ediouro 2012_06_12 - manual de astronomia_aeb com isbn.pdf

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  • SUMRIO

    3

    17

    31

    61

    Cu. Esfera CelesteObservao do cu a olho nuO cuFenmenos celestes visveis a olho nuEfeitos atmosfricosEsfera celesteSistema horizontal de coordenadas celestesRefernciasSugestes de atividades prticas

    Terra: Rotao e FormaRotao da TerraEstrelas fixasSistema equatorial de coordenadas celestesForma da TerraRefernciasSugestes de atividades prticas

    Sol: Movimento AparenteMovimento aparente do solAtividade SolarRefernciasSugestes de atividades prticasO movimento aparente do SolGnmon e os Pontos CardeaisRelgio de SolEstaes do AnoAto de F ou Conquista do Conhecimento?

    Lua e Planetas: Movimento AparenteA LuaMovimento aparente da LuaMovimento aparente dos planetasPredio do movimento dos astros no espaoRefernciasSugestes de atividades prticasEclipses e fases da LuaO Sistema Solar em escalaO Sistema Solar numa representao teatralComparao entre os tamanhos dos planetas e do SolComparao entre a orbita lunar e o dimetro solarComparao entre os tamanhos da Terra e da Lua

    172224252929

    3241

    44444547495456

    3447

    10111515

    616371

    7475757680829098

    100

  • 113

    159

    179

    Primeira Lei de Kepler - Lei das rbitasSegunda Lei de Kepler - A Lei das reasTerceira Lei de Kepler - Lei dos perodosO achatamento dos Planetas

    Fenmenos Observveis a Olho NuAstrofsicaFenmenos do Sistema SolarFenmenos externos ao Sistema SolarRefernciasSugestes de atividades prticasSimplificando a luneta com lente de culosAnexo - Fotos ilustrativas da montagem da luneta com lente de culos

    OrigensOrigem e evoluo do UniversoOrigem do Sistema SolarOrigem da vida. Vida extraterrestreReferncias

    Glossario

    102107109111

    113117128143145146153

    159167172178

  • CU. ESFERA CELESTE

    O cu o palco natural dos fenmenos astronmicos. Neste captulo descreveremos o cu contemplado a olho nu de um ponto qualquer da superfcie da Terra.

    O observador no solo est debaixo da atmosfera da Terra, cujas influncias na observao astronmica tambm sero discutidas aqui. Em seguida, procederemos a uma geometrizao do cu, quando surge o conceito de esfera celeste com os vrios sistemas de referncia para a localizao precisa dos astros.

    1.1 Observao do cu a olho nuAproveitando o contex-to, discutiremos agora as limitaes de uma ob-servao astronmica a olho nu. De um lado h a necessidade de uma quantidade mnima de luz chegando aos nossos olhos para que a retina se sensibilize e perceba a presena do astro. No cu noturno esse limite quantificado por uma estrela de 6a magnitude (caixa ao lado).

    Para as dimenses da pupila de nossos olhos, impossvel formar em nossas retinas a

    A origem do conhecimento sensorial.

    Mas toda experincia sensvel que visa ao

    conhecimento, pressupe uma teoria.

    Brilho ou magnitude. LuminosidadeO brilho de um astro numa observao a olho nu refere-se intensidade da sensao luminosa. Essa intensidade est diretamente relacionada com o fluxo de luz que chega aos nossos olhos. Para um mesmo astro, o brilho depende da distncia do observador. No vcuo, o brilho de-cresce no inverso do quadrado da distncia.

    importante distinguir brilho, de luminosidade. O primeiro, como dissemos, depende da distn-cia do observador fonte luminosa, portanto, envolve subjetividade. O ltimo uma proprie-dade intrnseca ou objetiva da fonte luminosa. A luminosidade de uma estrela anloga potncia luminosa de uma lmpada, p. ex., 60 Watts, 120 Watts etc.

    A magnitude quantifica o brilho de um astro. Por uma conveno tradicional, ela menor quando o brilho maior. Uma estrela de magnitude 1 brilha mais que uma de magnitude 2. variao de 1 magnitude corresponde uma variao de brilho pelo fator 2,5.

  • AstronomiA

    imagem de qualquer estrela visvel noite. Portanto o que vemos apenas uma concentrao de luz que, por mais que ampliemos, jamais formar uma imagem da estrela. Se um astro for suficientemente brilhante, podemos in-dagar qual o limite para que os nossos olhos possam formar uma imagem dele. Numa observao noturna, com a pupila dilatada por causa do escuro, nosso olho capaz de discriminar somente objetos que subtendem mais que cerca de 0,5. Assim, dentre os planetas possvel formarmos, em princpio, uma imagem de Jpiter e, ocasionalmente, de Marte e de Vnus.

    1.2 O cuVivemos na superfcie da Terra. Por isso, de algum ponto dessa superfcie que fazemos nossas observaes ordinrias dos astros. dessas observaes que trataremos aqui, no daquelas que um astronauta pode realizar fora da Terra.

    Fora de recintos fe-chados podemos ver a paisagem circundante (Figura 1.1). Essa pai-sagem compreende a terra e o cu. Terra aqui no a totalidade do Planeta, pois, estando na superfcie da Terra, um observador s pode ver uma pequena poro dessa superfcie ao seu redor. Terra aqui o que vulgarmente chamamos cho com tudo o que ele abriga. a que tem lugar a maior parte das atividades humanas. Na terra as pessoas nascem, vivem e morrem, trabalham e descansam, constroem e destroem.

    Contrapondo-se terra est o cu, fato este que um simples fio-de-prumo pode atestar empiricamente (Figura 1.1). Esta distino emprica sugeriu ao influente filsofo grego Aristteles (384-322 aC) a ainda arraigada dicoto-mia cu-terra como se fossem dois reinos incomunicveis e de naturezas irredutveis, com a impermanncia das coisas terrestres contrastando com a aparente permanncia das coisas do cu.

    Na paisagem, o cu separado da terra pela linha do horizonte, denominada simplesmente horizonte sensvel do observador (Figura 1.1). nessa linha que se diz poeticamente que a terra parece encontrar o cu.

    1.3 Fenmenos celestes visveis a olho nuO cu no vazio, mas o cenrio de uma grande variedade de fenme-nos. Pelo fato de que, intermediando o solo e o espao csmico, existe a atmosfera da Terra, devemos distinguir no cu dois tipos de fenmenos: atmosfricos (meteorolgicos) e csmicos (astronmicos).

    Figura 1.1. Representao da paisagem com o cu e a terra (cho). O horizonte separa o cu, da terra. Um fio-de-prumo indica a terra para baixo, e o cu para cima

  • Ceu. esferA Celeste

    A atmosfera da Terra uma camada gasosa cuja densidade decresce exponencialmente com a altura. Sua parte mais densa, que faz parte da nossa biosfera, tem apenas alguns quilmetros de espessura. Ela constitui, portanto, uma delgada pele do nosso Planeta. Apesar disso, ela influencia a nossa observao astronmica de diversas maneiras. Mas sobre isso fala-remos mais adiante.

    Dentre os fenmenos atmosfricos naturais podemos citar as aves que voam, as nuvens, a cerrao, as chuvas, os raios, os troves, os tornados, os arco-ris, os halos solares e lunares, as auroras polares e os meteoros.

    Os arco-ris e os halos so fenmenos pticos resultantes da interao da luz solar (ou lunar) com gotas de gua e cristais de gelo em suspenso na atmosfera.

    As auroras polares, cuja ocorrncia nula em nossas latitudes, consistem em fenmenos luminosos resultantes da penetrao nas regies mais altas da atmosfera da Terra, de partculas eltricas ejetadas pelo Sol (Figura 1.2). Luz emitida pelos tomos e molculas da nossa atmosfera depois de terem sido excitados (energizados) pela coliso com partculas solares. As auroras ocorrem preferencialmente nos plos magnticos da Terra, pois l as linhas do campo magntico que atuam como dutos, esto orientadas mais verticalmente em rela-o superfcie da Terra. Os plos magnticos no coincidem exatamente com os

    plos geogrficos, mas esto relativamente pr-ximos. As auroras bore-ais so as que ocorrem no hemisfrio norte, e as austrais, no hemisf-rio sul. A ocorrncia de auroras modulada pela atividade solar que tem um ciclo de pouco mais de 11 anos.

    Meteoro sinnimo de estrela cadente (Figura 1.3). Falaremos mais sobre ele na aula sobre Fenmenos Observveis a Olho Nu. Trata-se de um fenmeno que ocorre na atmosfera da Terra, mas cujo agente causador um fragmento slido de origem csmica.

    No cu ainda podemos observar fenmenos artificiais na atmosfera da Terra, tais como, avies, bales, asas delta, planadores etc.

    Os fenmenos que ocorrem alm da atmosfera da Terra, portanto no espao csmico, so na grande maioria astronmicos. No podemos omitir aqui os satlites artificiais, muitos deles visveis da Terra a olho nu em horrios apropriados. A predio da passagem desses satlites por localidades especficas da Terra pode ser obtida, por exemplo, em http://www.heavens-above.com/.

    Figura 1.2. A aurora se parece com cortinas

    se agitando ao vento e brilhando intermitentemente (Chaisson and and McMillan,

    Prentice Hall, 1998, 156)

  • AstronomiA

    Os objetos astronmi-cos visveis a olho nu no cu so: o Sol, a Lua, os planetas Mercrio, Vnus, Marte, Jpiter e Saturno, cerca de 2 mil estrelas visveis noite acima do horizonte (de um total de 6 mil em toda a esfera celeste), a Via Lctea, as Nuvens de Magalhes, a Ne-bulosa de Andrmeda, a Luz Zodiacal e a Nebulosa de rion junto s Trs Marias. Ocasionalmente podemos tambm ver a olho nu algum cometa e, mais raramente, alguma supernova.

    A Via Lctea uma faixa de brilho fraco e esbranquiado que d uma volta na esfera celeste (Figura 1.4). Consiste na nossa prpria Galxia vista por ns, de seu interior (Figura 1.5). A projeo de uma faixa se deve a que a Galxia no esfrica, mas tem a forma de um disco que abriga os braos espirais. A faixa de brilho a projeo na esfera celeste do disco contendo gs, poeira e uma mirade de estrelas que no discriminamos indivi-dualmente a olho nu.

    Na seqncia dos as-tros visveis a olho nu, so duas as Nuvens de Magalhes: a Grande e a Pequena. Ambas so galxias, assim como Andrmeda. A Nebulosa de rion uma nuvem interestelar de gs e poeira no interior da nossa Ga-lxia, em que ocorre atualmente intensa formao de novas estrelas. Sobre cometas e supernovas falaremos em detalhe na aula sobre Fenmenos Observveis a Olho Nu.

    Figura 1.3. Desenho de um meteoro riscando momentaneamente o cu

    Figura 1.4. Foto-composio da Via Lctea do Hemisfrio Sul. John P. Gleason (http://antwrp.gsfc.nasa.gov/apod/ap990224.html)

    Figura 1.5. Representao artstica da Via Lctea com a posio do Sol.(NASA/JPL/Caltech/R. Hurt)

  • Ceu. esferA Celeste

    1.4. Efeitos atmosfricosA atmosfera da Terra constituda de uma mistura de molculas de nitro-gnio, oxignio, gs carbnico e gua, e de tomos de argnio. Alm disso ela tem minsculos gros de poeira em suspenso levantadas do solo por ventos, ou ejetadas por vulces, ou produzidas pelo homem em queimadas, indstrias e motores de veculos a combusto.

    O Sol irradia luz para todas as direes. Mas a Terra um corpo aproximada-mente esfrico e opaco. No hemisfrio da Terra que se acha voltado para o Sol, a luz solar incide diretamente. Esse o hemisfrio diurno ou iluminado. O outro hemisfrio, no-iluminado pelo Sol, chamado hemisfrio noturno (Figura 1.6). A alternncia entre noite e dia numa localidade se deve a que a Terra gira.

    1.4.1 Cu diurnoO mais espetacular efeito astronmico da atmosfera a difuso da luz solar pelos gases e poeira da atmosfera. Essa difuso pode ser ilustrada por meio de um feixe intenso de luz (por exemplo, de um projetor de diapositivos) numa sala escura. O feixe s se torna visvel pela luz que os minsculos gros de poeira em suspenso espalham na direo dos nossos olhos.

    Por causa da difuso da luz solar, o cu diurno se torna claro. Sem a at-mosfera no haveria a difuso e, ento, o cu permaneceria escuro como, p. ex., na superfcie da Lua ou no espao csmico. As estrelas que na Terra so visveis apenas de noite, continuariam sendo visveis de dia juntamente com o Sol. Portanto o desaparecimento das estrelas de dia resulta do ofus-camento delas pelo brilho do cu diurno.

    Esse ofuscamento deixa de existir excepcionalmente durante os breves instantes da totalidade do eclipse solar. Ento, em pleno dia, podemos ver estrelas no cu. Nesse caso o obscurecimento do cu se deve a que a Lua impede a incidncia dos raios solares, no sobre toda a Terra, mas sobre uma regio de algumas centenas de quilmetros.

    Um ofuscamento semelhante, porm bem mais fraco, produzido tambm pela Lua Cheia noite. Ento as estrelas de brilho mais fraco desaparecem.

    Os astrnomos se queixam da poluio luminosa que limita e, s vezes, in-viabiliza a observao noturna do cu. O cu se torna claro, como acontece de dia, tendo como fonte luminosa no o Sol, mas as luzes das cidades. Estrelas de 6a magnitude so as de brilho mais fraco que podemos perceber a olho nu, mas esse limite vale apenas para locais cujo cu noturno escuro.

    Figura 1.6 (fora de escala). A incidncia dos raios solares

    ocorre s no hemisfrio voltado para o Sol, ou

    diurno. O hemisfrio oposto, ou noturno, se encontra no cone de sombra. Esse cone

    se forma porque a Terra opaca e os raios solares se

    propagam em linha reta. Do interior desse cone no se

    pode observar o Sol

  • AstronomiA

    Numa cidade s podemos perceber estrelas mais brilhantes. Os astrnomos no reivindicam obviamente que as luzes sejam apagadas. Em geral, o facho de luz das luminrias pblicas no dirigido s para os objetos de interesse, mas espalhado inutilmente para todas as direes, inclusive para o cu. A reivindicao a de que essas luminrias tenham um desenho mais racio-nal, at porque isso representaria tambm uma significativa economia de energia eltrica a longo prazo.

    A luz do Sol tem componentes de vrias cores. O cu diurno azulado porque as molculas e os menores gros de poeira da atmosfera espalham mais eficientemente a componente azul, do que a componente vermelha.

    1.4.2 Janelas espectrais Outro efeito astronmico importante da atmosfera da Terra so as suas jane-las espectrais atravs das quais a radiao dos astros pode chegar at o nvel do solo. A radiao natural dos astros consiste em ondas eletromagnticas que podem ter os mais variados comprimentos. Comeando pelos raios , cujos comprimentos de onda so os mais curtos, vm a seguir os raios X, os raios ultravioletas, a luz visvel (violeta, azul, verde, amarelo, alaranjado e vermelho), a radiao infravermelha, as microondas e as ondas de rdio (Figura 1.7). A radiao se propaga livremente no vcuo mas, na atmosfera, pode interagir com os seus componentes sofrendo absoro ou difuso. Quando isso acontece, a composio espectral da radiao observada no solo j no a original, pois foi alterada.

    As duas janelas atmosfricas que permitem a passagem da radiao csmica se situam na faixa espectral da luz visvel e das ondas de rdio (Figura 1.7). Esta ltima janela se fecha para comprimentos de onda 10 m (freqncias 30 MHz) que so refletidas pela ionosfera, uma camada a cerca de 100 km de altitude constituda de cargas eltricas (eltrons e ons). A reflexo tanto impede a penetrao das ondas que vm do espao, como tambm possibilita os longos trajetos das ondas curtas usadas nas comunicaes terrestres, atravs de reflexes sucessivas entre a ionosfera e o solo.

    Parte das microondas e da radiao infravermelha absorvida pelos com-postos moleculares da baixa atmosfera. Outras radiaes so absorvidas j na alta atmosfera. Fora das janelas a observao s possvel em grandes elevaes, ou a bordo de bales ou satlites.

    Mesmo a janela da luz visvel se fecha ocasionalmente quando chove ou o cu fica nublado. Tambm a presena de poeira e nvoa seca, que se agrava com as queimadas em perodos de estiagem, causa a extino (enfraquecimento)

    Figura 1.7 (fora de escala). Representao esquemtica das ondas eletromagnticas de diferentes comprimentos. O comprimento de onda cresce para a direita

  • Ceu. esferA Celeste

    da luz estelar. Essa extino mais intensa perto do horizonte. Dissemos antes que h cerca de 6 mil estrelas visveis em toda a esfera celeste mas que, com o cu escuro, podemos observar estimativamente apenas 2 mil estrelas. H primeiro uma reduo pela metade porque s temos acesso a um hemisfrio celeste. A perda de umas mil estrelas por conta da dificuldade de observao perto do horizonte. L o trajeto do raio luminoso dentro da atmosfera da Terra mais longo do que na vertical. Por isso a extino da luz mais severa. Por isso prefervel observar um mesmo astro perto da passagem meridiana do que perto do nascer ou ocaso. O Sol avermelhado perto do horizonte em dias de nvoa seca se deve a gros de poeira muito pequenos, do tamanho do comprimento de onda da luz visvel ou menores. Esses gros desviam para outras direes a luz de comprimentos de onda mais curtos (azul), de modo que o avermelhamento se deve componente espectral remanescente da luz solar original.

    1.4.3 CintilaoOutro efeito importante da atmosfera a cintilao. Consiste na variao intermitente do brilho e na agitao da imagem de uma estrela (Figura 1.8). Isso pode ser notado at mesmo a olho nu. Por causa desse efeito (Figura 1.8 esquerda) que se estabeleceu a representao de estrelas como ob-jetos pontudos, mas isso nada tem a ver com a forma real das estrelas que, de um modo geral, so esfricas. Numa fotografia astronmica tirada com tempo de exposio mais longo, a imagem sai borrada como se estivesse fora de foco (Figura 1.8 direita). Esse um efeito nocivo, pois tira a nitidez das imagens e prejudica a preciso da posio dos astros. Essa a razo que justifica projetos onerosos como o Telescpio Espacial Hubble. Mesmo as observaes na luz visvel se justificam no espao por causa da melhoria da qualidade de imagem.

    A causa da cintilao a turbulncia atmosfrica. Mesmo noite, clulas de ar de diferentes temperaturas, portanto com diferentes ndices de refrao, aquecidas durante o dia pelo Sol, se agitam e produzem esse efeito. A cin-tilao pode ser notada em luzes terrestres distantes, especialmente numa noite quente. Tambm na imagem atravs do ar aquecido nas proximidades do cho quente ou de uma chama. uma pena que a luz estelar, depois de caminhar centenas de anos-luz, sofra esses efeitos bem no finalzinho de to longa viagem.

    Figura 1.8. No lado esquerdo est representada a

    agitao da imagem de uma estrela devida cintilao

    atmosfrica. No lado direita, a imagem dessa mesma estrela fotografada com

    longo tempo de exposio

  • 0

    AstronomiA

    1.4.4 Refrao atmosfricaO ltimo efeito da atmosfera terrestre de que trataremos aqui a refrao atmos-frica. A refrao o desvio de um raio luminoso ao atravessar meios com ndices de refrao diferentes. Pelo fato de que o ar mais denso nas camadas mais baixas, e mais rarefeito nas superiores, a refrao causada nas diferentes camadas produz um encurvamento dos raios de luz provenientes dos astros. Isso faz com que a direo observada de um astro seja falseada. O observador tem a falsa impresso de que o astro est mais alto em relao ao horizonte (Figura 1.9). A discrepncia mxima no horizonte, decresce com a elevao tornando-se nula na ver-tical. Uma conseqncia desse efeito a possibili-dade de um observador enxergar um astro que ainda esteja abaixo do horizonte.

    1.5 Esfera celestePara podermos descrever quantitativamente a posio dos astros no cu, a paisa-gem acima descrita ser geometrizada. Em primeiro lugar, o observador deve se imaginar ocupando o centro de uma enorme esfera, a esfera celeste. No necessrio definir o tamanho exato do raio dessa esfera, mas ele deve ser muito maior do que o prprio observador, o raio da Terra, a distncia da Terra ao Sol etc.

    A esfera celeste no tem nenhuma reali-dade fsica. apenas uma construo men-tal. Quando observa-mos o cu estrelado, de fato, umas estrelas esto mais perto de ns, outras mais longe (Figura 1.10). H, por-tanto, uma distribuio de astros no espao tridimensional ao nosso redor. Nesse espao a posio de um astro requer a definio de 3 coordenadas, uma das quais a distncia ao observador. Mas, quando apelamos para o uso da esfera celeste, ignoramos intencionalmente as diferentes distncias dos astros. Fingimos que todos esto projetados numa espcie de cpula, como a de um gigantesco planetrio. Portanto, todas estariam suposta-mente mesma distncia do observador (Figura 1.10). Na prtica, estamos reduzindo o espao csmico tridimensional ao espao bidimensional da superfcie da esfera celeste. No espao bidimensional a posio do astro

    Figura 1.9. As camadas mais densas da atmosfera, nas quais o encurvamento dos raios de luz mais pronunciado, ficam mais perto do solo. A estrela branca est na posio verdadeira. Mas o observador tem a impresso de que ela se encontra mais elevada, na posio da estrela preta. Para o observador a estrela parece estar na direo da tangente (linha tracejada) trajetria da luz no local de observao

    Figura 1.10 (muito fora de escala pois, ou o observadordeveria ser bem menor, ou a esfera celeste bem maior). O fato de que os ps do observador esto no centro da esfera celeste, e no os seus olhos, irrelevante, pois o altura de um ser humano totalmente desprezvel neste contexto. mostrada a projeo sobre a esfera celeste, de duas estrelas que esto a diferentes distncias

  • Ceu. esferA Celeste

    requer a definio de apenas 2 coordenadas. So elas que, como veremos, definem a direo do astro no cu.

    1.5.1 Plano horizontal do observadorO cho do observador tambm precisa ser geometrizado. De um modo geral o cho na superfcie da Terra irregular, com inclinaes, morros e vales. O cho geometrizado a superfcie horizontal do observador (Figura 1.11). Na prtica ele pode ser determinado com um nvel de pedreiro. Essa superfcie perpendicular vertical do observador que pode ser determinada com um fio-de-prumo.

    1.5.2 Horizonte astronmicoO horizonte astronmico ou geomtrico a interseo da superfcie ho-rizontal do observador com a esfera celeste (Figura 1.11). No continente, quase sempre o horizonte astronmico difere do horizonte sensvel. Este tem irregularidades devido a montanhas e vales. No mar a superfcie mais regular devido fluidez que acomoda a superfcie da gua no plano hori-zontal. O horizonte sensvel visto da superfcie da gua (nvel zero) coincide com o horizonte astronmico. J o horizonte sensvel que vemos quanto mais acima do nvel da gua, estar tanto mais rebaixado em relao ao horizonte astronmico, por causa da esfericidade da Terra.

    O horizonte astronmico divide a esfera celeste em dois hemisfrios: o vi-svel (para o observador) que fica acima do horizonte, e o invisvel que fica abaixo do horizonte (Figura 1.11).

    Conclumos esta parte definindo o znite que corresponde direo vertical do observador na esfera celeste (Figura 1.11).

    1.6 Sistema horizontal de coordenadas celestesCom base na geometrizao que acabamos de expor, podemos definir o sistema horizontal de coordenadas celestes. Este um dos sistemas que possibilita quantificar precisamente a posio dos astros na esfera celeste.

    Figura 1.11 (fora de escala). O horizonte astronmico a

    interseo da esfera celeste com a superfcie horizontal do observador. O znite e os hemisfrios celestes que

    ficam acima e abaixo do plano horizontal tambm so

    mostrados

  • 2

    AstronomiA

    Se um astro se move no cu, seu movimento pode ser tambm descrito quantitativamente pelo tabelamento da posio em sucessivos instantes de tempo. Mas, neste sistema de coordenadas celestes, a descrio da posio e movimento dos astros referida ao observador, ou melhor, posio do observador na superfcie da Terra.

    Cada sistema de coordenadas celestes baseia-se num plano fundamental. Neste caso o plano fundamental a superfcie horizontal do observador.

    No plano horizontal o observador dever definir os pontos cardeais (Figura 1.12): N (norte), S (sul), L (leste) e O (oeste). Planos verticais podem ser cons-trudos, todos eles se interceptando na vertical do observador. A interseco dos planos verticais com a esfera celeste define os crculos verticais. Um deles especial: aquele que passa pelos pontos cardeais N e S. Esse o crculo meridiano ou simplesmente meridiano do observador (Figura 1.12).

    Vimos que a posio de um astro na esfera celeste fica perfeitamente definida se especificarmos apenas a sua direo. A sua distncia pode ser ignorada. Portanto precisamos determinar apenas duas coordenadas. No sistema horizontal elas so a altura e o azimute (Figura 1.13). A altura o ngulo medido, a partir do horizonte at o astro, ao longo de um crculo vertical que passa pelo astro. A altura de qualquer objeto no horizonte 0 e no znite, 90.

    O azimute o ngulo medido ao longo do horizonte a partir do S no sentido S-O-N-L. Os azimutes dos pontos cardeais S, O, N e L so, respectivamente, 0, 90, 180 e 270. Alguns autores adotam o N para origem dos azimutes mantendo o mesmo sentido de rotao para a contagem.

    Figura 1.12. So mostrados os pontos cardeais no horizonte do observador. Uma infinidade de planos pode passar pela vertical (seta para cima). A interseo desses planos com a esfera celeste define uma infinidade de crculos verticais, mas a Figura s mostra o crculo vertical que passa pelos pontos cardeais N e S. Esse crculo vertical (em trao mais grosso) o meridiano do observador

  • Ceu. esferA Celeste

    Figura 1.13. Altura e azimute de uma estrela, e o

    almucntar na altura dessa mesma estrela

    Almucntares so crculos da esfera celeste paralelos ao plano horizontal. Num almucntar a altura constante. A Figura 1.13 mostra o almucntar referente altura da estrela exemplificada.

    1.6.1 Medio de ngulosNo contexto da presente discusso, o astrnomo no precisa fazer mais que medir ngulos na esfera celeste. Um mtodo grosseiro, mas que dispensa instrumentos, consiste em estender o brao e considerar que o dedo mnimo subtende 1, o polegar 2 e a largura do punho cerrado, 10 (Figura 1.14).

    Um instrumento simples a balestilha que consiste em duas hastes trans-versais: uma longa na direo da linha-de-visada e graduada; outra mais curta, chamada travessa, que desliza ao longo da primeira (Figura 1.15).

    Figura 1.14. Mtodo simples para medio de ngulos no

    cu

  • AstronomiA

    Com o olho numa ex-tremidade da haste longa e deslizando-se a travessa, o tamanho aparente do objeto ajustado de modo a subtender a travessa. A medida angular do objeto, , em graus, ser dada por

    onde x a distncia

    [mm] medida sobre a haste longa, desde a travessa at onde incide a sua sombra, e y a largura [mm] da travessa.

    A alidade consiste em duas hastes pivotadas numa das extremidades. Uma delas, com nvel de bolha, fica sempre no plano horizontal. A outra apon-tada para o astro atravs de uma mira (par de orifcios ou pnulas). Assim se media a altura dos astros em relao ao horizonte.

    Instrumentos mais sofisticados so os sextantes e quadrantes. Um instrumen-to contemporneo baseado no sistema horizontal de coordenadas e com o qual podemos medir a altura e o azimute dos astros o teodolito.

    Figura 1.15. O observador est usando a balestilha para determinar a altura angular do Sol. direita est representada a superfcie do mar. A travessa est na vertical

  • Ceu. esferA Celeste

    RefernciasBozko, Roberto e Leister, Nelson Vani: Astronomia Clssica, Cap. 3, Astrono-mia, Uma Viso Geral do Universo, 35, Edusp, 2000

    Matsuura, Oscar T.: Atlas do Universo, Editora Scipione, So Paulo, Edio com Errata, 1996

    Matsuura, Oscar T.: Radiao eletromagntica, FICHA DE ASTRONOMIA No.7, 1998 www.observatorio.diadema.com.br e www.revistaastronomy.com.br.

    Matsuura, Oscar T.: Sol: Luminosidade e Temperatura, FICHA DE ASTRO-NOMIA No.11, 1998 www.observatorio.diadema.com.br e www.revistaas-tronomy.com.br.

    Matsuura, Oscar T.: Cu: cenrio de fundo, FICHA DE ASTRONOMIA No.14, 1999, www.observatorio.diadema.com.br e www.revistaastronomy.com.br.

    Matsuura, Oscar T. e Picazzio, Enos: O Sistema Solar, Cap. 6, Astronomia, Uma Viso Geral do Universo, 103, Edusp, 2000

    Sugestes de atividades prticas: Identificar o cu, a terra e o horizonte sensvel numa paisagem

    Observar a olho nu os fenmenos celestes mencionados no texto

    Examinar o funcionamento ptico de uma luneta ou telescpio simples

    Fazer uma observao comparativa de planetas e de estrelas ao teles-cpio e a olho nu

    Observar a cintilao atmosfrica

    Observar a extino da luz estelar perto do horizonte

    Observar a luz solar espalhada pelo cu diurno

    Observar os diferentes brilhos e as diferentes cores estelares

    Com ajuda de uma lmpada incandescente comum distinguir os conceitos de luminosidade e brilho

    Provocar a turbulncia convectiva do ar com um ferro eltrico e ob-serv-la com ajuda de um retroprojetor

    Visualizar o cone de sombra da Terra atravs da observao de satlite artificial

    Determinar com ajuda de um nvel de pedreiro e de um fio-de-prumo o plano horizontal e o znite e visualizar o horizonte astronmico, o meridiano e almucntares

    Determinar a altura e o azimute de astros com um teodolito

    Medir distncias angulares

  • Nesta aula trataremos da influncia da rotao e da forma da Terra nas ob-servaes astronmicas. Discutiremos o movimento diurno e a orientao na Terra definida pelo eixo de rotao da Terra. Aproveitaremos a oportunidade para introduzir a noo de estrelas fixas. Em seguida apresentaremos um novo sistema de referncia que decorre naturalmente da rotao da Terra: o sistema equatorial de coordenadas celestes. Por fim, descreveremos a influncia da forma da Terra delimitando o hemisfrio celeste visvel e alterando a inclinao dos crculos do movimento diurno em diferentes latitudes do globo; e a influncia do tamanho da Terra possibilitando a medio da paralaxe diurna.

    2.1 Rotao da TerraOs dados brutos ou diretos da observao astronmica nos revelam o movimento aparente dos astros. assim que os astrnomos designam o movimento dos astros tal como ele aparece aos nossos sentidos. No h no adjetivo aparente nenhuma conotao pejorativa como se tratasse de algo falso. A observao do movimento aparente cientificamente vlida e objetiva. Mas, nem sempre o movimento aparente o movimento do astro em relao a ns, na suposio ingnua e intuitiva de que somos ob-servadores em repouso, seno o reflexo do nosso prprio movimento. o caso da rotao diurna da esfera celeste, reflexo da rotao da Terra; ou do movimento anual do Sol na eclptica, reflexo da translao da Terra ao redor do Sol. Para o movimento ser descrito nos devidos termos, o movimento aparente precisa ser interpretado luz da relatividade do movimento.

    2.1.1 Relatividade do movimentoAt a publicao de De Revolutionibus Orbium Coelestium de Nicolau Coprnico (1473-1543), pensava-se que a Terra estivesse imvel no espao e que, portanto, os fenmenos celestes eram observados por ns de um sistema de referncia em repouso absoluto. Pensava-se que a nossa posio no Universo era privilegiada e que todos os astros moviam-se ao nosso re-dor. Na verdade, a Terra no s no est parada, mas tem um movimento

    TERRA: ROTAO E FORMA

    Na Astronomia, extrapolar as escalas domsticas,

    realizar a passagem ao limite quando x

  • AstronomiA

    complexo. Sendo inelutavelmente arrastados pelo seu movimento, ao ob-servarmos os astros, acabamos enxergando neles um movimento que, em boa parte, o nosso prprio movimento!

    Qualquer movimento que observemos sempre relativo ao nosso prprio movimento. Esse o enunciado da relatividade do movimento. Este fato pode ser atestado empiricamente quando andamos de carro numa estra-da. Se andamos a 100 km/h atrs de outro veculo que corre nessa mesma velocidade, estamos parados em relao a ele. Se um outro veculo vem no sentido contrrio nessa mesma velocidade, estaremos a 200 km/h em relao a ele. Porm, esta simples regra da soma vetorial das velocidades, s vale quando as velocidades envolvidas so muito menores do que a velocidade da luz (ver a caixa ao lado). Apesar das velocidades vertiginosas dos astros, eles ainda se movem muito mais devagar do que a luz. Assim, o movimento dos astros que observamos no cu um caso da mecni-ca clssica, pois, no envolve velocidades relativsticas. A seguir destacaremos uma im-portante componente do movimento da Ter-ra: a rotao.

    2.1.2 Movimento diurno da esfera celesteEm nossas latitudes ve-mos astros que nascem no horizonte leste (ver caixa ao lado), descrevem um crculo sobre as nos-sas cabeas, e se pem no horizonte oeste. Isso acontece com o Sol, a Lua, os planetas e as estrelas. Temos a impresso de que somos estacionrios e que os astros descrevem o movimento diurno em torno de ns.

    Na verdade, o movimento diurno um movimento aparente que resulta da rotao da Terra. Por causa da relatividade do movimento, a mera obser-vao do movimento diurno do cu no nos fornece nenhuma informao para sabermos se a Terra que gira de oeste para leste, ou se a esfera celeste que gira no sentido oposto. So observaes independentes que atestam que a Terra gira de oeste para leste. Um experimento clssico o do pndulo de Foucault (1819-68). Para entend-lo precisamos conceber a

    Teoria Especial da RelatividadeEmbora seja contra-intuitivo, um fato estabe-lecido experimentalmente que a velocidade luz independe do movimento relativo entre a fonte de luz e o observador. Esse fato a base da Te-oria Especial da Relatividade proposta em 1905 por Albert Einstein (1879-1955). Essa Teoria trata da influncia do movimento do sistema de referncia do observador na medio do espao e do tempo, trazendo novos resultados no caso de objetos que se movem a velocidades relativsticas, isto , prximas da luz.

    A expresso horizonte leste ou oeste no equi-valente a ponto cardeal leste ou oeste. Enquanto o ponto cardeal se refere a uma direo precisa, horizonte denota um setor de certa amplitude, no qual os astros nascem nas proximidades do leste, ou se pem nas proximidades do oeste.

  • terrA: rotAo e formA

    direo do plano de oscilao do pndulo como invariante, ou seja, ela no influenciada pela rotao da Terra apesar de o pndulo estar apoiado na superfcie da Terra (Figura 2.1). Mais modernamente pudemos atestar que a Terra gira atravs de observaes diretas feitas no espao.

    A rotao no um privilgio do nosso Planeta. uma propriedade pratica-mente universal de todos os astros. No Sistema Solar o sentido de rotao da Terra, de oeste para leste, tambm o sentido de rotao do Sol e do mo-vimento orbital dos planetas. Excetuando alguns casos, tambm o sentido usual da rotao dos planetas e do movimento orbital dos seus satlites.

    O movimento aparente no cu de oeste para leste direto e o movimento no sentido contrrio e retrgrado.

    2.1.3 Eixo da TerraPelo fato de que a Terra gira, segue-se que ela possui um eixo de rotao com orientao definida no espao. Essa orientao tem importncia fun-damental para a nossa orientao na Terra e para a Astronomia. Portanto os pontos cardeais so uma decorrncia da rotao da Terra e no correto ensinar os pontos cardeais sem falar antes da rotao da Terra.

    Os plos da Terra so os pontos em que o eixo de rotao fura a superfcie da Terra. O equador o plano perpendicular ao eixo de rotao que passa pelo centro da Terra. Com base no equador e nos plos so definidos os paralelos e meridianos terrestres na superfcie da Terra, os primeiros orien-tados na direo leste-oeste e os ltimos na direo norte-sul.

    O prolongamento do eixo da Terra fura a esfera celeste nos plos celestes norte e sul (Figura 2.2). A interseo do plano equatorial da Terra com a esfera celeste define o equador celeste (Figura 2.2). O equador celeste divide a esfera celeste nos hemisfrios celestes norte e sul, correspondentes aos hemisfrios da Terra com os mesmos nomes.

    Figura 2.1. A orientao do plano de oscilao

    do Pndulo de Foucault, representada em cinza,

    deve ser invariante. Essa invarincia assegurada pela homogeneidade e

    simetria do pndulo, do fio de suspenso etc. Assim, a oscilao no afetada

    por foras externas. Como a base circular debaixo do pndulo o cho que gira

    com a Terra, a orientao do plano de oscilao girar em

    relao ao cho

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    AstronomiA

    Numa ilustrao astronmica como esta de suma importncia a indicao de que ela est fora de escala. No teria sentido essa advertncia se fosse possvel fazer uma ilustrao em escala. Mas isso simplesmente impossvel. Ou a Terra teria que ser reduzida a um objeto invisvel, ou a esfera teria que ser ampliada a dimenses muito maiores do que a pgina do texto.

    2.1.4 Perodo de rotao da TerraO perodo de rotao da Terra no 24h como encontramos muitas vezes, mas 23h 56m 04,09053s. A durao de 24h do dia solar mdio, um valor mdio dos dias solares verdadeiros ao longo do ano (trpico). Os dias solares verdadeiros so desiguais. Para cronometr-los teramos que acelerar nossos relgios quando o dia fosse mais curto, e vice-versa. Para evitar essa inconvenincia prtica, criou-se o dia solar mdio que fictcio e tem durao constante de 24h. O verdadeiro perodo de rotao da Terra no pode ser medido em relao ao Sol que, por sua proximidade, no permanece fixo na esfera celeste. Deve ser medido em relao s estrelas distantes. O tempo para que uma mesma estrela distante cruze duas vezes sucessivas o meridiano do observador (aula anterior), o dia sideral. Este, sim, corresponde ao perodo de rotao da Terra no espao. Chama-se passagem meridiana o fenmeno em que um astro em seu movimento diurno cruza o meridiano do observador.

    2.1.5 Pontos cardeaisA determinao local dos pontos cardeais uma atividade prtica funda-mental na Astronomia. J vimos a importncia desses pontos no sistema horizontal de coordenadas celestes. O termo pontos no apropriado, pois, trata-se de direes. Todavia ele mantido pela fora da tradio. H mtodos precisos para a determinao dos pontos cardeais fazendo uso do teodolito. Com ele o meridiano pode ser determinado na culminao de algum astro. Na culminao o astro em seu movimento diurno atinge a altura mxima em relao ao horizonte.

    Mas h mtodos aproximados de execuo rpida e que dispensam equipa-mentos sofisticados. Um deles diurno e faz uso do gnmon (ou haste vertical)

    Figura 2.2 (fora de escala). Os plos e o equador celestes so as projees na esfera celeste dos plos e do equador da Terra

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    terrA: rotAo e formA

    que deve ter cerca de 1 m de altura. Tendo o gnmon sido espetado vertical-mente no cho horizontal em A (Figura 2.3), a sombra da sua extremidade projetada pelo Sol marcada no cho antes do meio-dia em B (Figura 2.3). Com um cordo pode-se traar um crculo centrado em A, cujo raio seja igual a AB (crculo pontilhado na Figura 2.3). Deve-se esperar o momento aps o meio-dia em que a sombra da ponta do gnmon volte a incidir sobre o crculo (C na Figura 2.2). O mesmo crculo desenhado antes deve ser redesenhado duas vezes, uma vez com centro em B e outra com centro em C. Os crculos se interceptaro em A (j conhecido) e D. O segmento de reta AD estar na direo norte-sul. A perpendicular a AD estar na direo leste-oeste. Na data do equincio o Sol se encontra no equador celeste, e a sombra da ponta do gnmon j descreve uma reta na direo leste-oeste.

    Nos demais dias a trajetria da sombra tem um encurvamento, mas sempre a sombra tem o menor comprimento na direo norte-sul.

    Outro procedimento rpido consiste em utilizar uma bssola, porm deve-se conhecer a declinao magntica, ou seja, o ngulo de desvio entre o ponto cardeal norte1 e o norte magntico. A declinao magntica varia de lugar para lugar e com o tempo. No Brasil, o ponto cardeal norte est entre 10 e 20 para leste do norte magntico (Figura 2.4). O valor preciso da declinao magntica pode ser obtido junto ao Departamento de Ge-ofsica do Observatrio Nacional do Rio de Janeiro. Em So Paulo o norte verdadeiro est cerca de 20 a leste do norte magntico.

    Figura 2.3. Mtodo prtico para a determinao dos

    pontos cardeais

    1O ponto cardeal norte tambm designado norte verdadeiro ou

    norte geogrfico.

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    AstronomiA

    2.2 Estrelas fixasEste um momento oportuno para introduzirmos a noo de estrelas fixas, pois para bem entend-la devemos abstrair o movimento diurno que acabamos de discutir. Como vimos, o movimento diurno consiste na aparente rotao global da esfera celeste. Esse movimento global ou coletivo no afeta em nada a posio relativa entre os astros. Conseqen-temente, tambm no deforma as constelaes. Portanto, quando falamos de estrelas fixas, estamos nos referindo permanncia do desenho das constelaes e fixidez da posio relativa das estrelas na esfera celeste. Mesmo que essa esfera gire em seu movimento diurno, as estrelas fixas so denominadas fixas porque aparentam estar permanentemente coladas esfera celeste. Tudo se passa como se a esfera celeste tivesse colado a ela um cenrio permanente de estrelas fixas.

    As estrelas fixas tinham impressionado tanto os antigos que as colocavam na ltima e mais externa das esferas cristalinas chamada Firmamento. Dife-rentemente da esfera celeste que um artifcio mental, as esferas cristalinas eram tidas como reais.

    Mas nem todos os astros so estrelas fixas. Fixos aparentam ser os astros que se encontram muito longe de ns, tais como as estrelas visveis noite. Em relao ao pano-de-fundo das estrelas fixas movem-se os astros que se encontram mais perto2 de ns. Esses astros so os membros do Sistema Solar: Sol, Lua, os planetas e os cometas. Por no serem fixos na esfera celeste, esses astros no se prestam para a determinao do dia sideral. O deslocamento em relao s estrelas fixas pode ser devido ao movimento prprio e paralaxe sobre os quais falarei mais adiante.

    Constelaes so ajuntamentos de estrelas na esfera celeste a que foram arbitrariamente atribudas formas de objetos, monstros ou heris mitol-gicos. Raramente podemos achar que essas formas sejam apropriadas. O Cruzeiro do Sul, o Escorpio e o Tringulo Austral so algumas das poucas excees. Em geral a configurao resulta de mero efeito de perspectiva. Se estivssemos em outro local do Universo, as figuras seriam diferentes. Mas

    2Perto no contexto astronmico.

    Figura 2.4. No Brasil o norte geogrfico est desviado entre 10 e 20 para leste do norte magntico indicado pela bssola.

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    h ajuntamentos de estrelas que consistem em aglomerados reais de estrelas com parentesco fsico. o caso dos aglomerados estelares das Pliades e Hades, ambos pertencentes constelao do Touro. Em cada aglomerado estelar as estrelas nasceram junto de uma mesma nuvem interestelar, e se encontram mesma distncia de ns.

    Em 1930 a Unio Astronmica Internacional oficializou a diviso da esfera celeste em 88 constelaes.

    2.2.1 Movimento prprioO movimento de um astro no espao se decompe em (Figura 2.5): (i) mo-vimento prprio que se projeta na esfera celeste como um deslocamento angular; e (ii) movimento radial, isto , ao longo da linha-de-visada, que no produz projeo na esfera celeste. O movimento radial pode ser medido atravs do efeito Doppler (ver seo 5.1.4 adiante) em linhas espectrais ou, no caso de objetos do Sistema Solar, por meio de sinais de radar ou da variao do tamanho angular.

    As estrelas distantes realizam no espao movimentos no muito diferentes daqueles realizados pelo Sol. Mas, para um mesmo deslocamento linear, perpendicular linha de visada, correspondente um deslocamento angular inversamente proporcional distncia (Figura 2.6).

    A distncia das estrelas vistas noite sempre muito, muito maior que a dis-tncia do Sol e de outros objetos do Sistema Solar. Por isso o deslocamento angular delas, ou movimento prprio, tende a se tornar imperceptvel.

    Uma forma dramtica de visualizar o movimento prprio de astros do Sis-tema Solar notar que, sendo eles o objeto de interesse, aparecem fixos na parte central das fotografias astronmicas. No entanto as estrelas de fundo aparecem em rastros luminosos, tanto mais longos quanto mais longo for o tempo de exposio (Figura 2.7).

    2.2.2 ParalaxeAlm do deslocamento na esfera celeste causado pelo movimento do astro no espao, devemos considerar o seu deslocamento aparente devido ao movimento do observador (ou da Terra). Este o efeito da paralaxe. Po-demos visualizar a paralaxe colocando um lpis em p nossa frente com um brao estendido. Ao olharmos o lpis alternada-mente com o olho

    Figura 2.5. Mostra-se um cone que abrange uma

    pequena poro da esfera celeste (em cinza). Um astro

    se move no espao de A para B. A projeo desse

    movimento na esfera celeste o movimento prprio AB. A componente radial desse

    movimento BB

    Figura 2.6. As duas setas duplas representam o mesmo deslocamento

    linear a distncias diferentes do observador. O ngulo

    subtendido inversamente proporcional distncia e,

    por isso, < . Quando a distncia se torna muito

    grande ( ), o ngulo se torna muito pequeno,

    desprezvel (= 0)

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    AstronomiA

    direito, depois com o esquerdo, veremos o lpis se projetando em direes diferen-tes sobre o cenrio de fundo. A mudana de direo do objeto devido mudana da posio do observador (olho direito e olho es-querdo), a paralaxe. A paralaxe de estrelas (Figura 2.8) pode ser medida entre dois pontos de uma linha-de-base separados de 2 UA (UA a distncia mdia da Terra ao Sol que vale aproximadamente 150 milhes km). Uma observao feita numa data e a outra, seis meses depois, quando a Terra se encontra na posio diametralmente oposta primeira. Somente para estrelas muito prximas a paralaxe pode ser medida desta forma. Em 1838 a primeira paralaxe estelar de cerca de 0,3 foi medida pelo alemo Friedrich Wi-lhelm Bessel com a estrela 61 do Cisne.

    Estrelas fixas so portanto aquelas que se encontram to longe que no apresentam nem movimento prprio, nem paralaxe. As estrelas mais pr-ximas podem apresentar paralaxe e movimento prprio.

    2.3 Sistema equatorial de coordenadas celestesAssim como as localidades na superfcie da Terra so definidas pelas coorde-nadas geogrficas: latitude e longitude, assim tambm na esfera celeste a posio dos astros pode ser definida pelas coordenadas celestes equato-riais. Conforme o nome indica, este sistema tem como plano fundamental o equador da Terra. Os meridianos da Terra tm como contrapartida celeste os meridianos celestes e os paralelos da Terra, os paralelos celestes. As coordenadas de um astro neste sistema so: declinao e ngulo horrio. A declinao medida ao longo do meridiano celeste que passa pelo astro, sempre a partir do equador celeste. As declinaes do hemisfrio celeste

    Figura 2.7. Atrs do cometa Giacobini-Zinner fotografado em 1959, traos deixados pelas estrelas de fundo (Chaisson and McMillan, Astronomy, Prentice Hall, 1998, 112)

    Figura 2.8 (fora de escala). A Terra orbita ao redor do Sol. A observao da mesma estrela feita quando a Terra est em A e, depois, em B. A mudana de direo sob a qual a estrela vista a paralaxe. A paralaxe o ngulo indicado na Figura, cuja linha-de-base tem 1 UA. Quando esse ngulo vale 1, a distncia da estrela 1 parsec 3,26 AL.

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    norte so positivas e as do hemisfrio sul, negativas. O ngulo horrio medido de 0h a 24h ao longo do equador celeste, a partir do meridiano do observador at o meridiano celeste do astro caminhando para oeste.

    O ngulo horrio uma medida referida ao local do observador. Mas ela pode assumir carter universal e as coordenadas celestes equatoriais passaro a ser declinao e ascenso reta (Figura 2.9). A contagem da ascenso reta feita para o leste, a partir do ponto vernal ou , aquele ponto do equador celeste que o Sol cruza vindo do hemisfrio celeste sul quando ocorre o equincio de outono no nosso hemisfrio. Sobre esse ponto teremos opor-tunidade de falar mais adiante.

    De acordo com as explicaes acima, fcil concluir que a distncia zenital de um astro na passagem meridiana

    0 =

    sendo a latitude geogrfica local. Distncia zenital positiva significa que o astro est ao norte do znite, e vice-versa.

    Conhecendo o ngulo horrio, H, de um astro e a sua ascenso reta, , saberemos a hora sideral local S:

    S = +

    Vemos assim que a hora sideral local o ngulo horrio do ponto vernal (=0h) ou a ascenso reta do astro que est cruzando o meridiano local (H=0h).

    2.4 Forma da TerraA Terra no perfeitamente esfrica, mas sensivelmente esfrica. A principal deformao consiste no achatamento dos plos e no aparecimento de um bojo equatorial. Essa deformao causada pela rotao. Alm disso, h uma distribuio no simtrica de massa que faz com que a Terra tenha a forma que lembra uma pera.

    Figura 2.9. Sistema equatorial de coordenadas celestes. O plano fundamental o equador. Com base nele

    define-se os plos celestes. A posio de uma estrela

    especificada pela declinao e ascenso reta . A

    trajetria do Sol na esfera celeste a eclptica aqui

    representada apenas para definir a localizao do ponto

    vernal

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    AstronomiA

    2.4.1 Plano horizontal tangente superfcie da TerraEm relao Terra considerada como um Planeta sensivelmente esfrico, a superfcie horizontal do observador um plano tangente Terra no local do ob-servador. Se a Terra fosse perfeitamente esfrica, o prolongamento das verticais de observadores postados em diferentes pontos da Terra sempre convergiriam no centro da Terra (Figura 2.10). Mas isso no ocorre porque, como j dis-semos, a Terra no perfeitamente esfrica. O prolongamento das verticais de alguns pontos da Terra (principalmente de latitudes intermedirias) no cruza o centro da Terra (Figura 2.10). Na prtica, porm, cada observador deve determinar o seu plano horizontal com o nvel de bolha e a sua verti-cal com o fio-de-prumo. A latitude assim determinada astronomicamente fornece a latitude geogrfica que usada nos mapas e atlas.

    fcil perceber que a orientao do plano horizontal depende de lugar para lugar. Uma vez que esse plano delimita o hemisfrio celeste visvel, conclui-se que esse hemisfrio diferente de um lugar para outro (Figura 2.11). Por exemplo, o hemisfrio visvel por um observador no plo norte complementar ao he-misfrio visvel por um observador no plo oposto. Um observador no equador tem o privilgio de poder ver os dois plos celestes ao mesmo tempo. O hemisfrio celeste visto no equador na longitude ser complementar ao visto no mesmo instante tambm no equador, na longitude + 180. Esta uma das conseqncias da forma da Terra. Os navegadores do sculo XV j sabiam que as diferentes constelaes do hemisfrio sul eram uma conseqncia da esfericidade da Terra.

    2.4.2 Paralaxe diurnaO fato de a Terra girar e ter um raio equatorial de cerca de 6380 km, tambm possibilita a medio da paralaxe. Com efeito, num intervalo de tempo de 12 horas, um observador que permanece na mesma localidade transportado, pela rotao da Terra, de uma extremidade a outra de uma linha de base cujo

    Figura 2.10. esquerda, uma Terra idealmente esfrica. Nela os prolongamentos das verticais se interceptam no centro. direita a Terra achatada. Os prolongamentos das verticais de latitudes intermedirias j no passam pelo centro

    Figura 2.11 (fora de escala). So mostrados os planos horizontais de 4 observadores, 2 nos plos e 2 no equador em longitudes diametralmente opostas

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    terrA: rotAo e formA

    Figura 2.12. Um observador se encontra numa latitude sul,

    como a de So Paulo, SP. O plo celeste que fica acima do

    horizonte o sul. Sua altura igual ao valor absoluto da

    latitude j que, como a Figura acima nos mostra, esses

    dois ngulos tm os lados perpendiculares entre si. O

    plo celeste est representado por uma paralela ao eixo da

    Terra. De fato, duas paralelas apontam para a mesma

    direo na esfera celeste e a distncia que as separa

    desprezvel em relao ao raio da esfera celeste

    Figura 2.13. mostrada a direo do plo celeste sul

    comprimento comparvel ao raio da Terra. Essa paralaxe chamada paralaxe diurna. Ela foi til somente para os objetos mais prximos do Sistema Solar. Para astros mais distantes ela pode ser ignorada. Para uma linha-de-base igual ao raio da Terra a paralaxe da Lua 57 e a do Sol, 8,79.

    2.4.3 Localizao do plo celesteEm qualquer lugar que seja feita uma observao astronmica, importante localizar o plo celeste. Afinal em torno dele que a esfera celeste realiza o movimento diurno. Somente estando no equador da Terra que podemos ter acesso simultneo aos dois plos celestes. Fora dele, o plo visvel acima do horizonte o correspondente ao hemisfrio geogrfico do observador.

    Por consideraes geomtricas elementares podemos concluir que o plo celeste tem as seguintes coordenadas horizontais: o azimute o ponto cardeal norte ou sul, dependendo do hemisfrio do observador. A altura igual ao valor absoluto da latitude geogrfica (Figura 2.12).

    A Figura 2.13 ilustra a situao acima descrita no local do observador. O eixo que aponta para o plo celeste chamado eixo polar.

    A haste mais longa da constelao do Cruzeiro do Sul est orientada aproxi-madamente na direo norte-sul. Uma vez que essa constelao descreve um crculo ao redor desse plo, a extremidade sul dessa haste aponta sempre para o plo celeste sul. Se numa noite traarmos o prolongamento dessa haste em vrias observaes, esses prolongamentos se interceptaro num ponto no cu que estar prximo do plo celeste sul. Esse ponto pode ser encontrado tambm prolongando-se a haste mais longa do Cruzeiro para o sul cerca de 5 vezes.

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    AstronomiA

    2.4.4 Movimento diurno em diferentes latitudesNo movimento diurno os astros descrevem crculos na esfera celeste em torno do eixo da Terra. Portanto os planos desses crculos so paralelos ao equador, ou perpendiculares ao eixo dos plos. O movimento diurno difere de um local para outro em funo das diferentes inclinaes do eixo polar (Figura 2.14). Por exemplo, no equador da Terra os crculos so verticais, isto , no tombam nem para o norte, nem para o sul. J nas latitudes intermedirias do nosso hemisfrio, esses crculos ficam tombados para o norte. Nos plos, eles so horizontais.

    Com ajuda da Figura 2.14 podemos perceber tambm que, no equador, podemos observar estrelas com quaisquer valores de declinao, desde o plo celeste norte (90) at o plo celeste sul (-90). L todas as estrelas nascem e se pem no horizonte, exceo de algum astro que esteja exa-tamente num plo celeste.

    No plo sul, s podemos observar estrelas do respectivo hemisfrio celeste, ou seja, com declinao entre 0 (equador celeste) e 90 (plo celeste sul). L nenhum astro nasce ou se pe no horizonte. Todos so circumpolares, ou seja, do volta ao redor do plo celeste sem nunca se esconderem abaixo do horizonte.

    Numa latitude intermediria do hemisfrio sul no podemos observar estrelas que estejam na esfera celeste ao norte da declinao igual ao complemento do valor absoluto da latitude (Figura 2.15). P. ex., se a latitude -23, no podemos enxergar estrelas com declinao > (90-23) = 67. Essa priva-o tem uma compensao. Pois, se olharmos para a Figura 2.15, podemos perceber que h uma calota da esfera celeste (em preto) ao redor do plo celeste, cujas estrelas so circumpolares. Para a mesma latitude de -23, a declinao das estrelas dessa calota -90 -(90-23) = -67.

    Figura 2.14. O movimento diurno da esfera celeste em diferentes latitudes. Esse movimento consiste em crculos concntricos ao eixo de rotao da Terra (linha grossa). As setas indicam o sentido do movimento. Nos plos no se definem os pontos cardeais. Ao redor do plo celeste sul os astros descrevem crculos no sentido horrio. Ao redor do plo celeste norte eles descrevem crculos no sentido anti-horrio.

    Figura 2.15. Calota circumpolar ao redor do plo celeste para um observador numa latitude intermediria sul

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    Referncias:Bozko, Roberto e Leister, Nelson Vani: Astronomia Clssica, Cap. 3, Astronomia, Uma Viso Geral do Universo, 35, Edusp, 2000

    Matsuura, Oscar T.: Atlas do Universo, Editora Scipione, So Paulo, Edio com Errata, 1996

    Matsuura, Oscar T.: Cu: cenrio de fundo, FICHA DE ASTRONOMIA No.14, 1999 www.observatorio.diadema.com.br e www.revistaastronomy.com.br.

    Matsuura, Oscar T.: Movimento diurno dos astros, FICHA DE ASTRONOMIA No.15, 1000 www.observatorio.diadema.com.br e www.revistaastronomy.com.br.

    Sugestes de atividades prticas: Realizar um experimento simples que evidencie a relatividade do

    movimento

    Observar e comparar o movimento diurno do Sol, da Lua e de estrelas fixas

    Medir mentalmente (Gedanken) o ngulo subtendido pelo movimento prprio e paralaxe de um objeto distante

    Visitar um Pndulo de Foucault

    Medir o dia sideral

    Determinar os pontos cardeais com um gnmon e com uma bssola

    Medir a paralaxe na paisagem terrestre

    Manusear um telescpio com montagem equatorial

    Comparar as coordenadas celestes equatoriais com as coordenadas geogrficas com a ajuda de um globo terrestre e de um globo celeste

    Ver uma Esfera Armilar

    Localizar o plo celeste

    Fotografar estrelas circumpolares

  • O Sol ocupa lugar de destaque dentre todos os astros observveis. Para incio de conversa, ele o mais brilhante de todos, e a ele devemos a claridade diurna, o aquecimento e a dinamizao da vida na Terra.

    Apesar de ser visvel de dia, e somente de dia, o Sol uma estrela. Ele a estrela do Sistema Solar. Isto significa que o Sol irradia luz prpria, pois tem dentro uma usina geradora de energia. Essa usina realiza reaes de fuso nuclear: quatro ncleos de hidrognio formam um de hlio. Como o produto da fuso tem massa menor que os ingredientes, conquanto essa diferena seja nfima, h um desaparecimento de massa ou matria. Essa massa desaparecida convertida em energia segundo a famosa equao de Einstein E = mc2 onde c a velocidade da luz.

    O Sol concentra 99,866% de toda a massa do Sistema Solar. Por isso ele mantm orbitando ao seu redor os planetas, seus satlites, asterides e cometas, atravs da atrao gravitacional.

    Considerando que a luz se propaga no vcuo a uma velocidade constante c 300 mil km/s, podemos quantificar distncias astronmicas pelo tempo gasto pela luz para percorr-las. Assim se define o ano-luz (AL), distncia percorrida pela luz durante 1 ano trpico (ver adiante). 1 AL = 63.280 UA 9,5 trilhes km (UA: Unidade Astronmica, a distncia mdia da Terra ao Sol, cerca de 150 milhes km). A luz do Sol demora 8 minutos para chegar Terra e 05h 27m para chegar ao planeta mais afastado, Pluto. Por outro lado, a estrela mais prxima (Proxima do Centauro, uma companheira de do Centauro) est a 4,3 AL. Adotando a distncia de Pluto ao Sol para caracterizar o tama-nho do Sistema Solar, a grande discrepncia temporal entre 05h 27m e 4,3 anos nos mostra quo paroquial o Sistema Solar na Galxia, e quo isolado estamos do resto do Universo. Por isso podemos dizer com propriedade que o Sistema Solar o nosso lar, e o Sol a nossa estrela.

    Nesta aula falaremos dos movimentos diurno e anual do Sol, cujos ciclos nos levam naturalmente s vrias definies de dia e ano, ao tema dos ca-lendrios e a um novo movimento da Terra alm da rotao e translao: a

    SOL: MOVIMENTO APARENTE

    Aparente subjetivo, i., dependente do observador,

    mas no falso

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    AstronomiA

    precesso. Sendo o Sol uma estrela, falaremos de suas propriedades globais, origem e evoluo numa outra aula, mas falaremos aqui da atividade solar que rege as relaes solares-terrestres.

    Por ser muito importante sobretudo para educadores e divulgadores, fa-zemos aqui uma breve, porm, necessria advertncia sobre os perigos potenciais da observao inadequada do Sol. Por causa de seu brilho muito intenso, o Sol nunca deve ser encarado diretamente, ainda que por uma frao de segundo. Os riscos so de leso irreversvel nos olhos e at mes-mo cegueira. Os movimentos do Sol podem ser observados indiretamente atravs da sombra do gnmon, ou de sua imagem projetada num recinto escuro por meio de um orifcio ou de um pequeno espelho plano. Para a observao do disco solar h filtros recomendveis, como o de mylar dupla-mente aluminizado (importado) ou de culos de soldador No.14. Negativos fotogrficos, principalmente os coloridos, radiografias, vidros esfumaados, insulfilm, culos escuros etc no so recomendados. O disco solar pode ser observado de forma segura para os olhos se for projetado num anteparo. Mas o brilho solar to intenso que cuidado redobrado necessrio para no danificar tambm os instrumentos pticos.

    3.1 Movimento aparente do SolO Sol uma estrela, mas no uma estrela fixa, pois est muito perto da Terra. Portanto ele se desloca em relao s estrelas fixas de fundo. Para compreendermos esse movimento podemos considerar o Sol estacionrio e a Terra orbitando ao seu redor. O movimento aparente do Sol resulta do movimento orbital da Terra (Figura 3.1).

    A trajetria do Sol na esfera celeste tambm chamada eclptica. O termo eclptica, de origem grega, tem a mesma raiz de eclipse. Na prxima aula veremos que os eclipses do Sol e da Lua s ocorrem quando, alm da Terra e do Sol, a Lua tambm se encontra na eclptica ou perto dela.

    Podemos converter a representao heliocntrica da Figura 3.1 numa repre-sentao centrada no observador (Figura 3.2).

    Figura 3.1 (fora de escala). A rbita da Terra ao redor do Sol a curva tracejada. O plano dessa rbita (plano do papel) chamado plano da eclptica. Quando a Terra se encontra no ponto 1, o observador v o Sol projetado na esfera celeste em 1. Quando a Terra se encontra no ponto 2, o observador v o Sol projetado em 2, e assim por diante. Quando a Terra completa um giro em sua rbita, o movimento aparente do Sol tambm completar um giro na esfera celeste.

  • sol: movimento ApArente

    3.1.1 Trajetria do Sol na esfera celeste: EclpticaVejamos como se orienta a eclptica na esfera celeste, no sistema equatorial de co-ordenadas (Figura 3.3). O observador continua no centro da esfera celeste. Ali desenhamos o globo terrestre apenas para ajudar a visualizao do equador.

    A obliqidade da eclptica pode variar at 1,3 numa escala de tempo que vai de centenas a milhares de anos. H indicaes de que a Lua exerce uma estabilizao na orientao do eixo da Terra. No fosse ela, a variao poderia chegar a 25, o que j comprometeria a sobrevivncia da vida na Terra dos organismos mais complexos.

    O movimento aparente anual do Sol ao longo da eclptica est diretamente relacionado com a sucesso das estaes do ano. Vemos na Figura 3.3 que metade da eclptica fica no hemisfrio celeste norte (lado direito) e metade no hemisfrio sul (lado esquerdo). H dois pontos em que a eclptica intercepta o equador celeste. Eles so diametralmente opostos. A passagem do Sol por esses pontos o equincio. No ponto voltado para o leitor, o Sol passa do hemisfrio celeste sul para o norte, e o ponto vernal do qual falamos na aula anterior. Esse ponto foi adotado para o incio da contagem da ascenso reta. A passagem do Sol pelo ponto o equincio de outono no nosso hemisfrio (equincio da primavera no hemisfrio norte). A passagem do Sol pelo ponto diametralmente oposto o equincio da primavera no nosso hemisfrio (equincio de outono no hemisfrio norte). Notar, portanto, a inverso das estaes do ano em relao aos hemisfrios norte e sul da Terra.

    Figura 3.2. O observador no centro da esfera celeste v o movimento aparente do Sol projetado na esfera celeste

    Figura 3.3. O plano da rbita da Terra no coincide

    com o plano do equador, mas eles formam entre si um ngulo de 23,43

    chamado obliqidade da eclptica. Portanto, o eixo

    da Terra no coincide com a perpendicular eclptica, mas desvia-se dela 23,43.

    Medidas aproximadas da obliqidade da eclptica podem ser obtidas com um gnmon. Os globos

    terrestres didticos tm o eixo obliquo, devendo ser subentendido que o plano

    da mesa representa o plano da eclptica. As setas na

    Figura indicam o sentido do movimento aparente do Sol

  • AstronomiA

    Na eclptica representada na Figura 3.3 podemos notar outros dois pontos diametralmente opostos nos quais o Sol atinge a mxima declinao para o norte (lado direito) e para o sul (lado esquerdo). A passagem do Sol por esses pontos o solstcio. A linha que une esses dois pontos perpendicular reta que une os dois pontos dos equincios. O termo solstcio vem do latim e significa Sol estacionrio, ou seja, o Sol pra de continuar caminhan-do para o norte, ou para o sul, a fim de inverter o sentido do movimento. A passagem do Sol pela sua mxima declinao norte ( = +23,43) o solstcio de inverno no nosso hemisfrio (de vero no hemisfrio norte). A passagem pela mxima declinao sul ( = -23,43) o solstcio de vero no nosso hemisfrio (de inverno no hemisfrio norte).

    A passagem do Sol pelos pontos de solstcio e de equincio define as es-taes do ano. As estaes do ano na seqncia cronolgica so: prima-vera, vero, outono e inverno. H uma inverso das estaes em relao aos hemisfrios norte e sul. Para a seqncia acima no nosso hemisfrio corresponde a seqncia outono, inverno, primavera e vero no hemisfrio norte. Daqui em diante, a menos que avisemos o contrrio, estaremos nos referindo s estaes do nosso hemisfrio.

    A primavera comea no equincio da primavera e termina no solstcio de vero. O vero comea no solstcio de vero e termina no equincio de outono. O outono comea no equincio de outono e termina no solstcio de inverno. O inverno comea no solstcio de inverno e termina no equincio da primavera.

    3.1.2 Movimento diurno do Sol. Dia solarJ vimos que o dia sideral, o verdadeiro perodo de rotao da Terra, me-dido em relao s estrelas fixas. O dia solar medido em relao ao Sol. fcil concluir que o dia solar no tem a mesma durao do dia sideral, pois o Sol no permanece fixo na esfera celeste, mas se desloca ao longo da eclptica. A Figura 3.4 ilustra isso.

    Figura 3.4 (fora de escala). O plano do papel representa o plano orbital da Terra ou a eclptica. A reta que une o Sol Terra na posio 1 indica a passagem meridiana do Sol para um observador na Terra indicado com uma bolinha preta. Passado 1 dia sideral, a Terra estar em 2 quando ocorrer a passagem meridiana daquele ponto da esfera celeste em que o Sol se encontrava no dia anterior. Mas o Sol no estar mais l. Para ocorrer a passagem meridiana do Sol, a Terra precisar girar e caminhar um pouco mais. Ao se deslocar de 2 para 3, a Terra girar de um ngulo adicional3 (indicado na Figura) para que ocorra a passagem meridiana do Sol. Por isso o dia solar mais longo que o dia sideral, mas as coisas se inverteriam se, por exemplo, a Terra girasse no sentido oposto

    3Considerando o nmero de dias do ano, vemos que esse ngulo adicional, igual ao arco da rbita descrito pela Terra em um dia, mede aproximadamente 1o.

  • sol: movimento ApArente

    O dia que rege as nossas atividades cotidianas o dia solar, no o sideral. Mas o dia solar verda-deiro no tem a mesma durao todos os dias do ano. So duas as causas: (i) a velocidade orbital da Terra no constante, pois a rbi-ta no circular, mas, elptica; a variao senoidal e anual (curva em vermelho Figura 3.5); (ii) a projeo do movimento do Sol no equador afetada pela

    obliqidade da eclptica; esta variao senoidal com perodo semestral (curva em azul Figura 3.5). A adoo pura e simples do dia solar verdadeiro para reger as nossas atividades teria assim graves inconvenientes. Para sermos pontuais, cada dia teramos que acertar o ritmo dos nossos relgios. Para evitar esse inconveniente, se definiu o dia solar mdio cuja durao constante e vale exatamente 24 horas. A durao do dia solar mdio igual mdia da durao dos dias solares verdadeiros ao longo do ano trpico.

    A diferena entre o dia solar verdadeiro e o dia solar mdio em diferentes datas do ano chamada equao do tempo (Figura 3.5).

    3.1.3 Relgio de Sol. AnalemaO relgio de Sol for-nece a hora solar ver-dadeira4. A durao do dia, medida com ele, revela portanto as diferenas entre o dia solar verdadeiro e o dia solar mdio. O relgio de Sol mais simples

    aquele em que a sombra do eixo polar produzida pelo Sol se projeta num cilindro concntrico a esse eixo (Figura 3.6).

    H muitas outras verses de relgio de Sol. Mas esta a que melhor se presta para mostrar conceitualmente o seu funcionamento. Todas as outras verses podem ser facilmente entendidas a partir deste modelo simples.

    Raramente a hora solar verdadeira do relgio de Sol coincide com a hora legal dos relgios comuns de pulso. A discrepncia pode chegar a 45 minu-

    4O que no quer dizer que outras horas solares sejam falsas

    Figura 3.6. Relgio de Sol simples. O eixo polar (trao grosso) paralelo

    ao eixo de rotao da Terra. Conseqentemente

    aponta para o plo celeste. A vantagem do cilindro

    concntrico ao eixo polar que, em qualquer data

    do ano, a sombra do eixo descrever nele um arco

    de 15 para cada hora solar verdadeira, indicado

    na Figura pela projeo das pontas do eixo (linhas

    tracejadas). Assim a diviso das horas inteiras no

    mostrador consiste em linhas paralelas eqidistantes

    Figura 3.5. Equao do tempo ao longo do ano

  • AstronomiA

    tos! H dois fatores que contribuem para essa diferena. A primeira a j mencionada equao do tempo. S por causa dela a diferena pode chegar a 15 minutos. Alm disso, segundo uma conveno de interesse prtico, a hora legal a mesma (comum) dentro de cada fuso horrio. Numa reunio em Washington em 1884, que reuniu 25 pases inclusive o Brasil, decidiu-se que o meridiano de longitude zero seria o de Greenwich, perto de Londres, e que o globo terrestre fosse dividido em 24 fusos, cada um com largura de 15 em longitude. Greenwich ficaria na longitude mdia do 1o. fuso. Na prtica, os contornos dos fusos nem sempre seguem rigorosamente os meridianos. Bons atlas trazem mapas com os fusos horrios.

    No Brasil so 4 fusos horrios desde os pene-dos de So Pedro e So Paulo at o Acre (Figu-ra 3.7). A hora legal do fuso a hora solar mdia na longitude mdia do fuso. O fuso brasileiro que inclui So Paulo, Rio de Janeiro e Braslia, o terceiro a oeste do de Greenwich. A hora legal a hora solar mdia de Greenwich menos 3 horas (no estando em vigor o horrio de vero), ou a hora solar mdia na longitude 45 a oeste de Greenwich. O meridiano com essa longitude passa perto do ponto mdio entre So Paulo e o Rio de Janeiro.

    Na extremidade leste do fuso, a hora legal estar atrasada meia-hora em relao hora solar mdia. Na extremidade oeste, estar adiantada. No meridiano central de um fuso a coincidncia entre a hora solar ver-dadeira e a hora legal poder ocorrer 4 vezes no ano. Mas alm de 4 desse meridiano, em longitude, a coin-cidncia nunca ocorre. Somando todas as par-celas, conclumos que a discrepncia mxima de 45 minutos.

    Figura 3.7. Os quatro fusos horrios do Brasil.Fonte: http://www.calendario.cnt.br/AFINS/Calendar600.htm

    Figura 3.8. O analema no meridiano central de um fuso. Equao do tempo (minutos) na horizontal e a declinao do sol (graus) na vertical.Fonte: http://www.analemma.com/Pages/framesPage.html

  • sol: movimento ApArente

    A Figura 3.8 mostra a curva conhecida como analema. Ela tem forma parecida com a do algarismo 8 e fornece a posio da sombra da extremidade de um gnmon ao meio-dia civil no meridiano central de um fuso. A cada grau de longitude a leste ou oeste da longitude do meridiano central, deve-se acrescentar ou subtrair 04 minutos de tempo equao do tempo.

    O meridiano a 180 de Greenwich chamado Linha Internacional da Data. Sua localizao to convencional e arbitrria quando a escolha de Gre-enwich para a longitude zero. Mas essa Linha define a mudana da data. O novo dia na Terra tem incio nessa Linha e dali se propaga para o oeste medida que a Terra gira. No fuso com essa Linha, a hora legal a mesma a oeste e a leste da Linha, mas a data a oeste est adiantada 1 dia em relao data a leste. Os viajantes que atravessam a linha de leste para oeste devem adiantar 1 dia no relgio sem mexer na hora legal, e vice-versa quando atravessam no sentido contrrio.

    3.1.4 Estaes do ano

    3.1.4.1 Ano trpicoPercorrendo a eclptica, a declinao do Sol est variando continuamente. Mas essa variao peridica e completa um ciclo em 1 ano trpico. O ano trpico chamado tambm ano das estaes. O ano trpico o intervalo de tempo entre dois sucessivos equincios de outono e corresponde a 365,242191 dias. Podemos dizer tambm que o ano trpico o tempo transcorrido entre duas passagens sucessivas do Sol pelo ponto vernal . A durao de cada estao cerca de do ano trpico, mas no exatamente. Este fato j era conhecido dos antigos como desigualdade das estaes.

    Eis algumas conseqncias da variao da declinao do Sol. O Sol nasce no ponto cardeal leste e se pe no ponto cardeal oeste somente nos equincios de outono e de primavera, pois nessas datas o Sol est cruzando o equador celeste.

    Em todas as outras datas (excluindo-se os lugares onde o Sol se torna circumpolar) no hemisfrio sul (norte) o Sol nasce no sudeste e se pe no sudoeste durante a primavera e o vero ( o outono e o inverno), e nasce no nordeste e se pe no noroeste durante o outono e o inverno (primavera e o vero). Portanto um erro afirmar que todos os dias o Sol nasce no leste e se pe no oeste.

    A altura do Sol na passagem meridiana tambm varia ao longo do ano. Nos equincios, no nosso hemisfrio, o Sol se encontra no azimute norte a uma altura igual ao complemento do valor absoluto da latitude (Figura 3.9). Em outros dias do ano o Sol poder estar at 23,4 mais ao norte ou ao sul do equador celeste (Figura 3.9).

  • AstronomiA

    A variao sazonal da altura meridiana do Sol pode ser facilmente constatada por meio da sombra de um gnmon na passagem meridiana do Sol.

    Nos dias do equincio o perodo iluminado e o perodo escuro do dia tm igual durao em todos os pontos do globo. Em qualquer hemisfrio, norte ou sul, no solstcio de inverno o perodo claro o mais curto e, no solstcio de vero, o mais longo. Aqui estamos falando da simetria ou assimetria na diviso do dia entre os perodos claro e escuro. Na linguagem vulgar a pa-lavra dia significa, s vezes, o perodo claro, e ento se diz que no solstcio temos o dia mais curto, ou mais longo. Isso no deve ser confundido com a durao do dia significando o intervalo de tempo entre duas sucessivas passagens meridianas de um mesmo astro.

    No nosso hemisfrio, o crculo diurno na esfera celeste fica tombado para o norte. Pelo fato de que o Sol est ao sul do equador celeste na primavera e vero, mais da metade desse crculo fica acima do horizonte. Por isso, nessas estaes o perodo iluminado mais longo do que o perodo escuro. Quanto mais nos aproximamos do plo, mais o perodo diurno maior que o noturno, at o Sol se tornar circumpolar. Ento o perodo noturno se torna nulo. No outono e inverno ocorre o contrrio.

    Mas os efeitos mais dramticos da variao da declinao do Sol so as influncias climticas que caracterizam as quatro estaes do ano. A causa das estaes a variao do ngulo de incidncia dos raios solares numa localidade da Terra em diferentes pocas do ano. Quando a incidncia perpendicular superfcie da Terra, a captao de energia solar mxma, mas ela diminui quanto mais obliqua. Isso pode ser entendido por meio da analogia simples da captao da gua da chuva com um balde. Se a chuva cai verticalmente, a captao ser mxima se o balde estiver com a boca voltada para cima e nula se estiver deitado. A captao proporcional rea da boca do balde vista pela chuva, ou projetada no plano horizontal. Essa rea varia com cos sendo o ngulo entre a direo da chuva e a perpendicular ao plano da boca do balde.

    Figura 3.9. O observador se encontra numa localidade do hemisfrio sul. O plano do papel contm o meridiano desse observador. Ao longo do ano, o Sol na passagem meridiana visto por esse observador em diferentes alturas. No equincio o Sol visto no equador celeste (linha tracejada). No solstcio de inverno a altura meridiana do Sol mnima e, no solstcio de vero, mxima. As direes em que o Sol visto podem ser transportadas para o local do observador por meio de paralelas

  • sol: movimento ApArente

    A Figura 3.10 mostra que a variao da declinao do Sol altera a incidncia dos raios solares entre os hemisfrios norte e sul do globo. A incidncia nos solstcios define na Terra os trpicos de Capricrnio e de Cncer, e os crculos polares Antrtico e rtico. Na faixa tropical o Sol pode passar pelo znite na passagem meridiana. Nos crculos polares o Sol pode se tornar circumpolar.

    s vezes se tem dito que as estaes so devidas variao da distncia da Terra ao Sol. Esta explicao equivocada, pois se a proximidade fosse a causa do vero, como estaria ocorrendo o inverno ao mesmo tempo no outro hemisfrio? As estaes ocorrem porque a Terra orbita ao redor do Sol mantendo o eixo de rotao obliquo em relao eclptica.

    3.1.4.2 CalendrioO calendrio controla o fluxo dos dias do ano civil. Este tem um nmero inteiro de dias: 365 ou 366 se o ano for bissexto. Por outro lado, neces-srio que o calendrio mantenha sincronismo com o ano trpico, j que esse ciclo natural rege o plantio, a colheita, as frias escolares etc. Mas, j vimos que o ano trpico no tem um nmero inteiro de dias. O ano trpico tem 365,242199 dias solares mdios. Toda a dificuldade de se elaborar um bom calendrio reside na frao 0,242199 do dia. Se o calendrio ignorar essa frao, ao cabo de n anos ficar defasado n x 0,242199 dias. Depois de vrios anos essa diferena pode alcanar seis meses e, ento, as estaes do ano estaro invertidas!

    A insero de 1 dia a cada 4 anos foi introduzida na reforma juliana pro-movida pelo ditador romano Caio Jlio Csar (100-44 aC) em 46 aC. Esse procedimento tem a vantagem de manter o ano civil com um nmero inteiro de dias, mas equivale a considerar que o ano trpico tenha 365 + dias, ou seja, 365,25 dias. Esse valor comparado com o valor correto dado acima,

    Figura 3.10. A incidncia dos raios solares no equincio

    no favorece nenhum dos hemisfrios. Mas no

    solstcio de vero favorece o hemisfrio em que ocorre,

    assim como no solstcio de inverno desfavorece o

    hemisfrio em que ocorre. No hemisfrio favorecido a incidncia tende a ser mais vertical. Esta Figura ajuda a

    entender porque as estaes so invertidas entre os hemisfrios norte e sul

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    AstronomiA

    mostra que a correo exagerada. As conseqncias desse exagero foram se acumulando com o tempo e, j na idade mdia, passaram a atrapalhar a fixao da data para a comemorao da Pscoa. Por isso uma nova reforma foi promovida pelo papa Gregrio XIII (1502-85) em 1582. Para manter o incio da primavera no hemisfrio norte, e o incio do ano no dia 21 de maro, onze dias foram eliminados por decreto e novas regras foram estabelecidas, que eliminavam alguns anos bissextos previstos na reforma juliana. Com essas regras, em vigor at hoje, o ano trpico teria

    365 + - 1/100 +1/400 = 365,2425 dias.

    Permanece ainda um exagero na correo, mas o calendrio ficar adian-tado de 1 dia somente depois de 3.236 anos. Fica esse problema para ser herdado pelas futuras geraes.

    Desde que foi institudo, o calendrio gregoriano procura coincidir o equi-ncio de outono com 21 de maro ou perto dessa data. Assim o solstcio de inverno, o equincio da primavera e o solstcio de vero ocorrem, respecti-vamente, por volta de 21 de junho, 23 de setembro e 22 de dezembro.

    3.1.4.3 Ano sideralZodaco uma faixa da esfera celeste ao longo da eclptica com cerca de 16 de largura. Nessa faixa esto as constelaes zodiacais que, tendo no passado nomes de animais, deram origem ao nome zodaco que tem a mes-ma raiz da palavra zoolgico e significa crculo dos animais. A importncia do zodaco que por ele transitam o Sol, a Lua e os planetas. que esses objetos se encontram no plano da eclptica ou no muito longe dele.

    Hoje o Sol passa pelas constelaes zodiacais nos meses indicados na Figura 3.11.

    A constelao zodiacal pela qual o Sol transita hoje numa determinada data do ano, no a mesma pela qual ele transitava na mesma data do ano por volta de 2 mil aC quando os babilnios estipularam os signos zodiacais utilizados ainda hoje para fins astrolgicos.

    Figura 3.11. O plano do papel a eclptica. Na rbita da Terra (tracejada) os meses indicam a posio da Terra de onde o Sol atualmente visto projetado nas constelaes zodiacais. A representao esquemtica

  • sol: movimento ApArente

    Os egpcios antigos controlavam o incio do ano monitorando o nascer helaco de Stis, que hoje conhecemos como a estrela Sirius, a mais brilhante depois do Sol. Quando essa estrela era vista no horizonte leste pouco antes do nascer do Sol, depois de vrios meses sem ser vista, era sinal de que logo comearia a cheia do rio Nilo. Portanto, nessa poca do ano, o Sol se aproximava dessa estrela do Co Maior enquanto transitava na constelao de Gmeos. Se esse mtodo continuasse sendo usado, o nascer helaco de Sirius tambm teria perdido o sincronismo com a cheia do Nilo controlada pelas estaes do ano.

    A explicao desse descompasso que o Sol, aps completar 1 ano trpico, retorna ao ponto vernal , mas ainda no completou uma volta na esfera celeste. Ele somente completar essa volta uns 20 minutos depois. Isto significa que o ponto vernal no fixo na esfera celeste, mas se desloca lentamente no sentido oposto ao do movimento do Sol na eclptica. Trata-se de uma diferena pequena, mas ela se torna grande e perceptvel depois de se acumular por muitos anos.

    O tempo para o Sol completar uma volta de 360 na esfera celeste o ano sideral cuja durao de 365,256363 dias. Compare a durao do ano sideral com a do ano trpico.

    3.1.5 Precesso do eixo da TerraA causa do deslocamento do ponto um lento movimento do eixo de rotao da Terra chamado precesso. Embora a obliqidade se mantenha praticamente inalterada, o eixo da Terra realiza um movimento como o do eixo de um pio que bamboleia (Figura 3.12).

    O perodo da precesso de aproximadamente 26 mil anos. Cada um dos 12 signos zodiacais abrange um arco de 30 na eclptica. Portanto, o des-locamento de um signo ocorre em 2200 anos aproximadamente.

    A causa da precesso a atrao gravitacional da Lua e do Sol no bojo equa-torial da Terra que, por sua vez, causado pela rotao da Terra. Por causa da precesso, um mapa celeste em coordenadas equatoriais muda com o tempo e deve mencionar a poca que convencionalmente varia a cada 50 anos. Por exemplo: poca 1950,0, poca 2000,0 e assim por diante.

    Figura 3.12. direita, a Terra e o seu eixo de rotao

    hoje. Mantendo a mesma obliqidade com a eclptica, a Terra precessiona como um

    pio, esquerda. O eixo da Terra descreve um movimento

    cnico, cuja projeo na esfera celeste mostrada.

    Conseqentemente os plos celestes descrevem um

    movimento cnico na esfera celeste. Notar que o sentido da precesso invertido em

    relao ao movimento do Sol na eclptica. O equador, por

    ser solidrio ao eixo da Terra, tambm precessiona. Ora, o

    ponto vernal a interseo da eclptica com o equador

    celeste. Portanto esse ponto tambm precessiona

    no sentido inverso ao movimento do Sol. Por isso o Sol retorna ao ponto antes

    de dar uma volta completa

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    AstronomiA

    3.2 Atividade solarO Sol como estrela ser discutido em outra aula quando falaremos de sua estrutura interna, composio qumica, origem, idade e evoluo. Aqui nos limitaremos a falar da atividade solar que se repete ciclicamente a cada 11,2 anos e produz alguns efeitos na Terra e fenmenos observveis a olho nu.

    A atividade solar tem origem nas manchas solares, estruturas escuras que surgem ocasionalmente na superfcie do Sol. No mundo ocidental elas fo-ram descobertas somente em 1611, logo depois que a luneta passou a ser utilizada para fins astronmicos por Galileu Galilei (1564-1642). As man-chas so regies fortemente magnetizadas, cerca de 2 mil K mais frias do que o meio circundante (6 mil K). Os antigos eventualmente viram grandes manchas a olho nu, observando o Sol atravs de nuvem ou nvoa relativa-mente homognea. Uma forma de medir a rotao do Sol acompanhar, dia aps dia, o deslocamento das manchas no disco solar. Vista da Terra, uma mancha d uma volta no Sol em cerca de 27 dias. Esse o perodo sindico. Descontando-se o movimento orbital da Terra, o verdadeiro per-odo de rotao, ou perodo sideral, de 25 dias. Mas esse o perodo de rotao no equador do Sol. A rotao do Sol mais lenta em direo aos plos. Em suma, o Sol no gira como um corpo rgido.

    Uma mancha individual nasce e sobrevive tipicamente poucas rotaes so-lares. Mas a quantidade total de manchas na superfcie do Sol, e a rea de todas as manchas visveis no disco, varia ciclicamente. s vezes o Sol no tem nenhuma mancha. Mas, passando-se os anos comeam a surgir as primeiras manchas at o Sol ficar cheio de manchas. Depois elas comeam a diminuir. A periodicidade de 11,2 anos aproximadamente.

    Uma conseqncia da atividade que pode ter sido registrada pelos antigos a mudana da forma da coroa solar. A coroa solar a parte mais externa e extensa da atmosfera do Sol (Figura 3.13). Sua temperatura elevadssima, cerca de 2 milhes K. Por isso, o hidrognio que o elemento majoritrio, encontra-se ionizado. Um tomo de hidrognio consiste num prton e num eltron. O primeiro tem carga eltrica positiva, e o segundo, negativa. No entanto a carga do tomo nula, pois os sinais opostos se neutralizam. Porm, quando a temperatura muito elevada, a coliso entre os tomos to violenta que pode romper a ligao entre o prton e o eltron. Por outras palavras, o eltron se torna livre e deixa de fazer parte do tomo. O gs aquecido pode ser considerado uma mistura gasosa de prtons e eltrons ou plasma. Assim a coroa. Ora, a coroa solar tambm magnetizada e as cargas eltricas tendem a seguir as linhas-de-fora do campo magntico, e a se acumular onde o campo mais fraco (garrafa magntica). Os eltrons livres, por sua vez, espalham a luz solar. Assim, quando ocorre um eclipse total do Sol, a coroa que nos dias ordinrios ofuscada pelo brilho do cu diurno, torna-se visvel. O brilho da coroa cerca de um milionsimo do brilho do disco solar. A Figura 3.13 revela as estruturas magnticas da coroa solar,

  • sol: movimento ApArente

    mas essas estruturas variam com a atividade solar. Quando o Sol est em mnima atividade, a coroa tende a se alongar na direo equatorial do Sol. Quando est em mxima atividade, a coroa tende a ser mais arredondada, porm, sua estrutura fina mais complexa.

    Um efeito observvel na Terra, embora in-direto, so as auroras polares. Podem ser boreais ou austrais. Esse fenmeno est associado ao campo magntico da Terra. Sua ocorrncia, como dissemos, depende da ejeo de cargas el-tricas pelo Sol durante

    erupes solares. O local dessas erupes est associado s manchas e a ocorrncia delas maior em poca de maior atividade solar. J se relacionou um perodo de ausncia de registros de auroras no hemisfrio norte a uma ausncia anmala de atividade solar entre 1645 e 1715, um perodo de 70 anos conhecido como mnimo de Maunder.

    A atividade solar s comeou a ser monitorada depois da descoberta das manchas. Mas h mtodos indiretos de se diagnosticar a atividade solar no passado mais remoto. Um deles consiste na medio da abundncia do istopo 14C em anis de sees de troncos de rvores. Esse istopo produzido por raios csmicos na atmosfera da Terra, mas a penetrao dos raios csmicos modulada pela atividade solar. Quanto mais ativo o Sol, menor a penetrao. Parece que sedimentos lacustres australianos do pr-cambriano tambm registram o ciclo solar j h 680 milhes de anos.

    Os efeitos da atividade solar tambm podem ser notados atravs da alterao das condies de propagao de ondas de rdio que se refletem na ionosfera da Terra, ou pelas variaes do campo magntico da Terra. Alguns efeitos climticos, tais como variaes na temperatura mdia, tambm tm sido alegados, mas ainda no foram completamente comprovados.

    Figura 3.13. Coroa solar na luz branca fotografada no

    eclipse total de 1991. Fonte: http://science.nasa.gov/ssl/

    pad/solar/corona.htm

  • AstronomiA

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