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Jornal da Ciência (JC E-Mail) de 08 de março de 2007. ---------------------------------------------------- ---------------------------------------------------- Edição 3218 - Notícias de C&T - Serviço da SBPC ---------------------------------------------------- ---------------------------------------------------- Historiadores lutam com Bush por acesso a documentos Comitê da Câmara de Representantes discute projeto que pode derrubar restrições do goveme Patricia Cohen escreve para "The New York Times": Em dezembro de 1989, um mês após a queda do Muro do Berlim, os presidentes George Bus~ e Mikhail Gorbachev se encontraram em Malta e, nas palavras de um porta-voz soviético, "enterraram a Guerra Fria no fundo do Mediterrâneo". A transcrição russa do encontro de cúpula foi publicada em Moscou em 1993. Quatorze anos depois, historiadores americanos ainda estão esperando que seu próprio govemo libere uma transcrição. Agora, legisladores e estudiosos estão esperando forçar a abertura de um acesso a tais documentos de arquivo, eliminando o que disseram ser o maior obstáculo à pesquisa histórica: uma diretriz emitida pela atual Casa Branca em 2001, que desacelerou enormemente ou impediu a liberação de documentos presidenciais importantes. "Eu visitei a biblioteca Bush em 1999, esperando poder olhar' a transcrição de Malta, disse Thomas S. Blanton, diretor executivo de um instituto de pesquisa independente chamado Arquivo de Segurança Nacional da Universidade George Washington. Ele preencheu o pedido segundo a Lei de Liberdade de Informação, mas disse: "Eu ainda não a tenho e não sei dizer quando a terei". A ordem executiva de 2001 do presidente George W. Bush restringiu o acesso aos registros presidenciais ao dar aos presidentes em exercício o poder de adiar indefinidamente a liberaçãe de documentos, ao mesmo tempo em que estendeu o controle a ex-presidentes, vice- presidentes e suas famílias. Também mudou o sistema, de um que liberava automaticamente documentos 30 dias após o ex-presidente ou presidente em exercício ser notificado para um que retém documentos até urr presidente permitir especificamente sua divulgação. Nesta quinta-feira (8/3), o Comitê da Câmara para Supervisão e Reforma do Governo deverá discutir um novo projeto de lei que derrubaria a ordem de Bush, disse uma porta-voz do comitê Karen Ughtfoot. Os patrocinadores, que incluem o presidente do comitê, o deputado Henry A. Waxman, democrata da Califórnia, esperam apresentar o projeto de lei no plenário da Câmara na próxima semana. AlIen Weinstein, o arquivista dos Estados Unidos, disse na quarta-feira que a ordem não está sendo usada para impedir que documentos presidenciais cheguem ao público, mas que obviamente "tem aumentado o tempo e ad:amentos, que são endêmicos". O acúmulo de pedidos por documentos agora chega a cinco anos.

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Jornal da Ciência (JC E-Mail) de 08 de março de 2007.--------------------------------------------------------------------------------------------------------

Edição 3218 - Notícias de C&T - Serviço da SBPC--------------------------------------------------------------------------------------------------------

Historiadores lutam com Bush por acesso a documentos

Comitê da Câmara de Representantes discute projeto que pode derrubar restrições do goveme

Patricia Cohen escreve para "The New York Times":

Em dezembro de 1989, um mês após a queda do Muro do Berlim, os presidentes George Bus~e Mikhail Gorbachev se encontraram em Malta e, nas palavras de um porta-voz soviético,"enterraram a Guerra Fria no fundo do Mediterrâneo".

A transcrição russa do encontro de cúpula foi publicada em Moscou em 1993. Quatorze anosdepois, historiadores americanos ainda estão esperando que seu próprio govemo libere umatranscrição.

Agora, legisladores e estudiosos estão esperando forçar a abertura de um acesso a taisdocumentos de arquivo, eliminando o que disseram ser o maior obstáculo à pesquisa histórica:uma diretriz emitida pela atual Casa Branca em 2001, que desacelerou enormemente ouimpediu a liberação de documentos presidenciais importantes.

"Eu visitei a biblioteca Bush em 1999, esperando poder olhar' a transcrição de Malta, disseThomas S. Blanton, diretor executivo de um instituto de pesquisa independente chamadoArquivo de Segurança Nacional da Universidade George Washington. Ele preencheu o pedidosegundo a Lei de Liberdade de Informação, mas disse: "Eu ainda não a tenho e não sei dizerquando a terei".

A ordem executiva de 2001 do presidente George W. Bush restringiu o acesso aos registrospresidenciais ao dar aos presidentes em exercício o poder de adiar indefinidamente a liberaçãede documentos, ao mesmo tempo em que estendeu o controle a ex-presidentes, vice­presidentes e suas famílias.

Também mudou o sistema, de um que liberava automaticamente documentos 30 dias após oex-presidente ou presidente em exercício ser notificado para um que retém documentos até urrpresidente permitir especificamente sua divulgação.

Nesta quinta-feira (8/3), o Comitê da Câmara para Supervisão e Reforma do Governo deverádiscutir um novo projeto de lei que derrubaria a ordem de Bush, disse uma porta-voz do comitêKaren Ughtfoot. Os patrocinadores, que incluem o presidente do comitê, o deputado Henry A.Waxman, democrata da Califórnia, esperam apresentar o projeto de lei no plenário da Câmarana próxima semana.

AlIen Weinstein, o arquivista dos Estados Unidos, disse na quarta-feira que a ordem não estásendo usada para impedir que documentos presidenciais cheguem ao público, mas queobviamente "tem aumentado o tempo e ad:amentos, que são endêmicos". O acúmulo depedidos por documentos agora chega a cinco anos.

Para Weinstein, o maior problema é a falta de recursos e arquivistas treinados. lOdO ex­

presidente traz uma nova enxurrada de documentos e leva a um aumento nos p didos poreles. Enquanto isso, um recente congelamento do orçamento reduziu o número eral defuncionários. Weinstein disse que sua equipe trabalha em formas para melhorar a eficiência,como agrupar juntos pedidos semelhantes.

Blanton culpou o comando anterior do arquivo por falhar inicialmente em resPoler às

pressões adicionais sobre o sistema. Mas ele deixou claro que a mais recente o dem executivaagravou significativamente o problema. Em uma audiência no Congresso na se ana passada,ele disse que o tempo de espera na Biblioteca Presidencial Reagan aumentou d 18 meses,em 2001, para 6 anos e meio.

"Havia um processo funcional, justo, organizado, claro e sensível para os registrTs

presidenciais em vigência durante os anos 90", que a ordem executiva de Bush 'Iderrubou esubstituiu pelo oposto", disse Blanton. "Não é apenas errado, é estúpido."

A Lei de Registros Presidenciais de 1978, parte das reformas pós-Watergate, claramente deu àpopulação americana a propriedade de documentos presidenciais, disse o historiador RobertDallek, cujo livro mais recente, "Nixon and Kissinger: Partners in Power", será publicado nopróximo mês. Mas a ordem executiva de Bush, ele disse, teve o efeito de devolver apropriedade aos presidentes e seus herdeiros.

Tendo escrito histórias altamente respeitadas sobre Franklin D. Roosevelt, John F. Kennedy,Lyndon B. Johnson e Ronald Reagan, Dallek disse que "minha experiência foi, particularmentecom este novo livro, que há uma história muito diferente para ser contada do que umpresidente e seus representantes gostariam de ouvir quando você consegue entrar e ler osregistros".

Ele revirou os arquivos para montar seu novo livro, que revela que Henry A. Kissinger eRichard M. Nixon discutiram desde cedo a impossibilidade de vencer a Guerra do Vietnã, assimcomo momentos descuidados em que Kissinger se refere aos sul-vietnamitas como "pequenosamigos amarelos".

Os presidentes e os guardiões de seus legados prefeririam que tais detalhes embaraçosos nãoviessem à tona, disse Dallek em uma entrevista por telefone. Mas as evidências dos arquivosfomecem um "quadro muito mais honesto, mais franco, do que pensavam, do que diziam e dosatos de logro que praticavam", ele disse. "É importante para o país ouvir e saber."

A divulgação dos documentos presidenciais e transcrições telefônicas freqüentementetransformam a forma como o público e estudiosos vêem os presidentes. Fred I. Greenstein, umestudioso de presidentes, utilizou anotações originais feitas funcionários do governo dasdiscussões para argumentar que Dwight D. Eisenhower, longe de ser ineficaz e não envolvido,foi um presidente notavelmente engajado que orquestrou cuidadosamente a estratégia duranteseus dois mandatos.

Os documentos que deram uma visão mais clara da extensão das doenças debilitantes deWoodrow Wilson e John F. Kennedy -habilmente escondidas durante seus mandatos e apóssuas mortes- influenciaram a forma como as pessoas pensam sobre a saúde física e mentaldos candidatos, assim como a transferência de poder em caso de um presidente ficarseveramente debilitado.

Blanton disse acreditar que a Casa Branca de Bush está principalmente preocupada emreverter o que considera uma erosão do poder presidencial após Watergate. "Isto propicia avantagem adicional de dar ao presidente em exercício muito mais controle sobre a história", eledisse.

Mas se ele está correto sobre os motivos do govemo Bush é algo que ninguém saberá até queos documentos do presidente sejam liberados - seja lá quando isto for. (Tradução: George EIKhouri Andolfato)(The New York Times, Uol.com/Mídia Global, 8/3)