efeitos do programa bolsa famÍlia na reduÇÃo da pobreza ... · o conceito de desigualdade...

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EFEITOS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NA REDUÇÃO DA POBREZA E DA DESIGUALDADE SOCIAL 1 Claudiane Coimbra da Silva 2 RESUMO Este projeto pretende esboçar alguns conceitos acerca das condições de exclusão social impostas pelo sistema em que se encontra a sociedade, além disso, aspira, por meio de entrevista com famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família - visto que no Brasil este é o maior programa de transferência de renda - apontar alguns aspectos relevantes para a superação ou não da pobreza, já que sua perpetuação ao longo das gerações é um fato relevante para a manutenção da exclusão social de alguns grupos. Para essa pesquisa, adotou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo a partir de entrevistas semiestruturadas, tendo como principais teóricos Lopes (2006) com os estudos sobre exclusão e inclusão social, bem como a Política Nacional de Assistência Social (BRASIL, 2016). A partir da análise de dados chegou-se a conclusão que o Programa Bolsa Família é relevante na vida dos beneficiários, mas sozinho não promove a superação da pobreza. Palavras-chave: Exclusão Social. Pobreza. Transferência de renda. ABSTRACT This Project intends to outline some concepts about the conditions of social exclusion imposed by the system in which the society bellows, besides that, aspire, by means of an interview with beneficiaries families of the Bolsa Família Program – since in Brazil this is the biggest program of income transference – to point some relevant aspects for the overcoming or not of the poverty, since your perpetuation in the long of the generations is a relevant fact for the maintenance of the social exclusion of some groups. For this research it was adopted as methodology the bibliography research and field research from semi structured interviews, having as main theorists Lopes (2006) with the studies about social exclusion and inclusion, as well as the National Policy of Social Assistance (BRASIL, 2016). After analyzing the data we have reached the conclusion that the Bolsa Família Program had a relevant impact in the lives of its beneficiaries, however by itself it is not sufficient for the erradication of poverty. Keywords: Social exclusion. Poverty. Income transference. 1 Trabalho orientado pela Profa. Me. Gesilane de Oliveira Maciel José. E-mail: [email protected]. 2 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu em Educação, Pobreza e Desigualdade Social pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Formação em Psicologia. Email:[email protected]. Anais do XIV Congresso Internacional de Direitos Humanos. Disponível em http://cidh.sites.ufms.br/mais-sobre-nos/anais/

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EFEITOS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NA REDUÇÃO DA POBREZA E DA DESIGUALDADE SOCIAL1

Claudiane Coimbra da Silva2

RESUMO Este projeto pretende esboçar alguns conceitos acerca das condições de exclusão social impostas pelo sistema em que se encontra a sociedade, além disso, aspira, por meio de entrevista com famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família - visto que no Brasil este é o maior programa de transferência de renda - apontar alguns aspectos relevantes para a superação ou não da pobreza, já que sua perpetuação ao longo das gerações é um fato relevante para a manutenção da exclusão social de alguns grupos. Para essa pesquisa, adotou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo a partir de entrevistas semiestruturadas, tendo como principais teóricos Lopes (2006) com os estudos sobre exclusão e inclusão social, bem como a Política Nacional de Assistência Social (BRASIL, 2016). A partir da análise de dados chegou-se a conclusão que o Programa Bolsa Família é relevante na vida dos beneficiários, mas sozinho não promove a superação da pobreza. Palavras-chave: Exclusão Social. Pobreza. Transferência de renda. ABSTRACT This Project intends to outline some concepts about the conditions of social exclusion imposed by the system in which the society bellows, besides that, aspire, by means of an interview with beneficiaries families of the Bolsa Família Program – since in Brazil this is the biggest program of income transference – to point some relevant aspects for the overcoming or not of the poverty, since your perpetuation in the long of the generations is a relevant fact for the maintenance of the social exclusion of some groups. For this research it was adopted as methodology the bibliography research and field research from semi structured interviews, having as main theorists Lopes (2006) with the studies about social exclusion and inclusion, as well as the National Policy of Social Assistance (BRASIL, 2016). After analyzing the data we have reached the conclusion that the Bolsa Família Program had a relevant impact in the lives of its beneficiaries, however by itself it is not sufficient for the erradication of poverty. Keywords: Social exclusion. Poverty. Income transference. 1 Trabalho orientado pela Profa. Me. Gesilane de Oliveira Maciel José. E-mail: [email protected].

2 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu em Educação, Pobreza e Desigualdade Social pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Formação em Psicologia. Email:[email protected].

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1 DESIGUALDADE SOCIAL E A PRODUÇÃO DA POBREZA

O conceito de desigualdade social, inclusão e exclusão, perpassam a

realidade do modo de produção capitalista. Desse modo, ao discutirmos o processo

da Exclusão/Inclusão é necessário antes de tudo, compreendermos como as

relações são dadas e afirmadas socialmente.

O capitalismo tem como característica principal a exploração do homem pelo

homem. Esta forma subalternizada a qual o indivíduo é submetido já se constitui

como uma forma peculiar de exclusão. Tal peculiaridade se caracteriza pela divisão

social de classes, em que uns são detentores dos meios de produção e, a outros

muitos, resta-lhe a força de trabalho para que seja vendida e explorada (NETTO;

BRAZ, 2007).

Sobre isso, Netto e Braz (2007) nos esclarece: A relação de classes é construída historicamente e é revestida de determinantes que estão diretamente ligados a posição que estes indivíduos ocupam dentro da sociedade. Ou seja, a desigualdade social constitui-se como resultado do caráter dominante do capital, em que a produção é coletiva, mas a apropriação é privada (NETTO; BRAZ, 2007, p.20).

Sendo assim, percebe-se a desigualdade social entendida como geradora de

pobreza e, por conseguinte de vulnerabilidade social, estando ligada aos fatores

sociais construídos pela lógica capitalista e incorporado pelo ser social

acriticamente, em que passa a determinar sua consciência.

A compreensão de que a pobreza existe é algo fundamentalmente importante

na sociedade atual, principalmente por todos os fatores intrínsecos a vivência

daqueles que são pobres e necessitam, como qualquer outro cidadão, usufruir de

seus direitos.

A naturalização do fenômeno da pobreza tem levado a contestações que

combatem a compreensão da pobreza como violação dos direitos humanos, já que

essa realidade teria como causa a falta de esforço pessoal, uma espécie de opção

pessoal, ou mesmo o resultado de características negativas dos indivíduos

classificados como pobres. Ou seja, com a constatação de que a pobreza não

efetiva os ditos direitos humanos, observa-se a necessidade de eliminar as causas

que lhe dão origem.

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É notável que o sujeito não dependerá apenas de sua vontade para obter

sucesso na vida escolar e profissional. É preciso considerar as causas da pobreza.

O atendimento básico as necessidades básicas para a vida dependem da aquisição

de renda, esta geralmente é proveniente do trabalho, que nem sempre está

disponível no mercado.

A definição do que é a pobreza faz-se necessária para que se efetive o

acesso a direitos fundamentais trazidos pela Constituição em seu artigo 6º “São

direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a

segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência

aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 2016). Ao considerar

que todos são iguais perante a lei e todos têm direitos, deve-se garantir não apenas

o acesso ao direito por todos os cidadãos, e sim a qualidade no acesso e

participação neste direito.

Ao se perceber a pobreza nos núcleos familiares, percebe-se também que

muitas situações decorrentes de sua vivência são difíceis de superar, algumas

dessas situações são a progressão nos anos escolares, a falta de qualificação para

o mercado de trabalho, a cultura de violência impostas a jovens, homens e em sua

maioria negros.

O Programa Bolsa Família tem se consolidado e tem sido reconhecido como

o principal responsável pela mudança de situação social de muitas famílias por

preconizar o acompanhamento da família nas áreas da saúde e da educação. Neste

sentido, em Campo Grande, conforme o Boletim do MDS (2016) 91,52 % das crianças e jovens de 6 a 17 anos do Bolsa Família têm acompanhamento de frequência escolar. A média nacional é de 91,67 %. Na área da saúde, o acompanhamento chega a 76,45 % das famílias com perfil, ou seja, aquelas com crianças de até 7 anos e/ou com gestantes. A média nacional é de 75,25 % (BRASIL, 2016).

Portanto, o aumento do grau de instrução ao longo das gerações, a garantia

de renda, a possibilidade de aumento de crédito, a utilização de serviços e a

aquisição de patrimônio são fatores que contribuem substancialmente para a

possibilidade de superação da pobreza pelas famílias.

Ainda no que tange à Educação não é perceptível na estruturação dos

currículos escolares a inclusão da pobreza como tema de estudo. Para Santomé

(1995, p.161), As culturas ou vozes dos grupos sociais minoritários e/ ou marginalizados que não dispõem de estruturas de poder costumam ser excluídas das salas de aula,

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chegando mesmo a ser deformadas ou estereotipadas, para que se dificultem (ou de fato se anulem) suas possibilidades de reação, de luta e de afirmação de direitos.

Nos estudos acerca das características presentes para a população pobre, há

dados dos Indicadores Sociais Mínimos/IBGE (2016) sobre o não acesso a serviços

básicos como moradia, asfalto, esgoto, iluminação pública, transporte, educação,

saúde e características relativas ao consumo diário de alimentos. Assim, a baixa

renda das famílias é acentuada e constantemente negativada quando combinada

com as questões voltadas às minorias.

Ainda segundo indicadores do IBGE (2016), há o predomínio de mulheres

negras em situação de pobreza, como também há mais pobres em áreas territoriais

com menos acesso a serviços, nas famílias pobres há baixa escolaridade e menor

tempo nos bancos escolares, são alguns apontamentos de que a violência é a maior

causa de morte em homens adultos-jovens e pobres.

Aceitar que a pobreza é uma violação dos direitos humanos implica a

necessidade de eliminar as injustiças cometidas contra esses contingentes

populacionais, criando condições para que se ampliem com objetividade os graus de

consciência sobre a dimensão desse problema e dos fatores que o geram.

Com isso, é necessário rebater a percepção preconceituosa que identifica a

pobreza como fatalidade ou consequência de atitudes individuais. Ou seja, além da

vulnerabilidade econômica e financeira ocorre a vulnerabilidade social recorrente em

famílias que vivenciam a pobreza. Por isso, as políticas públicas devem preconizar a

superação da pobreza e o incentivo à permanência nas escolas, devem ser

pensadas para o pobre.

1.1 EXCLUSÃO E INCLUSÃO SOCIAL: ALGUNS APONTAMENTOS

A discussão aqui proposta anseia esboçar alguns conceitos acerca das

condições de exclusão social impostas pelo sistema em que se encontra a

sociedade e analisar se a superação da pobreza se torna de fato um aspecto

relevante para a superação da exclusão social.

A ideologia predominante coloca a meritocracia como algo comum e básico

aos processos de distribuição de renda e acesso a vidas mais dignas e ricas, ou

seja, o trabalhador e o aluno que vão bem, que obtém sucesso, chegam a esta

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posição por seu próprio esforço, sem maiores análises de processos que os levam

ao sucesso acadêmico e a manutenção nos postos de serviços.

Esta visão reducionista e moralizante não favorece aqueles que estão à

margem dos processos e dos serviços básicos. Em um de seus textos sobre o

analfabetismo Paulo Freire escreve “O homem marginalizado não é “um ser fora de”.

É, ao contrário, um “ser no interior de” em uma estrutura social, em relação de

dependência...” (FREIRE, 1980, p.74). Neste ponto percebe-se que a pobreza e a

falta de empregos são necessárias a estrutura em vigor.

Para Lopes (2006) a Exclusão Social pode ser caracterizada pelos seguintes

fatores: Caracteriza-se por um conjunto de fenômenos que se configuram no campo alargado das relações sociais contemporâneas: o desemprego estrutural, a precarização do trabalho, a desqualificação social, a desagregação identitária, a desumanização do outro, a anulação da alteridade, a população de rua, a fome, a violência, a falta de acesso a bens e serviços, à segurança, à justiça e à cidadania, entre outras (LOPES, 2006, pg. 13).

E conforme, Wixey et al (2005), a Inclusão Social é: Valorização das pessoas e grupos independentes de religião, etnia, gênero ou diferença de idade; estruturas que possibilite possibilidades de escolhas; envolvimento nas decisões que afetam a si em qualquer escala; disponibilidade de oportunidades e recursos necessários para que todos possam participar plenamente na sociedade (WIXEY et al., 2005, pg. 17).

Diante dessas denominações, levando em conta que há outras definições e

abrangências do tema, este trabalho se concentrará na percepção em que a

dicotomia: Exclusão e Inclusão apresenta-se enquanto uma correlação de forças

que é estabelecida dentro da dinâmica da sociedade capitalista e inserida no

contexto da flexibilização proposta pela lógica neoliberal (FALEIROS, 2006).

Ou seja, a identificação dos fatores de Exclusão e Inclusão social está

associada à vulnerabilidade social e percebe-se ainda que alguns dos fatores apesar

de antigos, permanecem ainda em evidência na sociedade contemporânea.

Para um maior entendimento de como o processo de exclusão interfere na

vida das pessoas, Sawaia (1999, p.104) nos explica o sofrimento vivido pelas

consequências da exclusão: O sofrimento ético-político abrange as múltiplas afecções do corpo e da alma que mutilam a vida de diferentes formas. Qualifica-se pela maneira como sou tratada e trato o outro na intersubjetividade, face a face ou anônima, cuja dinâmica, conteúdo e qualidade são determinados pela organização social. Portanto, o sofrimento ético-político retrata a vivência cotidiana das questões sociais dominantes em cada época histórica, especialmente a dor que surge da situação social de ser tratado como inferior, subalterno, sem valor, apêndice inútil da sociedade. Ele revela a tonalidade ética da vivência cotidiana da desigualdade

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social, da negação imposta socialmente às possibilidades da maioria apropriar-se da produção material, cultural e social de sua época, de se movimentar no espaço público e de expressar desejo e afeto.

Por esses motivos e outros que não foram citados acima é que a Exclusão /

Inclusão não podem ser debatidas e enfrentadas na superficialidade, mas, sim, a

partir de bases sólidas e consistentes e por isso que a efetivação e o

acompanhamento de todos os planos inclusivos não devem permanecer apenas em

relatório.

O pobre vive em situação de precariedade em relação a seus direitos,

inclusive ao direito de poder escolher uma forma de viver em que haja melhorias e

transformações em sua realidade socioeconômica. A violência e a falta de

representatividade social fazem o pobre se calar, pois a sua capacidade de voz está

relacionada ao seu direito de exercer sua cidadania visto que os cidadãos são entes

políticos e sociais, que exercem seus direitos e seus deveres, principalmente o

direito de fazer suas próprias escolhas e não tê-las impostas pela falta de acesso a

bens materiais e sociais, como saúde, educação e lazer.

A possibilidade de rompimento do circulo vicioso da pobreza se dá pelos

ganhos estruturais e subjetivos advindo da superação da pobreza. A garantia de

renda mínima, ainda que advinda do Programa Bolsa Família, é o primeiro passo

para se combater a perpetuação da pobreza. Assim, as politicas públicas devem

estar voltadas para as questões relacionadas ao empoderamento e às capabilidades

dos pobres com a finalidade de proporcionar maior cidadania e possibilidades de

superação da pobreza ao longo das gerações. (Pinzani e Rego, 2015)

Diante dessas considerações e da perpetuação da pobreza nas famílias

interessa-se em abordar as vulnerabilidades vividas e vencidas ou não por famílias

beneficiárias de transferência de renda por intermédio do governo federal, portanto o

objetivo principal dessa pesquisa é identificar os efeitos do Programa Bolsa Família

na redução da pobreza e da desigualdade social.

2 SUPERAÇÃO DE VULNERABILIDADES E O DIREITO À CIDADANIA

Os efeitos do Programa Bolsa Família são dados na perspectiva de

superação de vulnerabilidades sociais vividas por famílias pobres e extremamente

pobres conforme a linha de corte constante no Cadastro Único, essa linha refere-se

a renda per capta apontada na declaração do responsável familiar.

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A base utilizada para a distribuição do benefício financeiro do Programa Bolsa

Família é o Cadastro Único – CadÚnico do Governo Federal. Este cadastro é Um instrumento que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda, permitindo que o governo conheça melhor a realidade socioeconômica dessa população. Nele são registradas informações como: características da residência, identificação de cada pessoa, escolaridade, situação de trabalho e renda, entre outras (BRASIL, 2016).

Assim, a constatação da pobreza e extrema pobreza e consolidou-se a partir

do Plano Brasil Sem Miséria, o qual trás os pilares fundamentais para a superação

de vulnerabilidades das famílias pobres e extremamente pobres; por considerar que

a garantia de renda, a inclusão produtiva e o acesso a serviços devem estar

interligados na busca por mais dignidade.

Algumas instituições apresentam critérios para a constatação da pobreza.

Segundo dados do vídeo Pobreza no Brasil - Caminhos da Reportagem (TV Brasil,

2011), a ONU – Organização das Nações Unidas coloca que pobre é quem tem

renda de até R$2/dia, para o MDS quem tem renda familiar per capta de até

R$140/mês, e extremamente pobre até R$70/mês.

Nos estudos acerca das características presentes para a população pobre, há

ainda dados acerca do não acesso a serviços básicos como moradia, asfalto,

esgoto, iluminação pública, transporte, educação, saúde e características relativas

ao consumo diário de alimentos.

A concepção de família trazida nessa perspectiva política é a mesma

interpretada por toda Política Nacional da Assistência Social em que se considera

“família, a unidade nuclear, eventualmente ampliada por outros indivíduos que com

ela possuam laços de parentesco ou de afinidade, que forme um grupo doméstico,

vivendo sob o mesmo teto e que se mantém pela contribuição de seus membros”

(BRASIL, 2004).

Essa nova perspectiva acerca das famílias e das pessoas em vulnerabilidade

social decorrentes da pobreza e da exclusão social nasce com a Constituição

Federal de 1988 por assegurar o direito à cidadania. Assim, a Política Nacional de

Assistência Social foi regulamentada pela Lei Orgânica da Assistência Social, Lei nº

8.742, de 07 de dezembro de 1993, com vistas a ampliar o acesso aos bens e

serviços socioassistenciais para grupos específicos, bem como, assegurar que as

ações no âmbito da assistência social tenham centralidade na família e garantam a

convivência comunitária.

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A partir deste novo modelo de Assistência Social foram instituídos benefícios,

serviços, programas e projetos destinados ao enfrentamento da exclusão social dos

segmentos mais vulnerabilizados como as pessoas em situação de miséria e

pobreza, bem como aqueles que estão com direitos violados.

O foco desta política está nas famílias por considerá-las espaços naturais de

proteção e inclusão social. Os grupos familiares encontram-se em comunidades,

portanto, é nesse território que as pessoas vão se constituindo como seres sociais,

onde se desenvolve o sentimento de pertencimento, de segurança, cidadania a partir

da percepção que se é um sujeito social, ativo, emancipado, um ser social de fato.

Essas famílias que não tem rostos quando analisadas a partir de dados do

IBGE, das secretarias de Educação, Assistência Social e Saúde, bem como dos

programas sociais. Todavia, são personificadas diante de cada atendimento e

devem ser humanizadas cada vez mais, do ponto de vista de quem atende e,

principalmente, pela própria valorização que se faz necessária para a superação de

suas vulnerabilidades.

No âmbito da consolidação da política de Assistência Social, na perspectiva

do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, o desenvolvimento de um Sistema

Nacional de Informação da Assistência Social é fundamental para o aprimoramento

da gestão, além da institucionalização das práticas de planejamento, monitoramento

e avaliação do conjunto de ações, programas, serviços e benefícios da política

assistencial, de forma a aumentar sua efetividade. (BRASIL, 2009)

Assegura-se que o público dessa política são os cidadãos e grupos que se

encontram em situações de vulnerabilidades sem distinção daqueles que dela

necessitam e sem contribuição prévia a provisão dessa proteção social, através do

trabalho desenvolvido pelos técnicos que estão presentes na Proteção Social

Especial com os CREAS - Centro de Referência Especializado de Assistência Social

e na Proteção Social Básica com os CRAS- Centros de Referência da Assistência

Social.

2.1 O ACESSO ÀS POLÍTICAS ASSISTENCIAIS

A consolidação da Política de Assistência Social – PNAS por meio do SUAS,

pelo conteúdo presente na Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais e

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pela capilaridade da Proteção Social Básica, concretiza os CRAS como locais onde

se executam de forma direta Os serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica deverão se articular com as demais políticas públicas locais, de forma a garantir a sustentabilidade das ações desenvolvidas e o protagonismo das famílias e indivíduos atendidos, de forma a superar as condições de vulnerabilidade e a prevenir as situações que indicam risco potencial. Deverão, ainda, se articular aos serviços de proteção especial, garantindo a efetivação dos encaminhamentos necessários (PNAS, 2004).

Essas Unidades estatais responsáveis pela oferta de serviços continuados de

proteção social básica à famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade social

em seu contexto comunitário, visam a orientação e o fortalecimento do convívio

familiar. Este fortalecimento de convívio é o principal pressuposto no

desenvolvimento das atividades dos CRAS, especialmente pelo PAIF – Serviço de

Proteção e Atendimento Integral à Família.

O PAIF, conforme a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais

(2009) Consiste no trabalho social com famílias, de caráter continuado, com a finalidade de fortalecer a função protetiva das famílias, prevenir a ruptura de seus vínculos, promover seu acesso e usufruto de direitos e contribuir na melhoria de sua qualidade de vida. Prevê o desenvolvimento de potencialidades e aquisições das famílias e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, por meio de ações de caráter preventivo, protetivo e proativo. (BRASIL, 2009).

Além do PAIF, os CRAS realizam outros serviços divididos nas diversas

faixas etárias por entender que os sujeitos passam por ciclos de vida e, em cada um

desses ciclos, há necessidades e potencialidades diferentes; assim como busca da

garantia de direitos e o desenvolvimento de mecanismos para a inclusão social por

meio do acolhimento de demandas diversas trazidas pelos sujeitos pertencentes ao

território como cadastramento e atualização do NIS e concessão de benefícios

eventuais.

Conforme as Orientações Técnicas para o Centro de Referência de

Assistência Social/CRAS (2006), além de o trabalho assistencial estar centralizado

na família, “nos CRAS prioritariamente, serão atendidas as famílias beneficiárias do

Programa Bolsa Família, os idosos e deficientes beneficiários do Benefício de

Prestação Continuada – BPC” (BRASIL, 2006)

Assim, a articulação acontecerá entre o PAIF/PBF por meio da intervenção

técnica do profissional responsável pelo PAIF na Unidade de atendimento, desde a

acolhida até o acompanhamento no Sistema de Condicionalidade do PBF – SICON,

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perpassando a demanda de visitas domiciliares, entrevista com as famílias e o

trabalho com grupos.

As famílias que se encontram em descumprimento de condicionalidades do

PBF são as prioritárias ao atendimento do PAIF, pois além da constatação da

pobreza ou miséria mediante o recebimento da transferência de renda, estão com

outras vulnerabilidades instaladas referentes à saúde ou à educação. Assim, a

intervenção profissional deve acontecer para que a família seja beneficiada e

consiga superar suas vulnerabilidades, ele não deve somente ficar esperando que

esta família o procure.

Logo, este trabalho realiza-se de maneira intersetorial com outras políticas a

fim de garantir os mínimos sociais, o provimento de condições para atender à

sociedade e à universalização dos direitos sociais básicos. Essa forma de fazer a

assistência social permite uma visão mais complexa acerca das situações de

pobreza, concede um sentido dinâmico às desigualdades e possibilita uma

explicação menos simplista da realidade social.

Portanto, a família pobre que vive situação de precariedade em relação a

seus direitos, inclusive ao direito de poder escolher uma forma de viver em que haja

melhorias e transformações em sua realidade socioeconômica, necessita do

desenvolvimento de suas capabilidades.

Para Pinzani e Rego (2015), a referência às capabilidades se dá por entendê-

las como as capacidades e habilidades desenvolvidas através da sociedade, ao

indicarem o êxito de uma política pública conforme o cidadão exerce a partir delas

suas transformações, já que são desenvolvidas de acordo com a realidade do

território. Ressalta-se também que dizem respeito aos ganhos subjetivos da

população.

Dessa forma, a capacidade de voz dos pobres só poderá ser exercida na

medida em que tenham mais acesso aos seus direitos e ao exercício de seus

deveres no campo da cidadania e na medida em que haja representatividade social,

ao efetivar-se sua inclusão social. Ou seja, a Inclusão Social está ligada à noção de

cidadania plena e à emancipação, conforme os sujeitos são incluídos ou excluídos

por terem ou não bens, por terem ou não direitos, sendo exercida na esfera política

e do poder comunicativo.

Partindo desse princípio, destaca-se a abordagem da solidariedade social

com o envolvimento de todos os segmentos da sociedade. Entretanto, todas as

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ações de Inclusão Social requerem uma gestão econômica, mais concretamente,

uma política social (SILVA, 2011).

Nessa perspectiva, o Programa Bolsa Família tem se consolidado e tem sido

reconhecido como o principal responsável pela mudança de situação social de

muitas famílias por preconizar o acompanhamento da família nas áreas da saúde e

da educação.

2.2 A TRANSFERÊNCIA DE RENDA CONDICIONADA

A consolidação do Programa Bolsa Família como um responsável da

mudança social dá-se por contribuir com o combate à pobreza e à desigualdade

social, permitindo que as famílias deixem a extrema pobreza, com efetivo acesso a

direitos básicos e a oportunidades de trabalho e de empreendedorismo.

A gestão do Programa Bolsa Família é descentralizada, ou seja, tanto a

União, quanto os estados, o Distrito Federal e os municípios têm atribuições em sua

execução. Desde sua criação em janeiro de 2004 pelo então Presidente da

República Luís Inácio Lula da Silva, sua execução é realizada pelo Ministério do

Desenvolvimento Social e de Combate à Fome, atualmente Ministério do

Desenvolvimento Social e Agrário, com execução dos pagamentos pela Caixa

Econômica Federal.

Já na instituição do Programa pela Lei no 10.836, o “Art. 1o Fica criado, no

âmbito da Presidência da República, o Programa Bolsa Família, destinado às ações

de transferência de renda com condicionalidades.” Dessa forma, o PBF caracteriza-

se pelo complemento da renda como pretensão de um alívio mais imediato em

relação à miséria e pobreza, garantia de direitos e à inclusão social por meio das

condicionalidades, e articulação com outras ações visto que é integrado com

politicas públicas diversas a fim de garantir o fortalecimento dos grupos familiares e

a superação das vulnerabilidades.

Ao tratar das condicionalidades, reitera-se que elas apenas reforçam

garantias de direitos básicos já previstos em lei, assim como seu descumprimento

não deve ter caráter punitivo às famílias e sim na perspectiva de inclusão social, de

aumentar o nível de consciência de suas próprias possibilidades sociais.

As condicionalidades da saúde referem-se ao acompanhamento de

crescimento e calendário de vacinação das crianças e adolescentes. As crianças

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devem passar por pesagem no posto de saúde ao qual a família se referencia pelo

menos duas vezes ao ano, uma em cada semestre, as vacinas devem estar em dia

conforme as disposições do SUS. A mulher desta família deve realizar o exame

preventivo uma vez ao ano, de forma geral, mulheres, crianças e adolescentes são

acompanhados ao menos uma vez no ano.

Em relação à assistência social, a família deve manter seus dados

atualizados junto ao Cadastro Único de dois em dois anos ou quando houver

alterações em um dos dados, como mudança de escola, de situação trabalhista, de

renda, de endereço, entre outras. Já o que se refere à educação, as crianças e

adolescentes matriculados são acompanhados conforme a frequência mensal.

Ao remeter esta discussão para o campo específico da educação é notável

que a pobreza interfere em suas diversas esferas. O aluno pobre não tem acesso a

bons materiais pedagógicos individuais, sua situação econômica não facilita o

acesso a tecnologia, sem considerar ainda as questões relacionadas a situação

nutricional, de moradia, de saúde, entre outros. Segundo Arroyo (2003), A presença incômoda dos coletivos empobrecidos no sistema escolar repolitiza os currículos e a docência, que são pressionados a se repensar e se repolitizar com base nas formas reais e históricas de viver ou mal-viver a infância. Imaginários românticos da infância se tornaram imaginários românticos da pedagogia e da docência, da função social das escolas e dos currículos (ARROYO, 2003, p.90)

Nestes termos, evidencia-se que muitas vezes as práticas pedagógicas

encaram a pobreza pela perspectiva moralizante, ao caracterizá-la pela carência

intelectual e moral. Assim, o sistema educacional deveria suprir carências relativas a

conhecimento e valores e não a bens materiais. A discussão dos fatores intrínsecos

ao cotidiano escolar dos pobres perpassa pelo questionamento dos currículos,

enquanto guias da prática pedagógica.

Ainda acerca de como a educação poderia ser um fator determinante para a

superação da pobreza, Lázaro (2014) coloca que “Tomar consciência das condições

que produzem e reproduzem a pobreza, conhecer sua complexidade e as

implicações para o conjunto da vida em sociedade é uma forma inicial para que

pobres e não pobres possam atuar na superação da pobreza”.

Na perspectiva da superação da miséria por intermédio do Programa Bolsa

Família busca-se analisar e, se possível, constatar alguns aspectos relevantes na

vida de algumas famílias beneficiárias do Programa e participantes do PAIF/CRAS

Zé Pereira, bem como perceber fatores relevantes à exclusão/inclusão social.

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3 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA E ANÁLISE DOS DADOS

O intuito de analisar fatores relevantes à exclusão social e à superação da

pobreza decorreram do trabalho direto com a Política Nacional de Assistência

Social, com famílias e sujeitos marginalizados de todo o processo de conquistas

sociais. A suposição que o Programa Bolsa Família faz parte apenas de um início de

melhora de vida nas famílias com vulnerabilidades decorrentes da pobreza por

garantir a permanência de crianças e adolescentes, e não a melhoria na oferta de

serviços básicos, nem a melhoria das condições da educação brasileira. Como

Pochmann (2003) afirma A reversão da situação atual de forte exclusão social é possível, urgente e necessária. Tecnicamente é realizável. Precisa, no entanto, da superação de dois grandes problemas de difícil resolução. De um lado, o problema da conformação de um novo padrão de financiamento capaz de alavancar o crescimento econômico sustentado... De outro lado, o problema da construção de uma verdadeira estratégia nacional de inclusão social, portadora de novos mecanismos institucionais e de gestão pública, capaz de superar o atual padrão de políticas sociais e do trabalho fundado na setorialização das ações, na desarticulação dos programas, na focalização de clientelas e na falta de integração operacional (POCHMANN, 2003, p. 4).

A partir desses questionamentos buscou-se realizar uma análise um pouco

mais aprofundada com famílias pertencentes ao serviço de Proteção e Atendimento

Integral às Famílias – PAIF na Unidade de trabalho, num dos 19 (dezenove) CRAS

de Campo Grande – MS.

A análise de dados do Cadastro Único em Campo Grande evidencia que, em

junho de 2015, haviam 123.272 famílias registradas, sendo 27.162 famílias

beneficiárias do Programa Bolsa Família (11,03 % da população do município),

conforme dados do Boletim do MDS (2015), através dos relatórios de informações

sociais disponível na SAGI – Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação.

Enquanto, estes foram os dados disponibilizados pelo Boletim do MDS em

2015; para o Censo do IBGE de 2010 14.934 dos residentes no município

encontravam-se em situação de extrema pobreza (com renda domiciliar per capita

abaixo de R$ 70,00), ou seja, 1,9% da população municipal vivia nesta situação.

Segundo o Censo Demográfico 2000 e Pesquisa de Orçamentos Familiares -

POF 2002/2003 – IBGE os dados relativos à pobreza de Campo Grande, no Mato

Grosso do Sul, com base no índice Gini percebe-se que o índice de desigualdade

social é relevante. Henriques (2003, p.64) aponta que “é fundamental reconhecer a

desigualdade como principal fator explicativo do excessivo nível de pobreza no

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Brasil”. Ele ainda considera necessária a superação da desigualdade educacional, “a

enorme heterogeneidade entre os níveis de escolaridade dos indivíduos representa

a principal fonte de desigualdade salarial brasileira” (HENRIQUES, 2003, p.67)

Neste sentido, em Campo Grande, conforme o Boletim do MDS (2015),

através dos relatórios de informações sociais, 91,52 % das crianças e jovens de 6 a 17 anos do Bolsa Família têm acompanhamento de frequência escolar. A média nacional é de 91,67 %. Na área da saúde, o acompanhamento chega a 76,45 % das famílias com perfil, ou seja, aquelas com crianças de até 7 anos e/ou com gestantes. A média nacional é de 75,25 % (BRASIL, 2015).

Nesse contexto municipal insere-se o CRAS Zé Pereira com suas 65

(sessenta e cinco) famílias em acompanhamento PAIF, conforme dados

disponibilizados pela coordenação a partir do Relatório Mensal de Atendimentos

referente ao mês de maio/2016. Por isso, realizou-se questionário com 13 (treze)

famílias, 20% das acompanhadas pelo PAIF do CRAS Zé Pereira em Campo Grande

– MS, por este número representar 20% do total de famílias acompanhadas e se

consolidar como uma porcentagem significativa.

Diante dessas considerações e da perpetuação da pobreza nas famílias

interessou-se em abordar as vulnerabilidades vividas e vencidas, ou não, por

famílias beneficiárias de transferência de renda por intermédio do governo federal,

portanto o objetivo principal dessa pesquisa foi identificar os efeitos do Programa

Bolsa Família na redução da pobreza e da desigualdade social.

Na primeira parte das entrevistas buscou-se analisar o perfil do entrevistado,

geralmente o responsável familiar constante no Cadastro Único e responsável pelo

saque do benefício recebido pela família. Dados como faixa etária, gênero,

ocupação e cor foram questionados. Na segunda parte, optou-se por verificar

questões referentes à composição familiar e como se caracteriza o imóvel ocupado

pela família, dados pertinentes à classe econômica também foram coletados

conforme definições do Critério Brasil. Somente na terceira e última parte das

entrevistas que o entrevistado foi questionado quanto às questões referentes ao

Programa Bolsa Família em si, tais como valor, condicionalidades, com o que é

gasto, qual a perspectiva da família em relação ao benefício.

No Boletim do MDS (BRASIL, 2015) sobre a extrema pobreza há a

caracterização da população extremamente pobre por gênero (54,1% de mulheres

extremamente pobres), em todos os questionários realizados, as famílias

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enquadraram-se nesse quesito, nenhum dos questionários apontou renda superior a

1(um) salário mínimo e somente uma das famílias tem como responsável familiar um

homem.

Acerca dos dados de cor/raça, nenhum entrevistado declarou-se negro

mesmo diante dos índices do Boletim MDS em que 56,2% dos responsáveis

familiares de famílias extremamente pobres se declararam negros; a maioria

identificou-se como “parda”, somente uma “branca”; nos lares entrevistados, as

mulheres não tem companheiros(as).

Os dados referentes a emprego, mostraram que as mulheres não tem

ocupação e nenhuma família entrevistada tem membro vinculado ao mercado

formal. Esses também são os indicativos apontados pelo IBGE (2014) A população feminina teve uma redução no nível de desocupação, no período, um pouco maior que a masculina, mas elas representam ainda o maior contingente de desocupados (3,7 milhões) e registraram a maior taxa de desocupação (8,3%). (IBGE, 2014, p. 127)

Ainda sobre este tema Jannuzi e Pinto (2013) apontam que as beneficiárias

do Programa Bolsa Família “apresentam menor taxa de ocupação que as não

beneficiárias, além de estarem sujeitas a risco maior de desemprego e levem mais

tempo para conseguir trabalho” (JANNUZI e PINTO, 2013, p.188).

As questões levantadas sobre o domicílio mostraram que o número médio de

moradores é de 4,4, enquanto que o IBGE (2014, p.172) aponta que o adensamento

médio no Brasil é de 3,1, o que demonstra que essas famílias estão com número de

moradores bem acima do previsto.

Na perspectiva das classes sociais, utilizou-se os padrões da ABEP –

Associação Brasileira de Empresas de Pesquisas (2010) que referem à classe

econômica, e não social, por considerar uma divisão de mercado, e não de pessoas.

Os critérios levam em conta dados acerca de eletrodomésticos, de renda bruta

familiar e de escolaridade do chefe de família, conforme descrito na sequência.

As famílias entrevistadas obtiveram pouca pontuação no quesito de

escolaridade visto que os chefes de famílias têm no máximo Ensino Fundamental II

completo ou Ensino Médio incompleto, somente em uma família. A pontuação

também não foi significativa nos itens referentes a quantidade de eletrodomésticos e

a renda bruta familiar. Portanto, percebeu-se que as famílias estão todas nas duas

últimas classificações sociais (D/E) devido a soma dos critérios.

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Nas informações sobre a renda dessas famílias foi observado que é

proveniente de benefícios sociais como o BPC – Beneficio de Prestação Continuada

e pela transferência. Quanto a isso o IBGE (2014) aponta A crescente importância dos programas focalizados de transferências de renda na composição do rendimento familiar das famílias com menores rendimentos pode ser observada no Gráfico 5.4. O rendimento familiar é subdividido em três tipos de origens: trabalho, aposentadoria e pensão e outras fontes. Nestas últimas, incluem-se as transferências de programas sociais, aplicações financeiras, rendimentos de alugueis, bônus, etc., divulgadas de forma agregada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD por motivos de precisão estatística. Sendo assim, ao considerar apenas as famílias com menores rendimentos (até ½ salário mínimo), pode-se supor, dados os baixos rendimentos familiares, que a maior parte desses “outros rendimentos” venha de transferências governamentais, considerando ainda a ampliação da cobertura dessas transferências na última década. (IBGE, 2014, p. 154)

Quanto ao tipo do imóvel, todas as famílias residem em domicílios, uma

família paga aluguel, uma financiou o imóvel e nas demais o imóvel é próprio ou

cedido.

Quanto ao repasse do Programa Bolsa Família, nota-se que é utilizado para a

emergência do dia, para a primeira necessidade familiar não suprida por outros

rendimentos, geralmente alimentos e materiais de uso pessoal como remédios, itens

de higiene ou materiais escolares. Campello (2013, p.20), trata da autonomia da

família em ter a liberdade de usar o recurso transferido e da possibilidade de

melhoria na qualidade de vida. Ao questionar as famílias quanto à definição do

Programa, todas apontaram que sem a transferência de renda passariam privações.

Nos apontamentos referentes às condicionalidades, somente duas famílias

não souberam enunciar diretamente quais são. A respeito disso expõe-se que a

transferência de renda por meio de condicionalidades aumenta a chance de crianças

pobres se manterem nos bancos escolares (CIRENO, SILVA, PROENÇA, 2013, p.

299).

Dessa forma, a pesquisa foi relevante por ser possível a ligação entre teoria e

prática e colaborou para compreender os efeitos do Programa Bolsa Família na

redução da pobreza e da desigualdade social e percebeu-se então que além da

vulnerabilidade econômica e financeira ocorre a vulnerabilidade social recorrente em

famílias que vivenciam a pobreza. Com a pesquisa também foi possível ratificar o

papel do Programa Bolsa Família na construção de uma sociedade mais justa e que

o Programa também tem colaborado na autonomia e superação da pobreza.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A superação do atual modelo de política social e do trabalho exige uma

inovadora metodologia de ação governamental, capaz de identificar o cidadão na

sua totalidade. A partir disso, esta pesquisa buscou por meio de entrevistas com

famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família observar se há, ou não, a redução

da pobreza.

Os dados demostraram que o Programa Bolsa Família tem colaborado na

autonomia e superação da pobreza. É certo que essa afirmação não exclui todos os

desafios que o Programa ainda tem que superar, mas já demonstra um caminho

coerente e desafiador, levando em conta que todas as famílias entrevistadas

relataram os benefícios do programa.

A discussão tratada possibilitou perceber que o aumento do grau de instrução

ao longo das gerações, a garantia de renda, a possibilidade de aumento de crédito,

a utilização de serviços e a aquisição de patrimônio são fatores que contribuem

substancialmente para a possibilidade de superação da miséria/ extrema pobreza

pelas famílias.

Nota-se que o discurso acerca da meritocracia e o contexto social atual,

caracterizado pelo desemprego e pela forte exploração do trabalhador, devem ser

questionados continuamente com vistas a preconizar a superação da pobreza.

Enfim, para ocorrer de fato uma inclusão social aos que estão à margem das

conquistas sociais faz-se necessário que as politicas públicas tenham sua

centralidade nos sujeitos, a partir da valorização de seu território, de sua cultura, de

seus conhecimentos acerca da vida, ou seja, que essas políticas sejam pensadas a

partir da perspectiva de quem é seu público.

Ou seja, não adianta condicionar a transferência de renda à presença na

escola caso não se pense na escola para o pobre. Não há nada mais enriquecedor

no ambiente escolar que as próprias vivências de seus alunos e o entendimento de

que a pobreza é uma condição, não uma identidade, fruto da dinâmica social e esta

discussão deve ser promovida no ambiente escolar, fazendo da pobreza um tema a

ser abordado por toda comunidade escolar.

Assim, as políticas públicas devem voltar seus esforços à educação, pois

talvez seja o único caminho capaz de diminuir as consequências desse modo de

produção em que vivemos e que continua a sustentar poucos e a explorar muitos.

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