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Edison Trombeta de Oliveira, Soellyn Bataliotti e Lais Benedetto Libras

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Edison Trombeta de Oliveira,Soellyn Bataliotti e Lais Benedetto

Libras

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SumárioCAPÍTULO 2 – Introdução à Linguística e Gramática da Libras: ............................................. Parâmetros, Classificadores, Intensificadores ...............................................05

Introdução ....................................................................................................................05

2.1 Os parâmetros da Libras ...........................................................................................05

2.1.1 A fonologia das línguas de sinais ......................................................................07

2.2 Classificadores.........................................................................................................12

2.2.1 Tipos de classificadores nas línguas de sinais......................................................13

2.3 Intensificadores no discurso da Libras .........................................................................18

Síntese ..........................................................................................................................20

Referências Bibliográficas ................................................................................................22

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Capítulo 2 IntroduçãoVocê sabe o que é Libras? Neste estudo, você conhecerá a língua brasileira de sinais utilizada pelas comunidades surdas no país, reconhecida enquanto língua pela Lei nº 10.436/2002 e san-cionada pelo Decreto nº 5.626/2005. Mas o que significa isso? Pois se trata de uma conquista do reconhecimento da Libras em todos os órgãos públicos, entre os quais escolas, hospitais, prefeituras e afins, que trouxe grandes melhorias para a vida das pessoas surdas.

Contudo, como a legitimação é recente, nem sempre as pessoas surdas tiveram essa facilidade de comunicação no convívio em sociedade. Você sabia que, até ser reconhecida oficialmente, a língua de sinais era entendida apenas como linguagem corporal, sendo confundida com expres-sões como os gestos e a mímica, por exemplo? E que os primeiros estudos da língua de sinais sob a ótica da linguística iniciaram em 1957 com o pesquisador norte-americano William Stokoe? Em 1960, ele publicou os resultados da pesquisa, em que descreve a estrutura da ASL (American Signs Language), ou seja, a Língua Americana de Sinais (STOKOE, 1960). Dessa forma, as lín-guas de sinais passaram a ser estudadas pela área da linguística e consideradas de mesmo valor que as línguas orais, como inglês, espanhol, francês, etc.

Agora que você já sabe que a Libras é uma língua utilizada pelas comunidades surdas do Brasil, estudará os aspectos linguísticos específicos da Libras e conhecerá seus precursores nas pesqui-sas dessa área. Este capítulo pretende mostrar a área de estudo da linguística, ou seja, as áreas de estudo que descrevem a língua. Para tanto, você aprenderá os conceitos de fonética e fono-logia; morfologia, sintaxe, semântica e pragmática.

Este material dará ênfase à fonética e à fonologia, que dão início aos estudos na estrutura gra-matical da Libras. Após entender esse tópico, você verá quais são os classificadores na Libras e, na sequência, os intensificadores no discurso. O objetivo é que, ao fim deste capítulo, você esteja familiarizado com esses conceitos e se interesse cada vez mais pelos estudos linguísticos da Libras.

2.1 Os parâmetros da LibrasPara entender os parâmetros, é preciso saber o que é fonética e fonologia, que são áreas de es-tudo da linguística. Você sabe o que é linguística? “A Linguística é a ciência que estuda as línguas naturais humanas” (QUADROS, 2004, p. 15). Viotti (2008) comenta que a linguística é uma ciência que não estuda somente uma ou algumas línguas, pois não se limita a isso. Veja a seguir.

A linguística não se limita ao estudo de uma língua específica, nem ao estudo de uma família de línguas. Ela não é nem o estudo isolado do português, do japonês, do árabe, da língua de sinais americana (ASL), da Libras, nem é o estudo de um conjunto de línguas aparentadas, como as línguas indo-europeias, as línguas orientais, as línguas semíticas, as línguas bantas, as línguas de sinais descendentes da língua de sinais francesa (LSF), etc. A linguística é o estudo científico da língua como um fenômeno natural. É claro que quanto mais avançamos nossos conhecimentos sobre as características das mais variadas línguas naturais, mais bem formamos um entendimento do que é a língua como um todo. (VIOTTI, 2008, p. 8).

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Introdução à Linguística e Gramática da Libras: Parâmetros,

Classificadores, Intensificadores

06 Laureate- International Universities

Libras

Como você viu na citação anterior, para Viotti, a linguística estuda a língua enquanto um siste-ma, um fenômeno. Portanto, ela não a compreende como um jeito “correto” de falar, mas como a língua (langue) em si, descrevendo-a e explicando-a. Além disso, Viotti (2005) afirma que a linguística é considerada uma ciência descritiva-explicativa, porque descreve a língua em si. Portanto, a linguística “despe” a língua, apresentando-a como realmente é, com suas alterações e variações linguísticas.

As áreas de estudo da linguística são: fonética, fonologia, morfologia, sintaxe, semântica e prag-mática. Além dessas áreas, a linguística faz interfaces com outras ciências, como a biológica, sociológica, psicológica e outras. A partir de agora, você conhecerá os conceitos de fonética e fonologia.

A fonética é a ciência que estuda os sons físico-articulatórios isolados, ou seja, a fonética pre-tende descrever todos os sons utilizados na linguagem humana. Já a fonologia estuda sons que mudam o sentido, como pares mínimos que mudam o significado de algo, por exemplo, mala, fala e bala. Dessa forma, enquanto a fonética pretende descrever, a fonologia pretende explicar (QUADROS, 2004).

Enquanto isso, a morfologia estuda os elementos internos das palavras, a fim de entender as combinações feitas entre eles (QUADROS, 2004). A morfologia é a área da linguística que es-tuda o interior das palavras. Essas palavras são constituídas por morfemas, que são unidades mínimas que têm significado. Alguns morfemas isolados formam palavras, outros morfemas são presos e incapazes de formar palavras independentes de outros (QUADROS, 2004).

Já a sintaxe é o campo de estudo da linguística que trata sobre a estrutura das sentenças de uma língua. Todas as línguas têm diferentes estruturas sintáticas e, por isso, têm uma estrutura base. Quadros (2004) reitera que a Libras tem a mesma ordem básica que a Língua Portuguesa falada no Brasil. Essa ordem seria S (sujeito) + V (verbo) + O (objeto). Contudo, apesar de essa ordem ser a básica, não significa que os falantes não usem outras ordens (QUADROS, 2004).

De acordo com Quadros (2004, p. 21), “A semântica estuda o significado da palavra e da sen-tença”. Ou seja, analisa o significado individual e agrupado das palavras, que muitas vezes apre-sentam sentidos diferentes – a exemplo dos dialetos, que são línguas próprias de cada região. Além disso, a semântica estuda os significados das expressões, implícitos ou não, como ironias, metáforas e afins. E, por fim, a pragmática que, pelo prisma tradicional, estuda a linguagem em seu uso, ou seja, no contexto.

NÃO DEIXE DE VER...

Para entender melhor sobre a linguística e a estrutura gramatical da língua de sinais, assista ao vídeo Estrutura Gramatical da Libras, em que a pesquisadora Ronice Qua-dros mostra, de maneira clara, como funciona essa língua e seu uso. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=O66o7BvuYwA>.

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2.1.1 A fonologia das línguas de sinais

O primeiro objetivo da fonologia nas línguas de sinais é descrever as unidades mínimas da língua que são capazes de formar sinais, depois disso, é saber quais são os padrões para as combi-nações. Neste item, você estudará as unidades mínimas da língua brasileira de sinais e, depois, suas combinações.

Os estudos linguísticos pioneiros sobre a língua de sinais foram iniciados em 1957, quando o pesquisador William Stokoe propôs uma análise da formação dos sinais na Língua Americana de Sinais, a ASL (American Signs Language). Com a intenção de descrever os sinais, ele os decom-pôs e apontou três parâmetros principais, assim nomeados: configuração de mão (CM), ponto de articulação (PA) e movimentos (M) (STOKOE, 1960).

Após esses estudos, iniciaram-se investigações sobre a estrutura linguística da Libras, a língua de sinais usada no Brasil. Autores como Ferreira-Brito (1995), Quadros e Karnopp (2004) adentra-ram nos estudos linguísticos da Libras para descrever a formação de seus sinais. Dessa forma, foram apresentados mais dois parâmetros: orientação de mãos e expressões não manuais (ENM). A seguir, veja a descrição dos cinco parâmetros.

Configuração de mão: inicialmente, Ferreira-Brito (1995) propôs 46 configurações de mão. São consideradas elementos fundamentais para possibilitar a formação dos sinais. Observe, na Figura 1, as configurações de mão propostas por Ferreira-Brito (1995, p. 220).

O que é configuração de mão? Esse parâmetro integra os estudos da fonética, que, por sua vez, analisa as unidades mínimas da língua de sinais. Nas línguas orais, a fonética descreve os sons (unidades mínimas), enquanto nas línguas de sinais são estudadas as configurações de mãos. Ou seja: as unidades mínimas que, em combinação com outros parâmetros, formam os sinais. De forma superficial, a configuração de mão é o formato em que ficam a mão e os dedos.

NÓS QUEREMOS SABER!

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Libras

1 2

[B] [A] [B] [5][C] [V]

[B]

[Bb] [A6]

[bO]

[Kd]

[K] [I] [R] [W] [L] [E][a]

[F1]

[Ft]

[a1]

[A1][B]

[O] [F] [X] [H] [3] [Y]

3 4 5 6

7 8 9 10 11 12

13 14 15 16 1817 19

[A] [G1]

[Gg]

[54]

[Gd]

[C]

[H] [3]

[O]

[5]

[5]

[L]

[Y][H]

[V]

Figura 1 – As 46 configurações de mão.

Fonte: Ferreira-Brito e Langevin, 1995.

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Figura 2 - Configurações de Mãos

Fonte: http://2.bp.blogspot.com/-ZiSJApuXGCc/UAb-vEWn_hI/AAAAAAAAAFk/ IouLHAm7Nlc/s640/configura%C3%A7%C3%B5es+de+m%C3%A3os2.jpg

Ponto de articulação: é o local em que será produzido tal sinal. O PA pode ser o rosto, cabeça, braços, troncos e até pernas, como acontece no sinal de “calça”. Também pode ser em um es-paço/local neutro (observe a Figura 3). O PA refere-se a uma unidade mínima que influencia o significado do sinal, uma vez que, mudado de lugar, terá outro significado. Veja alguns exemplos nas figuras 3 (QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 57) e 4 (CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001).

Espaço

Cabeça

Mão

Tronco

Braço

Espaço de realização dos sinais e as quatroáreas principais de articulação dos sinais

(baseado em Baltison, 1978, p. 49)

Figura 3 – Principais áreas de articulação (campo espacial).

Fonte: Quadros; Karnopp, 2004.

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Libras

APRENDER

SÁBADO

Figura 4 – Mudança do PA.

Fonte: Capovilla; Raphael, 2001.

Movimento (M): este parâmetro envolve diversas maneiras de movimentos significativos nas lín-guas de sinais. Quando o movimento é alterado, ocorrem mudanças no significado dos sinais. Além de o movimento alterar o significado dos sinais, pode causar mudança temporal. Veja o exemplo na Figura 4.

Figura 5 – Exemplos do parâmetro movimento.

Fonte: Quadros; Karnopp, 2004.

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Orientação da mão: também é um parâmetro decisivo no significado do sinal. Na língua brasi-leira de sinais, foram enumerados seis tipos de movimentos: para cima, para baixo, para o cor-po, para frente, para a direita ou para a esquerda (QUADROS, 2004). Observe as figuras 5 e 6.

PARA CIMA PARA BAIXO

Figura 6 – Orientação para cima e para baixo.

Fonte: Quadros; Karnopp, 2004.

PARA DENTRO PARA FORA

PARA O LADO[CONTRALATERAL]

PARA O LADO[IPSILATERAL]

Figura 7 – As demais orientações da mão.

Fonte: Quadros; Karnopp, 2004.

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Libras

Expressões não manuais (ENM): são expressões faciais e corporais. Esse parâmetro consiste em movimentos da cabeça, dos olhos, da face ou do tronco. As ENM marcam as “pontuações” nas sentenças, como interrogativas, relativas, topicalização, concordância, etc. (QUADROS, 2004).

NÃO DEIXE DE VER...

A Libras possui uma estrutura frasal e regras gramaticais que necessitam das ENM. Confira a explicação em três vídeos produzidos pelo Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines):

• Gramática Libras – Parte 1: <https://www.youtube.com/watch?v=kEp6fU4zVFI&list=PLZSmbWM7OcaAMWnoGnx0DR8iubEy MgryG&index=1>.

• Gramática Libras – Parte 2: <https://www.youtube.com/watch?v=jAt7j54whUM&list=PLZSmbWM7OcaAMWnoGnx0DR8iubEyMgryG&index=2>.

• Gramática Libras – Parte 3: <https://www.youtube.com/watch?v=Urt4LtslSds &list=PLZSmbWM7OcaAMWnoGnx0DR8iubEyMgryG&index=3>.

2.2 ClassificadoresFelipe (2002) salienta que as línguas e, por consequência, as culturas, dão significados às coisas por meio de sistemas semióticos. Esses sistemas têm categorias que, combinadas em seus con-textos, classificam as coisas, acontecimentos, qualidades, etc.

Contudo, existem línguas que fazem subclassificações separando os elementos em animados (pessoas e animais) e inanimados (objetos, automóveis). Essas subclassificações ainda podem a-dentrar o gênero, o número, o formato, o tamanho, a consistência, o caso, o pepel temático, o modo, o tempo, o aspecto e o sistema de flexão para concordância (FELIPE, 2002).

Os classificadores estão presentes tanto nas línguas de sinais quanto nas línguas orais. “Chama--se classificador um afixo utilizado, em particular nas línguas negro-africanas, para indicar a que classe nominal pertence uma palavra (Sin.: índice de classe).” Dubois et al. (apud FELIPE, 2002, p. 3). Portanto, assim como em algumas línguas orais e muitas línguas de sinais, existem os classificadores, inclusive a Libras. Esses classificadores são um tipo de morfema gramatical e lexical, afixado, que serve para mencionar a classe a que pertence e descrever formas, maneiras na ação verbal, etc. (FERREIRA-BRITO, 1995).

Pizzio et al cita o linguista Allan (1997), que aponta quatro tipos de classificadores nas línguas orais, que constituem um conjunto universal. Confira a seguir.

1. línguas de classificador numeral: são línguas em que um classificador é obrigatório em muitas expressões de quantidade e em expressões anafóricas e dêiticas, como, por exemplo, a língua Thai;

2. línguas de classificador concordante: são línguas em que os classificadores são afixados (geralmente prefixos) aos nomes e seus modificadores, predicados e pró-formas como, por exemplo, em muitas línguas africanas (Bantu e SemiBantu) e australianas;

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3. línguas de classificador predicativo: são línguas que possuem verbos classificadores, que variam seu radical de acordo com as características das entidades que participam enquanto argumentos do verbo como, por exemplo, os verbos de movimento/localização em Navajo, Hoijer (1945), e verbos classificadores em outras línguas Athapaskan;

4. línguas de classificador intralocativo: são línguas nas quais classificadores nominais são embutidos em expressões locativas que obrigatoriamente acompanham nomes em muitos contextos. Existem apenas três línguas: Toba, uma língua sul-americana, Eskimo e Dyirbal, uma língua do noroeste da Austrália (PIZZIO et al., 2008, p. 14).

Sobre os tipos de classificadores, Pizzio et al. (2008) elencaram sete categorias de classificação, mas deixam claro que esse número pode variar nas línguas. Os classificadores podem somar duas ou mais categorias que, ainda assim, podem se subdividir dentro de outras.

• A primeira categoria encontrada foi a material, que se subdivide em duas partes: animadas e inanimadas. As animadas se referem às pessoas e aos animais; também caracteriza as relações de gênero feminino e masculino e de adulto ou criança. As inanimadas referem-se basicamente aos objetos, mas também incluem inanimados, como árvores, montanhas, etc.

• A segunda é o formato. Estes classificadores referem-se a objetos longos, planos e arredondados de diferentes dimensões como consistência, textura, etc.

• A terceira é a consistência e está associada com material e forma.

• A quarta é o tamanho, que reúne dois grupos: grandes e pequenos. Também se relaciona com o formato.

• A quinta é a localização, que se refere a lugares e objetos.

• A sexta é o arranjo, que explicita objetos específicos.

• E a sétima é a quantia, que diz respeito a volume, tempo, etc.

2.2.1 Tipos de classificadores nas línguas de sinais

Pizzio et al. (2008) reiteram que há vários tipos de classificadores verbais e formas em que eles se relacionam. A escolha de um classificador é baseada na seleção lexical relacionada à concor-dância gramatical, e isso pode subdividi-lo em grupos.

Em muitas línguas, os classificadores verbais são opcionais e são determinados pela função discursiva dos substantivos de um predicado adicional. Eles podem ser usados para manter a referência de um substantivo dentro de uma narrativa, podem também reintroduzir os participantes e podem ser usados anaforicamente. (PIZZIO et al., 2008, p. 16).

Como você viu, a escolha de um classificador verbal depende de sua função dentro de um discurso. Portanto, a partir de agora, você conhecerá os tipos de classificadores nas línguas de sinais para que possa entender esse funcionamento. Estudará os classificadores descritivos, os classificadores especificadores, os classificadores de plural, os classificadores instrumentais e os classificadores de corpo.

Conforme Pizzio et al. (2008), os classificadores descritivos podem ser percebidos de acordo com sua representação imagética, como os objetos animados ou inanimados. Com os classificadores descritivos, é possível conhecer elementos como o tato, o cheiro, o paladar, a forma, o som, a textura, a localização, sentimentos e, inclusive, incorporação de ações por meio dos classificado-res que podem ser feitos com uma ou duas mãos, de acordo com a necessidade.

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Libras

Esse tipo de classificador possui três subgrupos: o dimensional, que, como o nome diz, mostra as dimensões do que se está sendo visto, a bidimensional, que é o dobro das dimensões que se vê, e o tridimensional, que demonstra todas essas dimensões que permitem registrar a sensação de introdução da ênfase visual (PIZZIO et al., 2008).

Já os classificadores especificadores têm o dever de descrever a forma, o tamanho, a textura, o paladar, o cheiro, o corpo de pessoas ou animais, inclusive o olhar e os sons. Os classificadores específicos também representam elementos gasosos, descrevem símbolos e logomarcas e até números relacionados a objetos animados ou inanimados, como números de casa, telefone, etc. (PIZZIO et al., 2008).

Os classificadores de plural usam a configuração de mão, de forma a representar o objeto com movimentos repetitivos. Isso serve tanto para objetos quanto para incorporação de objetos inani-mados. Um exemplo disso são os classificadores de estacionamentos de carros lotados.

De acordo com Pizzio et al. (2008), os classificadores instrumentais são configurações de mão que descrevem a ação gerada por tal instrumento. É comum esses classificadores serem conheci-dos como icônicos, porque eles representam a ação e de forma visual – é nítido perceber do que se trata. Por exemplo: pentear os cabelos, digitar, escrever à mão, escovar os dentes, etc. Já os classificadores de corpo descrevem ações de seres animados pela expressão corporal. Uns dos exemplos seria o caminhar de um cachorro, um gato lambendo as patas, um leão bravo e afins.

Como você viu, os classificadores na língua de sinais são configurações de mãos que represen-tam objetos, pessoas e animais. Segundo Felipe (2007), eles funcionam como marcadores de concordância. Dessa forma, os classificadores podem substituir e classificar o sujeito ou objeto relacionado à ação verbal e, assim, marcam concordância de gênero.

Ainda segundo essa autora, os classificadores servem para representar pessoas ou animais inclu-sive em plural. Dependendo da ação, são capazes de representar duas ou mais pessoas, além de animais, com o uso da repetição do sinal, que é relacionado ao número. É importante salientar que alguns sinais são icônicos e que geralmente são confundidos com classificadores, como os sinais que são adjetivos, conforme podemos ver a seguir.

Portanto, não se deve confundir os classificadores, que são algumas configurações de mãos incorporadas à raiz de certos tipos de verbos e que são obrigatórias, com os adjetivos descritivos que, nas línguas de sinais, por serem gesto-visuais, representam iconicamente qualidades de objetos (FELIPE, 2007, p. 173).

No artigo Sistema de flexão verbal na libras: os classificadores enquanto marcadores de flexão de gênero, Tanya A. Felipe trata os classificadores de forma clara e objetiva. Para aprofundar seus conhecimentos, acesse: <https://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:jrm6jWiHxlgJ:scholar.google.com/+classificadores+libras+felipe&hl=pt-BR&as_sdt=0,5>.

NÃO DEIXE DE LER...

A seguir, observe o Quadro 1, que traz imagens que exemplificam alguns tipos de classificadores e objetos animados e inanimados que essas configurações de mãos são capazes de representar. Esse quadro é de extrema importância para que você visualize os signos.

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CLASSIFICADORES DESCRITIVOS

A forma, o tamanho e os detalhes de uma mochila

A forma e o paladar de uma melancia

A forma e a força de um tigre

Sentimento de uma criança chorando

A incorporação do verbo de ação “nadar”

Salto de bungee jump

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Lágrimas caindo dos olhos

Descrição dos detalhes da boca de um lobo

CLASSIFICADORES ESPECÍFICOS

Som do telefone tocando

Cachorro (animal quadrúpede)

Fumaça do cigarro

Fumaça da explosão da bomba atômica

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Específico nomes e logomarcas. Ex.: Torre Eiffel.

Específico nomes e logomarcas. Ex.: Mercedes Benz.

CLASSIFICADORES DE PLURAL

Em movimento para cima indicando vários livros empilhados

Configuração de mão aberta e dedos fechados, uma mão parada e a outra ao lado repetindo movimento

Muitas árvores (sinal conhecido: floresta)

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CLASSIFICADORES INSTRUMENTAIS

Escrever no teclado

Escovar os dentes

CLASSIFICADORES DE CORPO

Gato lambendo a pata

Leão bravo

Quadro 1 – Tipos de classificadores e representações de objetos.

Fonte: Elaborado pela autora com imagens de Shutterstock, 2015.

2.3 Intensificadores no discurso da LibrasOs intensificadores podem estar presentes tanto nos adjetivos quanto nos verbos e incorporar o intensificador (muito e rápido). No caso dos verbos, eles podem incorporar advérbios por meio da mudança de movimentos. Esses intensificadores ocorrem por meio das expressões não manu-ais, ou seja, expressões faciais e corporais (FELIPE, 2007).

Contudo, a autora salienta que, para intensificar (muito) uma ação, ocorre a repetição do sinal que corresponde à ação e, paralelo a isso, há a incorporação de um movimento lento. Porém, para conseguir realizar o intensificador rápido, a ação deve ser incorporada a um movimento acelerado e o sinal deve ser feito repetidas vezes. Há exemplos como: FEI@muito, FELIZmuito, ANDARrápido, ANDARlento, CHOVERforte, VENTARfraco.

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É muito comum o uso desses intensificadores em discursos na língua de sinais. Os surdos usam muito as marcas não manuais (expressões corporais e faciais) para argumentarem ou explicita-rem em um discurso, e elas são capazes de dar sentido intensificado usando marcas morfológi-cas, como morfema adjetivo, morfemas dêiticos, morfema adverbial e morfema para grau de adjetivo. Sobre isso, veja o que a autora (FELIPE, 2013, p. 79-81) diz:

a) Morfema adjetivo: Um tipo de movimento da cabeça e a direcionalidade do olhar, simultâneos ao sinal manual, marca uma qualidade para o substantivo ou intensificador para um advérbio ou adjetivo.

b) Morfemas dêiticos: a direcionalidade do olhar e da cabeça, simultânea a um sinal pronominal ou locativo, marca uma referência espacial específica para os referentes indicados através de apontações.

c) Intensificador: uma expressão facial específica, através do levantar ou do franzir das sobrancelhas, às vezes também com as bochechas infladas e com o arregalar dos olhos, simultânea a um adjetivo, substantivo ou verbo marca um intensificador. Caso modal: uma expressão facial específica, sinalizada pela boca simultaneamente com a sinalização de um verbo, marca um caso modal. Negação, reprovação: a MNM pode ser uma expressão específica, sinalizada pela cabeça se movimentando repetidamente para os lados e testa franzida, simultaneamente a determinado sinal; a cabeça levemente inclinada; as sobrancelhas baixas; os lábios estendidos lateralmente ou arredondados; o olhar com movimentos para as laterais (squinting eyes).

d) Morfema para grau de adjetivo: a intensidade no arregalar ou diminuir as pálpebras, simultânea ao levantar ou franzir as sobrancelhas e ao inflar ou contrair as bochechas marca os graus aumentativo ou grau diminutivo e o superlativo.

O artigo O discurso verbo-visual na língua brasileira de sinais – Libras, de Tanya A. Felipe, discute profundamente o discurso verbo-visual na Libras. Dessa forma, você consegue ver mais exemplos do uso do intensificador no discurso da língua brasileira de sinais, com imagens, situações e referências de pesquisadores do tema. Saiba mais em: <http://www.scielo.br/pdf/bak/v8n2/05.pdf>.

NÃO DEIXE DE LER...

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SínteseAo concluir este capítulo, você:

• estudou que a língua de sinais sempre foi muito confundida enquanto linguagem;

• entendeu por que as pessoas acreditavam, e muitas ainda acreditam, que a língua de sinais se assemelha às expressões como gestos e mímica;

• viu que a língua de sinais contém estrutura gramatical própria e é tão legítima quanto as línguas orais;

• conheceu o que estuda a área da linguística;

• viu que a linguística é uma ciência que estuda a língua (langue), sua estrutura e seu funcionamento;

• teve contato com a Libras sob o ângulo da linguística, descobrindo que a Libras tem fonética, fonologia, morfema, sintaxe, semântica e pragmática;

• aprendeu que os parâmetros são da linha de estudo da fonética e fonologia e, como vimos, são o ponto de partida para a formação dos sinais;

• estudou que, dentro dos cinco parâmetros, nós temos as configurações de mão (que são o formato das mãos), os pontos de articulação (lugar onde é feito o sinal: cabeça, rosto, tronco, espaço neutro, etc.), orientação (direção em que a palma da mão fica direcionada), movimento (movimento do sinal, quando houver) e expressões não manuais (expressões faciais e corporais);

• observou que os classificadores são capazes de classificar coisas, acontecimentos, qualidades, etc.;

• soube que há classificadores tanto nas línguas orais quanto nas línguas de sinais;

• conheceu alguns tipos de classificadores nas línguas de sinais, estes são: classificadores descritivos, classificadores especificadores, classificadores de plural, classificadores instrumentais e classificadores de corpo;

• estudou que cada um desses classificadores possui sua função no discurso;

• entendeu que não se deve confundir os sinais adjetivos com os tipos de classificadores;

• compreendeu que os intensificadores no discurso da Libras são de extrema importância, uma vez que são capazes de dar ênfase para as coisas inseridas em um discurso;

• viu que os intensificadores podem ser feitos com a repetições de sinas de forma rápida ou intensificação de forma lenta;

• aprendeu que as expressões não manuais feitas simultaneamente aos sinais são capazes de intensificar o que se quer dizer dentro do discurso na Libras.

Síntese

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A expectativa é que, com a leitura desse material, você tenha obtido noções básicas sobre a gramática da Libras pela ótica da linguística. A partir do conhecimento que adquiriu, você está apto para aprofundar seus estudos sobre a formação dos sinais em Libras e suas especificidades. Até breve!

22 Laureate- International Universities

ReferênciasALLAN, K. Classifiers. Language, vol. 53, nº 2., p. 285-311, jun.1997.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras, e o art. 18 da Lei nº 10.089, de 19 de dezembro de 2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm>. Acesso em: 5 jul. 2015.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10436.htm>. Acesso em: 5 jul. 2015.

CAPOVILLA, F. C.; RAPHAEL, W. D. Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngue da Língua de Sinais Brasileira. São Paulo: Edusp, 2001.

FELIPE, T. A. Libras em Contexto: Curso Básico: Livro do Estudante. 8. ed. Rio de Janeiro: WalPrint Gráfica e Editora, 2007.

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