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Você não sabe
O quanto eu caminhei
Pra chegar até aqui... (GARRIDO; LAZÃO; DA GAMA; BINO. A Estrada. 2008.)
Sou Viviane da Rocha, filha de Maria do Carmo Rocha e de Idalino
Rodrigues da Rocha. Tenho uma irmã chamada Vivian e um irmão chamado
Ivan e moro na cidade de Cotia com os meus pais.
Nasci no dia 08 de fevereiro de 1982, façam as contas... Aquariana,
tímida, sensível e paciente. Disposta sempre a lutar por boas causas, sonhar e
ter sempre comigo meus amigos e minha família.
Hoje sou professora, um sonho que não veio da infância, mas que me
realiza hoje na vida adulta. Estudei em escola pública, iniciei na creche com 5
anos, mas não completei o Jardim I, chorava e me escondia debaixo da cama
para não ir para a “escolinha”. As poucas lembranças que tenho são da
professora com uma régua de madeira na mão andando entre as crianças,
deitadas em colchonetes no chão tendo que dormir, mesmo sem estar com
sono.
Aos 7 anos inicie a 1ª série na E.E. Fernando Nobre com a professora D.
Olivia, de quem tenho boas e más recordações. Tenho o privilégio de me
lembrar de como aprendi a ler: com um quadro que havia em minha casa e um
poema para as mães. Naquele momento, as palavras ganharam sentido em
minha vida. Sempre fui boa aluna, comportada, quietinha, estudiosa e muito
orgulhosa por nunca ter repetido nenhuma série, no tempo em que “repetir o
ano” existia. Os professores eram rígidos e muito exigentes, a disciplina era
mantida com advertências e a tão temida expulsão da escola. Todos temiam o
último banco do pátio, que ficava em frente à diretoria, e era destinado àqueles
que aguardavam os pais para uma conversa com a diretora.
Ao concluir a 8ª série mudei de escola, o que foi muito difícil para mim.
Depois de viver 8 anos no mesmo lugar, com os colegas, alguns que estudei
desde o primeiro ano, que cresceram comigo, chegara a hora de ir cada um
para um lado e eu não me adaptei.
Fui para outra escola estadual chamada “Vinícius de Moraes”. Nesta
escola, curiosamente, havia o curso Normal Superior. Lembro-me da minha
mãe insistindo muito para que eu fizesse o curso, pois assim já poderia ter uma
profissão e ser professora. Recusei imediatamente, não queria ser professora.
As alunas que freqüentavam o 4º ano (normal superior) eram ridicularizadas
pelos outros alunos da escola, alvos de risinhos no corredor e taxadas de
coitadinhas, porque estudavam para serem professoras. Ao ver aquilo
pensava: eu não quero isso para mim.
Nesta escola fiquei em uma sala separada de todos os meus colegas.
Foram três longos anos dos quais não tenho saudades. Quase não faltava as
aulas, procurava ter boas notas para poder, no final do ano, me livrar o quanto
antes da escola.
Os professores eram assustadores! Entravam na sala e começavam a
escrever na lousa ou mandavam copiar alguma página do livro, faziam a
chamada e a aula acabava, muitas vezes sem nem sequer uma explicação
sobre o que fora copiado no caderno.
Nas aulas de Língua Portuguesa fui “obrigada” a ler livros para o
vestibular, em matemática enfrentei as minhas maiores dificuldades: minhas
primeiras notas vermelhas, a trigonometria e o Profº Pasqualini. Um professor
que não permitia que colocássemos os cotovelos na mesa. Tínhamos que
sentar corretamente, era proibido o uso de caneta vermelha e eram humilhados
os alunos que não conseguiam nota em sua disciplina. As boas lembranças
eram apenas de matérias específicas ao curso: Psicologia, Filosofia e
Sociologia que realmente me agradava.
Ao terminar o ensino médio fui fazer cursinho, pensava em trabalhar
com turismo, relações internacionais, biologia, enfim não tinha a menor ideia do
que queria estudar.
Comecei a pesquisar, fazer testes vocacionais e todos eles indicavam a
área da educação ou assistência social. As ideias de mudar o mundo, de lutar
por algo melhor para todos, de fazer a diferença na vida de alguém, de ajudar,
sempre foram ideais que me atraiam, mas eu não sabia por onde começar.
Após pensar e ler muito a respeito optei pela pedagogia. Pensava em
trabalhar em ONGs, projetos sociais ou algo do tipo. A sala de aula ainda era
algo no qual não pensava.
Iniciei o curso de pedagogia nas Faculdades Oswaldo Cruz, localizada
Barra Funda, zona oeste de São Paulo. Lembro-me da minha formação muito
centrada nos conteúdos teóricos, com discursos técnicos e de pouca
experiência prática. Foram três anos de formação, com muita dificuldade para
pagar as mensalidades, livros e transporte. Meu pai me ajudou a arcar com os
custos da faculdade quando fiquei desempregada. Ele não gostou muito da
minha escolha, dizia que professor sofria muito, ganhava pouco e que eu podia
ter escolhido coisa melhor, mas respeitou a minha opção. Fui a primeira
pessoa na família a conseguir uma formação em nível superior.
Acabei realizando um dos meus estágios na mesma escola onde estudei
no ensino médio, agora me via no lugar daquelas alunas que faziam o curso
normal superior. Mas não me importava mais! Sentia que havia feito a escolha
certa, estava decidida e feliz!
Percurso profissional
Conclui minha graduação no ano de 2003. Ainda não havia trabalhado
em nenhuma escola ou diretamente com educação. Depois de concluir a
faculdade comecei a procurar emprego em escolas particulares. Tive a minha
primeira experiência em uma escola de educação infantil. Era a professora, a
coordenadora, responsável pelo pagamento dos funcionários, fazia de tudo.
Tive nesta escola minhas primeiras experiências com a alfabetização.
Iniciei com uma turma de seis alunos, no que hoje seria o 1º ano do ensino
fundamental. Todas as crianças foram alfabetizadas, aprenderam a ler e
produzir pequenos textos. A minha prática docente começou ali!
Saí desta escola e não consegui encontrar outra colocação na área da
educação. Fiquei um ano e meio procurando emprego e dando aulas
particulares em casa. Consegui voltar a trabalhar, mas em outra área como
atendente de um serviço de entrega de medicamentos. Permaneci lá por um
ano e oito meses até conseguir ingressar no serviço público municipal de Cotia.
No final do ano de 2005 foi realizado um concurso público para o cargo
de professor titular no município de Cotia, era a minha oportunidade! Realizei
as provas e em 2006 iniciei o meu trabalho como professora no município.
Estava muito feliz e ansiosa com o que me esperava. Pedi demissão do
meu serviço e mais uma vez fui recriminada. As pessoas diziam: você vai fazer
isso mesmo? Tem certeza que quer ser professora? Não é melhor você pensar
mais sobre isso? As pessoas simplesmente não compreendiam o porquê da
minha escolha. Eu havia estudado para aquilo, com certeza era o que queria.
Iniciei meu trabalho no dia 5 de fevereiro de 2006, com uma turma de
Jardim II, em uma sala com 35 alunos na E.M. Isabel Ribeiro Leal Leite,
localizada na periferia de Cotia, em um lugar que eu só conheceria realmente
com o tempo.
A escola era totalmente nova, tinha acabado de ser inaugurada. O
primeiro dia foi assustador! Uma confusão: criança chorando, as mães
querendo saber quem eram as professoras de seus filhos. Era tanta confusão
que eu nem sabia para onde ir. Consegui chegar até a minha sala de aula, as
crianças se sentaram e eu me apresentei: - Boa tarde a todos, eu sou a
professora Viviane.
Foi nesta escola que encontrei minhas principais parceiras,
companheiras de trabalho e amigas: Angela, Lisliê e posteriormente Nildes. Eu,
Angela e Lisliê éramos novas na rede municipal e não tenho dúvidas em
afirmar que sem elas minha trajetória seria muito mais difícil. Tornamos-nos
amigas e companheiras na busca de um trabalho de qualidade, no qual
realmente acreditamos.
Foi um começo difícil! A falta de experiência, a falta de confiança no seu
trabalho, as dúvidas que aumentavam cada vez mais. A experiência de
vivenciar uma gestão autoritária, sem objetivos definidos e sem uma atuação
adequada, foram desafios que muitas vezes me fizeram pensar em desistir.
Mas ao pensar no motivo de estar ali, naquela comunidade que mesmo
com todas as dificuldades havia lutado para ter aquela escola no bairro para os
seus filhos; a valorização do nosso trabalho, por grande parte dos pais e
principalmente pelas crianças, que tinham na escola o seu único lugar para
aprender, se alimentar e se divertir; fizeram-me na verdade buscar novos
conhecimentos e aperfeiçoamento para o meu trabalho.
Em 2008 iniciei minha pós – graduação em Psicopedagogia Institucional,
na UNIFIEO em Osasco. As inquietações, diante das inúmeras dificuldades de
aprendizagens dos alunos, fizeram com que fosse necessária essa formação,
para poder de alguma forma, compreender o processo aprendizagem dos
alunos.
Foi nesta escola também que iniciei um dos meus maiores prazeres hoje
como professora: as práticas de incentivo a leitura com o projeto de rodas de
leituras. Em 2008 fomos convidadas a participar do Projeto Ecofuturo: Brincar
de ler. Neste projeto vivenciamos uma oficina com professores e outros
profissionais para a realização de rodas de leituras em diferentes locais, em
todo o Brasil para a institucionalização do dia 12 de outubro como o Dia da
Leitura, fato que foi efetivado em 2009 de acordo com a lei n.º 11.899.
As práticas de leituras tornaram-se um marco transformador em minha
atuação como professora, tanto que passou a ser para mim objeto de
investigação e pesquisa.
Em 2010 mais uma nova oportunidade surge em meu caminho. Após
novo concurso público, ingresso como professora adjunta, também no
município de Cotia, passando a trabalhar em dois períodos. Além disso, surge
a possibilidade de realização do curso de Pós-Graduação em Supervisão
Pedagógica e Formação de Formadores com acesso ao Mestrado Europeu em
Ciências da Educação, no qual me encontro atualmente.
O acesso ao mestrado foi uma oportunidade, daquelas que não se pode
deixar passar. O início não foi fácil, não que tenha melhorado com o tempo,
acho que cada vez se torna mais desafiador e também arriscado.
Dentro dos vários módulos apresentados até aqui o de Modelos e
Práticas de Formação de Professores vem apresentando aspectos que
explicitam a formação docente no Brasil e em Portugal, levantando os seus
pontos históricos e os paradigmas que estão emergindo na formação de
professores.
A formação inicial e continuada dos professores em busca de uma
formação reflexiva, baseada na proposta de Schön (1983), passa a apontar na
formação do futuro profissional a necessidade de incluir a reflexão a partir de
situações práticas reais, ou seja, da sua realidade, tornando-se um novo
desafio, tanto para a formação de docentes, quanto para a nossa prática no
processo educativo.
Se buscarmos na Lei de Diretrizes e Base da Educação, Lei Nº 9.394/96
veremos que segundo o Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:
I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento
de ensino;
II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica
do estabelecimento de ensino;
III - zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV - estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor
rendimento;
V - ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de
participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação
e ao desenvolvimento profissional;
VI - colaborar com as atividades de articulação da escola com as
famílias e a comunidade.
Se analisarmos somente a LDB e as atribuições ali delimitadas para o
trabalho dos professores, ficaríamos restritos as questões técnicas e
normalistas, muito aquém das atribuições reais que o professor tem hoje em
dia. Hoje a ação do professor é revestida de uma grande complexidade, com a
presença na escola de crianças de todas as origens culturais, classes sociais e
as mais variadas tecnologias de informação e comunicação.
Desta forma as atuais reflexões em torno da formação de professores,
passam por um momento em que a teoria aprendida nos cursos precisa ser
relacionada com as práticas docentes. Tanto na formação inicial, como na
formação continuada, vê-se a necessidade de uma maior aproximação entre os
conhecimentos teóricos e a vivência desses conhecimentos em sala de aula,
na atuação efetiva do professor.
Ao se falar de professor reflexivo nos deparamos com uma formação
universitária que não oferece esta formação aos seus alunos, segundo Nóvoa
(1999, p.6):
“É verdade que existe, no espaço universitário, uma retórica de
“inovação”, de “mudança”, de “professor reflexivo, de
“investigação-acção”, etc.; mas a Universidade é uma instituição
conservadora, e acaba sempre por reproduzir dicotomias como
teoria/prática, conhecimento/acção, etc. A ligação da
Universidade ao terreno (curiosa metáfora!) leva a que os
investigadores fiquem a saber o que os professores sabem, e
não conduz a que os professores fiquem a saber melhor aquilo
que já sabem”.
Os estudos e as reflexões acerca do que os professores já realizam na
escola não são poucos utilizados como conhecimento capaz de propor práticas
pedagógicas novas e a ação que deveria ser reflexiva fica somente restrita a
uma atuação cada vez mais fechada em um sistema curricular rígido, com
materiais didáticos que engessam sua prática, pois vem com todo o
direcionamento das aulas, como se fosse um manual de instrução a ser
seguido. O professor é um mero executor das ações ali propostas, pouco
importando neste trabalho a sua visão ou o que gostaria realmente de
contemplar em suas aulas com seus alunos.
O espaço para a realização de debates, de análises, de troca e de
colaboração entre os professores fica restrito a funções de preenchimento de
fichas, planilhas e relatórios, muitas vezes sem função nenhuma, só para
contar como mais um documento em meio a montanhas de papeladas. O
trabalho coletivo é pouco valorizado e estimulado.
Além de um maior investimento na formação de docentes, buscando
contemplar os aspectos aqui já mencionados, o trabalho da equipe pedagógica
também precisa ganhar mais importância dentro das escolas, como um espaço
de diálogo, cooperação, de troca, aprendizagens, de produção e aquisição de
conhecimentos constituindo uma mudança necessária para a profissão
docente.
Para muitos de nós professores as ideias aqui apresentadas ainda estão
em um campo de proposições, ideais e reflexões, que sem dúvida, são
importantíssimas para o seu trabalho e atuação. As aprendizagens e
conhecimentos aqui estudados já me fazem, e com certeza farão muito mais,
repensar minha prática, minha formação e o que posso melhorar e modificar
em minha profissão.
Ao recordar aqui os caminhos de minha jornada, desde o meu percurso
na escola, na faculdade e em minha prática profissional vejo que as dúvidas e
incertezas sempre estiveram presentes e assim continuará sendo. E que bom
que seja assim!
As reformulações visando um melhor trabalho docente e
consequentemente uma qualidade do ensino e da escola passam
necessariamente pelas questões relacionadas a formação dos professores e as
reflexões sobre a sua própria profissão, encontrando modelos que permitam
uma melhor organização e aperfeiçoamento da sua prática.
A realidade vivida nas escolas e os conhecimentos ali apresentados são
fontes das mais importantes aprendizagens e conhecimentos e precisam
passar a ser também fonte de pesquisa, estudo e formação do professor.
De tudo, ficaram três coisas: a certeza de que ele estava sempre
começando, a certeza de que era preciso continuar e a certeza de que seria
interrompido antes de terminar. Fazer da interrupção um caminho novo. Fazer
da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sono uma ponte, da
procura um encontro. (SABINO, 1999, p.145)
REFERÊNCIAS
GARCIA, MARCELO C. FORMAÇÃO DE PROFESSORES – PARA UMA
MUDANÇA EDUCATIVA. PORTUGAL:PORTO, 1999.
NÓVOA, A. OS PROFESORES NA VIRADA DO MILÊNIO: DO EXCESSO
DOS DISCURSOS À POBREZA DAS PRÁTICAS. CUADERNOS DE
PEDAGOGÍA, BARCELONA, N. 286, P. 102-108. 1999.
ZEICHNER, K. A FORMAÇÃO REFLEXIVA DE PROFESSORES: IDÉIAS E
PRÁTICAS. LISBOA:EDUCA, 1993.
ZEICHNER, K. FORMAÇÃO DE PROFESSORES: CONTATO DIRETO COM
A REALIDADE DA ESCOLA. ENTREVISTA: REVISTA PRESENÇA
PEDAGÓGICA, V. 6, N. 34, P. 5-15, JUL.,AGO., 2000.