CRISTIANE STADLER STECINSKI
USURPAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DAS POLÍCIAS JUDICIÁRIAS PELAS
POLÍCIAS MILITARES: CONSTITUCIONAL OU NÃO?
PONTA GROSSA
2014
CRISTIANE STADLER STECINSKI
USURPAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DAS POLÍCIAS JUDICIÁRIAS PELAS
POLÍCIAS MILITARES: CONSTITUCIONAL OU NÃO?
Artigo científico apresentado à disciplina de
Metodologia da Pesquisa Científica como
requisito parcial para a conclusão do Curso de
Pós-Graduação Lato Sensu – Especialização
em Direito Penal e Processo Penal do Núcleo
de Pesquisa em Segurança Pública e Privada
da Universidade Tuiuti do Paraná.
Orientador: Prof. Jorge Sebastião Filho.
PONTA GROSSA
2014
USURPAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DAS POLÍCIAS JUDICIÁRIAS PELAS POLÍCIAS MILITARES: CONSTITUCIONAL OU NÃO?
RESUMO: O presente trabalho desenvolveu-se a partir da Constituição Federal de 1988. Visa apresentar tópicos sobre um assunto de extrema importância para a sociedade brasileira, a Segurança Pública, prevista no artigo 144 da CF, onde estão delineadas as atribuições dos diversos órgãos encarregados da segurança pública do país. Mas, um questionamento acerca da maneira como essas atribuições foram definidas deve ser feito, pois vários conflitos têm surgido, principalmente, entre a Polícia Militar e a Polícia Civil, devido à maneira como cada uma interpreta o referido artigo. A Polícia Militar, que em um primeiro momento realizaria somente o policiamento ostensivo/preventivo, acaba realizando investigações, por meio de seu Serviço de Inteligência e a Polícia Civil, que deveria, segundo interpretação errônea da Constituição, realizar apenas as atividades de polícia judiciário-investigativa, acaba realizando atividades típicas da Polícia Militar, ou seja, realiza bloqueios em vias públicas, utilizando-se de viaturas caracterizadas e policiais devidamente uniformizados. O principal objetivo deste trabalho é demonstrar, de maneira clara e objetiva, que para um eficiente trabalho voltado à segurança pública, é necessário que se faça uma interpretação mais extensiva das atribuições tanto da Polícia Militar como da Polícia Civil, para que se atenda ao princípio da eficiência do serviço público prestado. Este trabalho teve como base o método dialético, sendo consultados acervos bibliográficos, bem como sites na internet e jurisprudências do STJ e STF.
PALAVRAS-CHAVE: Constituição Federal; Atribuições de Competências; Eficiência do Serviço Público; Segurança Pública.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................... 4
2 REVISÃO DE LITERATURA................................................................... 6
2.1 ATRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DA POLÍCIA MILITAR.................... 7
2.1 ATRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DA POLÍCIA CIVIL......................... 8
3 CONFLITOS CORPORATIVOS................................................................ 9
3.1 TERMO CIRCUNSTANCIADO............................................................... 9
3.2 MANDADO DE BUSCA DOMICILIAR.................................................. 10
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................... 16
5 REFERÊNCIAS......................................................................................... 18
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USURPAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DA POLICIA JUDICIÁRIA POR MILITARES:
CONSTITUCIONAL OU NÃO ?
Cristiane Stadler Stecinski1
1 - INTRODUÇÃO
A sociedade brasileira, de um modo geral, costuma confundir as atribuições
dos diversos órgãos responsáveis pela manutenção da Segurança Pública do país,
não sabendo definir quais funções caberiam a cada um deles.
Dentre as várias polícias existentes no Brasil, Polícia Militar, Polícia Civil,
Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Ferroviária Federal, além das
Guardas Municipais, criadas pelos municípios, quis o legislador constitucional
garantir na Carta Magna um serviço essencial e eficiente de preservação da ordem
pública e da segurança pública.
O presente trabalho preocupou-se, apenas, em estudar as atribuições da
Polícia Militar, comparando necessariamente com as atribuições de outros órgãos
encarregados da segurança pública principalmente as atividade exercidas pela
Polícia Civil, sendo feita uma análise crítica acerca das interpretações doutrinárias
sobre as suas competências.
Muitas vezes Oficiais da Polícia Militar são acusados do crime de
"Usurpação de Função Pública", seja por advogados, na defesa dos interesses de
seus clientes, ou por integrantes da Policia Civil, Delegados de Polícia, que visando
interesses Corporativos, acabam enviando representações ao Judiciário e ao
Ministério Público, contra os Policiais Militares.
Os próprios Delegados instauram Inquéritos Policiais para apurarem a
"Usurpação de Função Pública por parte de Oficiais da Polícia Militar", contudo,
muitas dessas representações são arquivadas de imediatos pelo Judiciário, ou
quando são oferecidas denúncias pelo MP, não prosperam.
1 Graduação em Direito, Advogada atuante com inscrição na OAB/PR sob o nº 45.749 - Pós
Graduada e Especialista em Direito Civil e seus Instrumentos de Tutela pela Universidade Anhanguera – Uniderp – São Paulo – SP e Pós Graduanda em Direito Penal e Processo Penal, voltados à área de Segurança Pública.
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A bibliografia sobre o assunto é bastante escassa, por isso, este trabalho
levará em consideração, além do aspecto legal, os anseios da sociedade em relação
ao trabalho policial.
O tema foi proposto, devido às inúmeras discussões presenciadas, ao longo
de anos de serviço na administração da Justiça, acerca das competências da Polícia
Militar e das competências da Polícia Civil, ficando a sociedade brasileira exposta às
ações de criminosos, os quais se aproveitam de um sistema policial inoperante e
ineficaz, que busca atender interesses pessoais em detrimento de toda uma
sociedade.
A Polícia Militar deve dispor de um Serviço de Inteligência capaz de obter
dados para identificar quem são os criminosos, como e onde eles atuam, visando
obter um policiamento preventivo/repressivo eficaz. É importante ressaltar que a
investigação realizada pela Polícia Militar não se confunde com a investigação
realizada pela Polícia Civil, a Polícia Militar não instaura inquéritos policias, não
interroga suspeitos, portanto, não há que se falar em usurpação da função pública
por parte de policias militares.
Porém, os responsáveis pela Segurança Pública, ao julgarem incorretas
algumas atividades praticadas pela Polícia Militar, parecem esquecer-se que sua
missão Constitucional é prestar um Serviço Público eficiente, para a garantia da
Preservação da Ordem Pública e da Segurança Pública. A sociedade almeja que o
Estado tenha uma atuação eficaz de combate ao crime, para que aquele que
cometeu o delito seja julgado e, caso seja declarado culpado seja condenado.
Para se fazer um estudo correto sobre o tema em questão, é necessário,
além de fazer uma análise sobre as origens da "Polícia" e da sua necessidade para
a proteção da sociedade, identificando suas atribuições Constitucionais e Infra
Constitucionais, que sejam observados os aspectos Constitucionais, o Direito
Administrativo e as Leis Processuais, levando em consideração o espírito do
legislador.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 144, parágrafo 5º, trata da
atribuição da Polícia Militar conferido a ela o exercício de polícia ostensiva e a
garantia da preservação da ordem pública. O parágrafo 4º do artigo 144 da
Constituição Federal foi dedicado às polícias civis, que dirigidas por delegados de
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carreira, incumbem, ressalvadas a competência da União, as funções de polícia
judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
A discussão surge exatamente destes pontos, ou seja, cabe à "Policia
Militar" o policiamento ostensivo/preventivo, e à "Policia Civil" a função de polícia
judiciária e a apuração de infrações penais. Deveria então diante do que dispõe o
texto constitucional a Polícia Militar ater-se tão somente ao patrulhamento
ostensivo? Ocorrendo um delito como deveria ela agir? E, se tomasse conhecimento
de que em determinado local estariam sendo guardados objetos produtos de ilícitos,
ou que poderiam estar sendo guardadas armas para serem utilizadas na prática de
crimes, como deveria a Policia Militar agir? A atividade investigativa é exclusiva da
Polícia Civil?
Tais questões surgem e causam grandes divergências doutrinárias. Buscar-
se-á com esse trabalho demonstrar qual seria o melhor procedimento, qual a melhor
doutrina, objetivando sempre oferecer um serviço de Segurança Pública eficiente,
que atenda aos anseios da Sociedade brasileira.
2 – REVISÃO DE LITERATURA
2.1 - ATRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DA POLÍCIA MILITAR
A Constituição Federal, em seu artigo 144,parágrafo quinto, atribuiu a Polícia
Militar a função de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, contudo,
essas funções não podem ser entendidas como sendo absoluta, e mais importante,
não se pode restringir a atividade desse Órgão, apenas ao policiamento ostensivo.
Na verdade, entende-se que o legislador constitucional, ao atribuir as
funções aos diversos órgãos encarregados de manter e garantir a segurança pública
traçou um parâmetro de atuação, não fazendo isso de modo taxativo, impedindo a
Polícia Militar de investigar.
É importante ressaltar que a investigação aqui tratada, é aquela referente à
prevenção da infração delituosa e não a investigação para se descobrir o autor do
delito, produzindo provas para a propositura da ação penal. Não se fala, nem se
cogita a possibilidade da Polícia Militar de promover interrogatórios de suspeitos,
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requerer perícias e buscar provas de autoria de materialidade do delito.
Segundo o parágrafo quarto, do artigo 144 da Constituição Federal, a Polícia
Militar seria de exclusividade da Polícia Militar, somente a instauração de Inquérito
Policial Militar para apuração de crimes de natureza militar:
“Artigo 144 § 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de
polícia de carreira incumbem ressalvadas a competência da
União, as funções de polícia judiciária e a apuração de
infrações penais, exceto as militares.”
O legislador constitucional, ao traçar o parâmetro de atuação dos diversos
órgãos encarregados da segurança pública, quis mostrar que ela é um dever do
Estado e, por isso, deve obedecer aos princípios constitucionais da efetividade, que
consistem em medidas adequadas que visem impedir que ocorra o dano ao
patrimônio público, seja de ordem material ou pessoal.
2.2 - ATRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DA POLÍCIA CIVIL
O parágrafo quarto, do artigo 144, da Constituição Federal, foi dedicado à
Polícia Civil, sendo elencadas as suas atribuições, e quem deve dirigi-las. A
Constituição Federal determina de maneira clara, que à Polícia Civil cabe o dever de
investigar o crime já ocorrido.
Além do texto transcrito no parágrafo quarto do artigo 144, da Constituição
Federal, pode-se ler no artigo quarto do Código de Processo Penal o seguinte:
“A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no
território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a
apuração das infrações penais e de sua autoria.”
Segundo doutrina, a missão da Polícia Civil consiste na repressão do crime
já ocorrido, ou seja, ela é na essência uma polícia de investigação que, para
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esclarecimento do delito, deflagra procedimento administrativo (inquérito policial).
Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Junior, assim definem a atribuição
da Polícia Judiciária:
(...) a polícia judiciária também conhecida como polícia de
investigação, cuja missão consiste na repressão do crime. Isto
é, uma vez ocorrido deflagra procedimento administrativo
(Inquérito policial) voltado para busca da certeza material da
existência do crime, bem como assim de quem seja seu autor,
(...). (2005. p 419).
Mesmo que a Polícia Civil e a Polícia Federal sejam denominadas polícias
judiciárias, elas possuem algumas diferenças entre si. A Polícia Federal tem como
finalidade, exercer as funções de polícia judiciária da União, sendo responsável pela
apuração de infrações penais contra a ordem política e social, ou em detrimento de
bens, bem como pela repressão ao tráfico de entorpecentes, pelo contrabando e o
descaminho, exercendo as funções de polícia marítima, aeroportuária e de
fronteiras, por fim exercer com exclusividade as funções de polícia judiciária da
União.
Neste ponto e forçoso reconhecer que há mais uma limitação de atribuições
conferidas à Polícia Civil, qual seja, não cabe à Polícia Civil a possibilidade de
exercer as funções de polícia marítima, de fronteiras, aeroportuárias e a mais
importante, as funções de polícia judiciária da União.
3 - CONFLITOS CORPORATIVOS
Os conflitos entre os órgãos encarregados da segurança pública, Polícia
Militar e Polícia Civil surge da interpretação de dispositivos previstos em nosso
Ordenamento Jurídico, dentre estes dispositivos destacam-se o Mandado de Busca
Domiciliar, o TC (Termo Circunstanciado) e a Interceptação Telefônica.
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3.1 - TERMO CIRCUNTANCIADO
O Termo Circunstanciado foi criado pela Lei Nº. 9099/95, sendo
posteriormente alterado pela Lei No 10.259, de 12 de julho de2001. As duas Leis
que instituíram o TC têm como objetivo dar maior agilidade aos procedimentos de
menor potencial ofensivo, mas acabaram gerando enormes conflitos entre duas
corporações: Polícia Civil e Polícia Militar.
A primeira corporação entende que apenas ela teria competência para a
confecção do referido documento, pois somente o Delegado de Polícia estaria apto,
devido a sua formação jurídica, mas a segunda, Polícia Militar, acredita que seus
agentes também estão aptos e legalmente amparados para a lavratura do
documento.
Os argumentos da Polícia Militar estão fundamentados na lei que instituiu o
TC, em substituição ao Inquérito Policial na apuração de infração de menor potencial
ofensivo, que em momento algum cita o Delegado de Policia como o único
competente para a elaboração do documento.
José Vicente da Silva, Coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo,
acredita que o termo circunstanciado é um ato de toda a polícia:
"É um trabalho de registro de um fato, não de investigação. A
PM está mais próxima ao cidadão e pode aliviar a burocracia
da Polícia Civil, fazendo registros de ocorrência e termos
circunstanciados. O policial militar pode ser treinado para
atender o cidadão de imediato, em crimes de menor potencial
ofensivo, acelerando os procedimentos que vão para a Justiça.
É o interesse público que está em jogo (...)"
Em muitas localidades, como por exemplo, no Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Paraná, São Paulo, Pernambuco, Mato Grosso do Sul e Acre, a Polícia
Militar elabora o TC e encaminha diretamente aos JEC’s (Juizados Especiais
Criminais). Um bom exemplo a ser citado é a Polícia Ambiental do Estado de São
Paulo, que elabora os "TC’s" quando constata a infração de menor potencial
ofensivo, fundamentando seu entendimento no Provimento Nº 758/2001, do
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Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, e na
Resolução SSP 403/2001, prorrogada pela Resolução SSP 517/2002, da Secretaria
de segurança Pública de São Paulo.
Recentemente, o STF, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2862,
proposta pelo ex Partido da República (PR), que pretendia ver declarada a
inconstitucionalidade do Provimento acima mencionado, bem como da Resolução
emitida pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, julgou por unanimidade
a improcedência do pedido, reconhecendo que os policiais militares são autoridades
competentes para elaboração do Termo Circunstanciado.
3.2 - MANDADO DE BUSCA DOMICILIAR
O mandado de busca domiciliar, citado no artigo 240 do Código de Processo
Penal, é outra atividade que tem gerado conflitos entre a Polícia Militar e a Polícia
Civil, pois há dúvidas quanto a quem pode solicitar sua expedição. Os advogados,
por motivos óbvios, alegam ser ilegais a representação feita pela Polícia Militar pela
concessão de Mandado de busca domiciliar.
A Polícia Civil, por sua vez, alega que somente o Delegado de Polícia pode
representar pela expedição do mandado de busca domiciliar. Mas, pode-se perceber
que, geralmente, quando a Polícia Militar cumprindo mandado de busca por ela
solicitado junto ao Poder judiciário e em sendo a ocorrência apresentada ao
Delegado de Polícia, caso seja necessário, é feita a apreensão dos objetos do delito,
das armas ilegais, da droga, além de produtos provenientes de descaminho e
contrabando, sendo o infrator da lei autuado e recolhido ao cárcere, contudo, ao
término da ocorrência apresentada, a autoridade policial, em muitos casos, tem
registrado o Termo Circunstanciado contra o Policial Militar que assinou a
representação, com a alegação de usurpação de função pública, chegando a
fundamentar que o cumprimento do mandado causou constrangimento ilegal ao
indiciado.
No Código de Processo Penal não há previsão alguma de que a
representação pela concessão do mandado de busca junto ao Juiz de Direito seria
de competência exclusiva do Delegado de Polícia. Para melhor compreensão, é
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necessário que se transcreva o artigo 240 do CPP:
“A busca será domiciliar ou pessoal.
§ 1º proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões
a autorizem, para:
a) prender criminosos
b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;
c) apreender instrumentos de falsificação ou contrafação e
objetos falsificados ou contrafeitos
d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na
práticas de crimes ou destinados a fim delituoso;
e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à
defesa do réu;
f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou
em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento de
seu conteúdo possa ser útil a elucidação do fato;
g) apreender pessoas vítimas de crimes;
h) colher qualquer elemento de convicção.”
O que se pode observar é que somente as letras "e", "f" e "g", do parágrafo
primeiro, do artigo 240 do CPP tratam de prerrogativas do Delegado de Polícia, pois
estão relacionadas à fase de coleta de provas, para instruir o Inquérito Policial. Em
tais situações, mesmo sem Inquérito Policial instaurado, o Ministério Público pode
solicitar provas.
O artigo 242 do CPP, disciplina como será concedido o mandado de busca,
ou seja, ele poderá ser determinado de oficio, ou a requerimento das partes,
vejamos:
“Art. 242 - A busca poderá ser determinada de ofício ou a
requerimento de qualquer das partes.”
Como reconhecimento de que não há ilegalidade na representação feita pela
Polícia Militar junto ao Poder Judiciário, pode-se citar um caso ocorrido no Rio de
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Janeiro, onde o Serviço de Inteligência do 11º Batalhão de Policia Militar, ao tomar
conhecimento de que na residência de um homem, sobre o qual recaíam várias
denúncias de crimes, havia vários objetos de ilícito penal, uma vez o Juiz tendo
tomado conhecimento da representação expediu o mandado de busca domiciliar que
foi cumprido pela Polícia Militar.
Após o término das diligências, o suspeito foi encaminhado ao Distrito
Policial, sendo todas as demais atividades executadas pela Polícia Civil. O
Advogado do indiciado, entendendo que o mandado de busca que originou a prisão
era ilegal, requereu liberdade provisória, a qual foi indeferida pelo Juiz de primeiro
grau.
Foi interposto junto ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Hábeas Corpus
em favor do indiciado, mas foi denegado. Inconformado, o advogado buscou reverter
a situação, por meio do RHC Nº. 14-1236:
“Recurso de hábeas coppus 14° 1236 - rio de janeiro -
(91.0010556 2) o sr. Ministro jost dantas josé claudio marques
barboza e outro tribunal de justiça do estado do rio de janeiro
marco aurélio da silva cordeiro ementa processual pena,.
Inquérito policial. Busca e apreensão Mandado Judicial.
Alertada por notitia criminis oriundo de Órgão policial militar,
não macula a busca e apreensào o cumprimente do respectivo
mandado judicial pelo mesmo órgo, tanto mais que se seguiu a
regular instauração do inquérito pela policia civil, qual foram
entregues os bens apreendidos. (sic) ACÓRDÃO Vistos e
relatados estes autos em que são partes as acima mdi cadas.
Decide a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unaimidade, negar provimento ao recurso na forma do relatório
e notas taquigrficas constantes dos autos, que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília, 26 de junho de 1991 (data do julgamento). (sic). Para
o julgamento do RHC, acima mencionado, o STJ requereu
informações do Juiz de primeiro grau, que assim se
manifestou: (...) O SR. MINISTRO JOSÉ DMNTAS(RELATOR):
Senhores Ministros, tenha se presente a informaçàc do juiz
impetrado, sobre as circunstâncias em que se deu a discutida
apreensão. Ei Ia: Em 17 de abril passado recebi ofício do
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Comando do 11 Batalhão de Polícia Militar solicitando
expedição de mandado de busca e apreensão na residëncia do
Paciente, apresentando a digna autoridade requeren te os
motivos justificadores da medida. Entendendo serem justos tais
motivos, mesmo porque sobre o Paciente recaiam suspeitas de
que tinha em sua posse objetos e valores provenientes de
furtos, acolhi a solicitação, determinando rosse expedido o
mandado. Cumprida a diligência, rol este Juízo noticiado do
seu resultado, sendo no local apreendidos vários objetos,
inclusive certa quantia em dólares americanos, tudo indicando
que de origem ilícita. Questionam os impetrantes sobre a
legalidade do ato. Sabe se que à Polícia Militar deste Estado
completa o policiamento ostensivo posto para prevenção e re
pressão ao crime. Além disso, criou se no âmbito da Polícia
Militar a Segunda Seção, que se constitui num grupo de serviço
reservado, cuja tarefa é a de proceder também investigação,
colaborando diretamente com a Polícia Judiciária. Tanto que,
efetuada a diligência sobre a qual se insurgem os Impetrantes,
imediatamente foi dado conhecimento à autoridade policial, a
quem foram apresentados dos todos os elementos colhidos,
inclusive os objetos apreendidos." fls. 19/20. A partir desses
dados, terminados pela notícia da imediata entrega dos objetos
e valores à polícia civil incumbida da apuração da suspeitada
infração penal, não vejo porque reputar imune o paciente ao
regular inquérito policial, só porque a persecução teve origem
em autorização judicial diligenciada por policiais militares. No
ponto, louvo me no excelente parecer do Ministério Público
local, deste teor: (sic) Recebida a informação do Juiz de
primeiro grau, a quinta Câmara fundamentou sua decisão,
reconhecendo a legitimidade da atuação investigatória da
Polícia Militar, para a preservação da ordem pública: Poder
judiciário superior tribunal de justiça recurso de habeas corpos
n 1236 - rj (91.0010556-2) recorrentes : José Claudio Marques
Barsoza e outro recorrido : Tribunal de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro. Paciente Marco Aurélio da Silva Cordeiro.
091061050056223100000123640. Relatório, o Sr. Ministro
José Dantas: trata se de habeas corpus denegado em escusas
à alega da nulidade do mandado judicial de busca e apreensão
de mercadoria e valores sob suspeita de furto; nulidade que
residiria no fato da diligência ter sido cumprida por policiais
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militares e não pela polícia civil; via de conseqüência, nulo
também se escusaria qualquer inquérito instaurado com base
naquela apreensão ilegalmente feita na residência do paciente.
Denegou se a ordem, ao fundamento da legitimidade do
malsinado mandado judicial (cf, art.144, e cpp, art.6q, iii), por
se te tratar se de atividade investigatória visando manutenção
da segurança pública fls. 43. Seguiu se o presente recurso,
apoiado nesta instância pelo ministério público federal, pelo
argumento da ilegal invasão da esfera exclusiva de
competência da polícia civil para apuração de infrações penais
f is. 54/58. Relatei.(...) (sic).”
Vê-se, portanto, que o STJ reconheceu características investigatórias, na
ocorrência levada pela Polícia Militar, mas essas características estavam voltadas
para manutenção da segurança pública, e não para a apuração da autoria do crime
e coleta de provas, função essa exclusiva da Polícia Civil.
Portanto, o que se pode observar é que quando se tratar das letras "e", "f" e
"g" do parágrafo 1º do artigo 242 do CPP, e que seria uma prerrogativa do Delegado
de Polícia, pois isto estaria afeito ao Inquérito policial, não podendo aqui excluir o
Ministério Público que poderia requerê-las, mesmo sem Inquérito policial instaurado.
É interessante verificar que as alegações de que a Polícia Militar não poderia
representar pela expedição de mandado de busca contra residências de civis, pois
não poderia ela Polícia Militar formar provas contra civis. Tal entendimento esta
construída sobre falsa afirmativa.
Ora, a atividade exercida pela Polícia Militar é por sua essência de natureza
civil, a previsão e que a Policia Militar é reserva do Exercito, não descaracteriza sua
atividade civil, a Polícia Militar não tem inimigos internos ou externos, ela somente
enfrenta os que atentam contra as leis, contra os que insistem em viver à sua
margem, e atua para garantir a preservação da ordem pública trazendo tranqüilidade
à sociedade brasileira.
O legislador Constitucional ao prever que a Polícia Militar é reserva do
Exercito o fez considerando a hipótese de que em caso de guerra externa teria uma
força capaz de realizar internamente atividade de polícia, como também realizar
missões de caráter propriamente militar. Um exemplo disso, seria a guarda e
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vigilância de prisioneiros de guerra, ou ainda, a hipótese de utilizar o efetivo da
Polícia Militar na defesa interna do País, portanto em tempos de paz a atividade
exercida pela Polícia Militar é estritamente civil.
O STF, em julgamento recente, conclui que policiais militares não se
enquadram propriamente como "militares". Neste sentido, manifestou-se o Ministro
Marco Aurélio:
“Referência ao HC n° 72.022/PR, Rel. para Acórdão Min. Marco
Aurélio: COMPETÊNCIA HOMICÍDIO AGENTE: MILITAR DA
RESERVA VÍTIMA: POLICIAL MILITAR EM SERVIÇO. Ainda
que em serviço a vítima policial militar, e não militar
propriamente dito a competência é da justiça comum.
Voto Marco Aurélio: "Ao meu ver o militar reformado, nos
homicídios perpetrados, está equiparado ao civil. Civil o é! É
certo que os policiais militares estavam em serviço, mas eram
simplesmente policiais militares. Não eram militares. No inciso
III do artigo 9º do Código Penal Militar, ao aludir-se as
instituições militares, consideram-se, como tanto, as das
Forças Armadas e não as das Polícias Militares e Bombeiros
dos Estados. (sic).”
Assim, pode-se concluir que, realmente, a Polícia Militar exerce atividade de
polícia de natureza civil, e raramente será empregada em missão de força auxiliar do
Exército, atuando na defesa interna do País. Quanto ao crime de usurpação de
função pública, que os Delegados de Polícia insistem em tentar atribuir aos policiais
militares, que representam pela expedição de mandados de busca, lavratura de
termos circunstanciais e interceptações telefônicas, também não merece prosperar.
Álvaro Lazzarini assim se manifesta:
“(...) a Polícia Militar do Estado de São Paulo, "diante do ilícito
penal que não conseguiu evitar, passa, automática e
imediatamente, ao exercício da atividade de polícia repressiva
polícia judiciária”. (...).”
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Para caracterização do crime de usurpação da função pública, é necessário
que exista o animus de usurpar, ou seja, que se entre na esfera de atribuição de
outra instituição policial. Neste sentido, é preciso levar em consideração que a
atribuição constitucional da Polícia Militar não é apenas, o patrulhamento ostensivo-
preventivo, mas também a preservação da ordem pública.
Recentemente, pôde-se presenciar o episódio da greve dos policiais civis,
que não respeitaram a decisão do Poder Judiciário, e paralisaram o serviço em
diversos Distritos Policiais, conforme matéria da internet, de autoria do jornalista
Elvis Pereira:
“São Paulo - O ministro Eros Grau, do Supremo Tribunal
Federal (STF), suspendeu, em caráter liminar, a tramitação de
dissídio coletivo de greve de nove categorias da Polícia Civil
paulista no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região.
A Corte manteve, no entanto, a liminar concedida pelo TRT
determinado a continuidade dos serviços e a manutenção de
80% do efetivo da corporação durante o movimento grevista. O
Ministro Eros Grau, ao determinar a continuidade dos serviços,
não possibilitou escolha de quais serviços seriam prestados,
portanto, no momento em que os integrantes da Polícia Civil
deixaram de realizar algumas de suas atividades rotineiras,
como por exemplo, a elaboração boletins de ocorrências e a
representação de mandados de buscas, descumpriram a
decisão judicial, sendo que para a garantia da preservação da
ordem pública, a Polícia Militar não poderia deixar de atuar,
elaborando os Termos circunstanciados e requisitando perícias.
Cabe dizer que os institutos responsáveis pelas perícias, ao
negarem comparecer nos locais de acidentes de trânsito, locais
de crimes, ou mesmo realizar perícias em vítimas, estariam
desobedecendo a decisão judicial e descumprindo resoluções
da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo.”
4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo procurou, de maneira clara e objetiva, demonstrar as
atribuições da Polícia Militar. Para isto, mesmo que com algumas limitações, foi
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necessário estabelecer alguns contrapontos entre as duas polícias, abordadas
durante todo o trabalho. Não se pretendeu em momento algum menosprezar as
atividades desenvolvidas pela Polícia Civil, pelo contrário, procurou-se apenas
demonstrar que a sociedade brasileira quer e necessita de um serviço de segurança
pública que não lhe dê somente a sensação de segurança, mas sim, a segurança
efetiva.
Seria utópico acreditar que um trabalho de investigação realizado pelo
efetivo da Polícia Militar, aproximadamente 100.000 (cem mil) homens, acabaria com
todo tipo de crime. As falsas interpretações de que apenas uma Organização Policial
deve realizar determinada atividade, não podem prevalecer, pois estão causando
prejuízos à sociedade.
A Polícia Militar, de acordo com alguns exemplos apresentados neste
estudo, tem competência para fazer, junto ao poder judiciário, a representação pela
expedição do mandado de busca domiciliar e interceptação das comunicações
telefônicas.
Um dos fatores que levaram à realização deste trabalho, foi que embora a
Constituição tenha atribuído à Polícia Militar a atividade ostensiva/preventiva, não é
o que vem acontecendo, pois, ultimamente, ela tem atendido ocorrências policiais
corriqueiras, não sendo necessária a presença de um Delegado de Polícia para
avaliar os fatos e constatar se a ocorrência é uma situação de menor potencial
ofensivo ou uma situação de flagrante delito.
O próprio policial militar poderia resolver a situação, no local dos fatos, não
sendo necessária a condução até o Distrito Policial para decidir sobre a lavratura do
Termo Circunstanciado. Em muitos Municípios, o Delegado responde à distância, e
quem toma conhecimento dos fatos é o escrivão de polícia ou o Investigador, que
não estão investidos de autoridade policial, mesmo que alguns até tenham formação
jurídica.
Portanto, na maioria das vezes, as ocorrências são transmitidas pelo
telefone, à autoridade policial, que decide ou pela elaboração do Boletim de
Ocorrência ou do Termo Circunstanciado, que só será assinado no próximo
expediente. Tal procedimento demanda muito tempo e gastos desnecessários, pois o
policial militar tem competência para lavrar o documento no local da ocorrência.
18
Para que a Polícia Militar preste um serviço de qualidade, cumprindo de
forma adequada a função de prevenção ao crime que lhe foi atribuída, não basta
apenas que sejam colocados policiais militares nas ruas, mas sim que ela disponha
de meios eficazes, realizando investigações preventivas, por meio do Policiamento
Velado (descaracterizado), bem como utilizando interceptações e monitoramentos
telefônicos podendo tais representações serem feitas diretamente pela Polícia Militar,
ou ainda em atendimento ao Ministério Público quando este representa pela
concessão da ordem judicial.
Concluindo, para que o Estado não seja acusado de prestar um serviço de
Segurança Pública de péssima qualidade, é necessário ou que se altere a
Constituição, redefinindo as atribuições dos diversos Organismos Policiais, seja
unificando Órgãos responsáveis pela Segurança Pública, ultrapassando certas
vaidades pessoais, ou ainda mudando todo ciclo da persecução criminal, permitindo
que o órgão policial que primeiro tomar conhecimento da infração penal, seja o
responsável por sua apuração até o fim, com o encaminhamento dos autos à
Justiça.
Caso mudanças não ocorram, uma eterna disputa sobre quem pode o quê
continuará a existir, assim, persistindo uma disputa entre os Organismos Policiais a
sociedade brasileira será a parte mais prejudicada. Enquanto se discute a quem
compete determinada atividade, o Primeiro Comando da Capital, já há tempos
instituiu seu próprio "Tribunal de Justiça", sem segunda instância, onde suas
decisões são imediatamente executadas, por meio de teleconferências realizadas
pelos celulares, de dentro dos presídios.
Portanto, o que deve prevalecer acima de interesses pessoais ou mesmo
corporativo é, e sempre será o interesse da sociedade brasileira, que anseia por um
serviço público de qualidade, eficiente, que garanta a preservação da Ordem Pública
e da Segurança Pública.
5 - REFERÊNCIAS
ABNT. Boletim ABNT. Vários anos.
19
BERNARDI, Renato. A inviolabilidade do sigilo de dados. São Paulo. Fiúza, 2005
BRASIL, CONSTITUIÇÃO (1988). Constituição da República Federativa do
Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988: atualizada até a Emenda
constitucional nº 53, de 2006, 25ª ed: Câmara dos Deputados, Coordenação de
Publicação, 2007.
__________. LEI N.º 9099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados
Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências.[...].D.O.U. de 27.9.1995.
__________. LEI N° 10.259, de 12 de julho de 2001. Dispões sobre a instituição dos
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