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1.0 Introdução

Segundo decreto nº. 4072, de 03 de janeiro de 2002, aguardente de cana

apresenta as seguintes definições:

Aguardente de cana é a bebida com graduação alcoólica de 38 a 54º G.L., a 20º

C, obtida de destilado alcoólico simples de cana de açúcar ou pela destilação do

mosto fermentado de cana-de-açúcar, podendo ser adicionada de açúcares até 6

g/L.

Cachaça é a denominação típica e exclusiva da aguardente de cana produzida no

Brasil, com graduação alcoólica de 38 a 48º G.L., a 20º C e com características

sensoriais peculiares.

A cachaça poderá ter as seguintes denominações:

Cachaça Adoçada - pode conter açúcares em quantidade superior a 6,0 gL-1 e

inferior a 30 gL-1, expressos em sacarose. A sacarose (açúcar refinado ou cristal)

pode ser substituída total ou parcialmente por açúcar invertido, glicose ou seus

derivados reduzidos ou oxidados.

Cachaça Envelhecida - deve conter, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) de

cachaça ou aguardente de cana envelhecida em recipiente de madeira apropriado,

com capacidade máxima de 700 (setecentos) litros, por um período não inferior a

um ano.

Cachaça Premium - deve conter 100% (cem por cento) de cachaça ou aguardente

de cana envelhecida em recipiente de madeira apropriado, com capacidade

máxima de 700 (setecentos) litros, por um período não inferior a um ano.

Cachaça Extra Premium - deve conter 100% (cem por cento) de cachaça ou

aguardente de cana envelhecida em recipiente de madeira apropriado, com

capacidade máxima de 700 (setecentos) litros, por um período não inferior a três

anos.

Este trabalho tem o objetivo de demonstrar o cálculo de balanço de massa

para se produzir 50 L de cachaça em um alambique caseiro.

2.0 Descrição dos processos de produção

Na Figura 1 é apresentado um fluxograma ilustrativo do processo de

elaboração da aguardente de cana. Nos itens seguintes é realizado a descrição de cada

etapa do processamento.

FIGURA.1: Fluxograma de Produção do aguardente de Cana.

Fonte: Brasil (2005).

A produção de cachaça envolve várias etapas, iniciando com a cana e

finalizando com a comercialização do produto. Deve-se examinar todo o processo,

apontando os principais aspectos a serem observados, a fim de obter em cada uma delas,

os melhores resultados, objetivando inserir no mercado um produto final de qualidade

comprovada.

A cana-de-açúcar, depois de colhida e transportada para a indústria, é moída

e o bagaço é separado. O caldo é peneirado, decantado para separação do bagacilho e

diluído para ajuste do Brix (utilizado para medir aproximadamente os açúcares em sucos

de fruta, vinhos e na indústria de açúcar). O caldo de cana-de-açúcar pronto para

fermentar é denominado mosto que é colocado para fermentar na presença do fermento,

denominado “pé-de-cuba”. Depois de terminada a fermentação, este composto é chamado

de vinho. Este, depois de decantado, é destilado.

Durante a destilação, são separadas as frações “cabeça”, “coração” e “cauda”.

A fração “coração”, denominada de cachaça, pode ser armazenada ou envelhecida e,

posteriormente, engarrafada e comercializada.

2.1 Moagem

Após realizado o corte da cana de açúcar é preparada em tamanhos que

possam ser manuseadas, ela é passada em uma moenda para que seja extraído o caldo

existente nos gomos. Sendo o principal objetivo desta etapa a recuperação do açúcar que

esta dissolvido no caldo. Um desenho esquemático deste maquinário é mostrado na

Figura 2.

Figura 2: Componentes básicos de uma moenda.

Fonte: adaptado de Oliveira et al., (1978).

O preparo da cana consiste em picar e/ou desfibra-la, com a finalidade de

destruir a resistência das partes duras dos colmos, aumentando a capacidade de trabalho

da moenda e a extração. No entanto é indispensável que os colmos sejam preparados

imediatamente antes da moagem, para evitar a proliferação de bactérias.

Após a primeira passagem da cana na moenda, o caldo é separado é o bagaço

então descartado irá conter em torno de 35% a 40% do produto moído. O caldo que sai

da moenda ainda não está adequado para a produção de cachaça. Ele deve ser filtrado e

decantado para separação de impurezas, antes de entrar nas dornas de fermentação.

2.2 Filtração e Decantação

A filtração consiste em passar o caldo extraído em uma peneira de malha fina

que tem a finalidade de reter impurezas maiores, como resíduos de bagaço e folhas,

provenientes da matéria-prima. Recomenda-se o uso de tela de aço inoxidável com malha

de 1,0 mm de abertura.

Após essa filtração, o caldo atravessa o decantador mostrado na Figura 3,

onde as partículas sólidas remanescentes no caldo filtrado e mais densas que ele (resíduos

de terra), se deslocam para o fundo do recipiente e o bagacilho, menos denso que o caldo,

fica retido nas aletas suspensas do decantador.

Figura 3: Esquema de um decantador (vista lateral).

Fonte: Adaptado de Maia e Campelo (2005).

O sistema de filtração deve permitir que o caldo chegue o mais puro e limpo

possível as dornas de fermentação. Bagacilhos, bagaço e folhas, quando secos nas bordas

das dornas, podem provocar contaminação bacteriana (mucilagem).

2.3 Diluição do Caldo

Quando a cana é colhida no ponto ideal de maturação, o caldo possui um

percentual de sólidos solúveis (ºBrix) entre 20º a 24º, o qual segundo autores pesquisados

deve ser diluído para 16º a 18º para a fermentação.

A água não deve ser adicionada diretamente na dorna de fermentação pois

esta prática implica em riscos de choque osmótico sobre as células (leveduras que

compõesm o fermento) com prejuizos para a produtividade e o rendimento da

fermentação.

Um caldo com elevada concentração de açúcares pode levar a um elevado

teor alcoólico, o qual é prejudicial à atividade fermantativa das leveduras, além de

acarretar fermentações lentas e incompletas, ocasionando redução no rendimento.

Por outro lado, um Brix menor que 16º, proporciona uma fermentação muito

rápida, podendo o “vinho” ficar muito tempo parado na dorna, o que provocará um

produção muito maior de alcoóis superiores e facilitara as infecções por bactérias.

O cálculo da quantidade de água a ser adicionada no caldo de cana para ajuste

do Brix pode ser feito utilizando o diagrama conhecido como Cruz de Cobense (ou regras

de misturas). Um exemplo da utilização do diagrama é evidenciado na figura 4.

Figura 4: Cálculo da redução do caldo de 20º para 18º Brix.

2.4 Fermento

O fermento é composto por fungos microscópicos vivos. Esses fungos são

pertencentes à classe dos Ascomicetos, sendo a espécie mais importante

a Saccharomyces cerevisiae.

O fermento é preparado a partir das leveduras que acompanham a cana,

mosto ou o ar, sendo variável entre os produtores, que geralmente utilizam receitas

regionais. Normalmente, estas receitas são preparadas a base de uma massa inicial

constituída de caldo de cana-de-açúcar não diluído, farelo de arroz, fubá ou farelo de soja,

com adição de suco de limão ou laranja azeda para abaixar o pH.

Independente do fermento utilizado e da forma de preparo, o pé-de-cuba deve

ser preparado com cuidados especiais, de modo que o fermento se desenvolva nas

condições mais favoráveis possíveis para que mais tarde, ao ser misturado ao mosto

normal e em quantidade suficiente, domine completamente o meio, produzindo sempre

fermentações homogêneas e um vinho com características desejáveis.

2.5 Fermentação

Por definição, a fermentação é um processo de oxidação parcial da glicose na

ausência de oxigênio (processo anaeróbico).

É o ponto crítico do processo de fabricação da cachaça e depende da

maturidade certa da cana, da padronização do o Brix do caldo antes de entrar na dorna, a

sanidade da cana e da composição química do caldo.

O álcool etílico ou etanol é o principal produto da fermentação. Também,

ocorre grande formação de gás carbônico, que é liberado para o ambiente. É comum a

formação de espuma, principalmente nos estágios iniciais da fermentação, dada a

interação do gás formado com lipídeos (principalmente fosfolipídeos) e macromoléculas

(especialmente proteínas) do mosto.

A fermentação tem início quando o fermento contido no fundo da dorna, o

“pé-de-cuba”, começa a ser alimentado pelo caldo de cana. Dentro da fábrica o ciclo

completo compreende várias etapas, e deve ser ajustado para que se complete no intervalo

de 24 horas, facilitando a manutenção de uma rotina operacional preestabelecida.

Para produção de cachaça, o ideal é que essa transferência seja feita

lentamente, entre 6 a 8 horas. Trata-se do sistema de fermentação em “batelada-

alimentada” (sistema semicontínuo), muito mais eficiente que a “batelada-simples”

(sistema descontínuo), no qual todo o caldo é transferido rapidamente para a dorna,

prejudicando o fermento.

O ciclo fermentativo se completa, quando o fermento que está suspenso,

flutuando no líquido, tende a decantar. Esse processo de decantação do fermento é

necessário para evitar a presença de fermento dentro do destilador, o que afeta a qualidade

da cachaça. A destilação do vinho deve ser realizada tão logo termine a fermentação e a

levedura sedimente.

2.6 Destilação

A destilação, processo físico para separações químicas, consiste em aquecer

um líquido até sua passagem para o estado gasoso, que em seguida retorna ao estado

líquido por meio de resfriamento, objetivando especialmente a purificação ou formação

de novos produtos por decomposições de frações.

É a etapa responsável por separar todas as substâncias de interesse formadas

pela fermentação. Por este motivo é considerada de extrema importância para obtenção

de uma cachaça de qualidade.

Concluída a fermentação do mosto, obtém-se o vinho que apresenta na sua

composição uma mistura de componentes sólidos, líquidos e gasosos, em virtude das

transformações que se desenvolveram durante a fermentação. O vinho adequadamente

decantado, contendo 89% a 94% de água, 7% a 12% de etanol e 2% a 4% outras

substâncias voláteis (principalmente aldeídos, ésteres, ácidos orgânicos e álcoois

superiores) é submetido ao processo de separação dos constituintes, através das diferenças

dos pontos de ebulição, denominado destilação.

Ao destilar o vinho da cana, obtém-se um novo líquido, com teor alcoólico

cinco a seis vezes maiores que o teor do líquido gerador.

2.6.1 Frações do Destilado

Durante a destilação o vinho é separado em 3 frações: “cabeça”, “coração” e

“cauda”. A separação dessas frações durante o processo de destilação é de fundamental

importância na produção de cachaça. A fração “cabeça” é recolhida nos primeiros

minutos da destilação.

O destilado de “cabeça” corresponde aos primeiros vapores condensados e

contém altas concentrações de álcool (geralmente acima de 60% v/v). O volume dessa

fração corresponde ao recolhimento de 1,0% a 2,0% do volume total de vinho.

O “coração” é a cachaça propriamente dita e deve ser recolhido por um tempo

aproximado de 2 horas. Inicia-se seu recolhimento, após a separação do destilado de

cabeça. A fração “coração” representa um volume correspondente a até 16% do volume

total do vinho (dependendo do teor alcoólico que se deseja para o produto e da

concentração de álcool do vinho) ou aproximadamente 80% do total do destilado.

A fração “cauda”, também chamada de “água fraca”, corresponde

aproximadamente a 3,0% do volume total do vinho. O ponto final da destilação ocorre

quando o teor alcoólico do destilado atinge o limite de 14% (v/v), correspondente a 15%

do volume total do destilado.

3.0 Cálculo Balanço de Massa

O cálculo foi desenvolvido para a produção de 50 litros de cachaça de forma

artesanal.

No processo de moagem os cálculos foram baseados em artigos; que

consideram que em 1 t (tonelada) de cana consegue 600 l (litros) de caldo.

Para o desenvolvimento do trabalho, foi desenhado e montado um diagrama

de blocos, demonstrado na Figura 5.

Figura 5: Fluxograma Processo de Cachaça Artesanal.

Fonte: Adaptado pelos autores.

Após definição do fluxo de produção da cachaça foi iniciado os cálculos para

balanço de massa nos processos; considerando a entrada da cana com “F” e os processos

como “Ps” e as saídas / descartes como “Ds”. Os cálculos foram iniciados para encontrar

o volume produzido no processo de destilação para produção de 50 L. da cachaça

(coração). Os rendimentos de cada produto (coração – Cabeça – Cauda) foram

respectivamente (16% - 2% - 3%). utilizou-se:

P6 = P5 x 0,16

Sendo: P6 = Quantidade de cachaça produzida;

P5 = Quantidade de produto proveniente do processo de Destilação;

0,16 = Porcentagem de cachaça contida no produto destilado.

50 = P5 x 0,16 P5 = 50 / 0,16 P5 = 312,5 L.

Sabendo então a quantidade proveniente do processo de destilação para a

produção de cachaça; calculou-se então os descartes D4 (cabeça); D5 (cauda) e D3

(vinhaça):

D4= 0,02 x 312,5 D4= 6,25 L

D5 = 0,03 x 312,5 D5 = 9,37 L

Produto da Saída do Destilado (Sd) para produção cachaça:

Sd = P6 + D4 + D5 Sd = 50 + 6,25 + 9,37

Sd = 65,62 L.

Cálculo de D3 Vinhaça:

D3 = 312,5 – Sd D3 = 312,5 – 65,62 D3 = 246,88 L

A porcentagem relativa da Vinhaça será:

% Vinh = 100 – 21 % Vinh = 0,79.

Para calcular a quantidade de produto que entrou no processo de Fermentação

(P4); considerando que neste processo há uma eficiência de 96% tem-se:

P4 = P5 + D3

D3 = (312,5 x 0,04) / 96 D3 = 13 L

Então:

P4 = 312,5 + 13

P4 = 325,5 L

Para ser calculado a quantidade que entrou no processo de Fermentação foi

necessário definir o Brix de 16º ao final e também considerar que o mesmo entrou no

processo com 21º. Para reduzi-lo aos patamares desejados é preciso adicionar H2O. sendo

o cálculo efetivado através do diagrama de Cobenze.

Cálculo de Diluição

Brix 21º Brix 16º

Cálculo da quantidade de caldo:

* densidade do caldo = 1,092

Qcaldo = (16 – 0) / 1,092 Qcaldo = 14,65 L

Cálculo para a quantidade de água:

QÁgua = (21-16) / 1 QÁgua = 5 L

Através dos cálculos sabe-se que para cada 14,65 L de caldo são necessários

5 L de água. Para 242,68 L de caldo são necessários 82,82 L de água. Não entendi como

chegou neste cálculo. A partir daqui vou conversar com você amanhã.

Na Figura 6 é mostrado o fluxograma do processo de produção de cachaça

artesanal para produção dos 50 L; com os cálculos de balanço de massa já inseridos após

a realização dos cálculos pertinentes.

Figura 6: Fluxograma da produção com o balanço de massa

Fonte: Adaptado pelos autores.

4.0 Conclusão

O balanço de massa é fundamental para a análise de um novo processo, bem como

de um já existente. O conhecimento do fluxo de matéria (ou balanço de massa)

envolvido pode ser uma ferramenta utilizada para tomada de decisões no processo.

Do balanço de massa no nosso processo a razão caldo/bagaço é de 60/40, podemos

mecanizar o processo e possivelmente mudar essa razão, para obter mais caldo com

a mesma quantidade de cana.

5.0 Bibliografia

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