Thiago M. Zago medUnicampXLVI 1
Mentes emocionais, Mentes Racionais
Mentes emocionais
A emoção é uma experiência subjetiva acompanhada de manifestações fisiológicas detectáveis (integradas e
executadas através do hipotálamo). Pode-se admitir três grandes “utilidades” para as emoções:
1- A sobrevivência do indivíduo;
2- A sobrevivência da espécie;
3- A comunicação social.
O forte vínculo biológico entre emoções e sobrevivência é muito nítido no homem, particularmente na emoção
que chamamos de raiva, que produz comportamentos de agressão, e na emoção que chamamos de medo,
causadora de comportamentos de ameaça ou fuga.
Positivas ou negativas, as emoções podem provocar comportamentos motivados, o que levou a se considerar
que o único elemento comum entre as diferentes emoções é o reforço, isto é, um estímulo positivo (prazeroso)
ou negativo (desagradável) que resulta na motivação por prolongar ou interromper a experiência emocional.
Quando o reforço é positivo chama-se recompensa ou estímulo apetitivo, e quando é negativo chama-se
punição ou estímulo aversivo. Desse modo, de acordo com o reforço, podemos considerar dois grupos de
emoções: as positivas (que provocam prazer) e as negativas (que provocam desprazer).
A expressão das emoções. Cada emoção tem o seu padrão característico de manifestações fisiológicas.
O que chamamos manifestações ou correlatos fisiológicos das emoções são respostas autonômicas
(comandadas pelo SNA). As respostas autonômicas de caráter emocional variam com o tipo de emoção e com o
indivíduo.
As emoções também provocam manifestações comportamentais, isto é, respostas motoras. Essas podem ser
estereotipadas, isto é, de natureza reflexa, involuntária; ou podem ser bastante complexas envolvendo ações
voluntárias. As reações comportamentais estereotipadas geralmente estão ligadas à sobrevivência: são ações de
emergência, e portanto, devem ser acionadas com rapidez, sem que seja necessário pensar. As respostas
autonômicas e comportamentais que ocorrem logo no início de uma emoção, diretamente correlacionadas com
um estímulo disparador, são as respostas emocionais imediatas. Mas as emoções podem se tornar crônicas, seja
porque os estímulos disparadores permanecem ou por que o indivíduo apresenta um distúrbio afetivo. Nesse
caso ocorrem respostas prolongadas, geralmente mantidas com o envolvimento de hormônios e do sistema
imunitário.
Teorias das emoções. No século XIX foi proposto que as emoções não existem sem manifestações
fisiológicas e comportamentais, e que na verdade a experiência emocional subjetiva seria causada por elas. De
acordo com essa teoria, chamada teoria James-Lange, a emoção seria a percepção das manifestações
fisiológicas, ou seja, uma informação retroativa, que proporcionaria o estado interior correspondente. Tal teoria
pode parecer absurda, mas há indicações de que a informação retroativa, se não causa pelo menos influi sobre a
experiência emocional subjetiva, potencializando-a.
Uma segunda teoria propôs mais objetivamente o SNC como causador tanto da experiência subjetiva emocional
como de suas manifestações fisiológicas e comportamentais. Essa teoria ficou conhecida como teoria Cannon-
Bard e postulou que as reações emocionais seriam produzidas pelo hipotálamo, sendo este normalmente inibido
pelo córtex e o tálamo. Posteriormente revelou-se que essa teoria é parcialmente verdadeira, uma vez que apenas
o córtex exerce influências inibitórias sobre o hipotálamo.
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O sistema límbico. O sistema límbico é responsável pelo controle emocional e é formado por um
conjunto de regiões localizadas em sua maioria na face medial dos hemisférios e no diencéfalo. O sistema
límbico é também conhecido como circuito de Papez, que inclui o córtex cingulado, o hipocampo, o hipotálamo,
os núcleos anteriores do tálamo e a amígdala.
O córtex cingulado recebe projeções de diversas outras regiões corticais associativas, e com elas forneceria a
base para a experiência subjetiva das emoções. Verificou-se que o hipocampo propriamente dito não participa
de modo determinante nos mecanismos neurais da emoção, a não ser como responsável pela consolidação da
memória. A amígdala, por outro lado, revelou-se uma estrutura de enorme relevância, uma espécie de “botão de
disparo” de toda experiência emocional. O hipotálamo é a região de controle das manifestações fisiológicas
que acompanham as emoções, realizando essa tarefa através do SNA e do sistema endócrino.
Medo. Dentre os estímulos que provocam medo existem:
1- Medo incondicionado estímulo que provoca medo por si só;
2- Medo condicionado ou aprendido estímulos normalmente inócuos que foram associados a
situações ameaçadoras e tornaram-se “avisos” de que elas podem estar prestes a acontecer
novamente;
3- Medo “implícito” medos cuja causa não se pode descrever com precisão, porque não se foi capaz
de percebê-la conscientemente quando da exposição a ela em associação a alguma situação
ameaçadora ou simplesmente desagradável.
Medo rápido e passageiro sobressalto
Medo duradouro tensão e sofrimento ansiedade
O sentimento normal de medo é uma emoção de intensidade e duração variáveis entre o sobressalto e a
ansiedade.
A existência de estímulos causadores de medo, ainda que virtuais, indica que as regiões envolvidas devem
conectar-se de algum modo com os sistemas sensoriais. Em outras palavras: as reações de medo têm uma lado
aferente. Mas as reações de medo envolvem também atos comportamentais e manifestações fisiológicas como a
maioria das emoções, indicando a existência de vias eferentes motoras e viscerais. As ações comportamentais
veiculadas pelo sistema motor somático e os ajustes fisiológicos veiculados pelo SNA, então, representam o
lado eferente dos circuitos neurais envolvidos com as reações emocionais.
O complexo amigdalóide (amígdala) funciona como botão de disparo das reações emocionais. Tal função é
evidenciada por suas conexões que a colocam em posição ideal para exercer essa função. O complexo
amigdalóide recebe extensas projeções dos sistemas sensoriais: áreas associativas visuais e auditivas dos lobos
occipital e temporal, e áreas associativas multissensoriais do lobo parietal. Também recebe projeções do tálamo
auditivo e visual. Através dessa aferências o complexo amigdalóide recebe os estímulos causadores de medo. A
amígdala também manda eferências para o hipotálamo e núcleos bulbares envolvidos com as manifestações
fisiológicas do medo, e com uma região do mesencéfalo chamada grísea periaquedutal (substância cinzenta
periaquedutal), principal organizadora das reações comportamentais do medo. Conclui-se, dessa forma, que a
amígdala é o botão disparador acionado pelos estímulos causadores de medo.
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Estímulos causadores de medo
Teto mesencefálico/ Tálamo sensorial/ Córtex associativo/ Regiões pré-frontais e cinguladas
Amígdala basolateral (recebe aferências)
Ativação da amígdala central (manda eferências)
Hipotálamo ativação dos circuitos de comando do SNA, endócrino e imunitário
Grísea periaquedutal ativação dos núcleos e vias descendentes do sistema motor no tronco encefálico
Córtex cerebral experiência emocional
Tronco encefálico ativação dos sistemas ascendentes difusos do tronco encefálico alerta
Ansiedade e estresse. Em algumas circunstâncias o medo se torna crônico, seja porque o estímulo
incondicionado se mantém por perto, porque surgem estímulos condicionados que prolongam os efeitos iniciais,
ou porque o indivíduo desenvolve uma expectativa de perigo ou ameaça futura. O medo crônico pode resultar
em estresse e em ansiedade.
Geralmente usa-se o termo estresse quando se pode identificar uma causa geradora de medo crônico. O termo
ansiedade é geralmente reservado a um estado de tensão ou apreensão cujas causas não são necessariamente
produtoras de medo, mas sim da expectativa de alguma coisa que acontecerá no futuro próximo. As
manifestações de ansiedade e estresse são consideradas normais até o ponto, mal definido, em que começam a
provocar sofrimento no indivíduo.
Na ansiedade e no estresse os ajustes fisiológicos extrapolam o âmbito do SNA e atingem o sistema endócrino e
imunitário. É importante destacar que em tais situações há maior liberação de glicocorticóides, que têm ação
anti-imunitária e anti-inflamatória, podendo provocar queda da resistência a infecções. Resumidamente pode se
relacionar condições de estresse ao eixo amígdala-hipotálamo-hipófise-adrenal da seguinte forma:
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Estímulos de estresse
Ativação da amígdala
Hipotálamo
CRH
Adeno-hipófise
ACTH
Córtex adrenal
glicocorticóides
Alterações metabólicas ( glicogenólise hepática)
Da raiva à agressão. Chama-se raiva a emoção que determina o comportamento de agressão ou ataque,
seja de tipo defensivo ou ofensivo. Relaciona-se com o medo porque pode se seguir a ele, e do mesmo modo
tem um componente subjetivo (o sentimento de raiva), manifestações comportamentais e os ajustes fisiológicos
correspondentes.
O hipotálamo é uma estrutura-chave na expressão comportamental e fisiológica da raiva. Sabe-se que o ataque
ofensivo é produzido por estimulação do hipotálamo lateral e o ataque defensivo, pelo hipotálamo medial.
Emoções positivas, Prazer. Experimentos realizados com ratos demonstraram a existência de um
conjunto de regiões ao longo do feixe prosencefálico medial, além da área septal, como o hipotálamo lateral,
área tegmentar ventral e os núcleos pontinos dorsais, capazes de provocar a auto-estimulação “compulsiva” dos
animais, ou seja, eles acionavam repetidamente uma alavanca que causava estimulações elétricas em
determinadas áreas cerebrais, sugerindo que a estimulação fosse prazerosa para eles.
Mentes Racionais
O córtex pré-frontal, considerado o córtex da razão, é formado por três grandes regiões funcionais:
1- Região ventromedial→ Envolvida com o planejamento de ações e do raciocínio e com o ajuste
social do comportamento. Tudo indica que essa região é a responsável pelo planejamento e a
ordenação temporal dos atos, sua adaptação e ajustes às circunstâncias, e a seleção daquelas mais
adequadas a cada momento e aos objetivos finais. Essa região é encarregada de adequar os dados do
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presente que são processados pelo córtex pré-frontal dorsolateral, com os objetivos de longo, médio e
curto prazo estabelecidos pelo indivíduo, e com as demais circunstâncias pessoais e sociais
envolventes. Essa região cortical é, então, responsável pelo planejamento dos comportamentos
necessários para a concretização dos objetivos.
2- Região dorsolateral→ Encarregada da memória operacional. É essa região que recebe as
informações que entram através dos sistemas sensoriais e chegam a ela através das abundantes
conexões aferentes provenientes das áreas corticais sensoriais. Compete ao córtex pré-frontal
dorsolateral comparar as informações novas (sensoriais) com aquelas armazenadas na memória de
longo prazo. Essa é uma tarefa típica da memória operacional, essencial ao curso do raciocínio.
3- Região cingulada anterior→ Envolvida com as emoções. Tudo indica que as atividades da razão que
envolvem raciocínio lógico para a resolução de problemas e a tomada de decisões, a fixação de
objetivos e o planejamento das ações correspondentes, começam com a focalização da atenção para
as informações que entram. O córtex cingulado é o responsável por essa etapa, que consiste na
modulação das informações processadas pelo córtex pré-frontal dorsolateral.
O córtex pré-frontal estabelece conexões recíprocas com praticamente todo o encéfalo: todas as áreas corticais,
vários núcleos talâmicos e núcleos da base, o cerebelo, a amígdala, o hipocampo e o tronco encefálico. Podemos
imaginar que uma região que possui essas conexões tão variadas tem grandes possibilidades de exercer funções
de controle e coordenação geral das funções mentais e do comportamento.