Ano 2 (2016), nº 1, 435-467
Mestrado em "Direito de Família: Diálogos" – Disciplina
DCV5940 do Programa de Pós-Graduação "stricto sensu" da
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
PARTILHA DO LUCRO NA “REVERSÃO DE
LUCROS LÍQUIDOS” EM PATRIMÔNIO
INCOMUNICÁVEL
Rafael Lauria Marçal Tucci
Sumário: I – Introdução. II - Tendências Societárias e
Problemas. III - Comunicabilidade de Bens no Casamento e na
União Estável. III.1 - No Casamento. III.2 - Na União Estável.
IV - Operação Econômica. V - Conceito de Lucros. VI-
Conceito de “Reversão de Lucros Líquidos”. VII -
Comunicabilidade dos Frutos de Bens Particulares Adquiridos
a Titulo Oneroso. VIII - Entendimento Jurisprudencial. IX –
Conclusão. Bibliografia
I - INTRODUÇÃO
família, primeiro pilar da organização social,
evolui gradativamente desde os tempos mais re-
motos até a atualidade. Sendo considerada mais
antiga do que o Estado, é possível imaginar que a
família se verifica como célula germinal da co-
munidade estatal.
Sua evolução é caracterizada por importantes alterações
em decorrência da forte influência do Direito Romano, do Di-
reito Canônico e dos períodos históricos da modernidade e da
pos-modernidade até à atualidade.
Na antiguidade o sacramento matrimonial era a única
forma de iniciar uma família que, até então, era indissolúvel,
A
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tornando, as entidades familiares, severas e sem vínculo afeti-
vo. O modelo hierarquizado, conservador e patriarcal foi desas-
troso e gerou grande aumento de uniões extramatrimoniais,
abalando a estrutura familiar da época. Contudo, a família con-
temporânea é evidenciada pela diversidade que pode ser justifi-
cada pela incessante busca pelo afeto e felicidade.
A ampliação do conceito de família acabou permitindo
o reconhecimento de outras entidades familiares, como a uni-
ões de pessoas do mesmo sexo, o reconhecimento da filiação
socioafetiva entre outros avanços. Essas novas relações levam
a procura de inserção de soluções práticas no âmbito do Direito
das Famílias.
É cediço que a evolução da família ao longo do tempo
acarretou reflexos sociais que modificaram seus rumos no or-
denamento jurídico brasileiro.
Observa-se que a evolução social sempre deve preceder
o regulamento jurídico sob pena de não serem reconhecidas as
necessidades sociedade, desvalorizando-a por consequência.
Jean Cruet, autor do livro A Vida Do Direito e a Inutilidade
das Leis de 1908 já lecionava que: “Vè-se todos os dias a sociedade reformar a lei; nunca se viu
a lei reformar a sociedade”1.
Sendo assim, atualmente, as famílias aparentam convi-
ver em um mundo extremamente complexo em razão, princi-
palmente, das evoluções industriais e tecnológicas que sobrevi-
eram.
Neste contexto social, é muito comum ser verificada a
figura de empresários, quotitas, acionistas, entre outras, em
uma sociedade cada vez mais urbana e empresarial.
Por sua vez, ganha grande relevância a figura dos plane-
jamentos sucessórios. Tal pratica é necessidade premente, pois
mais do que criar um patrimônio é importante saber preservá-lo
1Jean Cruet. A Vida Do Direito e a Inutilidade das Leis. Lisboa: Bibliotheca de
Philosophia Scientifica – Ed. Antiga Casa Bertrand – José Bastos & C,1908
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durante as gerações.
Entretanto, dissolvido os vínculos familiares, novas
questões são levadas ao tribunal envolvendo quotas e ações nas
disputas de partilha de bens.
II - TENDÊNCIAS SOCIETÁRIAS E PROBLEMAS
Maria Helena Diniz bem observa a diminuição do pa-
trimônio que a pessoa poderá livremente dispor tendo em vista
o advento do Código Civil brasileiro de 2002 como, por exem-
plo, a nova ordem de vocação hereditária na sucessão legitima,
o reconhecimento do cônjuge como herdeiro necessário, con-
correndo, em certos casos, com descendentes e ascendentes do
falecido, entre outras2.
Por essas razões, o planejamento sucessório é o princi-
pal instrumento para que fortunas adquiridas durante toda uma
vida sejam protegidas e não venham a se diluir.
Uma das formas para que se concretize mencionada
manobra patrimonial protecionista são as chamadas holdings
ou holdings familiares.
Por definição, holding é qualquer empresa criada com
intuito de controlar outras companhias ou um certo patrimônio.
Segundo o conceito de Gladston Mamede e Eduarda
Cotta Mamede sobre está construção societária: “holding (ou holding company) é a sociedade que detém par-
ticipação societária em outra ou de outras sociedades, tenha
sido construída exclusivamente para isso (sociedade de parti-
cipação), ou não (holding mista)”3
Em sua forma pura, a holding não irá realizar qualquer
tipo de operação, apenas gerenciará as empresas controladas,
determinando as políticas operativas e, eventualmente, patroci-
2 Maria Helena Diniz. Curso de direito Civil Brasileiro Vol. 8. São Paulo: Sarai-
va,2011. 3Gladston Mamede; Eduarda Cotta.Mamede. Holding Familiares E Suas Vanta-
gens:São Paulo:Atlas, 2013.
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nando todo o financiamento necessário para operacionalizá-las.
A Lei Federal n. 6.404/76, em seu artigo 2º, § 3º, traz o
fundamento legal para a criação de sociedades holding, deter-
minando que tais companhias podem participar de outras em-
presas e que, mesmo não estado previsto no estatuto ou contra-
to social, a participação poderá ocorrer como forma de concre-
tizar o objeto social ou para prover benefícios de incentivos
fiscais.
Em que pese à Lei acima tratar das Sociedades Anôni-
mas, não existe nenhum impedimento para que a sociedade
holding seja formalizada sob a égide das normas referentes às
sociedades por quotas de responsabilidade limitada ou qualquer
outra permitida pelo direito brasileiro, pois esta modalidade de
empresa consiste mais em um objetivo da sociedade – controle
e gerenciamento de outras empresas ou patrimônio – do que em
um tipo societário específico.
Feitas estas observações, verifica-se que a família atual,
muito mais urbanizadas em comparação com os modelos que a
precederam, defrontar-se-á, habitualmente, com questões so-
cietárias. Entretanto, em razão da complexidade trazida pela
evolução histórica da família, novos problemas, igualmente
complexos, começaram a surgir.
Neste cenário de planejamentos societários, e uma vez
desfeito o vinculo familiar voluntariamente, seja pelo divórcio,
separação de fato, nulidade ou anulabilidade do casamento,
levando em consideração o fim da separação de direito4, novas
questões foram avocadas as demandas judiciais nas ações de
partilha de bens.
A partilha de quotas ou ações são, normalmente, discu-
tida quando há questões envolvendo a comunicabilidade ou não
de referido bem. Inúmeros questionamentos poderão ser feitos
quando adquiridos antes do casamento ou união estável e, por
4 Flávio Tartuce; José Fernando Simão. Direito Civil. Direito de Família. São Paulo:
Metodo, 2010. p.188
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diversas razões, valorizaram-se. Seria, essa valorização, comu-
nicável ao cônjuge ou companheiro nos regimes de bens que
preceituam o direito à meação?
Ainda, quando as quotas ou ações adquiridas por so-
mente um do casal forem consideradas bem comunicáveis,
ocorre outro problema de grande relevância. É possível imagi-
nar a hipótese de o cônjuge ou companheiro sócio da empresa
não obter outros recursos, a não ser suas quotas, para o efetivo
pagamento da meação devida ao seu par. A sociedade estaria
fadada a dissolução para que o problema da partilha fosse re-
solvido? O cônjuge ou companheiro poderia tornar-se sócio da
empresa por imposição legal?
Dentre todos estes problemas, o presente trabalho foca-
rá na questão referente à situação em que o acionista ou quotis-
ta executa a operação econômica denominada de “Reversão
dos Lucros Líquidos” com o intuito de investir o produto rece-
bido como contraprestação do trabalho na própria empresa que
concedeu o benefício.
As discussões de comunicabilidade nas demandas judi-
ciais sobre este problema ganharam grande relevância nas hi-
póteses de ser verificada exorbitante aumento de patrimônio
particular em razão desta manobra societária geralmente cons-
tatada nas empresas holding familiares pertencentes à família
de um dos cônjuges ou companheiros.
A questão sobre a problemática em tela diz respeito à
comunicabilidade dos lucros auferidos pelo sócio e incorpora-
dos, logo em seguida, na própria empresa.
Dois principais argumentos foram trazidos à baila para
afastar a meação conjugal do ex-cônjuge ou ex-companheiro
nas ações que se questionava a divisão deste ativo.
O primeiro deles seria que não há no que se falar em
comunicabilidade de valores das quotas ou ações reinvestidas
ou recompradas para o aumento do capital social, pois a socie-
dade, inicialmente, era patrimônio particular do cônjuge ou
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companheiro. Dito argumento ganhou importante apoio princi-
palmente nas ações entre conviventes na união estável quando
não havia o reconhecimento de tal vínculo como entidade fami-
liar. Sendo assim, era necessária a comprovação do “esforço
comum” para haver comunicabilidade dos bens.
Diverso argumento seria que a operação resultante na
incorporação de lucros líquidos na empresa pelo sócio bonifi-
cado não é onerosa e, portanto, configurariam as hipóteses de
incomunicabilidade em certos regimes patrimoniais, que serão
posteriormente analisados, nos quais os bens adquiridos gratui-
tamente na constância do casamento ou na união estável, con-
forme previsto em lei, não atingem ao outro cônjuge ou com-
panheiro.
Para a inteligência do presente trabalho e para analisar
as argumentações acima expostas, será necessária a apresenta-
ção de alguns conceitos elementares.
Em primeiro momento, serão observadas as hipóteses
em que ocorre comunicabilidade patrimonial entre cônjuges e
companheiros quando há a dissolução do vinculo familiar.
Após, serão feitas considerações sobre os conceitos de opera-
ção econômica, de lucros e de “reversão de lucros líquidos”
para, ao final, examinar a comunicação ou não dos valores das
quotas/ações que foram reinvestidas na empresa que compõem
patrimônio particular do cônjuge ou companheiro.
III - COMUNICABILIDADE DE BENS NO CASAMENTO E
NA UNIÃO ESTÁVEL
III.1 - NO CASAMENTO
A comunhão de vidas que foi originada pelo casamento,
necessariamente, produzirá efeitos jurídicos patrimoniais e pes-
soais. No que tange aos efeitos de esfera patrimonial, com o
casamento surge à constituição de família reconhecida pela lei,
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mutua assunção obrigatória entre o casal na condição de con-
sortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família,
conforme preconiza o artigo 1565 do Código Civil5, e, ainda, a
imposição de deveres aos cônjuges de acordo com o artigo
1566 do Código Civil6.
Não obstante, a celebração do casamento faz vigorar,
automaticamente, o regime de bens conforme o artigo 1639,
§1º do Código Civil7. É lecionado sobre o tema, nas palavras
de Pontes de Miranda, que “por sua significação social, a con-
sequência dos matrimônios quanto aos bens: o regime que
vigorar começa desde a data da celebração...”8.
Neste compasso, a seguir, pretende-se demonstrar os
regimes de bens que vigoram no casamento e que comportam a
comunicabilidade patrimonial. Ademais, também serão vistos
quais os bens que integram o patrimônio comunicável entre os
cônjuges.
É importante registrar, na linha do que ensina Débora
Brandão, que o regime patrimonial afeta exclusivamente a re-
gulamentação dos bens econômicos, refletindo os efeitos entre
5 Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de
consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.
§ 1o Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro.
§ 2o O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado
qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas. 6 Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I - fidelidade recíproca;
II - vida em comum, no domicílio conjugal;
III - mútua assistência;
IV - sustento, guarda e educação dos filhos;
V - respeito e consideração mútuos. 7 Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto
aos seus bens, o que lhes aprouver.
§ 1o O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamen-
to. 8 Pontes de Miranda, Tratado de direto de Família, Vol. II. São Paulo: Max limo-
nad, 1947 p. 23
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cônjuges e entre os cônjuges e terceiros9.
No que preceitua a doutrina de Paulo Lôbo, o regime de
bens regula as relações patrimoniais, “nomeadamente quanto
ao domínio e a administração de ambos ou de cada um sobre
os bens trazidos ao casamento durante a união conjugal”10
.
Ainda assim, o regime de bens pode ser estabelecido li-
vremente entre os nubentes ou por imposição legal verificados
certos requisitos legais.
Com o advento da lei do Divórcio n. 6.515/77 o regime
da comunhão parcial passou a ser o regime legal a ser adotado
na falta, nulidade ou ineficácia da convenção quanto aos bens
dos cônjuges.
Este regime opta por excluir da comunhão os bens per-
tencentes aos cônjuges antes do casamento e em que ficam
incluídos na comunhão os adquiridos onerosamente após o
casamento.
Segundo Silmara Juny Chinelato “o regime da comu-
nhão parcial presume a colaboração material de ambos os
cônjuges na aquisição de bens a título oneroso, na constância
do casamento, sendo irrelevante que sejam adquiridos apenas
em nome de um”11
.
Neste regime, consequentemente, ficam excluídos da
comunhão de bens entre cônjuges aqueles elencados no artigo
1659 do Código Civil. Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe
sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou su-
cessão, e os sub-rogados em seu lugar;
9 Débora V. C. Brandão. Regime de Bens no Novo Código Civil. São Paulo: Saraiva,
2007 p. 54 . 10 Paulo Luiz Netto Lôbo, Código Civil Comentado: direito de família e relações de
parentesco, direito patrimonial: arts 1.591 a 1.693. In: Azevedo, Álvaro Villaça
(coord.) São Paulo, Atlas, 2003 v. 16
11 Silmara Juny Chinelato, Código Civil Comentado: parte especial do direito de
família. Arts. 1591 a 1710. In. Azevedo, Antonio Junqueira (coord.). São Paulo,
Saraiva, 2004, v. 18
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II - os bens adquiridos com valores exclusivamente perten-
centes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particula-
res;
III - as obrigações anteriores ao casamento;
IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo rever-
são em proveito do casal;
V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profis-
são;
VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas
semelhantes.
Estes, quando agregados ao patrimônio de um dos côn-
juges, compõem a massa de bens chamados particulares e que
não devem ser comunicados ao outro findo o vinculo matrimo-
nial.
Por derradeiro, a massa comum do casal será composta
pelos bens comunicáveis. De acordo com os artigos 1658 e
1660 do Código Civil são mencionados todos os bens que
comporão o patrimônio conjunto do casal e, certamente caberá
ao outro cônjuge à parcela estipulada em lei em eventual rom-
pimento do vinculo conjugal. Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os
bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento,
com as exceções dos artigos seguintes.
Art. 1.660. Entram na comunhão:
I - os bens adquiridos na constância do casamento por título
oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;
II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o con-
curso de trabalho ou despesa anterior;
III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em
favor de ambos os cônjuges;
IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada
cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou penden-
tes ao tempo de cessar a comunhão.
A comunicabilidade de bens não é só característica do
regime da comunhão parcial de bens. O regime comunhão uni-
versal de bens tem como elemento fundamental a própria co-
munhão entre os cônjuges. Durante a vigência do Decreto n.
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181 de 1890, dito regime, era o legal ao invés da comunhão
parcial de bens.
Neste regime patrimonial, ocorre à participação de am-
bos os cônjuges na metade de todos os bens que componham o
patrimônio, tendo eles sido adquiridos anteriormente ou poste-
riormente ao casamento.
Apesar da comunicabilidade inerente ao regime, o arti-
go 1668 do Código Civil relaciona os bens que estariam exclu-
ídos desta comunhão. Além disso, deve ser observada a possi-
bilidade de doações entre cônjuges com as clausulas descritas
no art. 1911 do Código Civil12
.
É relevante notar, sobre este regime de bens, que a in-
comunicabilidade, não se opera quantos aos frutos destes bens
de acordo com o artigo 1669 do Código Civil que preceitua: Art. 1.669. A incomunicabilidade dos bens enumerados no ar-
tigo antecedente não se estende aos frutos, quando se perce-
bam ou vençam durante o casamento.
A esse respeito, Silmara Juny Chinelato menciona que
na comunhão universal de bens “rendimentos de aplicações
financeiras, aluguéis de bens incomunicáveis comunicam-
se”13
.
Os dois regimes de bens acima mencionados, comunhão
parcial de bens e comunhão universal de bens, são aqueles que
encontram enraizados no seu próprio conceito, por força legis-
lativa, a comunicabilidade de patrimônio.
O legislador optou, em ambos os casos, adotar os efei-
tos da comunhão na sua própria natureza. Pode-se dizer que os
regimes que preveem esta característica coadunam-se com a
índole da sociedade conjugal em termos de refletir no patri-
12 Art. 1.911. A cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalida-
de, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade.
Parágrafo único. No caso de desapropriação de bens clausulados, ou de sua aliena-
ção, por conveniência econômica do donatário ou do herdeiro, mediante autorização
judicial, o produto da venda converter-se-á em outros bens, sobre os quais incidirão
as restrições apostas aos primeiros. 13 Silmara Juny Chinelato, Código Civil Comentado...cit.
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mônio o que se verifica na identificação da vida e do destino
dos cônjuges.
Os demais regimes de bens consagrados no Código Ci-
vil, se nada houver sido acordado entre os nubentes em sentido
oposto, não comportam respectivo efeito, pois, os outros, ca-
racterizam-se pelo critério da separação dos patrimônios dos
casados, ocorrendo à comunhão somente por ato de vontade se
assim a lei permitir.
Entretanto, no regime da separação obrigatória de bens,
importantes questionamentos se insurgiram sobre a revogação
ou não da Súmula 37714
com a publicação do Novo Diploma
Civil em 2002. Referida dúvida vem gerando enormes debates
entre os doutrinadores mais respeitáveis no campo civil brasi-
leiro. Ao que tudo indica, a melhor doutrina aparenta se filiar
ao conceito de que a Súmula 377 está revogada porque geraria
o enriquecimento sem causa uma vez que, dita súmula, não
exige a comprovação do esforço comum para que exista o di-
reito à meação.
Para o presente trabalho, será entendido que a súmula
377 está revoga, não cabendo, consequentemente, meação no
regime da separação obrigatória de bens.
Outra ressalva necessária a se fazer sobre comunicabili-
dade de bens se refere ao fato de que, no regime da participa-
ção final dos aquestos, os bens que seriam comuns ao casal, se
fossem casados pelo regime da comunhão parcial de bens, de-
verão compor a parcela compensável ao outro cônjuge uma vez
que este instituto não comporta a figura da meação.
Pela falta de adoção do regime da participação final dos
aquestos no direito brasileiro, não será feita qualquer outra re-
ferência a cerca do mesmo.
Ademais, a lei admite serem escolhida, voluntariamen-
te, segundo o princípio da liberdade dos pactos antenupciais,
14 Súmula 377/STF: No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adqui-
ridos na constância do casamento.
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alterações de diversas naturezas no regime de bens15
, salvo
quando a escolha de determinado regime de bens é obrigatória
por imposição legal16
. Sendo assim, nestes casos, caberá da
análise casuística para ter conhecimento quais os bens que se-
rão ou não comunicáveis entre os cônjuges.
III.2 - NA UNIÃO ESTÁVEL
Segundo Ana Elizabeth Lapa Cavalcanti, a união está-
vel considera-se pelo relacionamento estável entre homem e
mulher que pretendem formar uma entidade familiar sem que
estejam presentes as formalidades exigidas por lei para a cons-
tituição do casamento17
.
Infere-se, deste conceito, uma pequena ressalva. O úni-
co elemento subjetivo, qual seja, união entre pessoas de sexo
distintos, parece, segundo entendimento doutrinário e jurispru-
15 Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher
podem livremente:
I - praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempe-
nho de sua profissão, com as limitações estabelecida no inciso I do art. 1.647;
II - administrar os bens próprios;
III - desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados
sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;
IV - demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invalidação do aval,
realizados pelo outro cônjuge com infração do disposto nos incisos III e IV do art.
1.647;
V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo
outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos
pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco
anos;
VI - praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente. 16 Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:
I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da cele-
bração do casamento;
II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos;
III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial. 17 Ana Elizabeth Lapa Wanderley Cavalcanti. Casamento e União Estável. Requisi-
tos e Efeitos Pessoais. São Paulo: Manole, 2004. p.67
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dencial da Superior Corte brasileira, que não mais se opera18
,
sendo possível uniões estáveis homossexuais.
Ainda na vigência do Código Civil de 1916, após a
Constituição de 1988 que, em seu artigo 226, § 3.º19
, reconhe-
ceu o instituto da União Estável, justamente para substituir a
figura do concubinato.
O Código Civil de 1916 não contemplava, em seus dis-
positivos, a figura do concubinato puro, apenas regulamentan-
do preceitos pertinentes ao concubinato adulterino. Nesse perí-
odo, era utilizado o instituto da sociedade de fato para resolver
a partilha de bens, apurando-se os efetivos ingressos ao patri-
mônio comum e os bens eram repartidos na proporção dos res-
pectivos aportes a fim de evitar o enriquecimento sem causa.
Assim, era apenas partilhado o patrimônio adquirido pelo es-
forço comum dos concubinos.
Avulta, nesse período, a jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal que, mediante a edição do enunciado sumular
n. 380/STF, estabeleceu que "comprovada à existência de soci-
edade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução
judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço
comum". Assim, conforme Álvaro Villaça Azevedo, a partilha
de bens deverá ocorrer, desde que reconhecida à sociedade de
fato, pela comprovação do esforço comum20
.
Em 1994, foi editada a Lei nº 8.971/94, regulamentando
a união estável e reconhecendo-a como entidade familiar, mas
sem dispor acerca da partilha de bens, seguindo-se a aplicação
da Súmula 380/STF. Em 1996, editou-se a Lei nº 9.278/96,
buscando corrigir as falhas da Lei nº 8.971/94, especialmente
18 Flávio Tartuce; José Fernando Simão. Direito Civil..cit, p.313. 19 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem
e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casa-
mento. 20 Álvaro Villaça Azevedo. Do Comcubinato ao Casamento de Fato. São Paulo:
Cejud, 1986.
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no que tange à separação de fato de convivente casado e ao
prazo de cinco anos para caracterização da união estável21
. Es-
se diploma legal regulamentou especificamente a partilha de
bens, em seu art, 5º, dispondo o seguinte: Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por
ambos os conviventes, na constância da união estável e a títu-
lo oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colabo-
ração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio
e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato
escrito.
§ 1° Cessa a presunção do caput deste artigo se a aquisição
patrimonial ocorrer com o produto de bens adquiridos ante-
riormente ao início da união.
§ 2° A administração do patrimônio comum dos conviventes
compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato
escrito.
Dessa forma, passou-se a aplicar à união estável as re-
gras atinentes ao regime da comunhão parcial de bens do ca-
samento.
Em sendo o regime da comunhão parcial de bens o apli-
cável para a união estável, deve-se atentar aos princípios que
regem tal regime, em especial os regramentos que tangem a
comunicabilidade de bens.
Comunicam-se apenas os bens comuns, ficando excluí-
dos da comunhão os bens que cada companheiro já possuía
antes do início da união estável, bem como os adquiridos na
sua constância, a título gratuito, por doação, sucessão ou os
sub-rogados em seu lugar.
É imperioso ressalvar que a liberdade de escolha no re-
gime de bens, característica presente no casamento, também é
verificada na união estável que poderá ser amplamente regula-
mentada da melhor forma que ajustar aos conviventes.
Analisado, assim, os regimes de bens em que ocorrerá a
comunicabilidade e quais os bens que compõem patrimônio
comum dos cônjuges ou companheiros, pretende-se averiguar,
21 Flávio Tartuce; José Fernando Simão. Direito Civil..cit, p.199.
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neste momento, os conceitos básicos que envolvem a operação
denominada de “reversão de lucros líquidos” para observar se
determinados bens que envolvem está operação serão ou não
comunicáveis ao outro cônjuge ou companheiro sob a ótica dos
regimes de bens previamente analisados.
IV - OPERAÇÃO ECONÔMICA
Importante para o presente estudo, compreender o con-
ceito de operação econômica para analisar as possíveis mano-
bras societárias por uma perspectiva analítica a fim de demons-
trar a natureza da operação de “reversão de lucros líquidos”
objeto do presente estudo.
Imperioso, desde logo, mencionar que ditas operações
econômicas podem ser verificadas tanto nas sociedades anôni-
mas quanto nas limitadas, sendo que o conceito aplicado a uma
delas valerá isonomicamente à outra.
De acordo com o posicionamento de Ivan Guimarães
Pompeu e Renata Guimarães Pompeu, é possível examinar, de
antemão, que uma operação econômica pressupõe o desloca-
mento de algo valorativamente mensurável de um polo a outro.
Este aspecto pode ser visto como característica objetiva que
independem dos elementos subjetivos dessa operação. “O que se troca por meio da transação apresenta sempre
uma natureza patrimonialmente apreciável. Porém, o proces-
so dessa operação econômica conta igualmente com preocu-
pações ou expectativas de ordem existencial. A formação do
vinculo, seja ainda em nível anterior ao mundo jurídico, co-
mo fato social, pressupõe uma rede de pretensões imaginadas
pelos agentes para realizarem as trocas”22
.
O objeto dessa circulação de “riqueza” não necessaria-
mente precisa ser dinheiro. É possível imaginar operações em
22 Ivan Guimarães Pompeu e Renata Guimarães Pompeu. O Contrato Como Opera-
ção Econômica:Contributo Científico A Partir Da Obra De Enzo Roppo - 2 Revista
da Faculdade Mineira de Direito, v.12, n. 23, jan./jun. 2011
450 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
que se deslocam bens moveis, bens imóveis, vantagem social,
dividendos, benefícios, quotas, ações, etc.
A esse respeito, bem preceitua Sylvio Marcondes ao
mencionar que “bem é um objeto material, considerado pela
sua apropriação atual ou virtual”23
As operações econômicas, assim, podem ser atuais,
concretizando-se no momento em que é finalizada a movimen-
tação como, por exemplo, o acionista que recebe os lucros da
empresa e os embolsa, deslocando o patrimônio da empresa
para o benefício do sócio, ou podem ser apenas potencialmente
asseguradas ao seu titular. Neste último caso o benefício é reti-
do na própria sociedade na esperança, via de regra, de trans-
forma-lo em benefício maior no futuro.
Os polos em que se deslocam estes bens podem ser pre-
enchidos por pessoas jurídicas ou pessoas físicas, não criando
nenhum obstáculo para os resultados que surgirão.
Apesar de existirem circulação de “riqueza” gratuita-
mente, importante observar que sempre que houver recompen-
sa patrimonial, seja desde já assegurada ou potencialmente au-
ferível, há presente a característica da onerosidade na operação
econômica realizada. “A operação econômica traz consigo a troca de utilidades
feita de maneira onerosa ou não. As utilidades podem ser
oferecidas por meio de prestações de bens e/ou serviços ofe-
recidos e queridos no mercado, lócus de transações que lhe
permitem um balizador de valores.”24
.
Pois bem, para a boa compreensão do que é transferido
na operação societária em apreço pelo presente estudo, é neces-
sário, portanto, refletir sobre o conceito de lucro, principalmen-
te na esfera econômica, efetuando a elementar transferência das
considerações para o mundo jurídico, a fim de encaminhar o
trabalho para as futuras conclusões.
23 Sylvio Marcondes. Problema de Direito Mercantil. São Paulo: Max limonad,
1970 p. 69. 24 Ivan Guimarães Pompeu e Renata Guimarães Pompeu, O Contrato...cit.
RJLB, Ano 2 (2016), nº 1 | 451
V - CONCEITO DE LUCROS
Há diversos tipos de lucros sejam eles no campo
econômico, contábil, social ou até legalmente constituído. No
seu sentido mais simples, economicamente analisado, lucro é o
resultado positivo de um investimento inicial. Com base na
teoria neoclássica o lucro seria a diferença entre a receita total
da empresa e todos os custos. O lucro, econômico, é, portanto,
o retorno ao proprietário do capital social, dinheiro ou títulos
investidos inicialmente.
Trazido o conceito para a esfera empresarial, verifica-se
segundo Alessandra Hirano Fuji que: “O lucro é, em suma, a recompensa e a motivação para a ins-
talação e continuidade de um empreendimento na sociedade
capitalista”25
Pode-se afirmar que qualquer empresa privada, seja de
capital aberto ou fechado, busca o lucro da sua atividade como
pressuposto conceitual conforme entendimento de Fabio Ulhoa
Coelho26
.O acionista/quotista, neste quadro, objetiva satisfazer
seu interesse individual no recebimento do lucro ou , preservar
o crescimento empresarial, acrescendo seu capital social.
De acordo com Manoel de Queiroz Pereira Calças, as
sociedades empresárias mercantis tem sempre a finalidade lu-
crativa, que corresponde o motivo pelo qual os sócios se reú-
nem, cobrando esforços e recursos para a construção da socie-
dade27
.
Dito isso, é fator inerente à qualidade de sócio o direito
subjetivo ao lucro. Imperioso, a esse respeito, discernir aqueles
de titularidade do sócio ou acionista e aqueles de titularidade 25 Alessandra Hirano Fuji. O conceito de lucro econômico no âmbito da contabili-
dade aplicada Rev. contab. Financeira vol.15 n.36. Sept./Dec. 2004. São Paulo.
26 Fabio Ulhoa Coelho. A Sociedade limitada no Novo Código Civil, Saraiva, 2003-
p. 74
27 Manoel de Queiroz Pereira Caças. Sociedade limitada no Novo Código Civil.
Atlas, 2003. – p.114
452 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
de própria empresa que, por sua vez, não atingem a pessoa do
sócio.
A lei n. 6.404/76 traça importante divisão finalistica do
lucro com reflexos públicos, coletivos ou sociais, tendo desti-
nação específica por força de lei.
Esse lucro que a lei se refere é normalmente retino em
nome da empresa nas chamadas “reservas”.Dessarte, estes, não
são de titularidade do sócio. Não integram o patrimônio do
sócio e servem de medidas protecionistas para assegurar a ati-
vidade empresarial. Além das reservas cuja lei define, ainda é
possível a criação de reservas estatutárias pelas sociedades
anônimas observados certos pressupostos28
.
De maneira exemplificativa, podem ser mencionados
alguns tipos de lucro, previsto na lei n. 6.404/76, que ficam
preservados na sociedade nessas reservas como o verificado no
artigo 19329
, quando a lei reserva porcentagem específica para
compor a chamada “Reserva Legal” que assegurará a integrali-
dade do capital social.
Ainda assim, outro lucro com finalidades sociais, cole-
tivas é aquele cuja destinação se da para as chamada “Reserva
de Contingência” que são aquelas de livre disponibilidade dos
órgãos societários para compensar, futuramente, a diminuição
do lucro. Destina-se parte do lucro líquido à formação de re-
serva com a finalidade de compensar, em exercício futuro, a
28 Art. 194. O estatuto poderá criar reservas desde que, para cada uma:
I - indique, de modo preciso e completo, a sua finalidade;
II - fixe os critérios para determinar a parcela anual dos lucros líquidos que serão
destinados à sua constituição; e
III - estabeleça o limite máximo da reserva. 29 Art. 193. Do lucro líquido do exercício, 5% (cinco por cento) serão aplicados,
antes de qualquer outra destinação, na constituição da reserva legal, que não excede-
rá de 20% (vinte por cento) do capital social.
§ 1º A companhia poderá deixar de constituir a reserva legal no exercício em
que o saldo dessa reserva, acrescido do montante das reservas de capital de que trata
o § 1º do artigo 182, exceder de 30% (trinta por cento) do capital social.
§ 2º A reserva legal tem por fim assegurar a integridade do capital social e
somente poderá ser utilizada para compensar prejuízos ou aumentar o capital.
RJLB, Ano 2 (2016), nº 1 | 453
diminuição do lucro decorrente de perda, julgada provável,
cujo valor possa ser estimado conforme se verifica no artigo
19530
.
Por sua vez, as reservas assinaladas acima não se con-
fundem com a “Reserva de Capital” as quais são constituídas
com valores recebidos pela empresa e que não transitam pelo
resultado, por não se referirem à entrega de bens ou serviços
pela empresa. São ganhos obtidos sem compensação na forma
de bens ou serviços. Os valores dessa reserva, em geral, deve
ser incorporados ao capital social ou compensados com lucros
acumulados e não representam receitas ou ganhos aos acionis-
tas.
Em suma, as múltiplas reservas de lucros intituladas pe-
la lei são constituídas com a apropriação de lucros da compa-
nhia para atender a diversas finalidades coletivas, sendo sua
constituição efetivada por disposição da lei ou por proposta dos
órgãos da administração.
Por conseguinte, os lucros ou dividendos que serão dis-
tribuídos ao acionista/quotista têm, como destino, serem em-
bolsados pelos mesmos ou de retornarem ao patrimônio da
empresa, resultando no aumento de capital social. Importante
salientar que empresas que atuam sob quaisquer regimes fiscais
podem distribuir lucros ou dividendos. Estes, sim, serão inte-
gralizados ao patrimônio do sócio.
De acordo com o entendimento de Luiz Antonio de
Sampaio Campos o Decreto-lei n. 2.627-1940 criou a obrigato-
riedade no pagamento dos dividendos nas Sociedades Anôni-
30 Art. 195. A assembléia-geral poderá, por proposta dos órgãos da administração,
destinar parte do lucro líquido à formação de reserva com a finalidade de compen-
sar, em exercício futuro, a diminuição do lucro decorrente de perda julgada prová-
vel, cujo valor possa ser estimado.
§ 1º A proposta dos órgãos da administração deverá indicar a causa da perda
prevista e justificar, com as razões de prudência que a recomendem, a constituição
da reserva.
§ 2º A reserva será revertida no exercício em que deixarem de existir as razões
que justificaram a sua constituição ou em que ocorrer a perda.
454 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
mas a seus acionistas31
.
De acordo com Luiz Antonio de Sampaio Campos: “A transferência de recursos da sociedade para os sócios,
após a apuração do resultado do exercício social e uma vez
observada as regras especificas, não viola o princípio da in-
tangibilidade do capital social, e por consequência, não viola
o direito dos credores. Isto porque essa movimentação não
importa transferência de capital, mas apenas de lucros”32
.
A distribuição de lucros ou dividendos pelas empresas
aos seus sócios é muito benéfica, pois é considerada uma forma
legal e fiscal de remuneração dos investidores pelo capital in-
vestido no empreendimento e os valores pagos/creditados não
estão mais sujeitos à incidência de nova tributação, seja na Pes-
soa Física ou na Pessoa Jurídica.
Costuma ser feita de acordo com a participação de cada
um no contrato societário ou estatuto da empresa, contudo,
também pode não ser exatamente proporcional, desde que siga
certa razoabilidade econômica e esteja prevista no contrato
social.
A distribuição de lucros ou dividendos, quando efetuada
diretamente, pode ser entendida como a entrega de dinheiro,
credito ou qualquer outro bem ao acionista/quotista que os em-
bolsa e poderá convertê-lo em qualquer patrimônio que lhe
convir.
Por sua vez, quando há o reinvestimento daquilo que fo-
ra distribuído, o lucro da atividade empresarial do acionista ou
quotista é reaplicado na própria empresa, integralizando o pa-
trimônio da mesma.
A esse respeito o mesmo autor acima mencionado ensi-
na que o lucro, com possibilidade de ser distribuído aos acio-
31 Luiz Antonio de Sampaio Campos In. Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França
(coord.). Temas de direito societário...cit, p 428. 32 Luiz Antonio de Sampaio Campos In. Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França
(coord.). Temas de direito societário e empresarial contemporâneos –Algumas notas
sobre a utilização do lucro do exercício em curso: dividendo e recompra. São Paulo:
Melhoramentos, 2011. p. 428.
RJLB, Ano 2 (2016), nº 1 | 455
nistas sem oposição dos credores, poderá servir de recompra de
ações da própria empresa no que tange as sociedades anônimas 33
.
M.Helena Diniz faz importante ressalva sobre a matéria
no sentido de que: “A distribuição de lucros somente poderá dar-se se a situa-
ção do exercício anterior da sociedade contiver resultado po-
sitivo relativamente ao capital social, para evitar que o pa-
trimônio societário seja afetado ou sofra redução”34
.
É de suma importância, neste momento, efetuar a trans-
posição dos conceitos de lucros nas ciências econômicas pra o
universo jurídico. Isto porque o conceito econômico de lucro
encontra relevo semelhante nos ditames do direito brasileiro
que facilitam sua melhor analise.
Para todos os efeitos, pode-se afirmar que lucros nada
mais são do que frutos. Frutos, na sua concepção conceitual,
são as utilidades que uma coisa periodicamente produz. Nas-
cem e renascem da coisa, sem acarretar-lhe a destruição no
todo ou em parte.
De acordo com Pontes de Miranda, frutos são os provei-
tos econômicos que derivam da coisa conforme o destino que
ela tem35
.
Esta reflexão permite a elaborar a premissa de que os
lucros auferidos pelos quotistas ou acionistas são frutos, que
devem ser analisados sob a ótica jurídica, para, assim, verificar
sua comunicabilidade ou não entre cônjuges ou companheiros
em disputa nas ações de partilha.
VI- CONCEITO DE “REVERSÃO DE LUCROS LÍQUIDOS”
33 Luiz Antonio de Sampaio Campos In. Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França
(coord.). Temas de direito societário...cit, p 437.
34 Maria Helena Diniz. Curso de direito Civil....cit.
35 Pontes de Miranda. Tratado de Direito Privado, Tomo II, Rio de Janeiro: Bor-
soi, 1954, p.75.
456 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
Elaborado, portanto, o conceito de operação econômica
e de fruto, verificando a distinção entre aqueles que são de titu-
laridade da própria empresa e aqueles “distribuíveis” aos só-
cios, é chegado momento da análise do conceito de “reversão
de lucros líquidos”.
Reversão de lucros líquidos é a operação econômica na
qual o sócio da empresa reaplica os lucros ou dividendos que
faz jus em contraprestação ao seu trabalho ou investimento, ao
mesmo tempo em que os recebe, na própria sociedade, aumen-
tando, assim, o valor das suas quotas ou ações.
É comum os sócios de empresas, visando fortalecer a si-
tuação patrimonial e financeira dos seus negócios, incorporar
todo ou parte dos lucros distribuídos, na forma de aumento de
capital. Incorporar lucros, já tributados, ao capital social não
enseja tributação, independentemente da forma jurídica da
composição do capital social; o "bis in idem" - dupla incidência
do mesmo tributo – não se verificará nesta operação por veda-
ção constitucional.
O registro contábil correspondente ao aumento do capi-
tal social mediante aproveitamento de lucros acumulados é
realizado mediante a transferência do valor á conta de capital
social.
Importante mencionar que não há qualquer necessidade
de aprisionamento à terminologia “reversão” uma vez que se
deve, primordialmente, compreender que a operação em ques-
tão diz respeito ao que também se pode chamar de “reinvesti-
mento” ou “reaplicação”, pois todas as nomenclaturas utiliza-
das devem resultar no mesmo conceito, qual seja a aplicação
do lucro recebido pela empresa na própria empresa em um úni-
co momento.
Assim sendo, esta reposição econômica constitui-se ao
final, no aumento de capital da empresa por dois fatores que,
apesar de ocorrerem concomitantes, geram importantes resul-
tados jurídicos.
RJLB, Ano 2 (2016), nº 1 | 457
No primeiro momento ocorre a perda do patrimônio da
empresa que distribui o lucro aos acionistas o que acarreta,
obviamente, na vantagem patrimonial dos sócios. Ainda, ao
mesmo tempo, ocorre o esvaziamento deste lucro em benefício
da empresa revertendo à operação que a antecedeu.
O importante fator jurídico que aos leigos podem não
ser aparente é que no primeiro momento é possível verificar a
entrada do lucro no patrimônio do acionista/quotista ao ganhar
vantagem patrimonial que, posteriormente, servirá de acrésci-
mo, ao seu próprio capital social.
Esse benéfico, em verdade, não será embolsado mo-
mentaneamente por aquele que recebe. Haverá, nesta hipótese,
o represamento, do valor na empresa que deverá lhe assegurar
a recompensa.
Ou seja, há efetivamente aumento patrimonial do acio-
nista mesmo que, ao final da operação econômica denominada
de “reversão de lucros líquidos”, o sócio não tenha recebido
diretamente o benefício. Seu recebimento será no campo virtu-
al e em nada obstará para a construção do conceito que se pre-
tende haja vista os conceitos pré-estabelecidos no estudo.
VII - COMUNICABILIDADE DOS FRUTOS DE BENS
PARTICULARES ADQUIRIDOS À TITULO ONEROSO.
Elaborados os conceitos básicos de operação econômi-
ca, lucros e “reversão de lucros líquidos”, pode-se, neste mo-
mento, formar as principais conclusões sobre a temática para o
desfecho do presente trabalho.
Tendo em vista os regimes de bens que comportam a
comunicabilidade entre cônjuges e companheiros já apresenta-
dos, resta saber se o lucro revertido à empresa na operação de
“reversão de lucros líquidos” caracteriza-se como patrimônio
partilhável ao outro cônjuge ou companheiro após o desfazi-
mento da união familiar.
458 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
Em primeiro momento, deve-se analisar se a operação
mote deste trabalho é considerada onerosa. Tal fato é relevante,
pois como visto, os frutos dos patrimônios particulares adquiri-
dos onerosamente de cada cônjuge ou companheiro deve ser
partilhado ao seu par nos regimes de bens que assim preveem.
É possível concluir, como primeira premissa do traba-
lho apresentado que a manobra societária denominada “rever-
são de lucros líquidos” tem características conceituais e termi-
nológicas suficientes para ser considerada uma operação
econômica.
Além de seus elementos objetivos e subjetivos, com a
simples análise da palavra “reversão” é possível observar
sinônimos como “regresso”, “retorno”, “devolução”, denotando
movimentação característica do instituto. Ora, assim, pode-se
dizer que só se reverte algo que já se teve. Há, portanto, na
“reversão de lucros líquidos” circulação, movimentação ou
transferência, elementares de uma operação econômica.
Sobre o objeto daquilo que está se movimentando, é
também facilmente concebida a figura de bens objetivamente
mensuráveis, pois a reversão aqui presente é a de “lucros líqui-
dos” em recompensa a atividade empresarial, já tendo sido, no
estudo, elaborado seu conceito básico.
Tal assertiva conduz à segunda premissa do presente
trabalho. Na operação econômicas em tela há configurada, sem
dúvida, a onerosidade da circulação de bens entre sociedade-
sócio.
A característica da onerosidade nesta operação
econômica pode ser observada em diferentes hipóteses abaixo
elencadas no momento em que ocorre a distribuição de lucros
ou dividendos ao acionista/quotista.
A onerosidade da operação é facilmente verificada
quando o valor ou qualquer algo objetivamente mensurável é
recebido pelo acionista tornando-se vantagem que pode ser
transformado em qualquer outro patrimônio seja de ordem ma-
RJLB, Ano 2 (2016), nº 1 | 459
terial ou não.
Por sua vez, em situação pouco mais complexa, porém
igualmente onerosa, será no momento em que o acionista ou
quotista recebe o lucro ou dividendo preferindo, ao invés de
embolsa-lo e adquirir outros bens, reverter o benefício na pró-
pria empresa, aportando e aumentando capital na sua participa-
ção social para que dali em diante passe a ser valorizado ou
mantido seu valor no mercado individualmente. Sendo assim,
há a potencialidade de benefício assegurado ao sócio que rein-
vestiu sua participação que, de acordo com o já analisado, não
descaracterizaria a onerosidade da operação econômica.
Observadas as mencionadas qualidades da operação so-
cietária “reversão dos lucros líquidos”, aparentemente se torna
inócua a argumentação efetuada no inicio do trabalho que justi-
ficaria o afastamento da meação conjugal pela não onerosidade
da operação econômica mencionada.
Assim, conclui-se que, os cônjuges ou companheiros
que estiverem unidos sob a égide do que preceitua o regime da
comunhão parcial de bens, deverão partilhar o valor auferido
pelo lucro da quota ou da ação quando ocorrer a “reversão de
lucros líquidos” na sociedade que compõe patrimônio particu-
lar do cônjuge ou companheiro.
Tal fato pode ser ultimado pela análise do artigo 1660,
inciso V do Código Civil ao preceituar que “entrarão na co-
munhão, os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de
cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou
pendentes ao tempo de cessar a comunhão”.
Preceitua, a melhor doutrina, que os frutos ingressam
automaticamente na comunhão e são considerados como pen-
dentes quando na data da dissolução do vinculo familiar já es-
tavam percebidos ou estavam em via de ser36
.
Se os cônjuges ou companheiros forem unidos no regi-
me da comunhão universal de bens a mesma conclusão deverá
36 Paulo Luiz Netto Lôbo, Código Civil Comentado..cit. p. 292.
460 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
ser formalizada de acordo com o artigo 1669 do Código Civil.
Referida disposição preceitua que dos bens tidos como inco-
municáveis neste regime patrimonial (art. 1668 do Código Ci-
vil) aos frutos não serão aplicará tal regra quando se percebe-
rem ou vencerem durante o casamento.
Sobre mencionado dispositivo, Paulo Lôbo alude que os
frutos dos bens recebidos pelo cônjuge ou companheiro com
clausula de incomunicabilidade “são suprimidos do patrimônio
particular e integram a comunhão universal”37
.
Feitas estas conclusões, percebe-se que, os lucros pro-
venientes da operação discutida no estudo, terão o mesmo fim
daqueles bens adquiridos onerosamente na constância do ca-
samento ou união estável em superveniente dissolução do vín-
culo familiar.
VIII - ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL
Observa-se que os tribunais de justiça não se declina-
ram de analisar a matéria em apreço. No que tange, portanto, a
questão sobre a comunicabilidade dos valores auferidos como
frutos por um dos cônjuges ou companheiros sobre bem parti-
cular, tendo ocorrido à chamada “Reversão de Lucros Liqui-
dos”, o Tribunal de Justiça de São Paulo apreciou da seguinte
forma:
Nos autos da Apelação n. 400.137-4/6 o Desembarga-
dor FRANCISCO LOUREIRO prolatou acordão no sentido de
afirmar a comunicabilidade do valor dos frutos auferidos du-
rante o período do casamento verbis38.
: “Ocorre que as cotas se valorizaram durante o período do
casamento, por força de sucessivos aumentos do capital soci-
al. Foram usados, para viabilizar tais aumentos, correção
37 Paulo Luiz Netto Lôbo, Código Civil Comentado..cit. p. 313. 38 Apelação Civil n. 400.137-4/6 do Tribunal de Justiça de São Paulo, relatado pelo
do Desembargador FRANCISCO LOUREIRO, julgado em 24 de maio de 2007. –
Voto Vencido.
RJLB, Ano 2 (2016), nº 1 | 461
monetária do próprio capital, reavaliação de ativos e lucros
não distribuídos aos sócios”.
(...)
“Parece claro que os frutos gerados por bens próprios ou
comuns são destinados a contribuir para o enriquecimento da
união, razão pela qual têm vocação comunitária”.
(...)
“Parece claro que se os lucros distribuídos são bens comuns
do casal, os lucros retidos e usados para aumento do capital
social também gerarão aquestos”
(...)
“Em resumo, dá-se parcial provimento ao recurso, para re-
conhecer que a valorização das cotas da ré Rosana ocorridas
nas alterações do contrato social entre agosto de 1.994 e no-
vembro de 1.995, decorrentes do aumento do capital social
com origem na inversão de lucros suspensos ou acumulados
constitui aquestos”
Outro julgado também do Tribunal de Justiça de São
Paulo determinou que o lucro proveniente de patrimônio parti-
cular do cônjuge fosse partilhado ao outro de acordo com o que
se pode observar do acórdão proferido pelo relator Desembar-
gador JOAQUIM GARCIA nos autos do Agravo de Instrumen-
to n. 571.765-4/5, verbis39
: “Assim, embora as quotas sociais/ações da empresa Makeni
pertençam exclusivamente ao requerido, que as recebeu por
doação, os frutos daí advindos, à evidência, devem ser objeto
de partilha entre os cônjuges”.
Nesse aspecto, cumpre trazer à baila acórdão do Tribu-
nal de Justiça do Rio Grande do Sul relatado pelo Desembar-
gador SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHA-
VES, e proferido no julgamento do Agravo de Instrumento n.
70.006.007.553.
Infere-se de referido aresto que foi decidido que a parti-
lha de bens, nos casos de união estável, deve abarcar também
os frutos percebidos na constância da convivência, aplicando-
se as regras relativas ao regime da comunhão parcial de bens, 39 Agravo de Instrumento n. 571.765-4/5 do Tribunal de Justiça de São Paulo, rela-
tado pelo Desembargador JOAQUIM GARCIA. J. 18/03/2009.
462 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
verbis40
: “Nos termos do artigo 1.660, inciso V do Código Civil, apli-
cável às uniões estáveis, são partilháveis os frutos dos bens
particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do
casamento, onde se inclui a evolução patrimonial das socie-
dades mercantis do Agravado”
Corroborando o entendimento sustentado neste traba-
lho, ainda, nesse acórdão, menciona-se que: “O Novo Código Civil, ao disciplinar a união estável, man-
tém a mesma exegese conferida no art. 5º da Lei n.º 9.278/96,
determinando a aplicação das regras relativas ao regime da
comunhão parcial à partilha de bens, na hipótese de inexistir
contrato escrito celebrado entre os companheiros (art. 1.725
do Código Civil). Os bens adquiridos na constância do rela-
cionamento, a título oneroso, são partilhados entre os litigan-
tes, independente da demonstração de colaboração para a
formação do patrimônio”.
“Nesse contexto, a partilha deve incidir sobre o crescimento
patrimonial das empresas P. e M., das quais o Agravado é
sócio. Nos termos do artigo 1.660, inciso V, do Código Civil,
aplicável às uniões estáveis, são partilháveis os frutos dos
bens particulares de cada cônjuge, percebidos na constância
do casamento, onde se inclui a evolução patrimonial das so-
ciedades mercantis do Agravado”
Mais uma vez, no julgamento do Agravo de instrumen-
to n. 70004832176, em acórdão relatado pelo Desembargador
JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS, o mesmo órgão colegi-
ado teve oportunidade de patentear que41
: “Além da garantia constitucional, aplicam-se ao caso as
prescrições da Lei n. 9.278/96, que consigna serem conside-
rados como fruto do trabalho e da colaboração comum, pas-
sando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes
iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito, todos
os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os
40 Agravo de Instrumento n. 70.006.007.553 da Sétima (7ª) Câmara Cível do Tribu-
nal de Justiça do Rio Grande do Sul, relatado pelo Desembargador SÉRGIO FER-
NANDO DE VASCONCELLOS CHAVES. J. 1/12/2004. 41 Agravo de instrumento n. 70004832176 do Tribunal de Justiça de São Paulo,
relatado pelo Desembargador JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS. J. 05/11/2002
RJLB, Ano 2 (2016), nº 1 | 463
conviventes, a título oneroso, na constância da união estável
(art. 5º).
É a adoção do regime da comunhão parcial que afasta do
cabedal comum apenas os acervos herdados, sub-rogados ou
havidos antes do início da relação (Lei n. 9.278/96, artigo
5º)".
E, mais adiante, o mesmo julgado frisou que: “Portanto a partilha deve debruçar-se apenas sobre as quo-
tas sociais do Laboratório Regius Ltda., e não em sua dívida.
Ou seja, devem ser considerados os aumentos de capital fei-
tos depois de dezembro de 1976, representados por subscri-
ções novas, mais as integralizações oriunda de lucros e re-
servas, à exceção daquelas existentes antes da união.
Não se levam em conta as alterações de capital devidas pela
simples revalorização monetária das quotas antigas ou inte-
gralizações derivadas de sub-rogação de bens anteriores e
exclusivos do sócio, como já sublinhado pela sentença”
O Tribunal de Justiça Mato-grossense também aborou a
temática na Apelação n. 0001009-54.2010.8.12.0028 relatado
pelo Desembargador EDUARDO MACHADO ROCHA, no
seguinte sentido42
: “Dentre as exceções enumeradas por aqueles artigos, e que
não se comunicam ao casal (conviventes), encontram-se os
bens que sobrevierem ao casal na constância do casamento
(união estável), por doação ou sucessão e os sub-rogados
(inciso I do art. 1.659”).
(...)
“Todavia, não há como afastar seu direito de meação aos
frutos decorrentes de tais bens”.
Imperioso, entretanto, observar que não se deve con-
fundir a “reversão de lucros líquidos”, que se consubstancia no
reinvestimento dos lucros ou dividendos na empresa emissora,
com a simples valorização econômica da ação ou quota. Pode-
se imaginar inúmeras hipóteses em que quotas e ações serão
valorizadas por fatores econômicos sem qualquer aporte de
42 Apelação n. 0001009-54.2010.8.12.0028 da Terceira (3ª) Câmara Cível do Tribu-
nal de Justiça do Mato Grosso do Sul relatado pelo Desembargador EDUARDO
MACHADO ROCHA. J. 1/06/2014.
464 | RJLB, Ano 2 (2016), nº 1
capital pelo sócio ou acionista.
A esse respeito, importante consignar que existe um
precedente do C. STJ que entendeu que a valorização das cotas
sociais não seria partilhável por se tratar de mero fenômeno
econômico que independe da atuação de qualquer dos cônju-
ges. Informativo 533 do STJ
Sociedade limitada
DIREITO CIVIL. INCOMUNICABILIDADE DA VALORIZAÇÃO DE CO-
TAS SOCIAIS NO ÂMBITO DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL.
Na hipótese de dissolução de união estável subordinada ao regime da co-
munhão parcial de bens, não deve integrar o patrimônio comum, a ser
partilhado entre os companheiros, a valorização patrimonial das cotas
sociais de sociedade limitada adquiridas antes do início do período de
convivência do casal. Inicialmente, cumpre ressaltar que o regime da co-
munhão parcial de bens – aplicável, em regra, à união estável (art. 1.725
do CC/2002) – determina que não são comunicáveis os bens e direitos que
cada um dos companheiros possuir antes do início da união (como, na
hipótese, as cotas sociais de sociedade limitada), bem como os adquiridos
na sua constância a título gratuito (por doação, sucessão, os subrogados
em seu lugar etc.). Ademais, para que um bem integre o patrimônio comum
do casal, além de a aquisição ocorrer durante o período de convivência, é
necessária a presença de um segundo requisito: o crescimento patrimonial
deve advir de esforço comum, ainda que presumidamente. Nesse contexto, a
valorização de cota social, pelo contrário, é decorrência de um fenômeno
econômico, dispensando o esforço laboral da pessoa do sócio detentor, de
modo que não se faz presente, mesmo que de forma presumida, o segundo
requisito orientador da comunhão parcial de bens (o esforço comum). REsp
1.173.931-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino.
IX - CONCLUSÃO
Infere-se do presente trabalho que, a distribuição de lu-
cros pela empresa poderá ter como receptor a própria sociedade
ou seus sócios.
Daqueles lucros que são “distribuíves” aos sócios os
mesmos integralizam o patrimônio particular do acionista ou
quotista e se justifica como recompensa pela atividade empre-
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sarial.
Este lucro pertencente ao sócio poderá ser embolsado
diretamente ou reinvestido na empresa mediante a operação
econômica denomina de “Reversão dos Lucro Líquidos” com o
objetivo de agregar valor ao seu patrimônio, aumentando o
valor do capital sócial.
Observou-se que, tanto faz distribuir o lucro, através de
pagamentos em dinheiro ou pela incorporação direta do lucro
na sociedade como forma de pagamento do lucro líquido. Por
um caminho ou por outro, é entendido que os lucros auferidos
foram percebidos a título oneroso e são, portanto, comunicá-
veis ao ex-conjuge ou ex-companheiro.
A comunicação ocorrerá, caso nada tenha sido pré esta-
belecido entre as partes, nos regimes da comunhão parcial de
bens ou no da comunhão universal, conforme o legislador esta-
beleceu como regramento.
Para todos os efeitos e de acordo com as explanações do
presente trabalho conclui-se que caberá a meação, quando a lei
autorizar, ao cônjuge ou companheiro se houver valores refe-
rentes aos lucros de quotas ou ações recebidos pela operação
chamada “Reversão de Lucros Líquidos”.
a
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