Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
1 Professora PDE 2013 – Colégio Estadual do Campo Antônio Lacerda Braga [email protected] 2 Orientador – UTFPR – Universidade tecnológica Federal do Paraná [email protected]
AS REAÇÕES QUÍMICAS E A PRODUÇÃO ARTESANAL DE
MATERIAIS DE LIMPEZA DOMÉSTICA
Beatriz Valéria Donadel ¹
Prof. Dr. Nilson Bueno Kominek ²
Resumo:
O presente artigo relata a construção e a implementação de uma experiência pedagógica, ocorrida no Colégio Estadual do Campo Antônio Lacerda Braga, distrito de Mariental, município da Lapa, estado do Paraná, com turma do 9º ano do Ensino Fundamental. O tema trabalhado, dentro da disciplina de Ciências, foi o de “Reações Químicas”. O diferencial ficou por conta da utilização da produção artesanal de materiais de limpeza para a compreensão do conteúdo. Teve como apoio a teoria da aprendizagem significativa, de Ausubel, em que o aprendiz ancora seus novos saberes nas experiências anteriores, e as concepções de Vygostsky, que defende que o aprendizado se dá através das experiências e da interação social. Este trabalho focou o ensino contextualizado e significativo para a realidade dos alunos, apresentando os aspectos teóricos e práticos e buscando envolver a comunidade escolar no desenvolvimento do processo. Os resultados demonstraram que o aprendizado foi consistente e que também se pode usar a Química como instrumento conscientizador de preservação de meio ambiente e de desenvolvimento de cidadania. Com a utilização do recurso de práticas diferenciadas percebeu-se que estas merecem lugar de destaque na metodologia do ensino de Ciências, pois podem colaborar na obtenção de resultados positivos, uma vez que proporcionam condições para a promoção da aprendizagem significativa e demonstram que a Ciência está presente no cotidiano das pessoas.
Palavras-chave: química ensino fundamental; reações químicas; produção materiais limpeza;
química no cotidiano; contextualização da química
1 INTRODUÇÃO
Para iniciar a apresentação deste artigo, uma antiga expressão popular serve
perfeitamente para fazer uma ilustração: “certas coisas saem melhor que a
encomenda”. Muitas vezes o professor se fixa em certo objetivo e no caminhar de
seu trabalho percebe que é possível alcançar muito mais que ele almejava no
princípio.
Isso pode acontecer com qualquer disciplina, mas a área das Ciências
Naturais é extremamente propícia para tal. Talvez porque este professor seja um
curioso por excelência, talvez porque seus aprendizes já o vejam como um
“inventador de moda”. O fato é que trabalhar com Ciências no Ensino Fundamental
constitui-se um interessante desafio, uma vez que ela abriga diversas áreas do
saber, como a Química, a Física, a Biologia, a Geologia, a Astronomia, entre outras.
Outro aspecto característico em Ciências é a sua constante atualização, com as
descobertas e com os novos conceitos que chegam a todo o momento para
transformar o que antes se tinha por verdade científica.
Quando o plano anual elenca os vários conteúdos a serem trabalhados em
um ano letivo, ele parece uma mera lista de saberes a serem passados aos alunos.
Contudo, cada um deles encerra em si infinitas possibilidades para trabalhá-lo e
relacioná-lo com outros temas. A partir do desejo de trabalhar significativamente o
conteúdo de “Reações Químicas”, foi possível descobrir como este assunto pode
contribuir para a formação da consciência cidadã do aluno e de todos os que
participam do dia a dia de uma escola. Afinal, toda a comunidade escolar pode
colaborar com seus saberes e também aprender novos conceitos quando se abre a
porta da sala de aula para acolhê-la.
Cada pessoa que participa da vida escolar pode descobrir, ensinar e
aprender. Mesmo nos percalços e imprevistos é possível obter ensinamentos, pois,
é quando surge a preocupação acerca daquela experimentação que não funcionou
como se esperava, é que as maiores lições são transmitidas. O domínio do saber se
revela como instrumento para a libertação do seu humano. A oportunidade de se
poder partilhar algo aprendido traz um sentimento de “pertencimento” ao seu meio e
de satisfação consigo mesmo.
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Este trabalho proporcionou ao aluno a aprendizagem de “Reações
Químicas”, conteúdo de Química previsto para o 9º ano do Ensino Fundamental, de
uma maneira contextualizada, com envolvimento do trabalho realizado em grupo e
colaboração coletiva nos experimentos práticos. Normalmente, quando um aluno fica
sabendo que vai ter aulas de Química, imagina um mundo distante de si, com
fórmulas incompreensíveis e cientistas que não conhece. Aqui, a ideia foi partir de
algo já conhecido, discutir o assunto e fazer a mediação entre o saber conhecido e o
saber proposto.
2.1 APRENDIZAGEM SEGUNDO AUSUBEL E VYGOTSKY
“Se eu tivesse que reduzir toda psicologia educacional a um único princípio, diria isto: O fator isolado mais importante que influencia a aprendizagem é aquilo que o aprendiz já conhece. Descubra o que ele sabe e baseie nisso seus ensinamentos.” (David Ausubel)
Quando se fala em contextualizar o que se ensina, esta proposta encontra
ratificação no pensamento de Ausubel. Como se pode ler em Praia (2000), David
Ausubel é um psicólogo da atualidade, que defende que o aprendizado se dá
quando a pessoa se interessa pelo assunto e tem estrutura cognitiva já adquirida
para compreendê-lo. Deste modo, a aquisição de conhecimento depende sempre de
conhecimentos prévios, isto é, um novo aprendizado irá se ancorar no que já foi
aprendido anteriormente. Com essa definição, ficou célebre a sua frase supracitada
no início desta seção. Ainda de acordo com Praia (2000, p. 123), “Na aprendizagem
significativa as novas ideias e informações interagem com um conhecimento prévio
existente na estrutura cognitiva do indivíduo, definido por Ausubel como sendo
ideias-âncora (subsumers)”. Seguindo este raciocínio, se o aluno não possuir
conhecimentos para “ancorar” o novo aprendizado, é preciso antes de tudo
providenciá-los.
No momento em que se questiona se uma pessoa pode aprender alguma
coisa sem que ela tenha algum conhecimento prévio relacionado com o assunto,
Pelizzari et al. (2002) esclarece que, de acordo com Ausubel, é possível que uma
pessoa memorize mecanicamente algo, como uma fórmula matemática, uma
sequência de movimentos e a aplique/execute por algum tempo. Contudo, por não
haver significação lógica para ela, brevemente perderá a lembrança. Estes autores
também mencionam, assim como Praia (2000), as duas condições básicas para um
aprendizado, ainda segundo Ausubel: interesse pelo conteúdo e presença de algum
sentido lógico no que se quer aprender, sempre de acordo com a visão do aprendiz.
Em resumo, quanto à maneira de se aprender, ela estaria dividida em duas
categorias: a aprendizagem significativa e a memorística (mecânica):
“Quanto mais se relaciona o novo conteúdo de maneira substancial e não arbitrária com algum aspecto da estrutura cognitiva prévia que lhe for relevante, mais próximo se está da aprendizagem significativa. Quanto menos se estabelece esse tipo de relação, mais próxima se está da aprendizagem mecânica ou repetitiva. (PELIZZARI et al, 2002, p. 39)
O aprendizado através de experiências e com interação social também
encontra fundamentação no pensamento de Vygotsky (1991). Para o autor, o
professor é um mediador que irá levar o conhecimento ao seu aluno, através de uma
interação social. Nestas condições, as experimentações práticas serão a maneira de
promover a interação social e o ambiente propício para a aprendizagem. Como ele
afirma que o ser humano é resultado principalmente das suas relações sociais,
então é necessária uma investigação dos saberes prévios do aluno, para que o
professor, neste caso o parceiro mais capaz, possa fazer a intermediação com o
novo conhecimento.
Uma das grandes contribuições de Vygotsky (2002) foi a elaboração do
conceito de “zona de desenvolvimento próximo”. Aqui, ele afirma que se trata da
situação em que uma criança não consegue desenvolver um aprendizado sozinha,
necessitando da ajuda de alguém. Esta pessoa pode ser um adulto ou outra criança
que já domina o conteúdo.
Esta teoria é de grande valor para a área da educação: o professor age
nesta zona de desenvolvimento próximo para buscar a aquisição do saber. Para
este autor, é possível à criança conseguir alguns aprendizados sozinha, apenas
observando e tentando por si mesma compreender e se inteirar de um assunto.
Entretanto, há conceitos que ela somente será capaz de aprender contando com a
intervenção de alguém que já os domine. É aqui que age o professor, que media a
aprendizagem, fazendo a interação social.
A Teoria da Aprendizagem Significativa de Ausubel e a Pedagogia
Sociocultural de Vygostky são a fundamentação teórica para a realização deste
trabalho. A busca é pelo aprendizado através de apreensão de conceitos que façam
sentido para o aluno e que estes sejam adquiridos através da interação social entre
os envolvidos no projeto.
2.2 O ENSINO DAS CIÊNCIAS NO BRASIL
Para se compreender como se ensina Ciências hoje no Brasil, é preciso
rever as últimas décadas. Uma análise a partir da década de 1950 sobre os
principais fatos e tendências que influenciaram o ensino nesta área ao longo deste
tempo, esclarece em muitos pontos o atual estágio em que ele se encontra.
Durante a década de 1950, para muitos pesquisadores, entre eles Mól
(2011) e Krasilchik (2000), o Brasil foi muito influenciado pelo modelo norte
americano no ensino das Ciências. Buscava-se privilegiar os alunos mais talentosos
nas áreas como Biologia, Física e Química. Com isso, a dedicação era focada aos
mais aptos para estas áreas.
No início dos anos 1960, pregou-se o acesso de todos ao saber. As Ciências
foram privilegiadas com um aumento de carga horária no ginásio e no colégio. Tal
norteamento para educação logo foi alterado, com a chegada do regime militar, em
1964. Agora, o foco era na formação profissional. Com isso, o ensino de Ciências
foi descaracterizado, pois nele queria-se adaptar este objetivo (KRASILCHIK, 2000).
Como consequência da promulgação da Constituição Federal de 1988, foi
elaborada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, sob o nº 9394, de 1996. De
acordo com esta lei, o cidadão tem direito a uma educação básica, educação infantil,
ensino fundamental e médio, sendo que nestes dois últimos ele deverá ter:
“A formação básica do cidadão na escola fundamental exige o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo, a compreensão do ambiente material e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade. O ensino médio tem a função de consolidação dos conhecimentos e a preparação para o trabalho e a cidadania para continuar aprendendo.” (KRASILCHIK, 2000, p. 87)
Para cumprir o que diz a lei, o MEC lançou mão de políticas específicas e da
distribuição dos parâmetros curriculares, das diretrizes, dos sistemas institucionais
de avaliação e a busca da inclusão de todos dentro do ambiente escolar. Contudo, a
realidade ainda é caracterizada por um ensino precário, marcado por falta de
condições de trabalho para o professor, pela sobrecarga de trabalho, carência de
recursos e de formação acadêmica deficiente. Como em outras disciplinas, o ensino
de Ciências sofre a influência das políticas educacionais implementadas pela
UNESCO, Banco Mundial e Banco Interamericano, entre outros, que se baseiam em
sistemas de avaliações internacionais. De acordo com os resultados das avaliações,
analisam-se as metas propostas e direcionam-se projetos e recursos financeiros.
Apesar das discussões acerca do que realmente se pode apurar em termos de
aprendizado com essas avaliações, o sistema educacional é pressionado a obter
conceitos numéricos, mesmo que questionáveis, melhores. (LIBÂNEO, 2012).
Dentro desta realidade, algumas vezes, o professor tem compreendido as
Ciências como conhecimento livresco, a ser fragmentado e repassado ao aluno.
Entender que ensinar Ciências é promover a discussão do que já se tem como
verdade científica e partir para novas descobertas é uma ideia que vem ganhando
terreno aos poucos, difundida pelos pesquisadores e educadores.
2.3 ALGUMAS PROPOSTAS PEDAGÓGICAS RELACIONADAS AO ENSINO DA
QUÍMICA
Dentre as experiências de utilização de práticas associadas à aprendizagem
da Química, algumas propostas foram analisadas e serviram como inspiração e
ponto de partida para a reflexão e o desenvolvimento desta pesquisa. Estas são
apresentadas e discutidas a seguir.
O ensino da química normalmente se destina a alunos do ensino médio ou,
quando muito, das séries finais do ensino fundamental. Ao mencionar a introdução
mais precoce da Química no Ensino Fundamental, Zanon e Palharini (1995), tratam
da abordagem de conceitos da disciplina já na 4ª série (5º ano), levando os alunos
ao estudo prático de fenômenos químicos, com a posterior introdução da linguagem
científica e das explicações técnicas. Estes autores, baseados em Freire e Shor
(1987), afirmam que cada vez menos se aprende as palavras com o seu significado.
Por esse motivo, os alunos cada vez mais apenas absorvem mais e mais
vocabulário, mas sem uma compreensão lógica do que eles significam. Assim
sendo, os autores demonstram através de uma experiência pedagógica em uma
escola do Rio Grande do Sul, que a Química pode ser abordada já nas séries iniciais
do Ensino Fundamental, dentro dos conteúdos previstos em Ciências. Isso
proporcionaria melhor aprendizado ao longo deste período e encaminharia alunos
mais bem preparados ao Ensino Médio para trabalhar com Química.
Este tema é discutido por Chassot et al (1993), que defendem a produção
constante de material didático por parte dos professores, para a reconstrução de
conceitos de Química. Compartilhando do pensamento de Piaget, expresso por
Goulart (1989), em que se deve ensinar conforme o estágio de desenvolvimento da
criança, os autores afirmam que muitas vezes a tentativa de abstração vem muito
cedo, prejudicando a compreensão e desmotivando os estudantes. Este material
não se trataria de algo pronto e acabado, mas sim de trabalhos constantemente
revisados e modificados. Segundo os autores, o ensino desta disciplina necessita de
uma metodologia que vise mostrar que a Química é útil para a vida, está inserida no
contexto da comunidade em que a escola está localizada e que pode proporcionar o
desenvolvimento da criticidade do cidadão, aprimorando sua capacidade de
cognição. Em suas palavras, a proposta é: “uma Química contextualizada, politizada
e útil para o futuro do cidadão”.
Dentro deste pensamento, o objetivo é o aluno compreender o que ocorre no
cotidiano e, a partir da aquisição do conhecimento, poder tomar decisões que
modifiquem o seu mundo. Estas ações acabariam por transcender a disciplina, pois
incentivariam a formação de estudantes que procuram a comprovação dos
conhecimentos adquiridos, são capazes de analisá-los, problematizam e resolvem
questões, entre outros aspectos. Os autores adotam uma postura de ensino não
apenas contextualizado, mas útil e transformador da realidade do aluno. Na maioria
das vezes, os professores de Química só pensam no experimento como método de
comprovação. Desta forma, perde-se uma grande parte da potencialidade da
disciplina, que poderia servir como instrumento conscientizador e transformador da
comunidade.
Para Galliazi e Gonçalves (2004), a experimentação é vista como uma
experiência pedagógica. Os autores contestam a visão simplista de que a função
das experiências é somente reafirmar uma teoria ou uma maneira de motivação das
aulas, presa a um conteúdo. Baseados em Pedro Demo (2000), eles veem o desafio
como um ponto de partida no ensino, que leva sempre além do que foi proposto. A
disposição em aceitar ser desafiado incentiva o aprender:
“Apenas escutar ou repetir algo é como estocá-lo de tal modo que teremos dificuldade de encontrar quando quisermos rememorar. Se elaboramos nossa aprendizagem pelo pensar acerca de suas relações com outras coisas que conhecemos ou por falar a respeito delas - explicando, resumindo ou questionando - saberemos melhor rememorar quando for necessário". (DEMO, 2000, p. 28)
Para os autores, há a necessidade de se despertar, dentro da
contextualização do que se quer ensinar ao aluno, as questões culturais, sociais,
econômicas e políticas envolvidas no processo. Uma vez que o saber científico se
constrói através da busca da solução de problemas, não se justifica utilizar uma
experiência apenas para motivar ou comprovar um saber, mas sim para se perceber
que se chega ao saber científico através da problematização, da argumentação e da
validação de um argumento. Outro aspecto importante apresentado pelos autores foi
a importância da atitude questionadora e mediadora do professor na condução da
atividade, que evita impor as teorias aceitas como verdades e instiga o aluno a
procurar suas respostas.
O presente trabalho segue a linha dos demais aqui elencados em vários
aspectos. Entre eles, pode-se ressaltar a intenção de ensinar um conteúdo de
maneira contextualizada, para que o aluno compreenda melhor como ele está
presente no cotidiano. Esta maneira de ver a disciplina contribui para a sua
desmistificação: a Química transcende a visão simplista de que ela estaria
encerrada em livros com fórmulas ou em laboratórios, sendo manipulada apenas por
determinados profissionais. A Química, além de presente no cotidiano, é um
instrumento de informação e conscientização da população. Informação porque as
pessoas poderão entender melhor como ela funciona. Conscientização porque o
acesso a ela trará uma liberdade de escolha maior para o cidadão: se ele entende a
composição química de um produto, poderá consumi-lo de maneira mais consciente.
Nesta proposta, em que os alunos puderam ver como se produz alguns materiais
domésticos de limpeza, criou-se para eles e as famílias uma opção de obtê-los a
menor custo e ainda os instigou a procurar saber como se fazem outros produtos
que lhes são úteis.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa foi desenvolvida cumprindo as seguintes etapas: elaboração
do projeto de intervenção pedagógica, produção de caderno pedagógico,
implementação de projeto de intervenção na escola e produção de artigo final.
O público que participou da implementação deste projeto foram alunos de
Ensino Fundamental, do 9º ano na disciplina de Ciências, no Colégio Estadual do
Campo Antônio Lacerda Braga, município da Lapa, no Estado do Paraná. O
conteúdo contemplado na intervenção pedagógica foi o das “reações químicas”. O
tempo de aplicação desta experimentação em sala de aula foi de 32 horas-aula,
sendo que 12 horas-aula (parte teórica) foram ministradas no período normal e as
outras 20 horas-aula (experimentos práticos e socialização com a comunidade das
atividades) em período de contraturno. O período em que se realizou este trabalho
foi durante os meses de março e abril de 2014.
Para o respaldo pedagógico da presente proposta, foram consultados
autores que estudam a aprendizagem da química e as dificuldades que a rodeiam,
enfatizando e buscando o caráter significativo durante todo o processo. A realidade
do ensino de química atesta que tal estratégia não é corrente nos ensinos
fundamental e médio. Por esta razão, este trabalho contemplou o ensino do
conteúdo “reações químicas”, a partir das premissas de aprendizagem significativa
de Ausubel e Vygotsky. Enfocou-se uma abordagem do ensino da química através
da utilização de experimentos práticos para a melhor compreensão do conteúdo a
ser ensinado em sala de aula e a utilização da prática escolar para o
desenvolvimento do pensamento crítico que se origina a partir da reflexão e da
discussão.
Este estudo foi desenvolvido nos moldes da pesquisa qualitativa. Este tipo
de pesquisa se preocupa com os fenômenos sociais, que não podem (ou não
devem) ser medidos apenas em números, pois trata da interpretação da realidade
social. Nas palavras de Minayo (2009, p. 21) “ela trabalha com o universo dos
significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes”.
Dessa maneira, cabe a interpretação dos fatos através das impressões que o
pesquisador capta durante o processo de pesquisa, e não se prende a uma
comprovação estatística.
A intervenção pedagógica efetivada apresenta estas especificidades, uma
vez que ela buscou estabelecer um rol de habilidades que os alunos desenvolveram
a partir da sua implementação. Ao proporcionar um aprendizado mais
contextualizado, o intento foi fazer com que os alunos, além de compreender melhor
a química, pudessem entender melhor a sua relação com o cotidiano. Além disso,
buscou-se despertar a capacidade de relacionar novos conceitos a partir destes
aprendidos neste trabalho, não só na produção de materiais de limpeza, mas em
outros momentos em que a vida o desafie a compreender e relacionar o seu saber
com as situações que vive. Não se trata apenas de uma questão de aprender mais,
mas de proporcionar aos alunos uma maneira prazerosa e instigante de aprender.
Foi observada a questão de despertar o gosto em participar da aula, em
conformidade com Minayo (2009, p. 79), que afirma que a pesquisa qualitativa foca
“a exploração do conjunto de opiniões e representações sociais sobre o tema que
pretende investigar”.
Dentro das modalidades descritas como ramos da pesquisa qualitativa, a
pesquisa-ação contribui na caracterização da metodologia utilizada. Comumente
aliada à pratica educativa, nesta técnica de pesquisa o professor é o pesquisador e
o agente que transforma a educação. A proposta da pesquisa é partilhar os
conhecimentos que foram adquiridos através da ação educativa, onde os alunos
atuam como parceiros na construção do conhecimento. A intenção é superar a
divisão que existe em teoria e prática dentro da educação. (TOZONI-REIS, 2009).
Depois da construção do projeto, o passo seguinte foi a elaboração do
material didático utilizado na sala de aula na intervenção pedagógica, a Unidade
Didática. Nela estão descritas as atividades realizadas, onde o diferencial é a
utilização da produção de materiais de limpeza, com o objetivo de se promover a
contextualização do ensino do conteúdo. Esta Unidade Didática passou por uma
adaptação para constituir um caderno de teorias e atividades para o uso de cada
aluno. Ao se utilizar a produção de materiais que serão utilizados nos lares dos
alunos como ferramenta de ensino, e não apenas se reproduzir uma simples reação
química em laboratório, criou-se um diferencial nas aulas ministradas.
Ao início do trabalho em sala de aula, os alunos foram submetidos a um pré-
teste, que verificou que tipos de conceitos acerca do conteúdo eles já possuíam e
quais são as suposições que faziam a respeito. Também, através deste diagnóstico
inicial, foi possível verificar quais pontos seriam necessários esclarecer com os
estudantes, para que eles tivessem condições de melhor compreender as aulas que
se seguiram.
As atividades realizadas no período normal de aulas foram: aplicação do
pré-teste, exposição do conteúdo, realização de discussões e reflexões e avaliação
ao final do trabalho. No contraturno foram realizadas as experiências e a
socialização com a comunidade escolar do aprendizado e das produções artesanais
dos materiais de limpeza. Esta socialização consistiu na apresentação para os
demais alunos do estabelecimento escolar dos produtos preparados em aula e da
divulgação das receitas. Além disso, cada aluno levou para sua casa uma amostra
dos materiais de cuja produção participou.
Durante o período de implementação da atividade pedagógica, também foi
tutoriado um Grupo de Trabalho em Rede (GTR), em ambiente virtual de
aprendizagem. Nesta atividade, participaram como alunos 17 professores do estado
e nele foram apresentados o projeto, a unidade didática e o plano de implementação
em sala de aula referentes ao trabalho desta professora em seu PDE. Foi uma
oportunidade de socializar com outros professores do estado do Paraná todo o
trabalho realizado até então, refletir, trocar opiniões e receber sugestões para as
aulas.
Para reunir todos os estudos teóricos e apresentar os resultados obtidos na
prática pedagógica, bem como as reflexões acerca de todo o percurso realizado, foi
elaborado o presente artigo científico, a última etapa da pesquisa.
4 RESULTADOS OBTIDOS
Ao iniciar a implementação do projeto, a primeira aula foi destinada à
aplicação do pré-teste (apêndice deste artigo), que identificou o conhecimento prévio
dos alunos e também serviu de teste ao final das aulas, para a verificação da
evolução apresentada por cada aluno da turma. Neste pré-teste houve acerto de
40% das questões propostas.
A apresentação das experiências e a distribuição de amostras de sabão em
barra foram bem recebidas. A comunidade escolar interessou-se bastante pela
aplicabilidade dos produtos obtidos através das experiências escolares em seu
cotidiano. Duas questões foram mais mencionadas: o aproveitamento do óleo de
cozinha usado, que se trata de um “lixo incômodo”, que as pessoas da região têm
problemas em descartar e a possibilidade de economia ao se fazer esses produtos
em casa em lugar de comprá-los.
A primeira experiência realizada foi a do sabão em barra. Aqui ocorreu um
imprevisto. A receita correta não leva álcool, porém a pessoa que forneceu o óleo
usado tem o hábito de acrescentá-lo ao fazer as suas frituras. Isso ocasionou
problemas na manufatura da receita, que reagiu rápido demais e adquiriu outra
textura. Apesar da preocupação e do desconforto, a discussão gerada foi produtiva e
serviu de motivo para investigação. Existem inúmeras receitas de sabão caseiro que
levam algum tipo de álcool, mas esta, especificamente, não.
As aulas de preparação de produtos de limpeza receberam várias visitas de
pessoas da comunidade escolar em geral. Muitos solicitaram as receitas e, depois
disso, relataram que as fizeram em suas casas. Também verificou-se um maior
interesse dos alunos pela Química durante a realização das experiências. Durante o
acompanhamento dos procedimentos, diversas questões sobre Química em geral
surgiram para a discussão, motivados pela percepção que está ciência está
presente no dia a dia das pessoas.
Outro aspecto muito comentado pelos alunos foi a desmitificação acerca dos
materiais usados para a preparação dos diversos produtos de limpeza. Eles
puderam perceber que muitas das substâncias utilizadas são muito conhecidas e
que as reações químicas nada têm de “mágicas”, elas têm uma explicação lógica.
Esta explicação fundamentou-se melhor quando se ensinou as equações
químicas e o seu balanceamento. Houve uma boa compreensão dos alunos que a
matéria não se cria e nem se perde, apenas se transforma, conforme a Lei de
Conservação de Massas de Lavoisier. Quando da reaplicação do teste ao final,
houve 80% de acerto na questão 3, que tratava do tema.
Mesmo demonstrando uma compreensão geral desta questão, houve muitas
dúvidas na realização do balanceamento das equações químicas. A turma
demonstrou pouca maturidade para a resolução destes exercícios. A respeito deste
assunto, professores participantes do Grupo de Trabalho em Rede comentaram a
dificuldade que seus alunos também têm em aprender este tema.
Diversas pessoas da comunidade vieram acompanhar a produção dos
materiais de limpeza, levaram as receitas e trouxeram retorno. Comunicaram que a
produção caseira foi bem sucedida e ficaram satisfeitos em aproveitar o óleo de
cozinha usado que possuíam em casa e fazer um material de qualidade e de baixo
custo. Houve necessidade de ensinar a se substituir a soda líquida por soda em
escamas com água, pois não se encontrou a versão líquida no comércio local.
Um dos objetivos propostos no projeto era a implementação de uma sala que
servisse de laboratório de química no colégio. Tal intento frustrou-se, pelo motivo
que a comunidade não conta com serviço de rede de esgoto e, por isso, não se
permite o descarte dos resíduos de experiências químicas em fossa séptica.
Ao fim da implementação do projeto, o mesmo teste utilizado no início foi
novamente aplicado aos alunos. Desta vez, houve acerto de 70% das questões.
Além da melhora quantitativa em acertos, verificou-se que as respostas foram
melhor elaboradas, com argumentos mais consistentes para justificá-las.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Todo o processo de pesquisa, preparo de material e implementação
pedagógica é uma oportunidade única para o professor que cursa o PDE.
Estar por um ano afastado de sala de aula oportuniza a reflexão do trabalho
realizado e o convívio com as diferentes realidades vividas por outros educadores
em diferentes escolas estaduais abre portas para a aquisição de conhecimentos e
proporciona um novo incentivo para se prosseguir na carreira.
O fato de se preparar um material específico para a realidade em que se vive
também mostrou ser algo de muita valia. Foi possível sentir a valorização que a
comunidade escolar deu para as aulas ministradas e para a oportunidade de se
aprender um pouco da ciência que está no cotidiano. Apesar de o livro didático ser
um grande parceiro de trabalho do professor, ele é construído de maneira que
contemple o maior número de realidades possível, já o trabalho do professor PDE é
voltado especificamente para a vivência daquela comunidade.
É claro que a produção de um professor PDE pode ser utilizada integral ou
parcialmente por outros professores e em outras escolas, mas a chance de se fazer
um trabalho específico para seu próprio público é uma oportunidade enriquecedora
para todos os envolvidos. Este aproveitamento do material foi bastante mencionado
entre os professores participantes do GTR – Grupo de Trabalho em Rede tutoriado
por esta professora. Estes docentes, que lecionam em diversos pontos do estado,
demonstraram serem profissionais comprometidos com a educação e contribuíram
muito com o desenvolvimento da implementação em sala de aula, com suas
sugestões e opiniões a respeito do processo que estava em pleno andamento
naquele momento.
A implementação comprovou, não apenas pela verificação dos testes escritos,
mas também pela aceitação dos envolvidos no processo, como é importante
oferecer aos alunos o conteúdo de uma maneira voltada para a realidade deles. É
muito construtivo demonstrar que se pode usar o que se sabe para aprender a
ciência e, de outro lado, utilizá-la para melhor viver sua cidadania. A realização das
atividades previstas lançou um novo olhar por parte dos envolvidos no processo, no
modo de se entender a Química. A abordagem dos temas seguintes ao de Reações
Químicas no Plano Curricular tem procurado, agora mais do que nunca, transcender
a transmissão do conteúdo, visando desenvolver o pensamento crítico através da
aquisição do conhecimento científico. Tal concepção tem sido continuamente
reforçada no decorrer das aulas, através de atividades práticas e da busca de
informações em livros, revistas e textos na internet. Tudo isso comprova que a
Química participa do dia a dia das pessoas e que melhor compreendê-la influencia
na melhoria da qualidade de vida de todos.
A aplicação desta ideia também proporcionou um olhar sobre a questão do
meio ambiente e da economia nos lares, uma vez que há reaproveitamento de
materiais e barateamento de custos. As reflexões e as discussões que suscitaram
da implementação deste projeto instigaram os seus envolvidos a cada vez mais
procurarem alternativas para diminuir o impacto ambiental que o ser humano causa
ao utilizar-se dos recursos naturais e ao produzir lixo e de se consumir
conscientemente.
Atualmente, são valorizadas as pequenas ações de cada indivíduo ou grupo
social, no sentido de proteger o planeta da ação danosa do ser humano. Parece
claro que muitas pessoas já têm consciência de que seus atos podem contribuir para
a melhora das condições ambientais, tanto em termos locais como num sentido mais
amplo. Este projeto também foi uma ação neste sentido, que visou sensibilizar um
pouco mais a comunidade escolar onde foi aplicado.
Enfim, implementar um projeto que foi construído ao longo de um ano, em seu
ambiente de trabalho, é uma grande oportunidade para que o professor perceba
como ele é capaz de construir uma trajetória própria para ensinar. O
comprometimento deste docente com sua escola se torna mais consistente à
medida que ele percebe a valorização da sua implementação pedagógica, não
apenas por parte de seus alunos, mas também de seus colegas educadores e da
comunidade em geral que participou das ações realizadas.
REFERÊNCIAS
CHASSOT, Attico Inácio, et al. Química no cotidiano: pressupostos teóricos para a elaboração de material didático alternativo. In: Espaços da Escola, ano 3, nº 10, out/dez. Ijuí: Unijuí, 1993. P. 47-53. Disponível em: http://www.iq.ufrgs.br/aeq/producao/delpino/espacos_escola_10.pdfacesso em 10/03/2013.
DEMO, Pedro. Conhecer e aprender: sabedoria dos limites e desafios. São Paulo:
Artes Médicas Sul Ltda. 2000. 152 p.
FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. 116 p. GOULART, Iris Barbosa. Piaget: experiências básicas para utilização pelo professor. 5 ed. Petrópolia: Vozes, 1989. 147 p. GALIAZZI, Maria do Carmo; GONÇALVES, Fábio Peres. A natureza pedagógica da experimentação:uma pesquisa na licenciatura em química. In: Química Nova, vol. 27, nº 2, 2004. P. 326-331. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/qn/v27n2/19283.pdf acesso em 10/04/2013
LIBÂNEO, José Carlos. O dualismo perverso da escola pública brasileira: escola do conhecimento para os ricos, escola do acolhimento social para os pobres. In: Educação ePesquisa, Mar 2012, vol.38, no.1, p.13-28.
KRASILCHIK, Myrian. Reformas e realidade. In: São Paulo em Perspectiva.vol.14 no.1 São Paulo Jan./Mar. 2000. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/spp/v14n1/9805.pdfacesso em 17/05/2013
MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio da pesquisa social. In: MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.) Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 28 ed. Petrópolis: Vozes, 2009. 108 p.
MÓL, Gerson de Souza. O ensino da química no ano internacional da química. In: Revista de Educação, Ciências e Matemática v.1 n.1 ago/dez. 2011. Disponível
em: http://publicacoes.unigranrio.edu.br/index.php/recm/article/viewFile/1591/770 acesso em 09/05/2013.
PRAIA, João Félix. Aprendizagem significativa em D. Ausubel: Contributos para uma adequada visão da sua teoria e incidências no ensino. In: Contributos do III Encontro Internacional sobre Aprendizagem Significativa. Peniche, 2000.
Disponível em: https://repositorioaberto.uab.pt/bitstream/10400.2/1320/1/Livro%20Peniche.pdf#page=122 acesso em 02/05/2013.
PELIZZARI, A. etal.Teoria da aprendizagem significativa segundo Ausubel. In:Revista PEC, Curitiba, v.2, n.1, p.37-42, jul. 2001-jul.2002. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbem/v32n1/14.pdf acesso em 02/05/2013
TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. Metodologia da Pesquisa. 2 ed.
Curitiba: IESDE Brasil S. A., 2009. 180 p.
VYGOTSY, Lev S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes. 1991.
90 p. Disponível em http://cristianopalharini.wordpress.com/2011/04/20/a-formacao-social-da-mente-vygotsky-livro-download/ acesso em 09/05/2013
VYGOTSY, Lev S. Pensamento e linguagem. Edição eletrônica: Ridendo Castigat Mores. 2002. Disponível em: http://www.institutoelo.org.br/site/files/publications/5157a7235ffccfd9ca905e359020c413.pdfacesso em 02/05/2013
ZANON, Lenir Basso: PALHARINI, Eliane Mai. A química no ensino fundamental de ciências. In: Química Nova na Escola, Aprendizado Real, nº 2, 1995. Disponível em: http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc02/relatos.pdfacesso em 25/03/2013
APÊNDICE – Questionário aplicado na turma antes e após a implementação
Vamos ver o que você já sabe sobre este assunto
1- O que você observa quando mistura água com sal de frutas (antiácido)? E
quando mistura água e sal de cozinha?
2- As transformações que ocorrem na matéria são chamadas de fenômenos.
Porém, existem fenômenos físicos e químicos. Qual será a diferença entre
eles?
3- Lavoisier foi um importante químico francês. Ele disse: “Na natureza, nada se
perde e nada se cria. Tudo se transforma”. Explique com suas palavras o que
você entendeu sobre essa afirmação do cientista.
4- A massa de um prego novo e de um prego enferrujado é a mesma?
Considere o mesmo tamanho de prego. Justifique.
5- Uma reação química endotérmica precisa que se forneça calor para ela
acontecer. Pense em um exemplo desse tipo de reação e cite-o.
6- Uma reação química exotérmica libera calor quando ela ocorre. Pense em
um exemplo desse tipo de reação e cite-o.
7- Quais seriam as vantagens de se fazer produtos de limpeza em casa? Pense
em duas ou mais e cite-as.
8- Você já deve ter ouvido falar de gente que faz sabão em casa a partir de óleo
usado em frituras. Na sua opinião, como é possível uma substância feita a
partir de uma gordura (ainda por cima, suja) ser capaz de remover sujeiras?
9- Além de gordura, a receita de sabão leva soda cáustica. Alguém perguntou
para seu professor se esse sabão não seria poluente. O que você acha?
10- Muitas pessoas fazem sabão em casa. Você já viu alguém fazer detergente?
Qual seria a diferença entre um e outro?