Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
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LIMITES E POSSIBILIDADES DO USO DO FUNDO ROTATIVO:
IDENTIFICAÇÃO DO VALOR INVESTIDO POR ALUNO EM UMA ESCOLA
ESTADUAL DO PARANÁ
Autor: Marcos Augusto Pereira
Orientadora: Andréa Barbosa Gouveia
Resumo
O presente texto tem como tema a análise de como se dá a descentralização financeira
nas escolas públicas, que no Estado do Paraná, é efetuada por meio dos recursos do
Fundo Rotativo. A discussão apresentada parte da hipótese de que esta verba, que é
enviada para as escolas estaduais, pode ser considerada insuficiente para as demandas
pedagógicas ou ainda tem um viés muito ligado à lógica da administração, muito mais
ligada à lógica da administração de infraestrutura e portanto ligada a somente questões
administrativas, deixando em segundo plano as questões pedagógicas. Para discutir os
aspectos relativos ao Fundo Rotativo, o texto traz uma breve apresentação de leis do
financiamento no Brasil e faz uma análise crítica acerca do valor que é repassado para
as escolas do Paraná. A partir da pesquisa documental, bibliográfica e de campo com
estudantes se buscou fazer a reflexão acerca do modo em que o Fundo Rotativo é
distribuído, suas divisões por cotas e como deve ser a aplicação do dinheiro que é
repassado para as escolas. As discussões apresentadas permitiram concluir que o recurso
do Fundo Rotativo para as escolas públicas do Estado do Paraná é insuficiente para a
manutenção pedagógica da escola e que se deveria aumentar substancialmente seu valor
para as escolas começarem a discutir qualidade na educação.
Palavras chaves: educação; financiamento; fundo rotativo
INTRODUÇÃO
O financiamento da educação, em nosso país, tem instrumentos legais que regem
a dimensão da gestão, no que se refere à distribuição de recursos previstos pela
Constituição Federal e Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN
9394/96): “A União aplicará anualmente, nunca menos que dezoito, e os Estados e
Municípios vinte e cinco por cento, proveniente de transferências na manutenção e
desenvolvimento de ensino” (BRASIL, 1988 e Brasil, 1996). Portanto quando falamos
em educação pública, estamos indicando que as escolas são mantidas pelos governos
Federal, Estadual e Municipal, promovendo o ensino gratuito, pois as pessoas que
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utilizam as escolas públicas não pagam diretamente a ela. O Estado brasileiro não pode
realizar práticas que favoreçam desigualdades em suas esferas de atuação e por isto a
Constituição Federal determina a gratuidade do ensino em estabelecimentos oficiais.
Em um país marcado por uma intensa desigualdade social, a única forma de
promover a igualdade por meio de práticas educacionais é possibilitar o acesso
igualitário de todos, e isso se dá por meio da garantia da gratuidade do ensino público.
Não é à toa que os princípios da igualdade de oportunidades, gratuidade e qualidade
vêm expressos no mesmo artigo da Constituição (respectivamente, incisos I, IV e VII do
art.206) e da LDB (respectivamente, incisos I, VI e IX do art. 3°). Para viabilizar estes
princípios o Estado constitui um fundo público que é resultado da coleta de impostos
efetuada pelos entes federados (União, Estados e Municípios) que permite o repasse de
recursos para seus sistemas educacionais, que investem nos serviços que são
necessários, inclusive a educação formal fornecida pelas escolas.
A legislação brasileira prevê que os recursos sejam aplicados pelo poder público
em insumos para a manutenção das escolas para esta manutenção é possível que a
estratégia de utilização de recursos seja o repasse direto as escolas.
Esta forma de aplicação direta na escola tem relação com o debate sobre
autonomia. A autonomia da gestão financeira da escola, na atual LDB, que regulamenta
a educação no Brasil, é destacada da seguinte forma:
Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de
educação básica que os integram progressivos graus de autonomia
pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas
gerais de direito financeiro público. (BRASIL, 1996, art. 15)
No Paraná uma das formas de descentralizar recursos para que haja uma
autonomia relativa, é conhecido como Fundo Rotativo. Este é um fundo com repasse de
recursos financeiros, feito pela Secretaria de Estado da Educação (SEED-PR),
diretamente para as escolas estaduais do Paraná.
Considerando que o Fundo Rotativo é utilizado pelo Estado Paraná como
estratégia para assegurar a autonomia financeira das escolas públicas do Estado, bem
como a importância desta autonomia para o desenvolvimento de uma educação pública
de qualidade, o presente texto tem como objetivo apresentar alguns elementos que
auxiliem no conhecimento e na compreensão a respeito do funcionamento e da
efetividade deste Fundo na organização das escolas. Para tanto, o texto apresenta
informações básicas, levantadas a partir da pesquisa documental, a respeito do
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funcionamento e dos aspectos legais que envolvem o Fundo Rotativo no Estado do
Paraná e, também, estabelece uma relação entre as possibilidades do Fundo Rotativo e
as necessidades reais da escola pública, tendo como uma das referências para esta
análise, a experiência do próprio autor na gestão administrativa de uma das escolas do
Estado.
As análises a respeito do funcionamento do Fundo Rotativo, nos seus limites e
possibilidades para a efetivação de uma educação pública que atenda às necessidades
reais de formação da população brasileira, e no caso em questão, da população
paranaense, são apresentadas neste texto a partir da concepção de política educacional e
dos princípios pedagógicos de autores como: DOURADO (2007), LIBÂNEO (2004),
VICENTE (1993), SILVA (2013), PARO (2000), FARENZENA e VIEIRA (2005) que
defendem uma política educacional de gestão e financiamento da educação voltada para
a promoção da formação humana ou para a justiça social.
O FUNDO ROTATIVO NO ESTADO DO PARANÁ
O Fundo Rotativo, segundo o Manual de Operacionalização da Secretaria
Estadual de Educação (2014) é um instrumento criado pela Lei 14.267/2003 e
regulamentado pelo Decreto n°. 3.457/2011, para viabilizar, com maior agilidade
repasse de recursos financeiros aos Estabelecimentos de Ensino da Rede Estadual, para
a manutenção e outras despesas relacionadas com a atividade educacional.
O Fundo Rotativo é, portanto, como o Estado do Paraná descentraliza os
recursos financeiros que são destinados às escolas estaduais, tendo como objetivo o
dinamismo na execução das despesas, para resolver os problemas de manutenção da
infraestrutura e do desenvolvimento das atividades escolares.A transferência de recursos
financeiros do orçamento do Estado constitui a base de recursos para a receita de cada
Fundo Rotativo, cabendo à SEED estabelecer as diretrizes para a política de
funcionamento do Fundo Rotativo junto aos Estabelecimentos de Ensino da Rede
Pública Estadual, para esta finalidade e oriundos dos recursos gerais para educação: o
recurso que vem para compor o Fundo Rotativo vem da cota Estadual do Salário
Educação, do Tesouro do Estado e de outras fontes.A Cota Estadual do Salário-
Educação é a contribuição social destinada à educação, de acordo com o parágrafo 5º do
art. 212 da Constituição Federal, a educação básica pública tem como fonte adicional de
financiamento a contribuição social do salário educação, recolhida pelas empresas na
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forma da lei.
O Tesouro do Estado composto principalmente pelas receitas de impostos que
são vinculados à educação.
As Outras Fontes são compostas por fontes orçamentárias que extrapolem as
receitas vinculadas obrigatoriamente à educação.O Fundo Rotativo é uma verba
estadual, enviada para todas as escolas estaduais do Paraná, este recurso é o que
possibilita a pela manutenção física, administrativa e pedagógica das escolas, como por
exemplo, a compra de: materiais de escritório; materiais esportivos; materiais de
limpeza; execução de pequenos reparos; incremento da merenda escolar; materiais
didáticos, sendo que o valor a ser repassado para cada escola é calculado pelo número
de alunos e distribuído em quatro cotas para prestação de serviços. Conforme Manual de
Operacionalização do Fundo Rotativo as cotas são de quatro tipos, conhecidas como:
Cota Normal – Consumo: As liberações ocorrem mensalmente, a partir do mês de
Fevereiro, até o mês de Novembro. Ao todo são 10 (dez) parcelas liberadas durante o
exercício, exclusivamente para aquisição de Materiais de Consumo.
Cota Normal – Serviço: As Liberações ocorrem nos meses de Fevereiro, Maio, Julho e
Outubro, exclusivamente para atender despesas de serviços prestados por empresas
devidamente constituídas.
Cota Extra: Com destinação exclusiva para o atendimento de solicitações, cujas
despesas não possam ser efetivadas por meio da Cota Normal. Somente no ano de 2012,
todas as escolas receberam este tipo de cota para complementação da merenda escolar e
uma para compra de materiais para a prevenção da gripe.
Cota Projetos Especiais: Com destinação exclusiva ao atendimento de Programas e
Projetos desenvolvidos pela SEED-PR.
O Fundo Rotativo estabelece que a manutenção, o que congrega tanto as
despesas com Material de Consumo quanto Prestação de Serviços, seja realizada
somente por empresas devidamente constituídas. A compra de Material de Consumo
está relacionada com a aquisição de itens necessários ao desenvolvimento de atividades
escolares como:
Gás de cozinha, lâmpadas e luminárias, materiais de construção, elétrico, hidráulico,
materiais de expediente, de laboratório, segurança, material didático, material esportivo,
peças de reposição, produtos de higiene, materiais de limpeza, utensílios de copa e
cozinha, vidros, entre outros.
A Prestação de Serviços diz respeito a reparos e consertos de:
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Conjuntos escolares, despesas bancárias, equipamentos de cozinha, de informática, de
laboratório, mobiliários, fotocópias, pequenos reparos na infraestrutura do prédio, entre
outros.
Veremos que esta divisão é mais um empecilho para tomada de decisões e que
não contribui para uma gestão democrática As rubricas estabelecidas para uso dos
recursos que definem onde gastar, são definidas de forma centralizada pela SEED o que
nem sempre atende a rotina da escola. Por exemplo pode haver recurso para
manutenção, mas a escola precisa de bens de consumo, mesmo assim não poderá
comprar, pois efetuará despesa indevida, devendo devolver o recurso para o Estado.
O FUNDO ROTATIVO NO ESTADO DO PARANÁ EM 2014
O Estado do Paraná efetuou, em 2014, um investimento, via Fundo Rotativo,
para as despesas de manutenção das escolas no valor de R$ 44.482.001,44, distribuído
em dez cotas de consumo, quatro cotas de prestação de serviços. Este valor foi
destinado para 2.148 escolas em todo o Paraná, sendo 50.684 turmas e 1.209.813
alunos (Paraná, 2014).
Em uma primeira análise podemos entender estes números como um grande
investimento em educação, para a manutenção das escolas, mas se analisarmos melhor
os detalhes veremos que este recurso não é suficiente para as demandas que as escolas
estaduais apresentam em seu cotidiano.
Se dividirmos os R$ 44.482.001,44 investidos no ano de 2014, pelo número de
alunos da rede estadual, que eram 1.209.813, teremos o valor de R$ 36,76 por
ano/aluno, isto resulta ainda em uma média de repasse mensal de R$ 3,06 por
aluno/mês. Abaixo apresentando o recurso recebido por uma escola de Curitiba, que
analisaremos depois:
Tabela 1: Valores liberados mensais para Escola Estadual – Fundo Rotativo, 2014
Cota Mar Abr Mai Jun Set Out Total*
Cota normal
consumo 2014
3.333,60 3.164,00 6.338,80 0,00 9.497,60 3.158,80 25.492,80
Cota normal
serviço 2014
3.333,60 0,00 0,00 3.169,40 3.169,40 0,00 9.672,40
Total
Distribuído
6.667,20 3.164,00 6.338,80 3.169,40 12.667,00 3.158,80 35.165,20
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Fonte: SEED (portal diaadiaeducação)
*Os meses sem repasse foram omitidos.
Dentro dos valores apresentados na tabela 1 vemos que esta escola recebeu um
total de R$ 35.165,20 e tendo 1.127 matrículas no ano de 2014, sendo o valor aluno/ano
de R$ 31,16 e, ainda, dividindo este valor por doze meses fica em R$ 2,60, podemos
concluir que este valor dificilmente será suficiente para as necessidades que a escola
como um todo necessita, ficando o trabalho pedagógico prejudicado nesta política da
descentralização financeira adotada pelo Estado do Paraná, chamado de Fundo Rotativo.
QUAIS AS NECESSIDADES REAIS DA ESCOLA?
Na discussão sobre a gestão escolar da escola pública, é fundamental, além de
entender as regras gerais de funcionamento destes repasses de recursos, refletir sobre o
fato do recurso do Fundo Rotativo (identificado a seguir como FR) que é recebido pelas
escolas estaduais, ser ou não suficiente para a demanda pedagógica das escolas. Cabe
questionar se este recurso vai interferir diretamente na condução da escola como um
todo. Refletirá no processo ensino aprendizagem e poderá interferir no resultado nos
índices educacionais?
Parte-se da hipótese o baixo volume de recurso direto nas escolas interfere na
ação pedagógica, limitando a ação da gestão escolar a mero procedimento
administrativo, pois como veremos a seguir, os recursos liberados na forma
descentralizada, são insuficientes para demandas pedagógicas. A insuficiência dos
recursos do fundo rotativo pode ser percebida, por exemplo, no fato de que muitas vezes
as escolas buscam “Recursos Próprios”, obtidos de várias formas. Entre elas pode-se
citar: Festa Junina e similar; Cantina Comercial e similar; Rifas, Bingos e similares;
contribuição voluntária da família.
Esta captação de recurso através da Associação de Pais, Mestres e Funcionários
(APMF) é conhecida como recurso próprio, e aumenta, as diferenças dos recursos que
as escolas do Paraná têm para sua manutenção. Entre as escolas, algumas estão inseridas
em áreas consideradas da classe média, tem a tendência de maior arrecadação (recursos
próprios) e outras escolas estão inseridas em locais considerados da classe baixa, e esta
arrecadação é quase nula (recursos próprios). Dentro deste contexto as escolas são
comparadas umas as outras como se as condições materiais fossem as mesmas, e não
são. Pois na forma como é proposta a política educacional do Estado fica claro que
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existe um tratamento muito parecido quando se trata de investimento financeiro via FR,
pois a relação é sempre o número de alunos que a Escola apresenta. Como podemos
verificar pelo índices oficiais e pelas necessidades levantadas pela comunidade escolar.
No caso do Paraná há uma tendência que as escolas concorram entre si, pois a
política de governo divulga escolas com melhores índices que outras, como se os
problemas das escolas estaduais do Paraná fossem os mesmos, e neste aspecto a escola
pode gerar mais recursos próprios, geralmente tem condições de aumentar a arrecadação
através de cantina comercial, festas, bingos, concursos, rifas etc., a escola que precisa
menos recurso pelas condições socioeconômica de seus alunos, acabam tendo ainda
mais recursos financeiros.
Os diretores1 escolares tem uma dificuldade em entender qual seria seu papel,
pois existe uma ênfase pela busca da eficiência gerencial e administrativa, contrapondo-
se com a ideia de construir uma gestão voltada principalmente para a questão
pedagógica e democrática, e, portanto, humanizadora.
Mesmo respeitando as regras de utilização dos gastos, pois há leis e
regulamentos, há uma burocratização na utilização dos recursos, sendo que existe lógica
de gastar o recurso somente em qual cota ele está classificado.
Conforme veremos a seguir a utilização da cota normal consumo, não pode ser
utilizada para outro fim, não se pode gastar o dinheiro do fundo rotativo nas reais
necessidades da Escola, mas sim ao que ele foi destinado dentro das cotas, esta forma de
executar os gastos é rígida e sua execução fica imobilizada e não contribui na
administração dos problemas que a escola apresenta, essa rigidez pode ser em virtude
das leis, mas também não fica claro para os diretores escolares compreenderem o
porquê de utilização de recursos de forma fechada. O que não é o principal problema
das Escolas, mas sim a falta de recursos, este sim um problema mais evidente e urgente.
E caso haja o gasto fora do previsto no manual de operacionalização enviado
pela SEED-PR, o recurso financeiro tem que ser devolvido com recursos próprios do
diretor. Existe uma falta de assessoria aumentando a chance dos erros causados pelo
diretor escolar no uso de recurso financeiro, mas quando há algum erro sempre optam
pela devolução do recursos que é o caminho mais fácil para a correção, e não com
1 Concepção de direção, di.re.tor, adj (lat directore) Que dirige, regula ou determina; diretivo caminho
(Michaelis, 2012). A escola precisa ter um objetivo, portanto o termo diretor parece mais adequado do
que Gestor.(N.A.) ges.tor, sm (lat gestore) 1 V gerente. 2 Indivíduo que, sem mandato, administra
negócios alheios, feitor (Michaelis, 2012). Mas isso é outra discussão.
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outras formas administrativas quando possível.
O recurso público estadual conhecido como Fundo Rotativo está distribuído de
forma em que o cálculo é igual a todas as escolas estaduais, calculado pelo número de
alunos, as escolas recebem um valor fixo por aluno matriculado na escola, quanto maior
o número de alunos, maior é o recurso, quanto menor o número de alunos, menor é o
recurso recebido, mas é de conhecimento de todos que as escolas têm demandas
diferentes, e precisamos demonstrar à SEED-PR, uma forma de poder distribuir melhor
os recursos para as escolas que precisam de maior investimento.
A perspectiva desta forma de agir transporta uma ideologia ou um paradigma, de
que somente a SEED-PR ou o Governo do Estado do Paraná, tem o conhecimento do
que a escola precisa, portanto influenciando a gestão escolar, em um de seus princípios
fundamentais que é a autonomia na tomada de decisões, via descentralização da gestão
financeira. Como falar de autonomia se o processo de interferência vai diminuindo a
concretização da gestão democrática, e da autonomia da gestão escolar, de seus atores
como diretores, equipe pedagógica, pais de alunos e alunas, a participação fica restrita,
na decisão do que investir? Podemos analisar se a quantidade de recurso é ou não
suficiente, mas sendo insuficiente, como falar em autonomia da gestão financeira? há a
pressão de investir em insumos básicos, portanto tornando qualquer decisão coletiva
desnecessária.
Dentro do processo de descentralização financeira do Estado do Paraná, voltado
para as escolas estaduais, este tipo de repasse financeiro tem sua origem no formato do
Estado brasileiro, que como diz Oliveira e Souza, “No Brasil, com a República, a
federação nasce na perspectiva da descentralização” (OLIVEIRA E SOUZA apud Silva,
2013, p. 14).
Outro fator da descentralização financeira do Estado do Paraná, que a SEED
pode ser compreendido de vários discursos de representantes oficiais ligado a escola
pública estadual, se justifica por dois dois fatores principais:
1. Diminuir os custos da logística de distribuição, pois o sistema tem uma capilaridade
muito grande, dificultando a distribuição de materiais e serviços contratados de forma
central, e com custos mais elevados ao sistema;
2. A preocupação com o desenvolvimento do comércio local, desenvolvendo a
comunidade e seus participantes;
Mas dentro da descentralização financeira proposta pelo governo do Paraná, para
as escolas estaduais, poderiam ter vários objetivos diferentes, poderia ter uma dimensão
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democrática, que é estabelecida no discurso e conforme Paro diz:
Toda vez que se propõe uma gestão democrática da escola pública de 1° e 2°
graus2 que tenha efetiva participação de pais, educadores, alunos e
funcionários da escola, isso acaba sendo considerado como uma coisa
utópica. Acredito não ser de pouca importância examinar as implicações
decorrentes dessa utopia. A palavra utopia significa o lugar que não existe.
Não quer dizer que não possa vir a existir. Na medida em que não existe,
mas, ao mesmo tempo, se coloca como algo de valor, algo desejável do ponto
de vista da solução dos problemas da escola, a tarefa deve consistir,
inicialmente, em tomar consciência das condições concretas, ou das
contradições concretas, que apontam para a viabilidade de um projeto de
democratização das relações no interior da escola. (PARO, 2005, p.9)
A descentralização financeira precisa contribuir para a condição de trabalho das
escolas, esta condição de receber o recurso financeiro, poderia fornecer condições de
manutenção dos estabelecimentos de ensino, que precisam de agilidade e tranquilidade
no uso do dinheiro público, solucionando mais rápido os problemas que acontecem no
cotidiano escolar. Na forma que o fundo rotativo opera favorece condições de
transferência de responsabilidade do Estado para a comunidade escolar, que passa a ser
cobrada em todas as questões que envolvem a educação e sua administração, medindo
sua eficiência somente pelos dados oficiais, e, portanto determinando quem é
competente e quem é incompetente. O discurso é que aqueles que conseguem trazer a
comunidade escolar para a escola (contribuindo financeiramente), são os que fazem a
chamada gestão democrática, mas representativa e não participativa em sua maioria.
Os novos paradigmas da educação que exigem dos profissionais da educação
uma nova atitude frente às desigualdades sociais, o modo de vida moderno, exige dos
indivíduos uma constante mudança de suas necessidades pessoais e profissionais, que
nos faz refletir sobre a necessidade de criarmos mecanismos que efetivamente
contribuam para a construção de uma sociedade mais humana, na função de educar.
Atualmente, cabe à escola tornar, dentro de suas possibilidades, a humanidade
menos desumana3. Afinal, que outra forma nós temos de fazer a escola cumprir sua
função social senão através de um processo complexo de conscientização de todos os
envolvidos com o nosso sistema educacional: comunidade, professores, funcionários e
2 Agora o termo utilizado no lugar do ensino de 1º e 2º graus, são ensino fundamental e ensino
médio. 3 “O maior pecado contra nossos semelhantes não é odiá-los, mas ser indiferente a eles: esta
é a essência da desumanidade.” (George Bernard Shaw)
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alunos?
Cabe à escola oferecer oportunidades de acesso à cultura, à tecnologia, à
informação, de oportunizar a reflexão de questões relativas ao respeito ao próximo, suas
culturas, etnias e orientação sexual, à preservação do meio ambiente, ao
desenvolvimento sustentável, entre vários outros temas.
Portanto, é função social da escola, tendo em vista tantas questões que fogem
das mãos da sociedade que tenta se proteger sem fazer por onde minimizar as
desigualdades sociais. Até porque o que está posto é uma forma de pensar que tornou
cultural o fortalecimento do individualismo, centrado numa visão de mundo, onde é
mais importante mudar de classe e não se constituir como sujeito coletivo da sociedade.
Considerando esta perspectiva de educação se apresenta a seguir um
levantamento realizado com os alunos do segundo ano do ensino médio, de uma Escola
Estadual de Curitiba, sobre o que a escola precisa, de maneira geral, para se falar em
qualidade da educação sendo uma tentativa de demonstrar que os alunos tem
necessidades mais complexas e que necessitariam mais recursos para a escola.
CONDIÇÕES PEDAGÓGICAS DE QUALIDADE: UMA REALIDADE EM
ESTUDO
Definir a qualidade na educação é uma tarefa bastante complexa. Quando
falamos que a educação precisa ter qualidade isto gera uma gama infindável de opiniões,
e dentro das possibilidades de uma escola pública estadual do Paraná, as condições de
entendimento são bastante variadas, dependendo do ponto de vista e dos referenciais de
cada sujeito envolvido no processo educativo. Destaca-se porém que:
uma escola de boa qualidade é uma construção de sujeitos engajados
pedagógica, técnica e politicamente no processo educativo, em que pese,
muitas vezes, as condições objetivas de ensino, a desvalorização profissional
e a possibilidade limitada de atualização permanente dos profissionais da
educação. Isso significa dizer que não só as condições objetivas são
determinantes, mas que os trabalhadores em educação, quando participantes
ativos, são de fundamental importância para a produção de uma escola de
qualidade. (FARENZENA, VIEIRA, 2005, P. 205)
Quando levantamos o que a escola precisa para se caracterizar com qualidade,
verificamos que a questão das condições objetivas (recursos, materiais, físicos, de
pessoal entre outros) é a principal inspiração para os envolvidos no processo definirem
sua posição a respeito das necessidades para a constituição de uma escola de qualidade.
Quando não temos as condições mínimas de trabalho na escola o que se evidencia na
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maioria dos casos, é a busca, primeiro pelas condições materiais mínimas, ficando em
segundo plano as condições subjetivas, que são elencadas em poucas sugestões dos
grupos. O que evidencia a dificuldade de enxergar coisas mais complexas quanto está
evidente a ausência de questões básicas. Este fato nos remete a preocupação de
como se dá a descentralização financeira, via fundo rotativo, que tem a pretensão de
fazer a manutenção da infraestrutura e atividades desenvolvidas pelas escolas, claro que
o que está no Manual de Operacionalização, não nos remete a preocupação com a
qualidade do ensino, tendo um texto vago no item Finalidade “O Fundo Rotativo é um
instrumento criado por Lei, para viabilizar, com maior agilidade repasse de recursos
financeiros aos Estabelecimentos de Ensino da Rede Estadual, para a manutenção e
outras despesas relacionadas com a atividade educacional”. (PARANÁ, 2012, p. 1).
Para exemplificar esta questão é possível utilizar os dados coletados em uma
pesquisa com alunos do segundo ano do ensino médio de uma escola pública da rede de
ensino do Estado do Paraná. Foi solicitado que estes alunos indicassem os elementos,
atividades, materiais, recursos que consideravam necessários para constituir uma escola
de qualidade. Foi entregue um formulário onde os alunos podiam apontar livremente as
condições subjetivas e objetivas, para que a escola funcione bem.
Após algumas reuniões surgiram os seguintes apontamentos: dentro das
condições subjetivas, pode-se verificar que os alunos se preocupam com o
comportamento adequado, ter um envolvimento maior na questão da
multidisciplinaridade, maior rigidez do uso do uniforme, participação dos alunos na
organização da escola, mais envolvimento da comunidade escolar, maior
comprometimento das pessoas com o trabalho e a necessidade de preservar a disciplina
dos alunos.
Como condições objetivas foi citado a ampliação da área da horta, coleta
seletiva do lixo, armários adequados na sala de aula, um profissional da assistência
social para acompanhamento familiar, aula com professores fora do horário formal de
ensino, aula de informática, atividades extracurriculares como luta, dança, teatro e aulas
de canto, câmeras de vigilância, portaria adequada, diminuição da quantidade de alunos
por sala, lousa digital, melhoria e ampliação do projeto de educação integral, aulas de
campo, visitas a teatro e cinema, substitutos para os professores faltosos, psicólogo para
os alunos, melhoria dos quadros negros, uma biblioteca mais ampla, ventiladores na
sala.Quando se pretende que a escola tenha qualidade, pensamos prioritariamente nas
condições materiais ou objetivas, como houve a afirmação de que o aumento de
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recursos descentralizados nas escolas é um dos fatores que determinam a melhoria na
qualidade pedagógica, podemos trazer para nossa compreensão que é necessário um
aumento dos recursos descentralizados para as escolas públicas. Após análise com
alunos, foi realizado uma estimativa de custos para as atividades priorizadas pelos
alunos ou atividades que pudessem atender as prioridades dos alunos. A estimativa
permitiu sugerir exemplos de algumas atividades pedagógicas que mostram quanto de
recurso deveria supostamente ter a escola para o enfrentamento das necessidades que a
especificidade do trabalho pedagógico solicita com o objetivo pensarmos efetivamente
em educação de qualidade. A tabela 2 apresenta um orçamento de gastos para uma
escola elaborada por sugestão de alunos do segundo ano do ensino médio
Tabela: Estimativa de custos para atividades priorizadas pelos estudantes
Atividade Pedagógica Valor da Atividade
Cinema (escola inteira 1 vez no ano) R$ 17.070,00
Passeio Parque Aquático (escola inteira 1 vez no ano) R$ 68.280,00
Internet 100 mega (uso na escola inteira – valor anual) R$ 4.800,00
Passeio ao Teatro (escola inteira 1 vez no ano) R$ 20.000,00
Visita ao Parque Vila Velha (escola inteira 1 vez no ano) R$ 25.000,00
Visitas a universidades (UFPR, PUC, UE – ensino médio 1 vez no ano) R$ 4.800,00
Câmeras de vigilância (instalação e manutenção) R$ 10.000,00
Diminuição do número de alunos por sala (lei do sistema) Indireto
Reforma das salas de aula R$ 20.000,00
Cursos de formação continuada – Inclusão (todos os professores) R$ 10.000,00
Aumento do número dos funcionários (lei do sistema) Indireto
Projeto mais educação (escola integral) com professores de 20 h.
(lei do sistema)
Indireto
Assinaturas de revistas e jornais (biblioteca) R$ 2.000,00
Professores para substituição dos professores que faltam (lei do sistema) Indireto
Rádio Escola R$ 5.000,00
Portaria informatizada para organização do ambiente escolar R$ 25.000,00
Total R$ 211.950,00
Obs.: Valores estimados com orçamentos feitos em 2015
Depois de algumas sugestões, veiculadas nas reuniões com alunos, pudemos
verificar o custo de algumas necessidades, fazendo levantamento com fornecedores de
serviços que utilizamos e também em alguns casos pesquisando preços na internet.
Podemos perceber que com algumas sugestões de alunos, o cálculo do valor
mensal necessário por aluno seria muito superior aos recursos disponibilizados pela
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SEED-PR
Tabela 3 : Comparativo de recursos necessários e recursos existentes.
Valor necessário
sugestões
Número de alunos
2014
Meses no ano Valor mensal por
aluno
Valor do Fundo
rotativo total no
Paraná
R$ 44.482.001,44 1.209.813 12 R$ 3,06
Valor do fundo
rotativo necessário
no Paraná
R$ 227.493.236,52 1.209.813 12 R$ 15,67
Valor do Fundo
rotativo na escola
R$ 35.165,20 1.127 12 R$ 2,60
Valor necessário da
escola
R$ 211.950,00 1.127 12 R$ 15,67
Assim, quando calculamos algumas das necessidades dos alunos verificamos
que o repasse está muito aquém das sugestões, que foram feitas de forma simples e
objetiva. A média de repasse do Fundo Rotativo é de R$ 3,06 por aluno/mês, no entanto
para a escola que participou deste trabalho o cálculo que obtido após análise das
propostas indicou a necessidade de R$ 15,67 aluno/mês, sendo que nas sugestões
ficaram de fora os insumos que a escola já oferece como material de escritório como um
todo, material de limpeza como um todo, pequenos reparos de equipamentos e da rede
física. Se considerada mais estas necessidades chegar-se á a um valor ainda maior.
Considerações Finais
O trabalho aqui apresentado não tem a pretensão de apresentar as soluções para a
educação, mas levantar uma série de questões que são pertinentes em nosso meio
educacional, como o caso do Fundo Rotativo que é a forma do Estado do Paraná
descentralizar uma parte do financiamento público para a educação em nosso Estado.
Buscou-se demonstrar como o recurso não é pensado para que haja uma educação de
qualidade, mas sim uma manutenção mínima das escolas estaduais.
Os dados levantados com alunos do ensino médio, mostram que as necessidades
são muito maiores do que o recurso repassado pelo fundo rotativo para as escolas. Os
cálculos foram elaborados de forma simples e podem apenas dar uma ideia de como a
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forma de distribuição do Fundo Rotativo está sendo mais uma forma de diminuir as
condições para que as escolas possam pensar em qualidade na educação. Outro fator a
se destacar é que, por sua complexidade, a questão do investimento em educação foge
da compreensão de seus sujeitos, professores, funcionários, alunos e comunidade
escolar, favorecendo os discursos da Secretaria de Estado da Educação, que
normalmente divulga que há um grande investimento em educação via Fundo Rotativo.
Fica claro que se calcularmos o que nossas escolas recebem usando o método da média
por aluno/mês, verificamos que realmente o repasse para as escolas é parco, e portanto
reduz a condição de oferecermos, via fundo rotativo, uma educação de mais qualidade.
Há que se considerar também que as necessidades apontadas pelos alunos na
pesquisa realizada indica o anseio por recursos e oportunidades educacionais passíveis
de serem realizadas e de acordo com a as perspectivas da efetivação da função social da
escola. como por exemplo aulas de campo e visitas a universidades, acesso a internet a
todos. No entanto, nem mesmo estas indicações básicas podem ser concretizadas com
os recursos disponibilizados pelo Fundo Rotativo,o que nos permite constatar que:
De modo geral, verifica-se que a definição de um padrão de qualidade na
educação escolar, sobretudo, em escolas públicas, continua a ser um desafio,
especialmente porque tal discussão traz à tona a complexidade, as tensões e
as contradições do fenômeno educativo em um país marcado pela
desigualdade (FARENZENA, VIEIRA, 2005, P. 219).
Este desafio está longe de ser alcançado? Este trabalho não tem uma reposta
pronta para esta questão mas demonstra que a educação precisa sim de recursos, de
forma descentralizada, e que a complexidade do tema traz consigo a a necessidade de
fazer uma análise crítica da situação do ensino no Paraná, pois
Apesar da complexidade da temática, a compreensão da estrutura e das bases
do financiamento da educação coloca-se como uma necessidade para toda a
sociedade, devendo envolver, principalmente, os gestores educacionais, os
profissionais da educação, os pais e os estudantes e a comunidade local.
(DOURADO, 2007, p. 1)
Assim, é preciso estar sempre refletindo sobre as questões da educação, que
sendo complexa precisa de todos os sujeitos professores, funcionários, alunos, gestores
e comunidade, envolvidos para participar da construção de uma educação de qualidade
para todos.
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REFERÊNCIAS:
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,
2013.
BRASIL. Ministério da Educação. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece
as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: 1996.
DOURADO, L.F. Políticas e gestão da educação básica no Brasil: limites e
perspectivas. Educação e Sociedade: Campinas, p. 1 out. 2007.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação, 2012. Disponível em
http://www4.pr.gov.br/escolas/numeros/frame_geralturmat.jsp?ano=2014. Acessado em
20/06/2013.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação, 2012. Disponível em
http://www4.pr.gov.br/escolas/numeros/frame_geralfundo.jsp?ano=2014. Acessado em
20/06/2013.
LIBÂNEO, José Carlos. Organização e Gestão da Escola: teoria e prática. 5 ed.
Goiânia: Alternativa, 2004.
FARENZENA , N. e VIEIRA, S. L. Custos e condições de qualidade da educação em
escolas públicas: aporte de estudos regionais. Brasília: MEC/INEP, 2005.
PARO, Vitor Henrique. Administração Escolar- Introdução Crítica 9 ed. São
Paulo: cortez, 2000.
_____, Gestão democrática da escola pública. 3 ed. São Paulo: Ática, 2005.
SILVA, Adriana Zanini da. A descentralização de recursos financeiros e a
organização do trabalho pedagógico: o caso de santo André. Dissertação de
mestrado. USP. 2013
VICENTE, Manoel José. O fundo Rotativo no Paraná. Monografia. Curitiba. 1993