TRATAMENTO DE PERFURAÇÃO RADICULAR COM MTA, AUXILIADO POR MICROSCÓPIO OPERATÓRIO. CASO CLÍNICO. .
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TRATAMENTO DE PERFURAÇÃO RADICULAR COM MTA, AUXILIADO POR MICROSCÓPIO OPERATÓRIO. CASO CLÍNICO.
Artigo publicado: JBE. Jornal Brasileiro de Endodontia, v. 7, p. 247-251, 2007.
Autores: Eloi DEZAN Júnior,* Sônia Regina Panzarini BARIONI,**
Eloá Rodrigues LUVIZUTO,** Érika Natsue NISHINO***
__________________________________________________________________ * Professor de endodontia da faculdade de odontologia Araçatuba/SP – UNESP (DDS, MS). **Professora de clínica integrada da faculdade de odontologia Araçatuba/SP – UNESP (DDS, MS). *** Cirurgiã dentista e estagiária do departamento de cirurgia e clínica integrada da faculdade de odontologia de Araçatuba/SP – UNESP
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Resumo:
As perfurações dentárias são comunicações artificiais entre o sistema de canais
radiculares e as estruturas de suporte dos dentes. Embora seja capaz de causar danos
irreparáveis, a instituição de um tratamento adequado pode melhorar o seu prognóstico.
Torna-se essencial para o êxito do tratamento, a obtenção de um selamento efetivo e
biologicamente compatível. Dentre os inúmeros materiais já utilizados para este fim, o MTA
(Agregado Trióxido Mineral), devido às excelentes propriedades biológicas permite uma nova
perspectiva no tratamento de perfurações. Este artigo descreve um caso clínico de
perfuração iatrogênica no terço médio do canal radicular que foi reparada com MTA auxiliado
por microscópio operatório. O microscópio operatório proporciona visualizar o campo
operatório com grande aumento e riqueza de detalhes, favorecendo os procedimentos do
operador com maior controle de ação.
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INTRODUÇÃO
O microscópio operatório (MO) foi introduzido na odontologia por Bauman (7), e tem
se tornado popular entre os endodontistas. A principal vantagem do MO é a habilidade de
conceder uma retroalimentação visual através da profundidade de captação do estetoscópio,
magnificação e iluminação coaxial, sendo uma valiosa ferramenta no tratamento
endodôntico.
Estudos mostram vantagens com o uso do MO para localizar orifícios nos canais (14-
15), tratar canais calcificados (16), colocação de material obturador no término radicular (17),
identificar fraturas no término radicular amputado (18, 26), entre outras. Ademais, o MO
elimina possíveis dúvidas existentes previamente ao atendimento em diversas áreas,
favorecendo os procedimentos do cirurgião dentista, o qual, enxergando detalhes, tem maior
controle de ação. Portanto, optamos pela utilização dessa ferramenta de trabalho no
tratamento do caso clínico, visto que a área de trabalho é bastante limitada e pequena.
A perfuração radicular é uma iatrogenia indesejável que pode ocorrer a qualquer
momento do tratamento endodôntico acarretando efeito danoso ao dente. Essas perfurações
são causas comuns de fracasso no tratamento endodôntico. O prognóstico do tratamento
depende entre outros fatores, da prevenção ou do tratamento da infecção bacteriana
instalada no local da perfuração. Para ocorrer um bom reparo, o material de escolha para
selar a perfuração radicular tem que ser biocompatível, atóxico, insolúvel aos fluidos
teciduais, bactericida e capaz de promover reparação dos tecidos periaradiculares. O MTA
(Agregado Trióxido Mineral) devido às excelentes propriedades biológicas permitiu maiores
perspectivas no tratamento de perfurações.
O MTA está sendo empregado em diversos procedimentos odontológicos como:
retrobturações, proteção pulpar direta, pulpotomia, tampão apical em rizogênese incompleta,
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obturação de canais radiculares, tampão cervical em clareamentos dentários internos, reparo
de fraturas radiculares, material restaurador temporário e selamento de perfurações
radiculares (25). Vários estudos tem demonstrado a excelente habilidade seladora e
biocompatibilidade (5-6-22-25-26). O exame microscópico dos tecidos periodontais após
perfuração na região de furca ou raiz e subseqüente selamento com MTA demonstrou reparo
do periodonto e uma nova formação de cemento sobre o material (2-22-26).
Baseado nos estudos das propriedades físicas e biológicas do MTA, esse material
parece ser o mais indicado até o momento para selar a comunicação entre o canal radicular
e os tecidos periodontais em caso de perfuração radicular(22). Este caso clínico suporta tal
hipótese.
CASO CLÍNICO
Paciente do sexo masculino, 42 anos apareceu na clínica da faculdade de odontologia
de Araçatuba – UNESP para tratamento odontológico. Após a anamnese e exame clínico,
radiografias periapicais foram tiradas dos dentes onde foi constatada uma perfuração
radicular no terço médio da raiz do dente 35 com presença de imagem radiolúcida causando
espeçamento do ligamento periodontal contínuo à perfuração (figura 1). O paciente relatou
que o canal havia sido tratado e preparado para receber um pino para prótese fixa e que
durante e após o tratamento não houve sintomatologia dolorosa, apenas um desconforto.
O plano de tratamento constou da obturação da trepanação com ProRoot MTA®
(Dentsplay) auxiliado pelo microscópio operatório. Previamente, aplicou-se curativo de
hidróxido de cálcio (figura 2) para descontaminação do canal.
Na segunda sessão (15 dias após), sob anestesia local, realizou-se isolamento do
campo operatório. O curativo de demora foi removido e o canal irrigado com hipoclorito de
sódio 2,5%.
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Com a magnificação que o microscópio operatório forneceu foi possível ver
nitidamente e distinguir os limites entre trepanação e canal radicular (figura 3). A
profundidade da perfuração foi determinada com exatidão empregando-se o localizador
apical Root ZX® (J. Morita Corp., USA).
Uma pasta de MTA com água destilada levada à perfuração com o auxílio do Map
System® com uma ponta angulada facilitar a colocação do material no interior da perfuração.
Uma radiografia periapical avaliou a qualidade do preenchimento da trepanação, detectando
pequeno extravasamento de material e necessidade de complementação com MTA para
completa obturação da trepanação (figura 4A).
A próxima etapa foi a aplicação de ionômero de vidro sobre o MTA restaurando o
canal original (figura 4B), permitindo desta forma a colocação de pino intra-radicular.
A radiografia no controle pós-operatório de um ano (figura 5) mostrou ausência do
material extravazado, tendo sido provavelmente reabsorvido, e ligamento periodontal com
características de normalidade com evidências radiográficas de reparo da lesão lateral.
DISCUSSÃO
Os fatores que determinam o sucesso do reparo no tratamento de perfurações
radiculares são: sua localização, o tempo decorrido entre o momento da perfuração e o
tratamento, a qualidade seladora do material, poder bactericida e sua biocompatibilidade
associado à execução de adequados procedimentos pelo operador.
O MTA oferece efetivo selamento da perfuração radicular sendo considerado
excelente material obturador, proporcionando selamento da trepanação, melhorando o
prognóstico das perfurações dentárias (22-25).
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Nosso caso clínico pode ser considerado sucesso (clínico e radiográfico). Decorrido
um ano do tratamento, a cicatrização é evidente no local da perfuração apresentando
normalidade dos tecidos paraendodônticos.
Avanços na tecnologia, como a introdução do microscópio operatório, novos
instrumentais e materiais (como MTA), fornece maior possibilidade de êxito no tratamento de
iatrogenias como a relatada acima, todavia, o conhecimento específico e domínio técnico,
que levam à prevenção de acidentes ainda é o melhor caminho.
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FIGURAS
FIGURA 1: radiografia periapical do dente 35 mostrando uma perfuração radicular no
terço médio do canal radicular com uma pequena lesão radiolúcida na região da tábua óssea
mesial. Terço apical obturado e ausência de alteração radiográfica na região periapical.
FIGURA 2: Radiografia mostrando o preenchimento da trepanação e conduto até a
altura da obturação do canal, com hidróxido de cálcio que permaneceu por 15 dias.
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FiGURA 3A: Foto tirada com câmera digital acoplada ao microscópio operatório
mostrando detalhes do interior do canal. Observa-se parede dentinária (seta)
separando a perfuração radicular P(à esquerda) do canal radicular C (à direita).
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FiGURA 3B: Dois cones de papel colocados no interior da perfuração radicular (à
esquerda) e do canal radicular (à direita).
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FIGURA 4A: Radiografia para avaliação da obturação da trepanação com MTA. Nota-
se pequena quantidade de material extravasado para o periodonto, e preenchimento
parcial da trepanação com necessidade de de colocação de mais material.
FIGURA 4B: Obturação adequada da trepanação com MTA e proteção com ionômero
de vidro isolando a trepanação do canal radicular, pronto para receber a restauração
protética.
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FIGURA 5: radiografia periapical tirada 1 ano após o tratamento. A cicatrização é
evidente no local da perfuração apresentando normalidade dos tecidos periapicais, o dente
apresenta-se restaurado com pino intra-radicular e coroa.