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Área de Competências-Chave
Cultura, Língua e Comunicação
RECURSOS DE APOIO À EVIDENCIAÇÃO DE COMPETÊNCIAS
Recursos de apoio ao desenvolvimento do processo de RVCC, nível secundário
Núcleo Gerador 3 – AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE
DR2 – Tema: Recursos Naturais
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Tema 3: Recursos Naturais
COMPETÊNCIA: Agir perante os recursos naturais reconhecendo a importância da sua salvaguarda e participando em atividades visando a sua proteção. O que se entende por recurso?
A Terra dispõe de um conjunto de riquezas que são exploradas para utilização em diversas atividades.
Estes bens utilizados pela Humanidade para satisfazer as suas
necessidades de sobrevivência e de desenvolvimento
designam-se por recursos. Estes podem ser renováveis ou não
renováveis.
De um modo genérico, consideram-se recursos naturais
todas as riquezas proporcionadas pela Natureza, que se
encontram no subsolo, no solo e à superfície terrestre.
Atendendo às suas características, os recursos naturais
podem ser divididos em vários tipos: geológicos (ou do
subsolo), hídricos e biológicos. Das matérias-primas de menor
valor, como a areia ou a brita, às de maior valor, como os
minerais preciosos ou o petróleo, todos os recursos naturais
são fundamentais ao desenvolvimento das sociedades, em vários domínios da atividade económica,
nomeadamente na agricultura, na indústria e no comércio.
Disponível na Internet: http://www.envolverde.com.br/noticias/degradacao-de-recursos-naturais-pode-diminuir-capacidade-de-paises-
de-arcar-com-dividas-alerta-pnuma/
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Os recursos do subsolo
Nos recursos geológicos ou do subsolo integram-se os recursos minerais, compostos por diversos
elementos químicos (ferro, alumínio, magnésio ou cálcio, por
exemplo) que existem na crusta terrestre em quantidades
variáveis. Estes formam-se no subsolo em condições
termodinâmicas muito diversificadas, gerando acumulações ou
concentrações locais designadas depósitos minerais ou jazidas.
Obtidos a partir da indústria extrativa, estes recursos são de
grande importância para todos os setores da atividade
industrial, e sem os quais não seria possível manter o nível de
vida da sociedade atual.
Os recursos do subsolo podem subdividir-se em dois
grupos:
. Energéticos - utilizados para produzir eletricidade, calor ou
para movimentar veículos de transporte ou máquinas. Os
mais utilizados são o carvão, o gás natural e o petróleo.
. Matérias-primas - minerais ou rochas que têm como destino
a indústria, onde são utilizados no fabrico dos mais variados
produtos. De entre as matérias-primas destacam-se os
minerais metálicos (ferro, estanho, cobre, volfrâmio), os
minerais não metálicos (feldspato, quartzo, talco), as rochas
ornamentais e os agregados (rochas industriais).
Outros recursos
Os recursos hídricos dizem respeito à disponibilidade de água à superfície, como os rios ou os lagos, bem
como a água existente em reservas no subsolo. A sua utilização incide tanto no abastecimento das
populações, como nas atividades económicas. Dos recursos hídricos disponíveis no subsolo destacam-se as
águas de nascente e as águas minerais.
Os recursos biológicos são os disponibilizados pela vegetação existente à superfície (a madeira, as plantas
medicinais e a biomassa), pela fauna (a vida selvagem e marinha) e pelo solo (a turfa).
Podemos ainda referir o solo arável, a paisagem esteticamente agradável e a biodiversidade como um
recurso natural, entre outros.
In Além, Manuel; Gomes, Gomes, Pedro Tildes. (1913) Geografia A –
10º. Carnaxide: Santillana.
Ordenamento do território, recursos e
sustentabilidade
As questões do desenvolvimento sustentável e do
entendimento do mundo em que vivemos são questões centrais
do ordenamento do território e são, também, questões de
cidadania. (…)
A estruturação do território é resultado de um processo longo e
RECURSOS REBOVÁVEIS E RECURSOS
NÃO RENOVÁVEIS
Diariamente, são retirados da Natureza recursos com diferentes capacidades de regeneração das respetivas reservas. Tratando-se de um recurso finito ou não, os recursos naturais podem ser classificados em renováveis e não renováveis.
Os recursos renováveis são aqueles cujas reservas podem ser continuamente repostas à velocidade com que são utilizadas, considerando-se, assim, que são inesgotáveis.
Os recursos biológicos, por exemplo, apresentam uma velocidade de crescimento relativamente grande, e os hídricos têm uma boa capacidade de manutenção.
Os recursos não renováveis são aqueles que existem em quantidades finitas, não havendo capacidade de reposição das reservas que vão sendo utilizadas. Podemos identificar como fontes de energia renovável, entre outros, os seguintes: biomassa, biogás, energia hídrica, energia solar, energia eólica, energia das ondas e energia das marés.
Disponível na Internet: https://eco4u.wordpress.com/tag/impacto-
ambiental/
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complexo para o qual concorrem a sua componente ambiental e as sociedades humanas que o modelam,
usam e alteram, e a economia que transforma em valor e
utilidade humana os recursos nele disponíveis. (...)
A Lei de Bases do Ordenamento do Território e do
Urbanismo reconhece ao estabelecer como uma das suas
finalidades, “assegurar o aproveitamento racional dos
recursos naturais, a preservação do equilíbrio
ambiental, a humanização das cidades e a
funcionalidade dos espaços edificados”
As realidades do nosso tempo fazem com que as
questões ligadas ao ambiente constituam preocupações
relativamente ao nosso futuro comum. O território é um
recurso e um suporte de vida, em equilíbrio mas
também em mudança, cuja utilização deve assentar num
conjunto de princípios que permitam a sua adequação
às estratégias de desenvolvimento sustentável e à
garantia da perpetuidade da sua capacidade produtiva.
O ambiente é uma condição essencial do
ordenamento sustentável do território e da paisagem e
fundamento das estratégias, metodologias e processos
que o tomam possível. Nomeadamente quanto à gestão
racional de recursos e à compatibilização ambiental das
opções de uso dos solos previstas nos diferentes
instrumentos de planeamento territorial e urbanístico, quaisquer que sejam os seus níveis de detalhe e
modo de organização. O uso sustentável do território assenta em processos de ordenamento e gestão
territorial e urbanística que se apoiam em estratégias coerentes de salvaguarda de recursos e valores
ambientais, naturais e paisagísticos.
O ordenamento do território constitui um processo articulado de organizar os habitats humanos com
vista à criação de melhores condições de vida do ponto de vista ambiental, social e económico, cujo
equilíbrio assenta em três pilares fundamentais: ambiente, sociedade e economia. O professor Jorge Gaspar
chamou-lhe “a arte de adequar as gentes e a produção de riqueza ao território numa perspetiva de
desenvolvimento”. A sua finalidade é permitir à sociedade atual e às futuras prover às suas necessidades
com eficiência, através de um uso regrado, tendo presente que “os seres humanos, as comunidades locais,
regionais, nacionais, são os
destinatários últimos das ações a
empreender - todos sem
exceção.
A organização dos espaços
habitados corresponde a uma
realidade ecossistémica onde as
relações de vizinhança e
pertença que se estabelecem
numa determinada área
geográfica são realidades sociais
e culturais que conferem
dimensão humana e uma
visão integradora ao
Disponível na Internet: http://docplayer.com.br/2714876-Caminhos-da-sustentabilidade-no-recife-secretaria-de-meio-
ambiente-e-sustentabilidade.html
SANTO TIRSO - Disponível na Internet: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?p=128714138
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território, independentemente da sua escala. Deste modo se organiza e promove a qualidade de vida das
populações, a qualificação dos espaços urbanos, periurbanos e rurais, e se torna possível o desenvolvimento
económico-social sustentado.
O território, nas suas diferentes expressões, ao ser apropriado para uso humano, mostra que é suscetível
de ordenamento e de gestão. O modo como as
comunidades humanas o utilizam e nele
estabelecem as suas atividades económicas, sociais
e culturais - sejam elas de produção, de conservação
ou de recreio - é uma condição que contribui para
aumentar ou reduzir as suas potencialidades e a
disponibilidade dos seus recursos ao longo dos
tempos. Conforme a intensidade e o ajustamento
desse uso às suas características naturais e
ambientais, assim o território potencia ou fragiliza a
sua condição de suporte de vida. E abre
possibilidades a um uso continuado ao longo dos
tempos por sequências geracionais. (...)
O ordenamento do território trata do território
no seu todo. Dos espaços rurais, dos espaços urbanos e dos espaços industriais, organizando as tensões que
se expressam pelo dinamismo social e económico que transforma o território e dá forma às paisagens.
Todos quantos intervêm no ordenamento do território são parte ativa neste complexo processo de
organização e gestão dos habitats humanos e dos recursos que os tomam possíveis; independentemente das
suas formações e do grau e natureza do envolvimento e responsabilidade que têm nas decisões que o
concretizam. (...)
As questões ambientais marcam o nosso tempo e o nosso futuro individual e coletivo; contribuem para a
organização da nossa vida em sociedade; modelam de forma consciente e inconsciente os nossos
comportamentos e atitudes; e determinam a nossa evolução como espécie à superfície da terra.
In Fadigas, Leonel. 82007). Fundamentos Ambientais do Ordenamento do Território e da Paisagem. Lisboa: Edições Sílabo
A importância da preservação do meio natural
A necessidade de proteger o meio natural perante a rapidez com que as cidades cresceram e se
divorciaram, enquanto
paisagens e habitats, da sua
envolvente originária, é
culturalmente recente. Corres-
ponde a um movimento que
acompanha as transformações
tecnológicas e culturais que, nos
países mais desenvolvidos,
deram origem a práticas
agrícolas e florestais redutoras
da diversidade biológica e
transformaram intensamente
paisagens tradicionais. Disponível na Internet: http://www.sindicatoseguradoras.com.br/ansp-reforca-
estudos-sobre-sustentabilidade-setor-de-seguros/
VALINHAS - SANTO TIRSO - http://adamirtorres.blogs.sapo.pt/15259.html
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O crescimento e a expansão das cidades, em paralelo com a transformação aceleradas das paisagens
tradicionais, originaram, nas relações humanas e na memória coletiva dos povos, outras transformações. A
conservação da natureza começou por ter como objetivo a proteção e a conservação de espécies animais e
vegetais ameaçadas, ou em risco de extinção; só mais tarde, alargou-se ao território e à paisagem. (…)
A conservação da natureza, como atitude, é um modo de gestão equilibrada de habitats e não um
conjunto isolado de
normas de proteção de
espécies, animais ou
vegetais. A importância
que vem assumindo, como
matriz comportamental e
como trave-mestra da
regulação dos processos
de ordenamento do
território, condiciona os
processos de uso do solo,
quer se trate de atividades
agrícolas, florestais ou
silvo-pastorícia, quer se
trate de uso urbano-
industrial. A componente
natural do meio é um
repositório de valores diferenciados, de cujo cruzamento resulta uma unidade geográfica, cultural, visual e
biofísica, com identidade e valores próprios. Razão porque as questões da conservação da natureza não
são apenas questões de conservacionismo estrito, de manutenção de paisagens tradicionais, de proteção
de espécies ameaçadas ou em vias de extinção.
O estudo dos habitats é, em termos de conservação da natureza, uma condição sem a qual ela não tem
sentido. Não é possível conservar espécies ameaçadas ou em vias de extinção se não se conservarem os seus
habitats. O desaparecimento dos habitats conduz sempre, e de forma irremediável, ao desaparecimento das
espécies a eles associadas. O que é bem evidente hoje por efeito das transformações sofridas pelos
agrossistemas tradicionais.
A redução de culturas tradicionais como a cultura cerealífera, por exemplo, fez com que se reduzissem
significativamente as populações de perdizes; a tal ponto que é preciso manter artificialmente essa cultura,
para garantir a existência destas aves nas coutadas de caça. O caso do lince da serra da Malcata é outro
exemplo de como não é possível manter
uma espécie no território quando O seu
habitat é alterado e a sua base alimentar
desaparece. É um facto que estes
fenómenos não são de agora; mas é
agora que eles ganham importância e
expressão. Os animais de grande porte,
que ainda existiam e eram caçados entre
Alenquer e Santarém durante o século
XIV, desapareceram, quando
desapareceram as matas onde viviam.
A reposição de habitats e as medidas
de proteção da fauna podem fazer
SANTO TIRSO - Disponível na Internet: http://olhares.sapo.pt/pontes-sobre-o-rio-ave-em-santo-tirso-foto4710792.html
VALINHAS, SANTO TIRSO - Disponível na Internet: http://dias-com-arvores.blogspot.pt/2007/04/um-de-vs-ser-coroado-rei.html
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regredir estas situações. O aumento de populações de lobos e de javalis em algumas regiões do centro e
norte do país é disso exemplo.
A conservação da natureza corresponde a uma atitude inteligente e ao uso racional e proporcionado
dos recursos disponíveis: paisagens, espécies em vias de extinção, monumentos naturais, habitats ou sim-
plesmente legados da ação humana
sobre o território, para uso das
gerações atuais e futuras. Como tal, é
uma condição de sustentabilidade dos
territórios e do seu desenvolvimento
integral, económico e social que o
Estado assumiu como um
compromisso, conforme consta do n.º
1 do art.º 10 do Decreto-Lei n.º 19/93,
de 23 de janeiro: “A conservação da
natureza, a proteção dos espaços
naturais e das paisagens, a preservação
das espécies da fauna e da flora e dos
seus habitats naturais a manutenção dos
equilíbrios ecológicos e a proteção dos
recursos naturais contra todas as formas de degradação constituem objetivos de interesse público, a
prosseguir mediante a implementação e regulamentação de um sistema nacional de áreas protegidas”.
No ordenamento do território, a integração da conservação da natureza e dos seus valores faz-se pela
adoção de políticas e estratégias destinadas a garantir a gestão dos recursos vivos e inertes com manutenção
dos equilíbrios ambientais e reforço da biodiversidade.
Os valores patrimoniais que se incluem na lista das ocorrências que, de um ponto de vista da
conservação da natureza, devem merecer atenção especial no ordenamento do território são o património
geológico, incluindo os monumentos naturais ou geo-monumentos, o património botânico e genético que
a flora espontânea e a flora introduzida e adaptada constituem, o património faunístico e as paisagens.
In Fadigas, Leonel. 82007). Fundamentos Ambientais do Ordenamento do Território e da Paisagem. Lisboa: Edições
Sílabo
Respeitar as áreas naturais
Há uma crescente ocupação do espaço natural pela atividade humana (agricultura, floresta, estradas,
urbanizações, etc.),
sendo já relativamente
escassos os locais que
ainda conservam parte
ou grande parte dos
valores paisagísticos e
ecológicos como
serras, matas, rios,
praias, etc., alguns dos
quais com estatuto de
proteção legal (áreas
de paisagem Área protegida da caloura – S. Miguel Açores
Disponível na Internet: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1057449&page=4
A3, junto ao nó de Santo Tirso - Disponível na Internet: http://dias-com-arvores.blogspot.pt/2007/04/um-de-vs-ser-coroado-rei.html
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protegida, parques naturais, etc.). O impacto negativo da atividade humana nestes locais é, muitas vezes,
elevado, desde o desrespeito das mais elementares regras de civismo à pressão urbanística, por exemplo.
Um dos impactes importantes que estas áreas sofrem é a deposição indiscriminada de todo o tipo de lixos
como, infelizmente, demasiadas vezes todos nós testemunhamos. De modo a termos uma ideia quantificada
deste problema podemos tomar como exemplo as estatísticas das campanhas "Costa Viva" organizadas pelo
Espeleoclube de Torres Vedras e a Associação de Defesa do Património de Torres Vedras, integradas nas
comemorações do Dia Mundial do Ambiente, que se celebra a 5 de junho, com a participação das escolas do
concelho.
Assim, desde o início destas campanhas anuais, 1995, até 2005, participaram cerca de 3200 alunos e
foram recolhidas cerca de 48 toneladas de lixo, como pneus, embalagens, resíduos de estufas, restos de
eletrodomésticos, papel e cartão, restos de bicicletas e motos, colchões, lixo doméstico, etc.. Só no primeiro
ano, com a participação de apenas 80 alunos foram recolhidas 10 toneladas de lixo. Nos anos subsequentes a
média situou-se nos 300 alunos participantes e na recolha de quatro toneladas de lixo. Em 2005 "apenas"
foram recolhidas 1,5 toneladas, ainda assim demasiado lixo para apenas um dia de recolha!
Os incêndios são outro flagelo, tendo, por exemplo, em 2005, 26,8% da sua origem sido devida ao uso
negligente do fogo (fogueiras, churrascos, queimadas). A destruição das dunas é também visível na extensa
área de costa do nosso país, devido à extração de areias e veículos todo-o-terreno. No entanto, a proteção
do cordão dunar é essencial para que o mar não avance e a praia não desapareça. A crescente procura
destes locais em atividades de ar livre, como escalada, percursos pedestres, BTT, passeios equestres,
canoagem, circuitos todo-o-terreno, desportos náuticos, etc., exige de quem os desfruta uma atitude cívica
de modo a diminuir os impactes que causamos.
Ambiente e Cidadania in http://sn247618.web.simplesnet.pt/mpica/pdf IN19 Respeitar_areas_naturais.pdf, . Junho 2010
(adaptado)
Identidade geográfica e cultural das populações e sua relação com os recursos naturais
O Relatório Planeta Vivo 2008 da WWF
demonstra que o uso insustentável da água é um
problema crescente no mundo, e que o declínio
dos ecossistemas hídricos é mais acentuado que o
declínio da biodiversidade marítima e terrestre. Na
base deste declínio estão o aumento das captações
de água para a agricultura e o abastecimento
urbano, as más políticas e práticas de gestão, e a
perda de habitats devido à urbanização e
construção de infraestruturas.
O mesmo relatório posiciona Portugal na 6.ª
posição (num conjunto de 140 países analisados)
entre os que apresentam uma pegada hídrica mais
elevada por habitante. Mas esta situação não é apanágio somente de Portugal entre os 6 países que têm a
mais elevada pegada hídrica estão 5 da região Mediterrânica, considerada um dos hotspots de
biodiversidade a nível mundial. A posição destes países reflete em boa parte as condições climáticas
mediterrânicas dominantes: verões secos e quentes, a que acresce um regime de precipitação muito
variável, em que chuvas torrenciais alternam com secas prolongadas. No verão, quando a oferta de água é
Rio Ave – Açude em Santo Tirso Disponível na Internet:
http://community.eu.playstation.com/t5/Discuss%C3%A3o-Geral/A-minha-terra/td-p/10768904/page/2
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mais escassa, assistimos a uma procura de água crescente para as atividades agrícolas de regadio e consumo
urbano. A este padrão natural climático junta-se o crescimento da procura de água, baseado em padrões de
desenvolvimento insustentáveis e em más práticas de uso e gestão, que favorecem o consumo e o desper-
dício. Também as alterações climáticas reduzem a disponibilidade de água no nosso país. (...)
Portugal tem recursos hídricos relativamente abundantes face ao contexto da região Mediterrânica,
ficando somente atrás da Grécia a este nível e apresentando uma taxa de escassez de água de 33%. No
entanto, o problema da escassez de água em Portugal deve ser equacionado tendo em conta 3 questões
estruturais:
1) A dependência externa do país face a Espanha, onde têm origem mais de 67% dos recursos hídricos
superficiais do país;
2) O elevado peso do setor agrícola - Portugal é o país da Europa do sul com uma taxa mais elevada de
consumo de água na atividade agrícola (por habitante), representando 78% do total da procura de água;
3) As desigualdades geográficas que
apontam para uma clara divisão entre Norte e Sul,
sendo a região sul do país afetada por graves
problemas de escassez de água.
O olival é a cultura que utiliza mais água
virtual em Portugal, e por isso foi selecionado
neste relatório como caso de estudo. Para além do
elevado consumo de água associado aos olivais
modernos e intensivos, o país não é
autossuficiente relativamente à produção de
azeite e azeitona, e importa uma grande parte de
Espanha.
Apesar de comparativamente aos seus
parceiros europeus apresentar uma baixa produtividade, o olival de regadio tem vindo a expandir-se,
particularmente na bacia hidrográfica do Guadiana (estima-se em mais de 30 000 ha a área ocupada por
novos olivais na última década, associada ao novo perímetro de rega de AIqueva). O balanço do comércio
externo de azeite e azeitona com Espanha representa uma importação virtual de água na ordem dos 868
hm3 - o equivalente a mais de 1/5 da capacidade da albufeira de Alqueva.
O setor agrícola é o maior responsável pela pegada hídrica de Portugal, sendo simultaneamente muito
pouco eficiente - é altura de concentrar esforços no incremento da gestão eficiente da água no setor agrí-
cola, reduzindo, assim, a pegada hídrica portuguesa.
Pegada Hídrica em Portugal. Resumo do relatório. “Water Footprint in Portugal". WWF Mediterrâneo. 2010 (adaptado)
A preservação dos recursos naturais
O progressivo colapso do cordão dunar da Costa de Caparica, ao ritmo das luas cheias e luas novas de
cada inverno, ilustra de forma exemplar um problema clássico, tradicionalmente pouco atendido, mas hoje
crucial para a Humanidade: as sociedades humanas têm, ao longo de milénios, mas com particular
intensidade ao longo dos dois últimos séculos, produzido bem-estar à custa da destruição de recursos
naturais.
As consequências não são geralmente percetíveis a curto prazo e quando se apresentam a longo prazo
tomam por vezes formas surpreendentes. No caso vertente, vai provavelmente ser necessário optar entre a
perda de um espaço litoral significativo para o mar e a realização de obras que consumirão grandes recursos
Rega a partir da albufeira do Alqueva Disponível na Internet:
http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2012/09/27g.htm
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e que poderão defender a existência desse espaço litoral, mas serão possivelmente incapazes de preservar as
suas características naturais e de o devolver às utilizações económicas que anteriormente tinha.
Argumenta-se frequentemente em tomo deste
problema das relações entre preservação de recursos
naturais e produção de bem-estar segundo duas linhas.
Uma afirma que não faz sentido preservar os
recursos naturais se eles não puderem ser fruídos pelos
seres humanos. As restrições à utilização de recursos
são, nesta linha, consideradas negativas, porque
limitam a produção de bem-estar. Outra afirma que a
preservação dos recursos naturais deve ser vista como
uma oportunidade de negócio e não como uma
ameaça aos negócios. A produção de bem-estar surge,
nesta linha, como um subproduto da preservação dos
recursos naturais.
Sem querer negar validade a estas linhas de
argumentação, importa sublinhar que elas não vão ao fundo do problema. Na verdade, em nenhuma delas a
preservação dos recursos naturais é considerada um bem, por si próprio proporcionador de bem-estar.
Nestas circunstâncias, é sempre a utilização da natureza como meio de produção, direto ou indireto, que
baseia a avaliação da razoabilidade da sua preservação. Se os recursos naturais não forem utilizáveis, ou não
proporcionarem negócios para serem preservados, então não há razão para os preservar. (...)
É esta segunda razão para preservar os recursos naturais (como bem de produção de longuíssimo
prazo) que, a uma escala muito pequena, é ilustrada pelo colapso do cordão dunar da Costa de Caparica. É
claro que a Costa de Caparica é praticamente irrelevante à escala da Humanidade. Mas a multiplicação de
fenómenos da mesma natureza não é.
Nuno Valério, Diário de Notícias, 24 de janeiro de 2017
Hábitos de vida e tempos de lazer "verdes"
Ecoturismo
O turismo - atividade transversal a todos os setores - constitui hoje uma das maiores indústrias mundiais.
No entanto, o turismo tradicional, massificado, tal como o
conhecemos, está esgotado e mostra insuficiências na moti-
vação e oferta de atrativos que satisfaçam o turista atento,
exigente e cada vez mais sensível às questões e produtos de
qualidade. Nasce assim a grande oportunidade para turismo
do Séc. XXI: o turismo aliado ao ambiente - o Eco-turismo
que, como o próprio nome indica, alia as componentes
ecológica, ambiental e turística.
Também designado de turismo alternativo, turismo
verde, turismo ecológico ou turismo de natureza, o
Ecoturismo visa integrar a experiência turística com a
proteção e conservação dos recursos naturais e
construídos, a valorização económica e a participação da
população local, constituindo um meio privilegiado para a sustentabilidade local.
Albufeira Disponível na Internet:
http://www.colegiovascodagama.pt/ciencias3c/onze/geologia1.2.html
Passadiço do Paiva Disponível na Internet: http://www.vortexmag.net/5-
actividades-turisticas-fora-do-vulgar-em-portugal/
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Esta nova atitude, sustentável, vem contrariar o turismo tradicional com bem de consumo de massas
no qual, além de raras vezes se considerar devidamente o fator ambiental e ecológico, os benefícios para as
populações locais são escassos e os turistas recebem uma visão estereotipada e, muito frequentemente,
distante da realidade. O termo Ecoturismo surge associado a uma filosofia de desenvolvimento equilibrado
de forma a utilizar o potencial turístico do local para gerar riqueza, a par da manutenção e valorização das
qualidades ambientais da região.
Consideram-se quatro aspetos fundamentais que, pela sua articulação, revelam o Ecoturismo como
sinónimo de sustentabilidade. São eles:
. a proteção dos recursos naturais,
. a valorização económica;
. a participação da população local;
. o turismo como uma ferramenta de conservação.
Carlos Cupeto - Ecoturismo, a sustentabilidade do turismo no século XXI [Julho 2003)
In htpp://www.ciari.orgopiniao/ecoturismo.htm, junho de 2010 (adaptado)
Diminuição da biodiversidade
As previsões apontam para uma perda de biodiversidade de entre 2 a 7%
das espécies mundiais nos próximos 20 anos, ao ritmo de 20 a 75 espécies
por dia (atendendo apenas às espécies identificadas).
As causas da degradação incessante dos ecossistemas naturais do
planeta que atentam contra a biodiversidade são:
- a desflorestação da floresta tropical, onde vivem 2/3 das espécies da
fauna e da flora do mundo;
- a pressão agrícola, com a criação de ecossistemas artificiais protegidos
dos seres indesejáveis;
- a caça e a pesca não regulamentadas, que têm dizimado espécies;
- a poluição da água, do ar e dos solos.
Os ecossistemas funcionam e têm vitalidade com base numa cadeia de
interações que, se forem interrompidas, põem em causa o seu equilíbrio.
Se juntarmos a menor diversidade biológica às rápidas mudanças
climáticas em curso, a capacidade de adaptação será menor,
comprometendo a evolução da vida no planeta e a sobrevivência dos seres humanos.
Consumo de peixe em Portugal é dos mais prejudiciais ao planeta
Depois dos alertas da OMS sobre o perigo da ingestão das carnes transformadas, um relatório que é
hoje divulgado avisa que o elevado consumo de peixe em Portugal também pode ser um problema
ambiental.
Portugal é o país mediterrânico cuja alimentação mais faz mal ao planeta. E, por irónico que pareça, a
maior culpa é do elevado consumo de peixe – um alimento saudável.
Esta conclusão surpreendente resulta de um estudo publicado esta quinta-feira pela Global Footprint
Network, a organização responsável pelos cálculos da “pegada ecológica”. Este indicador representa a área
Disponível na Internet: http://www.ids.pt/desenvolvimento.h
tml
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da Terra necessária para produzir o que cada pessoa consome ou necessita, dos alimentos a roupa, dos
combustíveis a edifícios.
Para Portugal, este valor é de 4,5 hectares por habitante. É o quarto país mediterrânico com a maior
pegada ecológica, depois de França, Eslovénia e Itália.
Mas na alimentação, o país lidera o ranking. Cerca de 1,5 hectares de terra ou mar são necessários para
garantir o almoço, o lanche e o jantar dos portugueses. Ninguém necessita de tanto espaço produtivo para
matar a fome entre os países do Mediterrâneo, região sobre a qual incide o estudo. A seguir vêm Malta (1,25
hectares por pessoa), Grécia (1,22) e Espanha (1,15).
Dois factores contribuem para este resultado. O primeiro é simples: em Portugal, come-se muito. A FAO –
a agência das Nações Unidas para a alimentação e a agricultura – recomenda como saudável uma dieta diária
de 2500 quilocalorias por pessoa. Em Portugal, consomem-se 3500 – 40% a mais. “Isto não é exclusivo de
Portugal. Encontramos valores similares noutros países, como Espanha, Grécia e Itália”, afirma Alessandro
Galli, director da Global Footprint Network para a área do Mediterrâneo.
O segundo factor encerra uma grande ironia. Portugal é um dos países com maior consumo per capita de
peixe no mundo – um dado positivo pelo lado da saúde. Mas o apetite nacional dirige-se muito para espécies
de topo, como o bacalhau e o atum, que requerem mais recursos para se desenvolver.
O atum, explica Alessandro Galli, alimenta-se de
sardinhas, que por sua vez se alimentam
de plâncton, os minúsculos organismos em suspensão
na água. Na prática, é preciso uma área muito maior
da plataforma continental para produzir
o plâncton necessário para um peixe num elo superior
da cadeia alimentar. “O impacto do consumo de um
quilo de atum equivale ao de dez quilos de sardinhas”,
explica Alessandro Galli.
A importação também pesa. Em 2014, 481 mil
toneladas de pescado vieram de fora, contra 283 mil
toneladas da exportação, segundo dados oficiais.
Dizer que comer peixe faz mal à Terra é mais uma Disponível na Internet:
http://www.feriaspeniche.com/restaurante-popular/
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má notícia para a mesa nacional. Na segunda-feira, a Agência Internacional de Investigação do Cancro da
Organização Mundial de Saúde anunciou ter
classificado as carnes processadas – como
chouriços, presuntos e bacon – como produtos
cancerígenos. As autoridades nacionais de
saúde apressaram-se a esclarecer que o
importante é garantir o uma dieta equilibrada.
No caso do pescado, Alessandro Galli diz que
não está em causa deixar de os comer, mas sim
escolher melhor. “A minha recomendação é
comer peixe mas diversificar, preferir peixes em
posição mais baixa na cadeia alimentar, como as
sardinhas”, diz.
Porém, neste momento, a maré também não está para as sardinhas. O stockibérico desta espécie nunca
esteve tão baixo e os cientistas dizem que no próximo ano não se deve capturar mais do que 1600
toneladas nos mares de Portugal e Espanha – apenas 10% da quota de 2015. Mas outras espécies, como o
carapau e a cavala, são hoje mais abundantes.
Os dados agora divulgados são uma nódoa na imagem positiva dos hábitos alimentares do Mediterrâneo.
Alessandro Galli argumenta, porém, que a verdadeira dieta mediterrânica é composta sobretudo de
produtos como legumes, verduras, cereais e azeite, com consumo moderado de carne ou peixe.
“O meu argumento é o de que a dieta mediterrânica é boa para o ambiente, mas acabámos por nos
afastar um pouco dela”, afirma.
Com o peso da alimentação, Portugal vai muito além da sua capacidade biológica de satisfazer o consumo
dos seus habitantes. A pegada ecológica é de 4,5 hectares por pessoa, mas o país só tem 1,3 hectares
produtivos per capita.
A meta não é ser auto-suficiente, algo que seria impossível para a generalidade dos países. Mas, para
a Global Footprint Network, cada nação deveria ter como guia a biocapacidade global para sustentar o
consumo dos seus habitantes, que é de 1,8 hectares por pessoa.
Garcia, Ricardo, In Jornal Público, publicado em 29 de outubro de 2015
Estilos de vida, ambiente e sustentabilidade
A nossa vida tem de mudar
Há 25 anos discutia-se em Portugal a construção de uma central nuclear. A aprovação do projeto
esteve por um fio num épico Conselho de Ministros onde o então Ministro da Qualidade de Vida, levou a
melhor sobre o Ministro da Indústria. (...) O país discutiu na altura, com profundidade e grande repercussão
na opinião pública, um Plano Energético que, numa época em que algumas das renováveis hoje operacionais
eram apenas quimeras, já colocava o dedo na ferida: o país necessitava de apostar mais na conservação de
energia, tinha de investir em energias mais limpas e, sobretudo, era preciso que a economia crescesse a um
ritmo mais rápido do que o do consumo de energia. Passados todos estes anos – uma geração - alguns destes
problemas continuam em cima da mesa. Introduzimos o gás natural na última década do século passado mas
cometendo alguns erros. Atrasámo-nos demasiado na promoção das energias renováveis - sobretudo na
exploração da energia eólica.
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O muito que se andou não evitou, contudo, que o ritmo de crescimento do consumo de energia tenha
sido, neste período, muito superior ao ritmo de crescimento da riqueza nacional. Ainda hoje o ritmo de
crescimento do consumo de energia é superior ao ritmo de crescimento do PIB quando, há 25 anos, a maior
parte dos nossos parceiros europeus já tinha conseguido
inverter essa tendência.
Isto significa que continuamos a ser pouco eficientes
na utilização da energia, em boa parte porque o país
depende em demasia do transporte automóvel, quer para
as mercadorias, quer para as deslocações particulares,
porque a qualidade de construção não melhorou e porque
os hábitos de consumo dos portugueses levam-nos a
consumir muito mais energia nos inúmeros aparelhos que
hoje enchem as suas casas. Tempos de crise como os que
hoje atravessamos devem-nos levar a repensar muitos dos
hábitos fáceis que adquirimos. Não basta, por exemplo,
trocar as lâmpadas normais por lâmpadas de baixo
consumo: é necessário fazer como os nossos avós, que
apagavam a luz quando saíam da sala.
Não chega escolher um frigorífico mais eficaz ou uma televisão mais económica, é necessário aprender
a utilizá-los de forma racional. E não se pode continuar a escolher um automóvel sem olhar para os níveis de
emissão de CO2.
Tudo isto e muito mais tem de ser feito porque nem que colocássemos torres eólicas em todas as
cristas das nossas serras e forrássemos o Alentejo de painéis solares produziríamos a energia suficiente para
as nossas necessidades. As renováveis são boas, mas não resolvem todos os problemas se mantivermos os
nossos atuais hábitos de consumo. É bom não ter ilusões.
José Manuel Fernandes, Dia da Terra: a nossa vida tem de mudar. In público, 22 de Abril de 2009 (adaptado)
Preservação Ambiental: Dá que pensar!
O processo de "desertificação" do interior do país e que também poderíamos designar como processo de
"desurbanização", tem como consequência mais direta e evidente a "concentração" de pessoas e de
atividades na orla costeira, gerando, por sua vez, o fenómeno da "sobreurbanização" .
Contudo, se a estas questões de índole demográfico-geográfico-territorial, acrescentarmos as enormes
transformações de todo o tipo que o Mundo sofreu
nos últimos anos, verificaremos que o conceito de
"aldeia global" que apareceu para significar o
drástico encurtamento de todas as distâncias (e não
apenas físicas ou materiais), está ainda muito longe
de representar, sequer, um salto significativo na
qualidade de vida dos povos em geral.
Claro que nenhum destes fenómenos é
tipicamente português! Situações idênticas
verificam-se nos quatro cantos do Mundo, ainda
que com intensidades diferentes. Em qualquer
Disponível na Internet: https://jornalismoaudiovisual.wordpress.com/2013/03/18/novas-propostas-de-reducao-de-co2-nos-automoveis-podem-
gerar-empregos/
Disponível na Internet: http://www.atlanticurbangardens.com/pages/48
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caso, a constante é o sistemático e generalizado crescimento ininterrupto das cidades e, portanto, a
"urbanização intensiva" do território, iniciada com a Revolução Industrial há mais de dois séculos e que
acabou por alterar profundamente o modo como, até
então, o homem ocupava e explorava o espaço de que
dispunha. E os números são, hoje, bem elucidativos.
Com efeito, 75% da população mundial vive em cidades
e também é nessas cidades que é produzida cerca de
75% da riqueza global.
Por outro lado, é um facto que, tal como acontece
entre nós, também cerca de 75% das cidades localizam-
se na orla marítima dos diversos continentes, nas
margens dos grandes rios ou lagos e, portanto, em
"frentes de água" extensas e contínuas. Significa isto
que, mesmo nos dias de hoje, a presença e a
disponibilidade de água continuas a ser um critério
fundamental para o desenvolvimento dos mais diversos assentamentos humanos, assim como é,
naturalmente, a disponibilidade de solo. Um e outro - água e solo - são, no entanto, recursos que estão
muito longe de serem inesgotáveis e não tardará muito que comecem a ser verdadeiros dramas já que,
ambos, têm sido consumidos sem regra nem ordem e isso, como tudo o que é mal gasto ou desbaratado,
paga-se. E, em alguns casos, já não faltará muito para que o solo vá mesmo pela água abaixo!
O problema é que nenhum destes modos de ocupação territorial - a "desurbanização" e a
"sobreurbanização” foram minimamente controlados, apesar de claramente pressentidos, e,
consequentemente, contrariados como deviam ter sido. Pelo contrário! Em muitos casos foram claramente
consentidos e, por vezes, até, vergonhosamente incentivados! Portugal não tem - ainda - um verdadeiro
"plano" (ou um "sistema de planos" ou de "modelos de referência", para quem abomine o chavão) que
preveja portanto, "desenhe" o presente e prefigure o futuro. Mas parece que também não tem uma "ideia"
muito clara que quer ser. Contudo, um "conceito" minimamente estruturado do que, em conjunto,
pretendemos ser, ou seja, sem uma "identidade" definida e assumida, não é possível construir qualquer
"projecto" e, sobretudo, levar à prática qualquer "obra"! A verdade é que sem isto - sem um ideal - é muito
difícil chegar a qualquer lado. Por isso, tudo que seja desviar a atenção deste desiderato - como neste
momento está a acontecer - é adiar por longos anos comprometer por gerações a hipótese de felicidade que
procuramos. Por isso, dá que pensar o modo como temos a gastar os nossos recursos!
Manuel Correia Fernandes, Jornal de Notícias, 21 de Fevereiro de 2010
Mais do mesmo?
Olhemos para alguns dados: a China tomou-se no primeiro consumidor de quatro das cinco principais
matérias-primas (cereais, carne, carvão e aço), só no petróleo ela é ultrapassada pelos Estados Unidos. Em
2002, a China já consumia 380 milhões de toneladas de cereais (contra 260 dos EUA), 258 milhões de aço
(mais do dobro dos EUA, que ficaram nos 104). Ela lidera o consumo de telefones, de televisões, de
frigoríficos, não deixando aos EUA o primeiro lugar senão nos computadores e nos automóveis. Em 2009, a
China tomou-se no principal exportador mundial, ultrapassando a Alemanha.
Olhemos também para o que se pode prever que acontecerá se a China atingir os padrões de consumo
americanos em diversos setores. Se atingir os níveis dos EUA no consumo de papel, virá a consumir 300
milhões de toneladas, ou seja, quase todas as florestas do planeta! E, se atingir o patamar americano de
Disponível na Internet: http://www.diarioliberdade.org/america-latina/consumo-e-meio-natural/43344-havana-cidade-da-
agricultura-agroecol%C3%B3gica-e-sustent%C3%A1vel.html
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consumo automóvel, precisará de 99 milhões de barris de petróleo por dia, mais do que a produção mundial
atual, que anda nos 84 milhões.
Olhando para tudo isto, facilmente se percebem os limites do modelo de crescimento ocidental e as
consequências da sua aplicação a um país com a dimensão e a população da China - para já não falar das
extrapolações que se podem fazer à escala mundial. Assim sendo, a questão é saber qual poderia ser o
modelo alternativo... e aqui as respostas escasseiam, mesmo ao nível mais embrionário. Tudo se passa como
se o Ocidente, apesar da profundidade da crise que o abala e da multiplicidade das apreensões que suscita,
tivesse o segredo de um "sucesso" que todo o planeta quer seguir, a fórmula de um "progresso" que todos
querem atingir a um notável paradoxo: nunca se falou tanto, e com motivações tão fortes, das fricções
civilizacionais que acompanham a emergência de novos polos de poder no mundo e o declínio do Ocidente.
E, no entanto, nunca a ocidentalização do
mundo foi tão intensa como nos dias de hoje:
no horizonte global não se vislumbra qualquer
outro modelo de desenvolvimento que não seja
o que o Ocidente consagrou no ú1timo século e
meio. (. ..)
O esgotamento deste modelo, que se
acentuou nas últimas décadas, está
contaminado não só pela ficção de um crédito
tão acessível como ilimitado, como por outros
dois movimentos, simultâneos e contraditórios:
enquanto no Ocidente se reconhece cada vez
mais que já se ultrapassaram os limiares da
prudência no consumo dos recursos naturais e
na devastação do planeta, no resto do Mundo, nomeadamente na Ásia, ignoram-se todos os sinais terminais
do modelo que fez o êxito do Ocidente.
Ora, partindo das tendências atuais, é um facto que os países emergentes poderão multiplicar por quatro,
até 2050, o seu nível de desenvolvimento (...) atingindo então o que os EUA tinham alcançado em 2005, isto
é, cerca de 40 mil dólares por pessoa. O que, se tivermos em conta que a população mundial andará então
nos nove mil milhões, implicará que a riqueza produzida se multiplique por seis… o salto parece inverosímil,
como parece improvável que a Terra aguente. (...)
A verdade é que a globalização tornou o modelo ocidental num amargo sucesso: ao contrário do que
muitas vezes se diz, o principal risco que o mundo corre está hoje menos no confronto de culturas ou de
civilizações do que na repetição, a nível planetário, da história da Europa e do Ocidente.
Movimentos de sensibilização ambiental
A Hora do Planeta
A Hora do Planeta ou no original Earth Hour, é uma campanha de sensibilização ambiental que se iniciou
como um movimento quase espontâneo dos
habitantes de Sidney que, em 31 de Março de
2007 desligaram as luzes por uma hora iniciando
um protesto unificado contra as alterações
climáticas.
Apagar as luzes por uma hora - a Hora do
Disponível na Internet: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=27301
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Planeta - é, não só contribuir para a preservação do nosso Planeta, como fazer parte da maior plataforma
voluntária de cidadãos contra as alterações climáticas.
Pelo segundo ano consecutivo, Portugal aderiu à Hora do Planeta e os resultados ultrapassaram as
expectativas!
Todos os dias várias cidades e vilas do país procuraram saber como aderir a este movimento, que este
ano ultrapassou em larga escala os números atingidos em 2009. Foram 27 os municípios aderentes.
Monumentos nacionais engrossaram a lista de mais de uma centena de monumentos que em Portugal e
em milhares de países em todo o mundo ficaram às escuras em nome desta mensagem poderosa da WWF e
da Hora do Planeta: ajudar a manter o nosso Planeta Vivo!
O Planeta conta consigo e com milhares de empresas e organizações, na Hora do Planeta e todos os
outros dias e horas do ano, para liderar esta luta para marcar a diferença e fundamentar uma mudança real!
Energia em Equilíbrio, 27 de Março de 2009 in http://energiaemequilibrio.com/blog/energia-emequilibri 0/ a-hora-do-planeta-
uma- hora-para-Iutar - c ontra-as-alteracoes-climaticas/, Junho 2010
Participação em comunidades online
A Internet é um meio privilegiado de comunicação, com um alcance global. Não existe outro meio,
actualmente, capaz de difundir informação a uma escala global e de forma tão fácil e rápida. Neste contexto,
as práticas ambientalmente saudáveis podem ser difundidas por este meio de forma eficiente e são
inúmeros os blogues, fóruns, salas de conversação e sítios da Internet dedicados às questões ambientais.
Legislação Ambiental: direitos e deveres
A atenção dada até ao momento aos deveres do cidadão em assumir hábitos ambientalmente adequados
não pretende descurar os seus direitos. Direito a utilizar recursos, a potenciar o seu crescimento económico,
a consumir. A legislação em vigor estabelece um conjunto de direitos e deveres do cidadão perante o
ambiente e sugere normas a seguir por todos com o objetivo de atingir metas que melhorem o ambiente,
que é de todos.
Acesso à informação sobre ambiente
A lei que regula o acesso à informação sobre ambiente, na posse
de autoridades públicas ou detida em seu nome tem por objetivos:
a) garantir o direito de acesso à informação sobre ambiente
detida pelas autoridades públicas ou em seu nome;
b) assegurar que a informação sobre ambiente é divulgada e
disponibilizada ao público;
c) promover o acesso à informação através da utilização de
tecnologias telemáticas ou eletrónicas.
O direito de acesso à informação ambiental é assegurado pelas
autoridades públicas, que devem recolher e organizar a informação
sobre ambiente na sua posse ou detida em seu nome no âmbito
das suas atribuições e asseguram a sua divulgação ao público de forma ativa e sistemática, através,
Disponível na Internet: http://meioambiente.culturamix.com/gestao-
ambiental/codigo-ambiental
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nomeadamente, de tecnologias telemáticas ou eletrónicas, quando disponíveis. Devem assegurar que essa
informação está atualizada e disponível em bases de dados eletrónicas facilmente acessíveis ao público
através de redes públicas de telecomunicações, designadamente através da criação de ligações a sítios da
Internet.
Direito de acesso à informação sobre ambiente
1. As autoridades públicas estão obrigadas a disponibilizar ao requerente informação sobre ambiente na sua
posse ou detida em seu nome, sem que o requerente tenha de justificar o seu interesse.
2. Para efeitos do disposto no número anterior, o requerente deve apresentar o pedido de informação por
escrito, do qual constem os elementos essenciais à identificação da mesma, bem como o seu nome,
morada e assinatura.
3. O acesso à informação de ambiente pode ainda ser efetuado através de consulta junto da autoridade
pública.
Prazo para disponibilização da informação
1. A informação sobre ambiente é disponibilizada ao requerente, o mais rapidamente possível, nos seguintes
prazos:
a) No prazo máximo de 10 dias úteis sempre que o pedido tenha por objeto informação que a autoridade
pública, no âmbito das respetivas atribuições e por determinação legal, deva ter tratada e coligida;
b) No prazo máximo de um mês nos restantes casos.
2. Os prazos previstos no presente artigo são contados a partir da data de receção do pedido pela autoridade
pública.
Artigo 10.º Forma de disponibilização da informação
1. A autoridade pública deve disponibilizar a informação sobre ambiente na forma ou formato solicitados
pelo requerente, exceto se:
a) A informação já se encontrar publicamente disponível sob outra forma ou formato facilmente acessível
ao requerente, nomeadamente nos termos do artigo 5.º;
b) A autoridade pública considerar razoável disponibilizar a informação sob outra forma ou formato,
devendo, nesse caso, comunicar as razões por que o faz.
2. As razões da recusa de disponibilização total ou parcial das informações, sob a forma ou o formato
pedidos devem ser comunicadas ao requerente no prazo máximo de 10 dias úteis contados da data de
receção do pedido.
3. Para efeitos do disposto no presente artigo, as autoridades públicas devem assegurar que a informação
sobre ambiente na sua posse ou detida em seu nome seja mantida sob formas ou formatos facilmente re-
produzíveis e acessíveis através de redes de telecomunicações de dados ou outros meios eletrónicos.
Artigo 11.º Indeferimento do pedido de acesso à informação
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 8.º, o pedido de acesso à informação sobre ambiente pode ser
indeferido quando a informação solicitada não esteja nem deva estar na posse da autoridade pública ou
não seja detida em nome da autoridade pública a quem o pedido for dirigido.
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2. Quando o pedido se refira a procedimentos em curso, a documentos e dados incompletos ou a
comunicações internas, o acesso é diferido até à tomada de decisão ou ao arquivamento do processo.
3. Quando o pedido se refira a comunicações internas, é deferido quando o interesse público subjacente à
divulgação da informação prevaleça.
4. No caso previsto no n.º 1, quando a autoridade pública tenha conhecimento de que a informação está na
posse de outra autoridade pública, ou é detida em seu nome, deve, de imediato, remeter o pedido a essa
autoridade e informar o requerente.
5. Se um pedido se referir a procedimento em curso, a autoridade pública remete-o à autoridade
coordenadora do procedimento, a qual informa o requerente do prazo previsível para a sua conclusão,
bem como das disposições legais previstas no respetivo procedimento relativas ao acesso à informação.
[... )
Notificação do indeferimento
No prazo de 10 dias úteis contados da receção do pedido, o requerente é notificado por escrito do
indeferimento total ou parcial do pedido de informação, expondo os motivos do indeferimento bem como a
informação relativa aos mecanismos de impugnação previstos na presente lei.
In Lei n.º 19/2006 de 12 de Junho, Diário da República, 1.ª Série A (adaptado)
A informação como base do sucesso das políticas de defesa ambiental
O agravamento dos problemas ambientais à escala mundial levou a uma crescente consciencialização da
necessidade de conciliar desenvolvimento económico e preservação ambiental, duas questões que antes
eram tratadas separadamente e que hoje se encontram unidas numa só designação: desenvolvimento
sustentável.
Em prol do desenvolvimento sustentável, a legislação ambiental tem-se tornado, paulatinamente, mais
restritiva, exigindo a responsabilização das pessoas, singulares e coletivas, por danos ambientais.
Simultaneamente, tem-se assistido a uma crescente pressão social para que as empresas, principais agentes
poluidores, internalizem os impactos negativos das suas atividades sobre o meio ambiente, bem como a uma
crescente procura por
produtos e processos de
produção "verdes" e por
fundos de investimento
ambientalmente
responsáveis (Social
Responsible Investing)
Os motivos
apresentados, como
fatores isolados ou conjuntos, induziram as empresas a assumir uma postura mais responsável quanto à
questão ambiental, marcando a emergência e a proeminência do conceito de Responsabilidade Social
Empresarial (RSE), que exige das empresas um foco no triple bottom-ine: as esferas económica, ambiental e
social. [...]
Uma questão pertinente que se coloca, há já algum tempo, é se estas atividades de cariz ambiental têm
impactos consistentes, negativos ou positivos, na performance financeira das empresas. A este respeito, duas
correntes de pensamento têm sido distinguidas. A corrente tradicional defende que as iniciativas tendentes a
melhorar a performance ambiental impõem elevados custos às empresas, contribuindo, desta forma, para
Disponível na Internet: http://fddip.com.br/tag/responsabilidade-social/
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deteriorar a performance financeira das mesmas. Contrariamente, a corrente contemporânea defende que
aquelas iniciativas contribuem para aumentar a eficiência e melhorar a imagem da empresa face aos seus
colaboradores/clientes, podendo constituir um fator de diferenciação e de competitividade e culminar na
melhoria da performance financeira. [...)
Como indicador da performance ambiental utilizamos a divulgação de informação ambiental. Assim,
através da análise do conteúdo dos relatórios e contas anuais de 2003 das 35 empresas da nossa amostra,
construímos 2 variáveis nominais representativas da performance ambiental:
1- uma variável nominal com duas categorias, relativa a divulgação de informação ambiental, resultante
da divisão da amostra em "empresas que não divulgam qualquer informação ambiental" e "empresas
que divulgam informação ambiental";
2- uma variável nominal com três categorias, relativa ao tipo de informação ambiental divulgada,
resultante da divisão da amostra em "empresas que não divulgam qualquer informação ambiental",
"empresas que divulgam informação ambiental de caráter qualitativo" e "empresas que divulgam
informação ambiental qualitativa e quantitativa".
Assim, das 35 empresas consideradas, 16 (45,71 %) não divulgam qualquer informação ambiental no
relatório e contas anuais de 2003, ao contrário de 19 (54,29%) que 0 fazem. Destas, a maioria (11 empresas)
restringem-se a divulgação de informação ambiental de caráter qualitativo (31,43 % do total da amostra) e
apenas 8 divulgam informação ambiental de caráter qualitativo e quantitativo (22,86% do total da amostra).
(...)
Os resultados empíricos do estudo tendente a avaliar a relação entre a divulgação de informação
ambiental e a performance financeira no mercado de capitais de 35 empresas cotadas em Portugal sugerem
que as empresas que não divulgam informação ambiental têm tendencialmente uma performance financeira
- rendibilidade, risco e rendibilidade ajustada ao risco superior às empresas que o fazem. Em particular, as
empresas que apresentam um melhor relato ambiental, divulgando informação ambiental qualitativa e
quantitativa, são as que apresentam pior performance financeira. Contudo, as diferenças encontradas ao
nível da performance financeira (com base nas duas variáveis de performance ambiental consideradas) não
são estatisticamente significativas. Estes resultados são robustos às duas metodologias utilizadas (estudos de
carteira e tabelas de contingência) e a alteração do horizonte temporal (observações diárias e mensais). (...)
Vanda Roque e Maria do Céu Cortez - A divulgação de informação ambiental e a performance financeira das empresas cotadas
em Portugal, Revista de Estudos Politécnicos, 2006, vol.lII, n.05 5/6
O papel dos media: questões ambientais na imprensa portuguesa
Olhando para o conjunto dos diferentes jornais analisados, o período 1976-1985 foi claramente marcado
pela questão energética. O choque petrolífero
ainda estava muito presente na memória dos
cidadãos, tendo os periódicos dado exponencial
destaque à discussão em torno das energias
alternativas e da energia nuclear, como soluções
para a problemática energética. Por outro lado,
muitos artigos questionavam os impactos e riscos
ambientais de algumas dessas soluções
energéticas, nomeadamente, em torno da energia
nuclear.
Foi também neste período que as questões da Disponível na Internet: http://greensavers.sapo.pt/2015/03/05/minuto-verde-ja-deu-2300-conselhos-sustentaveis-aos-portugueses/
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biodiversidade, da exploração dos mares e das orlas costeiras, dos recursos pesqueiros e dos derrames
oceânicos, assumiram alguma relevância. A partir de 1980, as alterações climáticas e o aquecimento global,
também começaram a ser temáticas com crescente importância.
Entre 1986 e 1995, foram as alterações climáticas, os fenómenos climáticos e o efeito de estufa que
assumiram maior destaque. As questões energéticas (energia nuclear e energias alternativas) continuaram a
merecer õ destaque dos editores dos jornais, ainda que com menor expressão que no período anterior.
No último período, as questões em torno da alimentação, OGM, agricultura, nitrofuranos e BSE
dominaram o panorama, nomeadamente, até ao ano 2000. A partir daí, as alterações climáticas, fenómenos
climáticos e efeito de estufa, a par da biodiversidade, da exploração dos mares e das orlas costeiras, dos
recursos pesqueiros e dos derrames oceânicos, tornam-se os temas com maior presença nas páginas destes
jornais. Antevia-se já a importância das discussões em torno das alterações climáticas, que culminaram nas
iniciativas desenvolvidas por AI Gore, já referidas. Foi também neste período que as polémicas em torno do
tratamento dos resíduos sólidos, da poluição atmosférica e da qualidade do ar, "povoaram"
significativamente o espaço mediático da imprensa. (...)
Os artigos sobre ambiente, fruto da complexidade e incerteza dos assuntos que abordam, são muitas
vezes alvo de um alegado sensacionalismo. Como forma de atribuir maior importância e destaque a uns
artigos em relação a outros, os editores utilizam diversas técnicas com 0 objectivo de captar a atenção do
leitor para determinados artigos. (...)
Rui Brito Fonseca - 30 anos de Ambiente na Imprensa portuguesa, Jornalismo e Jornalistas, n.º fl.1, Janeiro/Março 2010 (adaptado), In www.clubedejornalistas.pt/uploads/jjfl.lIjornalistasfl.1.pdf. Junho 2010
O papel dos media: importância da divulgação ambiental
Os média constituem um poderosíssimo meio de influência junto das sociedades contemporâneas:
selecionam e transmitem informação que ajuda o público leitor a construir a imagem do mundo que o
rodeia. E perante essa imagem, posicionamo-nos com os nossos valores, comportamentos, atitudes e
expectativas, e tornamo-nos ou não agentes de mudança social.
Desde o início da década de 90 que o Ambiente tem sido alvo de uma crescente atenção dos media
portugueses, acompanhando um crescente
interesse e preocupação por parte da sociedade,
fruto de uma nova dimensão paradigmática da
história humana. A poluição atmosférica e as
alterações climáticas, o buraco na camada de
ozono, a crise da biodiversidade planetária com a
destruição de habitats e extinção de espécies, a
erosão dos solos e desertificação, a sobre-
exploração dos recursos pesqueiros, o consumo
crescente e poluição da água, a profusão de
químicos nos alimentos, são complexos exemplos
de uma nova realidade que o Homem enfrenta, e
com um fim ainda incerto.
Mas dos diversos temas ambientais (como os
resíduos, a água ou o ordenamento do território), a conservação da Natureza, paralelamente a um menor
investimento da política pública de Ambiente, quer pelos sucessivos ministérios da tutela, quer pelo poder
local, tem sido um tema apenas esporádico na generalidade da imprensa escrita portuguesa. Sem contar
com dois exemplos da imprensa especializada, a Fórum Ambiente e a Ozono, e à parte da tradição do
Disponível na Internet: http://www.publico.pt/ambienteverde-ja-deu-2300-conselhos-sustentaveis-aos-portugueses/
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Expresso no tratamento de temas ambientais, apenas uma exceção: o Público, o único título generalista que
desde a sua fundação regularmente publica artigos, de maior ou menor relevo, sobre conservação da
Natureza. Quem não se lembra, por exemplo, por volta de 1997, da manchete do Público dedicada à morte
da fêmea do último casal reprodutor de águia-pesqueira no país? (...)
Se o jornalismo, no seu sentido lato, deve apostar numa informação diversificada, abrangendo os mais
variados campos de atividade e correspondendo aos interesses de um público plural, o Ambiente e
conservação da Natureza são hoje um tema incontornável da realidade social à escala global. Como nota,
refira-se que, segundo investigações realizadas por diferentes instituições de renome mundial, entre as quais
a ONU, caso a taxa atual de extinção diária de espécies continue, a partir de 2050 o planeta Terra perderá
metade da sua biodiversidade: vivemos no início de um período de extinção em massa comparável apenas
com o exemplo mais "recente" da extinção dos dinossáurios, há 65 milhões de anos.
Uma imprensa que descure a relevância das implicações da conservação da Natureza, no seio de outros
temas informativos, contribui para um enviesamento da realidade contemporânea que transmite ao seu
público. E é perante a realidade que conhecemos que formamos o nosso próprio quadro de valores e
comportamentos. Não podemos agir perante aquilo que não conhecemos. Daí a grande responsabilidade
social do serviço público prestado
pela comunicação social. Hoje em
dia justifica-se a existência de uma
secção específica de Ambiente e
conservação da Natureza nos
títulos de imprensa generalista, de
âmbito regional ou local, à
semelhança de outras secções já
existentes para temas bem mais
circunscritos em conteúdo que o
Ambiente.
O verdadeiro jornalismo
considera que a existência de uma
opinião pública informada, ativa e
interveniente, é condição
fundamental da democracia e da dinâmica de uma sociedade aberta, e como tal, deverá participar no debate
das grandes questões que se colocam à sociedade portuguesa na perspetiva da construção de um novo
espaço europeu e de um novo quadro internacional de relações. E os grandes desafios ambientais, bem
patentes na passada cimeira de Joanesburgo ou, por exemplo, nas conferências-quadro sobre Alterações
Climáticas, a isso obrigam. A política de Ambiente é cada vez mais transversal- local, regional, nacional e
internacional - e tem sido o motor da construção de um novo quadro de relações internacionais, em que as
diferentes partes são interessadas na prossecução de um objetivo comum.
Sem dúvida que a comunicação social tem sido talvez o principal agente motor da sensibilização das
pessoas para as questões ambientais. Apesar do papel preponderante e inegável que as Associações de
Defesa do Ambiente [ADA) têm demonstrado nesse objetivo, é a comunicação social que divulga as suas
denúncias ou pareceres, que dão vida a essas organizações e que permitem fazer chegar a sua mensagem a
milhões de pessoas. Mas a crescente formação e sensibilização de jornalistas na área do Ambiente tem
permitido a multiplicação de complexos trabalhos de investigação, por iniciativa própria, e portanto, já não
como meros recetores de informação veiculada pelas ADA através de comunicados ou conferências de
imprensa.
David Travassos - Média e Conservação: da Informação à Responsabilização (Uma análise sobre a imprensa
escrita) (adaptado)
Luísa Schmidt, jornalista do semanário Expresso, especializou na temática do ambiente, produzindo inúmeras artigos, reportagens e documentários sobre a problemática ambiental.
Disponível na Internet: http://porabrantes.blogs.sapo.pt/tag/cds
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Meio ambiente e literatura
“A literatura, através da sua força simbólica, revela a visão do mundo do homem em cada época. (...)
Dessa forma, o autor traz à luz, através do texto, todas as situações vividas em determinadas épocas em
vários sentidos: ético, político, social, ambiental, sentimental, religioso,
psicológico, mitológico, geográfico e histórico. A criação literária, portanto,
transfigura a realidade já que nela se veem refletidos todos os enigmas bem
como todos os fenómenos ligados à vida humana. (...)
Pode-se dizer que literatura e natureza caminham juntas desde que o
homem tentou traduzir o mundo de alguma forma, como se pode ver nas
escritas rupestres. Observando a mitologia, vê-se que sempre houve uma
tentativa de explicar o universo e todos os seus fenómenos. Assim, o meio
ambiente, que ora parece tão distante da arte literária, na verdade, sempre a
acompanhou e alimentou servindo de inspiração os seus criadores. (...)
A natureza sempre fez parte da literatura, porém nem sempre foi
abordada sob uma mesma perspetiva, ou
seja, a forma de concebê-la no período medieval não tem o mesmo
interesse da clássico-renascentista, assim como o olhar romântico sobre a
natureza não é o mesmo que hoje se tem sobre o meio ambiente. (...)
Locais onde a natureza, considerada como processo em que as
transformações induzidas pela ação humana tiveram, em princípio, pouca
relevância, vão sendo transformados pelo trabalho humano, deixando
marcas sociais cujas consequências dependem da profundidade e da
intensidade dos processos desencadeados. Nesse contexto, é interessante
notar como a literatura, em seu sentido mais
amplo, reflete esses estágios de
transformação. Romances como os Bichos, de
Miguel Torga, a Cidade e as Serras , de Eça de
Queirós, Vidas Secas, de Graciliano Ramos, Os Sertões, de Euclides da Cunha e
Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, As Cidades Invisíveis, de Italo
Calvino, entre muitas outras, nos seus contextos de época, são bons exemplos
dessa realidade.
A história de um povo numa determinada região vai sendo contada pelo
trabalho literário. Funciona à semelhança de uma trama narrada através de um
enredo de conquistas, de avanços e de retrocessos no qual as transformações
ambientais vão sendo reveladas e de certa forma reconstituídas no ambiente
local dessas transformações.
É através da estética utilizada por cada autor na sua época que a ação, muitas vezes desmesurada do
homem sobre o meio ambiente, vai sendo revelada pela literatura regional. Por isso, é possível dizer que os
componentes “naturais” e humanos, examinados pela lente literária, são de grande importância para
compreender o sentido que o homem quis dar ao que ele chama de “evolução”, mas que, muitas vezes,
pode se considerar como uma involução, na medida em que não se consegue efeitos generalizáveis em
termos da melhoria da qualidade de vida dos homens. Essa realidade é particularmente preocupante no
contexto atual da globalização, em que os processos de transformação ambiental tendem para o uso
indiscriminado dos stocks de recursos naturais ao ponto do comprometimento da própria qualidade de
existência e de sobrevivência humana. É nesse ambiente, portanto, que a literatura se apresenta com sua
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força significativa, com a sua capacidade de descodificação da complexa relação dos homens com o seu
meio. (...)
A literatura, esteticamente, mostra o indivíduo representado pelas
relações homem-natureza, ou seja, a literatura, esteticamente, mostra o
mundo e o homem, tanto na perspetiva ecológica quanto social. A palavra
ecologia nunca teve tanta importância, em virtude do contexto vivido hoje,
pela humanidade, numa ameaça contínua de destruição do seu habitat. O
vocábulo Ecologia é um termo criado por Ernest Haeckel, a partir da palavra
grega iokos (casa), para denominar uma disciplina da área da Biologia que
teria como função estudar as relações entre as espécies animais e seu
ambiente orgânico e inorgânico. (...) O homem é um ser que vive em
constante transformação tanto na perspetiva socioeconómica como na
intelectual e espiritual. Está sempre em conflito com a sua posição no
mundo, porque ao tentar traduzir-se, sempre se depara com os paradoxos do próprio ser e a dualidade que
lhe é inerente. A literatura, ao longo das épocas reflete isso mesmo, evidenciando quão ténue é, por vezes, a
fronteira que separa o racional do irracional, o homem do bicho e vice-versa.”
In Almeida, Maria do Socorro Pereira. Literatura e meio ambiente : Vidas Secas, de Graciliano Ramos e Bichos, de Miguel Torga
numa perspetiva ecocrítica. (2008) Campina Grande. [Consultado em 2015-04-20 21:07:00] Disponível na Internet em: http://pos-graduacao.uepb.edu.br/ppgli/download/dissertacoes/Dissertacoes2008/Maria-Socorro_Dissert.pdf, adaptado
Literatura e meio ambiente
(...) O tema da consciência ambiental, nas últimas décadas, tem recebido crescente adesão não apenas de
ambientalistas, mas também de intelectuais, políticos, escritores. A atenção dada ao tema da degradação
ambiental, funcionando como alerta implícito sobre as precárias condições de vida futura no nosso planeta
demonstra que estamos perante um dos problemas mais sérios da vida
contemporânea. (...)
Governos e organizações nacionais e supranacionais, como ONU e UNESCO,
têm investido sistematicamente em pesquisas, debates e até acordos relativos
ao controle do aquecimento global, à distribuição mais equitativa dos
rendimentos nos países em desenvolvimento
ou na preservação de recursos naturais. Este
é, pois, um tema nuclear para questões
relativas à preservação, subsistência
e sustentabilidade dos espaços habitáveis.
(...) Assim sendo, a degradação ambiental, as
condições precárias de saúde, as condições
de vida futura no nosso planeta, o
relacionamento e a sobrevivência do homem
na Terra e, mais recentemente, a sustentabilidade são apenas alguns dos
muitos problemas que desafiam as pesquisas e as artes contemporâneas e
que, de algum modo, têm sido objeto de abordagem pela literatura. Isso
explica-se, sobretudo, pelo facto de a literatura permitir um olhar múltiplo,
mostrando-se capaz, a partir de sua perspetiva diferencial, percecionar a
complexidade das visões necessárias para se ler a diversidade e a mutabilidade do mundo. Ela se dota-se,
nesse sentido, da potência oracular de antecipar imaginários e transformações negativas, como degradações,
desastres, guerras, dominações, hecatombes, mudanças climáticas relevantes, que poderiam, caso ela fosse
ouvida (ou lida), ser evitadas.
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Importa obviamente salientar a propriedade positiva que possui a literatura de prever riquezas, novas
formas de alimentos, sustentabilidade, saúde, a serem potencializadas em
benefício do homem, do meio ambiente, da vida. Grande parte dos fenómenos
que regulam ou desregulam o meio ambiente são-nos muitas vezes
impercetíveis. Isso porque não nos é dado ver ou assimilar certas ocorrências
que ao fugirem de sua ordem habitual, causam-nos mal-estar ou mesmo
inquietação. (...)
Ao longo da história da humanidade, a literatura tem-se muitas vezes
mostrado, mais do que outras formas de conhecimento, capaz de representar o
irrepresentável ou o indizível. Ou seja: dota-se da potência de traduzir aquilo
que outras linguagens não são capazes de expressar. Assim sendo, graças às
virtualidades imagéticas da criação literária, torna-se-lhe possível dar
materialidade e visibilidade àqueles elementos que, doutra forma, seriam
intraduzíveis e impercetíveis a olho nu. (...) Ao abordar questões relativas a
espaço e meio ambiente, a literatura faz a integração ou o desajustamento entre homem e natureza. De
certa forma, ao preocupar-se com problemas de preservação e sustentabilidade de nosso planeta, ela não
deixa de equacionar em que medida cada um desses elementos se vê limitado ou potencializado pelo outro.
In Aletria Fantini Scarpelli, Marli. Revista de Estudos de Literatura (2007) Literatura e Meio Ambiente. [Consultado em 2015-04-17 22:09:00] Disponível na Internet em: http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/aletria/article/view/1396/1494, adaptado
Poesia
Ai flores, Ai flores do verde pino Ai flores, ai flores do verde pino, se sabedes novas do meu amigo! Ai Deus, e u é? Ai flores, ai flores do verde ramo, se sabedes novas do meu amado! Ai Deus, e u é? Se sabedes novas do meu amigo, aquel que mentiu do que pôs comigo! Ai Deus, e u é? Se sabedes novas do meu amado, aquel que mentiu do que mh á jurado! Ai Deus, e u é? Vós me preguntades polo voss'amigo, e eu ben vos digo que é san' e vivo: Ai Deus, e u é Vós me preguntades polo voss'amado, e eu ben vos digo que é viv' e sano: Ai Deus, e u é? E eu bem vos digo que é san' e vivo e seerá vosc' ant' o prazo sa'ido: Ai Deus, e u é? E eu ben vos digo que é viv' e sano e seerá vosc' ant' o prazo passado: Ai Deus, e u é? El-rei Dom Dinis
Árvore, cujo pomo, belo e brando, Árvore, cujo pomo, belo e brando, natureza de leite e sangue pinta, onde a pureza, de vergonha tinta, está virgíneas faces imitando; nunca da ira e do vento, que arrancando os troncos vão, o teu injúria sinta; nem por malícia de ar te seja extinta a cor, que está teu fruito debuxando. Que pois me emprestas doce e idóneo abrigo a meu contentamento, e favoreces com teu suave cheiro minha glória, se não te celebrar como mereces, cantando-te, sequer farei contigo doce, nos casos tristes, a memória.
De Luís Vaz de Camões
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A fermosura fresca serra A fermosura fresca serra, E a sombra dos verdes castanheiros, O manso caminhar destes ribeiros, Donde toda a tristeza se desterra; O rouco som do mar, a estranha terra, O esconder do Sol pelos outeiros, O recolher dos gados derradeiros, Das nuvens pelo ar a branda guerra; Enfim, tudo o que a rara natureza Com tanta variedade nos of'rece, Me está se não te vejo magoando. Sem ti, tudo me enoja e me aborrece; Sem ti, perpetuamente estou passando Nas mores alegrias, mor tristeza.
Luís Vaz de Camões
Eu e Ela Cobertos de folhagem, na verdura, O teu braço ao redor do meu pescoço, O teu fato sem ter um só destroço, O meu braço apertando-te a cintura; Num mimoso jardim, ó pomba mansa, Sobre um banco de mármore assentados. Na sombra dos arbustos, que abraçados, Beijarão meigamente a tua trança. Nós havemos de estar ambos unidos, Sem gozos sensuais, sem más ideias, Esquecendo para sempre as nossas ceias, E a loucura dos vinhos atrevidos. Nós teremos então sobre os joelhos Um livro que nos diga muitas cousas Dos mistérios que estão para além das lousas, Onde havemos de entrar antes de velhos. Outras vezes buscando distracção, Leremos bons romances galhofeiros, Gozaremos assim dias inteiros, Formando unicamente um coração. Beatos ou pagãos, vida à paxá, Nós leremos, aceita este meu voto, O Flos-Sanctorum místico e devoto E o laxo Cavalheiro de Flaublas...
Cesário Verde
Se eu me sentir sono Se eu me sentir sono, E quiser dormir, Naquele abandono Que é o não sentir, Quero que aconteça Quando eu estiver Pousando a cabeça, Não num chão qualquer, Mas onde sob ramos Uma árvore faz A sombra em que bebamos, A sombra da paz.
Fernando Pessoa
Árvores do Alentejo Horas mortas... curvadas aos pés do Monte A planície é um brasido... e, torturadas, As árvores sangrentas, revoltadas,
Gritam a Deus a bênção duma fonte!
E quando, manhã alta, o sol postonte
A oiro a giesta, a arder, pelas estradas,
Esfíngicas, recortam desgrenhadas
Os trágicos perfis no horizonte!
Árvores! Corações, almas que choram,
Almas iguais à minha, almas que imploram
Em vão remédio para tanta mágoa!
Árvores! Não choreis! Olhai e vede:
- Também ando a gritar, morta de sede,
Pedindo a Deus a minha gota de água! !
Florbela Espanca
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Os paraísos artificiais Na minha terra, não há terra, há ruas; mesmo as colinas são de prédios altos com renda muito mais alta. Na minha terra, não há árvores nem flores. As flores, tão escassas, dos jardins mudam ao mês, e a Câmara tem máquinas especialíssimas para desenraizar as árvores. Os cânticos das aves - não há cânticos, mas só canários de 3º andar e papagaios de 5º. E a música do vento é frio nos pardieiros. Na minha terra, porém, não há pardieiros, que são todos na Pérsia ou na China, ou em países inefáveis. A minha terra não é inefável. A vida da minha terra é que é inefável. Inefável é o que não pode ser dito.
Jorge de Sena
A um carvalho
Eis o pai da montanha, o bíblico Moisés Vegetal! Falou com Deus também, E debaixo dos pés, inominada, tem A lei da vida em pedra natural! Forte como um destino, Calmo como um pastor, E sempre pontual e matutino A receber o frio e o calor! Barbas, rugas e veias De gigante. Mas, sobretudo, braços! Longos e negros desmedidos traços, Gestos solenes duma fé constante... Folhas verdes à volta do desejo Que amadurece. E nos olha a prece Da eternidade Eis o pai da montanha, o fálico pagão Que se veste de neve e guarda a mocidade No coração!
Miguel Torga
Poema da Terra Adubada Por detrás das árvores não se escondem faunos, não. Por detrás das árvores escondem-se os soldados com granadas de mão. As árvores são belas com os troncos dourados. São boas e largas para esconder soldados. Não é o vento que rumoreja nas folhas, não é o vento, não. São os corpos dos soldados rastejando no chão. O brilho súbito não é do limbo das folhas verdes reluzentes. É das lâminas das facas que os soldados apertam entre os dentes. As rubras flores vermelhas não são papoilas, não. É o sangue dos soldados que está vertido no chão. Não são vespas, nem besoiros, nem pássaros a assobiar. São os silvos das balas cortando a espessura do ar. Depois os lavradores rasgarão a terra com a lâmina aguda dos arados, e a terra dará vinho e pão e flores adubada com os corpos dos soldados.
António Gedeão
Velhas Árvores Olha estas velhas árvores, mais belas Do que as árvores moças, mais amigas, Tanto mais belas quanto mais antigas, Vencedoras da idade e das procelas... O homem, a fera e o inseto, à sombra delas Vivem, livres da fome e de fadigas: E em seus galhos abrigam-se as cantigas E os amores das aves tagarelas. Não choremos, amigo, a mocidade! Envelheçamos rindo. Envelheçamos Como as árvores fortes envelhecem, Na glória de alegria e da bondade, Agasalhando os pássaros nos ramos, Dando sombra e consolo aos que padecem!
De Olavo Bilac
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Lição sobre a água Este líquido é água. Quando pura é inodora, insípida e incolor. Reduzida a vapor, sob tensão e a alta temperatura, move os êmbolos das máquinas que, por isso, se denominam máquinas de vapor. É um bom dissolvente. Embora com excepções mas de um modo geral, dissolve tudo bem, bases e sais. Congela a zero graus centesimais e ferve a 100, quando à pressão normal. Foi neste líquido que numa noite cálida de Verão, sob um luar gomoso e branco de camélia, apareceu a boiar o cadáver de Ofélia com um nenúfar na mão.
De António Gedeão
Poema das árvores As árvores crescem sós. E a sós florescem. Começam por ser nada. Pouco a pouco se levantam do chão, se alteiam palmo a palmo. Crescendo deitam ramos, e os ramos outros ramos, e deles nascem folhas, e as folhas multiplicam-se. Depois, por entre as folhas, vão-se esboçando as flores, e então crescem as flores, e as flores produzem frutos, e os frutos dão sementes, e as sementes preparam novas árvores. E tudo sempre a sós, a sós consigo mesmas. Sem verem, sem ouvirem, sem falarem. Sós. De dia e de noite. Sempre sós. Os animais são outra coisa. Contactam-se, penetram-se, trespassam-se, fazem amor e ódio, e vão à vida como se nada fosse.
Algumas proposições com pássaros e árvores Os pássaros nascem na ponta das árvores As árvores que eu vejo em vez de fruto dão pássaros Os pássaros são o fruto mais vivo das árvores Os pássaros começam onde as árvores acabam Os pássaros fazem cantar as árvores Ao chegar aos pássaros as árvores engrossam movimentam-se deixam o reino vegetal para passar a pertencer ao reino animal Como pássaros poisam as folhas na terra quando o outono desce veladamente sobre os campos Gostaria de dizer que os pássaros emanam das árvores mas deixo essa forma de dizer ao romancista é complicada e não se dá bem na poesia não foi ainda isolada da filosofia Eu amo as árvores principalmente as que dão pássaros Quem é que lá os pendura nos ramos? De quem é a mão a inúmera mão? Eu passo e muda-se-me o coração
Ruy Belo
As árvores, não. Solitárias, as árvores, exauram terra e sol silenciosamente. Não pensam, não suspiram, não se queixam. Estendem os braços como se implorassem; com o vento soltam ais como se suspirassem; e gemem, mas a queixa não é sua. Sós, sempre sós. Nas planícies, nos montes, nas florestas, A crescer e a florir sem consciência. Virtude vegetal viver a sós E entretanto dar flores.
António Gedeão
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O vale de Santarém
O vale de Santarém é um destes lugares privilegiados pela Natureza, sítios amenos e deleitosos em que as
plantas, o ar, a situação, tudo está numa harmonia suavíssima e perfeita: não há ali nada grandioso nem
sublime, mas há uma como simetria de cores, de tons, de disposição em tudo quanto se vê e se sente que
não parece senão que a paz, a saúde, o sossego do espírito e o repouso do coração devem viver ali, reinar ali
um reinado de amor e benevolência. As paixões más, os pensamentos mesquinhos, os pesares e as vilezas da
vida não podem senão fugir para longe. Imagina-se por aqui o Eden que o primeiro homem habitou com a
sua inocência e com a virgindade do seu coração.
À esquerda do vale, e abrigado do norte pela montanha que ali se corta quase a pique, está um maciço de
verdura do mais belo viço e variedade. A faia, o freixo, o álamo entrelaçam os ramos amigos; a madressilva, a
musqueta penduram de um a outro suas grinaldas e festões; a congossa, os fetos, a malva-rosa do valado
vestem e alcatifam o chão.
Para mais realçar a beleza do quadro, vê-se por entre um claro das árvores a janela meia-aberta de uma
habitação antiga mas não delapidada – com certo ar de conforto grosseiro, e carregada na cor pelo tempo e
pelos vendavais do sul a que está exposta. A janela é larga e baixa: parece mais ornada e também mais antiga
que o reste do edifício, que todavia mal se vê...
Interessou-me aquela janela.
Quem terá o bom goste e a fortuna de morar ali?
Parei e pus-me a namorar a janela.
Encantava-me, tinha-me ali como um feitiço.
Pareceu-me entrever uma cortina branca... e um vulto por detrás... Imaginação decerto! Se o vulto fosse
feminino... era completo o romance.
Como há-de ser belo ver pôr o sol daquela janela!...
E ouvir cantar os rouxinóis!
E ver raiar uma alvorada de Maio !...
Se haverá ali quem aproveite a deliciosa janela?... quem aprecie e saiba gozar todo o prazer tranquilo, todos
os santos gozos de alma que parece que lhe andavam esvoaçando em torno?
Se for homem é poeta; se é mulher está namorada.
São os dois entes mais parecidos da Natureza, o poeta e a mulher namorada; vêem, sentem, pensam, falam
como a outra gente não vê, não sente, não pensa nem fala.
Na maior paixão, no mais acrisolado afecto do homem que não é poeta, entra sempre o seu canto de vil
prosa humana: é liga sem que se não lavra o mais fino do seu ouro. A mulher não; a mulher apaixonada
deveras sublima-se, idealiza-se logo, toda ela é poesia, e não há dor fisica, interesse material, nem deleites
sensuais que a façam descer ao positive da existência prosaica.
Estava nestas meditações, começou um rouxinol a mais linda e desgarrada cantiga que há muito tempo me
lembra de ouvir.
Era ao pé da dita janela!
E respondeu-lhe logo outro do lado oposto; e travou-se entre ambos um desafio tão regular em estrofes
alternadas tão bem medidas, tão acentuadas e perfeitas, que eu fiquei todo dentro do meu romance,
esqueci-me de tudo mais.
Lembrou-me o rouxinol de Bernardim Ribeiro, o que se deixou cair na água de cansado.
O arvoredo, a janela, os rouxinóis... àquela hora, o fim da tarde... que faltava para completar o romance?
Um vulto feminino que viesse sentar-se àquele balcão — vestido de branco... oh! branco por força... a fronte
descaída sobre a mão esquerda, o braço direito pendente, os olhos alçados ao céu... De que cor os olhos?
Não sei, que importa! é amiudar muito de mais a pintura, que deve ser a grandes e largos traços para ser
romântica, vaporosa, desenhar-se no vago da idealidade poética...
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Os olhos, os olhos... disse eu, pensando já alto, e todo no meu êxtase, os olhos... pretos.
— Pois eram verdes!
— Verdes os olhos... dela, do vulto da janela?
— Verdes como duas esmeraldas orientais, transparentes, brilhantes, sem preço.
— Quê! pois realmente?... É gracejo isso, ou realmente há ali uma mulher bonita e?...
— Ali não há ninguém — ninguém que se nomeie hoje, mas houve... oh! houve um anjo, um anjo, que deve
estar no céu.
— Bem dizia eu, que aquela janela...
— É a janela dos rouxinóis.
— Que lá estão a cantar.
— Então, esses lá estão ainda como há dez anos — os mesmos ou outros, mas a Menina dos rouxinóis foi-se
e não voltou.
— A Menina dos rouxinóis! Que história é essa? Pois deveras tem uma história aquela janela?
— É um romance todo inteiro, todo feito, como dizem os Franceses, e conta-se em duas palavras.
— Vamos a ele. A Menina dos Rouxinóis, menina com olhos verdes! Deve ser interessantíssimo. Vamos à
história já.
— Pois vamos. Apeemo-nos e descansemos um bocado.
Já se vê que este diálogo passava-se entre mim e outro dos nossos companheiros de viagem.
Almeida Garrett (1799-1854), In VIAGENS NA MINHA TERRA
Rio Leça
«Leça era noutro tempo uma terra à parte no mundo, de ingleses velhos, de poetas e de
marítimos. Tinha um velho forte transformado em hotel, ruas misteriosas e casas com degraus de
pedra para os grandes portões vermelhos, que nunca se abriam, e um fio de rio - o mais feliz do
mundo - onde a água corria devagar
entre salgueiros, parando, cismando,
reflectindo a camada de folhas, umas
verdes, outras de oiro. Vinha de cima
dos pinheirais isolados e acarretava
folhas; vinha dos campos de milho e
cheirava a bravio; vinha dos açudes
onde as lavadeiras cantam e trazia
consigo o eco das risadas. Embalava o
barco do Montalvão, que, no fundo da
caverna, sonhava, de barriga para o
ar, a mais bela obra do mundo. (...)
Descia, estremecia (...), parava entre
as árvores que se fechavam em cima
formando uma abóbada, e acabava
em fim por fazer mover o velho
moinho de ao pé da ponte. (...) E sentia-se que o rio tinha pena de acabar. Estava cheio de versos, de
cantigas, de silêncio, entontecido e quase humanizado. (...)
Hoje quase tudo isto desapareceu: por Leça passou um terramoto. O rio, sem o Montalvão e sem
as árvores, perdeu todo o encanto. Tenho medo de lá tornar, como tenho medo de ir à Foz: por
Quedas da Fervença, Rio Leça, Santo Tirso. Disponível na Internet: http://florbytesemmeemoria.blogs.sapo.pt/61313.html
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toda a parte vejo fantasmas. (...) Só o mar inalterável conserva a mesma beleza e a mesma
tragédia.»
Raul Brandão (1867-1930), in Livros e Escritos, 1922
O Concelho e Santo Tirso é atravessado pelo Rio Ave,
recurso essencial à região, que nascendo na Serra da
Cabreira desagua no Atlântico, em Vila do Conde.
Enquanto recurso essencial, foi celebrado por artistas,
cronistas e poetas e os seus problemas objecto de
documentários e de muitos estudos. De 1985 poderá ver
aqui o vídeo “Rio Ave” produzido pela RTP.
Rio Ave, Santo Tirso. Disponível na Internet: http://darasola.blogs.sapo.pt/52143.html