Universidade Estadual de Maringá 26 e 27/05/2011
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RETROSPECTO HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA
A EDUCAÇÃO A PARTIR DA DÉCADA DE 1980
POSSI, Ester Hinterlang de Barros (UEM)1
OLIVEIRA, Sandra Regina Ferreira de (Orientadora/UEL)
O presente artigo é resultante do diálogo de pesquisa desenvolvida
concomitantemente no Programa de Pós Graduação da Universidade Estadual de
Londrina. Tem por foco analisar o processo de aprendizagem dos professores
participantes do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) desenvolvido no
estado do Paraná cujas características possibilitam classificá-lo como um programa de
excelência no processo de formação continuada dos docentes2.
Conforme Pichon-Rivière (2005) quando pessoas com necessidades semelhantes
se unem em torno de uma tarefa comum, constitui-se o “grupo”. A ideia de construir um
texto considerando as interseções entre nossas pesquisas adveio dos debates suscitados
nos encontros de estudos do Grupo de Pesquisa História e Ensino de História. Em
coerência com os aportes teóricos metodológicos que balizam nossas investigações,
entendemos que o conhecimento se constrói na relação com o outro. Desta forma,
paralelamente ao processo de desenvolvimento da dissertação, nos desafiamos a
elaborar este artigo que tem por objetivo discutir as transformações e permanências no
processo de formação dos professores, com destaque para a construção do
conhecimento histórico articulada às políticas públicas voltadas para a formação de
professores.
Se pensarmos que a formação continuada de professores tem sido um assunto
recorrente na contemporaneidade cabe estudar os fatos históricos relacionados às
políticas públicas, para melhor entendermos o tema em questão. A história, segundo
Hobsbawm (1997), é a base a partir da qual podemos pensar a contemporaneidade.
1 Mestranda do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Londrina. 2 Pesquisa em andamento orientada pela Profª. Drª. Sandra Regina Ferreira de Oliveira.
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Portanto, fazemos um recorte histórico após o período de ditadura militar
(1964/1985), especificamente a partir dos anos de 1980, de período marcado pela
intensificação em torno do movimento de redemocratização do país. Movimento do qual
sindicato, universidades, professores, alunos e outras entidades fizeram parte. Com isso,
instala-se um estado de Direito Democrático, como afirma Vieira (2001, p. 17) “uma
típica configuração de democracia liberal, se nós nos basearmos na Constituição
Brasileira de 1988”.
Dessa forma, a partir da década de 1980 as discussões sobre formação de
professores foram mais acentuadas, de acordo com Nóvoa (1995, p. 15) porque a partir
desse período os estudos recolocaram “[...] os professores no centro de debates
educativos e das problemáticas da investigação”.
Embora a Constituição de 1988, seja uma constituição que garanta direitos
sociais, na educação permanece o caráter dualista, qual seja: público versus privado.
Portanto, a força do mercado com as políticas emanadas dos organismos multilaterais
repercutem tanto na consciência social como nas práticas educativas (Shiroma, 2007).
Todas as transformações efetia-se em função de ajustes econômicos, assumidos
junto aos organismos mutilaterais, entre eles: Banco Mundial (BM) e Fundo Monetário
Internacional (FMI), como conseqüência de dívidas contraídas pelos governos militares
(Shiroma, 2007)
É neste contexto que o atual quadro educacional delineia-se após a promulgação
da Constituição de 1988. No mesmo ano, em cinco de outubro, tem-se a eleição direta
de Fernando Collor de Mello para Repubica. A partir da eleição de Collor deflagra-se o
processo de ajuste econômico brasileiro às exigências da reestruturação global da
economia (SHIROMA. 2007).
Com a abertura do mercado, os produtos nacionais não conseguiram concorrer
com os produtos estrangeiros e em consequência, buscou-se encontrar alternativas que
assegurassem ao mercado brasileiro maior competitividade frente ao cenário mundial.
De acordo com Shiroma (2007, p. 47), para conseguir essas vantagens almeja-se
formar o sujeito para ser competitivo. Neste contexto, de acordo com Shiroma (2007, p.
47) acentuam-se nas discussões educacionais abordagens que retomam “[...] aspectos
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da Teoria do Capital Humano, muito em voga nos anos de 1970 [...] com forte presença
nas políticas educacionais do regime militar”.
A Teoria do Capital Humano, de acordo com Gentili (2002, p.53), “[...]
desempenhou um papel central na certificação e legitimação “científica” de que a escola
podia e seriam um mecanismo de integração de indivíduos a vida produtiva”.
Gentili, ainda cita:
Um incremento no capital humano individual aumenta as condições de empregabilidade do indivíduo, o que não significa necessariamente, que por aumentar suas condições de empregabilidade, todo indivíduo terá seu lugar garantido no mercado. Simplesmente, porque no mercado não há lugar para todos. “Empregabilidade” não significa, então, para o discurso dominante, garantia de integração, senão melhores condições de competição para sobreviver na luta, pelos poucos empregos disponíveis [...] (GENTILI, 2002, p. 53).
Gentili, em outras palavras demonstra a fragilidade do argumento de inserir
todos a vida produtiva, em função de não haver emprego para todos.
A educação é, no ideário neoliberal, apontada como salvacionista e o caminho
pelo qua o país se tornará competitivo. Para tanto, a escola precisaria ensinar os
códigos da modernidade, que são as capacidades e as competências mínimas para
participação produtiva do indivíduo no século XXI. Ou melhor, para sobreviver à
concorrência do mercado, o cidadão do século XXI precisa ter domínio da leitura e da
escrita, capacidade de analisar, sintetizar e interpretar dados, fatos e situações;
capacidade de compreender e atuar em seu entorno social; receber criticamente os meios
de comunicação; capacidade para localizar, acessar e usar melhor a informação
acumulada; capacidade de planejar, trabalhar e decidir em grupo (TORO, 1997).
Tais características são compreendidas a partir do mundo do trabalho e não do
desenvolvimento do sujeito, ou seja, em última instância o projeto prevê a formação do
sujeito, mas a formação do trabalhador competitivo.
Gentili (2002, p. 55) afirma que “nessa perspectiva, o indivíduo é um
consumidor de conhecimentos que o habilitam a uma competição produtiva e eficiente
no mercado de trabalho. E, ainda, Gentili (2002, p. 55) salienta que “[...] educação e
escola, nas suas diferentes modalidades institucionais, constituem sim uma esfera de
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formação para o mundo do trabalho. Só que essa inserção depende agora de cada um de
nós”.
A questão da formação para a formação do sujeito com vistas a prepará-lo para
mercado de trabalho é enfatizada no documentos internacionais. De acordo com
Shiroma: Vasta documentação internacional, emanada de importantes organismos multilaterais, propalou esse ideário mediante diagnósticos, análises e propostas de soluções considerados cabíveis a todos os países da América Latina e Caribe, no que toca tanto a educação quanto à economia. Essa documentação exerceu papel na definição das políticas públicas para a educação do país (SHIROMA, 2007, p. 47).
Seguindo as orientações dos organismos multilaterais (SHIROMA, 2007), em
1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação no Art. 9º prevê que a União incumbir-
se-á de “ elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o
Distrito, Federal e os Municípios”. No artigo 67 traz que os sistemas de ensino deverão
promover a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, nos
termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério, aperfeiçoamento
profissional contínuo, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse
fim.
As obrigações do poder público nesta questão ainda são enfatizadas no artigo 80,
que dispõe que “o Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de
programas de ensino a distância em todos os níveis e modalidades de ensino e de
educação continuada” e em seu artigo Art. 87º “É instituída a Década da Educação, a
iniciar-se um ano a partir da publicação desta Lei”, ou seja, 1997. No parágrafo 1º, do
mesmo artigo relata que “A União, no prazo de um ano a partir da publicação desta
Lei, encaminhará, ao Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação, com
diretrizes e metas para os dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial
sobre Educação para Todos (BRASIL, 1996).
Após discussões entre a sociedade civil e órgãos governamentais, que não
ocorreram em 1997, como consta na LDBEN, é promulgado o Plano Nacional de
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Educação (PNE) – Lei nº 10.172/2001 – ou seja, quatro anos após a aprovação da
LDBEN.
O plano é composto de um diagnóstico da realidade educacional brasileira e das
diretrizes e das metas a serem executadas por todos os entes federados em conformidade
com a Constituição Federal de 1988, que determina, no Artigo 214, que deverá ser
estabelecido o “Plano Nacional de Educação, com duração plurianual, visando à
articulação e ao desenvolvimento do ensino em diversos níveis e à integração das ações
do Poder Público” (BRASIL, 1988).
Na articulação entre Constituição Federal, Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN) e Plano Nacional de Educação (PNE) evidencia-se que o Brasil fica
subordinado às políticas emanadas dos organismos multilaterais, principalmente, no
citado no Artigo 87º no seu parágrafo 1º da LDBEN.
Para atingir as metas propostas faz-se necessário algumas alterações nas políticas
governamentais. Tais mudanças são ancoradas na reprodução do projeto do capital
internacional, consubstanciado nos princípios do Consenso de Washington, que se
materializou por meio das seguintes medidas: disciplina fiscal, redefinição das
prioridades dos gastos públicos, reforma tributária, liberalização do setor financeiro,
manutenção das taxas de câmbio competitivas, liberalização comercial, atração das
aplicações de capital estrangeiro, privatização das empresas estatais, desregulamentação
da economia e proteção dos direitos autorais (GENTILI, 1998).
Na década de 1990 avaliava-se que, com tais medidas entendidas como
necessárias para proporcionar a melhoria das condições sócio econômicas do Estado.
Sobrariam recursos para investimentos em políticas públicas. No campo educacional
um dos pontos fundamentais a receber tais recursos seria a formação continuada de
professores .
No governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) tal política tem
continuidade, porém são apresentadas à sociedade não mais como estratégia para o
desenvolvimento do projeto neoliberal, mas sim como necessárias para a melhoria dos
serviços prestados aos cidadãos (SHIROMA, 2007).
Lima; Viriato; Zanardini (2002) destacam que a reforma se sustenta nos planos
político e ideológico. Contudo, precisamos entender o que pretendem os organismos
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multilaterais com a reforma, pois os mesmos são financiadores desse projeto e como
financiadores cobram juros exorbitantes. Para obtenção de lucro, o capitalismo precisa
regular a economia e inculcar a ideologia por meio da escola.
Nesse sentido, a educação como política pública é afetada pelo plano político e
ideológico de FHC, pois o Estado de provedor passa a regulador, de acordo com Bresser
Pereira (1995), no plano de reforma do Estado. Portanto, o papel do Estado começa a
sofrer alterações, pois ocorrem transferências para o setor privado das atividades que
podem ser controladas pelo mercado e nada melhor do que a escola para disseminar a
nova ordem ideológica
De acordo com Shiroma (2007), nove países com maior taxa de analfabetismo
compõem o “E 9”, são eles: Banglandesh, Brasil, China, Egito, Índia, Indonésia,
México, Nigéria e Paquistão. Esses países foram levados a desencadear ações para
consolidação dos princípios acordados na Declaração de Jomtien. Esses países se
comprometeram a impulsionar políticas educativas articuladas ao Fórum Consultivo
Internacional para a “Educação para Todos” (Education for All- EFA), coordenado pela
UNESCO e, ainda, o projeto difundiu a idéia de que a educação deveria realizar as
necessidades básicas de aprendizagem (NEBAS). De acordo com a Carta de Jontiem a
educação básica deveria ocorrer em outras instâncias educativas como a família, a
comunidade e os meios de comunicação.
Para alcançar o cumprimento desse projeto idealizado de acordo com os
interesses neoliberais, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
(CEPAL), nos anos de 1990, pretendia
[...] criar, no decênio, certas condições educacionais, de capacitação e de incorporação do progresso científico e tecnológico que tornassem possível a transformação das estruturas produtivas da região em um marco de progressiva equidade social. Na visão de seus técnicos, tal objetivo só seria alcançado mediante uma ampla reforma dos sistemas educacionais e da capacitação profissional existentes na região [...] (SHIROMA, 2007, p 53, grifo nosso)
As reformas educacionais passam a enfatizar a capacitação do professor. No
relatório de Jacques Delors, produzido entre 1993 e 1996, a UNESCO delineia as
características da educação para o século XXI. Entende-se que os professores são
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importantes agentes de mudança e devem ser treinados para reforçar o conjunto de
ideias a prevalecer no futuro, aém de exigir-se-á do professor formação para a pequisa.
Nesse mesmo sentido, o Projeto Principal de Educação na América Latina e
Caribe (PROMEDLAC), financiado pela UNESCO/ OREALC, enfatiza a
profissionalização da ação educativa. Segundo esse mesmo órgão, as competências
básicas de aprendizagem seriam asseguradas com investimentos maciços na
profissionalização docente por meio de formação, da atualização e do aperfeiçoamento
(SHIROMA, 2007, p. 60).
E, ainda, as reflexões da autora apontam para a:
[..] recorrência das recomendações da UNESCO, da CEPAL, do PROMEDLAC e do Banco Mundial, estavam assentadas as tarefas que os países latinos americanos teriam para com a educação nos anos 1990. Instado a mobilizar as forças políticas necessárias para a produção do consenso, tendo em vista a realização do projeto internacional – do qual é caudatário -, o Brasil procurou a adesão de diversos setores, em especial de empresários e trabalhadores, que desejassem intervir nas políticas educativas. Afinal os organismos internacionais já haviam prevenido que o êxito nas negociações e persuasão dos interessados dentro e fora do sistema, posto que uma ruptura entre eles poderia conduzir à supressa das condições de efetivação das reformas (SHIROMA, 2007, p. 63).
Os próprios organismos multilaterais sinalizam para a possibilidade de não
adesão a esse consenso e a intervenção nas políticas educacionais, por meio da
coletividade. Porém, ocorre a desarticulação dos profissionais da educação, a partir da
participação de professores de renome no país quando assumem cargos nos governos
neoliberais. Com essa aproximação, perdemos a força coletiva e com isso, até os
sindicatos e associações foram enfraquecidas
Gimeno Sacristán formulou que a reforma na Espanha: “A curto prazo os
confunde, a longo prazo os desmobiliza”, nesse sentido, Shiroma (2007) tem o mesmo
posicionamento de Sacristán, por entender que ocorreu o mesmo com o Brasil, pois, o
fato de professores com cargos nos governos neoliberais deixaram confusos a todos e
com o passar do tempo ocorreu a desmobilização dos professores
Todo esse desencadeamento leva os profissionais da educação a conviverem,
segundo Oliveira, com as políticas educacionais direcionadas a noção de que a escola é:
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[...] espaço de ensino, mas antes de tudo promoção social. [...] atribuindo à escola novas funções sociais, muitas vezes de caráter assistencial. Por meio da escola espera-se corrigir determinados desequilíbrios característicos da estrutura social e econômica vigentes (OLIVEIRA, 2009, p. 17).
Essas são as novas políticas educativas adotadas em nível internacional, em
diferentes países e continentes (OLIVEIRA, 2009); em decorrência a escola é destinada
a assumir várias responsabilidades quanto ao papel formativo do sujeito, além da sua
função essencial, que de acordo com Saviani (2005) é a transmissão de conteúdos
científicos e culturais. Tal situação a coloca como um tema corrente nas discussões,
tanto no âmbito escolar, como em outros segmentos: governo, organismos multilaterais,
mídias, onde todos salientam as crises, os problemas e as ineficiências da educação
escolar, esquecendo-se a e mesma inserida numa sociedade a qual também encontra-se
em crise.
Para agravar o quadro de crise a formação continuada de professores, mesmo
garantida por Lei e implantada, ainda que a partir de pressupostos políticos voltados
para a economia do que, necessariamente, à educação, não garante qualidade no
processo de ensino.
Conforme artigo publicado pela Agência Estado, em 26/03/2007, São Paulo SP,
a jornalista Simone Iwasso, afirma que o “Professor que faz cursos não melhora o
aprendizado. Docentes que estiveram em programa de capacitação não conseguiram que
seus alunos tivessem melhor desempenho no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação
Básica)”. Nesta perspectiva, Simone Iwasso comenta que
[...] quando se trata de ensino público, e dos cursos de capacitação oferecidos aos professores dessas redes, é que eles não estão fazendo diferença no desempenho dos alunos, apesar de geralmente serem divulgados como uma das iniciativas para melhorar o ensino.
A jornalista escreve a reportagem comentando o estudo Determinante do
Desempenho Escolar do Brasil apresentado no Seminário Remuneração, Gestão e
Qualidade da Educação organizada pela Fundação Lemann, Instituto Futuro Brasil e
Ibmec São Paulo. O autor da pesquisa, o economista, Naércio Menezes Filho (2007),
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fez a análise dos resultados do Sistema Nacional da Avaliação e afirma: “Esses cursos
de capacitação não têm influência. Pelos resultados dos alunos no Saeb, esses cursos
não aumentaram a eficácia do professor na hora de dar aula”.
O conceito de avaliação do SAEB não é avaliado nesse trabalho, além do que se
trata de um economista olhando para o final de um processo: professor preparado é
igual a aluno aprendendo que é igual a bm resultado no SAEB. No entanto, mesmo
assim, não podemos desconsiderar tais análises.
O Banco Mundial (BM) prioriza a capacitação em serviço dos docentes em seus
documentos. Dessa forma, os governos têm realizados investimentos na formação
continuada, com o objetivo de melhorar o rendimento dos alunos. Gatti afirma:
Apesar disto, os resultados obtidos com os alunos, do ponto de vista de seu desempenho em conhecimentos escolares, não têm ainda se mostrado satisfatórios, fato que tem posto, no Brasil, os processos de educação continuada em questão (Gatti, 2009).
O discurso de Gatti (2009) e a matéria da Agência Estado (2007) enfatizam que
o desempenho escolar dos alunos não tem melhorado com os cursos de formação
continuada. Por quê? Para responder a essa qustão é preciso analisar os cursos, o
professor que freqüenta o mesmo e a relação que todo isso estabelece com a cultura
escolar.
Em que pesem críticas ou buscas de novos caminhos para a formação continuada
de professores, os governos vêm desenvolvendo programas ou projetos a respeito, visto
que, por lei, são os responsáveis por essa formação.
Gatti aponta que os problemas da formação inicial têm sido compensados por
programas de formação compensatória:
Com problemas crescentes nos cursos de formação inicial de professores, a idéia de formação continuada como aprimoramento profissional foi se deslocando também para uma concepção de formação compensatória destinada a preencher lacunas da formação inicial (GATTI, 2009, p. 200).
A discussão sobre formação de professores adensada pela ideia exposta por Gatti
de “preenchimento de lacunas” nos remete a outro problema: a formação inicial, ou
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formação recebida nos cursos de graduação, que também está atrelada a um projeto
social.
Nesse sentido Saviani descreve:
Não se trata, pois, de deslocar a responsabilidade pelo fracasso escolar que atinge as crianças das camadas trabalhadoras para os professores, escamoteando o fato de que eles também são vítimas de uma situação social injusta e opressora. Isso não pode, porém, impedir-nos de constatar que sua condição de vítima se expressa também, embora não somente, pela produção de sua incompetência profissional. Em verdade, não procedendo assim, incorreríamos em incoerência. Com efeito, ao criticarmos a política educacional vigente pelas distorções decorrentes de seu atrelamento aos interesses dominantes, não será possível deixar de reconhecer seus efeitos sobre a formação (deformação) de professores (SAVIANI, 2005, p. 31).
Saviani argumenta que a formação de professores, também, está atrelada às
políticas públicas vigentes e reconhece que os efeitos dessa formação (deformação) nos
professores, portanto, há um círculo vicioso que precisa ser rompido, emprestando as
palavras de Gatti (2009) podemos denominar como a cultura de formação.
Tal rompimento pode ser iniciado com pesquisas que se dediquem a estudar a
formação continuada de professores destacando suas potencialidades e limites. Como
pontos positivos Gatti (2009) destaca: a forma como os docentes valorizam as
oportunidades de formação quanto à aplicabilidade em sala de aula, veem oportunidade
de ampliar seus conhecimentos, interação com seus pares e com seus formadores, e,
acesso a novos conceitos.
Gatti (2009 p. 206) salienta pontos positivos da formação, pois, há cursos que
“abriam espaço para a inserção do professor como sujeito ativo e para uma capacitação
centrada na articulação entre a teoria e os desafios do professor”.
Se os professores tiverem uma formação continuada, por um longo período e
essa continuar na cultura escolar por meio de grupos de estudos e encontros coletivos
constata-se, de acordo com Gatti que:
[...]a manutenção dos efeitos de processos de formação continuada parecem indicar que um dos fatores relevantes para que isso aconteça está na continuidade das trocas, das discussões, dos ensaios de alternativas que se definem na dimensão coletiva do trabalho da
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escola. Atividades que o sistema não sustenta ao findar o programa, cujo prazo de validade coincide com a sua própria vigência (GATTI, 2009, p.212).
Como pontos negativos Gatti (2009) elenca: cursos fragmentados, formatados
sem o professor expor suas necessidades, descompasso entre os que estão dentro e fora
da escola, pouco tempo para fixar uma cultura de formação, aligeirados, capacita um
professor com mais experiência que repassa aos demais (homologia de processos),
pouca autonomia para abrir espaço para discussão, várias tendências pedagógicas (o
professor não aprende nenhuma e, portanto, acaba fazendo uma mistura, ou não as usa)
e, por fim, os programas não preveem acompanhamento e apoio a prática pedagógica.
Faz-se necessário pensar, também, a relação existente entre o processo de
formação continuada e as concepções teóricas e metodológicas que embasam a proposta
educacional e os motivos que levam a ruptura no contexto escolar, ou seja, não há
tempo suficiente para que as concepções teóricas e metodológicas tenham um
amadurecimento e possam compor a cultura escolar.
Gorni (2001) sinaliza como indicadores que a ruptura na formação continuada
de professores é ocasionada por mudanças políticas, acreditamos que isso ocorre devido
ao fato de que cada governo que assume tem uma concepção de homem, de educação e
de sociedade. Neste sentido, as políticas públicas quando conseguem imprimir melhoras
no sistema educacional devem ter um caráter permanente e não trocas constantes a
partir da troca de governo, pois, como a cultura escolar é sólida, constantes mudanças
não permitem a incorporação à cultura escolar.
Como essa pesquisa está em andamento, vemos como importante prolongar as
políticas públicas para a formação continuada de professores no governo Lula, que não
pretende ser um governo neoliberal, mas tem dado continuidade ao processo de
formação de professores. Ou seja, ainda que a partir de diferentes perspectivas
(econômica no governo Collor e FHC e mais social no governo Lula) o investimento em
formação continuada acresceu significativamente em nosso país nos últimos 22 anos,
mas ainda não atingimos um patamar decente na educação.
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Considerações
A partir dos apontamentos de Gorni (2001), Gatti (2009), Saviani (2005) há a
necessidade de ser pensado curso de formação continuada de professores que
contribuam para a profissionalização.
Apontamos para a permanência que os cursos de formação continuada de
professores tem nas políticas públicas, ainda que de diferentes concepções partidárias.
Sendo necessária a transformação nas políticas públicas de formação de
professores, com cursos que superem o aligeiramento, a fragmentação e disponibilize
tempo para estudo, fato que evidencia a possibilidade de alterar a cultura escolar tão
sólida.
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