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UM GUIA DE ASAS DA NOITE AOS

DRAGÕES DE PYRRHIA

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DRAGÕES DE PYRRHIA

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O REINO ESCONDIDO

TUI T. SUTHERLAND

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MONSTROS DA fLORESTA TROPICAL

PARTE 1

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Chovia havia cinco dias.Oficialmente, Glória detestava isso.Ela também não gostava dos comentários dos outros

dragonetes sobre como, “na qualidade de uma Asas da Chuva”, ela deveria adorar um tempo daqueles.

Ela quase certamente não adorava esse tempo. Nas cavernas sob as montanhas, os dragonetes nunca tinham sido atingidos pela chuva. Aquele temporal parecia anormal, incontrolável, terrível e desagradavelmente úmido.

“Não quero saber se um ‘verdadeiro’ Asas da Chuva deve gostar disso”, ela pensou, enquanto gotículas escorriam em seu focinho, infiltravam-se nas escamas e encharcavam-lhe as asas, até se arrasta-rem pesadamente atrás dela. “Se gostarem, há algo errado com eles. Nenhum dragão sensato deveria gostar de um tempo que dificulta o voo dessa maneira.”

“Três luas, por favor, deixem que eles sejam dragões sensatos. Deixem que não sejam parecidos com os das histórias.”

Todo mundo dizia que Asas da Chuva eram inúteis e preguiço-sos. Mas a tribo vivia no interior da floresta tropical, onde ninguém

CAPÍTULO 1

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a via, portanto todos deveriam estar enganados. Glória queria mui-to que estivessem enganados.

Ela sacudiu o corpo todo e olhou para o céu encoberto por nuvens. Ela queria mais sol. Sentira falta do sol a vida toda e só o conheceu quando ele atingiu suas escamas no dia em que deixou as cavernas. Mais longos dias ensolarados seriam ótimos para ela.

Mas, em vez do sol, tinha aquilo. Chuva. Lama. Mais chuva. Mais lama.

E um lento resmungo choroso e molhado de um Asas do Mar ferido.

– Podemos parar? – Liame arfou. – Preciso descansar – ele an-dou pela lama até um ponto um pouco mais seco sob uma árvore.

Glória semicerrou os olhos para o dragão azul-esverdeado quando ele desabou no chão. Os outros dragonetes também pa-raram, entreolhando-se. Eles estavam andando em vez de voar na-quele dia, porque Liame disse que era melhor para seu ferimento. E, mesmo assim, ainda pedia que parassem a praticamente cada dez passos. Glória estava começando a suspeitar que ele realmente não queria que chegassem à floresta tropical.

“Mas por quê?”, ela se perguntou. “Será que está escondendo algo? Terá algo a ver com meus pais?”

Como o guardião que a tinha roubado da tribo Asas da Chuva, para começar, Liame deveria ter sido uma fonte de conhecimento útil sobre o lugar de onde tinha vindo. Em vez disso, ele ficava to-do balbuciante e esquecido sempre que lhe perguntavam sobre os dragões da floresta tropical.

Lamur andou até Liame e observou o ferimento. Eles o tinham envolvido com algas marinhas embebidas em água do mar enquan-to puderam, mas agora estavam muito longe da água para conseguir mais. O arranhão envenenado perto da cauda de Liame tinha se

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O reino escondido

transformado em um corte feio cercado por escamas escurecidas, e a cor preta parecia se espalhar mais a cada dia. Nenhum deles tinha ideia do que fazer para combater o veneno de Asas da Areia.

“Isso sem mencionar que não temos ideia do motivo de Bolha querer Liame morto. Quer dizer, acho que ele é horrível, mas ela não o conhece.” Glória olhou para Voador, o Asas da Noite negro que era o dragonete mais inteligente que conhecia –, e provavel-mente ainda seria mesmo se conhecesse mais que quatro dragões. Ela se perguntou se ele teria alguma teoria sobre Bolha e Liame.

Lamur arrastou a cauda na lama, parecendo preocupado. – Espero que os Asas da Chuva possam ajudá-lo – ele disse. –

Não é exatamente o mesmo veneno, mas talvez eles tenham mais ideias do que nós.

Glória sacudiu as asas e desviou o olhar. Ela não se importava. Os outros dragonetes sentiam uma espécie de lealdade insensata em relação ao antigo guardião, como se fosse responsabilidade de-les salvá-lo.

Ela era a única que parecia lembrar como ele estivera disposto a não se envolver e deixar que alguém a matasse.

Roubar seu ovo também fora ideia dele. A profecia exigia um Asas do Céu, por isso, quando as Garras perderam o ovo de Asas do Céu antes de eclodir, Liame decidiu substituí-lo por um dos Asas da Chuva. Foi culpa dele Glória ter sido obrigada a crescer debaixo da montanha, longe de seu lar e sua família, aprendendo sobre uma profecia em que nem havia lugar para ela.

Era fácil para os outros. Não havia dúvidas quanto ao seu des-tino. Mas Glória... se ela deveria salvar o mundo, então por que a profecia não tinha pedido um Asas da Chuva? E, se ela não era necessária para esse destino grandioso, então qual era o sentido de sua vida, afinal?

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Talvez fosse tudo um grande engano, mas, quando esses pensa-mentos passavam por sua mente, ela acabava tendo sonhos violen-tos sobre estraçalhar Liame. Assim, era melhor não pensar nisso. O destino teria que encontrar seu caminho.

Naquele momento, ela estava indo para casa.De repente, o galho acima de Glória se inclinou e derrubou

em sua cabeça água o bastante para encher um lago. Ela saltou para trás com um sibilo e olhou para o alto da árvore.

– Sshhh – Tsunami disse lá de cima. Ela saltou para o chão e es-piou em volta, para o pântano sombrio. – Um par de Asas da Lama está vindo nesta direção, mas eles nunca vão nos ver com este tempo.

Uma névoa espessa e cinzenta pendia sobre a lama, envolven-do as árvores raquíticas como fumaça ao redor dos chifres de um dragão. Era difícil saber que horas eram. O céu estava cinzento de todos os lados e a chuva caía implacável. Glória concordou com Tsunami; um dragão mal podia ver as pontas das próprias asas na-quele tempo, quanto mais outro dragão.

– Devemos continuar escondidos – Voador disse ansioso. – Estamos só a um dia de voo do palácio da Rainha Logópode. Se formos pegos...

– Mais prisão – Lamur falou com um suspiro.Cada rainha dragão que tinham conhecido até então parecia

determinada a manter os dragonetes presos sob suas garras. Eles tinham escapado da prisão da Rainha Escarlate no Reino Celeste só por causa do veneno de Glória, uma arma secreta que nem ela sabia que tinha até precisar usá-la.

Ela tocou as presas com a língua bipartida e olhou para o céu. Eles ainda não tinham ideia se a Rainha Escarlate tinha sobrevivido ao ataque de Glória. Com a sorte que tinham, Glória tinha quase cer-teza de que Escarlate estava viva e planejando uma vingança terrível.

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O reino escondido

Depois da fuga, eles procuraram segurança com a mãe de Tsunami, a Rainha Coral, dos Asas do Mar. Naturalmente, Coral tinha decidido trancá-los também. Glória não ficou surpresa. Não se podia confiar nem na família quando se tratava da profecia. Todos tinham seus pró-prios planos sobre como a guerra deveria terminar.

Assim, se a Rainha Logópode os encontrasse em seu território, provavelmente não lhes ofereceria chá antes de mandá-los seguir seu caminho.

A corte da rainha dos Asas da Lama ficava ao lado de um gran-de lago, na extremidade sul do Reino Lamacento. Glória lembra-va-se do mapa de Pyrrhia e teve um calafrio quando algo lhe ocor-reu. Se Voador estivesse certo, e eles estivessem somente a um dia de voo de lá, então também deveriam estar somente a um dia de voo da floresta tropical. Da floresta tropical... e da tribo de Glória.

“E então vou me sentir em casa. Os Asas da Chuva não vão se importar por eu não fazer parte de alguma profecia.”

– Glória – Tsunami repreendeu. – Eles podem ver escamas ama-relas brilhantes. Volte a se camuflar.

Glória olhou para baixo e viu os pontinhos dourados que apa-reciam em todas as escamas. Até onde sabia, aquilo significava ale-gria ou empolgação, já que as tinha visto raramente em sua vida. Ela ficava louca quando suas escamas trocavam de cor à revelia de sua vontade, e elas faziam isso com muita frequência. Glória tinha que abafar todas as emoções fortes antes que elas explodissem em todo o seu corpo.

Ela se concentrou no pingar constante do pântano ao redor, olhando para a lama espessa e marrom se espremendo entre as suas garras. Ela imaginou o nevoeiro girando em volta de suas asas, deslizando para as fendas de suas escamas e se espalhando como nuvens cinzentas rolando pelo céu.

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– Eeeeeee ela se foi – Tsunami disse.– Ela ainda está lá – Solana piou. Ela chegou mais perto e se

chocou com uma das asas de Glória. – Viu? Bem ali. – Ela esticou uma garra para tocar Glória, mas esta se afastou para fora de alcance. Solana procurou no ar por um momento e então desistiu.

A pequena Asas da Areia tinha estado estranhamente silencio-sa nos últimos dias. Glória imaginou que ela também detestava a chuva. Os dragões do deserto eram destinados a viver sob calor escaldante, sol ardente e dias intermináveis de céu azul. Mesmo uma pequena Asas da Areia de aspecto estranho como Solana ainda tinha os instintos de sua tribo.

Na verdade, Lamur era o único feliz com o tempo. Somente um Asas da Lama poderia apreciar o esguichar e esmagar sob as garras quando passava pelo pântano.

Voador virou a cabeça de repente.– Acho que sinto o cheiro de alguém se aproximando – sussur-

rou ele, estremecendo dos chifres até as garras.– Não entre em pânico – Tsunami sussurrou de volta. – Lamur,

você pode esconder Solana e eu. Voador, encontre uma sombra e faça aquela sua coisa de Asas da Noite petrificada invisível. Glória, você pode esconder Liame.

– Não, obrigada – Glória disse imediatamente. Ela não preten-dia chegar perto de Liame, ainda mais para salvar a vida dele. – Fico com Solana. – Ela não gostava de tocar outros dragões, mas Solana era melhor do que Liame.

– Mas... – Tsunami começou, batendo os pés.Glória a ignorou. Ela ergueu uma das asas e puxou a drago-

nete dourada para junto do corpo. Quando baixou a asa de novo, Solana estava escondida pela camuflagem marrom acinzentada de Glória.

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O reino escondido

– Nossa – Lamur disse. – Isso foi muito estranho. É como se Solana tivesse sido engolida pelo nevoeiro. – Seu estômago roncou terrivelmente ao ouvir a palavra engolida, e o Asas da Lama mexeu os grandes pés constrangido.

Voador espiou para o lugar onde Solana estivera, enterrando as garras na lama.

– Ela está bem – Glória afirmou. – Obedeça às ordens como um bom dragonete, ou Tsunami vai jogá-lo para as enguias.

Tsunami franziu o cenho para ela, mas Voador se virou e en-controu uma árvore escura e oca onde suas escamas se confundi-ram nas sombras.

Agora Glória também podia ouvir: o stomp-squish-stomp-squish das garras enormes marchando pelo pântano na direção deles. O calor das escamas de Solana transmitia uma sensação desagradável.

Liame não tinha se movido enquanto falavam. Ele estava enro-dilhado sobre as raízes da árvore, com o focinho pousado sobre a cauda, parecendo infeliz.

Lamur conduziu Tsunami para perto de Liame e estendeu as asas cor de lama para esconder ambos. Não era uma solução perfei-ta, já que a cauda azul aparecia de um lado e a ponta das asas azul--esverdeadas do outro. Mas, naquele nevoeiro, eles pareciam mais como um monte borbulhante de lama, o que deveria resolver.

Stomp. Squish. Stomp. Squish.– Não gosto dessa patrulha – uma voz profunda grunhiu.

Glória quase deu um pulo. O som parecia vir de duas árvores per-to dali. – Se quer minha opinião, perto demais daquela floresta tropical assustadora.

– Ela não é assombrada de verdade – disse uma segunda voz. – Você sabe que a única coisa que vive aqui são pássaros e Asas da Chuva preguiçosos.

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Anos aprendendo autocontrole evitaram que Glória estreme-cesse. Ela tinha ouvido “Asas da Chuva preguiçosos” dos guardiões durante muito tempo, debaixo da montanha. Mas ouvir o comen-tário de um estranho era uma estocada extra no olho.

– Se isso fosse verdade – disse a primeira voz –, então Sua Majestade nos deixaria caçar lá. Mas ela sabe que não é seguro. E você já ouviu os barulhos à noite. Você vai dizer que são os Asas da Chuva que estão gritando desse jeito?

Gritando? Sob a asa de Glória, Solana virou um pouco a cabeça, como se estivesse tentando ouvir melhor.

– Sem falar dos corpos – a primeira voz murmurou.– Isso não é uma espécie de monstro da floresta tropical – disse

o segundo guarda, mas sua voz fraquejou, mostrando hesitação. – Isso é a guerra. Algum tipo de ataques de guerrilha para nos assustar.

– Até aqui? Por que os Asas do Mar ou os Asas do Gelo viriam até aqui para matar um ou dois Asas da Lama? Há batalhas mais importantes acontecendo em outros lugares.

– Vamos andar mais depressa – a segunda voz disse, inquieta. – Eles deveriam nos deixar patrulhar em três ou quatro, e não em pares.

– Pois é. – Stomp-squish-stomp-squish. – Então, o que você acha da situação dos Asas do Céu? Você está a favor de Rubi ou acha que...

Glória se esforçou para ouvir, mas as vozes desapareceram na névoa quando os dois soldados Asas da Lama andaram pesadamente para longe. Se ao menos pudesse segui-los... Ela queria muito sa-ber o que era a “situação dos Asas do Céu”. Talvez seus amigos não notassem se ela escapasse por um momento.

– Volto já – ela sussurrou para Solana, levantando a asa e se afastando.

Solana segurou-a pela cauda, de olhos arregalados.

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O reino escondido

– Não vá! – ela sussurrou. – Não é seguro! Você ouviu o que eles disseram!

– Sobre monstros da Floresta Tropical? – perguntou Glória, revirando os olhos. – Não posso dizer que estou preocupada com isso. Não vou longe. – Ela sacudiu a cauda e deslizou para trás dos soldados, pisando com cuidado apenas nos pontos secos para que as garras não fizessem barulho na lama.

O pântano estava estranhamente silencioso, principalmente com o nevoeiro abafando a maioria dos sons. Ela tentou seguir o distante murmúrio das vozes e o que pensou ser o som da marcha dos Asas da Lama. Mas, após alguns momentos, até isso ficou difícil de escutar.

Ela parou, atenta. As árvores gotejavam. A chuva caía melanco-licamente entre os galhos. Pequenas bolhas gorgolejavam na lama aqui e ali, como se o pântano estivesse com soluço.

E então um grito cortou o ar.As escamas do pescoço de Glória esquentaram, pois ela estava

com medo, e listras verde-claro ziguezaguearam pelo corpo dela. Ela lutou contra o pavor, concentrando-se para as cores voltassem a ser cinza e marrom.

– Glória! – Solana gritou de algum ponto atrás dela.“Cale a boca”, pensou Glória furiosa. “Não chame a atenção.

Não deixe que ninguém saiba que estamos aqui.”Os outros dragonetes devem ter pensado a mesma coisa e a ca-

lado, pois ela não chamou de novo.“A menos que tivesse sido um deles que gritou...” Mas não

podia ser. O grito tinha vindo de algum lugar à frente.Glória verificou as escamas de novo, para ter certeza de que

estava bem escondida, e então apressou o passo, correndo entre as árvores na direção do grito.

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O nevoeiro estava tão denso que ela quase não viu os dois montes escuros que pareciam troncos caídos. Mas suas garras toca-ram em algo que, decididamente, era a cauda de um dragão, e ela pulou para trás.

Os dois dragões marrons estavam estendidos na lama, cercados por poças de sangue que já estavam sendo lavadas pela chuva. As gargantas tinham sido cortadas com tanta violência que as cabeças quase se separaram dos corpos.

Glória olhou para a névoa ondulante, mas, além da chuva, nada se moveu.

Os soldados dos Asas da Lama estavam mortos, e não havia sinal de quem os tinha matado.

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