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1 EDUCAÇÃO AMORDAÇADA: AS UNIVERSIDADES EM MOGI DAS CRUZES, DURANTE A DITADURA MILITAR, DÉCADA DE 1970. GLAUCO RICCIELE PRADO LEMES DA CRUZ RIBEIRO 1 Resumo: As décadas de 1960 e 1970 foram primordiais na modificação do sistema de ensino superior no Brasil. O governo militar realizou inúmeras modificações nos campos da administração e didática em todas as faculdade e universidade do país. As faculdades de Mogi das Cruzes participaram incessantemente deste processo. Tanto que na década de 1970 o DOPS instaurou diversos inquéritos para investigar a prática de ações e atividades subversivas por parte de estudantes. A emergência desses conflitos revelou diferentes ideologias e reivindicações, permitindo hoje analisar aspectos de ordem política, econômica, social, cultural e educacional. Palavras-chave: Reforma Universitária; Ensino Superior; Mogi das Cruzes; DOPS. Sumário: 1. Introdução; 2. Reforma Universitária: o intervencionismo militar; 3. O ensino superior na cidade de Mogi das Cruzes; 3.1. Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) e Universidade Braz Cubas (UBC); 4. Da Universidade Repressiva a Expansão do Ensino Superior, 5. Considerações Finais; 6. Referências 1. Introdução: Os estudos preliminares em torno da Reforma Universitária e seus reflexos em Mogi das Cruzes, na década de 1960 e 1970, mostraram indícios do que poderia ser uma atuação política e ideológica ativa. Mogi das Cruzes possuía duas universidades desde a década de 1970. Neste âmbito as universidades trouxeram consigo estudantes ansiados de ideologias e propostas de mudanças. Mas instituições como o DOPS e o Ministério de Aeronáutica, estavam preparadas para coibir tais ações realizadas por estudantes na cidade. Coube às Universidades de Mogi das Cruzes rivalizar e posteriormente pacificar as ações dos estudantes sem ocorrências de violência e tortura. 1 Pesquisador e Professor de História. Estudante de Pós-Graduação Lato Sensu em Didática, Dinâmica e Gestão da Educação Superior. Universidade de Mogi das Cruzes. Email: [email protected].

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Page 1: Educação Amordaçada as Universidades em Mogi das Cruzes, durante a Ditadura Militar, década de 1970

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EDUCAÇÃO AMORDAÇADA: AS UNIVERSIDADES EM MOGI DAS CRUZES, DURANTE A DITADURA MILITAR, DÉCADA DE 1970.

GLAUCO RICCIELE PRADO LEMES DA CRUZ RIBEIRO1

Resumo: As décadas de 1960 e 1970 foram primordiais na modificação do sistema de ensino superior no Brasil. O governo militar realizou inúmeras modificações nos campos da administração e didática em todas as faculdade e universidade do país. As faculdades de Mogi das Cruzes participaram incessantemente deste processo. Tanto que na década de 1970 o DOPS instaurou diversos inquéritos para investigar a prática de ações e atividades subversivas por parte de estudantes. A emergência desses conflitos revelou diferentes ideologias e reivindicações, permitindo hoje analisar aspectos de ordem política, econômica, social, cultural e educacional. Palavras-chave: Reforma Universitária; Ensino Superior; Mogi das Cruzes; DOPS.

Sumário: 1. Introdução; 2. Reforma Universitária: o intervencionismo militar; 3. O ensino superior na cidade de Mogi das Cruzes; 3.1. Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) e Universidade Braz Cubas (UBC); 4. Da Universidade Repressiva a Expansão do Ensino Superior, 5. Considerações Finais; 6. Referências

1. Introdução: Os estudos preliminares em torno da Reforma Universitária e seus reflexos

em Mogi das Cruzes, na década de 1960 e 1970, mostraram indícios do que poderia

ser uma atuação política e ideológica ativa. Mogi das Cruzes possuía duas

universidades desde a década de 1970. Neste âmbito as universidades trouxeram

consigo estudantes ansiados de ideologias e propostas de mudanças.

Mas instituições como o DOPS e o Ministério de Aeronáutica, estavam

preparadas para coibir tais ações realizadas por estudantes na cidade. Coube às

Universidades de Mogi das Cruzes rivalizar e posteriormente pacificar as ações dos

estudantes sem ocorrências de violência e tortura.

1 Pesquisador e Professor de História. Estudante de Pós-Graduação Lato Sensu em Didática,

Dinâmica e Gestão da Educação Superior. Universidade de Mogi das Cruzes. Email: [email protected].

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2. REFORMA UNIVERSITÁRIA: O INTERVENCIONISMO MILITAR

A década de 1960 trouxe novos tempos para a sociedade brasileira, os campos

da política e educação foram os mais afetados com o advento do Governo Militar. A

organização do Ensino Superior desde 1808 está sendo articulado pelo governo e

setores sociais.

Neste década o início de uma reforma universitária deu-se com a primeira Lei

de Diretrizes de Base (LDB), assegurando igualdade entre estabelecimentos de

ensino públicos e particulares. Abandona-se a expressão "universidade livre" ou

"faculdade livre" para designar as instituições privadas de ensino superior. Mas a

proposta governamental imposta em 1968 modificaria toda a base do Ensino

Superior.

A LDB em 1961 foi a preocupação de regulamentar os mecanismos de expansão do ensino superior estabelecendo nova sistemática de três órgãos que poderiam decidir acerca da criação de novos cursos: as universidades que gozavam de autonomia; os Conselhos Estaduais de Educação e o Conselho Federal de Educação.

2

Setores como o Ministério da Educação e Cultura (MEC) perderam sua

autonomia frente às universidades, passado a vigorar como regentes decretos-leis

instituídos pela Presidência da República. Desta forma o regime militar implementou

várias mudanças no campo educacional.

Em 13 de dezembro de 1968, a ditadura militar acentuou sua face ainda mais

repressiva: decretou o Ato Institucional número 5 (AI-5), conhecido como “o golpe

dentro do golpe”. Oficializou-se o terrorismo de Estado, que prevaleceria até meados

dos anos 70, conforme segue (1968):3

I - cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função; II - suspensão do direito de votar e ser votado nas eleições sindicais; III - proibição de atividades ou manifestação de natureza política; IV - aplicação, pelo Ministério da Justiça, independentemente de apreciação pelo Poder Judiciário, das seguintes medidas: a) liberdade vigiada; b) proibição de freqüentar determinados lugares; c) domicílio determinado.

2 SAMPAIO, p, 55, 2000.

3 Trecho do Ato Institucional nº 5. Senado Federativo da República do Brasil.

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O Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas Estaduais foram

colocados temporariamente em recesso e o governo passou a ter plenos poderes

para suspender direitos políticos dos cidadãos, legislar por decretos, julgar crimes

políticos em tribunais militares, cassar mandatos eletivos, demitir ou aposentar juízes

e outros funcionários públicos etc.

Simultaneamente, generalizavam-se as prisões de oposicionistas, o uso da

tortura e do assassinato, em nome da manutenção da “segurança nacional”,

considerada indispensável para o “desenvolvimento” da economia, do que se

denominaria mais tarde “milagre brasileiro”.

A reforma universitária, depois de adquirir a consistência e as influências de um movimento social, equacionou ideais de organização da universidade. O repudio as “estruturas arcaicas di ensino superior” fez-se acompanhar por uma busca inquieta das soluções alternativas, adaptadas à melhor utilização dos recursos materiais e humanos existentes ou exploráveis e à automatização educacional e cultural da sociedade brasileira.

4

Após o duro golpe dado através do AI-5, ano posterior em 1969 no dia 3 de

fevereiro foi instituído Decreto-Lei No 477 que define infrações disciplinares

praticadas por professores, alunos de ensino público ou particulares. Assim: 5

Art 1o Comete infração disciplinar o professor, aluno, funcionário ou

empregado de estabelecimento de ensino público ou particular que: fffffffffffff I - Alicie ou incite a deflagração de movimento que tenha por finalidade a paralização de atividade escolar ou participe nesse movimento;fffffffffffffffffffff II - Atente contra pessoas ou bens, tanto em prédio ou instalações, de qualquer natureza, dentro de estabelecimentos de ensino, como fora dele;fff III - Pratique atos destinados à organização de movimentos subversivos, passeatas, desfiles ou comícios não autorizados, ou dele participe; ffffffffffffff IV - Conduza ou realiza, confeccione, imprima, tenha em depósito, distribua material subversivo de qualquer natureza; ffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffff V - Seqüestre ou mantenha em cárcere privado diretor, membro do corpo docente, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino, agente de autoridade ou aluno; fffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffff VI - Use dependência ou recinto escolar para fins de subversão ou para praticar ato contrário à moral ou à ordem pública. fffffffffffffffffffffffffffffffffffffff

Através do decreto-lei nº477 o governo militar iniciou uma ditadura incessante

nos campus das universidades, coibindo manifestações e movimentações tanto de

4 FERNANDES, p. 161, 1975.

5 Decreto-lei nº 477. Arquivo Ditadura.

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professores, alunos ou mesmo funcionários. Com este decreto a didática e a

logística utilizada nos campos tiveram de ser reformuladas.

Inúmeros estudantes, operários, intelectuais, políticos e outros oposicionistas

das mais diversas categorias foram presos, torturados, mortos ou exilados, após a

edição do AI-5. A censura foi imposta aos meios de comunicação e às

manifestações em geral. O regime militar dava fim à luta política e cultural do

período, reprimindo duramente qualquer forma de oposição. “Anos de chumbo”

viriam a suceder o “ano rebelde” de 1968.

3. O ENSINO SUPERIOR NA CIDADE MOGI DAS CRUZES

O Ensino Superior chega à pacata Mogi das Cruzes na década de 1960.

Mesmo com o pouco incentivo governamental, o germe educacional foi plantado em

1962 pelo então Padre Manoel Bezerra de Melo e o Bispo Diocesano Dom Paulo

Rolim Loureiro.

O intuito desta ação foi criar uma Escola de Ensino Fundamental que

posteriormente evoluiria em 1964 para a Faculdade de Filosofia e Letras intitulada

de Organização Mogiana de Educação e Cultura - OMEC. Em 1964, foram

instaladas as primeiras faculdades do complexo educacional que, a partir de 1973,

passou a ser a Universidade de Mogi das Cruzes (UMC).

Outra universidade de peso e tradição em Mogi das Cruzes é a Universidade

Braz Cubas que iniciou suas atividades em 1940. Inicialmente a escola abrigou um

pequeno curso preparatório. Vieram a seguir o ginásio, cursos de nível médio e

comércio.

Em 1964 a Sociedade Civil de Educação Braz Cubas decidiu orientar a

entidade para o novo campo do ensino superior. Um ano depois, o Conselho Federal

de Educação concedia autorização para o funcionamento da Faculdade de Direito

Braz Cubas. Em 1970, o Conselho Federal de Educação concedeu autorização para

a instalação da Faculdade de Arquitetura e um ano depois para a Faculdade de

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Filosofia, Ciências e Letras, com as licenciaturas de Letras, de Estudos Sociais,

além do curso de Psicologia, com bacharelado, licenciatura e formação de

psicólogo. Mais dois anos e instalava-se a Faculdade de Comunicação Social. Em

1983, o Conselho Federal de Educação aprovou a modificação da então Faculdade

Braz Cubas para Universidade.

Com o surgimento das faculdades e posteriormente universidades a cidade de

Mogi particularmente provinciana adquiri novo caráter e necessita passar por

inúmeras reformas estruturais e culturais.

Nesta década em consequência das universidades foram construídas na

cidade e em torno a Rodovia dos Trabalhadores, Estação Ferroviária “Estudantes”

(está beneficiava e facilitava a chegada de alunos para ambas as universidades,

pois logisticamente foi construída entre a UMC e a UBC) casas noturnas,

lanchonetes e repúblicas.

Jovens se mudavam para a recém cidade apelidada de “Estudantes e/ou

Universitária”, vindos das diversas localidades deste país sonhando cursar Medicina,

Direito e Arquitetura, cursos com maior demanda nas duas universidades.

Mas com a vinda de jovens a cidade adquiriu novas culturas e ideologias, que

por muitas vezes são contrárias a ordem nacional. Isto ficou evidente na década de

1970, o DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), inicia uma varredura

entre os DCEs (Diretório Central dos Estudantes) e CAs (Centros Acadêmicos) em

ambas as universidades, a fim de cessar focos iniciais de revoltas contra o Governo

e as Diretorias Acadêmicas.

Inquéritos foram instaurados contra diversos estudantes, normas coibindo

manifestações foram baixadas pelo Governo e a didática em sala utilizada pelos

educadores teve de ser revistas.

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Foto tirada pelo DOPS, através de uma janela de porta. Aluna indiciada pertence ao “Diretório Acadêmico Oscar Niemayer” (Arquitetura - UBC).

6

Um resquício que perdura até hoje nas universidades de Mogi são as

pequenas janelas de vidro nas portas das salas de aula. Este recurso foi utilizado

pelo DOPS na intenção de vistoriar e coibir professores e estudantes em caso de

propagação ideológica em sala.

3.1. UNIVERSIDADE DE MOGI DAS CRUZES (UMC) E UNIVERSIDADE BRAZ CUBAS (UBC)

Após o fortalecimento do Governo Militar e suas intervenções no campo

educacional brasileiro, ações repressivas são organizadas pelo governo

principalmente nas universidades e concomitantemente nos centros e diretórios

acadêmicos. Neste contexto Mogi das Cruzes foi duramente observada pelos olhos

do DOPS, as universidades e escolas estaduais eram alvo incessante de

investigações e ameaças policiais.

A Universidade de Mogi das Cruzes - UMC na década de 1970 foi investigada

em consequência de ações realizadas por alunos de diversos cursos, onde

manifestações em prol de “Melhores condições de ensino”, “Pela liberdade de

6 Arquivo do Estado de São Paulo. DOPS.

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organização” e “Manifestação aos trabalhadores e estudantes”, “Pela readmissão de

todos os professores demitidos” e “Pela matricula imediata de todos os alunos

expulsos”7, eram incessantemente feitas. As reivindicações citadas foram

distribuídas em todo o campus em conseqüência da expulsão e demissão de alunos

e professores, que na ocasião realizaram reuniões fora dos horários determinados

pela delegacia de policia de Mogi das Cruzes, conforme o decreto-lei nº477

estipulava.

Cartaz produzido pelo Centro Acadêmico da UMC.8

Outro caso ligado à UMC diz respeito a uma palestra do então jornalista

Fernando Moraes na manhã de sábado dia 26 de agosto de 1978, organizada pelos

discentes. Na manhã do dia 26 a UMC cancelou suas aulas em todo o campus e

enviou uma carta ao delegado de policia de Mogi das Cruzes, alertando o

cancelamento da palestra nas dependências da universidade por motivos

ideológicos.

Fernando Moraes é conhecido internacionalmente por suas produções e

pesquisas que posteriormente virariam livros e filmes. Entre as produções destacam-

7Idem.

8 Arquivo do Estado de São Paulo. DOPS.

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se “Olga” e “A Ilha” todas trazendo à luz ideologia comunista, que para o governo

militar se enquadrava como ato subversivo.

Na ocasião do fato o jornal local “O Diário de Mogi” fez ampla cobertura dos

fatos em torno das universidades na cidade, em vários inquéritos o dito jornal é

citado pelas autoridades do DOPS como apoiador e subversivo.

O Jornal “O Diário de Mogi das Cruzes”, aparentemente influenciado pelo D.A.O.N., vem dando uma cobertura quase diária ao movimento, procurando abordar e divulgar o assunto de forma visivelmente tendenciosa e parcial.

9

Além da palestra citada a UMC enviou às autoridades locais a data e o local da

reunião do Centro Acadêmico, que na ocasião distribuiria aos filiados uma

quantidade do jornal “O Gatilho”, onde textos e charges traziam figuras como o

“reitor”, “professores” e “políticos”, apoiadores do sistema vigente.

Documento expedido pelo Delegado de Polícia, pedindo que uma “Ronda” acompanhasse toda a reunião e recolhesse qualquer tipo de material que fosse distribuído.

10

9 Arquivo do Estado de São Paulo. DOPS.

10 Idem.

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O DOPS não deixou de observar também a Universidade Braz Cubas – UBC,

onde as ações realizadas eram mais calorosas. O “Diretório Acadêmico Oscar

Niemayer” era o centro onde as mentes manipulavam as próximas ações a serem

realizadas. Na UBC além do DOPS investigar as ações o Ministério da Aeronáutica

enviou investigadores para Mogi. Segundo a Aeronáutica:

A Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Federação das Faculdades Braz Cubas de Mogi das Cruzes, há muito estariam tentando articular movimentos para criarem uma célula de base visando uma integração dos demais estudantes nos movimentos das Grandes Universidades da área da Grande São Paulo (USP, PUC, ENG e S. Carlos).

11

Com a entrada da Aeronáutica nas investigações a UBC sofre dura repressão e

dentre as imposições feitas estão a demissão de professores, expulsão de alunos e

a extinção dos Diretórios e Centros Acadêmicos. Manifestações durante 1978 era

realizada semanalmente, o clima de protesto estava no ar e nas mentes dos jovens

estudantes.

Documento Confidencial instaurado contra o Diretório Acadêmico da UBC.12

11

Arquivo do Estado de São Paulo. DOPS. 12

Idem.

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Com a chegada do 2º semestre de 1978, alunos e professores tornam-se uma

única voz perante a repressão realizada pela instituição. Em julho grande parte do

corpo docente dos cursos de arquitetura e urbanismo foi demitido em virtude do

apoio às manifestações. Com esta atitude drástica desencadeou uma invasão em

massa dos estudantes em todo o campus, principalmente na reitoria e tesouraria.

Barracas, colchões e sacos de dormir estavam por toda a parte. Pichações

criticando professores apoiadores da universidade estavam escancaradas em

portas, paredes e lousas. Para a universidade iniciar o 2º semestre no mês de

agosto, a única forma de apaziguar toda esta confusão seria re-contratar todos os

professores demitidos e re-matricular alunos expulsos. E esta foi a forma que a UBC

encontrou, atendendo às reivindicações em prol dos discentes.

Curiosamente entre os casos citados em nenhum deles houve invasão policial

ou mesmo feridos e mortos. O único caso de morte envolvendo discentes das

universidades de Mogi das Cruzes ocorreu em 6 de março de 1980 em

consequência de um “Trote”, onde veteranos espancaram o jovem Carlos Alberto de

Souza de 20 anos nas proximidades da Universidade de Mogi das Cruzes – UMC.

Carlos Alberto ficou internado no hospital Santa Marcelina e faleceu em 11 de março

em consequência de um traumatismo craniano. Este caso ficou conhecido

nacionalmente pela brutalidade praticada por estudantes durante o “Trote”.

4. DA UNIVERSIDADE REPRESSIVA A EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR

O Ensino Superior em terras brasileiras sempre passou por inúmeras deficiências

e inicialmente privilegiou apenas as camadas mais altas da sociedade. A partir da

década de 1930 o ensino superior se consolidou com o surgimento das

universidades estaduais e federais, desvinculando o ensino superior das poucas

instituições privadas deixando-as sob a mantenedoras católicas.

Nesse contexto de expansão da rede pública do ensino superior, a criação da primeira Pontifícia Universidade Católica, em 1944, no Rio de Janeiro, inaugurando uma série de outras católicas que viriam a ser criadas no período, não foi suficiente para aumentar a fatia de participação das matriculas privadas no sistema. O impacto das universidades católicas no

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sistema tem, acima de tudo, caráter simbólico: coroa a quebra do Estado/Igreja na história do ensino superior Brasil

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Na década de 1960 havia um déficit de universidade no Brasil, era preciso

ampliar todas as áreas de ensino, pois na década seguinte a demanda de mão de

obra aumenta com o chamado “milagre econômico” (grifo nosso), mas tal fato não

ocorreu, prejudicando futuras mentes e a evolução do país.

O número de estudantes matriculados em 1960 era de aproximadamente

93.20014, número extremamente baixo perante outros países da América Latina

como a Argentina.

Mas era preciso retomar as propostas de expansão do Ensino Superior

deixadas para traz na década de 1960. Este fato foi repensado durante o 1º mandato

da gestão do Presidente Luis Inácio Lula da Silva, após 35 anos o projeto foi

implantado. O Governo Lula institucionalizou o “Programa Universidade para Todos -

Prouni”, com a finalidade de concessão de bolsas de estudo integrais e parciais em

cursos de graduação em instituições privadas de educação superior. Criado pelo

Governo Federal em 2005, por meio da Lei nº 11.096, em 13 de janeiro.

Através desta iniciativa o Brasil teve um saldo no número de universitários de

93.200 para um total de 4.880.38015. Esta expansão proporciona a oportunidade a

diversos brasileiros de cursarem uma graduação sem custos ou parcialmente. Mas o

Prouni só pode ser institucionalizado graças a diversas lutas travadas por

estudantes desde a década de 1960 e posteriormente repensadas nas décadas de

1990 e 2000.

Estudantes dos anos 60 e 70 hoje professores em universidades de nosso

país, não desejam repetir ações passadas em épocas obscuras, mas trazer uma

nova face à educação superior, onde a expansão do ensino privilegie grandes

nichos da sociedade para que o país possa evoluir tecnicamente e colha hoje frutos

de um país em destaque mundial.

13

SAMPAIO, p. 48. 2000. 14

SAMPAIO, p. 46. 2000. 15

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa possibilitou vir a público, casos desconhecidos e confidenciais

disponíveis no Arquivo do Estado de São Paulo na divisão do Departamento de

Ordem Pública e Social. Ao analisar os casos ocorridos e o cotidiano turbulento nas

Universidades de Mogi das Cruzes, percebe-se que houve uma movimentação

estudantil em prol de uma Universidade livre de decretos governamentais, onde a

pesquisa e o envolvimento no cotidiano do campus estejam caminhando em

conjunto com as propostas dos Diretórios e Centros Acadêmicos.

É perceptível que as lutas ocorridas em décadas passadas desencadearam no

processo de evolução das Universidades no Brasil uma expansão onde camadas

sociais se misturam nos campus de universidade, fato positivo perante o

crescimento de uma nação.

Mesmo delimitado pelo espaço de tempo, esperamos que este estudo tenha

contribuído para a ampliação e conhecimento do período onde as universidades

repreendidas pelo regime militar articulam uma implantar a expansão de ensino que

só pode ser institucionalizada após o ano 2000, a partir de consultas populares onde

as políticas públicas educacionais puderam ser revistas.

6. REFERÊNCIAS

ARQUIVO do Estado de São Paulo. Divisão DOPS. ATO Institucional nº5. Disponível: http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaNormas.action?numero=5&tipo_norma=AIT&data=19681213&link=s. Acesso em 26 JUN. 2011.

DECRETO-LEI No 477. Disponível: http://www.acervoditadura.rs.gov.br/legislacao_14.htm. Acesso em 26 JUN.2011.

FERNANDES, Florestan. Universidade Brasileira: reforma ou revolução. São Paulo, Ed. Alfa-Omega, 1975. SAMPAIO, Helena Maria Sant’Ana. O Ensino Superior no Brasil: o setor privado. São Paulo, Ed. FAPESP, 2000.