QUANTIFICAO DO TNUS MUSCULAR EM RATOS SAUDVEIS
UTILIZANDO UM DINAMMETRO ISOCINTICO
Fernanda Catelani Miguel
Dissertao de Mestrado apresentada ao
Programa de Ps-graduao em Engenharia
Biomdica, COPPE, da Universidade Federal do
Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessrios obteno do ttulo de Mestre em
Engenharia Biomdica.
Orientadores: Marcio Nogueira de Souza
Alexandre Visintainer Pino
Rio de Janeiro
Maio de 2011
iii
Miguel, Fernanda Catelani
Quantificao do Tnus Muscular em Ratos Saudveis
Utilizando um Dinammetro Isocintico/ Fernanda
Catelani Miguel. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPE, 2011.
IX, 82 p.: il.; 29,7 cm.
Orientadores: Marcio Nogueira de Souza
Alexandre Visintainer Pino
Dissertao (mestrado) UFRJ/ COPPE/ Programa de
Engenharia Biomdica, 2011.
Referencias Bibliogrficas: p. 73-79.
1. Tnus muscular. 2. Dinammetro isocintico. 3.
Rato. I. Souza, Marcio Nogueira et al. II. Universidade
Federal do Rio de Janeiro, COPPE, Programa de
Engenharia Biomdica. III. Titulo.
iv
O temor (respeito, reverncia) do Senhor o princpio da cincia;
os insensatos desprezam a sabedoria e a instruo.
Provrbios 1:7 (verso ARC; nota adicionada)
v
Agradecimentos
A Deus, por no somente operar em mim o querer, mas tambm o realizar de
mais esta etapa de minha vida acadmica. Por me amparar e imprimir em mim a
confiana de ter a Sua maravilhosa companhia.
Aos meus pais e familiares, entre os quais cito minha querida me Marly Sandra,
meu pai Gilberto e minha av Daria, agradeo pela dedicao, incentivo, investimento e
por creditarem em mim a confiana na concluso de mais este objetivo.
Aos meus companheiros do LIB e dos demais laboratrios do Programa de
Engenharia Biomdica, desde os que assistiram comigo ao primeiro dia de aula at os
que conheci no ltimo dia do mestrado. Obrigada por me ajudarem a transpor as
dificuldades e por potencializarem os meus momentos de alegria. Pessoas preciosas aqui
representadas pelos nomes de Nrrima de Souza Gave, Ivan Marques dos Reis e Daniel
dos Santos Morim.
professora Liliam Fernandes de Oliveira, cuja palavra de incentivo culminou
com a confeco deste trabalho.
Aos meus diligentes orientadores Marcio Nogueira de Souza e Alexandre
Visintainer Pino, pela disposio em ajudar, instruir e compartilhar seus conhecimentos,
tornando-se referenciais e dos quais tomo a liberdade de carregar os valorosos
ensinamentos.
Ao inestimvel suporte espiritual fornecido pela Comunidade Crist de Nova
Friburgo, sem o qual minhas vitrias acadmicas e pessoais teriam menor valor.
Aos meus amigos do Rio de Janeiro e Nova Friburgo que acompanharam a
minha trajetria, contribuindo direta ou indiretamente para o meu crescimento pessoal e
acadmico.
Agradeo tambm aos rgos financiadores da pesquisa: CNPq, CAPES e
FAPERJ.
vi
Resumo da Dissertao apresentada COPPE/UFRJ como parte dos requisitos
necessrios para a obteno do grau de Mestre em Cincias (M.Sc.)
QUANTIFICAO DO TNUS MUSCULAR EM RATOS SAUDVEIS
UTILIZANDO UM DINAMMETRO ISOCINTICO
Fernanda Catelani Miguel
Maio/2011
Orientadores: Marcio Nogueira de Souza
Alexandre Visintainer Pino
Programa: Engenharia Biomdica
A avaliao do torque resistente passivo (TRP), mais conhecido como tnus
muscular, frequentemente realizada em condies patolgicas ou fisiolgicas. Os
experimentos so realizados em humanos ou em animais, com o emprego de diferentes
formas de medio. O presente estudo, por sua vez, teve como objetivo desenvolver um
sistema isocintico para quantificar o torque resistente passivo pela mobilizao da
articulao do tornozelo de 6 ratos fmeas Wistar saudveis (236-259 g), com 15
semanas. Os animais foram submetidos a um protocolo de movimento que consistiu de
20 ciclos coletados nas amplitudes de 40 (-20 a +20) e 60 (-30 a +30) e em cada
uma das trs velocidades angulares empregadas: 30/s, 100/s e 200/s. Para a
quantificao do TRP foi utilizado o modelo massa-mola-amortecedor. O TRP
produzido pelos animais mostrou que o tnus teria caracterstica predominantemente
elstica, representada pelo coeficiente de elasticidade (K) em torno de 3,18 Nm/. Os
resultados tambm no indicaram um TRP velocidade-dependente. A anlise da pata
direita mostrou resultados coerentes, enquanto os sinais de torque da pata esquerda
apresentaram sinais de interferncia produzidos pelo servomotor, principalmente em
angulaes superiores a 0.
vii
Abstract of Dissertation presented to COPPE/UFRJ as a partial fulfillment of the
requirements for the degree of Master of Science (M.Sc.)
QUANTIFICATION OF MUSCLE TONE IN HEALTHY RATS USING AN
ISOKINETIC DINAMOMETER
Fernanda Catelani Miguel
May/2011
Advisors: Marcio Nogueira de Souza
Alexandre Visintainer Pino
Department: Biomedical Engineering
The assessment of passive resistance torque (PRT), better know as muscle tone,
is often performed in physiological or pathological conditions. The experiments are
usually performed in humans or animals using different forms of measurement. This
study, in turn, aimed to develop a isokinetic system to quantify the resistance torque by
the passive mobilization of the ankle joint of 6 healthy female Wistar rats (236-259 g),
with 15 weeks. The animals were submitted to a movement protocol that consisted of 20
cycles collected in range of 40 (70 to 110) and 60 (60 to 120) and in each one of
three angular velocities employed: 30/s, 100/s and 200/s. To quantify the PRT it was
used the mass-spring-damper model. The PRT produced by the animals showed that the
tone would have predominantly elastic characteristic, represented by the coefficient of
elasticity (K) around 3,18 Nm/. The results also did not indicate a velocity-dependent
PRT. The analysis of the right paw showed consistent results, while the torque of the
left paw showed signs of interference produced by the servomotor, especially at angles
greater than 0.
viii
Sumrio
CAPTULO 1 .................................................................................................................. 1
Introduo ....................................................................................................................... 1
1.1 Objetivos.................................................................................................................. 3
1.1.1 Geral .................................................................................................................. 3
1.1.2 Especficos......................................................................................................... 3
CAPTULO 2 .................................................................................................................. 4
Arquitetura e Fisiologia Neuromuscular...................................................................... 4
2.1 Msculo Estriado Esqueltico ................................................................................. 4
2.1.1 Contrao Muscular........................................................................................... 8
2.1.2 Propriedades Passivas da Unidade Msculo-Tendo ........................................ 9
2.2 Neurofisiologia ...................................................................................................... 12
2.2.1 Propriocepo .................................................................................................. 13
2.2.1.1 Fuso Muscular ........................................................................................... 13
2.2.1.1.1 Neurnios Motores Gama .................................................................. 14
2.2.1.2 rgo Tendinoso de Golgi ........................................................................ 15
CAPTULO 3 ................................................................................................................ 16
Tnus Muscular ............................................................................................................ 16
3.1 Tcnicas de Avaliao do Tnus Muscular...........................................................18
3.1.1 Avaliao por Escalas Associadas a Manobras............................................... 19
3.1.2 Avaliao com Dispositivos Auxiliares .......................................................... 21
3.1.3 Dinammetro Isocintico ................................................................................ 23
CAPTULO 4 ................................................................................................................ 28
Materiais e Mtodos ..................................................................................................... 28
4.1 Sistema Isocintico de Quantificao Mecnica para Ratos (SQMR) .................. 28
4.1.1 Projeto Mecnico............................................................................................. 28
4.1.2 Instrumentao................................................................................................. 30
4.1.2.1 Calibrao.................................................................................................. 32
4.2 Protocolo Experimental ......................................................................................... 34
4.3 Processamento dos Sinais...................................................................................... 36
4.4 Modelagem Matemtica do Experimento.............................................................. 40
4.5 Anlise Estatstica dos Resultados ........................................................................ 42
ix
CAPTULO 5 ................................................................................................................ 43
Resultados ..................................................................................................................... 43
5.1 Anlise Grfica do Sinal de Torque ...................................................................... 43
5.2 Anlise Estatstica dos Trechos de Torque............................................................ 47
5.2.1 Trecho 1........................................................................................................... 47
5.2.1.1 Amplitude de 40 ....................................................................................... 47
5.2.1.2 Amplitude de 60 ....................................................................................... 49
5.2.1.3 Comparao das Amplitudes de 40 e 60................................................. 50
5.2.2 Trecho 2........................................................................................................... 52
5.2.2.1 Amplitude de 40 ....................................................................................... 52
5.2.2.2 Amplitude de 60 ....................................................................................... 53
5.2.2.3 Comparao das Amplitudes de 40 e 60 .................................................. 54
5.2.3 Comparao dos Trechos 1 e 2........................................................................ 56
5.2.3.1 Amplitude de 40 ....................................................................................... 56
5.2.3.2 Amplitude de 60 ....................................................................................... 58
5.2.3.3 Sntese dos Coeficientes ............................................................................ 59
CAPTULO 6 ................................................................................................................ 60
Discusso ....................................................................................................................... 60
6.1 Sobre Protocolo e Equipamento ............................................................................ 60
6.2 Sobre o Tnus........................................................................................................ 64
6.2.1 Torque e Fora................................................................................................. 64
6.2.2 Coeficiente de Elasticidade (K) ....................................................................... 66
6.2.2.1 Trecho 1..................................................................................................... 67
6.2.2.2 Trecho 2..................................................................................................... 68
6.2.2.3 Comparando Trechos................................................................................. 70
CAPTULO 7 ................................................................................................................ 71
Concluso ...................................................................................................................... 71
Referncias Bibliogrficas ........................................................................................... 73
ANEXO I Dimenses da Plataforma de Testes.......................................................... 80
ANEXO II Dimenses da Base do Servomotor.......................................................... 81
ANEXO III Dimenses do Estabilizador de Joelho e da Sapata.............................. 82
1
CAPTULO 1
Introduo
O termo tnus muscular, embora sugira uma caracterstica restrita ao msculo,
costuma ser utilizado para expressar a fora resistente, ou de oposio, ao movimento
de uma articulao relaxada (LANCE, 1980, MUSHAHWAR et al., 2005, EISUKE et
al., 2007, OCHI et al., 2007). Neste caso, o tnus muscular de indivduos normais seria
produzido estritamente por fatores mecnicos miotendinosos e por tecidos adjacentes
articulao, o que o diferencia, por exemplo, do tnus comprometido por enfermidades
neurolgicas (SHEEAN, 2002).
A avaliao do tnus muscular realizada frequentemente em quadros
patolgicos decorrentes de comprometimentos do sistema nervoso central (SNC)
(SNC). Uma das alteraes do tnus mais estudada nestes casos, e que ocasiona o seu
aumento em funo da velocidade de mobilizao, denominada de espasticidade,
sendo esta uma das manifestaes da sndrome do neurnio motor superior (LANCE,
1980, CAVORZIN et al., 2001, ALIBIGLOU et al., 2008, DANTAS, 2008). A maioria
destes estudos visa acompanhar a evoluo da doena, bem como analisar a influncia
de fatores capazes de modificar o quadro espstico, tal como o uso de frmacos
(MARSALA et al., 2005, MUSHAHWAR et al., 2005).
Estudos sobre o tnus de indivduos normais, entretanto, avaliam desde a
influncia de atividades fsicas em diferentes faixas etrias (PAULA et al., 2008a e
2008b, POLATO, 2010), at o efeito da imobilizao articular sobre o tnus
(GAJDOSIK, 2001). O tnus normal fornece um parmetro comparativo importante nos
experimentos, geralmente fazendo parte de grupos-controle dos mesmos (PISANO et
al., 2000, MUSHAHWAR et al., 2005, HSIEH et al., 2010).
As formas de avaliao do tnus so variadas (CAVORZIN et al., 2001,
PANDYAN et al., 2001, MCCREA et al., 2003), porm a utilizao de equipamentos
com sensores e que dispensam aes do avaliador durante a coleta, tal como o uso do
dinammetro isocintico (ASHTON-MILLER et al., 1992, PISANO et al., 2000,
MUSHAHWAR et al., 2005), melhoram a confiabilidade dos resultados. Este
composto por um motor e uma clula de carga e utilizado para a produo de
2
movimentos com velocidade constante nas articulaes, fornecendo a respectiva medida
de torque necessria para o movimento (CUTLIP et al., 1997 e 2004).
Em relao quantificao do tnus realizada por equipamentos isocinticos,
enquanto alguns estudos computam a fora ou torque total produzido pela articulao
mobilizada (MARSALA et al., 2005, KAKINOHANA et al., 2006), dificultando as
comparaes em funo de fatores como o protocolo experimental adotado, outros
consideram as modificaes do torque dependentes de parmetros como velocidade e
deslocamento angular (PISANO et al., 2000, PANDYAN et al., 2001). Nestes casos, a
analogia da articulao com um modelo massa-mola-amortecedor (PROCHAZKA et
al., 1997, MCCREA et al., 2003) permite a caracterizao de um tnus dependente das
propriedades intrnsecas musculares (PAULA et al., 2008a e 2008b, POLATO, 2010), e
que apresentaria uma resposta diferente da verificada em um tnus alterado, como nos
casos de leso do SNC (LANCE, 1980, SHEEAN, 2002, IVANHOE et al., 2004,
MUSHAHWAR et al., 2005, HSIEH et al., 2010).
A literatura tambm tem mostrado o emprego dos dinammetros isocinticos em
avaliaes musculares em animais, com a vantagem do controle e homogeneidade da
amostra, bem como a possiblidade de utilizao de procedimentos mais invasivos
(KAKINOHANA et al., 2006, HSIEH et al., 2010). A avaliao costuma ser realizada
nas articulaes do tornozelo de roedores como camundongos (ASHTON-MILLER et
al., 1992) e ratos (CUTLIP et al., 1997 e 2004), embora com maior frequncia nestes
ltimos. A cauda de ratos tambm avaliada em alguns estudos de tnus espstico
(BENNETT et al.,1999, MUSHAHWAR et al., 2005), sendo, porm, sujeita a crticas
pela falta de similaridade com humanos (DIETZ, 2008).
Embora a avaliao do tnus patolgico seja um tema frequente na literatura,
principalmente nos casos de espasticidade, a caracterizao do tnus normal no pode
ser neglicenciada (MARSALA et al., 2005, MUSHAHWAR et al., 2005, HSIEH et al.,
2010). Neste contexto, um sistema isocintico de quantificao mecnica para ratos,
alm de possibilitar a obteno dos padres de normalidade, tambm favorecer o
domnio da tcnica de avaliao no invasiva do tnus, podendo vir a ser empregado em
experimentos que visem estudar as alteraes decorrentes de condies fisiolgicas ou
patolgicas, como a espasticidade.
3
1.1 Objetivos
1.1.1 Geral
Considerando o previamente exposto, o objetivo da presente dissertao foi
desenvolver um sistema isocintico para quantificar o torque resistente passivo, pela
mobilizao da articulao do tornozelo de ratos Wistar saudveis, in vivo.
1.1.2 Especficos
Para alcanar os objetivos gerais deste trabalho foram estabelecidos os seguintes
objetivos especficos:
- Projetar a estrutura mecnica do sistema experimental;
- Desenvolver o dinammetro isocintico para animais de pequeno porte;
- Acompanhar a elaborao do programa em Labview para a aquisio dos sinais e
controle do servomotor;
- Desenvolver programas em Matlab para o processamento dos sinais de posio
angular e torque;
- Realizar o protocolo experimental proposto para a avaliao do tnus muscular nos
ratos;
- Efetuar o processamento dos sinais coletados;
- Analisar os resultados, comparando-os com os da literatura.
4
CAPTULO 2
Arquitetura e Fisiologia Neuromuscular
2.1 Msculo Estriado Esqueltico
O tecido muscular um arranjo de estruturas capazes de produzir dois tipos de
tenso: passiva e ativa. A tenso ativa produzida pela contrao muscular,
despendendo energia para sua realizao, enquanto a tenso passiva gerada pelas
prprias estruturas que compem a musculatura e que participam da manuteno de seu
arranjo (GAJDOSIK, 2001, BEAR et al., 2008).
As clulas ou fibras musculares so agrupadas em feixes de aproximadamente
150 fibras formando fascculos (Figura 2.1-A), os quais so cobertos por um envoltrio
denominado epimsio, estabelecendo o limite para o que se conhece como msculo
estriado esqueltico. Cada fascculo, por sua vez, est envolto em uma camada de tecido
conjuntivo denominada perimsio. Abaixo desta encontra-se o endomsio, que envolve
cada fibra muscular individualmente. Por fim, o endomsio fixa-se membrana da fibra
muscular denominada sarcolema (LIEBER, 1986, LIEBER, FRIDN, 1991,
GAJDOSIK, 2001, AQUINO et al., 2005, BEAR et al., 2008, BOFF, 2008).
As fibras musculares so multinucleadas (BOFF, 2008) e apresentam um aspecto
estriado, estando dispostas em srie e paralelamente ao msculo (LIEBER, 1986). No
interior da fibra muscular so encontrados miofilamentos proticos dispostos em srie
denominados de miofibrilas, importantes para a gerao da contrao muscular e
organizao da fibra (BEAR et al., 2008). As miofibrilas, por sua vez, dispem-se
paralelamente umas s outras no interior da fibra. Feixes desses miofilamentos formam
o sarcmero, que a unidade funcional do msculo para a gerao de fora (Figura 2.1-
B). Eles tm cerca de 2 a 3 m de comprimento (LIEBER, 1986, FRIDN, LIEBER,
2003), esto dispostos em srie e so delimitados pelas linhas Z (LIEBER, 1986).
O sarcmero formado por filamentos finos e grossos. O filamento grosso,
denominado miosina, apresenta cadeias pesadas de protenas que apresentam em suas
extremidades estruturas globulares denominadas cabeas, importantes para a contrao
muscular por possurem stios de ligao para o trifosfato de adenosina (ATP) e para a
5
actina (BOFF, 2008). Os filamentos finos so formados pelas protenas actina,
troponina, tropomiosina e tropomodulina. As trs ltimas tm uma relao estreita com
os filamentos de actina, exercendo funes associadas ligao da miosina actina
(troponina e tropomiosina) ou mantendo o comprimento da actina (tropomodulina)
(ALBERTS et al., 2002, BOFF, 2008). Os filamentos de actina ancoram-se s linhas Z e
circundam miofilamentos de miosina (AQUINO et al., 2005, BEAR et al., 2008, BOFF,
2008).
Figura 2.1 Organizao da fibra muscular mostrando, em A, os envoltrios musculares (Adaptado de
SEER, sob domnio pblico) e, em B, as miofibrilas e os sarcmeros (Adaptado de LIEBER (1986), com permisso de John Wiley and Sons, Inc).
Para a melhor compreenso das alteraes sofridas pelos sarcmeros, estes foram
divididos didaticamente em regies (Figura 2.2). Nota-se uma linha M demarcando o
centro do sarcmero; a banda I, que uma regio mais clara e perifrica do sarcmero,
onde so encontrados apenas miofilamentos de actina; e a regio central do sarcmero
6
que contm os miofilamentos de miosina, sendo denominada de banda A. Esta contm a
zona H, regio onde no h sobreposio dos filamentos de actina e miosina (BOFF,
2008).
Figura 2.2 Imagem de microscopia eletrnica de uma seo longitudinal fina de tecido esqueltico humano, apresentando vrias miofibrilas, cada uma com o padro de bandas distintas de sarcmeros
individuais. Adaptado de HOWARD, sob domnio pblico.
Alm dos miofilamentos citados, estudos tambm detectaram a presena de
protenas participantes do arranjo do sarcmero, entre as quais destacam-se as protenas
conectina, tambm chamada de titina, a nebulina e a desmina (LIEBER, BODINE-
FOWLER, 1993, BOFF, 2008).
A nebulina est associada ao filamento de actina e controlaria as ligaes entre a
troponina e a tropomiosina (BOFF, 2008). A titina, por sua vez, uma protena gigante
(LODISH et al., 2000), tendo mais de 1 m de comprimento e possui caractersticas
elsticas que foram descobertas ao se observar a perda da tenso passiva miofibrilar
subsequente a sua remoo do sarcmero (LIEBER, BODINE-FOWLER, 1993,
ALBERTS et al., 2002). Segundo GAJDOSIK (2001), a titina a maior componente
sub-celular que resiste ao alongamento passivo do msculo relaxado. Ela responsvel
por ancorar os filamentos de miosina s linhas Z, estendendo-se at a linha M, segundo
experimentos in situ realizados por LABEIT e KOLMERER (1995).
Segundo LODISH et al. (2000), os filamentos de nebulina e titina (Figura 2.3),
conectados aos filamentos de actina e miosina, respectivamente, gerariam uma tenso
passiva quando o msculo fosse alongado.
7
Figura 2.3 Esquema da organizao das protenas no sarcmero. Observa-se filamentos de actina e
miosina e tambm as protenas tropomodulina, nebulina e titina.
A regio da titina localizada na banda A do sarcmero se liga a protenas do
filamento grosso, tendo, portanto, um arranjo mais regular, favorecendo a organizao
ultra-estrutural desta regio, enquanto a titina da regio da banda I do sarcmero teria
caractersticas mais elsticas (LIEBER, BODINE-FOWLER, 1993, LABEIT,
KOLMERER, 1995, FRIDN, LIEBER, 2003, BOFF, 2008).
A desmina (Figura 2.4), outro filamento protico, localiza-se entre a actina e a
miosina e, segundo BOFF (2008), est relacionada com a manuteno dos filamentos
de actina e miosina unidos parede do sarcmero, fazendo a conexo entre dois
sarcmeros. Por fazer esta conexo intersarcmeros, a desmina conhecida como uma
protena citoesqueltica do exosarcmero, fazendo uma interconexo transversal entre
as linhas Z. Ela tambm conecta os sarcmeros s organelas da fibra muscular, com
exceo dos tbulos T, abordados mais adiante. O alinhamento dos filamentos de
desmina com o sarcmero mantido por numerosas protenas associadas a filamentos
intermedirios, como a esquelemina na linha M e a sinemina na linha Z.
8
Figura 2.4 Desenho esquemtico dos filamentos de desmina no msculo esqueltico, mostrando
tambm as protenas esquelemina e sinemina.
2.1.1 Contrao Muscular
No interior da fibra muscular (sarcoplasma) existem estruturas especializadas,
entre as quais citam-se o retculo sarcoplasmtico (RS) e os tbulos transversos ou T. O
primeiro uma rede sacular que envolve as miofibrilas e funciona como um
reservatrio de ons clcio, liberados mediante estmulos especficos durante a
contrao muscular. Os tbulos T, por sua vez, relacionam-se intimamente com o RS, e
so invaginaes do sarcolema dispostas transversalmente s miofibrilas (BEAR et al.,
2008).
O processo de contrao muscular, tambm denominado de acoplamento
excitao-contrao (BEAR et al., 2008), ocorre quando o potencial de ao via
neurnio motor alfa chega juno neuromuscular. Este alcana a membrana ps-
sinptica pela liberao de acetilcolina que despolariza o sarcolema. O potencial de
ao, ento, chega ao RS via tbulos T. No RS ocorre a liberao de Ca2+ para o citosol
(LIEBER, 1986, BEAR et al., 2008) e, ento, as cabeas de miosina se ligam a stios na
actina, liberados pela ligao dos ons clcio troponina, e impulsionam os filamentos
de actina em direo ao centro do sarcmero. Quando ligada actina, a cabea de
miosina sofre uma mudana em sua conformao, flexionando-se no sentido da linha M
do sarcmero (Figura 2.5). Este processo mecnico pode ocorrer em inmeros
sarcmeros simultaneamente e ciclicamente enquanto o Ca2+ e o ATP estiverem
presentes (BEAR et al., 2008). O relaxamento muscular caracterizado pelo retorno do
9
Ca2+ ao RS, o que tambm requer ATP; pelo retorno da troponina aos stios de ligao
da miosina na actina; e pela repolarizao do sarcolema (LIEBER, 1986, BEAR et al.,
2008).
Figura 2.5 Modelo de contrao do msculo estriado esqueltico no estado relaxado e contrado.
2.1.2 Propriedades Passivas da Unidade Msculo-Tendo
O tecido muscular altamente adaptvel (LIEBER, 1986, LIEBER et al., 2004)
e juntamente com o tecido conectivo denso apresenta as propriedades mecnicas
elasticidade, plasticidade e viscoelasticidade (AQUINO et al., 2005). Das trs a
viscoelasticidade a mais frequentemente encontrada nos tecidos biolgicos ricos em
colgeno.
A propriedade elstica est associada ao posicionamento da articulao e refere-
se capacidade de um material retornar ao seu comprimento e conformao originais,
assim que uma determinada fora deformante imposta previamente retirada
(WATKINS, 2001, AQUINO et al., 2005). Para a identificao das propriedades
elsticas teciduais obtm-se a razo entre a variao da fora resistente e a amplitude do
alongamento imposto. Caso o reflexo de estiramento seja desencadeado, como em
10
certas condies patolgicas, a fora resistente elstica tambm aumentar, interferindo
na anlise das componentes estritamente mecnicas (GAJDOSIK, 2001, EISUKE et al.,
2007, OCHI et al., 2007).
A propriedade viscoelstica seria a combinao da propriedade elstica com a
propriedade viscosa e refere-se capacidade de um material retornar ao seu
comprimento original, porm, no imediatamente como ocorre com os materiais
elsticos. Os materiais viscoelsticos tambm se deformam a uma taxa constante,
independente da velocidade com a qual a fora deformante aplicada. A
viscoelasticidade do tecido representada pela curva de histerese, que o resultado da
perda de energia do tecido ao final de seu alongamento (GAJDOSIK, 2001, HSIEH et
al., 2010).
Nos estudos do torque resistente passivo a histerese observada com frequncia
(PROCHAZKA et al., 1997, MUSHAHWAR et al., 2005, CHUNG et al., 2008, PARK
et al., 2008) e tende a aumentar de tamanho com a velocidade de movimento,
principalmente em msculos espsticos (HSIEH et al., 2010). As propriedades plsticas,
por sua vez, surgem em situaes patolgicas que acarretam a deformao permanente
do tecido (AQUINO et al., 2005)
A manuteno dos tecidos como msculos, ligamentos e tendes na posio
alongada, conhecida como fase de sustentao ou fase esttica, tambm faz com que
alguns fenmenos sejam observados, entre os quais o creep (strain relaxation), que a
deformao contnua sofrida pelo tecido quando uma carga constante empregada por
um determinado perodo de tempo. O creep pode conduzir a um segundo fenmeno
denominado relaxamento ao estresse (stress relaxation), caracterizado pela reduo da
fora resistente passiva do tecido (GAJDOSIK, 2001, AQUINO et al., 2005).
De acordo com AQUINO et al. (2005), a histerese, o creep e o relaxamento ao
estresse ocorrem pela reorganizao das fibras de colgeno e pela redistribuio dos
constituintes da matriz.
Observando-se a curva comprimento-tenso da atuao dos componentes
passivos e ativos musculares e da matriz extracelular (Figura 2.6), verifica-se que a
componente passiva descrita como tendo um formato exponencial crescente medida
que o msculo alongado. Acredita-se que esta curva se deva titina e matriz
extracelular associada s fibras. O papel da matriz extracelular na fora resistente
passiva foi levantado no estudo de LIEBER et al. (2003), que associou o contedo de
11
colgeno presente no experimento com a possvel variao na fora resistente tecidual
observada em fibras espsticas. Quanto fora gerada pela contrao ativa, esta teria
um formato parablico, cuja fora tende a decair, tanto no sentido do encurtamento
(contrao concntrica) quanto no sentido do alongamento (contrao excntrica) e
tende a ser mxima quando o msculo encontra-se prximo ao seu comprimento de
repouso (LIEBER, 1986, LIEBER, BODINE-FOWLER, 1993, GAJDOSIK, 2001,
ACKERMAN, 2002).
Figura 2.6 Esquema da relao comprimento-tenso do msculo esqueltico, onde Lo corresponde ao comprimento muscular em repouso. A tenso ativa se deve contrao muscular e a tenso passiva aos
componentes elsticos em srie e em paralelo do msculo.
O tecido conectivo possui uma matriz extracelular rica em gua,
glicosaminoglicanas, fibras de colgeno e de elastina (WATKINS, 2001). Este meio,
segundo AQUINO et al. (2005), lhe confere a propriedade viscoelstica pelo
deslizamento das fibras colgenas, proporcionado pelo espaamento existente entre as
mesmas quando a matriz encontra-se hidratada e com presena de glicosaminoglicanas.
Os tecidos conectivos extracelulares como o endomsio, perimsio e epimsio so
denominados de componentes elsticos em paralelo. Na gerao da fora resistente
passiva, contudo, o perimsio se destaca, pois, segundo GAJDOSIK (2001), esta camada
de tecido apresenta fibras colgenas onduladas dispostas tridimensionalmente, sofrendo
deformao e realinhamento medida que o msculo alongado passivamente, sendo
tambm um dos tecidos responsveis pela curva exponencial da fora resistente
muscular passiva (Figura 2.6).
12
Os tendes so considerados componentes elsticos em srie da unidade
msculo-tendo, sendo formados por densas camadas regulares de tecido conectivo com
fibras paralelas pouco extensveis (LIEBER, FRIDN, 1991, WATKINS, 2001).
Devido a isto, considera-se que grande parte da extensibilidade desta unidade
proporcionada pelo ventre muscular (GAJDOSIK, 2001), embora estudos com imagens
afirmem que os tendes tm caractersticas elsticas importantes (KUBO et al., 1999,
PEIXINHO et al., 2008).
2.2 Neurofisiologia
Uma srie de interaes sensoriais, motoras e motivacionais encontram-se
envolvidas na execuo dos movimentos corporais. Um movimento simples do
antebrao, por exemplo, envolve a preparao de todo o corpo para execut-lo com a
organizao espao-temporal adequada. O sistema nervoso (SN), portanto,
responsvel por coordenar e tornar efetiva tal interao do organismo com o meio
(KANDEL et al., 1995).
O SN pode ser dividido didaticamente em duas grandes classes: o sistema
nervoso central (SNC) e o sistema nervoso perifrico (SNP) (SPENCE, 1991, KANDEL
et al., 1995, BEAR et al., 2008). Esta diviso e os componentes que compem cada uma
destas classes so apresentados na Figura 2.7.
Figura 2.7 Organizao esquemtica do sistema nervoso central (SNC) e perifrico (SNP).
O SNC atua como um centralizador dos impulsos nervosos aferentes (sensitivos)
ou um distribuidor de informaes eferentes (motoras). O SNP, por sua vez, a
13
continuidade do SNC ao receber informaes aferentes da periferia do corpo,
conduzindo-as aos centros superiores ou, opostamente, sendo um meio pelo qual as
informaes eferentes podem alcanar s variadas partes do corpo (SPENCE, 1991,
KANDEL et al., 1995).
O controle do movimento pode ser centralizado em duas regies do SNC: a
medula espinhal propriamente dita, com o papel de controlar a ao muscular, podendo
ser hierarquicamente influenciada pelo encfalo; e o encfalo, responsvel por
comandar e controlar os programas motores ou padres de movimento coordenados,
existentes na medula espinhal (KANDEL et al., 2003, BEAR et al., 2008).
2.2.1 Propriocepo
A propriocepo o nome que se d s aferncias que permitem a identificao
do posicionamento e movimento do corpo no espao. Estes sensores podem fornecer
informaes musculares (propriocepo muscular), localizando-se prximos a
msculos, como o fuso muscular e os rgos tendinosos de Golgi, ou podem estar
localizados na cpsula articular (propriocepo articular), fornecendo aferncias
medulares sobre a angulao e velocidade de movimento articulares (BEAR et al.,
2008).
A atuao conjunta dos proprioceptores musculares e articulares, somada
contribuio dos receptores cutneos, contribui para refinar a percepo do corpo no
espao, seja em repouso ou em movimento (KANDEL et al., 2003, BEAR et al., 2008).
2.2.1.1 Fuso Muscular
Dentro de quase todos os msculos esquelticos encontram-se sensores que
detectam alteraes do comprimento muscular. Estes sensores esto localizados no
interior do ventre muscular, dentro de um envoltrio fibroso, e so formados por um
conjunto de fibras musculares especializadas envoltas por axnios aferentes do grupo Ia,
denominadas de fibras intrafusais (Figura 2.8) (KANDEL et al., 2003, BEAR et al.,
2008).
A propriocepo do fuso muscular responsvel pelo chamado reflexo miottico
ou de estiramento, que ocorre quando um msculo estirado alm de um determinado
14
comprimento, gerando uma subsequente contrao do mesmo, sendo comum nos
msculos anti-gravitacionais. As informaes provenientes dos fusos so transmitidas
ao corno posterior da medula, chegando ao neurnio motor alfa, o qual inerva as fibras
extrafusais, localizadas externamente ao fuso muscular, desencadeando a contrao
muscular (BEAR et al., 2008).
Figura 2.8 Esquema das fibras intra e extrafusais e sua inervao.
Os axnios aferentes Ia so importantes para a manuteno do tnus muscular
pelos neurnios motores alfa, funcionando como retroalimentadores sensoriais, visto
que o aumento dos disparos dos axnios Ia tende a aumentar a contrao muscular, da
mesma forma que a reduo destes pode diminu-la (KANDEL et al., 2003, BEAR et
al., 2008).
O exemplo mais comum de arco reflexo miottico o observado no tendo
patelar que, quando percutido, estira o fuso muscular, desencadeando a contrao do
msculo quadrceps (BEAR et al., 2008).
2.2.1.1.1 Neurnios Motores Gama
Diferente dos neurnios motores alfa que inervam as fibras extrafusais, os
neurnios motores gama inervam as intrafusais (Figura 2.8), permitindo que,
15
independente do grau de disparo dos neurnios motores alfa, continue havendo
contrao das fibras musculares. Ou seja, mesmo que os axnios Ia estejam com grau de
disparo reduzido ou nulo por uma contrao muscular concntrica gerada, por exemplo,
pelos centros superiores, haver disparo dos neurnios motores gama (KANDEL et al.,
2003, BEAR et al., 2008).
Os neurnios motores gama atuariam nas extremidades (plos) das fibras
intrafusais, mantendo um certo grau de estiramento muscular, na tentativa de que os
axnios sensoriais Ia mantenham-se ativos (KANDEL et al., 2003, BEAR et al., 2008).
2.2.1.2 rgo Tendinoso de Golgi
O rgo Tendinoso de Golgi (OTG) tem uma importante funo relacionada
com a deteco da tenso muscular, diferente dos fusos musculares que, como visto,
respondem ao comprimento do msculo. Esse sistema sensorial localiza-se na juno
miotendnea, portanto em srie com as fibras musculares. Por meio de axnios do grupo
Ib fornecem informaes sensoriais para a medula sobre o grau de tenso muscular. Por
ligaes interneuronais com o corno ventral, os OTGs podem desempenhar um papel
inibitrio sobre os neurnios motores alfa, o que recebe o nome de reflexo miottico
inverso (Figura 2.9). Este reflexo caracteriza-se pelo aumento da inibio dos neurnios
motores alfa em resposta ao aumento da tenso muscular.
Figura 2.9 Regulao por feedback negativo da tenso muscular pelo rgo Tendinoso de Golgi (OTG).
16
CAPTULO 3
Tnus Muscular
O tnus muscular mais frequentemente denominado de tenso muscular e
rigidez elstica, podendo ser conceituado como a fora resistente sentida pelo avaliador
quando este movimenta a articulao de um indivduo relaxado (MIRBAGHERI et al.,
2001, SOMMERFELD et al., 2004), isto , sem que haja ativao muscular
(GAJDOSIK, 2001). O tnus pode ser quantificado como o torque resistente, ou de
oposio, associado a uma determinada articulao quando esta mobilizada
passivamente (LANCE, 1980, SHEEAN, 2002, EISUKE et al., 2007, OCHI et al.,
2007).
Tendo-se em vista tais consideraes e as tcnicas habituais de avaliao do que
se define como tnus muscular, presume-se que o torque resistente resultante, sentido
pelo avaliador ao se mobilizar uma articulao, no decorrente apenas das alteraes
sofridas pelo msculo, mas tem a participao dos tecidos adjacentes articulao
mobilizada e que so tensionados durante a avaliao. Portanto, cabe ressaltar que nesta
dissertao que o termo tnus muscular ser utilizado para se referir ao torque
resistente passivo produzido, segundo EISUKE et al. (2007) e OCHI et al. (2007), pelas
propriedades elsticas do complexo msculo-tendo; pelo tecido conectivo, incluindo
cpsula articular e pele; por articulaes e vasos sanguneos; e, entre outros, pelo
reflexo neuromuscular de estiramento.
Em um msculo normal, completamente relaxado, praticamente nenhuma fora
resistente sentida e, quando detectada, deve-se apenas aos componentes mecnicos e
no atividade reflexa; desta forma, o tnus muscular normal seria completamente
biomecnico. Segundo SHEEAN (2002), muito da diferena de tnus observada em
pessoas normais ocorre pela dificuldade destas relaxarem enquanto so avaliadas.
Teorias supem que os filamentos de actina e miosina, na ausncia de ativao
muscular, poderiam funcionar como elementos elsticos em srie do msculo, ou
mesmo serem responsveis por uma pequena ativao muscular presente na condio de
repouso, formando ligaes estveis entre os miofilamentos e que dificilmente seriam
identificadas pela eletromiografia (EMG) (AQUINO et al., 2005). Outras teorias citam
que variaes nas isoformas da titina poderiam responder pelas diferenas encontradas
17
na fora resistente entre as fibras musculares do tipo I (de contrao lenta) e II (de
contrao rpida). A desmina tambm citada como uma das contribuintes para a fora
resistente quando o msculo alongado (GAJDOSIK, 2001).
Segundo GAJDOSIK (2001), evitando-se a ativao neuromuscular, a fora
resistente elstica passiva proporcionada pelas protenas contrteis e no-contrteis da
fibra muscular e pelo tecido conectivo extracelular. O perimsio, neste caso,
provavelmente seria a primeira regio a gerar a fora resistente sentida pelo avaliador
quando este alonga o msculo ao mximo.
Alguns estudos no consideram os tendes importantes influenciadores da
relao comprimento-tenso da fibra, pois acreditam que eles atuariam apenas na
sustentao de cargas unidirecionais, por se considerar a manuteno de seu
comprimento praticamente constante (GAJDOSIK, 2001, AQUINO et al., 2005).
Porm, estas consideraes se mantm controversas diante de estudos ultra-sonogrficos
como que constataram a participao do tendo calcanear nas variaes do
comprimento da unidade msculo-tendo (PEIXINHO et al., 2008) ou verificaram a
importncia das propriedades elsticas do tendo e aponeurose do msculo vasto lateral
na performance do salto (KUBO et al., 1999). Os autores KUBO et al. (1999) afirmam
que as diferentes concluses sobre as propriedades mecnicas dos tendes devem-se a
experimentos realizados em cadveres e animais, que diferem de humanos vivos.
Os autores EISUKE e colaboradores (2007) citam que condies patolgicas
tambm tm o potencial de aumentar o tnus em indivduos relaxados, tal como as
provocadas pela realizao de certos protocolos de exerccios extenuantes como, por
exemplo, com contraes excntricas. Uma possvel razo para o aumento da fora
resistente nestes casos a presena de leso em decorrncia de fatores como a presena
de edema muscular, processo de recuperao tecidual e homeosttico do clcio.
A quantificao do tnus muscular normal ou patolgico pode ser realizada de
diferentes maneiras, seja manualmente (BENNETT et al., 1999), ou com o auxlio de
dispositivos mecnicos com adaptao de clulas de carga, tal como o medidor de
resistncia tecidual passiva por compresso cutnea empregado por AROKOSKI et al.
(2005) em humanos.
O estudo muscular em roedores algo frequente (ASHTON-MILLER et al.,
1992, CUTLIP et al., 1997 e 2004, WILLEMS, STAUBER, 1999, SONG et al., 2004,
EISUKE et al., 2007, OCHI et al., 2007), principalmente em pesquisas de alteraes do
18
tnus por leses do SNC (TURSKI et al., 1992, TURSKI, STEPHENS, 1993,
MARSALA et al., 2005, KAKINOHANA et al., 2006). O estudo do tnus normal em
humanos costuma acontecer em indivduos com nveis de treinamento muscular e
idades variadas, para a averiguao do efeito destes sobre o tnus (PAULA et al., 2008a
e 2008b, POLATO. 2010). Em animais, todavia, avaliaes do tnus normal costumam
envolver ratos pertencentes a grupos-controle, em estudos sobre a espasticidade
(BENNETT et al., 1999, BOSE et al., 2002, MUSHAHWAR et al., 2005, HSIEH et al.,
2010).
3.1 Tcnicas de Avaliao do Tnus Muscular
Diferente do que ocorre com os experimentos invasivos, nos quais a curva
comprimento-tenso da fibra ou do sarcmero podem ser analisados diretamente
(LIEBER, BODINE-FOWLER, 1993), a avaliao do tnus muscular in vivo necessita
do estabelecimento de alguns preceitos bsicos, entre os quais a definio do que seria
um msculo relaxado. Segundo GAJDOSIK (2001), o relaxamento em termos exatos
seria a ausncia de atividade ativa do msculo. Porm, mesmo em repouso a
musculatura pode apresentar um nvel baixo de ativao que pode ser detectado pela
EMG, o que no influencia as caractersticas viscoelsticas do tecido. O alongamento
mximo da musculatura, todavia, tem potencial para aumentar o nvel de ativao
muscular, induzida pelo estiramento do msculo.
Enquanto em humanos as manobras de mobilizao passiva so realizadas em
membros superior (PROCHAZKA et al., 1997, PISANO et al., 2000, PANDYAN et
al., 2001, MCCREA et al., 2003) e inferior (GOTTLIEB et al., 1978, CAVORZIN et
al., 2001, HANNON, 2006, CHUNG et al., 2008), em roedores a fora resistente
costuma ser avaliada na cauda dos animais ou na pata traseira, seja com a mobilizao
manual realizada por BENNETT et al. (1999) e HSIEH et al. (2010), respectivamente,
na cauda e tornozelo dos animais, ou com auxlio de alguma instrumentao mecnica,
como a utilizada por MARSALA et al. (2005) e REIS et al. (2008) para mobilizar o
tornozelo e joelho de ratos, respectivamente.
A articulao do tornozelo empregada em inmeros experimentos que avaliam
os msculos flexo-extensores como tibial anterior, extensor longo dos dedos,
gastrocnmio, solear e plantar (ASHTON-MILLER et al., 1992, CUTLIP et al., 1997 e
19
2004, SONG et al., 2004, MARSALA et al., 2005, KAKINOHANA et al., 2006,
EISUKE et al., 2007, OCHI et al., 2007, HSIEH et al., 2010). Esta articulao tem a
vantagem de ser mais anloga ao complexo msculo-articular de mesmo nome em
humanos do que quando utilizada a cauda dos animais. No caso de estudos do tnus
espstico, por exemplo, o complexo do tornozelo seria capaz de mimetizar mais
fielmente as alteraes decorrentes da espasticidade do que os modelos utilizando cauda
de ratos (BENNETT et al., 1999 e 2001, MUSHAHWAR et al., 2005), que costumam
ser grosseiramente comparadas com o padro encontrado em membro inferior humano
e, por isto, criticado por DIETZ (2008).
Algumas tcnicas utilizadas para a avaliao do tnus muscular fazem uso de
sensores para a captao de sinais mioeltricos, enquanto outras empregam
dinammetros (ASHTON-MILLER et al., 1992, CUTLIP et al., 1997 e 2004,
PANDYAN et al., 2001, MCCREA et al., 2003) ou caracterizam o tnus em funo da
resposta muscular obtida em testes clnicos realizados manualmente, tal como o teste
pendular de Wartenberg (HANNON, 2006), e as escalas de Ashworth e Tardieu
(CAVORZIN et al., 2001, MACKEY et al., 2004, MUTLU et al., 2008, DONG et al.,
2005). Os dinammetros isocinticos, por sua vez, costumam ser utilizados na avaliao
muscular, seja no estudo do tnus patolgico ou dos efeitos da adaptao ao treinamento
muscular, recuperao de leses, entre outros (CUTLIP et al., 1997 e 2004, PISANO et
al., 2000, GERONILLA et al., 2003, MUSHAHWAR et al., 2005).
3.1.1 Avaliao por Escalas Associadas a Manobras
As duas escalas mais comumente empregadas na avaliao clnica de pacientes
espsticos so denominadas escalas de Ashworth e Ashworth Modificada (CAVORZIN
et al., 2001, PISANO et al., 2000, PANDYAN et al., 2001, MCCREA et al., 2003,
MINUTOLI et al., 2007, MUTLU et al., 2008). Ambas apresentam cinco graduaes
ordinais variando de 0 a 4 com o acrscimo, na verso Modificada, da graduao 1+,
apresentada na Tabela 3.1. A escala utilizada com o objetivo de graduar a intensidade
da oposio do membro espstico ao movimento exercido sobre ele (movimento
passivo).
20
Tabela 3.1 - Escala de Ashworth Modificada. Baseada em PANDYAN et al. (2001) e MINUTOLI et al. (2007).
Graus Resposta Avaliao Clnica 0 No se observa aumento do tnus 1 Leve aumento do tnus muscular ou mnima fora resistente ao final da
amplitude de movimento 1+ Tnus muscular levemente aumentado, com uma fora resistente abrupta
seguida de mnima fora resistente 2 Aumento mais acentuado do tnus muscular em grande parte da amplitude de
movimento 3 Aumento considervel do tnus muscular, com movimentao passiva difcil 4 Partes afetadas rgidas na flexo ou extenso
A manobra realizada pelo profissional de sade para a aplicao da escala
consiste em aproximar as inseres do msculo espstico e, em seguida, afast-las
rapidamente, respeitando o limite de dor do paciente. O objetivo detectar o momento
em que se percebe uma fora resistente abrupta, tambm conhecida como sinal de
canivete (PANDYAN et al., 2001).
Embora a utilizao da escala de Ashworth seja amplamente empregada em
humanos, este tipo de classificao tambm foi utilizada em trabalhos de autores como
DONG et al. (2005) e REIS et al. (2008) em ratos. Neste ltimo foram atribudos
escores a ratos, entre a stima e a oitava semana, aps terem sofrido compresso
medular. Esses escores foram comparados com um ndice de rigidez muscular passiva
(IRMP), calculado com base no sinal de torque resistente obtido pela mobilizao do
joelho dos animais em um sistema isocintico.
Outras formas de avaliao do tnus, em humanos, compreendem o teste
pendular de Wartenberg, empregado na avaliao do membro inferior (HANNON,
2006) e a escala de Tardieu Modificada que, diferente das manobras apresentadas
anteriormente, considera trs velocidades de alongamento muscular: lenta, com queda
do membro pela ao da gravidade, e mxima, alm de acompanhar a goniometria em
cada velocidade (MACKEY et al., 2004, MUTLU et al., 2008).
Mesmo apresentando confiabilidade questionvel, pelas variabilidades inerentes
s aferies intra- e inter-avaliadores e pela falta de uniformidade na realizao dos
testes, as escalas associadas a manobras de mobilizao passiva so as formas de
avaliao do tnus mais utilizadas na prtica clnica (MUTLU et al., 2008). Embora
sejam de fcil implementao, a padronizao dos testes prejudicada, visto que as
respostas podem ser diferentes dependendo das velocidades e angulaes empregadas
na mobilizao (CALOTA et al., 2008).
21
3.1.2 Avaliao com Dispositivos Auxiliares
A utilizao de dispositivos auxiliares, juntamente com a manobra de
mobilizao articular passiva, pode ser considerado um mtodo intermedirio entre a
avaliao puramente manual e a que utiliza dinammetros isocinticos na avaliao,
pois tem o objetivo de melhorar a quantificao da avaliao ao fazer uso de sensores de
fora, embora o movimento e a velocidade angular continuem a ser controlados
manualmente pelo examinador, como nos trabalhos de PROCHAZKA et al. (1997),
PANDYAN et al. (2001) e PAULA et al. (2008a e 2008b) em humanos e de HSIEH et
al. (2010) em ratos.
A tcnica de HSIEH et al. (2010) comparou o tnus espstico com o normal,
pela mobilizao passiva da articulao do tornozelo de ratos Wistar pertencentes a dois
grupos: saudveis e aps o 21 dia de hemisseco medular. Os animais, acordados,
foram colocados na posio prona em um contensor com uma abertura inferior para
introduo da pata a ser avaliada (Figura 3.1). Esta foi, ento, movimentada pelo
avaliador por uma amplitude de 100, dos quais 80 de extenso. A posio neutra
considerada foi de 90 do p em relao tbia, com a informao de posio fornecida
por um sensor ptico.
22
Figura 3.1 apresentada, em A, a foto do equipamento e posicionamento do animal e, em B, o esquema do conjunto e os multieletrodos para registro da EMG do msculo gastrocnmio. Modificado de HSIEH
et al. (2010), com permisso de Elsevier.
Para a deteco da fora resistente mobilizao passiva, foram utilizados dois
bales pressurizados colocados anterior e posteriormente pata do animal, a qual foi
movimentada em cinco frequncias distintas: 1/3 Hz, 1/2 Hz, 1 Hz, 3/2 Hz e 2 Hz.
Aproximadamente 15 ciclos foram registrados para cada frequncia, com um perodo de
30 s entre os testes. Eletrodos para a captao do sinal de EMG tambm foram
colocados sobre o msculo gastrocnmio, com o eletrodo de referncia sobre a base da
cauda do animal.
A inclinao da curva ngulo-torque forneceu o que os autores denominaram de
rigidez elstica (comprimento-dependente). Tambm calcularam o que deram o nome
de componente viscoso (B), obtido pela largura da curva de histerese para cada
frequncia de alongamento muscular. Eles tambm estimaram a mdia do ndice de
23
viscosidade (B), derivado da reta de regresso linear do B das cinco frequncias (LEE
et al., 2004, HSIEH et al., 2010), conforme ilustra a Figura 3.2.
Figura 3.2 Em A observa-se o grfico do componente viscoso (B) para cada frequncia avaliada e a
inclinao de cada curva (ndice B). Em B apresentada a rigidez elstica para cada frequncia. Modificado de HSIEH et al. (2010), com permisso de Elsevier.
Os autores observaram o aumento da histerese em ambos os grupos medida que
a velocidade aumentou. O estudo tambm mostrou que nos primeiros dias aps a leso
medular houve reduo da rigidez elstica e viscosa (velocidade-dependente). Com o
passar dos dias a espasticidade aumentou, assim como a excitabilidade reflexa, o que
pde ser acompanhado pelo registro de EMG (HSIEH et al., 2010).
3.1.3 Dinammetro Isocintico
Embora a avaliao com dispositivos auxiliares envolva aprimoramentos, ainda
alvo de crticas quando comparada com mtodos mais controlados, como os que
utilizam dinammetros isocinticos.
Dinammetros isocinticos foram utilizados por diversos autores em pesquisas
com humanos (GOTTLIEB et al., 1978, PISANO et al., 2000, LEE et al., 2002,
MCCREA et al., 2003, MINUTOLI et al., 2007, ALIBIGLOU et al., 2008, CHUNG et
al., 2008, DANTAS, 2008, PARK et al., 2008, PAULA et al., 2008a e 2008b,
POLATO, 2010) e com ratos (MARSALA et al., 2005, MUSHAHWAR et al., 2005,
KAKINOHANA et al., 2006), o que beneficiou a reduo dos inconvenientes
relacionados com a interferncia do examinador no posicionamento, controle dos
parmetros e favoreceu, no caso de animais, o emprego de abordagens mais invasivas.
24
Inmeros trabalhos com dinammetros isocinticos para pequenos animais
avaliaram os msculos da pata traseira, mais especificamente a articulao do tornozelo
(CUTLIP et al., 1997, MARSALA et al., 2005, EISUKE et al., 2007, OCHI et al.,
2007). Os experimentos costumam empregar equipamentos semelhantes a um dos trs
tipos apresentados a seguir e se baseiam neles para realizarem avaliaes musculares
com diversas finalidades.
Os autores ASHTON-MILLER et al. (1992) utilizaram um equipamento
composto por um servomotor de torque contnuo de 0,25 Nm e por uma clula de carga
construda com dois pares de sensores de fora do tipo strain gauge, posicionados em
um cilindro contguo ao eixo do servo motor, que tambm fica alinhado ao centro da
articulao do tornozelo (entre os malolos medial e lateral), conforme mostra a
Figura 3.3. A posio do tornozelo considerada neutra foi de 90 do p em relao
tbia. O aparelho recebeu um camundongo que foi anestesiado e posicionado com o
joelho fixado pelos cndilos femorais, de forma a no comprimir nervos e nem a
circulao, mantendo o alinhamento entre o fmur e a tbia tambm em 90 (ASHTON-
MILLER et al., 1992). Eletrodos de agulha foram posicionados nos nervos tibial e
fibular para a estimulao dos msculos extensor longo dos dedos, tibial anterior,
plantar, solear e gastrocnmio (ASHTON-MILLER et al., 1992).
Figura 3.3 Dinammetro isocintico apresentando, em A, o posicionamento do animal e os
componentes do sistema utilizado nas aferies de posio, potncia, torque e velocidade. Em B observa-se o posicionamento do joelho e tornozelo do animal, bem como o local de colocao dos eletrodos de
agulha. Modificado de ASHTON-MILLER et al. (1992), com permisso de Am Physiol Soc.
Os autores CUTLIP et al. (1997), por sua vez, mediram a fora de msculos
extensores de ratos in vivo com uma clula de carga adaptada superfcie plantar da
sapata (estrutura onde repousa a pata do animal) e avaliaram as propriedades mecnicas
25
ativas musculares nas situaes esttica, isocintica e no-isocintica controlada. A
estimulao dos msculos extensores foi realizada com eletrodos de agulha. O
equipamento consistiu de um servomotor de torque contnuo de 2,89 Nm, uma clula
de carga piezoeltrica com fundo de escala de 5 kg e um potencimetro para registro da
posio angular.
O animal foi colocado na posio supina, com o joelho mantido em 90
(Figura 3.4). A pata do animal foi posicionada sobre uma placa de alumnio com o eixo
de rotao da placa na direo dos malolos medial e lateral. O tacmetro para registro
da velocidade foi conectado diretamente ao servomotor. avaliao da contrao
isomtrica foi gerada uma fora mxima de aproximadamente 9 N (CUTLIP et al.,
1997).
Figura 3.4 Esquema de fixao da pata traseira de um rato em um dinammetro isocintico. Extrado de
CUTLIP et al. (1997), com permisso de Springer Science and Business Media.
Experimentos de WILLEMS e STAUBER (1999), GERONILLA et al. (2003) e
CUTLIP et al. (2004) tambm fizeram uso de um equipamento similar ao de CUTLIP et
al. (1997), para msculos extensores do tornozelo eletricamente estimulados. Os
primeiros avaliaram ratos in situ que chegaram a produzir um pico de fora isomtrica
de 19,2 N, enquanto GERONILLA e colaboradores (2003) submeteram os animais in
vivo a ciclos lesivos de contraes excntrico-concntricas. contrao isomtrica pr-
teste foram encontrados valores de fora de aproximadamente 10 N. Os autores
CUTLIP e colaboradores (2004), tambm avaliaram ratos in vivo e, assim como
GERONILLA et al. (2003), empregaram contraes cclicas excntrico-concntricas no
estudo, porm com um nmero pequeno de repeties, encontrando valores de
contrao isomtrica pr-teste que variaram de 4 N a 7 N.
26
Os autores EISUKE e colaboradores (2007) utilizaram um equipamento
composto por uma sapata posicionada de forma que o eixo anatmico do tornozelo do
animal coincidia com o eixo da haste do dinammetro (Figura 3.5). O torque do motor
de passo, portanto, foi transmitido sapata. O sensor de fora para a extenso do
tornozelo foi um strain-gauge e a posio angular foi medida com um gonimetro
potenciomtrico. O animal, anestesiado, foi colocado na posio prona com o tornozelo
em 90 e o joelho estendido, para a realizao de um deslocamento angular de 30 a 45
em direo flexo em velocidade de 30/s.
Figura 3.5 Dinammetro isocintico para avaliao da flexo excntrica da articulao do tornozelo de rato. Modificado de EISUKE et al. (2007), com permisso de Journal of Sports Science and Medicine.
Os autores MARSALA et al. (2005) e KAKINOHANA et al. (2006) utilizaram
um equipamento similar ao de EISUKE et al. (2007), com colocao do animal na
posio prona (Figura 3.6-C e D). MARSALA e colaboradores (2005) avaliaram o
tnus em ratos espsticos e com rigidez induzida por morfina, pela mobilizao do
tornozelo em trs amplitudes de flexo: 40, 50 e 60, nas periodicidades de 2 s, 3 s e
4 s, sendo cada teste realizado uma nica vez.
O equipamento (Figura 3.6-A e B) era constitudo por uma unidade de fixao da
pata (UFP), com o eixo do motor de passo tambm centrado com o eixo articular do
tornozelo. Durante a rotao do tornozelo pelo motor, o torque resistente dos msculos
gastrocnmios e solear (trceps sural) foi transmitido UFP e desta para o transdutor de
fora. O sistema controlou a durao e o ngulo de rotao do motor. O animal foi
mantido em um contensor com a pata posicionada na UFP, com livre movimentao em
direo flexo do tornozelo. Fixaes tambm foram utilizadas para a manuteno da
pata do animal na sapata (MARSALA et al., 2005, KAKINOHANA et al., 2006).
27
Figura 3.6 Fotos do dispositivo para medio de tnus de ratos normais e espsticos. Em A
apresentada a estrutura mecnica de rotao e a unidade de fixao da pata (UFP). Em B apresentado o conjunto de medio. As fotos C e D apresentam o posicionamento do animal para teste. Modificado de
MARSALA et al. (2005), com permisso de Mary Ann Liebert, Inc.
28
CAPTULO 4
Materiais e Mtodos
A seguir sero apresentadas as etapas de desenvolvimento do Sistema Isocintico
de Quantificao Mecnica para Ratos (SQMR).
4.1 Sistema Isocintico de Quantificao Mecnica para Ratos (SQMR)
4.1.1 Projeto Mecnico
O projeto mecnico foi elaborado com o objetivo de permitir o posicionamento
correto do animal durante os experimentos, fornecendo sustentao e estabilidade ao
sistema, sendo baseado na estrutura adotada por ASHTON-MILLER e colaboradores
(1992) e apresentada na Figura 3.3 do captulo anterior.
Os desenhos foram projetados no programa Google SketchUp verso 6 (Google,
EUA) com base em medidas obtidas em ratos Wistar de 12 a 15 semanas de idade
(Figura 4.1). Algumas dimenses foram acrescidas s medidas dos animais para a
adaptao dos elementos de estabilizao. As dimenses de algumas peas so
apresentadas nos Anexos 1 ao 3.
De forma a prevenir trepidaes no SQMR, quando do acionamento do
servomotor, optou-se por manter o motor suspenso no suporte metlico. Entre a
plataforma de testes e o suporte para o motor foi introduzido o sistema de medio de
torque, a ser abordado na seo seguinte.
O correto posicionamento do tornozelo e joelho do animal foi proporcionado
pela sapata e pelo estabilizador metlico para joelho. A sapata (Figura 4.2-A) comporta
a pata do animal e contm um rasgo ao longo do comprimento de sua superfcie plantar,
que serve para permitir a passagem do velcro utilizado para manter unida a face plantar
do animal com a superfcie plantar da sapata. A superfcie lateral da sapata, onde
apoiado o calcneo dos animais, foi mantida alinhada com o centro do eixo do
29
servomotor por um bloco limitador. No desenho da sapata foi acrescentado 1 cm ao
comprimento mdio de 4 cm da pata dos ratos.
Figura 4.1 Projeto grfico da estrutura mecnica do Sistema Isocintico de Quantificao Mecnica para
Ratos (SQMR). So apresentados, em A, a vista em perspectiva e, em B, a vista frontal, mostrando a sapata (SP), o estabilizador metlico para joelho (EJ), a plataforma de testes (PT), o suporte para o motor
(S) e o servomotor (SM).
O estabilizador para joelho (Figura 4.2-B) apresenta uma espcie de parafuso
com um disco metlico e liso em uma de suas extremidades, sendo utilizado para
pressionar o joelho do animal contra a plataforma de testes sem, contudo, causar-lhe
dano tecidual, alm de cobrir uma rea maior, facilitando a adequao de ratos de
diferentes tamanhos ao SQMR.
Figura 4.2 Projeto grfico mostrando, em A, a sapata e sua superfcie plantar e, em B, o estabilizador
metlico para joelho.
30
4.1.2 Instrumentao
O SQMR composto por um servomotor SWA 56-3,8-20 com torque nominal de
3,8 Nm e por seu respectivo servoconversor SCA-050004 (WEG Automao, Brasil),
que podem ser vistos na Figura 4.3.
Figura 4.3 Servomotor esquerda e servoconversor direita (WEG Automao, Brasil).
Uma clula de carga MLB 50 (Interface, EUA), com capacidade total de 50 N,
est conectada ao eixo do motor para registrar o torque imposto sapata pela
musculatura (Figuras 4.4 e 4.5). A informao de posio angular foi fornecida pelo
controlador e conduzida diretamente a uma placa de converso analgico-digital
NI 6009 (National Instruments, EUA), de 8 canais e 14 bits de resoluo, enquanto o
sinal de dinamometria passou por um circuito condicionador de sinais, construdo no
Laboratrio de Instrumentao Biomdica especialmente para esta finalidade. Os sinais
de torque e posio angular foram amostrados a 2 kHz, sendo armazenados para futuro
processamento. A frequncia de amostragem elevada foi utilizada para a realizao de
anlises especficas realizadas nos testes-piloto.
Peas construdas com material isolante, do tipo PVC, tambm foram utilizadas
para minimizar interferncias do servomotor sobre a clula de carga, como o tambor
isolante indicado nas Figuras 4.4 e 4.5-A.
Para a realizao do experimento com cada uma das patas, separadamente, foram
construdas duas sapatas que puderam ser retiradas ou fixadas com parafusos
superfcie superior do eixo de transferncia de torque (Figura 4.5-B).
31
Figura 4.4 Sistema Isocintico de Quantificao Mecnica para Ratos (SQMR) apresentando o
servomotor (SM), o suporte para o motor (S), o eixo do servomotor (EM), o tambor de material isolante (TI), a clula de carga (CC), o eixo de transferncia do torque (ET) e a sapata (SP). A plataforma de testes
para posicionamento do animal foi retirada para facilitar a visualizao.
Todo o sistema de medio de torque, compreendendo a clula de carga, a sapata
e o eixo de transferncia de torque, acompanha o movimento de rotao do servomotor,
que gira juntamente com este pela amplitude programada inicialmente. O eixo de
transferncia de torque responsvel por transferir o torque resistente, isto , o torque
gerado na sapata em oposio ao sentido de rotao do motor, clula de carga, sem
que haja movimento entre as estruturas intermedirias (Figura 4.5-B).
32
Figura 4.5 Em A observa-se a plataforma de testes (PT), o degrau da plataforma (para facilitar o
posicionamento do animal), o estabilizador metlico para joelho (EJ), a sapata (SP), a clula de carga (CC), o tambor isolante (TI) e o eixo do servomotor (EM). Em B observa-se estruturas como o bloco
limitador para posicionamento do calcneo do animal (BL) e o eixo de transferncia de torque (ET). A seta curva um exemplo do sentido anti-horrio de um torque resistente gerado na sapata, em oposio ao sentido horrio de movimento do motor. A setas brancas indicam o sentido de transferncia deste torque
CC. A seta de duplo sentido representa a direo e os sentidos de fora que a CC capaz de detectar.
4.1.2.1 Calibrao
A calibrao esttica do torque foi realizada utilizando-se massas de cerca de
14,43 g a cerca de 855 g, que foram acrescentadas em aproximadamente 5 g at chegar
a valores prximos a 50 g e, a partir da, acrescentadas em cerca de 50 g. As massas
foram avaliadas com auxlio de uma balana de preciso Adventurer(TM) ARA 520
(Toledo do Brasil, Brasil) para massas de 0,5 g a 1,5 kg. A faixa de massas escolhida
para a calibrao foi determinada com base no estudo de MARSALA et al. (2005) que
33
obtiveram valores de tnus de 0,078 a 7,9 N. As massas foram suspensas por um cordo
inextensvel apoiado em uma pequena polia e fixado a 2 cm do centro do eixo do
servomotor (Figura 4.6). Esta posio foi escolhida por aproximar-se do centro de
massa da pata dos animais, uma vez que no se poderia afirmar o ponto exato de
aplicao da fora pelos mesmos.
Figura 4.6 Foto do sistema utilizado para a calibrao do torque, mostrando o cordo utilizado para
sustentar as massas, fixado na sapata a uma distncia de 2 cm do centro do eixo do servomotor. As figuras tambm mostram a polia utilizada para reduzir o atrito sob o cordo enquanto a massa estava suspensa
pelo mesmo.
A tenso em Volt (V), produzida por cada massa suspensa pelo cordo fixado
sapata, foi registrada, porm este registro foi realizado com a massa produzindo torque
nos sentidos horrio e anti-horrio, o que resultou, respectivamente, em valores de
tenso mais negativos ou mais positivos com o aumento da massa. Este procedimento
foi realizado por se prever possveis variaes de tenso relacionadas com o sentido do
torque gerado pela massa.
Em seguida, foi construdo o grfico da tenso medida versus o torque calculado
(Figura 4.7), obtendo-se as retas de calibrao que forneceram os coeficientes angulares
utilizados como multiplicadores da tenso medida (V), para a converso desta em
valores de torque (Nm). Como os multiplicadores encontrados eram similares, a mdia
em mdulo dos mesmos foi utilizada para a calibrao do sinal de torque, sendo de
0,1256.
34
Figura 4.7 Relao da tenso medida versus o torque calculado. Em A, a massa tracionou no sentido
horrio (correlao negativa) e, em B, no sentido anti-horrio (correlao positiva). A funo apresentada em cada grfico corresponde reta de calibrao, enquanto R2 indica o coeficiente de determinao (R2),
mostrando a grande correlao (R) entre torque e tenso.
Para o registro dos valores de calibrao foi utilizado o programa Data
Acquisition System (DAS), desenvolvido em Labview (National Instruments, EUA). O
polinmio de calibrao foi obtido no programa Microsoft Excel 2000 (Microsoft
Corporation, EUA).
4.2 Protocolo Experimental
A amostra consistiu de 6 ratos fmeas Wistar de 15 semanas, pesando de 236 g a
259 g. O protocolo experimental foi aprovado pela Comisso de tica no Uso de
Animais de Experimentao do Centro de Cincias da Sade (CEUA-CCS) da
Universidade Federal do Rio de Janeiro sob o registro DFBCICB025, encontrando-se
em nome de Ivan Marques dos Reis, responsvel pela manipulao dos animais.
35
Os ratos foram mantidos sedados com ter etlico P.A. (KOWALSKI et al.,
2004) por via inalatria, previamente e durante o experimento, de forma a reduzir a
chance dos mesmos realizarem movimentos voluntrios.
Os animais foram colocados sobre a plataforma de testes, na posio prona e
com 90 de abduo horizontal do quadril (Figura 4.8), sendo mantidos com a cabea e
tronco em um contensor de acrlico para ratos (Insight, Brasil). O joelho e tornozelo de
cada animal foram posicionados com a sapata encontrando-se na angulao de 0 ou 90
do p em relao tbia. Esta foi considerada a posio neutra do tornozelo (CUTLIP et
al., 1997 e 2004, WILLEMS, STAUBER, 1999, GERONILLA et al., 2003), onde se
espera um torque inercial nulo (0 Nm), sendo confirmada pela permanncia da
articulao nesta amplitude quando os mesmos encontravam-se relaxados na posio de
teste.
O joelho foi mantido em 90 pelo estabilizador metlico para joelho, enquanto a
pata foi posicionada na sapata e mantida nesta posio com o auxlio de velcro.
Figura 4.8 Fotos do posicionamento do animal no Sistema de Quantificao Mecnica para Ratos
(SQMR) mostrando, em A, a vista superior da plataforma de testes e do contensor para ratos; em B, o posicionamento do animal no contensor; em C, a vista em perspectiva do posicionamento da pata do rato
na sapata sem o velcro de fixao da pata; e, em D, a vista superior do posicionamento do animal no SQMR.
36
Estando o animal posicionado, o servomotor movimentava a sapata dentro da
amplitude angular de -20 a +20 ou -30 a +30. O movimento foi iniciado com a pata
em extenso ou plantiflexo (-20 ou -30). Foram realizados 20 ciclos para cada uma
das trs velocidades constantes empregadas no experimento: 30/s, 100/s e 200/s.
Para fins de validao do equipamento, tambm foi coletado, por duas vezes,
sinais de posio angular e torque com a sapata livre. Nesta condio foram adquiridos
sinais com os mesmos parmetros cinemticos utilizados nos testes com ratos, porm,
sem a presena destes.
4.3 Processamento dos Sinais
O programa para controle do motor e aquisio de sinais foi desenvolvido em
Labview verso 8.2 (National Instruments, EUA) por BORGES (2009). A interface do
sistema e sua utilizao podem ser vistas nas Figuras 4.9 e 4.10, respectivamente. Este
sistema fornece, na tela do computador, os sinais em tempo real referentes posio
angular e torque, tanto filtrado quanto original. O programa desenvolvido, alm de
permitir a seleo dos parmetros de teste como angulaes inicial e final, nmero de
ciclos e velocidade angular, tambm apresenta funes como a seleo da pata a ser
testada, o diretrio de gravao e as funes para interromper e reiniciar a aquisio.
O processamento dos sinais foi realizado em programas desenvolvidos em
MatLab verso 7 (The MathWorks, EUA). Os sinais de torque e posio angular
(goniometria) foram filtrados por um passa-baixas Butterworth de ordem 4 e frequncia
de corte correspondente a 15 vezes a frequncia fundamental do sinal. Foram
selecionados seis ciclos contnuos, com ausncia de interferncias e rudos, para as
anlises.
Para a obteno do sinal de torque, tendo-se como referncia a posio neutra do
tornozelo (0 e 0 Nm), foi utilizada a parcela do torque inercial, constante C do modelo
massa-mola-amortecedor, que ser explicado na seo seguinte. Esta parcela foi
subtrada do seu ciclo correspondente no sinal de torque, favorecendo a apresentao
grfica dos dados e a obteno das amplitudes mximas do sinal de torque.
37
Figura 4.9 Interface do sistema de controle, aquisio e armazenamento de sinais desenvolvido por
BORGES (2009).
Figura 4.10 Sistema para controle, aquisio e armazenamento de sinais.
38
Para o clculo das amplitudes mximas do torque, foi realizada a mdia de todos
os valores mximos e mnimos de cada ciclo do sinal. Estes valores foram, ento,
convertidos em fora (N) para facilitar a comparao com outros estudos que utilizam
este tipo de medida. Para tanto, utilizou-se o mesmo brao de alavanca da calibrao do
SQMR (0,02 m).
Nos sinais de posio angular e torque, as retas crescentes correspondem aos
movimentos de flexo (dorsiflexo), enquanto as decrescentes correspondem aos
movimentos de extenso (plantiflexo) do tornozelo.
Para a anlise do torque foi considerado o intervalo de 30% a 70% dos trechos de
flexo e extenso, sendo o sinal de posio angular utilizado como referncia para a
determinao destes trechos. O descarte dos 30% iniciais e finais objetivou eliminar as
influncias da acelerao-desacelerao para a mudana de sentido de movimento da
sapata, o que descaracterizaria o comportamento isocintico que se desejou avaliar.
Os trechos considerados e descartados do sinal de torque podem ser observados
nas Figuras 4.11 e 4.12 coletados, respectivamente, nas velocidades de 30/s e 200/s.
Figura 4.11 Trechos do sinal de torque da pata direita de um rato, coletados na velocidade de 30/s e amplitude de movimento de 60 (de -30 a +30), com a articulao do tornozelo movimentando-se da dorsiflexo em direo plantiflexo (df->pf) e em sentido oposto (pf->df), mostrando o sinal medido (a), o sinal descartado da anlise (linhas grossas) (b) e trechos do sinal selecionados para a anlise (c).
39
Figura 4.12 Trechos do sinal de torque da pata direita de um rato, coletados na velocidade de 200/s e amplitude de movimento de 60 (de -30 a +30), com a articulao do tornozelo movimentando-se da dorsiflexo em direo plantiflexo (df->pf) e em sentido oposto (pf->df), mostrando o sinal medido (a), o sinal descartado da anlise (linhas grossas) (b) e trechos do sinal selecionados para a anlise (c).
Uma alterao sistemtica na inclinao do sinal de torque da pata e sapata
esquerda (Figuras 4.13 e 4.14), a partir da posio angular de aproximadamente 0,
conduziu subdiviso do trecho de 40%, escolhido inicialmente para a anlise do
torque, em dois trechos: Trecho 1, de 30% a 50% e Trecho 2 de 50% a 70%. Desta
forma, para a amplitude de 40 (excurso de -20 a +20) foram analisados os trechos de
torque compreendidos entre -8 e 0 e entre 0 e +8 e, para a amplitude de 60 (excurso
de -30 a +30), foram analisados os trechos de torque de -12 e 0 e de 0 e +12,
respectivamente.
Figura 4.13 Curva ngulo-torque de um rato mostrando 6 ciclos de dorsi (df) e plantiflexo (pf) do
tornozelo, realizados na amplitude de 60 (de -30 a +30) e velocidade de 30/s. Em A, nota-se o sinal de torque da pata esquerda com uma inclinao caracterstica a partir de 0, divergindo do sinal da pata
direita, em B.
40
Figura 4.14 Curva ngulo-torque da sapata mostrando 6 ciclos do que corresponderia, com a presena dos ratos, dorsi (df) e plantiflexo (pf), realizados na amplitude de 60 (de -30 a +30) e velocidade de
30/s. Em A, nota-se o sinal de torque da sapata esquerda com alteraes a partir de 0, divergindo do sinal da sapata direita, em B.
Como alguns coeficientes de elasticidade (K), a serem abordados na seo
seguinte, apresentaram valores negativos em algumas anlises do torque utilizando-se
os Trechos 1 e 2, procedeu-se, nestes casos, ao clculo dos coeficientes considerando-se
um Trecho 3, de 35% a 70% de cada movimento de flexo e extenso. A anlise
utilizando o Trecho 3 foi empregada para a verificao da influncia do tamanho do
Trecho analisado na caracterizao dos coeficientes.
4.4 Modelagem Matemtica do Experimento
Para a caracterizao das propriedades passivas musculares foi utilizado o
modelo massa-mola-amortecedor (Equao 1), a exemplo de autores como
PROCHAZKA et al. (1997) que avaliaram o tnus rgido na doena de Parkinson,
MCCREA et al. (2003) que avaliaram indivduos espsticos e PAULA et al. (2008a e
2008b) e POLATO (2010) que avaliaram, respectivamente, adultos e idosos saudveis.
Neste modelo, a massa se relaciona com o componente inercial, enquanto a mola
e o amortecedor representam, respectivamente, as componentes elstica e de atrito
viscoso do movimento. Portanto, o torque resistente total formado pela soma destas
parcelas de torque, dependentes da acelerao, da velocidade e do deslocamento
angular.
41
T I B K C = + + +&& & (1)
Neste modelo, T o torque resistente resultante, I o momento de inrcia do
segmento analisado, B o coeficiente de atrito viscoso, K o coeficiente de elasticidade, C
o torque gravitacional e elstico existente na posio inicial e representa a posio
angular.
Considerando que no se pode garantir que a posio neutra, joelho e tornozelo a
90, corresponda posio de repouso dos elementos elsticos, razovel supor que um
torque elstico estar presente mesmo nesta posio, alm disto, a atuao da fora da
gravidade tambm pode contribuir com um torque, pois o movimento nunca ocorre num
plano perfeitamente horizontal. Estes problemas foram contornados com a adio da
constante C.
Para o clculo dos coeficientes do modelo (Equao 1) foi utilizado o mtodo
dos mnimos quadrados (PROCHAZKA et al., 1997, MCCREA et al., 2003).
Sabendo-se que no possvel alcanar a velocidade constante de movimento
sem que haja acelerao e desacelerao do servomotor e, uma vez optando-se pelo
descarte dos 30% iniciais e finais de cada trecho de flexo e extenso, o torque inercial
dos trechos avaliados torna-se nulo e a Equao 1 reduzida parcela mola-
amortecedor (PROCHAZKA et al., 1997, PISANO et al., 2000, LEE et al., 2002),
observada na Equao 2:
CKBT ++= & (2)
O torque viscoso, em velocidade constante, apresentou similaridades entre ratos
e sapatas, correspondendo, em ambos, a degraus de torque proporcionais ao atrito do
motor. Em vista disto, o coeficiente de elasticidade (K) foi considerado o valor mais
significativo na anlise estatstica dos resultados, embora a Equao 1 tenha sido
utilizada para a caracterizao do tnus.
A Figura 4.15 fornece um exemplo dos sinais de posio angular, velocidade e
acelerao de um rato. Nota-se que a acelerao se mantm praticamente nula, com
exceo das regies de mudana de sentido de movimento da sapata. Alm disto,
observa-se o formato de onda quadrada no sinal de velocidade.
42
Figura 4.15 Sinais de posio angular (Goniometria), velocidade (Vel) e acelerao (Ace) de um rato
coletados na amplitude de 60 (de -30 a +30) e velocidade de 30/s.
4.5 Anlise Estatstica dos Resultados
O teste no-paramtrico de Friedman foi aplicado para comparar medidas
repetidas dos valores do coeficiente de elasticidade (K) encontrados entre as trs
velocidades da mesma pata. Em caso de diferena estatisticamente significativa entre as
velocidades, procedeu-se comparao entre duas velocidades pelo teste de Wilcoxon
para amostras pareadas. Este teste tambm foi aplicado na comparao de dois grupos
de amostras: entre patas, entre as amplitudes de 40 e 60 e entre os Trechos 1 e 2.
A anlise estatstica foi realizada no programa R verso 2.10.1 (The R
Foundation for Statistical Computing, ustria) e considerou o nvel de significncia
estatstica de 5% ( = 0,05). Os resultados foram sumarizados em tabelas e em grficos
do tipo boxplot, onde o intervalo interquartil compreendeu a diferena entre os limites
da caixa (1 ao 3 quartil).
43
CAPTULO 5
Resultados
5.1 Anlise Grfica do Sinal de Torque
As Figuras 5.1 e 5.2 apresentam dois ciclos completos de sinais de torque e
posio angular, de ratos, considerados tpicos.
Figura 5.1 Sinais de torque e posio angular do tornozelo esquerdo, em A, e direito, em B, de um rato,
com a articulao movimentada passivamente pela amplitude de 40 e nas velocidades de 30/s (V30), 100/s (V100) e 200/s (V200).
44
Figura 5.2 Sinais de torque e posio angular do tornozelo esquerdo, em A, e direito, em B, de um rato, com a articulao movimentada passivamente pela amplitude de 60 e nas velocidades de 30/s (V30),
100/s (V100) e 200/s (V200).
As amplitudes mximas do sinal de torque so apresentadas na Tabela 5.1. Nota-
se que os torques mximos verificados na velocidade de 200/s suplantam os
encontrados nas demais velocidades, alm disto, tambm foram encontradas amplitudes
mais elevadas na pata esquerda.
Tabela 5.1 Valores mdios das amplitudes mximas do sinal de torque e fora de ratos (n = 6). Amplitude Mxima do Torque (Nm) (x10-3)-Fora (N)
Pata Direita (D) Pata Esquerda (E)
Vel (/s)
40
60
Mdia
(D)
40
60
Mdia
(E)
30 6,68-0,33 10,76-0,54 8,72-0,44 11,61-0,58 17,00-0,85 14,30-0,72
100 5,88-0,29 9,08-0,45 7,48-0,37 10,15-0,51 15,31-0,77 12,73-0,64
200 28,02-1,40 26,13-1,30 27,07-1,35 35,11-1,76 30,00-1,50 32,55-1,63
As Figuras 5.3-A e 5.4-A apresentam sinais de torque coletados na amplitude de
40 e velocidade de 200/s e que geraram coeficientes de elasticidade (K) negativos,
tanto na anlise do Trecho 1 (30% a 50%), quanto do Trecho 2 (50% a 70%). A anlise
45
do Trecho 3 (35% a 70%) tambm foi realizada (Figuras 5.3-B e 5.4-B), favorecendo a
deteco dos coeficientes nesta amplitude e velocidade.
Figura 5.3 Trechos do sinal de torque da pata direita, sem a referncia da posio neutra (0 Nm), de um rato coletados na velocidade de 200/s e amplitude de 40 (-20 a +20), mostrando o torque medido (a), o torque estimado descartado da anlise (linhas grossas) (b) e trechos de torque (c) correspondentes, em A,
ao Trecho 1 (30% a 50%) e, em B, ao Trecho 3 (35% a 70% ).
Figura 5.4 Trechos do sinal de torque da pata direita de um rato, sem a referncia da posio neutra
(0 Nm), coletados na velocidade de 200/s e amplitude de 40 (-20 a +20), mostrando o torque medido (a), o torque estimado descartado da anlise (linhas grossas) (b) e trechos de torque (c) correspondentes,
em A, ao Trecho 2 (50% a 70%) e, em B, ao Trecho 3 (35% a 70% ).
46
Os sinais de torque com a sapata livre tambm foram coletados nas duas
amplitudes estudadas e podem ser observados nas Figuras 5.5 e 5.6. O sinal de torque da
sapata esquerda apresenta alteraes mais acentuadas no formato de onda quadrada que
adquire medida que a velocidade aumenta.
Na amplitude de 40 as irregularidades do torque da sapata esquerda ocorreram
principalmente nas velocidades de 30/s e 100/s, enquanto na amplitude de 60 foram
observadas inclinaes onde deveria haver plats, nas velocidades de 100/s e 200/s,
alm de presena de rudos na velocidade de 30/s.
Figura 5.5 Dois ciclos de sinais de torque das sapatas esquerda, em A, e direita, em B, coletados nas
velocidades de 30/s (V30), 100/s (V100) e 200/s (V200) e amplitude de movimento de 40.
Figura 5.6 Dois ciclos de sinais de torque das sapatas esquerda, em A, e direita, em B, coletados nas
velocidades de 30/s (V30), 100/s (V100) e 200/s (V200) e amplitude de movimento de 60.
47
5.2 Anlise Estatstica dos Trechos de Torque
A seguir sero apresentados os coeficientes de elasticidade (K) dos dois trechos
de torque estimado selecionados para as anlises: Trecho 1, de 30% a 50%, e Trecho 2,
de 50% a 70% dos movimentos de flexo e extenso do tornozelo. Os trechos foram
analisados nas amplitudes de 40 e 60. Para fins de verificao da influncia do trecho
analisado sobre os coeficientes obtidos, um Trecho 3, de 35% a 70% tambm foi
coletado na velocidade de 200/s e amplitude de 40.
5.2.1 Trecho 1
5.2.1.1 Amplitude de 40
A Tabela 5.2 apresenta um resumo dos valores de K encontrados para as trs
velocidades estudadas nas duas patas.
Tabela 5.2 Coeficientes de elasticidade (K) das patas direita e esquerda por velocidade e para a amplitude de 40.
Coeficiente de Elasticidade (Nm/) (x10-3)
Pata Direita Pata Esquerda Velocidade (/s)
Mediana IQ Mdia DP Mediana IQ Mdia DP
30 3,58 0,53 3,84 1,25 3,38 0,56 3,20 0,70
100 4,27 1,31 3,96 1,21 2,37 1,96 3,10 1,38
200 0,70 2,77 -0,25 2,39 -0,70 1,33 -0,49 1,91
DP Desvio-padro, IQ Intervalo interquartil
O teste de Wilcoxon para amostras pareadas indicou semelhana entre os
coeficientes de elasticidade das velocidades de 30/s com 100/s (p = 0,8438) em ambas
as patas. Em funo dos coefic