Download - Síntese crítica beleza americana
JURAY NASCIMENTO DE CASTRO
BELEZA AMERICANA
ANÁLISE CRÍTICA
Síntese do filme “BELEZA AMERICANA” Apresentada ao Professor Jorge Luiz da Cruz Santos, do Instituto de Educação Superior UNYAHNA de Salvador.
Salvador – Bahia Março de 2002
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SÍNTESE DO FILME: “BELEZA AMERICANA” Beleza Americana traz no seu título, a essência volátil do seu conteúdo. Poderíamos
chamá-lo de “MODELO SOCIAL DO OCIDENTE” ou “MÁSCARAS SOCIAIS”, não
importa. O fato é que nos surpreendemos com a genialidade do narrador e
personagem principal, “Lester”, que emerge da teatralidade de uma sociedade de
relacionamentos sórdidos, onde se respira hipocrisia, e pelo constante desequilíbrio
de valores colhe-se desilusão.
É notável o espírito solitário dos personagens, e a direção deste roteiro, conduz-nos
como um voyeur a observar na autenticidade de suas diferenças e semelhanças,
seus conflitos e desejos, expondo o esforço de cada um em parecer o que não são.
Lester um profissional liberal com um bom emprego, poderia estar acirradamente
envolvido na corrida para mantê-lo, no entanto não há prazer nestas conquistas, e
surpreende-nos a confissão de que o momento mais feliz do dia é quando se
masturba solitariamente todas as manhãs.
Carolyn a esposa do Lester, esconde a sua solidão – leia-se incapacidade de
relacionar-se naturalmente com o mundo real – acreditando-se feliz por manter as
aparências de seu mundo perfeito. Aliás, seduzida pelo poder, ela sufoca a
frustração do seu fracasso capitalista por submeter a sua família, mesmo contrariada
com a inversão de valores, a sustentar a farsa de uma imagem “família feliz”.
Ângela, a amiga de Jane, acredita que seu sucesso depende da sua projeção como
alguém especial. E mesmo que isto signifique sustentar uma vida de vantagens
mentirosas, mesmo que tenha que pisar nos amigos, é isso que lhe fará sentir-se
bem, o que importará sempre é ser invejada, pois só assim se sentirá uma pessoa
especial.
Jane, a filha do casal, vive o desamor familiar que não nutre as suas ansiedades de
adolescente, e ansiosa, só encontra respostas para suas angustias e inquietações
quando conhece o seu novo vizinho, um voyeur da vida, e com ele descobre a
possibilidade de alcançar a serenidade e superar conflitos a partir de uma revisão de
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crenças e preconceitos que permitam ver o mundo com outros olhos, como se só o
estivéssemos vendo agora, e portanto redescobrindo-o.
Curiosamente é ao conhecer o jovem vizinho e namorado de sua filha – personagem
envolvido pelo anti-heroico e discriminado papel social de traficante, com direito ao
rotulo de doente – que Lester fascina-se com a coragem e o modo despojado como
o rapaz rompe com a sociedade dominante. Lester não só descobre-se aprisionado
pelos seus próprios limites, como se dá conta de que toda a força necessária para a
ruptura dos seus grilhões sempre esteve com sigo mesmo, e assim rebela-se contra
as convenções em busca da sua liberdade.
Graças à genialidade com que Lester nos escancara a sua vida e a daqueles com
que se relaciona, nos defrontamos com um caldeirão de conflitos em contínua
ebulição de onde emergem as questionáveis famílias que protagonizam o ideal da
Beleza Americana. Em contraponto, o casal de homossexuais, vizinhos de Lester,
em uma denúncia tácita da desagregação das estruturas sociais estabelecidas,
ostenta no seu velado convívio a felicidade e harmonia de uma relação alternativa,
um casal que ousa ser diferente quebrando padrões.
Paradoxalmente, assistimos às famílias de Jane e Rick sofrerem sob o manto das
aparências, a angustia das insatisfações engessadas pelos moldes dos
preconceitos. E o pai do Rick, o Coronel Frank, nos revela com o seu drama, esta
trama de vida urdida para nos enquadrar nos padrões socialmente aceitáveis. Não é
impossível imaginar as renúncias do seu passado e os traumas que lhe afligiram.
No entanto, é drasticamente visível que tendo se submetido ao julgamento de uma
consciência coletiva, foi condenado pela sua homossexualidade. A vergonha
derivada desta condição fica evidente no desespero com que tenta resgatar a sua
imagem viril; seja por ostentar publicamente a sua patente Militar, ou pelo modo
como a homossexualidade dos seus vizinhos afeta o seu humor, pelo seco e tirano
modo com que trata o seu filho sob a justificativa do seu desejo de transformá-lo em
um homem, ou ainda pelo exercício de uma relação opressora que torna a sua
esposa uma mulher oprimida e subjugada à sua autoridade.
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Tais valores ostentam a sua orgulhosa imagem de macho dominador, e o redime da
condenação imposta por uma consciência coletiva. Mas não o libertam dos seus
medos interiores, que como fantasmas, retornam todos os dias para infligir-lhe o
terror. Assim, são os seus próprios fantasmas interiores que deflagram o seu
desespero, levando-o a enxergar no relacionamento do seu filho com Lester, o seu
fracasso como homem, e ao mesmo tempo o fracasso em fazer de seu filho um
Homem.
Mais genial ainda é perceber a habilidade com que o nosso personagem central
domina a cena despindo-se de valores sociais decadentes, e como com seu gesto
vai despindo os interpretes sociais com os quais o seu mundo se relaciona,
culminando na ousadia de despir até mesmo a nós os espectadores, quando diante
de cada drama pessoal, nos conduz a emitir nosso juízo de valor, para no instante
seguinte, nos vermos expostos neste drama coletivo construído com recortes de
uma realidade que pode fazer parte da vida de cada um de nós.
JURAY NASCIMENTO DE CASTRO