidado as suas respos-tas. Isso ocorria freqüentemente quando lhe questionavam, porexemplo, sobre religião. Certa vez, em Boston, ainda na sua pri-meira viagem aos Estados Unidos em , um repórter pergun-tou a Einstein se ele acreditava em Deus. Einstein respondeuque acreditava no Deus de Spinoza que se revelava a si mesmona harmonia de todas as coisas. Trbuhovic-Gjuric esclarece queEinstein acreditava na existência de um Deus que não apenasse manifestava na harmonia do universo, mas que também nãose imiscuía jamais no seu destino nem muito menos nas obrasdos seres humanos. O Deus de Einstein não era, pois, um Deusantropomórfico, como o Deus dos cristãos, que influísse cons-tantemente nas coisas mais banais da vida cotidiana. SegundoEinstein, era sempre enganoso usar conceitos antropomórficosao lidar com coisas externas à esfera humana; para ele, isso nadamais era do que simples analogias infantis. Deus, para Einstein,era antes de tudo uma ordem universal que presidia e conferiaum sentido à regularidade do cosmos.

Em uma outra oportunidade, ainda nos Estados Unidos, Eins-tein foi questionado de forma ainda mais direta sobre aquelasua afirmação de acreditar no Deus de Spinoza. Desta vez, eleelaborou um pouco mais a sua resposta lançando mão da sua

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conhecida postura educacional, fazendo uso daquele mesmo tipode metáfora que tanto gostava de utilizar em suas aulas de Física.Ele simplesmente respondeu, logo de início, que não poderiadizer nem sim nem não, que também não era um ateísta e nempoderia ser considerado exatamente como um panteísta, ou seja,como aquele que identifica, rigorosamente, Deus com a própriaNatureza. Para explicar melhor a sua posição, Einstein lançoumão de uma comparação, como fazia comumente em suas aulas:ele construiu uma metáfora de uma criança em uma biblioteca eteceu a sua argumentação sobre aquela imagem mental. Para ele,o homem estaria em uma posição semelhante à de uma criançaque entra em uma biblioteca repleta de livros escritos em váriosidiomas. A criança sabe que alguém deve ter escritos aqueleslivros, mas ela não sabe como. Ela também não compreendeas línguas em que eles estão escritos. Ela, apenas suspeita timi-damente da existência de alguma misteriosa ordem no arranjodos livros, mas não sabe que ordem é essa. Essa era a situação,segundo Einstein, mesmo do mais inteligente dos seres humanos,diante de Deus; uma situação de pura perplexidade. Para ele,o homem vê um universo maravilhosamente arrumado e obe-decendo a certas leis, mas ele mal consegue compreender essasleis. A sua mente limitada não pode captar a força misteriosa quemove as constelações.

Após expor essa comparação metafórica, Einstein tratou entãode assinalar que ele se sentia particularmente fascinado pelo pan-teísmo de Spinoza, mas que o que mais admirava na contribuiçãodaquele grande filósofo para o pensamento moderno era o fatode ter sido ele o primeiro a lidar com o espírito e com o corpocomo uma entidade única e não como duas coisas dicotomica-mente separadas como na visão cartesiana.

Esse poderoso recurso metafórico utilizado por Einstein paracomunicar com maior clareza a sua compreensão sobre o signi-ficado de Deus, dá também uma boa medida do tipo de imagense metáforas que ele costumava construir com os seus estudantesem suas aulas e em seus seminários.

Einstein costumava elaborar engenhosas imagens mentais paraexplicar de um modo mais simples certas construções teóricas

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mais complexas. Para explicar, por exemplo, que o Universodeveria ser finito, porém ilimitado, segundo a sua Teoria da Rela-tividade Geral, ele criou, certa vez, uma imagem bastante ilustra-tiva. Einstein pediu aos estudantes para que imaginassem comoas coisas deveriam parecer para uma pulga bem achatada, deapenas duas dimensões, vivendo na superfície de uma esfera eincapaz de escapar daquela superfície. Ele sugeriu, também, queo nosso Universo seria como a superfície de uma esfera que nãotem início, nem fim e nem limites, mas, entretanto, é finito.

O recurso às imagens e aos experimentos em pensamento erauma constante nos discursos, nas aulas e nas conversas mais in-gênuas que Einstein mantinha com os outros. Uma vez, ques-tionado por seu filho de nove anos, Eduard, porque ele era tãofamoso, Einstein respondeu em tom de brincadeira com umametáfora. Ele respondeu que era famoso porque quando umapulga cega percorre a superfície de um globo, ela não percebe queo caminho por ela percorrido é curvo. Ele, Einstein, apenas haviatido a sorte de perceber isso que uma pulga cega não percebia.

A dimensão imagética no pensamento de Einstein era, de fato,algo determinante e que ele utilizava com freqüência tanto nassuas conversas com os amigos, quanto nas suas aulas e em suacriação científica. As imagens eram como um guia para a suaintuição e Einstein em sua fase madura considerava que o seutrabalho era guiado principalmente pela sua intuição matemá-tica. Ele comparava a sua obra em parte com a livre criação deum artista que tira as suas idéias da sua imaginação. Para ele,a imaginação era mais importante do que o conhecimento. Opapel que a razão e a consciência jogavam no comportamentodos homens era também bem modesto. Ele se colocava contratodos os preconceitos e afirmava que as visões tradicionais e osvalores são geralmente aceitos de forma não crítica e tomadossempre e em todos os lugares como se fossem simples dados darealidade.

Dentre as imagens mais famosas criadas por Einstein estão, porexemplo, a do viajante com um espelho em um raio de luz, a dosencontros de trens muito velozes com os seus relógios de luz, ados elevadores em queda livre e outras mais. Einstein também

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recorria com freqüência a certas imagens concretas de tais expe-rimentos em pensamento e as utilizava de um modo brincalhão,com uma alegria quase infantil. Talvez aí residisse a origem de suapaixão por quebra-cabeças e por brinquedos imaginativos. Defato, Einstein sempre teve uma paixão especial por brinquedos epor brincadeiras que contivessem um fundamento científico.

Certa vez, segundo relata Vera Weizmann, passeando nos arre-dores da Universidade de Harvard, após haver apresentado umaconferência, ela notou que Einstein jogava no ar a todo instantealguma coisa que fazia um som metálico. Em seguida, ele se-gurava o tal objeto sem que ela pudesse ver do que se tratava.Quando ela lhe perguntou o que era, ele simplesmente respon-deu, em tom de brincadeira, que era um segredo. Logo depois,entretanto, ele revelou o tal segredo, que se tratava apenas datampa de sua caixa de guardar a escova de dente. O som metálicoera produzido quando a escova em queda livre, juntamente como recipiente, tocava o fundo do mesmo ao ser agarrada no ar porEinstein. É fácil perceber que ele estava, na verdade, simulandoum elevador em queda livre, ou seja, brincando com o princí-pio da equivalência, que joga um papel decisivo na Relatividadegeral e que estabelece uma equivalência entre os efeitos de umaaceleração e de um campo de forças.

Thomas Bucky conta que em , quando ele tinha apenas

anos de idade, foi com os seus pais visitar Einstein em sua casa decampo em Caputh. De início, Einstein mostrou-se distante paracom Thomas, mas logo em seguida ele quebrou o gelo ao mostrara Thomas como ele sabia brincar com o seu Yo Yo. Einstein tinha,de fato, um belo Yo Yo e sabia fazer vários movimentos interes-santes com ele. Thomas, entretanto, achou que alguns movimen-tos executados por Einstein não estavam devidamente equilibra-dos e com a familiaridade que têm as crianças com as brincadei-ras, ele mostrou a Einstein alguns truques que este não conhecia.Ele explicou, por exemplo, a Einstein que era necessário dar umlaço no final do cordão para poder executar alguns truques comoo da queda livre. Einstein parece ter ficado realmente surpresoe aceitou de bom grado o seu conselho. Thomas, por sua vez,ficou igualmente surpreso quando o professor Einstein começou

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a conversar com ele e mostrou-se bastante interessado nas suasopiniões.

Apesar de apreciar brinquedos e brincadeiras com conteúdocientífico, Einstein não costumava jogar xadrez. Certa vez, quan-do questionado sobre se costumava jogar xadrez, ele respondeuque quando queria relaxar a sua mente ele preferia alguma coisaque não exigisse muito da mesma. Ele se lembrava de haver jo-gado xadrez apenas uma ou duas vezes quando ainda era criança.Ele também nunca jogara “bridge” e nunca ouvira nem ao menosfalar no jogo de “Monopoly”. Quando lhe explicaram as regrasdeste último, ele apenas comentou: “um jogo muito americano”.

Alice Kahler conhecia a fascinação de Einstein por brinquedoscientíficos e por quebra-cabeças. Durante uma visita que ela lhefez, em , quando ele estava em férias às margens do LagoSaranac, ela lhe deu de presente um complicado quebra-cabeçaconhecido como a Cruz Chinesa. A tarefa era juntar umas pe-ças de um modo que para Kahler parecia quase impossível deentender. Segundo ela, Einstein montou as peças do brinquedoem menos de três minutos. Ela lhe disse que não conseguiriafazer aquilo nem em mil dias e pediu que ele lhe explicasse comohavia conseguido. Einstein sorriu e disse que era muito fácil. Elerapidamente desmontou todas as peças e tornou a montá-las semque ela pudesse perceber o truque. Kahler conta, ainda, que diasdepois, quando Hans Albert veio visitar o seu pai, ele deparou-secom o tal quebra-cabeças e igualmente o montou quase que deimediato. Einstein ficou muito feliz ao ver aquilo e juntou obrinquedo à sua enorme coleção de artefatos semelhantes que eletinha de todas as partes do mundo.

Para um homem que havia, de há muito, perdido o contatocom os seus próprios filhos, Einstein demonstrava uma surpre-endente afeição pelas crianças dos outros. Mab Cantril, quequando criança foi sua vizinha em Princeton, lembra que elecostumava caminhar lentamente pelas calçadas e que de vez emquando ao vê-la brincando de amarelinha oferecia-se para daruns pulinhos com ela. De outra vez, um garotinho apenas decinco anos de idade que também morava nas vizinhanças cos-tumava acompanhar Einstein em suas caminhadas fazendo-lhe

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várias perguntas. A sua mãe que o acompanhava de longe ficavapreocupada que o seu filho estivesse aborrecendo o professor.De repente, Einstein deu uma enorme risada. À noite, a mãeperguntou ao garoto o que havia acontecido para que o professorEinstein houvesse dado aquela risada. O garoto respondeu queapenas havia perguntado a Einstein se ele tinha tomado banho eEinstein lhe dissera rindo que finalmente alguém lhe fazia umapergunta para a qual ele sabia a resposta. No outono de ,Einstein costumava também ensinar Matemática pacientementea uma menina de oito anos que morava igualmente nas vizinhan-ças de sua casa em Princeton.

O seu bom entendimento com as crianças, aliado ao seu amorpor brinquedos científicos está em sintonia com a observação queAbraham Pais fez de sua alegria de viver e do seu constante bomhumor. Para Pais, Einstein era um homem que parecia ter umacriança muito alegre dentro de si mesmo. Ele não era absoluta-mente infantil em nada do que fazia; mas, o seu comportamentosempre alegre e sorridente denotava a alegria de uma criança quesempre viveu em sua mente e em seu coração e integrada em suaforma de viver.

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Influências sobre as

Concepções Educacionais deEinstein e de Dewey

E , principalmente, devido à ampla di-

vulgação pelos meios de comunicação da enorme impor-tância dos seus trabalhos científicos e esse fato tem contri-

buído para fazer dele uma espécie de mito da ciência moderna.Esta sua dimensão mítica mostra-se no fato de que o verdadeirosignificado dos seus trabalhos ainda permanece pouco claro mes-mo para muitos daqueles que o admiram. Entretanto, para alémdessa sua contribuição científica, existe em Einstein uma outradimensão que pode ser não apenas admirada; mas, mais facil-mente, compreendida. Esta outra dimensão da personalidade deEinstein revela-se no fato de que ele jamais se negou, enquantoalguém comprometido com os problemas e com o futuro da hu-manidade, a abordar também questões mais gerais relacionadasao ser humano e à sociedade como um todo, engajando-se, in-clusive, em várias campanhas sociais e em movimentos pacifistas.Em seus escritos, ele abordou, particularmente, temas relaciona-dos à educação em geral e à importância da cultura fazendo apre-ciações relacionadas aos objetivos da educação, à aprendizagemde conteúdos na Escola e à formação de um cidadão socialmenteútil sem, também, perder de vista as suas liberdades e os seus

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direitos individuais. É sobre esse lado menos conhecido do pen-samento de Einstein, sobre suas concepções acerca da educação,que nos concentraremos neste e nos próximos capítulos.

Ainda que Einstein não tenha deixado nenhuma obra especifi-camente sobre a educação, ele se pronunciou, em várias oportu-nidades, abordando vários aspectos deste tema. Tendo sido cos-tumeiramente convidado, já em sua fase mais madura, a opinarsobre assuntos diversos, ele chegou certa vez a fazer uma alocuçãointitulada “On Education” na qual abordou alguns aspectos im-portantes deste tema com bastante propriedade, mesmo para osnossos dias atuais. Tal alocução ocorreu precisamente em ,por ocasião de um evento comemorativo em homenagem aostrezentos anos do ensino universitário nos Estados Unidos. Na-quele seu discurso aparecem, claramente, as linhas-mestra do seupensamento educacional. Em várias outras ocasiões, ele apre-sentou também as suas idéias sobre os problemas da educação,ainda que de formas mais episódicas. Apesar de episódicas, taismanifestações demonstram, em seu conjunto, uma enorme sen-sibilidade além de uma grande coerência interna, merecendo,assim, um tal conjunto ser analisado com o devido cuidado.

No presente capítulo buscamos realizar uma tal análise e, paraisto, partimos dos trechos principais desse seu discurso “Sobre aEducação”. A discussão das suas idéias educacionais é feita aquibuscando uma estrutura a elas subjacente, sem seguirmos neces-sariamente de um modo linear a ordem em que tais idéias foramapresentadas na referida alocução. Em um outro passo analítico,vinculamos tais excertos coletados daquela sua alocução com ou-tras manifestações suas sobre o tema da educação apresentadasem outras obras ou mesmo entremeadas em outras temáticas porele abordadas.

Munidos dessa massa crítica de suas idéias, procedemos, sóentão, a uma interpretação comparativa do pensamento educa-cional expresso por Einstein em tais textos com as contribuiçõesde outros influentes pensadores buscando encontrar, assim, algu-mas sintonias relevantes. Por vezes, essas sintonias mostram-sena forma de algumas influências exercidas por certos pensadores

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anteriores a Einstein na formação da sua visão de mundo. Outrasvezes, são apontadas sintonias dos seus pensamentos educacio-nais com os de outros pensadores que viveram à mesma épocaque ele assim como sintonias com pensadores mais recentes eposteriores ao seu tempo.

As idéias de Einstein apresentam uma sintonia especial, comoprocuraremos mostrar, com os ideais teóricos de Pestalozzi e doMovimento Escola Nova e principalmente com as concepçõesde John Dewey (–), filósofo que foi o maior expoentedeste movimento nos séculos XIX e XX. Caracterizamos aqui tais‘ideais’ como ‘teóricos’ porque nem sempre as idéias contidas emuma certa filosofia da educação são postas em prática no âmbitoda instituição Escola da mesma forma que foram propostas ori-ginalmente pelos seus autores. Se no caso de Einstein o foco daanálise apresentada neste capítulo foi colocado principalmentenas idéias contidas no seu texto intitulado “Sobre a Educação”,no caso comparativo de Dewey a nossa atenção concentrou-se,de forma análoga, principalmente nas idéias por ele apresentadasem seu texto denominado “Meu Credo Pedagógico” ().

Em , aos anos de idade – no ano seguinte da sua mu-dança para os Estados Unidos – Einstein já participava ativa-mente de movimentos educacionais naquele país. Antes, quandoainda na Europa, ele já havia tocado brevemente no tema daeducação em algumas das suas alocuções, ainda que sem haverparticipado, até então, de quaisquer movimentos populares so-bre o referido tema. Naquele ano de , Einstein participouativamente pela primeira vez de um movimento educacional degrande repercussão ao enviar uma mensagem à ‘Conferência so-bre a Educação e a Paz Mundial’ da Associação de Educação Pro-gressivista realizada em Nova York.

Dois anos depois, em , Einstein apresentou a sua célebrealocução, já acima mencionada, intitulada “Sobre a Educação” eque discutiremos mais detalhadamente neste capítulo. Foram es-ses seus contatos mais próximos com os educadores que o aproxi-maram de John Dewey, então o mais respeitado educador norte-americano e um célebre ativista político e, assim como Einstein,também com uma intensa militância pacifista.

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Dewey mantinha uma ativa correspondência com várias pes-soas de projeção internacional, dentre elas, o revolucionário rus-so Leon Trotsky, o presidente democrata norte-americano Her-bert Hoover e o poeta T. S. Elliot. Na década de , Deweypassou a corresponder-se também com Albert Einstein¹.

Dewey e Einstein tinham muitos pontos em comum, tanto nassuas visões de mundo socialistas quanto nas suas compreensõessobre a educação. Esta nossa caracterização das convicções deDewey e de Einstein como socialistas tem sido, entretanto, dis-putada tanto por alguns dos seus opositores quanto pelos seusdetratores.

Tem havido muita polêmica na literatura acadêmica e fora delasobre a pertinência da caracterização de ‘socialistas’, aqui ado-tada tanto para Dewey quanto para Einstein. Esta, entretanto,parece-nos não apenas uma questão ideológica e interpretativa;mas, sobretudo, nos dias atuais, uma discussão que já deveria es-tar completamente superada pelos fatos políticos mundiais maisrecentes. De fato, tanto Dewey quanto Einstein, sempre se auto-proclamaram como socialistas em várias ocasiões. Dewey chegoumesmo a ser um ativo militante do minúsculo partido socialistanorte-americano enquanto Einstein, por seu lado, envolveu-seconstantemente, ainda que sem qualquer vinculação partidária,em campanhas de esquerda, tanto na Alemanha quanto nos Es-tados Unidos.

As visões do socialismo de Einstein e de Dewey continhamuma forte caracterização humanista, o que não é de se estranhar;pois, na sua origem, o socialismo é já essencialmente uma formade humanismo, segundo o próprio Marx, o qual não pode serculpado pelas deturpações posteriores da sua doutrina.

As circunstâncias políticas mundiais determinaram, entretan-to, o aparecimento de várias cisões naquilo que originalmentehavia sido um dia o socialismo marxista. Não seria exagerado di-zer que o próprio Marx, se ainda vivo, talvez não se considerasse,ele próprio, um marxista na época de Einstein e de Dewey, masapenas um socialista; tão gritantes foram os afastamentos perpe-trados em relação ao caráter originalmente humanista daqueladoutrina.

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A concepção stalinista vitoriosa e então dominante determi-nava um sentido mais prático para a sua militância e vislum-brava no conceito de ‘ditadura do proletariado’ um mal neces-sário para atingir o tão decantado progresso econômico e, emum futuro distante, atingir a tão almejada justiça social. Nestecontexto, todos aqueles que ao menos ousassem tocar na questãofundamental das liberdades individuais seriam taxados impiedo-samente pelos ortodoxos como reformistas ou mesmo, simples-mente, como reacionários.

Um certo e inegável progresso econômico foi, de fato, alcan-çado na União Soviética e em outros países de orientação políticasemelhante; mas, a um custo descomunal na exploração descon-trolada dos recursos naturais – em nada diferente daquela dospaíses capitalistas –, no cerceamento das liberdades individuaise mesmo na escalada de uma perseguição política e ideológicadesenfreada. Finalmente, mesmo aquele progresso econômico,obtido através do alto preço do cerceamento das liberdades in-dividuais, mostrou-se efêmero e fugaz. A experiência stalinista,travestida um dia pelos seus defensores como a única e verda-deira alternativa para um socialismo possível na prática, termi-nou por exibir, na verdade, toda a sua fragilidade tanto teóricaquanto prática e transformou-se assim em um gigantesco fra-casso econômico e social.

Tornou-se patente para todos aqueles de mente mais abertaque não era mesmo possível construir a justiça e a igualdadesocial sobre a ferramenta da opressão fundamentada em umaconcepção equivocada do que seria uma luta de classes. Certa-mente, o ideal socialista não morreu, mesmo porque as experi-ências stalinistas, um dia proclamadas aos quatro ventos comosocialistas, de socialistas mesmo nada tinham.

Contraditoriamente, no entanto, o fracasso da alternativa sta-linista, a qual continha em sua essência uma negação de um soci-alismo necessariamente humanista, serviu para inspirar os opo-sitores em geral do socialismo. A derrota do stalinismo foi vistapor muitos, triunfalmente, como a própria derrota do socialismoquando, ao contrário, ele era a sua mais completa negação.

Aos ainda remanescentes detratores das posições políticas de

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Dewey e de Einstein poder-se-ia pedir que ao menos revisassemos seus conceitos e que refletissem sobre os mais recentes acon-tecimentos históricos. Neste sentido, ironicamente, se há umacoisa de que se pode realmente acusar Dewey e Einstein é apenasa de terem eles vislumbrado, muito antes, o destino que a opçãototalitária stalinista traria ao mundo e o enorme desserviço emque ela se constituiria à causa socialista em geral. Portanto, nosdias atuais parece-nos que insistir em atribuir tanto a Einsteinquanto a Dewey a velha caracterização de reformistas e de merosliberais ou social democratas é, sobretudo, um ato de ignorar aslições da história.

As razões que movem tais críticas injustas às posturas políticasde Dewey e de Einstein, ainda na atualidade, são as mais diversase não vamos aqui entrar no seu mérito valorativo, nem ao menosassumir que sejam elas distorções propositais de seus discursos,mesmo porque como disse Goethe e como muito provavelmenteEinstein e Dewey concordariam, nunca se deve atribuir à má féaquilo que pode ser antes atribuído apenas à ignorância.

As militâncias políticas de Einstein e de Dewey cruzaram-setambém em certos momentos históricos decisivos. Em , porexemplo, os dois tornaram-se conjuntamente membros da ‘LigaInternacional para a Liberdade Acadêmica’. Eles também estive-ram unidos em manifestações públicas de protesto social comono caso do impedimento de Bertrand Russell lecionar nos Esta-dos Unidos.

Em , Russell, já então uma celebridade mundial, haviasido convidado para assumir uma cátedra de Filosofia da Ciên-cia no City College of New York. Entretanto, quase imediata-mente, uma acusação absurda de imoralidade foi lançada contraele, acusação esta que não conseguia disfarçar o verdadeiro pa-trulhamento ideológico contra as conhecidas posições políticas,pacifistas e libertárias de Russell. A notícia foi amplamente divul-gada pela mídia e os estudantes protestaram de imediato contraa infâmia daquela acusação. Por outro lado, enquanto muitosintelectuais assistiram impassíveis àquele triste acontecimento,Dewey, Einstein e Charles Chaplin colocaram-se entre as primei-

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ras personalidades de destaque a se solidarizarem na defesa dodireito de Russell ensinar nos Estados Unidos².

Nas suas visões educacionais, Dewey e Einstein receberam al-gumas influências filosóficas comuns, como por exemplo, dasobras de Kant, Spinoza e Goethe, dentre vários outros filósofos.Dewey recebeu também uma forte influência de William James.James, o primeiro psicólogo norte-americano, acreditava que osdesejos de uma pessoa são influenciados por toda a sua experiên-cia de vida e que o homem é um organismo feito para a ação. Paraele, se as ações concretas não tivessem conseqüências práticas,então as idéias não teriam qualquer sentido. Esta sua filosofiapragmatista exerceu, em termos educacionais, uma grande in-fluência sobre Dewey e por estar a obra de William James emperfeita sintonia com a epistemologia de Ernst Mach, filósofoque exerceu grande influência sobre Einstein e sobre o próprioJames, o pensamento de Einstein guarda também os seus pontosde contato com o pensamento de William James.

Um outro ponto importante a se salientar a respeito das pos-síveis sintonias entre as idéias de Dewey e as idéias educacio-nais de Einstein é que a existência de uma tal sintonia não sig-nifica necessariamente a existência de uma influência direta deDewey sobre Einstein nem vice-versa. Tais sintonias devem sermais apropriadamente creditadas às interseções existentes entreas suas formações filosóficas. Além disso, Einstein até a décadade não falava nem lia em inglês.

Como assinala ironicamente Denis Brian, quando Einstein vi-sitou os Estados Unidos pela primeira vez, em abril de , eleentendia menos o inglês do que os repórteres que tentavam en-trevistá-lo entendiam a sua Teoria da Relatividade. Mesmo de-pois de ir morar nos Estados Unidos, a partir de , quandopassou a dominar os rudimentos do inglês, ele ainda evitava sem-pre que possível o uso da língua inglesa. Einstein sempre preferiuler, escrever e comunicar-se em alemão. Apesar de evitar o usode outra língua que não o alemão, Einstein permitia-se trocarcorrespondências em outras línguas, sobretudo em francês e emitaliano, as quais dominava, e também ainda que com certa di-ficuldade, em inglês. Suas leituras de estudo ou por diversão,

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entretanto, sempre foram quase que exclusivamente em alemãoaté o final de sua vida e este fato pode ser conferido pelos livrose pelos textos encontrados ainda hoje em seus arquivos e em suabem preservada biblioteca.

Mesmo já residindo nos Estados Unidos, é ainda assim poucoprovável que ele tenha entrado em contato direto com os livrose artigos de Dewey escritos em inglês. Já com o próprio Deweyé certo, como dissemos acima, que Einstein teve contatos pes-soais e que eles chegaram inclusive a trocar correspondências e aparticiparem, em conjunto, de determinados movimentos sociaisprogressistas.

Uma outra influência comum recebida por Einstein e Deweyfoi aquela exercida sobre eles pelo educador suíço Pestalozzi. En-quanto Dewey procurou basear muitas das suas crenças educa-cionais no ideário pedagógico de Pestalozzi adaptando-as parauma sociedade industrial, Einstein vivenciou diretamente em Aa-rau a experiência de haver estudado em uma escola tipicamentede inspiração pestalozziana que, como vimos anteriormente,muito o marcou positivamente.

Logo no início de sua mais importante alocução educacional –“Sobre a Educação” – Einstein assume-se um leigo neste campo,sem qualquer fundamentação teórica a não ser a sua própria ex-periência pessoal. Porém, no decorrer do seu discurso, as sin-tonias com o pensamento de grandes filósofos e estudiosos daeducação tornam-se evidentes.

Na verdade, embora Einstein não fosse propriamente um estu-dioso da Pedagogia, ele tinha uma sólida formação filosófica quelhe permitia alçar vôos com segurança neste terreno. Antes, por-tanto, de adentrarmos na análise mais detalhada de seus pensa-mentos contidos no seu discurso “Sobre a Educação” parece-nosconveniente examinarmos, ainda que introdutoriamente, algu-mas das muitas influências filosóficas que ele recebeu e o quantoas mesmas, certamente, contribuíram para a construção do seupróprio discurso pedagógico. Um tal exame permite-nos, tam-bém, observar a semelhança de muitas fontes de influências filo-sóficas não apenas sobre o seu pensamento; mas, também, sobreo pensamento de Dewey.

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Um estudo cuidadoso da biografia de Einstein revela-nos, co-mo mencionamos nos capítulos anteriores, que ele desde a ju-ventude já lia bons textos filosóficos. Einstein leu Kant, como jáfoi apontado anteriormente, aos treze anos de idade e costumavafalar sobre os pensamentos kantianos aos seus colegas de escolaos quais, como assinalamos, provavelmente preferiam diversõesmais cotidianas. O estudo do pensamento de Kant ocuparia tam-bém, como vimos, um lugar de destaque nos seus estudos naETH e na sua estada em Berna, nas reuniões informais da Aca-demia Olímpia com os seus amigos Conrad Habicht e MauriceSolovine. Além de Kant, Einstein estudou também a obra deSpinoza, talvez aquela que mais tenha influenciado-lhe no seuponto de vista ético e na sua religiosidade cósmica. O Deus deSpinoza era identificado com a Ordem encontrada na Natureza,da qual o ser humano era uma parte integrante.

Na seqüência de influências recebidas, seguem-se as obras deSchopenhauer e de Hume. Juntamente com as já mencionadasobras de Kant e Spinoza, estas foram as quatro primeiras gran-des influências filosóficas que Einstein recebeu. Elas foram com-plementadas ainda pelos estudos do pensamento de Nietzsche,Mach, Goethe, Schiller, Stuart Mill, Poincaré e Avenarius. Oelenco é, entretanto, ainda muito mais vasto, incluindo desdeJesus Cristo a Marx, passando pelos clássicos gregos como Platão,Aristóteles, Epicuro, Plutarco, Ptolomeu e até mesmo por filó-sofos orientais, como Confúcio. Ao ler Platão, Einstein recebeuindiretamente a influência decisiva do pensamento socrático.

Embora não haja registro de que ele tenha estudado a obrade William James – o que na verdade é mesmo improvável queo tivesse feito, devido principalmente à barreira do idioma inglês–, ao ler Mach, como já assinalamos, ele se familiarizou com umadas maiores influências sobre a obra de James. Esta observaçãoé importante devido à enorme influência exercida sobre Deweypelo pensamento pragmatista de James.

Einstein, quando jovem, ainda em Berna, iniciou também oestudo da obra de Karl Pearson; mas, logo rejeitou a visão exage-radamente estatística daquele filósofo e matemático.

Alguns clássicos da literatura universal também deixaram as

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suas influências na formação de Einstein enquanto um livre pen-sador e influenciaram, também, ainda que de um modo maisindireto, na sua visão de educação. Dentre tais influências podemser mencionadas, com certeza, as leituras de Racine, Shakespe-are, Sófocles, Dickens e Cervantes, além do próprio Goethe. Acerteza de que Einstein, de fato, estudou amplamente todos essesautores mencionados provém da leitura de várias fontes dignasde crédito³.

Praticamente todos esses pensadores exerceram também umainfluência marcante na eclética formação filosófica de John De-wey, principalmente o estudo do pensamento de Kant, Confúcio,Spinoza, Goethe e dos autores gregos mencionados.

Para corroborar a influência de Kant sobre o pensamento deDewey basta lembrar que a sua própria dissertação de graduação,apresentada em na John Hopkins University, em Washing-ton – quando Einstein era ainda um simples garoto de apenascinco anos de idade vivendo na Alemanha – era intitulada de “APsicologia de Kant”. O manuscrito desta dissertação de Deweynunca foi publicado e também nunca foi encontrado. Acredita-se, entretanto, que o conteúdo ali tratado assemelhava-se em muitoàquele contido em um artigo publicado por Dewey em abril da-quele mesmo ano no The Journal of Speculative Philosophy e cujotítulo era: “Kant e o Método Filosófico”.

Apontaremos, em seguida, algumas das sintonias existentesentre os pensamentos desses mesmos filósofos e os pensamentostanto de Einstein quanto de Dewey.

O reflexo de tais sintonias, por sua vez, ficará mais claro noestudo que se seguirá, posteriormente, da mensagem contida no“Sobre a Educação”. Um tal estudo pode servir também não ape-nas para que se comparem algumas semelhanças entre os pen-samentos pedagógicos de Einstein e de Dewey; mas, ainda, paraque se possa aquilatar a extensão em que tais semelhanças refle-tem uma conjunção de influências filosóficas semelhantes encon-tradas nas formações desses dois grandes pensadores.

Consideremos, por exemplo, logo de início e ainda que deforma muito breve, a influência exercida por Kant sobre o pen-samento de Einstein. Para Kant, a educação está envolvida com o

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grande segredo do aperfeiçoamento da natureza humana. Eins-tein, como veremos adiante, diz algo semelhante no seu célebre“Sobre a Educação”, ao referir-se à ‘lapidação’ necessária para oser humano.

Para Kant, a verdadeira compreensão é o conhecimento dascoisas mais gerais; a razão é para ele o poder de conexão entre ogeral e o particular. Esta importância da compreensão das coisasmais gerais, dos verdadeiros fundamentos, aparece claramentetanto no pensamento científico quanto no pensamento pedagó-gico de Einstein. Para Einstein, a memória deve ocupar-se apenascom as coisas mais importantes de serem retidas e que possamser de utilidade na vida diária. Einstein ao opor-se, certa vez,às concepções educacionais de Thomas Edison, deixou muitoclara a importância por ele atribuída à necessidade do indivíduofocalizar a sua atenção naquilo que é fundamental.

Edison, o célebre inventor norte-americano, tinha uma con-cepção de educação bastante conservadora. Ele creditava umgrande valor à memorização de fatos, datas e curiosidades em ge-ral, ao mesmo tempo em que execrava a educação liberal. Certavez, um grupo de repórteres dirigiu-se a Einstein perguntando-lhe sobre qual seria o valor da velocidade do som. Ao ouviremde Einstein que ele simplesmente não se lembrava, os repórte-res contaram-lhe sobre a opinião de Edison a respeito da im-portância de se memorizar fatos, datas e coisas assim. Einsteinapenas respondeu que ele não costumava carregar em sua menteaquilo que podia ser obtido rapidamente nos livros. Einsteinaprimorou a sua discordância com o pensamento educacional deEdison afirmando, naquela ocasião, que uma pessoa não precisair à faculdade para aprender fatos; ela pode obter os fatos noslivros. O valor da verdadeira educação, uma educação superiorseria, para Einstein, o de treinar a mente a pensar e isto seria algoque não se poderia aprender nos livros-texto.

Em sua alocução “Sobre a Educação”, Einstein desenvolve estasua idéia da necessidade de treinar a mente ao recomendar oestudo apenas das coisas mais fundamentais.

Para Kant, também, é melhor conhecer pouco de alguma coisa,mas de uma maneira profunda, do que conhecer uma grande

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quantidade de coisas apenas superficialmente. Esse pensamentopode ser também encontrado em Ernst Mach, como uma expres-são pedagógica do seu ‘princípio da economia de pensamento’.Para Mach, a grande questão do ensino estava na decisão entreensinar pouco sobre muito ou muito sobre pouco. Ele, clara-mente, assumia, como Kant já o havia feito antes, a segunda al-ternativa. Nietzsche era ainda mais radical ao afirmar que erapreferível não saber nada do que saber algo apenas pela metade.

Como veremos, Einstein, também dava um destaque impor-tante a essa idéia de ensinar-se principalmente aquilo que é fun-damental, aquilo que desempenha um papel estruturador na or-ganização do todo, deixando de lado os detalhes de menor im-portância.

Algo bastante semelhante pode também ser encontrado emSchopenhauer que comparava, metaforicamente, o problemadaquilo que deve ser estudado à arrumação de uma biblioteca.Schopenhauer dizia que uma biblioteca pequena, mas bem ar-rumada, pode ser bem mais útil do que uma grande bibliotecacompletamente desorganizada. De modo semelhante, ele diziatambém que nós podemos acumular um vasto conhecimento,mas este pode ter uma utilidade bem menor – caso não tenhamosparticipado ativamente da sua elaboração – do que um conheci-mento restrito, porém, fruto de uma elaboração pessoal e ativa.

É importante notarmos que Schopenhauer não fazia alusãoapenas a um conhecimento menor; porém, a um conhecimentomais profundo, fundamental e que envolvesse necessariamenteuma elaboração pessoal. Ele estava preocupado, principalmente,com a forma de aquisição de um tal conhecimento e não apenascom a profundidade e a amplitude do seu domínio. Uma tal afir-mativa, portanto, vai além do princípio da economia de pensa-mento presente tanto em Kant quanto em Mach, pois acrescentaa nova dimensão de um envolvimento cognitivo ativo.

Confúcio, já na Antiguidade, também enfatizava, assim comoDewey também viria a fazê-lo, a importância deste envolvimentocognitivo. Confúcio afirmava, por exemplo: “diga-me e eu es-quecerei, mostre-me e eu lembrarei, envolva-me e eu compreende-rei”. Este envolvimento cognitivo do aprendiz, já preconizado por

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Confúcio, fazia com que ele não visse o papel do professor comoo de um simples transmissor do conhecimento. A semelhançados pensamentos de Confúcio e de Dewey já foi tema inclusivede importantes estudos acadêmicos. Dewey, que visitou a Chinaem , chegou a ser denominado pelos chineses de um segundoConfúcio, principalmente no tocante à sua valorização da expe-riência vivida para o ato educativo e pela importância dedicada àquestão cultural, de um modo mais amplo⁴.

A semelhança das palavras de Confúcio – naquilo que parecemais haver influenciado tanto Dewey quanto Einstein – com opensamento de Sócrates, recontado por Platão, é simplesmenteperfeita. A máxima de Sócrates, muitas vezes atribuída tambéma Plutarco, de que “a mente não é um poço que se deve encher,mas uma fogueira que se deve acender”, encaixa-se como uma luvanesta mesma linha de raciocínio. Desta forma, o clássico procedi-mento socrático de um ensino por argumentações problematiza-doras está em perfeita sintonia com o pensamento de Confúcio.Para Confúcio, toda verdade tem quatro lados e ao professor cabeapenas ensinar um desses lados, cabendo ao estudante a tarefa deencontrar os outros três.

A questão do envolvimento cognitivo pode ser claramente en-contrada tanto no pensamento pedagógico de Dewey quanto node Einstein. Para Dewey, a educação não é uma preparação paraa vida; a educação precisa ser a própria vida. De modo análogo,vemos Einstein defender que os próprios educadores colocadoscomo exemplos não são a principal maneira de influenciar aspessoas; são a única maneira. Algo análogo pode ser encontradojá em Sófocles, teatrólogo contemporâneo de Aristóteles na An-tiguidade grega. Para Sófocles, deve-se sempre aprender fazendoas coisas, pois embora se possa pensar saber alguma coisa, só setem certeza quando se tenta fazê-la.

Analisando-se a posição de Einstein a respeito da produçãodo conhecimento, pode-se perceber que ela é carregada de umacomplexidade ainda maior como discutiremos na seqüência des-te capítulo.

Como foi dito anteriormente, Einstein exerceu uma influência

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profunda sobre Wertheimer, um dos criadores da escola psicoló-gica da Gestalt. A razão de uma tal influência reside exatamentena posição adotada por Einstein frente ao ensino e à produçãodo conhecimento. Einstein, neste ponto particular, transcende asposições de Schopenhauer, Confúcio e mesmo a de Dewey. Emvárias ocasiões, ele adotava em suas aulas e em sua pesquisa umapostura bem mais dialética frente à produção do conhecimento,frente à cognição. Como já salientamos anteriormente, Einsteinressaltava freqüentemente a necessidade de se ver, simultanea-mente, o ‘todo’ e as ‘partes’. Foi exatamente a partir deste seuposicionamento que Wertheimer veio a elaborar as suas consi-derações sobre a cognição e a conseqüente atitude a ser adotadano ensino.

Não apenas a dimensão cognitiva do ato educacional preconi-zada por vários filósofos encontra eco no pensamento de Eins-tein, mas também e principalmente a dimensão ética desse atoeducacional. Neste aspecto, Einstein também recebe importantesinfluências dos filósofos cujas obras ele estudou.

Para Hume, por exemplo, quando os homens se mostram maiscertos e quando demonstram uma maior arrogância com uma talcerteza, eles comumente estão equivocados por darem um espaçomaior às suas paixões. A arrogância desse ‘saber douto’ é tam-bém criticada por Spinoza. Para Spinoza, as Academias, que sãomantidas com os recursos do povo, servem não para cultivar ashabilidades dos homens, mas para restringi-las, para aliená-las.Einstein zombaria, ainda bem jovem, de tais Academias ao adotara denominação irônica de Academia Olímpia para o seu grupo deestudos filosóficos com os seus dois amigos, Maurice Solovine eConrad Habicht.

A liberdade de pensamento e de ação e o respeito às diver-gências de opinião eram defendidos fortemente por Einstein emsua prática educativa, em oposição a um ensino simplesmentecalcado na disciplina e na memorização. Neste sentido, Nietzscheatuou sobre ele como uma segura fonte inspiradora. Para Nietzs-che, a melhor maneira de corromper a juventude é instruí-la amanter um maior respeito por aqueles que pensam do mesmomodo do que por aqueles que pensam de um modo diferente.

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Nietzsche também acentua criticamente que o papel desempe-nhado pela educação superior tinha sido até então o de trans-formar os homens em máquinas. E o modo de fazê-lo, segundoele, seria pela inculcação do conceito de obrigação, de dever. Elesalienta, além disso, que este tipo de educação parece destinar-seà formação de burocratas. Essa posição de Nietzsche encontra-ria ressonância na visão crítica de Einstein sobre os rigores daautoritária e desmotivadora educação germânica do seu tempo.Como veremos mais adiante, em sua alocução ‘Sobre a Educação’,Einstein chegou a comparar uma tal educação autoritária com amera formação de “máquinas utilizáveis” e não de personalidadeslivres e harmoniosas.

Einstein também parece alinhar-se com Schiller quando estedefende que a chave para uma boa educação é a experiência dabeleza ou, ainda, quando Schiller também defende que a liber-dade só pode ser conquistada pela verdadeira educação. Einsteinadota esta postura estética para a educação e até mesmo comoguia de sua própria atividade científica. Schiller afirma também,de modo sarcástico, que contra a estupidez humana nem os deu-ses podem ser vitoriosos, no que é acompanhado por Goethe quediz que nada é mais trágico do que a ignorância. Para Goethe, nósconhecemos algo apenas quando permitimos um espaço para adúvida.

Todos esses pensamentos críticos atuaram como um autênticofermento nas concepções educacionais de Einstein.

Também, para Goethe, nós somos moldados por aquilo que a-mamos. Nós sempre aprendemos verdadeiramente apenas quan-do partimos daquilo que amamos. Para ele, ainda, um professorque consegue reconhecer uma boa ação faz mais do que aqueleque enche a memória do estudante com listas enormes de obje-tos da Natureza classificados pelo nome ou pela forma. Comodestacamos no capítulo inicial, também para Einstein o amorconstituía-se em um professor melhor do que o sentido da o-brigação.

Goethe também volta-se contra o ensino acadêmico ao dizerque ele é repleto de informações; mas, que a maior parte das mes-mas é simplesmente inútil e recomenda tratar as pessoas como se

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elas fossem o que deveriam ser para que assim possamos ajudá-las a serem aquilo que poderão vir a ser. Neste sentido do tra-tamento humano dispensado no ensino, Einstein enfatizava oexemplo dado pelos professores. Certa vez, ao ser questionadopor Peter Bucky sobre o que ele acreditava ser a coisa mais im-portante a ser aprendida na Escola, Einstein enfatizou a questãoda atitude no tratamento com as pessoas, dizendo que:

“o ensino recebido por alguém pode ser muito bom, mas o ensinoé sempre, em certo sentido, inseparável da personalidade doprofessor. Se o professor tem uma personalidade má, osestudantes rejeitarão o assunto que poderia ser normalmente deinteresse para eles.”

Sobretudo, a dimensão ética dos ensinamentos de Goethe ca-lou muito fundo na formação humanista de Einstein, na sua de-corrente visão educacional e na sua conseqüente postura peda-gógica. Na prática, em especial, o respeito profundo que Einsteinsempre demonstrou em relação aos seus estudantes está em per-feita sintonia com o pensamento de Goethe.

Em certa medida, mesmo os clássicos da literatura lidos porEinstein exerceram, também, as suas influências pedagógicas so-bre o seu ideário educacional.

Shakespeare, no século XVII, dizia que a melhor maneira decorromper a juventude seria com a construção de uma institui-ção como a típica escola particular inglesa. Até mesmo Racine,o grande escritor francês que Einstein tanto apreciava, referia-seà falta de prazer com que se vai costumeiramente para a Escola.Racine afirmava que geralmente faz-se passar por saber aquilosobre o qual não se sabe nada e acrescentava que não existe nadaque seja tão fácil que não possa se tornar difícil quando o fazemoscom relutância.

Einstein, certa vez, manifestou o seu pensamento educacionalde um modo bastante relacionado ao pensamento de Racine aoafirmar que:

“tornar difícil o que é fácil, é fácil; mas, tornar fáil o que é difícil,é difícil.”

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Na literatura a que Einstein teve acesso, os próprios livros,também recebem a sua parcela de crítica. Dickens, por exem-plo, já dizia que existem livros cujas capas são de longe as suasmelhores partes. Podemos perceber uma clara sintonia de taisidéias no pensamento de Einstein. Para ele:

“a maioria dos livros sobre ciência e que se dizem destinados aoleigo procura mais impressionar o leitor do que lhe explicar clarae lucidamente os objetivos e os métodos elementares. Depois queum leigo inteligente tenta ler alguns desses livros, ele ficacompletamente desanimado. Sua conclusão é: eu sou idiotademais, é melhor eu desistir.”

O caso seguinte ilustra esta mesma sintonia. Em , LincolnBarnett escreveu um pequeno livro de divulgação das idéias deEinstein que se tornou famoso pela sua simplicidade e qualidade.O livrinho era intitulado “O Universo e o Dr. Einstein” e foitraduzido com sucesso para vários idiomas. Einstein escreveu oprólogo daquela obra e ali deixou registrada a sua opinião sobreos livros de divulgação científica:

“qualquer um que tenha tentado alguma vez expor um temacientífico para um público não especializado sabe o quão difícil éfazê-lo. Ou ele consegue tornar inteligível o seu discursoocultando a essência do problema e oferecendo ao leitor aspectossuperficiais e alusões vagas, enganando-o, assim, ao fazer-lhecrer que compreende; ou então ele lhe dá uma explicaçãoespecializada do problema, de tal forma que o leitor que nãotenha uma preparação especial torna-se incapaz de compreendera exposição e perde logo o interesse pela leitura. Se omitirmosesses dois tipos atuais de literatura de divulgação científica, bempouco ainda resta. Mas, esse pequeno remanescente é muitovalioso. Ele tem muita importância ao dar oportunidade aopúblico de tornar-se consciente e de modo inteligente acerca dosesforços e dos resultados da investigação científica. Não bastaque uns tantos especialistas compreendam, elaborem e apliquemcada resultado. Restringir o acesso ao campo do conhecimento

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científico a um pequeno grupo assassina o espírito filosófico dopovo e conduz à pobreza espiritual.”

O quadro de influências exercidas sobre Einstein pelos seusestudos filosóficos e pela literatura a que teve acesso é muito am-plo para que se possa dar mais do que um simples panoramacomo este que aqui tentamos apresentar. Entretanto, um tal pa-norama, ainda que breve, já pode nos servir ao menos comouma base para que possamos compreender um pouco melhor acomplexidade, a multiplicidade e a riqueza dos significados con-tidos no seu discurso denominado “Sobre a Educação” e para quepossamos encontrar as aludidas sintonias com o pensamento deoutros pensadores, em particular com o pensamento educacionalde Dewey, como segue no próximo capítulo.

Notas do Capítulo

. Segundo consta em Jaehnig, Kenneth. Collection offers view of John Dewey’slife, work. Southern Illinois University Carbondale News. N., September .. Uma discussão do caso Russel e da manifestação conjunta de Dewey e deEinstein pode ser encontrada, por exemplo em: Davis, Philip. Russell’s RealParadox: The Wise Man Is a Fool. SIAM News, Volume , Number , July .. Praticamente todos os biógrafos mais conceituados de Einstein são unânimesem destacar a importância dessas suas leituras filosóficas assim como a influênciasecundária das obras literárias mencionadas. Dentre tais estudiosos da vida e daobra de Einstein que se referem explicitamente à sua formação filosófica, pode-secitar, por exemplo: Phillip Frank, Ronald Clark, Peter Michelmore, Hoffmann &Dukas, Abraham Pais, Albrecht Folsing, Denis Brian, Gerald Holton, Highfield& Carter e vários outros.. Para um aprofundamento desta comparação pode-se consultar, por exemplo:Grange, Joseph. John Dewey, Confucius, and Global Philosophy. New York: StateUniversity of New York Press, ; Hall, David & Ames, Roger. The Democracyof the Dead: Dewey, Confucius, and the Hope for Democracy in China. Open CourtPublishing Company, ; Luo, Shirong. Human Nature and Self-Cultivation: AComparative Study on the Philosophies of Confucius and John Dewey. Master ArtsDissertation. Department of Philosophy, Texas A & M University, .

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Sintonias entre os

Ideários Educacionais deEinstein e de Dewey

E em seu ideário educacional o espírito

filosófico mais progressista e renovador a que teve acesso eque para ele fazia bastante sentido ao ser contrastado com

a educação tradicional que ele recebera quando jovem na Alema-nha e que tanto o incomodara. Este contraste contribuiu, muitopossivelmente, para fazê-lo expressar brilhantemente o espíritoeducacional por ele preconizado, à luz de suas próprias vivên-cias mais felizes em Aarau, com notável sensibilidade, emoção eeloqüência.

Por outro lado, para fazer jus à criatividade de Einstein, po-demos dizer que se tal absorção do espírito intelectual mais pro-gressista da sua época de fato ocorreu, ela deve ter ocorrido talcomo ocorre com certos solos e as boas sementes. Algumas vezes,as sementes germinam, outras vezes, não. Havia, decerto, daparte de Einstein, no mínimo, um certo substrato afetivo, éticoe intelectual já presente no seu modo de pensar e de agir, de vero mundo e a educação, para que tais influências se tornassem,como se apresentam em seu ideário educacional, tão coerentese fecundas.

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Einstein assinala, com grande sensibilidade, que as questõesligadas aos seres humanos são de uma outra ordem de comple-xidade bem diferente daquela do campo da ciência e que tal or-dem transcende o campo da verdade científica requerendo a ne-cessidade de se repensar continuamente o fenômeno em causa.Referindo-se às tais questões, ele afirma em seu discurso “Sobre aEducação” que:

“neste caso, o simples conhecimento da verdade não basta; aocontrário, esse conhecimento deve ser continuamente renovadopor um esforço incessante, sob pena de se perder. Assemelha-se auma estátua de mármore erguida no deserto e sob a permanenteameaça de ser soterrada pelo deslocamento da areia.”

Einstein destaca, metaforicamente, a necessidade de que nãoapenas os grandes artistas, os grandes escultores das obras de artedevam ter o seu papel reconhecido; mas, que também seja dadoo devido crédito ao trabalho abnegado daqueles que zelosamentepreservam tais obras ao longo dos séculos para a posteridade.É nesta condição metafórica de simples zelador do pensamentoeducacional advindo de muitas gerações passadas que ele, humil-demente, se coloca naquela sua célebre alocução:

“as mãos dos zeladores têm que trabalhar incessantemente paraque o mármore continue a brilhar para sempre sob o sol.Minhas mãos também devem estar entre elas.”

Ao colocar-se desse modo, Einstein apenas sugere modesta-mente ser ele um conhecedor de tais obras educacionais que an-seia preservar e ‘polir’. Ele jamais nomeia, claramente, tais obras,talvez por não querer assumir publicamente uma posição eruditaem uma área na qual ele não se sentia tão à vontade quanto nocampo científico. Cabe ao intérprete, portanto, buscar tentati-vamente identificar, como esboçamos no capítulo anterior, quaisforam aqueles que ergueram as ‘tais estátuas’ que ele se propõezelosamente a preservar e a aprimorar.

Einstein enfatiza a função crescente da instituição Escola na so-ciedade moderna a partir da sua constatação do enfraquecimento

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do papel educacional da família gerado pelas novas condições detrabalho impostas pelo desenvolvimento capitalista. Esta preo-cupação de Einstein com a nova importância da Escola trazidapela transição de um modo de produção mais ligado às manufa-turas e ao campo para um modo de produção capitalista pode seridentificada também no Movimento Escola Nova. Podemos aindaidentificar o mesmo tipo de transição ocorrida a partir do ideárioeducacional de Pestalozzi para um ideário ainda mais modernoda Escola Nova o qual tentou incorporar ao ideário pestalozzianoas necessidades de uma sociedade em mudança, as necessidadestípicas de uma era industrial.

Einstein destaca, em sua alocução, com clareza, que o papelmoderno da Escola é, assim, bem mais importante do que emtempos passados:

“a escola sempre foi o mais importante meio de transmitir ariqueza da tradição de uma geração para a seguinte. Isto é aindamais verdadeiro hoje que em tempos passados, pois, emdecorrência do moderno desenvolvimento da vida econômica, afamília foi enfraquecida como portadora da tradição e daeducação. A continuidade e a saúde da sociedade humana,portanto, depende da escola em grau ainda maior do queoutrora.”

Já neste ponto inicial do seu discurso, isto é, no cuidado ena importância por ele atribuída ao conhecimento advindo degerações anteriores às nossas, é perceptível a sintonia do seu pen-samento com a visão educacional de Dewey, um dos defensoresmais analíticos e críticos do assim denominado ‘Movimento Es-cola Nova’ ou ‘Movimento Progressivista’ da educação.

Dewey referindo-se à natureza da educação, na abertura deum conjunto de temas educacionais por ele abordados em ,intitulado ‘Meu Credo Pedagógico’, focaliza a questão da relaçãodo indivíduo com a coletividade ampla formada pela espécie hu-mana. Ao valorizar a cultura herdada por cada indivíduo na so-ciedade, Dewey expressou a sua crença de que toda educação co-meça pela participação do indivíduo na “consciência social da raça

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humana”. Segundo Dewey, o indivíduo passa, desde o seu nas-cimento, por um processo inconsciente que vai continuamentedando forma às suas habilidades naturais e impregnando a suaconsciência com a formação de hábitos, com o treinamento desuas idéias bem como com o excitamento de seus sentimentos eemoções. Neste longo empreendimento, o indivíduo vai gradual-mente tornando-se um ser social que ao compartilhar os recursosmorais e intelectuais que a humanidade produziu, torna-se umherdeiro dessa riqueza da civilização. Assim, segundo Dewey,

“a diferença entre civilização e estado selvagem, para tomar umexemplo em grande escala, decorre do grau em que asexperiências prévias mudaram as condições objetivas em que sepassam as experiências subseqüentes. A existência de estradas,meios de rápido movimento e transporte, ferramentas,máquinas, casas, equipamento, luz e força elétricas, sãoilustrações. Destruídas as condições externas da presenteexperiência civilizada, cairemos, por algum tempo pelo menos,nas condições primitivas. Em uma palavra, vivemos donascimento até a morte, em um mundo de pessoas e coisas que,em larga medida, é o que é devido ao que se fez e ao que nos foitransmitido de atividades humanas anteriores.”

A abordagem de Dewey, acima mencionada, da inserção do in-divíduo na consciência social da raça humana, muito assemelha-se à valorização da cultura feita por Einstein e mencionada acima,embora alguns autores, equivocadamente, não reconheçam – emseus textos, por vezes, esquemáticos – uma tal valorização dopapel da dimensão cultural na educação bem presente na obrade Dewey.

Na verdade, a diferença traçada por Dewey entre a experiênciacivilizada e as condições primitivas, alerta-nos para um enganobastante comum de alguns textos educacionais que costumamcolocar como linha demarcatória entre a Escola Tradicional e aEscola Nova, a idéia de que enquanto a primeira teria a preocu-pação com a transmissão da cultura, a segunda preocupar-se-iaapenas com os processos de aquisição do conhecimento. Um tal

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equívoco certamente não faz jus à complexidade do pensamentode Dewey.

É interessante lembrarmos que, primeiro, o Movimento daEscola Progressivista teve vários teorizadores com níveis de apro-fundamento e aspectos focalizados variados e, segundo, que oque se põe em prática no ensino nem sempre é o que foi analisadoe colocado como o ‘ideal’ por um certo filósofo da educação,como mencionamos anteriormente.

No caso de Dewey, o qual teve o cuidado de não fazer umacaricatura da pedagogia tradicional, atuando sempre como umverdadeiro filósofo, foi ele próprio caricaturado por alguns edu-cadores que o identificaram equivocadamente com as ações edu-cacionais dos praticantes do ideário do Movimento da EscolaNova em geral, vistas por aqueles críticos como ingênuas. Mas,em contrapartida, Dewey é, também, comumente consideradopor vários estudiosos como não apenas o mais importante filó-sofo do Movimento da Escola Nova como também um dos maisimportantes do século XX.

Dewey nunca desvalorizou em suas idealizações educacionaiso conhecimento produzido pelas gerações anteriores. Pelo con-trário, tal conhecimento constituía-se, em conjunto com as ex-periências de vida dos alunos, em uma base dupla sobre a qual aeducação deveria ser planejada pela Escola. Para Dewey, a ques-tão educacional não se colocava como uma escolha unilaterala ser feita entre o uso, pela Escola, das realizações do passadoe a prática de colocar-se o foco nas experiências presentes dosalunos. Bem diferentemente, o que ele rejeitava era o foco daEscola Tradicional ao colocar no conhecimento do passado o fimou a meta a ser atingida pela educação. Esse conhecimento pro-duzido pelas gerações passadas constituía, na visão de Dewey, ummeio para a educação dos jovens e como um meio teria que seradaptado às experiências presentes por eles vividas. Como eledizia, não era a questão do ‘isto ou aquilo’; a verdade ocupavauma posição intermediária. De fato, foram muitas as suas críticasao ensino tradicional; sem, no entanto, jamais caricaturá-lo. Osmotivos das suas críticas eram diferentes da equivocadamentesugerida ‘negação do valor do conhecimento produzido pela hu-

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manidade’ e a ele atribuída por alguns críticos seus. Não noscabe, entretanto, esmiuçar tais motivos neste presente trabalho,pois, este não é aqui o nosso objetivo principal.

À parte uma tal polêmica sobre o valor educacional da trans-missão cultural na obra de Dewey, basta-nos, neste texto, ver queambos, Einstein e Dewey percebiam a importância da culturaem seu sentido sociológico amplo, isto é, como um modo devida de uma comunidade ou sociedade constituído de uma baseespiritual ou conhecimento em geral – científico, moral, religi-oso, filosófico e artístico – e uma base material constituída porobjetos ou bens materiais em geral, advindos do conhecimentoproduzido e do trabalho humano.

Seguindo Vygotsky (–), contemporâneo de Einstein ede Dewey, que também valorizava educacionalmente a culturaproduzida pela humanidade, poderíamos acrescentar que o ho-mem nasce hominídeo, um ser com características biológicas daespécie humana, e hominiza-se, torna-se ‘homem’, ao adentrarna cultura de seu tempo. A esse processo de alguém adentrarna cultura que aí já está colocada antes dele nascer, Vygotskydenominou de ‘enculturation’¹.

Tal processo é considerado mesmo como sendo vital à conti-nuidade e à preservação da espécie humana, cujos membros sãoseres de aprendizagem e dependem da mesma para sobreviverem.

A apreensão da cultura pelos indivíduos era vista, por Eins-tein, como uma construção não estática e quando ele se refereà cultura, não está se referindo apenas ao conhecimento em siou especificamente ao conhecimento científico; mas, igualmente,às outras elaborações humanas. Esta importância atribuída àcultura incorpora desde a possibilidade da própria sobrevivênciabiológica da espécie humana como também até o processo, comoele se referiu, de ‘lapidação’ e enobrecimento dos indivíduos.

Não apenas nesta sua famosa alocução, ‘Sobre a Educação’,Einstein se manifesta desta maneira. Em várias outras ocasiõespodemos percebê-lo enfatizando o papel duplo da educação napreservação e no desenvolvimento da cultura, vista por ele comouma construção coletiva e, em assim sendo, como um fruto dosvalores máximos – éticos e artísticos – da civilização. Einstein,

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em outra ocasião, ao dirigir-se a jovens estudantes, identificoutal tratamento da cultura, com a própria imortalidade do ser hu-mano, imortalidade do indivíduo calcada não só na apreensão,mas, também, no desenvolvimento do conhecimento produzidopelo coletivo; coletivo este que ele, semelhantemente a Dewey,estende à ‘espécie’ humana:

“pensem que todas as maravilhas, objetos de seus estudos são aobra de muitas gerações, uma obra coletiva que exige de todosum esforço entusiasta e um labor difícil e impreterível. Tudoisto, nas mãos de vocês, se torna uma herança. Vocês a recebem,respeitam-na, aumentam-na e, mais tarde, irão transmiti-lafielmente à sua descendência. Deste modo, somos imortais,porque criamos, juntos, obras que nos sobrevivem. Se refletiremseriamente sobre isso, encontrarão um sentido para a vida epara o progresso. E o julgamento que fizerem sobre os outroshomens e as outras épocas será mais verdadeiro.”

Einstein enfatizava, assim, a importância da educação comouma forma do ser humano transcender a sua própria finitude, debuscar na apropriação, preservação e desenvolvimento da cul-tura a sua própria imortalidade. Diferentemente da ideologiacorrente de muitos jovens atualmente, do aprender como ato deconsumo e sem o enfrentamento de dificuldades, Einstein via,sobretudo, nesse esforço intelectual e entusiasta do ser humano,a que ele se referiu, a fonte da sua própria transformação. Eleassinala, assim, a dialética entre os produtos e os processos deprodução do conhecimento – e tal produção é vista como umtrabalho – pois ele afirma que:

“os resultados da pesquisa não exaltam nem apaixonam, mas, oesforço tenaz para compreender e o trabalho intelectual parareceber e para traduzir, transformam o homem.”

Essa sua assertiva lembra-nos a visão marxista de trabalho hu-mano, como aquela atividade que não se caracteriza apenas porgerar um resultado material que antes não existia e que posteri-ormente passa a existir. Resultados materiais, apenas, os outros

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animais também produzem: a aranha constrói a teia e o pás-saro constrói o ninho que antes não existiam, o castor constróio dique que antes não existia e assim por diante. A questão éque, diferentemente do ser humano e salvo raríssimas exceçõesdo mundo animal irracional, os animais de uma mesma espécie esituados na parte inferior de desenvolvimento da escala zoológicafazem o que fazem sempre de um mesmo modo, instintivamente,de acordo com as informações contidas em sua genética. Alémdisso, os animais irracionais não transformam a si mesmos.

O ser humano, engajado intencionalmente em alguma ativi-dade de trabalho, gera um resultado material (ou imaterial, noplano das idéias) que poderá ser útil ou não a outrem – a depen-der do seu uso na prática – e, ao mesmo tempo, transformama si mesmos. Isso significa dizer que ao trabalhar, o homemse autoproduz. Com o trabalho humano, a realidade em queo homem está inserido muda, o mundo deixa de ser exclusi-vamente Natureza e a essência humana também não é mais amesma. Ambos mudam, o mundo mental dos indivíduos quetrabalham e a realidade que os circunda.

Esta mudança mútua no homem e na realidade que o cercafaz-nos lembrar, a máxima de Heráclito de que

“um homem não bebe água duas vezes em um mesmo rio porquena segunda vez, ambos, o homem e o rio terão mudado.”

Vale, entretanto, lembrar que esta visão acerca do trabalhohumano nem sempre é verdadeira, pois há um desenvolvimentomental dos indivíduos quando estes estão envolvidos em formasde trabalho que não sejam apenas repetitivas e alienantes. Nocaso de sociedades onde há a exploração do homem pelo homem,isto é, nas quais o trabalho humano é limitado a repetições mecâ-nicas e sem criatividade, o trabalhador não se auto-produz ao re-alizar tarefas rotineiras específicas e que comumente não fizeramparte de um objetivo, de um projeto seu; um projeto de algo a serconstruído atribuindo significados às partes visando um ‘todo’ esegundo certas finalidades anteriormente previstas. Na ausênciadisto, o trabalho aliena o homem, ao invés de enobrecê-lo, de

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lapidá-lo. Em um tal tipo de trabalho alienante, o homem édesprovido não apenas da posse do fruto do seu trabalho comoaté mesmo do próprio significado do mesmo.

Este mesmo tipo de análise pode ser feito com relação ao en-sino tradicional criticado por Einstein no qual não se valoriza acriatividade e a independência de pensamento e onde o alunotoma posse de resultados através de processos alienantes de me-morização, tornando-se também, ele mesmo, alienado dos pro-dutos intelectuais. Com isto, ele não se autoproduz intelectual-mente. Daí, a necessidade da valorização do aspecto intelectualdo trabalho humano em uma perspectiva educacional que valo-rize os processos de produção do conhecimento e não apenas osresultados obtidos em aprendizagens mecânicas.

Tomando esta concepção de Einstein de que o trabalho intelec-tual transforma o homem, podemos fazer aqui um paralelo entreesta questão – do significado marxista do trabalho alienante quegera um indivíduo alienado do que ele produziu – com a situaçãoda educação tradicional e os seus produtos criticados por Dewey.

Ao referir-se que os instintos próprios da criança e as suashabilidades naturais deveriam fornecer o material e constituir oponto de partida para toda verdadeira educação, Dewey vê em‘Meu Credo Pedagógico’ que exceto no caso em que os esforços doeducador sejam conectados com alguma atividade que a criançaesteja desenvolvendo sem a interferência do educador, a educa-ção reduz-se simplesmente a uma pressão sobre os alunos. Estaeducação pode até trazer alguns resultados externos; mas, nãopode ser chamada de uma verdadeira educação.

Para Dewey, “sem um insight relativo à estrutura psicológica e àsatividades dos indivíduos, o processo educativo será casual e aciden-tal”. É clara a importância educacional colocada por Dewey tantono que se refere às atividades já em exercício pelos indivíduosem suas comunidades quanto ao insight necessário, por partedos educadores, relativamente às estruturas psicológicas dos in-divíduos para que o processo educativo possa ser bem sucedido.Para ele, se tal processo educativo coincidir com a atividade dacriança, tal ato atingirá o efeito da força de uma alavanca; seele não coincidir, o resultado de tal processo será, para Dewey,

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a desinteligência, a desintegração ou a interrupção da naturezada criança.

Semelhantemente a Dewey, Einstein em conversa com PeterBucky, enfatizou a importância da empatia dos professores comoalgo decisivamente necessário para que o ato educativo seja bemsucedido. Ele acreditava que a fragilidade de muitos professoresera devida ao fato de que eles não tentavam imaginar a si mesmosno lugar dos seus alunos e assim não conseguiam perceber comoeles pensavam. Para ele, os professores comportavam-se comopais que esperam que os seus filhos ajam, pensem e reajam comoadultos. Ao contrário, Einstein acreditava que o bom professorprecisaria imaginar-se dentro das mentes dos seus estudantes.

Einstein, ao focalizar o processo de transformação do homempelo trabalho, no caso intelectual, vê a importância vital de queo processo educacional inicial não sofra quaisquer interrupções,pois, em suas palavras:

“a ruptura do treino intelectual em anos decisivos para aformação provoca um atraso, dificilmente recuperável maistarde.”

Fazendo um paralelo entre este alerta de Einstein e o estadoatual da educação brasileira, identificamos uma situação bastantepreocupante ao focalizarmos a imensa quantidade existente deanalfabetos funcionais, em várias áreas do conhecimento, quesequer são um resultado da ruptura do processo educacional aqual preocupava Einstein. No caso de milhares de brasileiros, nãose trata de ter havido um rompimento com um treino intelectualanterior; mas, de não lhes ter sido propiciado sequer um começode um tal processo educacional de uma qualidade minimamenterazoável. Por outro lado, se Dewey estiver com a razão ao associareducação e vida, como nos parece estar, seria no mínimo razoávelpararmos, como educadores, para pensarmos sobre o malefícioque podemos estar causando às nossas crianças e, por decorrên-cia, também à nossa sociedade, com um ensino improdutivo ecomumente destituído de qualquer ligação com as suas vidas.

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Uma leitura inicial e desatenta dos posicionamentos de Eins-tein sobre a apreensão da cultura pode conduzir ao equívocode pensarmos que ele estivesse defendendo uma educação quevisasse apenas a manutenção do status quo nos planos ideoló-gico e social. Entretanto, tal equívoco é desfeito quando ele ex-pressa que:

“conhecemos e amamos, nas obras primas do desenvolvimentointelectual europeu, os valores supremos. Eles exigem liberdadede opinião e liberdade de ensino porque a luta pela verdade deveter precedência sobre todas as outras lutas.”

Embora fosse interessante ter ficado mais claro quais os tex-tos que ele considerava ‘obras-prima’, a referência constante eenfática, em suas falas, sobre a importância da liberdade de ex-pressão dos indivíduos em geral e na prática educacional – bemcomo a preocupação com a busca da verdade – apontam paracaminhos de mudanças contínuas rumo ao aprimoramento sejado conhecimento existente seja da construção de uma sociedademais humana. Não havia, portanto, no pensamento de Eins-tein uma preocupação reacionária de manutenção do status quoacima referido. Bem ao contrário, na própria continuidade dasua alocução, “Sobre a Educação”, podemos, claramente, aquila-tar o real valor que Einstein atribuía à criatividade e à liberdadede expressão na transformação da cultura e da sociedade. A suaconcepção de preservação da cultura, mas, também, de desen-volvimento cultural era dotada, assim, de um inegável caráterdinâmico e transformador.

Esta visão de Einstein sobre a educação como algo vivo e trans-formador bem como o olhar lançado concomitantemente para osbeneficiários da riqueza intelectual produzida, isto é, para o pró-prio indivíduo e a comunidade, fazem-se fortemente presentesno ideário filosófico-educacional de Dewey. No ‘Meu Credo Pe-dagógico’, por exemplo, Dewey enfatiza a importância de conce-bermos o indivíduo como ativo em seus relacionamentos sociais.

Colocando de uma outra forma o insight psicológico a que serefere Dewey e que citamos acima, a educação, para ele,

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“deve começar com um insight psicológico sobre as capacidades,interesses e hábitos da criança /.../estas energias, interesses ehábitos devem ser continuamente interpretados – nós devemossaber o que eles significam. Eles devem ser traduzidos em termosde seus equivalentes sociais.”

Por um lado, para Dewey, o único ajustamento possível emrelação à criança precisa ser feito em termos de suas condiçõesexistentes, isto é, aquele ajustamento que surge através de umacompleta posse de todas as suas habilidades naturais. Por outrolado, essas habilidades naturais e hábitos devem ser traduzidosem termos de seus equivalentes sociais, ou seja, em termos doque tais habilidades e hábitos sejam capazes de contribuir parao serviço social, em sua comunidade, em sua sociedade. Assim,na visão de Dewey, a educação e a sociedade não se desvenci-lham, jamais, uma da outra. Esta interpretação contínua dasenergias, interesses e hábitos dos alunos, defendida por Dewey,encontra-se em sintonia com a necessária empatia dos professo-res, apontada por Einstein e sobre a qual discorremos anterior-mente, imaginando-se a si mesmos dentro das mentes de seusalunos.

Tal como Dewey, Einstein vê com bastante clareza, a imbri-cação necessária entre educação e sociedade, ao não focalizá-lascomo instâncias isoladas. Para Einstein, a educação não é algoque ocorra em uma Escola à parte da sociedade; ao contrário, aeducação não deveria deixar de ter essa sociedade como um dosseus alvos principais.

Outro foco da visão educacional de Einstein é o próprio alunoque teria, para ele, o direito de realizar-se como indivíduo. Eleenfatiza, peremptoriamente, que a educação deve ser vista comoalgo vivo e transformador cuja função deve ser a de dotar osindivíduos de uma capacidade de ação e de transformação, tantoem benefício próprio quanto em benefício da sua comunidade.

Para atender a essas preocupações acima, vemos que os posi-cionamentos de Einstein sobre a educação necessária a ser propi-ciada aos jovens apresentam uma vertente tríplice. Esta vertente

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está pautada em preocupações éticas (referentes a comportamen-tos baseados no estado de alerta sobre o que é certo e verdadeiro),em preocupações sociais (relativas ao bem estar da coletividade)e em preocupações psicológicas (atinentes à felicidade dos alunoscomo indivíduos portadores de personalidades harmoniosas).

Para Einstein, nenhum desses três pólos é mais importanteque o outro. De fato, essas três dimensões estão sempre imbri-cadas umas com as outras, sem incoerência, nas expressões deseu pensamento. Separamo-las aqui apenas como uma formade abordar os elementos principais constitutivos do seu ideárioeducacional. Tais elementos são decisivamente complementaresentre si, sendo, por vezes, até difícil separá-los na interpretaçãode suas idéias, pois aparecem comumente inter-relacionados emsuas falas. Vemos que tal inter-relacionamento deve-se ao fatode que não existe um sujeito ético dissociado de um certo es-tado psicológico ou de uma certa condição social ou que não sejadetentor de uma visão, por menos elaborada que seja, sobre asociedade e o seu funcionamento.

Cada indivíduo incorpora esses três aspectos naquilo que eleé. Entretanto, é belo o relevo no qual Einstein coloca a dimensãoética em que o elevado destino do ser humano deveria ser o deservir à humanidade e não o de a ela impor-se. Ao levantar, parasi mesmo, a questão sobre qual seria a função da educação e daEscola, ele responde que:

“ambas deveriam ajudar o jovem a crescer em um tal estado deespírito que os princípios (éticos) fundamentais fossem para elecomo o ar que respiram. O ensino, por si só, não conseguefazer isso.”

É clara a diferença, para Einstein, entre uma verdadeira educa-ção e o mero ensino. Podemos dizer que este estado de espíritoético apontado por Einstein chega mesmo a orientar-se para aformação de uma personalidade onde haja a sublimação – e nãoa repressão ou a mera supressão – do estado egoísta para o es-tado altruísta. Deste modo, também enaltecendo o necessáriolado prazeroso da Escola, Einstein, ainda em sua conversa com

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Peter Bucky, retomou a questão do valor de um homem e ex-pressou que:

“eu sinto que o homem deve ser mais apropriadamente avaliadopelo que ele é capaz de dar do que pelo que ele é capaz de receber.Por isso, as pessoas precisam ser treinadas na atitude de dar aosseus semelhantes. Se a humanidade deve se beneficiar de cadaum dos seus membros, as pessoas precisam ser treinadas desdejovens e, ao mesmo tempo, a escola precisa ser uma experiênciaprazerosa.”

Tendo em vista o ‘todo’ de sua alocução “Sobre a Educação” eoutras idéias apresentadas em outros momentos e lugares, vemosque Einstein apresenta uma forte preocupação com a necessidadeda formação de indivíduos autênticos, éticos e úteis socialmente,a ser possibilitada através de uma Escola indispensavelmente pra-zerosa para os jovens. Ele critica constantemente o funciona-mento da Escola tradicional contrapondo as suas visões acercado que seria necessário ser construído. Essa crítica constante aosmétodos tradicionais na educação deve-se muito à sua própriaexperiência como estudante e como professor, como já discu-timos anteriormente. Na sua época de estudante no LuitpoldGymnasium, excetuando um único professor, Einstein referia-se à atitude generalizada de seus ex-professores como sendo ade sempre esperar que os alunos obedecessem às suas ordensde tal forma que fosse uma “obediência de um corpo inanimado,sem vida”.

À guisa de mais uma comparação entre os ideários de Einsteine de Dewey, vemos que essa tríade de preocupações psicológicas,sociais e éticas fez-se também fortemente presente nos escritosde Dewey.

Como mencionamos anteriormente, Dewey apresenta em seutexto “Meu Credo Pedagógico”, a crença de que a única educaçãoverdadeira é aquela que surge da estimulação das habilidades na-turais da criança e através das necessidades das situações sociaisda comunidade em que ela se insere. Assim, através dessas de-mandas sociais, a criança é estimulada a agir como um compo-nente de um todo único, seus sentimentos e capacidade de ação

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emergem e fazem com que ela passe a identificar-se com o bemestar do grupo a que pertence. Ela vai, assim, tornando-se umser social através da percepção das respostas dos outros membrosdaquela comunidade.

Apesar de colocar o lado psicológico como a base de todo esteprocesso educacional, Dewey explicita os dois pólos – o psico-lógico e o sociológico – como dois lados do processo educacio-nal onde nenhum dos dois deveria ser negligenciado, pois, nestecaso, os prejuízos seriam enormes. Para ele, se acreditarmos queo indivíduo que estiver sendo educado é um indivíduo social eque a sociedade é uma união orgânica de indivíduos, não pode-remos eliminar o fator social da criança; caso contrário, só nosrestaria uma abstração. Por outro lado, se nós eliminarmos ofator individual da sociedade, restar-nos-á uma massa inerte esem vida. Assim, Dewey não colocava na sociedade, a ser for-mada através da educação, o único alvo da ação educacional; oindivíduo também era visto como muito importante tal comono ideário de Einstein.

Para Dewey assim como para Einstein, o indivíduo e o gruposocial são complementares; porém distinguíveis. Interpretandoesta complementaridade e distinção, podemos dizer que o indi-víduo é uma totalidade dentro de uma outra que é a sociedade, ogrupo social a que pertence. Indivíduo e sociedade relacionam-seem uma interferência mútua, um faz o outro, mas um não éo outro.

Retomando a tríade de preocupações psicológicas, sociais e éti-cas, percebemos que o último pólo – o ético – presente no ideárioeducacional de Einstein também está implícito em toda a filosofiaeducacional de Dewey. A preocupação ética faz-se logo presenteem sua filosofia ao respeitar a criança nas suas necessidades indi-viduais ou sociais, vendo a educação como um processo de vidapresente, que está a acontecer, e não como uma preparação paraa vida futura que, como acrescentaríamos aqui, existirá ou nãopara todos. Portanto, para Dewey, é preciso viver, tendo vida.Assim, a educação ideal não deveria ser uma preparação para avida. Educação é vida, precisa ser vida ao mesmo tempo em quese vive.

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Para Dewey, o pólo ético, ou seja, a educação moral, centra-senesta concepção da Escola como uma forma de vida social, comouma forma de vida da comunidade e para a comunidade. Omelhor e mais profundo treino moral é aquele em que as crian-ças entram nas próprias relações com os outros em unidades detrabalho e pensamento. Segundo Dewey, em sua época, os siste-mas educacionais ou destruíam ou negligenciavam esta unidade,tornando difícil ou impossível um treino moral genuíno. Ao ex-pressar suas crenças acerca da relação entre a Escola, o progressoe a melhoria social, Dewey via a educação ideal como sendo ocaminho fundamental para que o progresso e as melhorias sociaispudessem acontecer. Tal como Einstein que enfatizava a impor-tância maior da educação como sendo a de fomentar a ética navida dos estudantes, a ponto de fazê-la presente no ar que elesrespiram, Dewey acreditava que

“a arte de dar forma às energias humanas e de adaptá-las para oserviço social é a arte suprema.”

É interessante observarmos ser bastante comum ouvirmosprofessores que apreciam caracterizar-se como progressistas, re-ferirem-se a Dewey como se o mesmo houvesse sido apenas um‘reformista’ e tal referência é feita com uma forte conotação ne-gativa, utilizando um significado para ‘reforma’ contrário ao de‘nova forma’ de organização social por ele utilizado. Isto é, osentido utilizado pejorativamente é o de ‘mudança aparente’, ode ‘mudar para deixar como está’, pois, para esses seus críticos, averdadeira e única mudança social e em uma sociedade de classesdar-se-ia apenas no caso da tomada de poder do Estado peloproletariado ou classe oprimida economicamente. Esta crítica aDewey como um reformista parece-nos não apenas injusta; mas,sobretudo, bastante equivocada. Sobre a forma de se conseguiruma mudança social real e válida, Dewey acreditava que as re-formas que residem simplesmente em leis, ameaças de certas pu-nições ou sobre mudanças mecânicas seriam sempre transitórias.Para ele, o verdadeiro e único método de reconstrução social seriaaquele em que o indivíduo passasse por um processo educacional

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no qual ele chegasse a compartilhar de uma consciência social eonde houvesse um ajustamento da atividade individual com basenesta consciência social.

Esse entendimento, segundo Dewey, atenderia tanto ao idealindividualista quanto ao ideal socialista. Atenderia à questão in-dividual porque uma personalidade correta é a única base ge-nuína de uma vida correta. Essa concepção atenderia tambémà questão coletiva socialista porque há o reconhecimento de queessa personalidade correta não deveria ser formada apenas pelasregras, advertências ou exemplos individuais; mas, ao invés disso,pela influência exercida pela vida comunitária ou institucionalsobre os indivíduos. Como a Escola é um órgão dentro do orga-nismo social mais amplo, para Dewey é através da Escola nãodissociada da comunidade que os resultados éticos podem serobtidos. Para isto, ele incluiu em suas crenças, a extraordináriadívida moral da comunidade em relação à educação. Na verdade,ele via que através da educação, a sociedade pode formular ospróprios propósitos e organizar os seus meios para formar-se a simesma na direção em que desejar mover-se.

Para Dewey, no capítulo sete do livro ‘Democracy and Educa-tion’ em que ele aborda a sua concepção democrática da edu-cação, qualquer educação fornecida por um grupo tende a so-cializar os seus membros; mas, tanto a qualidade como o valorque esta socialização possa ter, dependem dos hábitos e dos ob-jetivos desse grupo. Como ele aponta, os termos ‘comunidade’e ‘sociedade’ são ambíguos. Podemos ter comunidades boas oumás. De um mesmo modo, a vida familiar pode ser caracterizadapelos sentimentos ou práticas de exclusividade, suspeição e invejae ainda pretender ser um modelo de ajuda mútua entre os seusmembros. Assim, o tipo de socialização recebida depende dire-tamente de quem são os socializadores, dos seus valores, da so-ciedade que eles desejem construir, da sua perseverança e do seugrau de consistência interna. Uma das tarefas que Dewey atribuiao educador é a necessidade dele extrair as características desejá-veis das formas de vida comunitária que de fato existam, criticaras características indesejáveis e sugerir as melhorias necessárias.

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Observamos, assim, a forte sintonia entre a valorização da éticafeita por Dewey e aquela defendida por Einstein.

Uma outra sintonia entre os dois ideários aqui focalizados re-laciona-se, como já apontado no capítulo anterior, com o tipode organização social que ambos, Einstein e Dewey, projetavamcomo o ideal, a saber, o socialismo. Há em ambos os pensado-res, uma preocupação com o florescimento de um socialismomais humano do que os das formas então vigentes em sua época.Como examinado por Brooks, este posicionamento político trou-xe para Dewey alguns mal-entendidos sobre as suas idéias e, in-clusive, alguns contratempos em sua vida.

Há no ideário educacional de Einstein uma forte sintonia comrelação à necessidade, também apontada por Dewey e acimamencionada, do educador observar as características existentesna sociedade para só então buscar as necessárias melhorias. De-wey apontara que para se pensar em uma nova educação e emuma nova sociedade seria necessário examinar, primeiro, os cor-respondentes padrões educacionais e sociais então vigentes. Éexatamente isto que Einstein fez também em sua alocução ‘Sobrea Educação’.

Retomando Einstein, em ‘Sobre a Educação’, observamos quepara ele focalizar o que chamou de ‘espírito’ em que a juven-tude deveria ser instruída para, finalmente, abordar a questãoda escolha de conteúdos e métodos, ele aponta primeiramenteos defeitos do tipo de Escola e sociedade vigentes em sua épocaacima referidos. Para ele, o tipo de Escola então vigente nãoservia ao tipo de sociedade que ele gostaria de ver construída –aquela baseada no socialismo. Assim, ele passou a apontar osdefeitos da Escola que em sua visão eram, ao contrário, úteis paraa manutenção do capitalismo.

Como era o funcionamento da instituição Escola que Einsteincriticava? São várias as características negativas que ele apontavaas quais, infelizmente, são bastante comuns ainda hoje e que ten-taremos abordar resumidamente a seguir.

As suas preocupações nos planos ético, social e psicológico re-queriam que certos aspectos do ensino devessem ser extintos nas

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práticas escolares existentes e incorporavam outros aspectos quedeveriam existir em uma educação ideal a ser buscada.

Einstein expressa que:

“por vezes, vemos na escola simplesmente o instrumento para atransmissão de certa quantidade máxima de conhecimento paraa geração em crescimento. Mas, isso não é correto. Oconhecimento é morto; a escola, no entanto, serve aos vivos. Eladeve desenvolver nos indivíduos jovens as qualidades e ascapacidades que são valiosas para o bem-estar da comunidade.”

Ao mencionar que o conhecimento é ‘morto’, Einstein está sen-do coerente com a sua visão sobre a importância da cultura comouma dádiva recebida das gerações passadas; mas, que deveria serconstantemente lapidada e reconstruída de forma crítica pelasnovas gerações.

Por seu turno, como era o funcionamento da instituição Es-cola que Dewey criticava? Como filósofo da educação, Deweysempre procurou – em sua busca por uma filosofia da educa-ção que viesse a subsidiar e embasar as práticas pedagógicas doMovimento Escola Nova – ser analítico e crítico tanto da Escolatradicional quanto dos possíveis descaminhos e mal-entendidosdos praticantes do referido movimento educacional. Ele expressaem “Vida e Educação”, que a crítica dos escolanovistas à escolatradicional pode ser resumida como segue:

“o esquema tradicional é, em essência, um esquema de imposiçãode cima para baixo e de fora para dentro. Impõe padrões,matérias de estudo e métodos de adultos sobre os que estão aindacrescendo lentamente para a maturidade. A distância entre osque impõem e os que sofrem é tão grande que as matériasexigidas, os métodos de aprender e de comportamento são algode estranho para a capacidade do jovem em sua idade. Estãoalém do alcance da experiência que então possui. Porconseguinte, há que impô-los. E isto é o que se dá , mesmoquando bons professores façam uso de artifícios para mascarar aimposição e deste modo diminuir-lhe os aspectos obviamentebrutais.”

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Dewey coloca alguns marcos historicamente apontados comodiferenciadores entre a educação tradicional e a educação pro-gressivista. Há várias oposições. Temos as seguintes caracterís-ticas diferenciadoras: para os conservadores, educação é a for-mação de fora para dentro enquanto para os progressivistas, aeducação é um desenvolvimento de dentro para fora; para osconservadores, a educação é um processo de vencimento das in-clinações naturais a serem substituídas por hábitos adquiridossob pressão externa enquanto para os seguidores da Escola Nova,a verdadeira educação baseia-se nos dotes naturais do educando.Esses dotes naturais são muitas vezes mencionados por Deweycomo habilidades naturais, como instintos ou tendências. Porexemplo, o balbuciar de um bebê seria uma habilidade naturalque no processo de interação com as pessoas de seu ciclo so-cial permitiria o desenvolvimento de uma linguagem tão com-plexa como a do ser humano, carregada de significados afetivos eemocionais.

Essa expressão da aprendizagem como desenvolvimento ‘dedentro para fora’ está fortemente ligada à questão à qual Einsteinse referiu, e que acima citamos, de que a Escola ideal deveriadesenvolver as qualidades e as capacidades dos indivíduos jovensque são valiosas para o bem-estar da comunidade. Em uma ou-tra ocasião, Einstein refere-se à necessidade da instituição Escolapromover as habilidades inatas dos jovens, o que é mais um doselementos que o aproxima e que torna clara a sua sintonia edu-cacional com as idéias de Dewey.

A questão das qualidades e das capacidades necessárias aobem-estar da comunidade aparece em um trecho de um discursoproferido por Einstein aos estudantes do Caltech, o Instituto deTecnologia da California, durante uma visita aos Estados Unidosem e que incomodou as autoridades conservadoras daquelainstituição. O Caltech é um renomado centro de formação daelite de físicos e engenheiros da mais alta competência técnica.Acostumados a pensarem uma tal competência técnico-científicaem termos da mais pura neutralidade, os ouvintes foram con-frontados com um discurso de Einstein no qual ele questionavade modo eloqüente tanto os valores éticos a que servem toda e

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qualquer criação científica e tecnológica quanto as decorrênciassociais daquele tipo de produção acadêmica. Ele, certamente,teve outras ocasiões mais brandas e outros locais bem mais re-ceptivos para proferir um tal discurso; mas, preferiu, proposi-tadamente fazê-lo nas ‘entranhas da fera’, em pleno coração daprodução científico-tecnológica norte-americana. A sua fala foimuito além de apenas questionar o uso da tecnologia em temposde guerra; ele questionou também a sua utilização mesmo emtempos de paz, porque, segundo ele, “a tecnologia havia trans-formado os homens em escravos da máquina”. As suas palavrasácidas parecem retiradas das cenas do filme Tempos Modernos deChaplin no qual as linhas de produção transformam nas máqui-nas não apenas a matéria prima; mas, em um processo repeti-tivo e alienante transformam, também, os corações e mentes dospróprios operários, reduzindo-os assim à condição de simplesrobôs. Naquele discurso, guiado por suas convicções humanis-tas, Einstein ensinou aos estudantes, segundo relata Folsing, umanova lição à qual eles, certamente, não estavam acostumados,conclamando-os a refletirem e a não esquecerem de que eles pos-suíam uma responsabilidade que ia muito além daqueles seusmeros campos de especialização: “a preocupação com o homemem si mesmo e com o seu destino deve sempre formar o principalinteresse de todos os empreendimentos técnicos, preocupação comos grandes problemas não resolvidos da organização do trabalhoe da distribuição da riqueza – com o objetivo de que as criaçõesdas nossas mentes sejam uma bênção e não uma maldição para ahumanidade. Nunca esqueçam disto em meio aos seus diagramase às suas equações”. Como lembra Folsing, uma tal linguagemde Einstein soou como socialista demais para os conservadorescalifornianos.

Um olhar atento para o que Einstein via como ‘capacidades equalidades’ a serem desenvolvidas pela Escola, permite-nos ca-racterizar o seu pensamento educacional como estando perme-ado de um veio contra-ideológico, no sentido do termo ‘contra-ideologia’². Cunhado pelo pensador político italiano AntonioGramsci. Em especial, é patente o sentido contra-ideológico dotrecho acima exibido do seu discurso e a sintonia aludida com

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o pensamento político de Gramsci torna-se, neste aspecto, aindamais clara. Assim, parece esclarecedor, para efeitos de compara-ção, resgatar o significado de contra-ideologia presente na obrado próprio Gramsci. Um tal resgate permite-nos observar a di-mensão em que o ideário educacional de Einstein esteve semprecomprometido com a busca da liberdade e a construção de umasociedade mais justa e diferente das sociedades existentes em seutempo. Tentaremos fazer tal resgate no bojo do próximo capítulo.

Notas do Capítulo

. Não encontramos no léxico uma palavra específica para representar esse pro-cesso de adentramento gradual na cultura ou modo de vida de um povo a que ésubmetido o bebê humano, desde os seus primeiros contatos, após o seu nasci-mento. Uma sugestão é que a nomeemos como ‘enculturação’ diferenciando-a de‘aculturação’ – termo bem estabelecido no campo da sociologia – e de ‘incultura’presente nos dicionários de língua portuguesa.. Uma tal concepção de contra-ideologia pode ser encontrada em GRAMSCI,Antonio. Os Intelectuais e a Organização da Cultura. Rio de Janeiro: CivilizaçãoBrasileira, .

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A Educação e a Busca da

Liberdade e da Justiça Social

D A que via a instituição Es-

cola como um inevitável Aparelho Ideológico de Estado,Gramsci contrapõe-se à visão pessimista de que todas as

instituições da sociedade capitalista apenas reproduzam a lógicadeste sistema e as estratégias de exploração utilizadas pelas elitesdominantes. Gramsci desenvolve a idéia bem mais dialética deuma “contra-hegemonia”; pois, para ele, a Escola enquanto umainstituição pode iniciar um movimento contra-hegemônico, as-sumindo um papel estratégico de mudança ao invés de atuar co-mo uma mera reprodutora da ideologia da classe dominante.

Para Gramsci, se não houver uma ditadura, isto é, se o Estadonão for autocrático, é possível que a sociedade seja então umespaço aberto de disputas para a veiculação de ideologias em suapluralidade. Logo, se existe uma ideologia dominante, tambémpode-se conceber a existência de uma ‘contra-ideologia’ que ve-nha a combater as relações de dominação e que venha a servir àcausa da libertação das classes oprimidas. Por um lado, se a Es-cola tradicionalmente reproduz uma educação que se identificacom uma certa relação de dominação e a justifica, esta institui-ção escolar pode, também, por outro lado, criar as condições deexistência de um espaço de crítica e de libertação, contribuindo

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para livrar os indivíduos das amarras do senso-comum e da frag-mentação do conhecimento que deformam o desenvolvimentocognitivo, afetivo, social e cultural dos indivíduos.

A instituição Escola é, assim, para Gramsci, um espaço socialde disputas pela hegemonia na sociedade. Para ele, a educação é,acima de tudo, uma prática social construída a partir das relaçõessociais que vão sendo estabelecidas nas estratégias de enfrenta-mento entre a preservação da ordem estabelecida e a mudançade uma tal situação. É neste sentido que a Escola pode ser vistacomo o espaço de veiculação de uma “contra-ideologia”.

Em que sentido essa concepção de contra-ideologia de Grams-ci harmoniza-se com as concepções educacionais de Einstein?

Esta harmonia ocorre em seu sentido mais amplo: nos pró-prios significados políticos e sociais que Einstein atribui às fun-ções da educação, na sua luta contra a competição e as especiali-zações prematuras e, essencialmente, na sua compreensão da ne-cessidade do desenvolvimento de certas qualidades e capacidadesque possibilitem julgamentos éticos, críticos e independentes arespeito da realidade social na qual o ser humano esteja inserido.

As qualidades e capacidades referidas por Einstein no seu “So-bre a Educação” não devem ser entendidas, portanto, do mesmomodo que comumente hoje se costuma referir a tais palavras emalguns meios educacionais meramente como qualidades profissi-onais baseadas na posse de capacidades técnicas e especializaçõesem conteúdos específicos.

Além da dimensão ética e política já explicitada no pensamen-to de Einstein, ele vê, no plano cognitivo, que o adquirir umacapacidade geral de pensamento e de julgamentos independentesaliada ao domínio dos fundamentos de um certo campo de estudosão substitutivos superiores a uma mera qualificação profissionale a uma simples capacitação técnica obtidas através de métodosde aprendizagem mecânicos.

Vemos que as qualidades e capacidades a que Einstein se referiaestão, principalmente, associadas a ‘competências’ ético-sociaisna vida do indivíduo que precisa aprender a se ver como estandocom os outros no mundo, sendo ao mesmo tempo dependentedos outros e útil aos outros para o bem viver. Esta complexidade

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do pensamento de Einstein no tocante à questão do seu combateàs especializações prematuras é também exposta de forma muitofeliz pelo matemático e educador português Bento de Jesus Ca-raça, que foi profundamente influenciado pelo pensamento edu-cacional de Einstein. Caraça aborda, também, sem preconceitos,a questão polêmica da especialização. Ele combate a ingenuidadede rejeitar-se a especialização em troca de um enciclopedismoestéril, mas ressalta que a especialização só faz sentido, comopensava Einstein, se embebida em uma sólida formação huma-nística.

Caraça problematiza com propriedade essa questão da espe-cialização:

“não é ela absolutamente necessária e imposta pelo progresso daciência e da técnica? Ou temos que enfileirar junto daquelesingênuos que vêem num retorno à vida simples a salvação dacivilização? Se se abandonar a formação especializada dosprofissionais não se cai num enciclopedismo superficial queafinal não é nada? /.../ Não se trata nada disso. Se amanhã aciência tivesse de ser abandonada seria, não para passar a umestado melhor de civilização, mas para cair, por muitos séculos,num estado informe de barbárie. Do que se trata é de umamudança de qualidade, isto é, de relações da ciência, da técnica,da máquina, para com o homem, da sua subordinação aosinteresses superiores da sociedade. Uma coisa é o enciclopedismobarato e estéril e outra é a formação humanistados profissionais.”

Para Einstein, assim como para Caraça, o problema reside naforma em que tais conteúdos são obtidos, na ausência de co-nhecimento dos seus fundamentos e na pretensa neutralidadedo seu aprendizado e do seu uso. Em sua visão, as qualidades ecapacidades subjacentes a toda formação científica ou intelectualexigem, em seu sentido mais amplo, a necessidade do indivíduocompetente ser capaz de ver no seu semelhante alguém de quemele depende para viver bem e a quem precisa ajudar para quetambém possa ter o seu lugar digno no Cosmos.

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Em seu estilo direto, quase contundente, Einstein aponta doisgrandes males bem típicos da Escola de seu tempo – e que po-deríamos dizer típicos do nosso tempo também – a saber, a com-petição e a especialização prematura no ensino. Estes dois malestêm uma grande importância em sua visão de mundo visto queatuam na direção oposta da sociedade ideal com que ele sonhavabaseada em uma forma de socialismo necessariamente mais hu-manizado do que o daquelas formas já existentes em seus dias.Para ele,

“os excessos do sistema de competição e de especializaçãoprematura, sob o falacioso pretexto de eficácia, assassinam oespírito, impossibilitam qualquer vida cultural e chegam asuprimir os progressos nas ciências do futuro. É preciso, enfim,tendo em vista a realização de uma educação perfeita,desenvolver o espírito crítico na inteligência do jovem.”

Com relação ao primeiro dos males mencionados da educaçãotradicional, o da competição, vemos que, para Einstein, ela car-rega, em sua natureza, vínculos éticos e psicológicos e conseqüên-cias sociais danosas. Einstein enfatiza, com bastante propriedade,a necessidade de um socialismo mais humano como modelo desociedade ideal, tendo em mente que se este é o tipo de organi-zação social necessária, haveria conseqüentemente a necessidadeda realização de uma educação perfeita baseada na formação éticae no espírito crítico nas mentes dos jovens. Assim, ele apon-tou, recorrentemente e em ocasiões diversas, o papel negativo dacompetição inculcada nos jovens pela instituição Escola e pelasociedade como um todo.

Ao criticar o exagero da competição inculcada pela Escola,Einstein associa uma tal competitividade ao ideário e às práticascapitalistas:

“a competição ilimitada leva a um grande desperdício detrabalho e àquela deturpação da consciência social dosindivíduos /.../ essa deturpação dos indivíduos é o que consideroo pior malefício do capitalismo. Todo o nosso sistema de

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educação sofre desse mal. Uma exacerbada atitude competitivaé inculcada nos estudantes, que são treinados para adorar osucesso aquisitivo como preparação para a sua futura carreira.Estou convencido de que só há um modo de eliminar esses malestão graves, a saber, através do estabelecimento de uma economiasocialista, acompanhada por um sistema educacional orientadopara objetivos sociais.”

Einstein combatendo a competição entre os seres humanosexpressa também que:

“segundo muitos, a teoria de Darwin da luta pela existência e daseletividade a ela associada autorizaria o incentivo ao espíritode competição. Usando o mesmo argumento, houve tambémquem tentasse provar, pseudocientificamente, a necessidade dacompetição econômica destrutiva entre os indivíduos. Mas, istoestá errado, porque o homem deve sua força, na luta pelaexistência, ao fato de ser um animal que vive socialmente. Umabatalha entre os membros individuais de uma comunidadehumana é tão pouco essencial à sua sobrevivência como umabatalha entre as várias formigas de um formigueiro.”

Podemos ver que para Einstein, o processo de seletividade na-tural entre os seres vivos, na luta entre os mais fortes e os maisfracos, presente no âmago da Teoria da Evolução das Espécies deDarwin não se aplicaria à esfera social dos seres humanos de-vido às características da espécie humana em relação aos outrosanimais. Além de tudo, os seres humanos vivem em formas deco-dependência uns com os outros.

Em suporte às idéias de Einstein, podemos ainda lembrar queo ser humano não é apenas um ser biológico, um mero con-glomerado de moléculas ou de células. Ele é, também, comoapontado por Aranha & Martins, um ser moral, histórico, cul-tural, possuidor de uma inteligência abstrata, possuidor de umalinguagem simbólica carregada de signos e significados dentreoutras especificidades de sua inserção no mundo animal.

Não se trata de dizer que o ser humano é melhor que os ou-tros animais, inclusive porque, como sabemos, ele tem, aqui e

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em outros lugares do Planeta, destruído seus semelhantes sem omotivo único e exclusivo da autopreservação como o fazem osanimais irracionais. O ser humano tem destruído ainda muitaspartes do meio ambiente, sem preocupar-se eticamente com aqualidade ou possibilidade de vida das futuras gerações enquantoos animais irracionais vivem em harmonia com a Natureza.

A questão da harmonia entre o homem e a Natureza era algoque estava certamente presente no ideário mais amplo de Eins-tein. Ele não separava o homem da Natureza; encarava-o comoum exemplo de ordem presente na mesma. Assim como paraSpinoza, a Ordem Suprema da Natureza era, para Einstein, aquiloque ele chamava de Deus.

Podemos dizer que as preocupações éticas de Einstein sobreos bons valores, isto é, sobre os posicionamentos corretos sobreo que é certo e o que é errado, a serem incentivados na forma-ção das personalidades dos jovens, permeiam e são indissociáveisdo que ele entendia como uma boa educação, sobre o que elevia como um ser humano educado, necessário à construção deuma sociedade constituída em um verdadeiro regime socialista eque, assim, não poderia jamais ser obtido através da força e daviolência.

Esta concepção de uma educação necessária para Einsteinguarda claras semelhanças com a idéia de uma ‘educação integralnecessária’ defendida por Caraça:

“eduquemos e cultivemos a consciência humana, acordemo-laquando estiver adormecida, demos a cada um a consciênciacompleta de todos os seus direitos e de todos os seus deveres, dasua dignidade, da sua liberdade [...] o reconhecimento a todosdo direito ao completo e amplo desenvolvimento das suascapacidades intelectuais, artísticas e materiais.”

Podemos dizer, ainda, que Einstein via a educação e a socie-dade em um sentido defendido por educadores atuais denomi-nados de ‘progressistas’ diferenciando-se daqueles outros pensa-dores que evitam posicionar-se em suas falas ou em seus escritos

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sobre os problemas sociais advindos da existência de classes soci-ais economicamente diferentes e com interesses antagônicos. Talcomo vistas pelos referidos educadores progressistas, educaçãoe sociedade seriam para Einstein duas instâncias imbricadas ecomplementares, não havendo educação politicamente neutra;mas, ao contrário, educação com um modelo de sociedade a semanter ou, diferentemente, a se atingir. Assim, no plano ético,acima mencionado, Einstein buscou elementos constitutivos da-quele indivíduo moralmente correto e a ser formado, visando aconstrução de um socialismo mais humano, menos burocráticoe mais autêntico do que aquele praticado em alguns países àquelaépoca.

Quanto ao socialismo mais humano, este não se confunde,para Einstein, com uma mera ‘economia planificada’, pois, comoele alerta,

“... é necessário lembrar que uma economia planificada não ésocialismo, ainda. Uma economia planificada, por si só, pode seracompanhada pela completa escravização do indivíduo. Chegarao socialismo exige a solução de alguns problemas sócio-políticosextremamente difíceis: como é possível, em vista da imensacentralização do poder econômico e político, evitar que aburocracia se torne todo-poderosa e prepotente? Como podem osdireitos ser protegidos e com isso assegurar-se um contrapesodemocrático para equilibrar o poder da burocracia?”

Einstein olhava para as formas de socialismo existentes de ummodo analítico e crítico, percebendo as suas falhas na esfera dasquestões humanas, do que é bom para o ser humano, aler-tando que:

“... o socialismo como tal não pode ser considerado como asolução para todos os problemas sociais, mas meramente comoum esquema dentro do qual tal solução é possível.”

Assim, interpretando o ideário humanista de Einstein implí-cito em sua visão educacional, vemos que, para ele, para existir

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a sociedade ideal, um socialismo verdadeiro, seria preciso haveruma mudança real dos valores típicos do regime que lhe é an-tagônico em natureza – o capitalismo. Precisaria haver, pode-mos dizer, uma autêntica revolução cultural no que tange aosvalores vigentes e, neste empreendimento, a Escola parece seruma instituição imprescindível. Deste modo, inferimos que, emsintonia com Gramsci, Einstein via a necessidade de uma práticaeducacional realmente contra-ideológica.

A educação idealizada por Einstein, tal como por Dewey, nãodeveria ausentar-se de promover duas coisas fundamentais aojovem: o direito de ter as suas habilidades inatas respeitadas epromovidas e o desenvolvimento do seu senso de responsabilidadepara com os seus semelhantes. Assim, para Einstein:

“a educação do indivíduo, além de promover suas própriashabilidades inatas, tentaria desenvolver nele um senso deresponsabilidade por seus semelhantes em lugar da glorificaçãodo poder e do sucesso, como em nossa sociedade atual.”

Para Einstein, deveríamos evitar

“preconizar aos jovens o sucesso, no sentido habitual, como oobjetivo da vida, pois, o homem de sucesso é aquele que recebemuito dos seus semelhantes; em geral, incomparavelmente maisque o correspondente ao serviço que lhes presta. O valor de umhomem, no entanto, deve ser visto no que ele dá, e não no queele é capaz de receber.”

O verdadeiro valor do ser humano e que deveria ser a ele en-sinado desde a infância tem, em nosso ver, sido muito poucoincentivado pela família e bastante esquecido pela Escola. Istofaz-nos refletir sobre o fato de que cada um de nós precisa serreinventado como ser humano para que o verdadeiro socialismoou uma sociedade melhorada nesta direção torne-se possível. Secada um de nós fizer a sua parte, muitas partes serão feitas epoderemos estar mais próximos da direção da constituição dotodo necessário.

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Utopia? Certamente!Mas, também é certo que um futuro promissor não será pos-

sível sem sonhos aliados à busca de mudanças na prática real ecotidiana e nos seus tão aparentemente pequenos detalhes com-portamentais.

Esta mesma dimensão de uma utopia a ser buscada como al-go difícil, mas nunca impossível, foi expressa veementementepor Caraça em sua célebre conferência “A Cultura Integral doHomem” em resposta àqueles que consideravam tais utopiasilusórias:

“as ilusões nunca são perdidas. Elas significam o que há demelhor na vida dos homens e dos povos. Perdidos são os cépticosque escondem sob uma ironia fácil a sua impotência paracompreender e agir; perdidos são aqueles períodos da históriaem que os melhores, gastos e cansados se retiram da luta, semenxergarem no horizonte nada a que se entreguem, caída umasombra uniforme sobre o pântano estéril da vida sem formas.”

Vemos que essas belas caracterizações tanto de Einstein quantode Caraça ao verdadeiro valor a ser atribuído ao ser humano e àausência deste valor envolve duas atitudes imbuídas de visões demundo opostas: o altruísmo e o egoísmo.

O altruísmo tem sido muito pouco incentivado nos espaços enos atos educativos formais e informais. Dentre os nossos jo-vens (e, por que não dizer, também adultos) há uma quantidadeimensa deles cuja ‘filosofia de vida’ é a de usufruir o máximopossível das situações, do consumo – inclusive no aprendizado– achando tudo isso muito natural. Já, desde bem pequenos,muitos se vêem como possuidores de uma espécie de ‘carisma’que lhes confere muitos direitos e poucas obrigações, se é que,para alguns, deveria haver alguma.

As qualidades e as capacidades vislumbradas, por Einstein, pa-ra os jovens estudantes envolvem eticamente um senso de res-ponsabilidade social e, psicologicamente, um sentimento de ale-gria ao trabalhar e ao buscar o conhecimento. Ele questionou osmétodos educacionais competitivos como degradadores da mais

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importante riqueza da humanidade, qual seja o seu imperativomoral. Para ele,

“o imperativo moral não é assunto exclusivo da igreja e dareligião, mas a mais preciosa posse de toda a humanidade.Considerai deste ponto de vista a posição da imprensa ou dasescolas com seus métodos competitivos! Tudo é dominado peloculto à eficiência e ao sucesso, e não pelo valor das coisas e doshomens em relação aos fins morais da sociedade humana. A issodeve-se acrescentar a deterioração moral resultante de uma lutaeconômica impiedosa.”

Em oposição ao papel desempenhado comumente pela im-prensa e pela Escola, Einstein focaliza a grande importância dopapel de cada indivíduo em prol da coletividade. Mas, semelhan-temente a Dewey – como comentamos anteriormente – ele alertaque essa sociedade ideal baseada em valores socialistas não deve-ria ser atingida por quaisquer meios, principalmente por meiosautoritários, a partir da ausência de liberdade de pensamentoindividual.

Seguindo a sua convicção pacifista, Einstein apresenta de mo-do recorrente, em várias alocuções, um repúdio às sociedadesnão democráticas, praticantes de atos belicistas e autoritários.Para ele, “se não se suprime a educação do povo pelos militares epelos patriotas belicosos, a humanidade não pode progredir”. Nestecontexto, ele traz à tona o papel das organizações militares ques-tionando em que a sua interferência educacional poderia ser útile para que tipo de sociedade. Ele conclui, então, que uma talinterferência não poderia jamais ser útil para a convivência har-moniosa dos seres humanos.

Podemos dizer, tomando de empréstimo a linguagem althus-seriana que Einstein abominava as organizações militares atuan-tes como Aparelhos Repressivos de Estado e essa abominação eramaior ainda, quando tais organizações passavam a atuar na esferaeducacional como Aparelhos Ideológicos de Estado.

A visão de educação e de sociedade de Einstein apresenta tam-bém semelhanças com as de alguns influentes educadores mais

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recentes. Na esfera deste último tipo de organização atuante nasociedade, a dos aparelhos ideológicos de Estado, podemos apon-tar, por exemplo, a sintonia existente entre a crítica de Einsteinao papel comumente desempenhado pela imprensa, mencionadoanteriormente, com o alerta de Bernardo Toro, filósofo e educa-dor colombiano atual.

Toro alerta que “uma das coisas que os educadores devem enten-der é que o político e o comunicador de massas, os que escrevem nosjornais, os grandes comentaristas e as grandes figuras das indústriasculturais exercem efeitos educativos sobre a sociedade”. Mas, estanão é a única sintonia existente entre o pensamento educacionalde Einstein e de Toro. Em uma entrevista intitulada “Precisamosde Cidadãos do Mundo”, Toro mostra-se preocupado com umaconvivência social onde a pobreza seja um problema não apenasdos pobres, mas de todos aqueles preocupados com o bem estargeral da sociedade e que buscam uma convivência mais igualitá-ria baseada na tolerância e na solidariedade. Ele apresenta umconjunto de idéias com vários pontos de sintonia com o ideáriode Einstein referentes aos valores pessoais e sociais e à neces-sidade deles estarem contidos em um projeto educacional quecontribua para uma sociedade ideal mais humana.

Toro, tal como Einstein, valoriza também o conhecimento hu-mano como um bem cultural e acredita que a educação pelaeducação não serve para nada. Segundo ele, a utilidade do co-nhecimento está em poder servir a um projeto de sociedade.

Para enfatizar essa aludida sintonia entre o ideário educacionalde Einstein com as concepções mais recentes de Toro é interes-sante lembrar as palavras de Leopold Infeld – que foi assistentede Einstein em Princeton – a respeito da atitude do seu grandemestre frente ao papel social do conhecimento. Infeld assinalaque, para Einstein, a ciência havia trazido consigo não apenas obem estar; mas, também, o perigo. Para Einstein, o problema realresidia nas mentes e nos corações dos homens. Einstein alertavaque não seria possível mudar os corações dos outros homens porsimples mecanismos; mas apenas mudando os nossos próprioscorações e falando de maneira sempre corajosa. Para ele, porexemplo, era preciso dar ao mundo o conhecimento que nós

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tínhamos das forças naturais só após havermos estabelecido assalvaguardas contra os abusos do mesmo.

Ainda de modo semelhante a Einstein, Toro vê que um bomprofessor é aquele que contribui para que o estudante consigaaprender com felicidade tudo aquilo que ele precisa aprender.Referindo-se às aprendizagens necessárias para todos os dias, pa-ra a vida diária, para a convivência social, Toro aborda outros va-lores centrais que vemos presentes na visão educacional de Eins-tein já apresentados anteriormente neste livro, enaltecendo, porexemplo, a solidariedade e a ternura, a utilização socializadorados produtos do trabalho humano e finalmente, a forte coloca-ção dos direitos humanos como uma bússola ética para todas asações humanas sem exceção. Segundo Toro, o primeiro pontoimportante é a

“capacidade de trabalhar bens e serviços que serão desfrutadospor alguém que não sou eu. Porque se você e eu fizermos algoapenas para nós dois, isso vai se chamar máfia. O segundo é aternura: a capacidade de perceber-se tal como se é e de receber osoutros da maneira como eles são. A ternura é a base daconvivência democrática. É um conjunto de valores pessoais esociais que precisa estar fundamentado na pessoa. Finalmente, acapacidade de construir ordem para a dignidade de todos,colocando os direitos humanos como bússola ética para todas asações, sem exceção. A democracia não crê em iluminados nemem messias.”

O valor coletivo daquelas capacidades éticas e sociais, anteri-ormente mencionadas, a serem desenvolvidas no seio da Escolaé um dos pontos-chave no pensamento de Einstein. Sua consci-ência social, advinda do seu humanismo e da sua visão socialistada sociedade necessária, o conduz a ver na educação um sentidobem definido voltado para o coletivo e para o bem comum. Mas,preocupado também com o lado psicológico do aluno como in-divíduo, esse bem comum não deveria, para Einstein, ser obtidoàs custas da insatisfação e da infelicidade do estudante enquantoum membro da Escola.

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Referindo-se à relação dialética entre o indivíduo e a coleti-vidade, Einstein reafirma a importância do pensamento livre eindependente:

“isso não significa, porém, que a individualidade deva serdestruída e que o indivíduo deva tornar-se um meroinstrumento da comunidade, como uma abelha ou umaformiga. Pois uma comunidade de indivíduos padronizados,sem originalidade pessoal e sem objetivos pessoais, seria umacomunidade medíocre, sem possibilidades de desenvolvimento.Ao contrário, o objetivo deve ser a formação de indivíduoscapazes de ação e de pensamento independentes que, no entanto,vejam no serviço à comunidade o seu mais importanteproblema vital.”

Einstein, ao refletir em “Pensamentos Políticos e Últimas Con-clusões” sobre a questão do ‘por que o socialismo’, retoma a ques-tão do indivíduo e da coletividade expressando que o homemcomo um ‘ser solitário’ busca proteger a sua existência e das pes-soas que lhe são próximas para satisfazer os seus desejos pessoaise desenvolver as suas habilidades inatas. Este mesmo homemcomo um ‘ser social’ esforça-se para conquistar o reconhecimentoe o afeto dos outros seres humanos, busca confortá-los e melho-rar as suas condições de vida. Para Einstein,

“somente a existência desses esforços diferentes e muitas vezesconflitantes responde pelo caráter especial do homem e acombinação desses esforços determina até que ponto cadaindivíduo consegue atingir um equilíbrio interior e contribuirpara o bem-estar da sociedade.”

Um tal posicionamento lembra-nos as palavras já citadas deDewey ao caracterizar os resultados da separação mecânica en-tre o ser individual e o ser coletivo, pois como ele apontou, seeliminarmos o fator individual da sociedade, restar-nos-á apenasuma massa inerte e sem vida e, por outro lado, se eliminarmosdo homem esse fator social ou coletivo, ele não seria mais umhomem; mas, uma simples abstração.

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Einstein não se limita, assim, a defender uma educação voltadaexclusivamente para os interesses coletivos; ele vê, igualmente, anecessidade precípua da realização das potencialidades do pró-prio indivíduo como uma busca da sua felicidade. Para ele, autilidade social caminha lado a lado com o prazer individual queo conhecimento pode proporcionar. Isso aparece com toda aclareza em uma afirmação sua feita em uma outra ocasião, aodirigir-se a uma platéia de estudantes:

“nunca considerem seus estudos como um dever, mas como ainvejável oportunidade de aprenderem a conhecer a influêncialibertadora da beleza no reino do espírito, para a sua própriaalegria pessoal e para o benefício da comunidade a quempertencerá o trabalho posterior de vocês.”

Como uma decorrência desta sua valorização da importânciada alegria no ato de aprender, Einstein em suas conversas comPeter Bucky deixou clara a sua intensa aversão ao uso da forçaindevida, da coerção em sala de aula assim como também a todasas restrições à exploração da curiosidade natural dos estudantes.Essas qualidades negativas, segundo ele, contribuíam para des-truir a alegria natural que a maior parte dos estudantes trazempara os seus estudos ao não permitir que os mesmos pudessemencontrar os seus próprios níveis de interesse na escola. Portanto,para Einstein, é nessa tensão dialética entre o prazer individualpropiciado pela busca do saber e a consciência do valor socialque o conhecimento pode ter que reside toda a potencialidadetransformadora da produção do conhecimento.

Einstein focaliza de forma precisa as diferenças individuais aserem respeitadas:

“para ficar satisfeito, o homem deve também ter a possibilidadede desenvolver as suas capacidades intelectuais e artísticos, semlimites restritivos, segundo as suas características e aptidõespessoais.”

Assim, os fins da educação, mesmo que voltados para o bemestar coletivo, não justificariam jamais a adoção de quaisquer

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meios autoritários em processos de ensino e de aprendizagem.O caminho a ser seguido para atingir um tal fim não deveriabasear-se, para Einstein, no mero discurso moralista; mas, sim,ser construído e baseado no trabalho, na atividade e na base psi-cológica subjacente tanto às atitudes dos professores como à pró-pria prática administrativa da Escola.

Tal como exibido anteriormente neste livro em uma citaçãode Dewey que revela a grande importância que este colocava noensino ligado às atividades e trabalhos das comunidades, a forçado trabalho e das atividades da comunidade sobre a formaçãodas personalidades dos alunos é algo igualmente marcante nopensamento de Einstein. Einstein expressa que

“as palavras são e continuam sendo um som vazio e a estradapara a perdição sempre foi calçada pela exaltação hipócrita dealgum ideal. Mas, as personalidades não se formam pelo que éouvido e dito, mas sim pelo trabalho e pela atividade /.../ Eninguém há de negar que a administração da escola e a atitudedos professores têm uma influência na moldagem da basepsicológica para os alunos.”

Podemos afirmar, assim, que embora Einstein não tenha usadoo termo ideologia em suas falas e escritos – pelo menos na esferado que aqui conseguimos abordar – estava claro, para ele, que aideologia de uma pessoa ou de um grupo de indivíduos não serevela apenas através de suas falas e das ausências do que não éfalado ou lacunas de tais falas; mas, também, através dos seuscomportamentos e atitudes. Deste modo, também nós comoprofessores, sempre estamos servindo de exemplos ou de contra-exemplos para os alunos, em termos da sociedade que queiramosmanter ou daquela que queiramos vir a construir. Como Einsteinafirmou:

“... não existe uma educação mais inteligente senão aquela emque se toma a si próprio como um exemplo, ainda quando nãose possa impedir que esse modelo seja um monstro.”

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Para concluirmos a nossa análise do primeiro dos grandes ma-les da educação apontados por Einstein, o da prática da competi-ção, podemos inferir de sua célebre alocução que uma educaçãoque tente desvencilhar-se desta prática da competição não deveráocorrer através de métodos de ensino autoritários e que fomen-tem uma tal competitividade, seja em uma forma explícita ouseja em formas implicitamente presentes tanto nas atitudes deprofessores como também da administração escolar.

Podemos acrescentar que esse segundo segmento do espaçoeducacional formal – a administração escolar – aliado a um ter-ceiro segmento educacional que é aquele espaço informal das re-lações humanas cotidianas fazem-se presentes na formação geraldos jovens ou mesmo de seres humanos mais maduros e têmuma importância fundamental nos processos e nos resultadoseducacionais mais amplos obtidos.

Como sabemos e como Paulo Freire costumava dizer, todas asrelações humanas são relações pedagógicas, pois também prati-camos uma educação informal nos contatos humanos em geral eextra-muros escolares. Isto posto, acrescentaríamos que estamossempre ensinando e/ou aprendendo algo em nossos relaciona-mentos humanos cotidianos. Isto dá-se através de nossos atos edas nossas atitudes quotidianas, permeados pelas nossas visõesde mundo evidenciando talvez a nossa ideologia até mais do queo fazem as nossas palavras. O poder de nossos atos e atitudesé muito grande visto que mesmo as crianças ainda bem jovenspodem captar nuances sutis de nossos comportamentos as quaispodem vir a fazer parte de suas crenças em geral sobre o mundo.

Como vimos acima, para Einstein, a competição prejudica apossibilidade de existência de valores mais dignos e fomentadoresde uma sociedade verdadeiramente mais humana e autentica-mente fundada em uma concepção socialista.

Retomemos, agora, o tema da especialização prematura, o se-gundo dos grandes males da educação apontados por Einstein.

Em que a especialização prematura, na visão de Einstein,prejudicaria os jovens e, por decorrência, a sociedade em quevivemos?

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Para Einstein, a especialização prematura afeta a harmonia ne-cessária e fundamental a ser propiciada ao jovem em formação.Ao invés da posse prematura de conhecimentos específicos deta-lhados – o treinamento nos fatos científicos do paradigma – eda posse de habilidades que a pessoa terá de usar em possíveisprofissões futuras, Einstein contrapõe a necessidade de que sejampropiciados aos jovens o desenvolvimento da capacidade geral depensamento e de julgamentos independentes bem como o domíniodos fundamentos do seu campo de estudo.

Esse posicionamento de Einstein está em sintonia com aquelaconcepção de Dewey – ou mesmo típica do Movimento EscolaNova – de que a educação deveria adequar-se às transformaçõesde uma sociedade em mudança. Isto é, ao defender o valor dodesenvolvimento da capacidade geral de pensamento e de julga-mentos independentes pelos estudantes, aliados ao domínio doque é fundamental em seus campos de estudo, Einstein denotavacompreender que esta seria inclusive a forma pela qual os indi-víduos poderiam vir a contribuir para o desenvolvimento de ummundo em mudança. Em suas palavras:

“quero rebater a idéia de que a escola deve ensinar diretamente oconhecimento especial e as habilidades que a pessoa terá de usarmais tarde diretamente na vida. As exigências da vida sãodemasiadamente multiformes para que esse aprendizadoespecífico na escola pareça possível. Ademais, parece-mecensurável tratar o indivíduo como uma ferramenta inanimada.A escola deve ter sempre como finalidade que o jovem a deixecomo uma personalidade harmoniosa, não como umespecialista. Isto, na minha opinião, aplica-se em certo sentidoaté às escolas técnicas, cujos alunos irão dedicar-se a umaprofissão bastante definida. O desenvolvimento da capacidadegeral de pensamento e de julgamento independentes deve sercolocado em primeiro plano, e não a aquisição de conhecimentosespecíficos /.../ quando uma pessoa domina os fundamentos desua disciplina e aprendeu a pensar e trabalharindependentemente, por certo haverá de encontrar o seucaminho e, além disso, será mais capaz de se adaptar ao

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progresso e às mudanças do que outra cujo aprendizado tenhaconsistido, sobretudo na aquisição de conhecimentos detalhados.”

Afora os condicionamentos sócio-econômicos, uma criançanão pode, de fato, responder de modo satisfatório e muito an-tecipadamente à clássica pergunta sobre o que ela vai ser quandocrescer, em parte devido a sua experiência de vida ser ainda muitopequena. Talvez por isso, Einstein propusesse que não deveriahaver, nas práticas educacionais, quaisquer limites restritivos in-telectuais e artísticos e que fossem ainda respeitadas as ‘carac-terísticas e aptidões pessoais’ das crianças. Além disso, em suavisão, como veremos mais adiante, um tipo de abordagem educa-cional restritiva e que visasse apenas a especialização prematuracaracterizar-se-ia, comumente, pela falta de alegria e de prazerpor parte dos jovens, e por que não dizer, também, por parte dosseus professores.

Na última citação anterior, Einstein evidencia também maisuma aproximação de seu ideário educacional a mais uma facetado Movimento Escola Nova referente a um de seus lemas maisimportantes: o de que é preciso ensinar ao aluno a ‘aprender aaprender’, a alcançar o conhecimento com autonomia.

Ao estabelecer uma comparação entre a aquisição de fatos e odesenvolvimento da prática geral do pensamento, Einstein optaclaramente por esta segunda alternativa conforme suas palavras aPhilipp Frank: “aprender fatos não é importante para uma pessoa.Não é para isso que ela precisa de educação. Os fatos ela podeobter nos livros. O valor da educação não é ensinar muitos fatos,mas treinar a mente para pensar algo que não pode ser aprendidonos livros”. É claro, como já abordado anteriormente, que estetreinamento não deveria se dar sobre tudo e qualquer coisa; mas,respeitando-se as características e aptidões pessoais dos indivíduos.Assim, Einstein é enfático ao referir-se à desarmonia decorrentede uma educação voltada meramente para a formação de especi-alistas, expressando que:

“não basta ensinar ao homem uma especialidade porque ele setornará assim, uma máquina utilizável, mas não uma

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personalidade. É necessário que adquira um sentimento, umsenso prático daquilo que vale a pena ser empreendido, daquiloque é belo, do que é moralmente correto. A não ser assim, ele seassemelhará, com seus conhecimentos profissionais, mais a umcão ensinado do que a uma criatura harmoniosamentedesenvolvida.”

Em ocasiões diversas, Einstein retomou esta sua crítica à es-pecialização prematura. Em suas conversas com Peter Bucky, emespecial, esta crítica fica particularmente clara quando ele afirma:

“eu não acredito que o desenvolvimento de treinamentosespecializados seja nem aproximadamente tão importante naescolarização quanto a aquisição das habilidades de pensamentoe de julgamento independentes. Mas, a esse respeito, eu possoestar lutando uma batalha perdida porque a especializaçãoparece ser uma tendência irreversível. Ela parece caminhar, ladoa lado, com a mania pela eficiência. Infelizmente, eu penso quea eficiência, como tal, é mais desejada em nossos tempos pelamaioria das pessoas do que os valores corretos ou a seleção dosmateriais apropriados a partir dos quais se deva ensinar.”

As críticas de Einstein à especialização precoce mostram que,para ele, não deveria haver restrições nas possibilidades daquiloque pudesse vir a ser ensinado na Escola, uma vez que as carac-terísticas e habilidades pessoais dos jovens deveriam ser semprerespeitadas. Neste sentido, ele enfatiza que:

“para ficar satisfeito, o homem deve também ter a possibilidadede desenvolver os seus poderes intelectuais e artísticos, namedida em que isto corresponda às suas características ehabilidades pessoais.”

Até este ponto, focalizamos as idéias de Einstein com relaçãoàs dimensões éticas e sociais da educação, envolvendo a impor-tância da transmissão, desenvolvimento e lapidação da culturaassim como as suas críticas ao funcionamento da Escola e as suas

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opiniões sobre os dois de seus grandes males: a competição ea especialização. Vimos, ainda, que a sua visão de uma soci-edade necessária de ser construída, envolve a existência de umcerto ‘espírito’ no qual a juventude deveria ser instruída, isto é,um espírito de alegria e de liberdade, tendo em vista o bem co-mum da sociedade em seu sentido amplo. A dimensão éticado seu veemente discurso reside, tal qual ocorre com Dewey, navisão da busca de uma sociedade mais humana bem como nadefesa concomitante de respeito aos interesses e capacidades dosindivíduos.

Einstein identifica ainda um terceiro grande perigo na educa-ção escolar e que seria, para ele, o pior de todos.

Esse terceiro perigo vincula-se mais fortemente à vertente psi-cológica do trabalho escolar que, segundo ele, incorpora um com-plexo de sentimentos movidos por forças construtivas e por forçasdestrutivas. Além destas forças, Einstein refere-se, enfaticamente,a determinadas energias psicológicas produtivas que deveriam serdespertadas nos jovens contribuindo para a sua felicidade e parao desenvolvimento de uma personalidade harmoniosa.

O pior dos males da educação apontado por Einstein e queafeta enormemente o direito à felicidade e a uma personalidadeharmoniosa – ética, social e particularmente no plano psicoló-gico – seria o fato de uma escola trabalhar, sobretudo, com

“métodos de medo, força e autoridade artificial, pois, com um taltratamento, ela destrói os sentimentos sadios, a sinceridade e aautoconfiança do aluno, produzindo um sujeito submisso.”

As críticas de Einstein às decorrências danosas de uma abor-dagem educacional fundamentada em métodos de medo e decoerção sobre as crianças encontram uma forte sintonia nas críti-cas e nas experiências educacionais do educador escocês Alexan-der Neill (–) – comumente considerado o mais radicaldos pensadores escolanovistas. Em suas experiências pedagó-gicas descritas em seu livro intitulado “Summerhill”, o mesmonome de sua escola na Inglaterra, Neill descreve a sua atuaçãocom a educação de ‘crianças-problema’ oriundas, na verdade, de

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lares-problema existentes em sociedades-problema equivocadasem suas crenças e doentias em suas práticas em geral.

De fato, um dos pontos centrais na proposta educacional deNeill era a sua ênfase em propiciar às crianças a necessária li-berdade para que as mesmas desenvolvessem harmonicamenteo seu lado emocional. Neill também enfatizava que as crian-ças deveriam aprender naturalmente a ter controle sobre as suaspróprias vidas e que isso só seria possível removendo-se todos ostemores e todas as formas de coerção exercidas pelos adultos. Emsua escola, em Summerhill, o objetivo maior era o de criar umaatmosfera na qual todos os alunos, professores e funcionários pu-dessem aprender a se expressar livremente e a coexistir de formademocrática.

Analisada mais de perto, a proposta de Neill pode ser vistacomo uma radicalização das idéias originais de Pestalozzi e guar-dam, deste modo, uma grande semelhança tanto com os ide-ais de liberdade e de autodeterminação na educação defendidospor Einstein quanto com o seu combate radical aos métodos demedo, força e autoridade artificial.

Podemos inferir ainda do ideário educacional de Einstein, apercepção da existência de uma prática circular na qual a admi-nistração de uma escola pode exercer o autoritarismo em relaçãoao professor o qual, por sua vez, o repassa em seus relacionamen-tos com os seus alunos que, por decorrência, muito provavel-mente, o aplicarão como membros das suas comunidades ou dasociedade em geral, em suas vivências e em seus relacionamentosprofissionais.

Referindo-se a esses métodos de medo, força e autoridade artifi-cial no processo de escolarização a que os jovens são submetidos,Einstein afirma que seria

“relativamente simples manter a escola livre desse mal, que é opior de todos. Ponha-se nas mãos do professor o menor númeropossível de medidas coercitivas, de tal modo que as suasqualidades humanas e intelectuais sejam a única fonte derespeito que ele possa inspirar no aluno.”

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Certamente, tal assertiva de Einstein está correta no caso emque tais qualidades humanas e intelectuais existam, isto é, no casoem que os próprios professores possuam eles mesmos persona-lidades harmoniosas. Na verdade, vemos que Einstein propõe aconstrução de uma nova sociedade – a socialista – fundada empráticas verdadeiramente humanistas a partir de uma educaçãotambém nova montada a partir de valores éticos e sociais bemdefinidos e alternativos aos já existentes e, também, de uma novaconcepção sobre a produção do conhecimento.

Em nossa visão, parece-nos que apesar das dificuldades encon-tradas no processo educacional, talvez, seja mais fácil que os pro-fessores em geral venham a adquirir uma nova e mais adequadaconcepção sobre a produção do conhecimento do que venhameles a adquirir com facilidade os outros requisitos éticos e moraisapontados por Einstein e que possam torná-los bons exemplospara os seus alunos.

As características éticas típicas de uma personalidade harmo-niosa, para virem a existir, dependerão de mudanças culturaisfortes, incluindo aí mudanças a nível ideológico. E mudançassinceras e verdadeiras na esfera ideológica são difíceis de aconte-cer a contento porque não envolvem apenas o intelecto humano,a razão; elas envolvem, sobretudo, outros condicionamentos esentimentos como por exemplo a emoção e a afetividade. Nemsempre um raciocínio lógico consegue convencer e vencer, pelomenos em um curto período de tempo, um sentimento forte-mente arraigado no indivíduo por mais equivocado que ele seapresente. Falamos muitas vezes em conscientização para a solu-ção dos problemas do mundo. Não seria a emoção também umdos empecilhos às mudanças?

Um possível motivo da dificuldade de tomar os professorescomo ‘bons exemplos’ é que talvez tais indivíduos existam mes-mo em pequena quantidade ou porque talvez os próprios alunosnão valorizem algumas boas qualidades humanas apresentadaspor determinados professores que, às vezes, são tidas por aquelesalunos como simples sinais de fraqueza, imbuídos que tais alu-nos estão dos valores da ideologia dominante veiculada em umasociedade de classes em pouco ou em nada preocupada com um

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mundo melhor e mais harmonioso. Na verdade, como observaraEinstein, a Natureza não costuma fornecer excelentes espécimesem grande profusão.

Considerando-se o trabalho desenvolvido no seio da Escola, alipodem surgir grandes diferenças entre as atuações de diferentesprofessores e tais diferenças têm uma extrema importância novalor educacional do trabalho realizado.

Diante dessa encruzilhada, Einstein procura situar as possíveisorigens ou motivações subjacentes à realização de um trabalhopelo aluno na Escola apontando que:

“um mesmo trabalho pode dever sua origem ao medo e àcompulsão, ao desejo ambicioso de autoridade e destaque, ouao interesse apaixonado pelo assunto e a um desejo deverdade e compreensão e, portanto, àquela curiosidade divinaque toda criança saudável possui, mas que tantas vezes nãotarda a enfraquecer.”

Retomando estas três possíveis origens ou motivações, respec-tivamente, ele expressa, ainda, que “a influência educacional exer-cida sobre o aluno pela realização de um mesmo trabalho pode serextremamente diferente, conforme estejam na raiz desse trabalho omedo de ser ferido, a paixão egoísta ou o desejo de prazer e satis-fação”. Assim, o medo e a compulsão, produzido e imposto pelaEscola resultam no aluno um sentimento de medo de ser ferido;o desejo ambicioso de autoridade e destaque resultam na paixãoegoísta enquanto que o interesse apaixonado pelo assunto e umdesejo de verdade e compreensão associam-se ao desejo de prazer esatisfação com a realização do trabalho e com o seu resultado.

Referindo-se à importância da liberdade na educação, como ofizera Dewey, Einstein também dirigiu críticas a possíveis práticasde sua época; no caso, associadas mesmo a métodos de educaçãotidos, então, como modernos, mas que ainda assim tentavampromover a prática da observação e da pesquisa através da co-erção e da noção de dever.

Assim, quanto à primeira motivação para o trabalho ou estudopelo aluno, o medo de ser ferido, que o faz assumir de uma forma

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anarmônica o que lhe é imposto como obrigação, Einstein preo-cupado com a ausência de liberdade tão comum na Escola, vê-sesurpreso de que a extensão do dano causado por tais práticaspedagógicas na vida dos jovens não fosse ainda maior.

Ele expressa esse fato de uma forma veemente:

“na verdade, é quase um milagre que os métodos modernos deinstrução não tenham exterminado completamente a sagradasede de saber, pois essa planta frágil da curiosidade científicanecessita, além de estímulo, especialmente de liberdade; sem ela,fenece e morre. É um grave erro supor que a satisfação deobservar e pesquisar pode ser promovida por meio da coerção eda noção do dever. Muito ao contrário, acredito que seriapossível eliminar por completo a voracidade de um animalpredatório obrigando-o, à força, a se alimentar continuamente,mesmo quando não tivesse fome, especialmente se o alimentousado para a coerção fosse escolhido para isso.”

Se Einstein estiver certo, como parece-nos estar, sobre o neces-sário respeito à curiosidade científica espontânea dos estudantes,é fácil percebermos o massacre intelectual a que é submetida ajuventude, particularmente nos exames para a admissão às uni-versidades.

Além dessa falta de liberdade do estudante na escolha do queestudar, Einstein apontou os danos que os professores emocio-nalmente despreparados podem causar aos jovens. Ele foi ta-xativo sobre a necessidade de professores mais humanos paraque uma educação igualmente mais humana pudesse tornar-sepossível e condenou os maus tratos sofridos pela juventude:

“a humilhação e a opressão mental impostas por professoresignorantes e pretensiosos causam danos terríveis na mentejovem; danos que não podem ser reparados e que geralmenteexercem maléfica influência na vida futura.”

Dirigindo-se, certa vez, à juventude, Einstein exaltou a neces-sidade da conquista da liberdade na educação: “as escolas podem

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prejudicar o desenvolvimento da liberdade interior através de in-fluências autoritárias e através da imposição aos jovens, de cargasespirituais; por outro lado, as escolas podem favorecer esta liberdadeao encorajar o pensamento independente. Só quando a liberdadeexterior e a interior forem constantemente e conscientemente con-quistadas, haverá a possibilidade de desenvolvimento espiritual e deperfeição e, assim, de melhorar a vida interior e exterior do homem”.Esta defesa da liberdade interior, por Einstein, aproxima-o forte-mente do ponto principal do ideário educacional de Neill, acimamencionado.

A segunda motivação para o trabalho ou estudo pelo aluno,analisada por Einstein, caracterizada por ele como a ambição oudesejo ambicioso de autoridade e de destaque pode apresentar-seem duas formas, uma positiva e outra completamente negativa.

A primeira de tais formas, a positiva, é mais branda, e tipica-mente natural ao ser humano, caracterizada simplesmente pelodesejo de reconhecimento e de consideração. Esta forma de desejode reconhecimento, segundo Einstein, “está firmemente arraigadana natureza humana. Na ausência de estímulos mentais desse tipo,a cooperação humana seria impossível, o desejo de aprovação donosso semelhante é certamente uma das mais importantes forçasaglutinadoras da sociedade”. Este tipo de “desejo de aprovação ede reconhecimento é uma motivação saudável”. Podemos dizer,assim, que Einstein percebia muito bem a importância psicoló-gica da auto-estima não-egocêntrica e tipicamente natural ao serhumano bem desenvolvido emocionalmente.

A segunda forma, a negativa, em que o desejo ambicioso deautoridade e de destaque pode apresentar-se é aquela que resultana paixão egoísta que se caracteriza, segundo Einstein, pelo desejo

“de ser reconhecido como melhor, mais forte ou mais inteligenteque um semelhante ou colega de escola e conduz facilmente aum ajustamento psicológico excessivamente egoísta, que pode setornar prejudicial para o indivíduo e para a comunidade.”

Certamente, para Einstein, este tipo de competitividade se-ria bastante prejudicial a uma sociedade com ideais socialistas

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e bastante útil para manter uma sociedade de desiguais, em seusentido sócio-econômico.

Einstein tinha a percepção de que nesse complexo de sentimen-tos há tanto forças construtivas quanto forças destrutivas em atu-ação, as quais encontram-se intimamente unidas, cabendo à Es-cola e ao professor evitarem

“o uso do método fácil de fomentar a ambição individual comoforma de induzir os alunos ao trabalho diligente.”

A terceira motivação abordada por Einstein para o trabalho ouestudo pelo aluno sensibiliza-o imensamente, aquela motivaçãoque é ditada pelo interesse apaixonado pelo assunto e por um de-sejo de verdade e de compreensão e que implica na existência deum desejo de prazer e de satisfação com a realização do trabalhointelectual e com o seu resultado.

Podemos dizer que essa boa motivação, uma motivação intrín-seca, apontada por Einstein, seria uma motivação caracterizadapor um processo interno de ajustamento do indivíduo; mas, quereceberia, certamente, uma carga de influência externa do am-biente onde este indivíduo estivesse inserido. O aluno é um serindividual, mas é também um ser coletivo. É indivíduo; mas,não está sozinho no mundo; ao contrário, é um ser de relações.Assim sendo, é muito importante o que ocorre em termos derelacionamentos no espaço da Escola onde o aluno passa muitotempo de sua vida.

Na visão de Einstein, para que esse interesse apaixonado peloassunto pudesse vir a ocorrer: “o ensino deveria ser tão bom aponto de ser visto como um valioso presente e não como um durodever”. Além disto, segundo ele, o professor tem uma impor-tância muito grande neste empreendimento. Ele tem que ter edemonstrar alegria ao ensinar, pois “é tarefa essencial do professordespertar a alegria de trabalhar e de conhecer”.

Einstein destacava sempre a importância da alegria no ato deensinar e de aprender, vendo-a como um verdadeiro motor dacriatividade humana. Essa ênfase na alegria não tinha, entre-tanto, qualquer caráter hedonista. Muito pelo contrário, Eins-tein via em tal alegria pessoal um simples complemento de uma

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alegria maior que se configurava na possibilidade de atingir umbem comum à coletividade.

Refletindo, em sintonia com o pensamento de Einstein, pode-ríamos dizer, por exemplo, que se deve estudar a Física para setentar compreender melhor o mundo em que vivemos, os pro-blemas reais que são oferecidos pela realidade, pela Natureza.Se aprendermos a compreender o mundo que nos cerca, essesdesafios que encontramos a cada passo e a cada instante precisamser encarados com a mesma alegria com que ouvimos uma belamúsica.

Como dizia Pierre Lucie:

“um pianista estuda música para deleitar-se ao tocar a sinfoniade um grande mestre e comungar com o seu autor, não parafazer escalas - embora estas sejam necessárias para apurar atécnica. Da mesma forma, devemos estudar Física para melhorapreciar a sinfonia fantástica do Universo.”

Lucie dizia também que:

“entre ensinar física brincando e ensinar chateando, eu prefiroensinar brincando. /.../ Se queremos interessar os jovens noestudo da física, falemos de física. Isto é, em primeiro lugar,falemos do fenômeno. E se possível mostremos o mesmo.”

Esse mesmo tipo de atitude de valorização da alegria no ensinoda Ciência, apresentado por Lucie, já podia ser encontrado noséculo XVIII em alguns pioneiros do ensino da Física como opadre Teodoro de Almeida. Teodoro enfatizou, sobremaneira, ocaráter lúdico das demonstrações experimentais que exerciam, aoseu ver, um grande fascínio sobre o público em contraste com umensino meramente livresco até então hegemonicamente adotadopelos jesuítas.

De um modo mais geral, como os próprios autores deste li-vro já assinalaram em um texto sobre o uso de brinquedos noensino da Ciência, a capacidade de brincar com seriedade e comresponsabilidade é a base psicológica para a criatividade, para odesenvolvimento das capacidades técnicas e do talento em todas

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as profissões. O brincar é algo constitutivo do lado existencialda criança devido ao prazer causado e à sua importância para odesenvolvimento cognitivo e emocional.

Desse mesmo tipo de atitude decorria, no pensamento de Eins-tein, uma valorização do caráter lúdico da educação que encon-trava uma ressonância na própria atividade do cientista comoum indivíduo que busca prazerosamente desvendar os mistériosda Natureza. Einstein, não apenas recomenda que a alegria sejaintroduzida como um fator externo no ato educacional; ele crê,sobretudo, na força do exemplo de algo que venha de dentro eproveniente do professor e que, em assim sendo, contribua paracativar os estudantes.

Para Einstein, no entanto, essa questão do prazer nas ativida-des do ser humano não se restringe, na verdade, ao espaço daEscola; ela é mais ampla e deve, como já exploramos, carregardentro de si uma preocupação social. Para ele, “a motivaçãomais importante para o trabalho, na escola e na vida, é o prazerno trabalho, o prazer com o seu resultado e o conhecimento dovalor desse resultado para a comunidade”. E tal motivação sópode existir ao se atuar em atividades onde a liberdade seja umacaracterística primordial, vivida, buscada e preservada. É interes-sante observarmos, porém, não ser rara a situação em que seja noâmbito escolar, seja na esfera da família, as crianças são postas aestudar, a fazerem as ‘tarefas para casa’ escolares, imediatamenteapós terem comportado-se de uma maneira inadequada, pelomenos na visão dos adultos que as põem de ‘castigo’.

Qual o significado que resta às crianças, da atividade de apren-der, obter o conhecimento?

No mínimo, fica a conotação negativa de que estudar, tentaraprender é um castigo para as suas vidas. E como geralmente,as formas pelas quais elas aprendem estão longe de poderem servistas como formas de ensino voltadas para uma compreensão, a‘tortura’ torna-se ainda maior.

Podemos dizer que Einstein, assim como Dewey, acreditava nanecessidade de uma mudança cultural profunda – aí incluída aética – através da educação, para que as necessárias transforma-ções em direção a uma sociedade mais justa e igualitária fossem

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conquistadas de um modo conseqüente. Por isso, apesar de Eins-tein ter sido um dos maiores cientistas de todos os tempos e quejamais houvesse descartado a importância da ciência, o que elemais destacava na educação não era a necessidade da transmis-são de conteúdos científicos. O destaque era por ele colocado,sobretudo na dimensão humana e na questão ética e isso pode seconstatar, novamente, pelas suas próprias palavras ao dizer queo ser humano “deve aprender a compreender as motivações doshomens, suas quimeras e suas angústias para determinar com exa-tidão seu lugar exato em relação a seus próximos na comunidade.Essas reflexões essenciais, comunicadas à jovem geração graças aoscontatos vivos com os professores, de forma alguma se encontramescritas nos manuais. É assim que se expressa e se forma de iníciotoda a cultura”. Assim, Einstein não tinha como preocupaçãoeducacional central o mero aprimoramento da racionalidade hu-mana típica, no melhor dos casos, da educação científica quetemos comumente recebido e reproduzido. Einstein percebia aimportância do desenvolvimento de uma educação no nível dasemoções, da afetividade, do bom trato e das preocupações com osoutros seres humanos. É como se a inteligência, para ele, incor-porasse fortemente a dimensão emocional, não se restringindojamais, como é usual pensar-se, à lógica racional.

Na sociedade tecnológica da atualidade muito tem sido faladosobre a necessidade de ir-se além de uma simples alfabetização.Não são poucos os que têm defendido a necessidade de promo-vermos uma alfabetização científica, uma alfabetização matemá-tica e mesmo uma alfabetização digital. Conquanto isso possacarregar, certamente, uma importância e um fundo de verdade enecessidade, há de se conjecturar que há algo de mais profundoa ser atingido no terreno da educação e que não reside apenasno campo racional, mas que adentra nos terrenos da ética e daemoção, como preconizava Einstein. Para ele, por mais valiosoque fosse o discurso científico, o papel essencial da educação eda Escola é o de desenvolver a capacidade de pensar bem comodesenvolver uma espécie de alfabetização humanística, isto é, odesafio de aprender a ler os próprios homens.

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Einstein e a Questão Didática

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acerca do que ele considerava uma metodologia de en-sino produtiva.

Einstein escreveu, além dos seus muitos trabalhos de pesquisa,vários textos destinados a um público mais amplo. Uma partedesses textos era composta de transcrições de alocuções suas pro-feridas em ocasiões diversas e uma outra parte era composta demensagens contidas em cartas para as mais diferentes persona-lidades. Esses textos, que abordavam assuntos os mais variados,aí incluindo Ciência, Educação e Política, foram reunidos poste-riormente em forma de livros, editados em vários idiomas, taiscomo: “Como Vejo o Mundo” e “Escritos da Maturidade”.

Além desses livros de caráter mais geral, Einstein escreveu jáao final de sua vida, as suas “Notas Autobiográficas”. Escreveu,também, em , um célebre artigo de divulgação de alto nível,destinado aos seus colegas físicos e aos estudantes de Física, so-bre a Relatividade Geral e que foi publicado posteriormente emforma de livro em conjunto com outros artigos semelhantes deMinkowsky, Lorentz e Weil.

Einstein produziu, ainda, em , em conjunto com LeopoldInfeld, o best seller “A Evolução da Física”, uma obra magníficaque influenciou muitas pessoas pelo mundo a estudarem Física.Este livro, na verdade, foi escrito por Infeld seguindo um plano

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traçado por Einstein e adotando a abordagem de Einstein para odesenvolvimento das idéias da Física.

Einstein escreveu, também, isoladamente, em , um outrolivro de divulgação sobre a Teoria da Relatividade com um al-cance ainda mais amplo que o daquele dirigido anteriormenteaos seus colegas físicos. Este livro de era dirigido a pessoascom uma formação apenas de nível médio e intitulava-se: “ATeoria da Relatividade Geral e Especial”.

Uma vez situada aqui, esta breve síntese das obras de divulga-ção de Einstein¹ e após havermos analisado as suas posições edu-cacionais dotadas de um caráter mais filosófico nos capítulos an-teriores, interessa-nos, agora, observarmos algumas considera-ções suas mais próximas da esfera metodológica do ensino. Paratal, centramos a nossa atenção nas mensagens contidas no refe-rido prefácio de seu livro de Relatividade para um público maisamplo e, principalmente, na apresentação do assunto feita aolongo do próprio livro. Enriquecemos, ainda, tais reflexões comoutras considerações semelhantes feitas, igualmente por Einstein,principalmente em suas conversas com Peter Bucky.

No referido prefácio, Einstein levanta, ainda que de forma su-cinta, uma série de pontos que revelam a amplitude e a profun-didade do seu leque de preocupações pedagógicas. Particular-mente, fica bem caracterizada em todo o texto a sua preocupa-ção em produzir uma obra que tenha um caráter didático, assimcomo o sentido bem moderno e perspicaz que ele atribui a estadimensão didática.

Como já enfatizamos neste presente livro, as concepções edu-cacionais de Einstein foram muito influenciadas por sua reaçãoe descontentamento em relação à sua própria formação escolarem Munique assim como pelo bom exemplo colhido da sua edu-cação em Aarau. Essas concepções sofreram, também, uma forteinfluência do contato, como mencionamos anteriormente, porvezes inamistoso e hostil, com alguns dos seus professores naETH em Zurique, onde obteve a sua graduação em Física.

A sua visão pedagógica pode ser vista, assim, como uma es-pécie de libelo contra todas as agruras de um relacionamentoeducacional que muitas vezes esteve longe de contemplar as suas

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expectativas existenciais. Tudo isso mesclado com as influên-cias recebidas das suas leituras filosóficas e com a sua própriaexperiência profissional enquanto professor produziu, na ma-turidade, um conjunto de reflexões educacionais que guardamsintonias com o que há de mais avançado em termos do pensa-mento educacional em sua época e que descrevemos nos capítu-los anteriores.

Como vimos, a mais famosa das suas alocuções educacionais,foi a palestra que ele proferiu em Nova York na comemoraçãodos trezentos anos da educação superior nos Estados Unidos.Intitulada de “On Education”, esta palestra, como vimos, apre-senta as linhas- mestra do pensamento educacional de Einsteinem um tom de uma reflexão filosófica sobre os fundamentos daEducação.

Por outro lado, no texto do aludido prefácio do livro de di-vulgação sobre a Teoria da Relatividade assim como em váriostrechos de suas conversas com Peter Bucky, Einstein apresenta asua visão, ainda que de relance, do que ele compreendia comouma proposta didática.

Por ser aquele livro de Relatividade dirigido a um público nãoiniciado, Einstein destaca com vigor as várias nuances da ne-cessária dimensão didática contida naquele texto. Uma análisedas idéias contidas no mesmo pode revelar-nos pelo menos umadúzia de pontos importantes que caracterizam a posição de Eins-tein no tocante à sua postura didática adotada na escrita do li-vro. Tomemos, então, cada um desses pontos, caso a caso, paraefeito de uma análise que decodifique e explicite o seu conteúdosubjacente.

Einstein começa o referido prefácio assinalando que o seu livro

“pretende dar uma idéia, a mais exata possível da teoria daRelatividade ...”

Desse modo, ele deixa clara a necessidade de produzir não ape-nas uma simples obra de divulgação; mas, sim, de tentar trans-mitir uma imagem da Ciência que seja a mais próxima possíveldaquela derivada diretamente da pesquisa.

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Einstein, entretanto, tem plena consciência das dificuldadesde um tal empreendimento. Ele não acalenta a ilusão de que asua abordagem pedagógica sobre a Teoria da Relatividade possaser compreendida sem qualquer esforço por aqueles que não sesintam devidamente motivados a adquirirem o referido conhe-cimento. Ele assinala que essa visão a ser transmitida em seudiscurso destina-se

“àqueles que, de um ponto de vista geral científico e filosófico, seinteressam pela teoria ...”

De fato, para nós, a motivação não se apresenta apenas comoum elemento externo; é preciso que haja um desejo interior daparte do aprendiz em adquirir o conhecimento. Essa dimensãodo interesse e do conseqüente envolvimento pessoal não podejamais ser descartada. Apenas para os behaviouristas é possívelensinar até a quem não queira aprender; pois, em sua psicologiacomportamental, o papel da intenção e do livre arbítrio não édevidamente considerado.Apesar de Einstein assumir implicitamente que a aprendizagemcarrega necessariamente algo de intencional, ele admite tambémque, ao menos no caso do ensino da Relatividade para um pú-blico mais amplo, é possível uma aprendizagem mesmo para a-queles indivíduos que possuam um interesse pelo conhecimentodo assunto,

“mas não dominem o aparato matemático da Física teórica.”

Assim sendo, Einstein vê como um obstáculo maior à apren-dizagem uma possível falta de interesse do aluno do que propria-mente a ausência de possíveis e desejáveis conhecimentos préviosos quais, poderíamos dizer utilizando uma linguagem ausubeli-ana, pudessem se constituir em subsunçores para o assunto a seraprendido.

A leitura do seu livro de Relatividade revela-nos os recursos deque ele lança mão para contornar a dificuldade de uma possível

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falta de conhecimentos prévios por parte do leitor, conhecimen-tos esses que, certamente, permitiriam alicerçar melhor o novoconhecimento a ser adquirido.

Uma análise do texto mostra ainda que Einstein recorre ao usode metáforas bem escolhidas e a certos experimentos em pensa-mento que se constituem em belas transposições didáticas queo auxiliam a contornar e a superar um tal empecilho da faltade conhecimentos prévios mais adequados. Embora Einstein te-nha se referido em seu prefácio, especificamente à necessidade decontornar a ausência de um desejável conhecimento matemático,as metáforas que ele utiliza podem servir também de ‘pontes’ oude ‘transposições didáticas’ para suprirem as ausências de outrostipos de conhecimento. Por exemplo, se um aprendiz conhecea teoria da formação das franjas de interferência é possível fa-cilmente ensinar-lhe o experimento de Michelson-Morley. Se,entretanto, ele não dispõe de um tal conhecimento prévio, as me-táforas e os experimentos em pensamento com relógios de luz emtrens fictícios, usados por Einstein, podem ajudá-lo a contornaruma tal dificuldade de aprendizagem.

De fato, Einstein lança mão, naquele livro, de várias imagensmentais. Ele imagina situações das mais variadas, envolvendotrens, estações e sinais de luz. Imagina, ainda, que o ar nãoofereça resistência, que a gravidade seja desprezada em determi-nadas situações e coisas assim. São situações idealizadas que eletransforma mentalmente em experimentos em pensamento paraque o leitor possa adentrar mais apropriadamente nos mistériosda Teoria da Relatividade.

Na verdade, ele utilizava em profusão essas mesmas imagensem suas aulas e palestras, segundo o testemunho de muitos da-queles que tiveram a feliz oportunidade de assisti-las. Em suasaulas ele recorria mesmo a gestos teatrais, a um humor fino eprincipalmente a um constante questionamento. Em tais questi-onamentos, Einstein tinha sempre uma habilidade especial parasimplificar certas dificuldades teóricas, principalmente com o re-curso criativo de imagens, de metáforas e de experimentos empensamento.

O seu questionamento pedagógico fazia-lhe rever incessante-

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mente as bases dos pressupostos assumidos e adotar, de formatentativa, diferentes ângulos de visão de um problema. Como vi-mos, foi exatamente esse tipo de atitude de Einstein que inspirouMax Wertheimer, um dos criadores da psicologia da Gestalt, aconsiderar que um bom ensino deveria sempre levar em conta arelação dialética entre as ‘partes’ e o ‘todo’ dos assuntos estuda-dos.

Esse enfoque de um mesmo assunto por vários ângulos possí-veis parece, de fato ter sido uma das pedras de toque da aborda-gem metodológica de ensino característica de Einstein. A com-plexidade da busca dos muitos caminhos possíveis de apresen-tação de um assunto era tida por Einstein como um das tarefasbásicas de um bom professor, segundo ele expôs a Peter Bucky:

“é tarefa do professor encontrar quais são as facetas de um certoassunto ou qual é a abordagem que despertará o maior interessede cada estudante. E este é o grande desafio. Qualquer um podeensinar a alguém que se adapte rapidamente à aprendizagem,mas apenas um verdadeiro professor é capaz de alcançar aquelesalunos que são mentalmente mais lentos.”

Por alunos mentalmente mais lentos, devemos entender nãoapenas aqueles porventura menos inteligentes; mas, também, a-queles que por algum motivo, incluindo a falta dos necessáriossubsunçores ou imagens-guia, não adentrassem tão facilmente nacompreensão de um determinado assunto.

Retornando ao texto do aludido prefácio, notamos que Eins-tein estabelece também um patamar mínimo de conhecimentospara que o aprendiz possa atribuir um significado convenienteao seu discurso. Os necessários pré-requisitos que ele visualizacomo fundamentais estão em sintonia com a sua visão da teoriacomo algo mais que uma simples coleção de conteúdos isoladosou aleatórios. Ele vê a teoria como algo mais complexo tal como,por exemplo, uma rede ou como as árvores e a floresta, na qualexiste a mencionada dialética da parte e do todo. Em outras pala-vras, Einstein antecipa uma postura que em muito lembra a po-sição moderna de Edgar Morin ao assumir que o conhecimento

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admite uma complexidade. Assim, tais pré-requisitos adquirem,para ele, um sentido estrutural e antecipam o significado dossubsunçores no sentido que seria, tempos depois, conferido porAusubel na literatura educacional. Einstein deixa claro que

“a leitura pressupõe que o leitor tenha formação equivalente à doensino médio.”

Ele tem, entretanto, a clareza de que o seu texto é sucinto eque desta forma ele não abarca toda a complexidade do temaem foco. Assim, ele alerta que “apesar da brevidade do livro, aleitura pressupõe que o leitor tenha paciência e força de vontade”.Ele se dispõe deste modo, a desenvolver um discurso realmentecomprometido com o propósito de construir um tipo de apren-dizagem que poderíamos interpretar como significativa.

A clareza e a simplicidade do seu discurso são ferramentasbásicas para atingir os seus objetivos educacionais. Longe de ado-tar esquemas empiristas como o do assim denominado “ensinopor descoberta”, Einstein revela-se alinhado com os preceitos deuma instrução crítica, que requer além da precisão já assinaladaanteriormente, clareza e simplicidade. Ele enfatiza este pontoafirmando que

“o autor não poupou esforços para apresentar as idéias principaisde maneira clara e simples.”

Einstein tem também em mente a importância da dimensãohistórica do conhecimento científico. Ele não adota rigorosa-mente uma apresentação histórica; mas, recorre – quando lhe pa-rece conveniente para uma boa compreensão do assunto – à ela-boração de excelentes transposições didáticas apresentando taistransposições apenas como alternativas pedagógicas e jamais co-mo balizadores do real desenvolvimento histórico dos conteúdosveiculados. É apenas neste sentido pedagógico que ele se permiteutilizar o experimento de Michelson-Morley como uma pontepara um acesso mais fácil aos mistérios da Teoria da Relatividade,

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sem jamais atribuir ao mesmo o caráter de haver sido parte inte-grante do desenvolvimento histórico da mesma. No mais, comoele mesmo destaca, as informações são apresentadas

“respeitando, em geral, a seqüência e o contexto em que elassurgiram na realidade.”

Einstein prioriza a tal modo a questão da clareza do texto quechega a deixar de lado quaisquer detalhes de estilo que possamcomprometer a finalidade pedagógica do mesmo. Ele não deixadúvidas de que “no interesse da clareza, foi inevitável repetir-memuitas vezes, sem preocupação com a elegância da apresentação”.Ele chega mesmo a zombar daqueles que escrevem textos didáti-cos com uma preocupação estilística:

“pautei-me, escrupulosamente, pela norma do genial físicoteórico Ludwig Boltzmann, que deixava as questões de elegânciaa cargo de alfaiates e sapateiros.”

Einstein mostra-se também avesso à tradicional “didática dafacilitação”, um mero artifício metodológico muito comum e queconsiste no embuste de esconder as dificuldades reais do assuntoestudado apresentando, em seu lugar, uma simples caricatura domesmo. É por isso que ele se mostra tão cauteloso no uso dastransposições didáticas adotadas. Ele, conscientemente, prefereenfrentar as naturais complexidades do tema tratado:

“julgo não haver ocultado ao leitor as dificuldades inerentes aoassunto.”

Ele não tenta esconder a complexidade do assunto tratado;mas, sim, exibi-la e decodificá-la de todas as formas possíveis emum nível compatível com o do suposto leitor. Deste modo, seudiscurso afasta-se do conforto metodológico tradicional e alinha-se com uma postura de problematização do conhecimento, bemtípica dos seus múltiplos enfoques críticos adotados.

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Os muitos testemunhos daqueles que tiveram o privilégio deassistirem às suas aulas reforçam também a tese de que a sua atu-ação pedagógica como professor era sempre igualmente questio-nadora e socrática, como discorremos anteriormente neste livro.

Einstein mantém-se, em seu livro, fiel à distinção epistemo-lógica que traçou em vida entre teorias construídas e teorias deprincípios. Nesse sentido epistemológico, ele trata sempre a Re-latividade, mesmo quando apresentada em um nível elementar,como um exemplo maior de uma teoria de princípios. Assim,ele não recorre à menção de outros experimentos mais do queas exigências pedagógicas lhe intimam a fazer. Por isso, também,ele não recorre a quaisquer bases fenomenológicas do assuntotratado que possam ir além daqueles experimentos relacionadoscom o pretenso deslocamento do éter, como raízes pedagógicaspossíveis da apresentação da sua teoria. Além disso, a complexi-dade maior do conflito entre os fenômenos eletromagnéticos e astransformações galileanas é propositalmente omitida em prol deuma apresentação mais simples e clara da sua teoria. Retorna-se,assim, aos limites pedagógicos, já antes mencionados, de umaapresentação que se pretendesse rigorosamente histórica. É porisso que Einstein afirma, sem meias palavras, que:

“já os fundamentos físicos empíricos da teoria, tratei-osconscientemente com certa negligência.”

Ele deixa clara a sua postura dialética de apresentação do con-teúdo na qual o jogo entre a percepção das partes e do tododesempenham um papel fundamental. Em uma frase que deveter encantado Wertheimer, Einstein reafirma esta sua convicçãoao explicitar as razões do seu não aprofundamento dos detalhesempíricos da teoria

“para evitar que o leitor menos familiarizado com a Física fizessecomo aquele caminhante que, de tantas árvores, não conseguiuenxergar a floresta.”

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Finalizando o seu prefácio, Einstein retoma uma questão cen-tral em sua orientação pedagógica e em seu próprio modus vi-vendi, a da busca da felicidade como um motor das ações huma-nas. Ele se afasta de uma perspectiva meramente utilitarista e de-dica a sua obra à busca de um prazer fundamentado no exercíciodo pensamento, expressando:

“que este pequeno livro possa proporcionar a muitos leitoresalgumas horas de estímulo intelectual!”

Esta dimensão do prazer explicitada não apenas nos seus tex-tos escritos, mas, sobretudo, nas suas ações pedagógicas revela-se, também, de modo brilhante em suas conversas com PeterBucky. Nessas conversas, Einstein estabelece ligações múltiplas deuma tal dimensão do prazer com outras temáticas educacionaisjá abordadas neste livro em capítulos anteriores.

Ao ser questionado por Peter Bucky se ele achava que o pro-blema com os métodos de ensino que ele havia criticado eram umproblema apenas do seu tempo ou se eram algo que sempre haviase mostrado problemático, Einstein foi claro em sua resposta:

“Oh, sim, este problema sempre esteve entre nós. Na verdade, euformei meu julgamento do que constitui bons métodos de ensinoao experienciar maus métodos em ação na minha própriaescolaridade. A partir daquelas experiências, eu aprendi que asformas de ensino mais livres assim como o dar aos estudantes aoportunidade de selecionarem de formas mais livres os assuntosa serem estudados também faz com que, tanto os professoresquanto os alunos, compreendam de forma mais decisiva aimportância dos seus respectivos papéis e torne a experiênciaeducacional como um todo mais prazerosa. Sem esse tipo deliberdade educacional, a mente do estudante irá apenas serutilizada para a memorização, mas os seres humanos não sãomáquinas e não podem ser tratados como máquinas.”

É justamente no tratamento dispensado pelos professores aosseus alunos que Einstein vê um dos pontos fundamentais do en-sino e a possibilidade do surgimento dos maiores obstáculos para

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a aprendizagem. Ele retoma a questão do prazer no ato edu-cacional ligando-a à questão do interesse existente ou não paraaprender um certo assunto. Para ele:

“os professores, freqüentemente, não sabem como ensinar. Elesesquecem que os seus estudantes não estão naturalmente tãointeressados nos assuntos quanto eles. Um professor qualificadodeveria ter a habilidade ou o dom de presentear o seu assuntoaos estudantes de uma tal maneira que o tornasse interessante esignificativo para os mesmos.”

Apesar de admitir a enorme importância do professor neste as-pecto motivacional do estudante, Einstein afirma, também, comclareza, que se uma motivação intrínseca já existir da parte doestudante, este certamente poderá superar os obstáculos existen-tes e aprender o assunto desejado. Para ele, mesmo quando oprofessor não estiver em condições de cumprir aquilo que dele édesejado,

“quando alguém está interessado em um assunto e lê um livrosobre o mesmo, ele tem a oportunidade única de aprender aquiloque é essencial sem intermediários e assim, sem ser influenciadopor outras pessoas.”

Einstein retoma a questão dos interesses diferenciados entreos indivíduos para criticar o papel desmotivador freqüentementeexercido por processos de avaliação irracionais e traumáticos quevalorizam apenas a memorização de fatos, abafando, assim, acuriosidade natural e o necessário esforço de exploração ligadoa uma busca sadia e produtiva do conhecimento. Ele vê taisprocessos de avaliação que valorizam a pura memorização comomeras formas odiosas de coerção educacional que embotam todae qualquer criatividade e todo e qualquer livre desejo de apren-der. Opondo-se a toda e qualquer forma de coerção, Einsteinobserva em conversa com Bucky, que:

“os estudantes são forçados a aprenderem muitas coisasdesnecessárias simplesmente em nome dos exames a serem

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realizados. Com relação à minha própria experiência, após osexames, a minha mente ficava seriamente prejudicada porbastante tempo para explorações científicas e para análises.Minha capacidade mental era exaurida por ter de memorizarinformações inúteis.”

Einstein vê essa desmotivação causada por avaliações traumá-ticas e também estendida ao processo de ensino como um todo.Ela se estende à atitude de participação ou não dos alunos emum questionamento que possa conduzir a uma necessária trocade informações para fomentar a aprendizagem. Ele observa, emparticular, que os alunos aprendem, freqüentemente, com o tem-po vivido na Escola a não mais perguntarem, abandonando oquestionamento e a investigação como processos de aquisição doconhecimento.

Ao que nos parece, isso faz com que os alunos em geral termi-nem, no melhor dos casos, por substituir a sua natural curiosi-dade por uma obediência cega e irrestrita às palavras do mestre.Contra isso, Einstein alerta que é preciso atentar para a necessi-dade dos professores incentivarem os questionamentos por partedos seus alunos. Ele alerta, também, para o fato de não existiremperguntas tolas em um processo educacional realmente livre eprazeroso:

“na verdade, eu sempre fiquei surpreso com as questões que ascrianças perguntam sobre a Ciência. Na maior parte das vezes,elas são muito mais lógicas do que muitas questões que são feitaspor adultos, mesmo por profissionais no assunto. E, também,elas nunca se mostram temerosas em fazer perguntas. Os adultossão muito inibidos e mostram-se sempre receosos de fazerem‘perguntas tolas’. Mas, em meu vocabulário, a palavra ‘tola’ nãoexiste, ao menos com relação à Matemática e à Ciência. E é aquionde muitos professores se enganam. Pelas suas inabilidades emse comunicarem com alguém, eles o culpam de ser um estúpidoem lugar de culparem as suas próprias impaciências ou as suasfaltas de desejo de mudarem as suas abordagens de ensino.”

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Dentro desse necessário quadro de liberdade e de participa-ção ativa e prazerosa no ensino, como Einstein vê o papel doprofessor?

A questão levantada por Einstein sobre a necessidade do pro-fessor adotar práticas mais livres no seu ensino, em um clima deharmonia e liberdade em sala de aula, fez com que Peter Buckylhe perguntasse a respeito das reais condições necessárias paraque tais práticas pudessem vir a ser adotadas. Em particular, estaquestão parecia apontar para um outro ponto: se os professorespodiam realmente adotar tais posturas mais livres no ensino ouse eles eram tolhidos pelo sistema ou mesmo pelas suas própriaslimitações pessoais.

Einstein elaborou, inicialmente uma resposta para a segundaparte desse novo questionamento, o das limitações individuaisdos professores. Em suas palavras:

“para ser um bom professor a semente precisa desde o início estarali. O que eu quero dizer é que a qualidade mais importante deum bom professor é que ele precisa ter uma estrutura psicológicaapropriada. Deste modo, ele pode compreender as necessidadesdos seus alunos. Mesmo se a um tal professor faltar todo oconhecimento necessário, ele poderá sempre obter aqueleconhecimento nos livros ou da experiência. Mas, mesmo oprofessor com o maior conhecimento do seu assunto em todo omundo, mas que não compreenda a psicologia de lidar com osseus alunos, será um mau professor.”

No tocante à primeira parte da questão levantada, a respeitodos requisitos necessários à Escola para que uma tal prática daliberdade pudesse se efetivar, Einstein mostrou também a Buckya sua clara percepção do problema:

“bem, é necessário iniciar com as escolas em si mesmas. Aatmosfera da Escola é mais importante do que os professoresindividualmente, pois, ela alimenta a aprendizagem em geral aopermitir o ambiente apropriado para este fim. /.../ Deveriahaver a necessária liberdade para que tanto os professores

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quanto os alunos pudessem selecionar quais os materiais que elesdesejassem utilizar. Quando um comitê ou a direção de umaescola começa a mediar as escolhas dos livros didáticos e dosmétodos de ensino, então uma verdadeira aprendizagem já estácondenada à morte. Em todos os casos, o prazer em aprenderdeveria ser alimentado e através do mesmo o reconhecimentodas realizações pessoais.”

Vemos, deste modo, que para Einstein, uma boa metodologiade ensino não é apenas uma questão de técnicas; muito pelo con-trário, ela não pode jamais ser desvinculada das questões maioresda própria dimensão humana. É por isso que a questão do prazerna aquisição do conhecimento caminha, em sua visão, lado alado com o exercício da liberdade e com a construção de umasociedade mais fraterna e mais justa.

Notas do Capítulo

. Uma análise bem mais detalhada da obra de divulgação de Einstein, como umtodo, pode ser encontrada em Moreira & Studart ().

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