durabilidade e vida Útil das estruturas...

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1 as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 149 DURABILIDADE E VIDA ÚTIL DAS ESTRUTURAS HIDRÁULICAS DE BETÃO E DE BETÃO ARMADO ARMANDO CAMELO Engº Civil EDP Produção, SA Porto - Portugal SUMÁRIO A construção de Aproveitamentos Hidroeléctricos em Portugal teve recentemente um desenvolvimento relevante em face à aplicação do Plano Nacional de Barragens ao qual a EDP não podia deixar de estar presente, em particular na qualidade de Projectista de barragens, centrais hidroeléctricas e respectivas obras anexas. No enquadramento legal e normativo a durabilidade destas estruturas em betão e em betão armado não será inferior a 100 anos pelo que os critérios e especificações destes materiais nos respectivos projectos têm em consideração a acção química das águas de contacto, as características relevantes das propriedades dos betões que influenciam a durabilidade e, em particular, os condicionamentos de prazos de construção e de aplicação em obra, resultantes dos gradientes térmicos provocados por betonagens de elevados volumes correspondentes a aplicação do conceito de “betão em massa”. 1. INTRODUÇÃO E ENQUADRAMENTO NAS OBRAS HIDRÁULICAS O conceito de vida útil das estruturas em geral encontram-se definidos no Eurocódigo [1] como o “período durante o qual se pretende que uma estrutura ou parte da mesma seja utilizada para as funções a que se destina, com a manutenção prevista mas sem necessidade de grandes reparações”, sendo os valores especificados naquela mesma norma em termos de categoria das estruturas, e transcritos no DNA da NP EN 206 [2] conforme indicado na Tabela 1, pelo que a categoria das estruturas ou parte das estruturas de betão e de betão armado a executar em aproveitamentos hidroeléctricos deverá ser da categoria 5.

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1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 149

DURABILIDADE E VIDA ÚTIL DAS ESTRUTURAS HIDRÁULICAS DE BETÃO E DE BETÃO ARMADO

ARMANDO CAMELO

Engº Civil EDP Produção, SA

Porto - Portugal SUMÁRIO A construção de Aproveitamentos Hidroeléctricos em Portugal teve recentemente um desenvolvimento relevante em face à aplicação do Plano Nacional de Barragens ao qual a EDP não podia deixar de estar presente, em particular na qualidade de Projectista de barragens, centrais hidroeléctricas e respectivas obras anexas. No enquadramento legal e normativo a durabilidade destas estruturas em betão e em betão armado não será inferior a 100 anos pelo que os critérios e especificações destes materiais nos respectivos projectos têm em consideração a acção química das águas de contacto, as características relevantes das propriedades dos betões que influenciam a durabilidade e, em particular, os condicionamentos de prazos de construção e de aplicação em obra, resultantes dos gradientes térmicos provocados por betonagens de elevados volumes correspondentes a aplicação do conceito de “betão em massa”. 1. INTRODUÇÃO E ENQUADRAMENTO NAS OBRAS HIDRÁULICAS O conceito de vida útil das estruturas em geral encontram-se definidos no Eurocódigo [1] como o “período durante o qual se pretende que uma estrutura ou parte da mesma seja utilizada para as funções a que se destina, com a manutenção prevista mas sem necessidade de grandes reparações”, sendo os valores especificados naquela mesma norma em termos de categoria das estruturas, e transcritos no DNA da NP EN 206 [2] conforme indicado na Tabela 1, pelo que a categoria das estruturas ou parte das estruturas de betão e de betão armado a executar em aproveitamentos hidroeléctricos deverá ser da categoria 5.

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Tabela 1: Categorias da vida útil das estruturas de betão. Vida útil das obras

Categoria Anos Exemplos

1 10 Estruturas temporárias 2 10 a 25 Partes estruturais substituíveis, p. ex., apoios 3 15 a 30 Estruturas para a agricultura e semelhantes 4 50 Edifícios e outras estruturas comuns 5 100 Edifícios monumentais, pontes e outras estruturas de engenharia civil

Por sua vez, e sobre o conceito de durabilidade, refere-se igualmente no Eurocódigo [1] que a deterioração das estruturas não deve reduzir o seu desempenho ao longo da vida útil abaixo do prescrito, tendo em conta as acções ambientais e o nível de manutenção previsto, sendo que aquelas acções devem ser identificadas na fase de projecto de modo a estimar a durabilidade e avaliar o grau de deterioração. Esta identificação das acções ambientais é fundamental que seja desenvolvida na fase de projecto em particular quanto aos seus valores característicos como é por exemplo o da agressividade química das águas de contacto com as estruturas de betão e de betão armado e se o efeito de “lixiviação” e/ou ataque químico são ou não severos. Haverá também que diferenciar a capacidade incrustante que as águas de contacto têm ou não nos betões e se essa diferenciação exige que sejam tomadas medidas de minimização contra os riscos de perda de resistência ou de capacidade de passivação das armaduras. Para além das características intrínsecas (desempenho e geometria) dos materiais aplicados nas estruturas que influenciam o desenvolvimento do grau de deterioração dos betões, esta não depende exclusivamente das acções ambientais mas também de factores relevantes de ordem técnica e também de factores humanos relacionados com:

- características dos materiais constituintes dos betões seleccionados em fase de projecto; - abordagem e técnicas de execução dos estudos de misturas de betão; - níveis de controlo aplicado na obra pelos intervenientes; - cumprimentos das tolerâncias de doseamento dos constituintes dos betões; - a qualidade dos equipamento de fabrico, transporte, colocação e compactação dos betões; - riscos de gradientes térmicos elevados entre os betões superficiais e a massa interna dos

volumes betonados (cujas condições fronteira – físicas e climáticas - são determinantes); - condições de execução, por exemplo relacionadas com dificuldades em acessos; - condições de segurança no trabalho; - condições ambientais de execução associadas aos tempos de trajecto e de acessos aos

pontos de aplicação dos betões particularmente em obras subterrâneas; - grau de ambientação, competências e condições de remuneração do pessoal afecto à

execução; - níveis de controlo, monitorização e manutenção em fase de exploração;

Estes factores terão notoriedade acrescida em face dos graus de dificuldade de execução da obra quer no que diz respeito aos volumes de trabalho envolvidos quer no que diz respeito aos prazos exigidos aos intervenientes no processo construtivo.

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Assim, a deterioração das estruturas de betão e de betão armado nas estruturas hidráulicas, apesar do elevado número de variáveis que afectam o processo, pode ser acautelado pela consideração de requisitos e/ou especificações reconhecidas, mas tendo sempre em conta a experiência obtida em construções anteriores e de semelhante grau de dificuldade, como aliás se prevê naquele Eurocódigo [1]. Neste enquadramento, a observação e monitorização das obras existentes e em exploração são fundamentais para a constante avaliação do seu desempenho, tendo em consideração as datas de construção. Portugal tem em exploração 65 barragens cuja construção se iniciou em 1913 correspondente ao mais antigo registo de barragens existente na Comissão Nacional Portuguesa das Grandes Barragens [3] Na Fig. 1a) indicamos o número de barragens em Portugal em função da respectiva idade, onde podemos observar um número já significativo (25) de obras com idades superiores a 50 anos, e na Fig.1b) podemos observar a evolução no tempo do número de barragens em função da idade, observando-se que em 2050, dos actuais aproveitamento em exploração, 36 terão mais de 75 anos e 9 terão mais de 100 anos.

0 5 10 15 20

< 20

20 a 30

30 a 40

40 a 50

50 a 60

60 a 70

> 70

No.de barragens

Idade (Anos)

No. e Idade das barragens em Portugal (betão e alvenaria) - ano de ref. - 2011

25

30

40

62

37

17

36

0 1 2

9

0

10

20

30

40

50

60

70

2011 2020 2030 2050

No.de Barragens

Ano

Idade das Barragens em Portugal (betão e alvenaria) - ano de ref. - 2011

>50 Anos

>75 Anos

>100 Anos

a) b)

Figura1: Número e idade das barragens existentes em Portugal. Deste modo, recolhendo informação sobre a qualidade do betões aplicados naquelas obras a partir de documentos da época da construção das barragens da EDP, e por outro lado observando a evolução dos resultados da qualidade da água das albufeiras e ainda acompanhando a monitorização do envelhecimento destas estruturas hidráulicas, obtemos adequado ensinamento sobre os parâmetros e características que são mais relevantes para a manutenção das estruturas durante a sua vida útil. 2. DETERIORAÇÃO E PATOLOGIAS DAS ESTRUTURAS DE BETÃO Grande parte das estruturas de betão projectadas e executadas em Aproveitamentos Hidroeléctricos são, como se referiu atrás, estruturas de “betão em massa”, com e sem

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armaduras (ver fig 2.), sendo que o conceito de “betão em massa” pode não ser apenas uma questão de geometria de secção ou dimensão das estruturas. De acordo com o ACI Committe 207 [4] betão em massa é definido como o “volume de betão moldado no local com suficientes dimensões para exigir que sejam tomadas medidas para lidar com a geração de calor interno originado pela hidratação do ligante e para lidar com a correspondente variação de volumes para minimizar os riscos de fissuração”.

a

b c Figura 2: Barragem do Alqueva (a e c) e difusor da central de Venda Nova II.

De salientar que podem enquadrar-se nesta definição secções com dimensão inferior a 1 metro quando a aplicação do betão decorre épocas de elevado arrefecimento nocturno (caso dos períodos dos equinócios em Portugal) e/ou de aplicação de misturas com elevadas dosagens em ligante por imposição das classes de resistência e respectiva idade de verificação associadas ou não a exigências de especificação ambiental (por exemplo numa classe XA2 com cimento do tipo I a E464 [5] prescreve-se uma classe de resistência C40/50). Por isso convém recordar que a própria norma NP EN 206-1 refere que podem ser requeridos requisitos adicionais ou diferentes nos casos de aplicação de betões para estruturas em grandes massas As principais causas de deterioração das estruturas de betão em massa estão relacionadas com ocorrência de fissuração e perda de propriedades físicas, químicas ou mecânicas dos betões cujas ocorrências podem evidenciar-se em idade do betão ainda jovem e em idades mais avançadas e ainda por factores associadas às tensões térmicas desenvolvidas durante a construção ou desenvolvidas durante os ciclos térmicos anuais (ver Fig.3 e 4).

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Em idades mais jovens a ocorrência de patologias de deterioração na estrutura podem ter origem nos seguintes factores :

- assentamento plástico do betão - deficiente preparação das juntas de betonagem; - insuficiente estanqueidade das cofragens; - insuficiente capacidade resistente dos cimbres e cofragens - deficiente cura originando retracção superficial ; - retracção excessiva por elevadas tolerâncias de doseamento das misturas; - excessiva variação granulométrica dos agregados em relação aos estudos de mistura; - insuficiente rendimento de colocação do betão; - gradientes térmicos de curta e longa duração;

a b

c d

e

Figura 3: Assentamento plástico do betão (a, b), RAA nas barragens de A. Ceira e Pracana (c, d) e erosão de 11m no túnel do descarregador cheias com 2000m3 de volume

(Glen Canyon Dam).

Em idades mais avançadas outras factores são mais determinantes, tais como: - fissuração devido a reacção expansivas alcali agregado (RAA), dos tipos alcali-silica,

alcali-silicato ou alcali.carbonato; - fissuração por reacções sulfáticas internas expansivas pela exposição das estruturas a

águas com elevados teores em sulfatos ou por formação de etringite retardada. - erosões excessivas por cavitação hidráulica ou caudal sólido importante

A estas causas de deterioração e de patologias nas estruturas de betão em aproveitamentos hidroeléctricos acrescem ainda os fenómenos de envelhecimento correntes dos betões associados à carbonatação nas zonas submersas e não submersas, sendo que naquelas a velocidade de evolução é muitíssimo baixa.

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Figura 4: Efeitos tensionais dos gradientes térmicos numa barragem de secção gravidade.

Análise em fase de construção.

Na Fig.5 esquematizamos um modelo da interpretação dos fenómenos de deterioração das estruturas de betão associadas às acções químicas (de carácter ambiental) e físicas e as respectivas consequências nas estruturas. [6]

Figura5: Possíveis mecanismos envolvidos na deterioração das estruturas de betão(1).

(1) CSH – Silicatos hidratados de cálcio produzidos na hidratação do clinker.

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Noutros documentos encontramos igualmente modelos e estruturas dos mecanismos de deterioração do betão nas situações mais correntes aos quais cabe igualmente fazer referência como os indicados na NP EN 1504-9:2009 – “Produtos e sistemas para aprotecção e reparação de estruturas de betão. Parte 9: Princípios gerais para a utilização de produtos e sistemas”. Não consideramos como causas de deterioração as consequências de acções acidentais como são o caso de sismos, de risco de incêndio, caudais de cheia excepcionais, para os quais o projecto deverá prever dimensionamento adequado como se determina no Regulamento de Segurança de Barragens [7]. 3. IDENTIFICAÇÃO DAS ACÇÕES AMBIENTAIS EM OBRAS HIDRÁULICAS 3.1 Agressividade das águas de contacto com os betões As águas de contacto com os betões desempenham um papel muito relevante na evolução dos fenómenos de deterioração. No entanto não poderemos deixar de salientar que o betão saturado em água num estado estacionário pode contribuir para um aumento da durabilidade do mesmo betão. Nas obras hidráulicas estão em contacto com a água os paramentos de betão da barragem a montante e os paramentos das estruturas das tomadas de água, restituição, circuito hidráulico e descarregadores de cheias e de fundo, com pressões variáveis consoante o aproveitamento, e ainda com variações da mineralização da água. Além disso os paramentos em contacto com os solos encontram-se também saturados, e aqui o grau de mineralização é também variado e fortemente influenciado pelas características mineralógicas dos maciços rochosos onde essas estruturas se apoiam. Acresce que os gases dissolvidos na água das chuvas e nos cursos de água estão em geral em equilíbrio com a atmosfera, mas após atingirem os aquíferos tendem a ficar retidos, como acontece com o dióxido de carbono (CO2) e o oxigénio (O2), sendo o primeiro um gás relativamente solúvel que, ao hidrolizar-se, produz ácido carbónico originando um abaixamento do valor pH. Também numa albufeira, a concentração de O2 na água é variável com a profundidade (eutrofização da água com menos O2 e maior concentração de produtos azotados e fosfatados) criando condições de maiores concentrações de anidrido carbónico agressivo pela capacidade de dissolução do hidróxido de cálcio (CH) dos betões. A caracterização da agressividade da água varia com a temperatura ao longo do ano alterando assim a sua capacidade de dissolução. Também ao longo do período da vida útil da obra, a água da albufeira tem maiores concentrações de matéria orgânica após o primeiro enchimento devido à vegetação que fica submersa e, consequentemente apresenta maior concentração de CO2 em idades mais avançadas do aproveitamento. A classificação da agressividade química dos solos naturais e da águas subterrâneas é definida na NP EN 206-1 [2] e está subdividida em 3 classes - XA1, XA2 e XA3 – como ligeiramente agressiva, moderadamente agressiva e fortemente agressiva, respectivamente e em função das

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concentrações de sulfatos (SO42-), dióxido de carbono agressivo (CO2), amónio (NH4

+), magnésio (Mg2+) e do valor de pH (ver Tabela 2) De salientar que os valores indicados naquela normativa são válidos para os limites de temperatura entre 5ºC e 25ºC e considerando que o contacto da água com o betão se refere a um estado quase estacionário, situação que ocorre nos paramentos da barragem mas não nos circuitos hidráulicos ou nos descarregadores. Tabela 2: Valores limite das classes de exposição para o ataque químico de solos e águas neles

contida conforme NP EN 206-1.

Nos casos correntes deveremos ainda contar com o poder dissolvente ou incrustante das águas, definidas em função da variação da alcalinidade num ensaio de dissolução do carbonato de cálcio na água da amostra registando a diferença entre o valore do pH obtido com o valor do pH inicial, designado pelo parâmetro I [8]. Valores positivos de I com maior alcalinidade final significam que a água dissolve o carbonato de cálcio e não é incrustante, valores negativos significam uma alcalinidade final inferior pela precipitação do carbonato de cálcio e portanto a água é incrustante, e para valores nulos a água não precipita o carbonato e por isso não protege o betão. No entanto dever-se-á ter em conta a influência de iões agressivos na água, (sulfatos, sulfuretos, magnésio, amónia) definindo-se assim a agressividade química como moderada ou elevada conforme indicado na Tabela 3 [8].

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Tabela 3: Agressividade química da água. Agressividade

química Índice

I Teor em iões

agressivos (mg(l) Valor do poder

incrustante (mg/l) ≥ 300 - - - Elevada I ≥ 0 - - - > + 25

I ≥ 0 < 300 < +25 Moderada I < 0 > 300 - - - Um outro critério que podemos referir [9] combina três parâmetros característicos: o valor do pH, a mineralização relativa ao total de sais dissolvidos (TSD) e o índice saturação de Langelier (i) com base no algoritmo de Morton [10]:

i = pH + log C + log A + 0,025 T – 0,011 S (1/2) – 12,3 onde C é a dureza carbonatada da água (mg CaCO3/l); A é a alcalinidade (mg CaCO3/l); T é a temperatura da água entre 0ºC e 25ºC S é total de sais dissolvidos (mg/l) com limite máximo de 1000mg/l. Na Tabela 4 indicamos a classificação da potencialidade agressiva das águas aos betões de acordo com este critério.

Tabela 4: Classificação da potencialidade agressiva da água [7]. Parâmetro Valores limite Classificação da agressividade

≤ 6 Elevado potencial agressivo 6 < pH ≤ 8 Aguas equilibradas mas poder dissolvente para TSD baixos 8 < pH ≤ 10 Baixo ou nulo potencial agressivo pH

pH > 10 Potencial agressivo para os minerais silicatados ≤ 100 Elevado poder dissolvente

100 < TSD ≤ 300 Baixo poder dissolvente e moderado potencial agressivo 300 < TSD ≤ 800 Baixo ou nulo potencial agressivo TSD

TSD > 800 Elevada probabilidade de conter iões agressivos ao betão i ≤ (-3) Aguas fortemente agressivas

(-3) < i ≤ (-1) Aguas medianamente agressivas (-1) < i ≤ 1 Aguas pouco agressivas i

i < 1 Aguas não agressivas Dadas dificuldades na realização de estudos de previsão de mineralização e eutrofização das águas numa albufeira, recorre-se em geral ao comportamento em outras albufeiras com as devidas correlações em relação às características litológicas, geológicas e geotécnicas dos maciços a montante dos aproveitamentos. Também é importantes a análise histórica da evolução dos parâmetros característicos da água das albufeiras, valores monitorizados pelos Laboratórios de EDP (Labelec) que nos permitem correlacionar e obter modelos de previsão da agressividade das águas para os betões da obras hidráulicas.

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3.2 Influência dos agregados na deterioração dos betões As normativas nacionais aplicadas aos agregados para betão determinam a aptidão destes constituintes a partir de ensaios de caracterização mecânica, física, geométrica e química, parâmetros que devem ser convenientemente avaliados na fase de projecto ou antes do início da obra que permitam estabelecer quais as medidas a adoptar na formulação das misturas de betão ou adoptar medidas preventivas de protecção ou minimização de riscos expansão potencial por ocorrências de reacções expansivas internas. Com efeito, de acordo com a norma NP EN 206-1:2007 e respectivo DNA e ainda do NP EN 206-1:2007 EMENDA 1:2008, determina-se que, sobre a caracterização dos agregados, se tenham em consideração as seguintes normativas:

a) NP EN 12620:2002+A1:2010 que regulamenta a Marcação CE dos agregados para betão;

b) A Especificação LNEC E467:2006 - Guia para a utilização de agregados em betões de ligantes hidráulicos;

c) A Especificação E461:2007 – Betões: Metodologias para prevenir reacções expansivas internas.

Em obras de aproveitamentos hidráulicos, os volumes de betão envolvidos são , em geral, de quantidades significativas, pelo que no início da exploração de manchas de empréstimo associadas à construção das obras, devem ser devidamente caracterizadas. As manchas de empréstimo podem ter origem em pedreiras para exploração da rocha após realização de reconhecimento litológico e geotécnico do maciço pelos métodos convencionais, ou podem ter origem em depósitos aluvionares naturais avaliando-se em ambos os casos os volumes necessários comparados com os volumes disponíveis de exploração após eliminação das perdas habituais de desmonte e processamento. Em ambos os casos é fundamental que caracterização seja levada a cabo utilizando recolha de sondagens até profundidades adequadas com furação à rotação que permita recolher de amostras da rocha mãe (ver Fig.5), e no caso de depósitos aluvionares pela realização de poços de prospecção com recolha de amostras a diferentes profundidades em face da estratificação natural em que se apresentam estes materiais. Para além da determinação das propriedades mecânicas e físicas da rocha, são realizados no mínimo os seguintes ensaios:

- análise petrográfica de diferentes fácies da rocha com avaliação do potencial reactivo aos álcalis segundo E461 e RILEM AAR-1[11];

- analise mineralógica do rocha - analise química da rocha - avaliação do grau anisotropia da rocha - ensaios de fracturação experimental em moinho laboratorial - determinação das propriedades físicas e geométricas dos agregados grossos e finos

produzidos na fracturação exprimental;

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- determinação de resistência mecânica em argamassas produzidas com as fracções finas e das demandas de água para igual consistência da argamassa normal segundo NP EN 196-1.

     a b c

Figura 5: Prospecção de pedreira: a) Equipamento de sondagens; b) Cx. de sondagem; c) “logging” de sondagem.

Os resultados destes ensaios permite avaliar as propriedades mais relevantes para a produção industrial de agregados a partir da mancha de empréstimo em apreço e determinar quais os factores mais críticos para a produção dos betões da obra, nomeadamente sobre riscos de elevadas perdas de processamento, eventual produção excessiva de fracções finas constituídas por minerais algo deletérios para o betão (por ex., teor em micas), índices de forma do material fracturado que obriguem a adopção de equipamentos correctivos no processamento e muito em particular sobre as condições de lavagem para a produção do agregado mais fino. A influência do agregado na deterioração dos betões é relevante em particular sobre os riscos de reacções expansivas internas por formação de silicatos de cálcio, sódio e potássio responsáveis, sendo os alcalis sódio e potássio lixiviados pela água a partir dos constituintes do cimento ou do próprio agregado, que em ambiente muito alcalino como é caso do betão, dissolve igualmente a sílica dos minerais de quartzo mais tectonizados formando um sílica-gel que expande com a absorção de água e cristaliza formando aqueles silicatos. Tem-se verificado a ocorrência de fenómenos expansivos internos devidos a reacção álcali agregado (RAA) em diversas obras de aproveitamentos hidroeléctricas que levantam sérios problemas de segurança estrutural e consequentemente de acréscimo de monitorização das estruturas como foi o caso da Barragem de Pracana (ver Fig. 6), e em certos casos tomada a opção por demolição e nova construção como é o caso da nova barragem do Alto Ceira [12 ] Estas ocorrências não são exclusivas dos betões de barragem, já que a evolução de reacção expansiva necessita da presença da água, pelo que em elementos de obra correntes como o caso de fundações em edifícios localizadas abaixo ou a cotas muito próximas do nível freático podemos igualmente observar este tipo de fenómenos (ver Fig. 7).

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Figura 6: Paramento de Montante da Barragem de Pracana.

Figura 7: Casos de fundações afectadas com RAA (na cidade do Recife, Brasil).

Os tipos e classificação de reactividade potencial aos alcalis dos agregados (segundo o definido pela Especificação LNEC E415) que se encontram previstos para a construção dos aproveitamentos hidroeléctricos em construção pela EDP Produção estão indicados na Tabela 5 seguinte:

Tabela 5: Tipos de agregados previstas para os aproveitamentos em construção. Nome da Barragem Tipo de Aggreg. grosso Tipo de Agreg. fino Baixo Sabor – escalão montante Baixo Sabor – escalão de jusante Granito britado – Classe II

Ribeiradio-Ermida escalão montante Ribeiradio-Ermida escalão jusante Granito britado Classe I/II Areias naturais (*)

Alto Ceira (Nova Barragem) Granito britado - Classe II Foz Tua Granito britado - Classe II Areias naturais (*) Fridão – aprov. Montante Fridão – barragem jusante

Granito britado – Não Reactivo Areias naturais (*)

Alvito Granito britado – Não Reactivo Areias naturais (*)

(*) proveniência e características a indicar pelo empreiteiro.

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Como se pode observar o numero de casos de agregados que apresentam reactividade potencial aos alcalis tem um peso significativo e exige que sejam tomadas medidas de prevenção adequadas. A Especificação LNEC E 461 recomenda níveis crescentes de prevenção para evitar a ocorrência de RAA nos betões em função das categorias de risco de exposição ambiental, níveis que determinam, nomeadamente:

- Limitar o teor em álcalis nos betões a valores inferiores a 3,0 kg/m3 e 2,5 kg/m3(2) para agregados da classe II e classe III respectivamente ou pela incorporação de adições do tipo II (segundo NP EN 206-1) com um mínimo de 10%, 30% e 50% em relação ao total de ligante de incorporação de sílica de fumo, cinza volante ou escória de alto forno, respectivamente (soluções híbridas são igualmente aceitáveis para proporções pré definidas).

- Evitar um teor crítico de sílica reactiva incorporando uma quantidade suficiente de agregados não reactivos (Classe I) com agregados reactivos (recomendando-se no entanto a verificação através de ensaios);

- Limitar o acesso de humidade no interior do betão pelo aplicação de revestimento adequados;

- Modificar as propriedades do gel de modo não ser reactivo pela incorporação de sais de lítio na água de amassadura.

A primeira das medidas é a mais frequentemente adoptada e também seguida por nós, tendo presente que a incorporação de adições pozolânicas do tipo II são favoráveis à redução significativa do calor de hidratação dos betões, factor que veremos no ponto seguinte. 3.3 Acções ambientais relacionadas com a temperatura ambiente e do betão Os tipos e características dos ligantes hidráulicos dos betões desempenham um papel fundamental no desenvolvimento das temperaturas internas do betão. O clinker, principal constituinte do cimento é o material de reage em primeira mão com a água adicionada ao betão produzindo o que designamos pela hidratação como resultado da formação produtos hidratados a partir dos óxidos de cálcio (CaO), alumínio (Al2O3) e sílica (SiO2) que constituem a estrutura CSH que designamos como abreviatura dos silicatos (S) de cálcio (C) hidratados (H). Esta reacção é exotérmica produzindo uma quantidade de calor que é absorvida pelos constituintes do betão, nomeadamente a água e os agregados, estabelecendo ao longo do tempo um equilíbrio térmico cujos valores de temperatura vão evoluindo com o tempo desde o momento de adição de água. Em regime adiabático, isto é, num sistema sem trocas de calor com o ambiente, as temperaturas terão uma evolução crescente com o tempo, tendendo assintóticamente para um máximo até que 100% da hidratação se concretize o que pode demorar alguns anos. No entanto, é nos primeiros dias (entre 2 e 4 dias) que decorre uma percentagem muito significativa desta hidratação (ver.Fig.8).

(2) Teor em álcalis equivalente = Na2O+0,658 K2O

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0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

0 5 10 15 20 25 30

Cal-hid (kcal/kg)

Idade (dias)

Calor hidratação - Cimentos do Tipo I-42,5

0% cinzas

30% cinzas

50% cinzas

Figura 8: Valores medidos de calor de hidratação pelo método da dissolução em função da

adição de cinzas volantes. Na mesma Fig.8 podemos observar a influência de uma adição pozolânica (neste caso, cinzas volantes) em percentagem em relação ao valor total de ligante hidráulico (cimento + cinzas). Como adição pozolânica, as cinzas são constituídas por compostos amorfos com elevado teor em sílica (nas cinzas silico-aluminosas), cuja hidratação necessita da presença de cálcio e ocorre após o início da hidratação do cimento quando este liberta portlandite (hidróxido de cálcio) com a qual reage formando silicatos de cálcio estáveis. Nas estruturas em massa, o calor desenvolvido pela hidratação tem um papel determinante no risco de fissuração, dado que a estrutura arrefece nas superfícies correspondentes às suas condições fronteira que tanto podem estar com contacto com o ar ambiente, cujas variações térmicas poderão ser estimadas (com ou sem insolação) ou em contacto com a rocha de fundação com a qual se estabelecerá igualmente um equilíbrio térmico em função da transmissão de calor entre a estrutura e a rocha. Esta evolução de calor e o respectivo arrefecimento das superfícies da estrutura criam um gradiente térmico interno entre estas superfícies e a massa interior do betão. Há medida que o arrefecimento das superfícies que sai realizando o betão tende a retrair e o seu interior que se mantém a temperaturas elevadas não retrai, o que origina o desenvolvimento de tensões de tracção nas zonas arrefecidas (ver Fig.4). Estas tensões aumentam se ocorreram situações de restrição externa ao volume de betão em análise, razão pela qual o tempo entre betonagens sucessivas deve ser limitado. Este fenómeno tanto pode ocorrer de uma forma lenta quando se efectuam protecções adequadas nas superfícies, como pode ocorrer em forma de choque térmico (sem protecções ou nos casos em que retiramos as cofragens que induzem alguma protecção) e expomos as superfícies a temperaturas ambientes baixas como nos casos de forte arrefecimento nocturno. Existem outros factores que contribuem de forme relevante para o risco de fissuração que não poderão ser ignorados, nomeadamente a influência da retracção autógena e hidráulica do betão,

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1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 163

do efeito da fluência, da evolução do módulo elástico com o tempo, do grau de compactação obtido, e da variação destes parâmetros com a temperatura. A utilização de modelos de elementos finitos para estimar a evolução das temperaturas no interior das estruturas é hoje uma ferramenta corrente assim como para estimar a distribuição de tensões nas estruturas. Por isso a utilização da adições pozolânicas como as cinzas volantes como referimos atrás, ou à base de escória de alto forno ou de metacaulinos ou ainda de soluções híbridas destas adições representam soluções técnicas adequadas para a formulação de misturas a aplicar em betões em massa. No entanto, existem outras métodos de minimização dos riscos de fissuração térmica que passem pelo arrefecimento do betão na fase de fabrico ou imediatamente antes da colocação e compactação do betão, que designamos por pré refrigeração. Os métodos baseados em sistemas de isolamento das superfícies betonadas para diminuição dos gradientes com o ar ambiente não são exequíveis neste tipo de obras. Aqueles métodos, actuando isoladamente ou em conjunto, podem ser obtidos pela refrigeração dos agregados grossos em banhos de água a 3ºC, pela incorporação de gelo moído em escamas a -10ºC ou água refrigerada a 3ºC nas misturadores do betão, pela injecção de nitrogénio líquido em túneis de refrigeração onde passa o betão após o seu fabrico, efeitos que associados à aplicação de dispositivos de redução transmissão de calor para os constituintes do betão constituem soluções técnicas possíveis de serem adoptadas. 4. ESPECIFICAÇÃO DOS BETÕES COM VISTA À DURABILIDADE A abordagem à especificação dos betões das obras hidráulicas relacionadas com a durabilidade e cujas principais acções ambientais referimos atrás deve, de acordo com as recomendações internacionais [13], ser fundamentalmente desenvolvida na fase de concepção das estruturas adoptando medidas proactivas nesta fase de projecto em vez de medidas reactivas de manutenção e reparação na fase de exploração

Fase

concepção Projecto

Execução Construção Operação e uso;

Reparações; Manutenções

Abandono

Os requisitos do

dono de obra são definidos

Detalhe do projecto para construção

Projecto “as built”

Avaliação da performance de

durabilidade

Remoção, demolição e reciclagem

Figura 9: Gestão das estruturas de betão – estágios de avaliação da durabilidade dos activos.

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164 JMC’2011

Com efeito, no ciclo de vido de um empreendimento (ver Fig.9) quanto mais cedo foram identificados e quantificados os cenários de deterioração das estruturas menor serão os custos de manutenção e operação dos activos construído. As normativas nacionais aplicáveis à especificação dos betões com vista ao cumprimento dos requisitos de durabilidade dependem também da identificação e classificação das acções ambientais, sendo que estas acções decorrem fundamentalmente da eventual acção agressiva das águas de contacto e da acção da carbonatação cuja influencia se reflecte nos recobrimentos adoptados nas zonas armadas das estruturas em massa. Aquelas normativas que são aplicáveis nestes casos foram já referidas atrás, noemeadamente as especificações do LNEC E461 e E464, sendo a primeira relativa às metodologias para prevenir reacções expansivas internas no betão e a segundo como medidas prescritivas para satisfação da vida útil dos betões de 50 anos e 100 anos para os tipos de ligante previstos na NP EN 197-1, fornecendo assim informação sobre a aptidão destes os ligantes em função classificação das acções ambientais agressivas também já referidas anteriormente (Tabela 2). Tabela 6: Limites de composição e da classe de resistência para betão sujeito a ataque químico

e para uma vida útil de 50 anos.

Classe Exposição Ambiental

Relação A/C

máxima

Dosagem Mínima Cimento

(kg/m3)

Classe de Resist. Mínima

Tipos de cimento

0,55 320 C30/37 XA1

0,50 340 C35/45

0,50 340 C35/45 XA2

0,45 360 C40/50

360 C35/45 XA3 0,45

380 C40/50

1º caso:

IV/A (Referencia) ; IV/B ; III/A ; III/B ; V ; II/B(*) ;

II/A-D ---------------------------------

2º caso :

I ; II/A (*)

(*) não aplicável a cimentos II-T, II-W, II/B-L e II/B-LL De acordo com a E464, as especificações dos betões para a durabilidade de 100 anos são as reproduzidas na Tabela 6, acrescidas por:

- diminuição da máxima razão água/cimento em 0,05; - a dosagem mínima de cimento deve ser aumentada de 20 kg/m3 - a classe de resistência à compressão é aumentada de 2 classes.

Isto é, numa situação mais corrente de agressividade XA1, e mesmo com a utilização de um cimento CEM IV, aquelas especificações recomendariam um betão de dosagem não inferior a 340 k/m3, uma relação água/cimento máxima de 0,50 e uma classe de resistência C40/50. Para betões em massa, mesmo armados, a dosagem mínima de 340 kg/m3 poderia criar gradientes térmicos importantes que obrigariam a que a betonagem fosse realizada de forma

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1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 165

suficientemente lenta para que permitisse um arrefecimento gradual de cada camada de betonagem. No entanto a exigência de uma classe C40/50, exigiria uma dosagem seguramente superior àquele valor e inviabilizaria a execução destas estruturas num prazo considerado razoável. Salientaremos adiante que estas estruturas em geral nunca são solicitadas a idades tão jovens como os 28 dias, pelo que a adopção de idades mais avançadas para as especificações não só adequa a execução à especificação como contribui para a redução dos prazos de execução das obras por nos permitir executar espessuras de camadas de betonagem compatíveis. Nos casos de em que a acção ambiental principal é a carbonatação e com a utilização de adições equivalentes a um cimento CEM IV, recomenda a E464 para os 50 anos de vida útil a utilização de um recobrimento mínimo das armaduras de 40mm, uma dosagem mínima de cimento de 300 kg/m3, uma relação água/cimento máxima de 0,55 e uma classe de resistência não inferior C30/37. Para 100 anos de vida útil recomenda-se o apenas aumento do recobrimento em 10 mm, o que para estas estruturas não representa qualquer dificuldade de adopção em face das dimensões que as secções normalmente apresentam. Retomando ainda a acção da carbonatação, e seguindo os princípios da Especificação LNEC E465 [14] no seu Anexo A, a qualidade do betão de recobrimento das armaduras que permita uma resistência à carbonatação de uma estrutura nas condições em que os obras de aproveitamentos hidráulicos são realizadas, isto é, estruturas com elementos até à classe estrutural 6 (cmin,dur = 40mm) e com uma classe de fiabilidade RC3, conforme se determina na NP EN 1990:2009 [1] para níveis de inspecção IL3, e realizadas com cimentos do tipo CEM IV, o coeficiente mínimo de permeabilidade ao ar K60HR = 0,41 x 10 -16 m2, valor equivalente ao obtido pelo ensaio realizado pelo método do CEMBUREAU descrito na Especificação LNEC E 392 [15]. Deste modo, se garantirmos que a qualidade do betão de recobrimento satisfaz esta especificação, embora mantendo o valor daquele recrobimento com um mínimo de 40mm, não teremos de nos preocupar excessivamente com a classe de resistência para efeitos de garantia da durabilidade para aquela vida útil desde que se cumpram os coeficientes de permeabilidade ao ar indicados. Assim a especificação relativa a esta propriedade de permeabilidade do betão ao ar que utilizamos nas obras hidráulicas serão consideradas com os seguintes limites:

- K60HR < 5 x 10-17 m2 para zonas das estruturas não submersas e zonas com ciclos molhagem/secagem; e

- K60HR < 10 x 10-17 m2 para zonas das estruturas submersas No entanto, não dispomos de orientação naquelas normativas de igual abordagem com base em modelos de deterioração para as acções ambientais relativas às águas agressivas. Nestes casos recorremos aos princípios orientadores do estudo da permeação em meios porosos, como é o caso de estrutura do betão endurecido, através das seguintes propriedades de permeabilidade aos fluidos:

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- Resistência à capilaridade da água - Resistência à permeabilidade à água; e - Porosidade do betão

Sobre a resistência à capilaridade, a sua determinação segue o definido nas especificação do LNEC E 393 [16] definindo o coeficiente de capilaridade S (m3/m2.s-0,5) a partir da equação [17]:

i = S . t 0,5 onde i é o volume acumulado de água absorvida pelo provete no tempo t (horas). Seguindo ainda esta autor, e tendo presente a publicação[18] e considerando valores medidos pela EDP em betões aplicados em obra congéneres que demonstraram terem a durabilidade adequada com resultados inferiores a 0,12 kg/m2.h(1/2), consideramos como especificação limite em função do níveis de exigência, os seguintes limites:

S < 0,15 kg/m2.h(1/2), para zonas mais exigentes e S < 0,20 kg/m2.h(1/2), para zonas medianamente exigentes.

Quanto à permeabilidade à água, seguimos como princípio da resistência à penetração dos fluidos os valores obtidos pelos ensaios de:

- absorção de água por imersão à pressão atmosférica, conforme determinado pela Especificação LNEC E394 [19], uma vez que este ensaio nos permite obter uma medição indirecta da porosidade do betão; e

- penetração de água sob pressão, determinado pelos procedimentos da norma NP EN 12390-8[20], uma vez que este valor nos permite obter uma estimativa do coeficiente de permeabilidade segundo a equação de Darcy segundo os estudos de O. Valenta [21].

Para a absorção de água tomamos como valores de referência de 12% e 14% consoante as estruturas se localizem em zonas de maior ou menor exigência, respectivamente, valores que baseamos igualmente em resultados de ensaios realizados em provetes de estruturas de obras hidráulicas da EDP de comprovado desempenho. Quanto ao valor da penetração de água sob pressão, utilizamos os referenciais reportados pela Concrete Society [22] de:

- máxima penetração de água de 35mm para estruturas de betão armado em zonas mais agressivas ou em estruturas mais susceptíveis;

- máxima penetração de água de 50 mm para estruturas de betão armado correntes; e - máxima penetração de água de 70mm para estruturas de betão sem armaduras.

Salientamos que estas propriedades de desempenho dos betões em relação às acções ambientais são especificadas para idades mais avançadas que os 28 dias de referência utilizados na determinação da classe do resistência dos betões.

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1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 167

Aliás, seguimos com isto o princípio que o antigo Regulamento de Betões e Ligantes Hidráulicos (Decreto-Lei 445/89 de 30 Dezembro) determinava no seu artigo 15º sobre a definição das dosagens mínimas de ligante para as classes dos betões com exigências de durabilidade (tipo BD), no qual se distinguiam as situações em que o meio agressiva entrava em contacto com o betão:

- antes do início de presa; - até 24 horas após o fabrico do betão; e - depois de 24 horas do fabrico do betão.

Nos casos presentes o meio agressivo das águas de contacto, com excepção das águas drenadas os maciços rochosos onde se executam as estruturas subterrâneas e das águas pluviais, só entram em contacto com os betões muitos meses após o seu fabrico. Também naquele regulamento se salvaguardavam as situações de aplicação dos requisitos de durabilidade aos “betões em massa” quando se afirmava no ponto 3 do artº 6º o seguinte: “No caso de peças de grande espessura cuja superfície esteja em contacto com ambientes agressivos, a utlização dos betões do tipo BD só é imposta numa camada superficial cuja espessura seja suficiente para isolar a massa de betão da acção agressiva do ambiente exterior”. Esta última observação da anterior regulamentação faz todo o sentido, e poderá ser aplicada desde que a execução da peça permita colocar dois betões diferentes sem erros de troca na aplicação, e que garanta que o betão de protecção à massa interior mantenha em toda a periferia uma espessura mínima entre 0,5m e 1,0m. Relativamente às idades de referência das especificações atrás referidas, assim como as especificações relativas às classes de resistência entendemos deverem ser consideradas no projecto a idades não inferiores a 90 dias. Só em casos especiais de estruturas mais esbeltas ou que necessitam de capacidade resistente por razões associadas à sua função ou por razões associadas a tempo de descofragem mais curto se especificam idades de referência de 28 dias. 4. CONCLUSÕES As especificações de “betão em massa” com armaduras ou sem armaduras para as estruturas projectadas e realizadas para obras hidráulicas como barragens e centrais hidroeléctricos (subterrâneas ou não) representam um desafio em relação ao que se considera nas normativas nacionais dos betões em relação aos requisitos de durabilidade. Com efeito, aquelas normativas encontram-se fundamentalmente concebidas para estruturas correntes de betão armado, o que aplicado ao “betão em massa” para uma vida útil de 100 anos obrigaria, como vimos, a adoptar uma classe de resistência do betão muito elevada e não compatível com os ritmos de construção pretendidos por necessidade de optar por alturas de betonagens não inferiores a 2,0 m, uma vez que tal ritmo de construção originaria um excessivo risco de fissuração térmica.

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A experiência da EDP Produção que aqui apresentamos, procurou basear-se nas metodologias do desempenho dos betões em relação com os agentes agressivos em presença naquelas estruturas, metodologias que nos permitiram estabelecer especificações compatíveis com os ritmos de construção sem comprometer a durabilidade prevista no projecto. REFERÊNCIAS [1] NP EN 1990:2009 Eurocódigo – Bases para o projecto de estruturas, IPQ-Instituto

Português da Qualidade, Dez. 2009. [2] NP EN 206 – Betão- Parte 1: Especificação, desempenho, produção e conformidade, IPQ-

Instituto Português da Qualidade, Jun.2007. [3] Barragens em Portugal no portal: http://cnpgb.inag.pt/gr_barragens/gbportugal/index.htm [4] ACI Committe 207 – Mass Concrete for Dams and Other Massive Structures”, American

Concrete Institute, Farmington Hills, USA, 2007. [5] Especificação LNEC E 464 – Betões – Metodologia prescritiva para uma vida útil de

projecto de 50 e de 100 anos face às acções ambientais, LNEC, Lisboa, 2007. [6] Rendell, F, et al., Deteriorated concrete – inspection and phisicochemical analysis,

Thomas Telford Ldt, 1sted. London, 2002. [7] Decreto-Lei 344/2007 de 25 de Outubro- Regulamento de Segurança de Barragens,

Diário da República, 1ª série, nº 198, pags 7459-7474. [8] Sousa Coutinho, A.; Fabrico e propriedades do betão, LNEC, Lisboa, 1973. [9] Santos da Silva, H., “Estudo de envelhecimento das barragens de betão e de alvenaria-

Alteração físico-química dos materiais”, Tese para grau de Especialista, LNEC, Lisboa, 1992.

[10] ICOLD Bulletin nº71 – Exposure of dam concrete to special aggressive waters – guidelines, International Commission on Large Dams, Paris, 1989.

[11] Rilem Recommended Test Method AAR-1, 2003, “Detection of potential alkali-reactivity of aggregates – Petrographic method”, TC 191-ARP: Alkalireactivity and prevention – Assessment, specification and diagnosis of alkalireactivity, prepared by I. Sims and P. Nixon, Materials and Structures Vol. 36, pp. 472-479.

[12] Camelo, A. – EDP Experience on management and rehabilitation of AAR affected dams” – Presentation for LNEC Course 1: Concrete dams subjected to alkali aggregate reactions AAR): diagnosis, modeling and rehabilitation, Lisboa, Fev.2011.

[13] Concrete Structure Management – Guide ownership and good practice, fib Bulletin 44, Fedération Internationale du Beton, Lausanne, 2008.

[14] Especificação LNEC E465 – “Metodologia para estimar as propriedades de desempenho do betão que permitem satisfazer a vida útil de projecto de estruturas de betão armado ou pré-esforçado sob as exposições ambientais XC ou XS, LNEC, Lisboa, 2007.

[15] Especificação LNEC E392 – “Betões – determinação da permeabilidade ao oxigénio”, LNEC, Lisboa, 1993.

[16] Especificação LNEC E393 – “Betões – determinação da absorção de água por capilaridade”, LNEC, Lisboa, 1993.

[17] Hall, C., Water movement in porous building materials I: Unsaturated flow theory and its application, Building Environment, vol.12, issue 2, pags. 117-125, Elsevier Ldt., 1977.

[18] Hall, C., Water sortivity of mortars and concretes: a review, BMagazine of Concrete research, nº 41, issue 147, pags. 51-61, Elsevier Ldt., Jun. 1989.

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[19] Especificação LNEC E394 – “Betões – determinação da absorção de água por imersão”, LNEC, Lisboa, 1993.

[20] NP EN 12390-8, “Ensaios de betão endurecido. Parte 8: Profundidade de penetração de agua sob pressão”, IPQ, Lisboa, 2009.

[21] Valenta, O., The permeability and the durability of concrete in aggressive conditions, Proceedings 10th International Congress on Large Dams, pp 103-117, Montreal, 1970.

[22] The Concrete Society, Permeability testing of site concrete – a review of methods and experience, Report of a concrete society party, Concrete Society Technical Report no. 31, p.95, London , 1988.

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