http://dx.doi.org/10.35265/2236-6717-204-9094
FORTALEZA-CE. EDIÇÃO 204. V.9. ANO 2021.
LOGÍSTICA PORTUÁRIA: GESTÃO DOS PORTOS BRASILEIROS E A
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Gabriel Lopes da Silva1
RESUMO
Segundo dados da Marinha do Brasil, pelas rotas marítimas é escoado mais de 95% do comércio exterior
brasileiro. Dessa forma, com a intensificação da atividade de navegação e do comércio marítimo ao
longo dos anos, surgiu-se a necessidade de melhor definir os processos logísticos nos portos brasileiros
de modo a reduzir a burocracia e, consequentemente, aumentar a eficiência da operação portuária.
Embora alguns programas tenham sido criados de modo a adequar os portos brasileiros à expectativa de
crescimento contínuo das exportações e de movimentação das cargas, ainda há um longo caminho a ser
trilhado. Este artigo visa justamente destrinchar esse caminho; analisar a logística do país no que tange
à matriz de transportes; analisar a importância da tecnologia para a gestão dos portos brasileiros e,
resumidamente, analisar a importância da Marinha do Brasil nos aspectos fundamentais à eficiência
portuária, tais como: despacho de embarcações, inspeção naval e na definição de requisitos técnicos
necessários ao estabelecimento de sistemas para determinação da folga dinâmica abaixo da quilha em
portos nacionais.
Palavras-chave: Logística. Portos. Eficiência. Marinha.
PORT LOGISTICS: MANAGEMENT OF BRAZILIAN PORTS AND THE
IMPORTANCE OF BRAZILIAN NAVY
ABSTRACT
According to data from the Brazilian Navy, over 95% of Brazilian foreign trade is transported by sea
routes. Thus, with the intensification of shipping and maritime trade over the years, there was a need to
better define the logistics processes in Brazilian ports in order to reduce bureaucracy and, consequently,
increase the efficiency of port operations. Although some programs were created in order to adapt
Brazilian ports to the expectation of continued growth in exports and cargo movement, there is still a
long way to go. This article aims precisely to untangle that path; analyze the country's logistics with
respect to the transport matrix; to analyze the importance of technology for the management of Brazilian
ports and, briefly, to analyze the importance of the Brazilian Navy in fundamental aspects of port
efficiency, such as: ship dispatch, naval inspection and in the definition of technical requirements
necessary for the establishment of systems for determination of the dynamic clearance below the keel
in national ports.
Keywords: Logistics. Ports. Efficiency. Navy.
1 Primeiro-Tenente da Marinha do Brasil, Graduado em Ciências Náuticas pela Escola de Formação de
Oficiais da Marinha Mercante. Pós-graduado em Shipping e Modernização, Infraestrutura e Gestão Portuária
pela Faculdade UNIBF. E-mail: [email protected]
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INTRODUÇÃO
De acordo com o Estatístico Aquaviário disponibilizado no sítio eletrônico da Agência
Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), foram movimentadas, em portos brasileiros
entre os meses de janeiro e setembro de 2020, 849.547.334 toneladas de carga, resultado este
que representa um acréscimo de 3,74% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Outrossim, utilizando-se como referência o mesmo período, o Estatístico
supramencionado demonstra também a movimentação de 599 milhões de toneladas nas
embarcações empregadas na navegação de longo curso e de 141 milhões de toneladas nas
embarcações empregadas na navegação de cabotagem, resultados que representam, ao mesmo
período do ano anterior, acréscimos de 1,73% e 12,06% respectivamente.
Tendo em vista a guerra epidemiológica decorrente da pandemia de COVID-19
que, de um modo geral, derrubou a economia de vários países ao redor do mundo, tais resultados
surpreendem e, precipuamente, ratificam a importância do transporte marítimo na economia do
Brasil.
Em 2018, por exemplo, último ano de "normalidade" levando-se em conta a
propagação a nível global do COVID-19, a navegação de longo curso movimentou no Brasil
823,98 milhões de toneladas, a navegação de cabotagem 230,74 milhões de toneladas e a
navegação interior 60,32 milhões de toneladas. Além de gerar milhares de empregos diretos e
indiretos, tais números demonstram que o porto movimenta, em média, 293 bilhões anualmente,
o que representa 14,2 % do PIB brasileiro. Não obstante, dos U$ 47,5 bilhões que o Brasil
exporta para China - um dos principais parceiros comerciais do país - 98,2% são transportados
por via marítima.
Os números retrocitados aliados à localização geográfica do país deixam
evidente a importância dos portos para a economia do Brasil. No entanto, o baixo investimento
em infraestrutura portuária, o transporte rodoviário deficiente e pouco movimentado, a
infraestrutura deficiente para cabotagem e, principalmente, a burocracia nos portos brasileiros,
mostram que esses números poderiam ser ainda mais significativos.
Segundo projeção do Plano Nacional de Logística Portuária (PNLP), até o ano
de 2042 a demanda para os portos brasileiros tende a crescer 92%, contudo, para que esta
demanda seja atendida de maneira eficiente e ordenada, é necessário analisar os pormenores da
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gestão dos portos brasileiros e todos os fatores externos que contribuem para sua eficiência.
O primeiro capítulo expõe justamente esses pormenores; define conceitos
importantes, tais como: tipos de navegação, porto e logística portuária; apresenta, de modo
conciso, os principais portos do país; revela a distorção na matriz de transportes brasileira; traz
análises comparativas entre portos nacionais e estrangeiros; expõe a burocracia excessiva nos
portos e o consequente aumento dos custos decorrentes; e apresenta alguns pontos que estão
sendo aprimorados visando, fundamentalmente, aperfeiçoar os processos logísticos e os
modelos de gestão portuária.
Além disso, é externado também a importância da tecnologia como forma de
aumentar a eficiência das operações portuárias, especialmente por meio do programa Porto Sem
Papel (PSP), cuja criação permitiu facilitar a liberação de cargas nos portos nacionais.
Por fim, o segundo capítulo é destinado a demonstrar a importância da Marinha do
Brasil nos aspectos que afetam diretamente a logística portuária, como a realização da inspeção
naval, despacho de embarcações e, com uma atenção especial, aos aspectos técnicos necessários
à determinação da folga dinâmica abaixo da quilha em portos nacionais.
1. GESTÃO DOS PORTOS BRASILEIROS
1.1. Conceitos básicos
Para melhor entendimento deste capítulo, bem como do capítulo subsequente, é
necessário definir, conforme previsto na Lei 9.432, de 8 de janeiro de 1997, que dispõe sobre a
ordenação do transporte aquaviário, os seguintes conceitos:
1)Navegação de Longo Curso – a realizada entre portos brasileiros e estrangeiros;
2)Navegação de Cabotagem – a realizada entre portos ou pontos do território brasileiro,
utilizando a via marítima ou esta e as vias navegáveis interiores;
3)Navegação de Apoio Marítimo – a realizada para o apoio logístico a embarcações e
instalações em águas territoriais nacionais e na Zona Econômica, que atuem nas atividades de
pesquisa e lavra de minerais e hidrocarbonetos; e
4)Navegação Interior - a realizada em hidrovias interiores, em percurso nacional ou
internacional.
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1.2. O Porto
De acordo com GILBERTONI, 2000, p.311, o porto é o termômetro que mede a
economia do país. Especialmente no caso Brasil, tal definição é facilmente comprovada por
meio dos bilhões transportados em decorrência do transporte marítimo.
Não obstante, de acordo com Collyer apud Sousa Jr., pode-se definir o porto
como entreposto dinâmico de mercadorias, em que se realizam atividades (aduaneiras,
alfandegárias, comerciais, sanitárias, tributárias, imigratórias e etc.). É a porta de entrada e
saída de mercadorias e passageiros, servindo de abrigo e ancoradouro das embarcações, além
de estar munido de instalações necessárias para o embarque e o desembarque de cargas e
passageiros e, sobretudo, o mais importante elo cadeia logística que supre a humanidade.
O Brasil possui, sejam públicas ou privadas, um total de 175 instalações portuárias
de carga, incluindo portos, terminais marítimos e instalações aquaviárias. A figura 1 discrimina
os tipos de instalação portuária, bem como a movimentação, em toneladas, entre os meses de
janeiro e setembro de 2020 dos 10 principais portos brasileiros.
Figura 1: Portos brasileiros
Fonte: ANTAQ (2020)
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1.3. Logística portuária
Com a intensificação da atividade marítima ao longo dos anos, bem como de
modo a atender à expectativa de crescimento das importações e exportações, surgiu-se a
necessidade de melhor definir os processos logísticos visando, precipuamente, aumentar a
eficiência portuária.
De um modo geral, a estrutura da logística portuária pode ser subdividida em três:
Complexo fixo, Administração e Operação.
1- Complexo fixo: compreende todas as estruturas para o funcionamento da logística
portuária. Inclui instalações como terminais portuários, cais, armazéns e todo maquinário
envolvido.
2- Administração: refere-se aos órgãos encarregados da gestão dos portos. Em conjunto,
eles gerem desde o que diz respeito ao operador portuário até a modernização dos sistemas
presentes no porto.
3 – Operação: Compreende por exemplo os rebocadores e os operadores portuários,
sendo portanto, onde é realizada a logística previamente programada.
Desse modo, compreendida a estrutura do sistema logístico portuário é fácil observar a
relação entre as partes e, principalmente, observar que a eficiência portuária está intimamente
relacionada com o desempenho satisfatório, concomitante e ordenado de todos eles.
1.4. Eficiência portuária
Em uma definição mais simples, a logística portuária encarrega-se de transportar
a maior quantidade de carga, no menor espaço temporal e custo possível. No entanto, para
verificação da eficiência do referido processo é fundamental realizar análises comparativas por
meio de índices de desempenho amplamente conhecidos.
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Em 2018, por exemplo, levando-se em conta o Índice de Desempenho Logístico
(LPI) calculado pelo Banco Mundial, o Brasil ocupava o 56º lugar no ranking global do LPI,
com uma nota geral de 2,99 e nota de 2,93 em infraestrutura, deixando-o distante de outros
países conforme figura abaixo.
Figura 2: Comparativo LPI
Fonte: Banco Mundial
Além disso, tendo-se como base a extensa costa de 8,5 mil quilômetros
navegáveis segundo a ANTAQ e, principalmente, o lugar que o Brasil ocupa no cenário
econômico mundial, é fácil observar, por exemplo, que a movimentação de apenas 1,3 % do
tráfego mundial de contêineres (19º maior do mundo) fica muito aquém de nossa capacidade.
Não obstante, quando comparado o volume de movimentação de contêineres pela quantidade
de habitantes, tal resultado fica ainda mais divergente, conforme figura abaixo.
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Figura 3: Movimentação de Contêineres
Fonte: Banco Mundial
Tais resultados evidenciam os gargalos de ordem logística encontrados no país,
em especial no que tange à distorção da matriz de transportes brasileira, infraestrutura portuária
defasada, transporte rodoviário deficiente e pouco movimentado, infraestrutura deficiente para
cabotagem, além de outros problemas detalhados a seguir.
1.5. Principais problemas logísticos enfrentados pelo Brasil
De acordo com um estudo desenvolvido pela Superintendência de Desempenho,
Desenvolvimento e Sustentabilidade (SDS) da Agência Nacional de Transportes Aquaviários
(ANTAQ), a participação do modo aquaviário na matriz de transportes brasileira no ano de
2018 foi de apenas 11%. Tal estudo foi realizado nos corredores hidroviários dos rios Solimões-
Amazonas, Madeira, Tocantins-Araguaia, Paraguai, Paraná-Tietê, São Francisco e Hidrovia do
Sul, e nas principais rotas ao longo da costa, individualizada pelos principais principais pares
de origem e destino da navegação interior de percurso longitudinal e de cabotagem.
Por outro lado, excluindo-se grãos e minério, a participação do transporte
rodoviário na movimentação de cargas pode chegar a 82%. Em 2019, no entanto, um
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levantamento feito pela Confederação Nacional de Transporte (CNT), em parceria com o
Serviço Social do Transporte (Sest) e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte
(Senat) avaliou que a qualidade das rodovias brasileiras piorou em relação ao ano anterior e,
tão importante quanto, indicou que a situação da malha rodoviária continua a se deteriorar. Tal
quadro mostra-se extremamente preocupante uma vez que tal modal é o mais importante da
matriz de transporte brasileira.
Os dados da pesquisa retrocitada, especialmente por se tratar de nosso modal
mais importante, além de evidenciarem os óbvios riscos enfrentados pelos usuários, elevam,
em média, em 28,5% o custo operacional do transporte. Tal aumento estima-se que pode chegar
a 91,5% no caso de rodovias em péssimo estado de conservação.
Tal desproporção entre modais, herança do baixo investimento na infraestrutura
do país nas últimas décadas, evidencia a distorção da matriz de transportes brasileira que, sem
dúvidas, é o principal problema logístico enfrentado pelo país. Não obstante, este desequilíbrio
é agravado pelo baixo estoque da indústria do varejo, elevando, consequentemente, o risco de
desabastecimento em caso de greves prolongadas dos caminhoneiros.
Para corrigir esse desbalanço, o Governo pretende aumentar a oferta da
Cabotagem no Brasil por meio do Projeto de Lei 4.199/2020, criando novas rotas, incentivando
a concorrência e reduzindo custos. Tal projeto, apelidado de “BR do mar” em alusão a uma
rodovia marítima, foi aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 08 de Dezembro de 2020 e
segue para aprovação do Senado Federal. No projeto encaminhado, os Ministros Tarcísio
Gomes de Freitas (Infraestrutura), Paulo Guedes (Economia) e Jorge Oliveira (Secretaria Geral)
declaram sua importância para reduzir o custo logístico e estimular o desenvolvimento da
indústria naval nacional.
Outrossim, no projeto encaminhado ao congresso é explicitado a importância da
navegação de cabotagem para redução dos custos e, principalmente, para o equilíbrio da matriz
de transportes brasileira. Segundo os Ministros supramencionados “ O transporte marítimo é
comparativamente mais eficiente e de menor custo que o modal rodoviário ou ferroviário, pois
possui como característica natural a desnecessidade de aportes de recursos públicos para
viabilização da via, além de proporcionar maior segurança para o usuário do serviço, para a
carga transportada e menor impacto ambiental.”
Não obstante, outro problema logístico enfrentado pelo país é a burocracia
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excessiva e complexa existente nas operações portuárias que, obviamente, contrasta com a
importância econômica do respectivo setor. Segundo estudo realizado em 2016 pela
Confederação Nacional da indústria (CNI), os custos com a burocracia nas operações portuárias
totalizam entre R$ 2,9 bilhões e R$ 4,3 bilhões por ano. Tais cifras referem-se ao valor agregado
única e exclusivamente pelo mau funcionamento do setor.
De acordo com a CNI, os principais motivos para lentidão das operações
portuárias e o consequente aumento dos custos decorrentes são: o tempo gasto com a
documentação, a redundância de processos e a sobreposição de competências dos órgãos
fiscalizadores. Tendo em vista a complexidade do setor e a necessidade de envolver outros
modais, a falta de uma eficiente coordenação acarreta atrasos no processo e, principalmente,
afeta a competitividade do porto.
Além disso, o estudo supracitado evidenciou também que os atrasos nas obras
de implementação de infraestrutura portuária podem causar redução de mais de R$ 6,3 bilhões
em geração de caixa aos investidores, atrasando o retorno dos investimentos realizados e,
principalmente, reduzindo a competitividade do país como um todo no tocante à realização de
novos negócios.
1.6. A importância da tecnologia para eficiência portuária
Tendo em vista a complexidade do setor portuário e, principalmente, o caráter
internacional do transporte marítimo, muitos são os órgãos envolvidos na fiscalização de
embarcações durante as operações portuárias, sendo, inclusive, conforme evidenciado
anteriormente, um dos principais fatores para o atraso nos processos de estadia em portos
nacionais.
Visando facilitar o referido processo e diminuir a burocracia nos portos
brasileiros, foi criado o programa Porto Sem Papel (PSP) que, gerenciado pela Secretaria
Nacional de Transportes Aquaviários (SNPTA), promove a desburocratização dos
procedimentos de estadia nos navios no portos nacionais, otimizando os processos de
importação e exportação e, a partir de um Portal de Informações Portuárias, permite, em um
único banco de dados, reter as informações de interesse dos agentes de navegação e dos diversos
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órgãos públicos que gerenciam e fiscalizam as estadias de embarcações nos nossos portos.
As informações são agregadas em um Documento Único Virtual (DUV) e
transmitidas eletronicamente ao sistema, dessa forma são eliminados mais de mil itens de
informações que anteriormente eram prestadas de forma redundante. Além disso, tais
informações são prestadas de forma antecipada, possibilitando a agilidade na análise da
documentação por parte da autoridade portuária e demais órgãos públicos.
Figura 4: Documento Único Virtual (DUV)
Fonte: Ministério da Infraestrutura
Seguindo as orientações da Organização Marítima Internacional (IMO), tal
programa foi implementado inicialmente em 2011 nos portos de Santos, Rio de Janeiro e
Vitória, sendo hoje de utilização obrigatória em todas as estadias de navios nos portos públicos
brasileiros. Além da óbvia redução da burocracia, tal programa ainda segue a tendência mundial
no tocante à contribuição ambiental tendo em vista a redução de impressão de papel.
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2. A IMPORTÂNCIA DA MARINHA DO BRASIL (MB)
2.1. Introdução
De acordo com o Art. 18 da Lei 12.815/2013, popularmente chamada de Lei dos Portos, compete
a Autoridade Portuária, dentro dos limites do Porto Organizado e sob coordenação da Autoridade
Marítima (Marinha do Brasil), as seguintes atribuições:
• estabelecer, manter e operar o balizamento do canal de acesso e da bacia de evolução do porto;
• delimitar as áreas de fundeadouro, de fundeio para carga e descarga, de inspeção sanitária e de
polícia marítima;
• delimitar as áreas destinadas a navios de guerra e submarinos, plataformas e demais
embarcações especiais, navios em reparo ou aguardando atracação e navios com cargas inflamáveis ou
explosivas;
• estabelecer e divulgar o calado máximo de operação dos navios, em função dos levantamentos
batimétricos efetuados sob sua responsabilidade; e
• estabelecer e divulgar o porte bruto máximo e as dimensões máximas dos navios que trafegarão,
em função das limitações e características físicas do cais do porto.
Não obstante, no Art.17 do mesmo dispositivo legal, ao listar as atribuições de competência da
Administração do Porto, denominada Autoridade Portuária, são evidenciadas as responsabilidade das
demais autoridades do Porto, sobretudo da Autoridade Marítima (Marinha do Brasil):
• autorizar a entrada e saída, inclusive atracação e desatracação, o fundeio e o tráfego de
embarcação na área do porto, ouvidas as demais autoridades do porto;
• suspender operações portuárias que prejudiquem o funcionamento do porto, ressalvados os
aspectos de interesse da autoridade marítima responsável pela segurança do tráfego aquaviário; e
• autorizar a movimentação de carga das embarcações, ressalvada a competência da autoridade
marítima em situações de assistência e salvamento de embarcação, ouvidas as demais autoridades do
porto.
De mesmo modo, de acordo com o Art. 4º da Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (Lei
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9537/1997), são atribuições da Autoridade Marítima a elaboração de normas que versem sobre os
seguintes assuntos:
• tráfego e permanência das embarcações nas águas sob jurisdição nacional, bem como sua
entrada e saída de portos, atracadouros, fundeadouros e marinas; e
• realização de inspeções navais e vistorias.
Dessa forma, observando-se as competências atribuídas nos dispositivos mencionados, fica
evidente a responsabilidade da Marinha do Brasil, seja atuando diretamente junto a Administração do
Porto na coordenação e estabelecimento de parâmetros portuários, ou até mesmo exercendo a orientação
normativa nos aspectos que concernem à ordenação do transporte aquaviário e, portanto, fundamentais
para eficiência do setor.
2.2. Conceitos básicos
Para melhor entendimento das responsabilidades da Marinha do Brasil nos aspectos que
afetam diretamente a operação portuária, é necessário definir os conceitos abaixo relacionados,
conforme previsto nas Normas da Autoridade Marítima para atividades de inspeção naval
(NORMAM-07/DPC); nas Normas da Autoridade Marítima para tráfego e permanência de
embarcações em águas jurisdicionais brasileiras (NORMAM-08/DPC); e nas Normas da
Autoridade Marítima para implantação e operação de sistemas para determinação de folga
dinâmica abaixo da quilha (NORMAM-33/DPC):
1 - Inspeção Naval (IN): atividade de cunho administrativo, que consiste na fiscalização
do cumprimento da Lei 9537/97, das normas e regulamentos dela decorrentes, e dos atos e
resoluções internacionais ratificados pelo Brasil, no que se refere exclusivamente à salvaguarda
da vida humana e à segurança da navegação, no mar aberto e em hidrovias interiores, e à
prevenção da poluição ambiental por parte de embarcações, plataformas fixas ou suas
instalações de apoio;
2 - Inspetor Naval : são profissionais de diversos níveis, habilitados para executarem a IN e
designados por ato administrativo do titular das Capitanias dos Portos, suas Delegacias ou Agências
(CP/DL/AG) ou dos Comandantes dos Navios da MB;
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3 – Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB) : Compreendem as águas interiores e os espaços
marítimos, nos quais o Brasil exerce jurisdição, em algum grau, sobre atividades, pessoas, instalações,
embarcações e recursos naturais vivos e não vivos, encontrados na massa líquida, no leito ou no subsolo
marinho, para os fins de controle e fiscalização, dentro dos limites da legislação internacional e nacional.
Esses espaços marítimos compreendem a faixa de duzentas milhas marítimas contadas a partir das linhas
de base, acrescida das águas sobrejacentes à extensão da Plataforma Continental além das duzentas
milhas marítimas, onde ela ocorrer;
4 - Órgãos de Despacho (OD) : são as Capitanias dos Portos e suas Delegacias e Agências
subordinadas, responsáveis pelo processo de despacho de embarcações sujeitas a este procedimento;
5 - Despacho: processo realizado pelos OD, mediante verificação de documentos da
embarcação, com intuito de liberar sua saída de um porto ou terminal aquaviário. Este processo
compreende a chegada, a estadia e a saída da embarcação num determinado porto ou terminal
aquaviário;
6 - Pedido de Despacho: processo pelo qual o representante da embarcação solicita, ao OD da
jurisdição, autorização de saída da embarcação do porto ou terminal aquaviário;
7- Passe de Saída para o Próximo Porto: documento expedido pelos OD, o qual autoriza a saída
da embarcação do porto ou terminal aquaviário localizado na sua área de jurisdição, para o próximo
porto (nacional ou estrangeiro);
8 - Passe de Saída por Período: documento expedido pelos OD, o qual autoriza a saída da
embarcação do porto ou terminal aquaviário localizado na sua área de jurisdição, por um determinado
período;
9 - DPC: Diretoria de Portos e Costas;
10 - SISTEMA DE DESPACHO DE EMBARCAÇÕES (SISDESP-WEB) : sistema
informatizado da DPC que apoia o processo de despacho de embarcações, provendo recursos que
possibilitam o envio de documentos em formato digital e o acompanhamento do andamento dos
processos de despacho, via internet, e tem por propósito a desburocratização dos procedimentos de
estadia de embarcações nos portos e terminais aquaviários brasileiros;
11 - Folga abaixo da quilha (FAQ) : distância entre o ponto mais baixo da quilha e o fundo
marinho. Representa a margem de segurança para evitar o encalhe ou a colisão com o relevo submarino
ou com objetos submersos;
12 - Folga dinâmica abaixo da quilha (FDAQ): determinação da FAQ a partir de sistemas que
consideram e atualizam constantemente os fatores relativos ao nível da água, ao navio e ao relativos ao
fundo, com base em modelos de previsão e monitoramento; e
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13 - Calado Máximo Operacional (CMO): também conhecido como Calado Máximo
Recomendado (CMR), é o calado máximo para o qual uma embarcação pode ser carregada em um dado
conjunto de condições, mantendo a suficiente FAQ para garantir a passagem segura através de um canal
de acesso, canais internos ou de aproximação, bacias de evolução e dos berços, e cujo valor é
determinado pela Autoridade Portuária (AP) sob coordenação da Autoridade Marítima (AM), consoante
a Lei dos Portos.
2.3. Inspeção Naval (IN)
Conforme previsto na Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (Lei 9537/97), a
Inspeção Naval é uma atividade de cunho administrativo que tem por objetivo verificar os
requisitos legais de segurança em embarcações nacionais e estrangeiras que navegam em Águas
Jurisdicionais Brasileiras (AJB);
É uma atividade de caráter fiscalizatório, realizada por inspetores navais da
Marinha do Brasil de maneira inopinada e sem aviso prévio. Por alterar a rotina normal das
embarcações e consequentemente demandar mais tempo no porto das embarcações
inspecionadas, afetam diretamente a eficiência da atividade portuária.
Pensando nisso, a Marinha do Brasil, por meio do capítulo 4 de suas Normas da
Autoridade Marítima para operação de embarcações estrangeiras em águas jurisdicionais
brasileiras (NORMAM-04/DPC), estabeleceu algumas diretrizes para o inspetor naval e, entre
elas, para os navios que permanecerão por pouco tempo no porto/terminal, é que a entrada do
inspetor naval se dê tão logo o navio seja liberado pela saúde do porto e pela Receita Federal
do Brasil.
2.4. Despacho de embarcações
O Despacho é a autorização emitida pelas Capitanias dos Portos e suas
Delegacias e Agências subordinadas (CP/DL/AG), mediante verificação dos documentos de
uma embarcação com intuito de liberar sua saída de um porto ou terminal aquaviário. Tal
autorização é formalizada pela emissão do passe de saída por período ou o passe de saída para
o próximo porto.
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Uma vez analisada a documentação pertinente, para as embarcações empregadas
nas navegações de cabotagem, apoio marítimo, interior, pesca e cruzeiro marítimo (em viagens
nacionais) será emitido o passe de saída por período e para as embarcações empregadas na
navegação de longo curso será emitido o passe de saída para o próximo porto.
De maneira análoga à execução da inspeção naval, o processo de despacho
também pode alterar a rotina normal das embarcações e consequentemente a eficiência da
operação portuária. Visando reduzir a burocracia na realização do processo, foi criado o Sistema
de Despacho de Embarcações (SISDESP-WEB) que, por meio de um sistema informatizado,
possibilita o envio de documentos em formato digital e o acompanhamento do andamento dos
processos de despacho, via internet.
Não obstante, de modo que a demanda seja atendida de maneira ordenada e
eficiente, as embarcações que realizam despacho por período, somente devem fazer o pedido
de despacho quando não possuírem um passe de saído válido que, para essas embarcações, é de
até 90 dias. Tal validade possibilita que as embarcações que trafegam somente em Águas
Jurisdicionais Brasileiras (AJB), não necessitem realizar esse procedimento a cada estadia em
porto nacional, reduzindo a burocracia e elevando e eficiência da atividade portuária.
2.5. Determinação da Folga Dinâmica Abaixo da Quilha (FDAQ)
Em conformidade com o Art. 18 da Lei 12.815/2013, cabe a Administração do
Porto, sob coordenação da Marinha do Brasil, o estabelecimento e a divulgação de parâmetros
como o porte bruto máximo e as dimensões máximas dos navios que trafegarão no porto, assim
como o calado máximo de operação, em função dos levantamentos batimétricos efetuados sob
sua responsabilidade.
Tais parâmetros são de extrema importância para eficiência de um porto, uma
vez que limitam sua área de atuação e os navios que poderão usufruir de suas instalações. De
um modo geral, a Folga Abaixo da Quilha (FAQ) é calculada de forma estática a partir de
requisitos baseados nas condições meteoceanográficas prevaleventes nos canais de acesso e
bacias de evolução, bem como nos fatores relacionados ao nível da água, ao navio e ao fundo.
Dessa forma, indo ao encontro das práticas internacionais, a Diretoria de Portos
e Costas (DPC), por meio de Portaria nº430/2019, aprovou as Normas da Autoridade Marítima
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para Implantação e Operação de Sistemas para determinação de Folga Dinâmica Abaixo da
Quilha (NORMAM-33/DPC).
A referida norma traz o conceito de Folga Dinâmica Abaixo da Quilha (FDAQ)
assim como os procedimentos a serem seguidos pela Autoridades Portuárias junto a Autoridade
Marítima para implementação dos sistemas de FDAQ em portos nacionais.
Tal conceito vem sendo adotado em alguns portos internacionais, aumentando
os benefícios e viabilidade econômica de operação, na medida em que os navios maximizam a
sua capacidade de carga para determinadas condições ambientais, sem o comprometimento de
sua segurança, a partir de um sistema que aplica modelos de previsão e monitoramento
meteorológico, da observação da altura das ondas e de emprego de janelas de marés antes do
início do trânsito em determinada área marítima.
Os sistemas de FDAQ devem ser capazes de monitorar as condições ambientais
em tempo real e prever as condições meteorológicas para, no mínimo, as próximas vinte e
quatro horas, ampliando o período de operação desses navios nos portos que possuam esses
recursos, permitindo uma condição de carregamento dos navios que irão transitar por seus
canais e bacias de manobra. Dessa forma, a partir da utilização do sistema é possível estabelecer
um Calado Máximo Recomendado (CMR) dinâmico e, principalmente, avaliar o risco do
contato do navio com o fundo e prever janelas de maré adequadas para o trânsito nas áreas de
navegação restrita.
Diante do exposto, é fácil observar que a elaboração da NORMAM-33/DPC é
um passo fundamental para elevar a competitividade dos portos nacionais frente ao que há de
melhor no transporte marítimo internacional. Além disso, utilizando-se como base o conceito
de logística portuária em que há a necessidade de transportar a maior quantidade de carga em
menor tempo, maximizar a capacidade de carga nos portos nacionais sem comprometer a
segurança da operação é, sem sombra de dúvidas, elevar a eficiência portuária.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, pode-se observar uma distorção grave na matriz de transportes
brasileira, sobretudo para um país que possui mais de 8,5 mil quilômetros de vias navegáveis e
apenas 11% da participação do modo aquaviário no transporte de cargas. Embora o Estatístico
Aquaviário da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) já demonstre um
acréscimo de 12,06% no transporte de cargas pela navegação de cabotagem em relação ao ano
anterior, ainda há um longo caminho a ser trilhado.
Primeiramente, de modo a atender a projeção do Plano Nacional de Logística Portuária
(PNLP) que, até o ano de 2042 prevê um aumento de 92% na demanda para os portos
brasileiros, há a necessidade de adotar uma concepção moderna de gestão portuária,
considerando não apenas o porto em si, mas todo o contexto de toda comunidade portuária.
Dessa forma, tendo em vista a complexidade do setor portuário e quantidade de fatores
envolvidos, deve-se observar os portos como plataformas logísticas, agindo como interface
entre o sistema de produção e os centros de consumo. Além disso, o sistema portuário deve
possuir processos logísticos mais bem definidos, especialmente no tocante à relação entre os
modais marítimo e terrestre.
No tocante ao reequilíbrio da matriz de transportes, o governo avança numa tentativa de
aumentar a oferta da cabotagem no Brasil, incentivando a concorrência, criando novas rotas e
reduzindo custos. Por meio do Projeto de Lei 4.199/2020, apelidado de “ BR do mar” em alusão
a uma rodovia marítima, o Ministério da Infraestrutura pretende aumentar em 40% a capacidade
da frota marítima dedicada à cabotagem nos próximos 3 anos.
De mesmo modo, pode-se observar um avanço no combate à burocracia no setor
portuário por meio do programa Porto Sem Papel (PSP) e a criação, pela Marinha do Brasil, do
Sistema de Despacho de Embarcações (SISDESP-WEB) que, por meio de sistemas
informatizados, eliminaram a redundância de processos de fiscalização e facilitaram a liberação
de cargas em portos nacionais. Não obstante, a normatização do conceito de Folga Dinâmica
Abaixo da Quilha (FDAQ) também mostra-se como um grata surpresa para maximizar a
capacidade do transporte de cargas em nossos portos sem o comprometimento da segurança.
Por outro lado, além da logística propriamente dita, há uma evidente necessidade de
melhorar a regulamentação do setor portuário, fornecendo maior segurança jurídica nos
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anúncios públicos, processos seletivos públicos e garantias de que trata a Lei 12.815/2013, além
de maior estímulo à concorrência, incentivando a participação do setor privado e assegurando
o amplo acesso aos portos organizados, instalações e atividades portuárias.
Ressalta-se que o presente trabalho não tem a pretensão de encerrar as discussões acerca
do tema, sobretudo sobre um assunto extremamente complexo e sujeito a atualizações
constantes. No entanto, o presente artigo poderá certamente induzir novas pesquisas ou
simplesmente servir como fonte de informação aos entusiastas do setor marítimo.
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