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Os Maias
Eça de Queirós
O Ramalhete
LOCALIZAÇÃO ESPÁCIO-TEMPORAL
TEMPO
• «Outono de 1875»
ESPAÇO
• Em Lisboa, na «Rua
de S. Francisco de
Paula», no «bairro
das Janelas
Verdes»
– «os Maias vieram
habitar em Lisboa»
a «Casa do
Ramalhete».
DESCRIÇÃO DO RAMALHETE
CONTRASTE entre• A EVOCAÇÃO ENGANADORA DO NOME:
– «Apesar deste fresco nome de vivenda campestre» (assinale-se o uso da concessiva).
• A APARÊNCIA E A ESSÊNCIA DA HABITAÇÃO:
– «o Ramalhete, sombrio casarão de paredes severas, com um renque de estreitas varandas de ferro no primeiro andar, e por cima uma tímida fila de janelinhas abrigadas à beira do telhado, tinha o aspeto tristonho de residência eclesiástica que competia a uma edificação do reinado da senhora D. Maria I».
O RAMALHETE / OS GIRASSÓIS• «O nome do Ramalhete
provinha decerto de um revestimento quadrado de azulejos fazendo painel no lugar heráldico do Escudo de Armas, que nunca chegara a ser colocado, e representando um grande ramo de girassóis […]»
ANALEPSE DESCRITIVA
• Reforça a conotação religiosa da habitação:
–«Em 1858 monsenhor Buccarini», núncio do Papa,
encara com bons olhos a ideia de aí instalar a
Nunciatura, «seduzido pela gravidade clerical
do edifício e pela paz dormente do bairro»
ANALEPSE DESCRITIVA
• Introduz alguns motivos que sugerem uma dimensão de vitalidade e erotismo:
–Os frescos desmaiados das paredes onde se notavam ainda «as faces dos cupidinhos»;
–«uma estátua de mármore» no jardim que representava «Vénus Citereia».
ANALEPSE DESCRITIVA
• Contudo, prevalece uma imagem de ruínae lenta degradação, sobretudo no exterior:
–«um pobre quintal inculto, abandonado às ervas bravas»;
–a estátua «enegrecendo a um canto na lenta humidade das ramagens silvestres»;
–Por isso, o administrador dos Maias, o Vilaça Júnior, lhe chama «inútil pardieiro».
CARACTERIZAÇÃO DA FAMÍLIA
• Uma família beirã de antiga linhagem;
• «Pouco numerosa»:
– «sem linhas colaterais, sem parentelas — e agora reduzida a dois varões, o senhor da casa, Afonso da Maia […] e o seu neto Carlos […]»;
• Com rendimentos consideráveis:– «excedia já cinquenta mil cruzados»;
• E muito património imobiliário:– Para além do Ramalhete:
– Um palacete em Benfica (vendido em 1870);
– Uma propriedade na Tojeira (também alienada por esta altura);
– Uma quinta em Santa Olávia, nas margens do Douro (onde viviam desde a Regeneração).
INDÍCIOS TRÁGICOS
• Palacete de Benfica:
–«[…] pela razão de aqueles muros terem visto tantos desgostos domésticos»;
• Casa do Ramalhete:
–«[…] uma lenda, segundo a qual eram sempre fatais aos Maias as paredes do Ramalhete […]»
A TRANSFORMAÇÃO DO RAMALHETE
• A escolha do arquiteto / do estilo:
– Vilaça indigita o Esteves, arquiteto e político, que concebe um estilo evocador dos Descobrimentos («uma escada aparatosa, flanqueada por duas figuras simbolizando as conquistas da Guiné e da Índia»);
– Carlos aparece com um «arquiteto-decorador de Londres», que procura criar «um interior confortável, de luxo inteligente e sóbrio».
• Na batalha entre a estética portuguesa, pomposa e histórica, e o gosto inglês, mais simples e harmonioso, ganha o segundo, cosmopolita e moderno, do agrado de Carlos.
A TRANSFORMAÇÃO DO RAMALHETE
• Renovação profunda (exceto a fachada):
– «do antigo Ramalhete só restava a fachada tristonha, que Afonso não quisera alterada por constituir a fisionomia da casa.».
• O pátio:
–Ganha uma nova vida e até a Vénus parece «agora, no seu tom claro de estátua de parque, ter chegado de Versalhes, do fundo do Grande Século…».
A TRANSFORMAÇÃO DO RAMALHETE
• No interior é notória a distinção entre os aposentos de Carlos e os de Afonso da Maia:
–Os primeiros «não eram aposentos de médico — mas de dançarina» (segundo o Vilaça);
–O escritório de Afonso estava «revestido de damascos vermelhos, como uma velha câmara de prelado» apresentava um mobiliário robusto («maciça mesa de pau-preto»), «o solene luxo das encadernações» dos livros. A «feição austera de paz estudiosa».
AFONSO DA MAIA• A disciplina física do ancião:
– «Naquela idade, de verão ou de inverno, ao romper do Sol, estava a pé, saindo logo para a quinta, depois da sua boa oração da manhã que era um grande mergulho na água fria.»
• A religiosidade naturalista:
– «Sempre tivera o amor supersticioso da água […]. O que o prendera mais a Santa Olávia fora a sua grande riqueza de águas vivas, nascentes, repuxos, tranquilo espelhar de águas paradas, fresco murmúrio de águas regantes...»
AFONSO DA MAIA
• A longevidade hereditária e cultivada no contacto com a natureza:
– «E a esta viva tonificação da água atribuía ele o ter vindo assim, desde o começo do século, sem uma dor e sem uma doença, mantendo a rica tradição de saúde da sua família, duro, resistente aos desgostos e anos — que passavam por ele, tão em vão, como passavam em vão, pelos seus robles de Santa Olávia, anos e vendavais.»
AFONSO DA MAIA
• Um físico «heroico»:
–«Afonso era um pouco baixo, maciço, de ombros quadrados e fortes: e com a sua face larga de nariz aquilino, a pele corada, quase vermelha, o cabelo branco todo cortado à escovinha, e a barba de neve aguda e longa — lembrava, como dizia Carlos, um varão esforçado das idades heroicas, um D. Duarte de Meneses ou um Afonso de Albuquerque.»
AFONSO DA MAIA
• Um temperamento «bonacheirão» e hábitos cultos:
–«Não, não era Meneses, nem Albuquerque, apenas um antepassado bonacheirão que amava os seus livros, o conchego da sua poltrona, o seu whist ao canto do fogão. Ele mesmo costumava dizer que era simplesmente um egoísta […].»
AFONSO DA MAIA• Um coração generoso e benemérito:
–«[…] nunca, como agora na velhice, as generosidades do seu coração tinham sido tão profundas e largas. Parte do seu rendimento ia-se-lhe por entre os dedos, esparsamente, numa caridade enternecida. Cada vez amava mais o que é pobre e o que é fraco. Em Santa Olávia, as crianças corriam para ele, dos portais, sentindo-o acariciador e paciente. Tudo o que vive lhe merecia amor».
AFONSO DA MAIA
• Uma pose de patriarca:
–«[…] quando o vinha encontrar ao
canto da chaminé, na sua coçada
quinzena de veludilho, sereno,
risonho, com um livro na mão, o seu
velho gato aos pés», Afonso
assemelhava-se a um patriarca.