MOTIVAÇÃO NOS TRABALHO EM TURNOS OU NOTURNOS
Priscila Carneiro Hamada
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Resumo: Este trabalho aborda o impacto do trabalho em turnos e/ou noturno na motivação dos trabalhadores. Para tanto, foi feita uma pesquisa de campo qualitativa com trabalhadores que atuam ou atuaram em regime de turnos contínuos (24 horas por dia, sete dias na semana) na operação da rede de telefonia móvel de uma grande empresa de telecomunicações. A análise dos dados obtidos foi feita à luz da Teoria Motivação-Higiene de Herzberg. Diante dos resultados, fica claro que a empresa tem um papel decisivo no sentido de evitar ou minimizar os efeitos deletérios específicos do trabalho em escala, que tendem a funcionar mais como fatores higiênicos do que como fatores motivacionais.
Palavras-chaves: Trabalho Noturno; Trabalho em Turno; Motivação; Escala de
Trabalho; Teoria Motivação-Higiene; Herzberg.
ISSN 1984-9354
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1. Introdução
Existe uma grande quantidade de trabalhadores que exercem suas atividades em turnos ou no
período noturno. E a tendência é aumentar, dada a crescente demanda e exigência por serviços
ininterruptos e pelo próprio aumento da população. As áreas de atuação são as mais diversas,
desde serviços essenciais, como, por exemplo, os ligados à área da saúde, até a produção de
bens e serviços. Em alguns lugares é possível encontrar supermercados, bancas de jornal e até
academias que funcionam 24 horas.
Uma vez conhecida essa realidade, quem são essas pessoas que trabalham quando a maioria
está dormindo ou se divertindo em um belo domingo de sol? Por que esses trabalhadores
aceitam trabalhar de noite ou em turnos? Trata-se de falta de opção ou existem vantagens? Os
trabalhadores sentem-se felizes no exercício de suas funções? Pode-se fazer algo para
minimizar os problemas inerentes a esse tipo de atividade?
Diante do exposto, esse estudo buscou compreender esses trabalhadores, que, de certa forma,
ficam a margem da sociedade e, muitas vezes, a margem no ambiente de trabalho, pois não são
consideradas as dificuldades e especificidades do trabalho em turnos e/ou noturno.
Uma vez que existem os mais diversos tipos de atividades e áreas de atuação com
características diferentes que necessitam de pessoal de forma constante, foi analisado um
grupo específico: trabalhadores que atuam ou atuaram na operação da rede de telefonia móvel
de uma grande empresa de telecomunicações.
Sendo assim, foi estabelecido como objetivo principal averiguar quais fatores favorecem ou
dificultam o processo de motivação de quem atua em turnos e/ou período noturno e de que
forma o empregador pode atuar de modo a minimizar as dificuldades relacionadas ao bem-
estar orgânico e social inerentes a essa situação.
Esse estudo é importante no sentido de conscientização sobre as necessidades específicas
desses trabalhadores e para que seja dado o devido valor a esses funcionários e não deixá-los a
margem.
Deve-se, também, destacar a relevância acadêmica de se abordar um tema ainda pouco
explorado no campo da Administração: as especificidades do trabalho em turnos e/ou noturno
de forma mais ampla. Normalmente, os estudos e trabalhos a cerca desse assunto são voltados
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para as questões médicas e ergonômicas, não sendo muito explorada a perspectiva do
trabalhador, suas necessidades e desejos.
Esta pesquisa, caracterizada como um estudo de caso, oferece conclusões que devem ser
compreendidas no âmbito da experiência vivenciada pelos funcionários que trabalham em
turno e/ou noturno no setor de operação da rede móvel de uma empresa de telecomunicações.
Portanto, não serão passíveis de generalização para outros contextos em que este tipo de
trabalho ocorra.
Contudo, entende-se que tais conclusões e o próprio método de coleta e análise de dados possam
oferecer subsídios para outras pesquisas na mesa área de conhecimento.
2. O que é motivação?
Motivação é um motivo ou razão para agir, o que consegue fazer mover, tudo que causa ou
determina alguma coisa.
Por que certa pessoa acorda cedo todos os dias? Diversos podem ser os motivos: ela precisa
trabalhar, estudar, ir para academia ou simplesmente a pessoa gosta de acordar cedo por
considerar um hábito saudável. Esses são alguns dos infinitos motivos que podem existir para
a pessoa agir, nesse caso, acordar cedo. A enorme variabilidade deve-se ao fato de que o
comportamento humano não é exato, muito menos previsível, e o ambiente no qual a ação é
feita pode variar. São diversos os aspectos que influenciam o comportamento como
biológicos, psicológicos, históricos, sociais, culturais e ambientais. Dependendo da situação e
contexto, cada pessoa pode ter uma ação ou reação diferente, dependendo de suas
características pessoais. (BERGAMINI, 1997; GONDIM, 2004).
A motivação é resultante de pulsões internas, de desejos e de necessidades individuais que cada pessoa, como ser único, busca concretizar. O meio externo, as organizações, não são origem da motivação humana. A organização, enquanto meio social, poderá facilitar ou barrar a realização dos desejos e a satisfação das necessidades. Na realidade, as frustrações constantes podem levar o indivíduo à apatia, ao descontentamento, à desmotivação. Ele não encontra, no meio social, as condições para sua realização. Há, portanto, uma influência do meio externo no indivíduo. (AGUIAR, 2005, p. 369).
3. Motivação x trabalho
O estudo da motivação aplicada no ambiente organizacional surgiu da crença que
trabalhadores motivados produzem mais e melhor (GONDIM, 2004).
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No atual cenário intensamente competitivo, não basta mais fazer o mesmo sempre. É preciso
cada vez mais inovar, mudar, melhorar processos, cortar custos, se atualizar. Ou seja, as
empresas precisam se destacar, fazer melhor a cada dia. O mercado é muito dinâmico e só
sobrevive quem consegue acompanhar o ritmo das mudanças.
Diante disso, como os trabalhadores se sentem estimulados para promover as mudanças? O
que os impulsionam a produzir, a terem novas ideias, a dispensarem tempo e energia pensando
em como fazer melhor determinado processo ou produto para satisfazer os clientes ou diminuir
custos? Esse é o motivo pelo qual as organizações procuravam compreender o que conseguia
motivar seus funcionários. Hoje, baseado no fato de que a motivação é um processo interno e
pessoal, o que se procura é como fazer para que a organização não reprima as forças
motivacionais existentes e inerentes as pessoas e, dessa forma, cada um, com suas habilidades
e conhecimentos específicos, possa contribuir para os objetivos organizacionais
(BERGAMINI, 1997)
4. Teoria motivação-higiene de Herzberg
Para análise do processo motivacional nos trabalhos em turno e noturnos no caso estudado, foi
escolhida a Teoria Motivação-Higiene de Herzberg (ou Teoria Bifatorial). Isso porque os fatores
externos ao indivíduo (ambientais e situacionais) são considerados na concepção e
desenvolvimento da teoria como relevantes. E, na situação estudada, esses fatores são de suma
importância para a compreensão do indivíduos, dada que é a adversidade ambiental e situacional
(trabalhar em turnos ou durante a noite) que gerou o intuito da pesquisa.
Além disto, como afirma Bergamini (1997), a teoria de Herzberg é a mais divulgada teoria sobre
motivação no trabalho.
4.1. O conceito motivação-higiene
O livro “The Motivation to Work” (1959) trata do estudo de Herzberg e de seus colaboradores
sobre os fatores que promovem a satisfação e insatisfação no trabalho, lançando assim a conhecida
Teoria Motivação-Higiene.
Utilizando a técnica de sequência de eventos (incidentes críticos), Herzberg e seus co-autores
Bernard Mausner e Barbara Snyderman entrevistaram aproximadamente duzentos engenheiros e
contadores de indústrias localizadas nas imediações de Pittsburgh. Normalmente, as técnicas de
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pesquisa consistem em testar e medir determinados itens previamente estabelecidos. Já na técnica
dos incidentes críticos, o objetivo é descobrir os incidentes sobre o assunto que se está
pesquisando. Nesse caso do estudo de Herzberg, foi solicitado aos trabalhadores que descrevessem
com detalhes um momento em que se sentiram bem e um momento em que se sentiram mal em
relação ao trabalho, relatando não só o fato em si, mas também as razões para esse sentimento e os
efeitos derivados dele. O objetivo era investigar o complexo fatores-atitudes-efeitos (F-A-E) como
uma unidade, de forma simultânea (Herzberg et al, 1959, p. 11).
A partir da análise dos resultados obtidos, Herzberg, Mausner e Snyderman (1959) concluíram
que os fatores que contribuem para a satisfação (motivacionais) são diferentes e totalmente
independentes dos fatores que contribuem para a insatisfação no trabalho (higiênicos).
Baseado nessas informações, Herzberg propôs duas dimensões: satisfação – não satisfação,
influenciadas pelos fatores motivacionais, e insatisfação – não insatisfação, influenciadas pelos
fatores higiênicos.
4.1.1. Fatores motivacionais
São os fatores que levam a satisfação no trabalho e que estão diretamente relacionados ao
conteúdo do trabalho. A ausência deles não causará insatisfação, mas sim uma não satisfação.
Segundo Chiavenato (2000), são conhecidos também por fatores intrínsecos ou satisfacientes, pois
se relacionam diretamente com as atividades que a pessoa desempenha e estão sob seu controle.
Abaixo, a lista com alguns dos fatores motivacionais, em ordem decrescente de conexão com a
satisfação no trabalho, segundo o estudo de Herzberg et al (1959):
Realização – inclui histórias sobre a execução bem sucedida de determinados trabalhos.
Reconhecimento – prazer por ter executado um bom trabalho e retorno direto e positivo dos
clientes, supervisores pares ou subordinados e do próprio trabalho em si.
O trabalho em si – inclui elementos do trabalho como criatividade, desafio, variedade,
oportunidade de executar uma tarefa do início ao fim.
Responsabilidade – possibilidade de executar o trabalho sem supervisão, ser responsável pelo
seu próprio esforço, receber a responsabilidade pelo trabalho de outros ou executar um novo tipo
de trabalho, como novas responsabilidades, mas sem uma promoção formal.
Progresso profissional – promoção.
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4.1.2. Fatores higiênicos
São os fatores que levam a insatisfação no trabalho e estão diretamente relacionados ao contexto
do trabalho. A ausência deles não causará satisfação, mas sim uma não insatisfação. Segundo
Chiavenato (2000), são conhecidos também por fatores extrínsecos ou insatisfacientes, pois estão
relacionados com o ambiente que rodeia os trabalhadores e incluem as condições nas quais eles
executam suas atividades. Quando esses fatores são utilizados com o objetivo de satisfazer os
trabalhadores, conseguem até fazê-lo, mas não consegue sustentar essa situação por muito tempo.
Herzberg utilizou o termo higiene em analogia aos princípios de higiene médica, uma vez que a
higiene não tem o efeito de curar, mas sim de prevenir (Herzberg et al, 1959, p. 113).
Abaixo, a lista com alguns dos fatores higiênicos, em ordem decrescente de conexão com a
insatisfação no trabalho, segundo o estudo de Herzberg et al (1959):
Políticas e práticas administrativas – a adequação da organização e gestão da empresa, e os
efeitos das políticas, em particular aquelas relacionadas a gestão de pessoas.
Supervisão – a competência e imparcialidade do gestor direto.
Salário – compensação financeira.
Relações interpessoais – as características das interações entre o indivíduo e os demais
componentes da organização.
Condições de trabalho – as características físicas do ambiente.
Com relação ao fator salário, é interessante ressaltar que ele foi apontado também como um fator
motivacional, aparecendo como o sexto item em conexão com a satisfação no trabalho. Porém,
como afirma Hollyforde e Whiddett (2002), Herzberg reconheceu que este fator está mais ligado a
insatisfação. Funciona como uma forma de “mover” o trabalhador, não motivá-lo. Na conclusão
de sua pesquisa, Herzberg et al (1959) percebeu que quando o salário é citado como fator
motivacional está normalmente ligado a uma questão de reconhecimento por um trabalho bem
realizado, como uma forma de progresso profissional, e não só como uma satisfação apenas por
conta da questão financeira.
4.1.3. Os efeitos das atitudes no trabalho
Herzberg (1956) analisou nas entrevistas realizadas para o desenvolvimento da teoria Motivação-
Higiene, cinco efeitos gerados a partir dos fatores motivacionais e higiênicos relatados:
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Desempenho – Herzberg não reuniu dados mensuráveis a respeito da melhora no desempenho
dos trabalhadores na presença de determinados fatores, dada a natureza de sua entrevista, que se
utilizou de dados fornecidos pelos próprios entrevistados e não dados oficiais. Mas pôde perceber,
através dos relatos, que a motivação tem um efeito positivo no desempenho do trabalho.
Rotatividade de pessoal – os trabalhadores que estão insatisfeitos estão mais propensos a sair de
seus empregos do que aqueles que estão satisfeitos.
Atitude para com a empresa – concluiu-se que existe certa relação entre satisfação no trabalho e
atitude positiva para com a empresa.
Saúde mental – os trabalhadores tendem a ligar saúde precária e insatisfação no trabalho, mas
não tendem a fazer o mesmo com boa saúde e satisfação no trabalho.
Relações interpessoais – aparentemente há pouca ligação entre relacionamentos interpessoais e
satisfação e insatisfação no trabalho, pois, segundo Herzberg (1959), isso se daria mais em função
da dinâmica psicológica do trabalhador como um indivíduo do que com qualquer outra coisa.
5. O trabalho noturno e em turnos
5.1. Por que utilizar escalas de trabalho?
Escala de trabalho costuma ser utilizado por empresas que, devido à natureza de sua atividade ou
até por conta de questões econômicas, não podem paralisar a produção e/ou prestação de serviço
ou pode paralisar apenas em alguns momentos, como, por exemplo, durante horários noturnos ou
no fim de semana (FISCHER, 2004a; RUTENFRANZ et al., 1989). Rutenfranz et al (1989)
afirma que os turnos são utilizados como forma de organização do trabalho devido principalmente
a causas tecnológicas, imposições econômicas e atendimento da população. Harriet Preston (1999,
apud FISCHER, 2004a) considera as mudanças rápidas ocorridas nos processos tecnológicos, a
globalização econômica e as características demográficas da população como os principais fatores
de influência no aumento de empregos fora da jornada de trabalho normal.
Knauth (2004) aponta sob a ótica da empresa, dos funcionários e da sociedade, vários aspectos
positivos relacionados à flexibilização do trabalho:
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Fonte: Knauth, 2004, p. 22-24.
5.2. As implicações do trabalho em turno e/ou noturno nos trabalhadores
Com relação do trabalho noturno, Rutenfranz et al. (1989, p. 41) faz uma afirmação importante à
respeito da fisiologia humana:
De acordo com sua natureza, o ser humano pertence ao chamado grupo de seres vivos ativos durante o dia. Ao contrário dos seres vivos ativos à noite, como os ratos, por exemplo, suas funções físicas são orientadas especialmente para o trabalho durante o dia; a noite, ao contrário, é dedicada, principalmente ao descanso. Este fato reflete-se em muitas funções físicas. [...] A disposição para dormir está relacionada com os ritmos biológicos, com o período do trabalho ou do descanso, e tem muito pouco a ver com o cansaço do trabalho propriamente – que não produz estas diferenças nos ritmos de atividade e repouso, mas apenas os reforça. Isso pode ser claramente comprovado por qualquer pessoa nas férias, quando não realiza nenhum trabalho.
Os problemas físicos mais recorrentes no trabalhador em turnos e/ou noturno é a fadiga, mal estar
e distúrbios do sono, acompanhados comumente de irritabilidade e desânimo e, até, descontrole e
agressividade. De forma secundária, podem também ocorrer o envelhecimento precoce, estresse e
doenças orgânicas. Isso tudo devido à dessincronização da Organização Temporal Interna (ritmos
biológicos) e a Organização Temporal Externa (relação temporal entre organismo e ciclo
ambiental) que provoca o desencontro de diversos ritmos orgânicos. Mas, é fato, que nem todos os
indivíduos possuem o mesmo tipo de ritmos biológicos, e nem os próprios indivíduos possuem o
mesmo ritmo biológico durante toda sua vida. Sendo assim, o processo de ajuste do organismo
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pode variar de uma pessoa para outra, causando maiores ou menores impactos. (MENA-
BARRETO, 2004; MARTINEZ, 2008).
Segundo Fischer (2004a), o custo para que a sociedade moderna tenha a sua disposição produtos e
serviços, sejam eles de primeira necessidade ou supérfluos, durante as 24 horas do dia, 7 dias da
semana, não é apenas financeiro, mas também relacionados a problemas de saúde e sociais dos
trabalhadores que atuam em regimes de escala para nos proporcionar as facilidades descritas.
Problemas sociais como dificuldade de adequação dos horários diferenciados à rotina de afazeres
domésticos (mais associado às mulheres), dificuldade de adequação dos horários de lazer com os
dos grupos sociais com os quais se está envolvido (família, amigos, cultos religiosos, etc.),
desencontros nos relacionamentos amorosos, problemas familiares e para planejar a vida de forma
geral são normalmente relatados pelos trabalhadores em turnos e/ou noturnos (ROTENBERG,
2001; COSTA, 2000).
5.3. Os fatores que influenciam na adaptação ou não ao trabalho em turnos
e/ou noturno
Para Costa (2004a), assim como para Fischer (2004b), a questão turnos de trabalho, saúde e bem-
estar, é um assunto complexo e multifacetado, que está diretamente relacionado às características
pessoais, de trabalho e das condições de vida do trabalhador, envolvendo várias dimensões da vida
humana (fisiologia, psicologia, patologia, sociologia, ergonomia, economia, política e ética).
Sendo assim, o trabalho noturno e/ou em turnos pode causar diferentes impactos em diferentes
indivíduos e também diferentes impactos em um mesmo indivíduo, dependendo da fase de vida e
realidade em que o mesmo se encontra durante a execução do trabalho em regime de escala. Dessa
forma, Costa (2004a) considera arbitrário que se enfoque a tolerância ao trabalho noturno e os
aspectos relacionados a saúde apenas sob aspectos específicos, como características pessoais,
sendo mais apropriado uma abordagem sistemática.
5.4. Possíveis ações para combater ou amenizar os problemas causados pelo
trabalho em turnos e/ou noturno
Costa (2004a) resumiu em uma frase o que se deve ter em mente quando o assunto é saúde e bem
estar dos trabalhadores em turno e/ou noturno, dado o caráter multifacetado e multidimensional da
questão:
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[...] é necessário ir além da proteção da saúde e agir para a promoção da saúde e ter a participação de não apenas profissionais da área das ciências médicas, mas também outros agentes (ergonomistas, psicólogos, sociólogos, educadores, legisladores), assim como dos próprios trabalhadores. (COSTA, 2004a, p. 86-87)
Rotenberg (2004, p. 222) afirma que “minimizar os problemas associados aos esquemas de turnos
significa contribuir para que o trabalho possa ser visto não apenas sob a ótica do sofrimento, mas
também como fonte de prazer e melhoria da qualidade de vida”.
Na Recomendação sobre o Trabalho Noturno de 1990 - R178 (ILO, 1990b), que consiste em
propostas adicionais a Convenção do Trabalho Noturno - C171 (ILO, 1990a), a Organização
Internacional do Trabalho (ILO, 1900b) sugere, dentre outras recomendações, que medidas devem
ser tomadas para melhorar a qualidade de descanso dos trabalhadores noturnos, além de prover
maneiras desses trabalhadores obterem refeições e bebidas durante o expediente. O documento
também ressalta a importância de medidas de incentivo à formação e reciclagem, assim como
atividades culturais, desportivas e recreativas para esses trabalhadores. Com relação à saúde, o
trabalhador tem o direito de receber gratuitamente avaliação da sua saúde e instruções de como
reduzir ou evitar problemas associados ao desempenho de suas atividades em horários irregulares.
Para Moreno (2004), é importante que o trabalhador em regime de escala e/ou noturno seja
auxiliado de forma a encontrar o seu regime “ideal” de sono, que, associado ou não a outras
estratégias como cafeína e luz, por exemplo, permitam uma melhor adaptação ao regime de
trabalho estipulado. Até porque, um trabalhador não adaptado ao seu horário de trabalhador pode
se tornar um agente de risco para si mesmo e para outros trabalhadores no caso, por exemplo, de
alta sonolência durante o desempenho da atividade (ALMEIDA, 2004).
Mesmo que se respeitem todas as recomendações feitas acerca do assunto, não existe uma escala
de trabalho que possa ser considerada a melhor (COSTA, 2004b; RUTENFRANZ et al., 1989;
VERDIER, 2004). O arranjo de jornada de trabalho adequado vai variar de acordo com a natureza
da atividade a ser desempenhada, condições ambientais e demandas do cargo, além, é claro, das
características e hábitos específicos dos trabalhadores que vão desempenhar as atividades,
considerando não só os aspectos fisiológicos, mas também os psicológicos e sociais, não
esquecendo de que ele deverá estar de acordo com as leis. De qualquer forma, imaginar que a
escala de trabalho, por mais pensada e analisada que seja, não gerará nenhuma consequência
negativa nos aspectos relacionados à saúde ou vida social do trabalhado, isso é mera ilusão
(COSTA, 2004b; VERDIER, 2004).
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Diversas medidas podem ser adotadas pelas empresas para compensar ou minimizar os transtornos
e inconvenientes causados pelo trabalho em turno e/ou noturno. Por força da lei, financeiramente,
o horário noturno tem valor maior que o diurno. Algumas empresas adotam melhorias nas
condições de trabalho em geral, como ambiente ou enriquecimento do cargo. Outras opções
também são: redução das horas de trabalho, restrição de jornadas noturnas, pausas extras para
refeições e cochilos, instalações para dormir e se alimentar, apoio social e financeiro, transferência
futura para trabalho diurno e aposentadoria precoce (COSTA, 2004b).
6. Pesquisa de campo: satisfação dos trabalhadores em turnos e/ou noturnos
relacionada ao horário de trabalho
6.1. Metodologia Os dados para o desenvolvimento do estudo foram obtidos através de aplicação de
questionários aos funcionários que trabalham (ou trabalharam) na operação da rede de
telefonia móvel de uma grande empresa de telecomunicações em regime de turnos contínuos
(24 horas por dia, sete dias na semana, incluindo feriados) e sistema de rodízio, ou seja, sem
turno fixo e incluindo turnos noturnos. O nome e dados da empresa não serão aqui citados,
mas tal informação não tem influência para a análise das informações obtidas, dado o foco da
questão.
O questionário foi composto de sete perguntas abertas, no qual foi solicitado que as respostas
se restringissem à época da vida profissional cujo horário de trabalho é segundo o regime de
turnos e/ou noturno. Eles foram enviados via e-mail para quatro pessoas escolhidas de forma
aleatória, que preencheram e retornaram suas respostas na última semana de novembro de
2008.
6.2. Descrição e análise dos dados
Baseado na mesma forma de pesquisa feita por Herzberg (1959) para o desenvolvimento da
Teoria Motivação-Higiene, o questionário com perguntas abertas tem o objetivo de analisar de
forma qualitativa os dados, segundo os preceitos da teoria de Herzberg, mas, neste caso, sem o
intuito de generalizações. Sendo assim, não há necessidade de estabelecer a representatividade
da amostra em relação ao total da população em questão. De forma a preservar o anonimato
dos entrevistados, os mesmos serão identificados por E1, E2, E3 e E4.
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6.2.1. A questão satisfação x insatisfação: abordagem generalizada
Uma das críticas feitas à teoria de Herzberg é que ela não prova a relação entre satisfação e
produtividade, pois a análise sobre um possível aumento de produtividade foi feito a partir de
informações dadas pelos trabalhadores e não uma constatação de fatos concretos. Porém, já
reconhecido o fato de que a motivação é um processo interno e individual de cada ser humano,
e por conta disso, ninguém é capaz de motivar ninguém, o que se consegue fazer é agir para
que o indivíduo não perca sua sinergia motivacional (BERGAMINI, 1997).
Diante disso, conhecer o que satisfaz ou não os trabalhadores implica em poder, a partir dessas
informações, criar um ambiente favorável para a manutenção ou até potencialização da
sinergia motivacional. Dessa forma, os trabalhadores vão se sentir mais dispostos a colaborar
com os objetivos organizacionais, o que culminará, consequentemente, com um aumento do
desempenho e produtividade. Logo, podemos então assumir que caso a sinergia motivacional
do trabalhador seja afetada por conta de insatisfação, é provável que o desempenho e
produtividade deste se mantenha no mesmo nível ou até diminua.
Partindo desse princípio, foram feitas duas das mesmas perguntas que Herzberg fez em suas
entrevistas para o desenvolvimento de sua teoria para analisar, respectivamente a satisfação e
insatisfação dos trabalhadores:
Descreva uma época ou uma situação na qual se sentiu muito bem em relação ao seu trabalho.
Dentro dessa descrição, cite, com detalhes, o que ocorreu e como isso repercutiu na sua vida
profissional e pessoal, quais sentimentos e/ou consequências foram gerados pelo o ocorrido,
incluindo a informação sobre o aumento ou diminuição de sua produtividade no trabalho.
Descreva uma época ou uma situação na qual se sentiu muito mal em relação ao seu trabalho.
Dentro dessa descrição, cite com detalhes o que ocorreu e como isso repercutiu na sua vida
profissional e pessoal, quais sentimentos e/ou consequências foram gerados pelo o ocorrido,
incluindo a informação sobre o aumento ou diminuição de sua produtividade no trabalho.
As respostas obtidas relacionadas à satisfação (fatores motivacionais), não apresentaram nenhuma
conexão com relação ao horário de trabalho. E1 disse não se recordar de nenhuma época em que
se sentiu muito bem quando atuando em regime de escala. E3 e E4 citaram situações de
reconhecimento, sob forma de elogio do gerente e por oportunidade de atuar em uma nova área
por conta do bom desempenho no trabalho e na continuidade dos estudos. E3 também fez
referência à satisfação na realização da atividade em si, ao executar uma tarefa que foi desafiadora
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e fora da rotina. E2 citou um aspecto que suscitou discussões durante a elaboração da teoria de
Herzberg: compensação financeira. Por um limiar muito pequeno, o salário foi enquadrado pela
teoria como um fator higiênico, ou seja, que não seria capaz de gerar satisfação, mas apenas evitar
a insatisfação. Porém, pela declaração dele, podemos observar que a satisfação neste caso, parece
mais ligada à questão da conquista feita, entrando o salário como um fator secundário, ou melhor,
dizendo, complementar a questão: “Os sentimentos envolvidos estão relacionados à conquista de
uma grande oportunidade que me traria ganhos financeiros e abriria portas para realizações.”
(E2).
Com relação à insatisfação, foram relatados fatos ligados ao horário de trabalho. E1 falou que tem
dificuldades em relação ao sono quando ocorre troca de horário do turno. E, além disso,
demonstra-se descontente com trocas de horário não programadas, pois lhe causa problemas
pessoais ao ter que reorganizar compromissos e lidar com reclamações de amigos e parentes. E2
relatou o seu ressentimento com aspectos pessoais e sociais assim como E1. A má adaptação do
seu organismo ao turno noturno, os horários de trabalho fora do horário da maioria que lhe forçava
a abdicar de parte de sua vida social e o fato de trabalhar sozinho foram citados. Problema de
relação interpessoal no trabalho foi relatada por E3 e de condições de trabalho (ambientais) por
E2.
Os fatores intervenientes na insatisfação mais citados foram relacionados às políticas
administrativas (três ocorrências) e supervisão (duas ocorrências).
Foi interessante encontrar nas respostas da pergunta sobre insatisfação, um relato que nos remete a
questão da satisfação. “Eu ia trabalhar desanimado, mas isso não afetava no meu desempenho,
pois eu sempre fui responsável com o compromisso assumido.” (E2). Essa afirmação mostra que o
senso de responsabilidade funcionou como fator motivacional, uma vez que E2 deixa implícito
que, apesar, de certa forma, ter motivos para produzir menos, se superou e não o fez.
6.2.2. Vantagens, desvantagens e saúde no trabalho em turnos e/ou noturno
Foi solicitado aos trabalhadores descrever as vantagens e desvantagens do trabalho em escala e
questões de saúde relacionadas a essa atividade:
Cite, na sua concepção, as vantagens e desvantagens de trabalhar em turnos e/ou período
noturno.
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Você já teve alguma doença ou indisposição relacionada ao fato de trabalhar em escala?
Qual? Quanto tempo levou para se curar? Teve alguma falta no trabalho por conta dela?
Algumas das vantagens relatadas tem conexão com o que Knauth (2004) aponta como objetivos
dos funcionários com a flexibilidade da jornada de trabalho: horário para estudo facilitado,
dependendo da escala; redução do tempo de ida e volta do trabalho por conta da ausência de
trânsito; adequação da hora de lazer a horários de menos concorrência. Adicional noturno e
silêncio para execução das tarefas também foram citados. E2 justifica que a ausência de chefe
imediato durante o período noturno pode ser uma vantagem por conta da cobrança mais branda,
mas ao mesmo tempo, pode ser uma desvantagem, pois o funcionário às vezes tem que tomar
decisões importantes que não cabe a ele e depois, dependendo das consequências, pode vir a ser
cobrado por isso.
Dentre as desvantagens estão: perigo no deslocamento noturno para o trabalho; estar no ambiente
do trabalho quando ocorrem obras diversas e dedetização, que são sempre feitas à noite; trabalhar
sozinho ou com poucas pessoas, não havendo assim interação social; não ser lembrado para cursos
ou promoções ou não participar de cursos por conta do horário; a impossibilidade de muitas vezes
não conseguir conciliar a rotina e atividades de lazer com as pessoas com que se convive, até por
conta de má distribuição de fins de semana na escala; distúrbios do sono, incluindo sonolência
durante o horário do trabalho; apetite desregulado.
Em relação à saúde, foram citados o stress, alterações de humor por conta de distúrbio no sono e
intoxicação, por conta de dedetização realizada no local de trabalho durante período noturno. Não
houve falta no trabalho.
Como se pode observar, algumas das desvantagens e problemas de saúde relatados pelos
trabalhadores nos remetem aos possíveis problemas de saúde e sociais associados ao trabalho em
turno e/ou noturno descritos no capítulo quatro.
6.2.3. Escala de trabalho: assunto sempre polêmico
O arranjo da escala de trabalho é uma das condições nas quais os trabalhadores executam suas
tarefas e nada tem a ver com o conteúdo do trabalho. Sendo assim, podemos considerar que a
escala de trabalho funciona como um fator higiênico, ou seja, pode provocar a insatisfação ou, no
máximo, não insatisfação nos funcionários.
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Diante do peso e influência da questão na motivação, ou melhor, “não motivação”, dos
trabalhadores em turnos e/ou noturnos, já que é exatamente os horários flexíveis que gerou esse
estudo, foi questionado:
Com relação à montagem da escala, na maioria das vezes se sente satisfeito ou insatisfeito?
Por quê?
Esse item da pesquisa foi respondido de forma unânime: todos normalmente ficam insatisfeitos
com a montagem da escala. O aspecto mais relatado é problema da adequação da vida pessoal
com a escala devido a constantes modificações ou demora na confecção e divulgação da mesma.
Segundo E3, “(...) o que mata são as solicitações bobas e que mexem a escala inteira, ex:-
alteração de escala devido ao aniversário da sobrinha da prima do meu vizinho. Revoltante! A
chefia não vê, e quando se comenta, solicita que seja enviado um e-mail e que tomará
providências, sai uma nova versão e pronto, ficou pior do que era antes. Agora tem que trabalhar
03 noturnos folga 01 dia e vem trabalhar no turno da manhã mais 04 dias. Ninguém merece!”.
Nesse comentário, podemos perceber também que o posicionamento da empresa, neste caso, na
figura da chefia, contribui para a insatisfação com a escala, já que não está atenta, segundo o
entrevistado, para os problemas desses trabalhadores. Não é recomendável menos de dois dias de
folga após turno noturno, pois o primeiro dia é de muito cansaço. Ou seja, essa folga de um dia o
trabalhador não pode realmente aproveitar para desenvolver suas atividades de lazer ou aproveitar
da maneira que lhe for conveniente, devido ao cansaço.
Outra reclamação relacionada à questão escala x empresa foi feita por E2: “A escala sempre é
injusta, pois o número de empregados é muito reduzido e o nível de exploração por parte da
empresa é muito alto. Sobram reclamações a apontamento de culpados, mas a verdadeira
culpada, a empresa, é pouco citada.”. E1 e E4 também atribuem, de certa a forma, a empresa,
pelos problemas relativos a escala, já que se referem a perda ou remarcação de compromissos,
impossibilidade de organização pessoal por conta da demora de confecção e entrega da mesma e
quantidade de fins de semana trabalhados.
Como podemos ver, pelo menos nesses casos, a empresa, através de algumas ações, poderia
minimizar o impacto negativo da escala na vida desses trabalhadores.
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6.2.4. A questão satisfação x insatisfação: abordagem específica – trabalho em
regime de escala
Nesse âmbito de análise, os trabalhadores foram solicitados a responder a seguinte pergunta:
De um modo geral, você se sente satisfeito ou insatisfeito por trabalhar em turno e/ou
período noturno? Por quê? O que te faz se sentir bem e o que te faz se sentir mal em relação a essa
situação?
Dos quatro entrevistados, E3 é o único que em geral se sente satisfeito: “Em geral eu me sinto
satisfeito, pois trabalhando no noturno é mais calmo e tenho o dia inteiro (ou parte da tarde),
para ficar com a minha família.” (cabe aqui comentar que E3 trabalha em turno noturno fixo por
opção, atuando no turno da tarde ou manhã somente em casos excepcionais). Pelo seu comentário,
é possível perceber que a satisfação se deve ao fato dele conseguir conciliar a sua vida social com
o trabalho, extraindo ainda vantagem profissional disso, no caso, trabalhar em um ambiente mais
tranquilo. Vale ressaltar que foi E3 que apontou o adicional noturno como vantagem no trabalho
em regime de escala. Ou seja, ele conseguiu transformar o que poderia ser um problema em
solução.
Os demais se sentem mais insatisfeitos que satisfeitos. E as alegações para tal é exatamente o que
E3 conseguiu contornar: a questão social. E1 relatou: “Fico chateado por não trabalhar no
horário convencional, o mesmo em que minha esposa.”. E2, além de se queixar de ter sido
privado de um convívio “normal” com as pessoas que os cerca, se sentia abandonado pela
empresa. E4 atribui a sua insatisfação à impossibilidade de organizar sua vida pessoal por conta de
demora na entrega da escala e muitos finais de semana trabalhados.
Portanto, diante destes relatos, podemos averiguar que o trabalho em turnos e/ou noturno nem
sempre é considerado como algo negativo. Uma vez contornado os fatores deletérios específicos
da situação, pode se tornar uma opção interessante para o trabalhador.
6.2.5. O papel da empresa na melhoria das condições de trabalho na concepção
dos trabalhadores
Como um dos objetivos do estudo era saber o que as empresas podem fazer para minimizar os
impactos dos efeitos deletérios do trabalho em turnos e/ou noturno, perguntamos exatamente isso
aos trabalhadores:
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O que você acha que poderia ser feito em relação ao seu trabalho para que o mesmo fosse
mais prazeroso? Você acha que a empresa poderia ajudar de alguma forma?
Tanto E1 quanto E2 fizeram referência à escala, relacionando a necessidade de aumentar o número
de trabalhadores para que a escala seja menos desumana, que sejam feitas anualmente com a
menor variação possível e que se evite desfalques de última hora na equipe, como agendamento de
curso sem um tempo de antecedência, pois isso acarreta mudança na escala.
No que tange ao ambiente de trabalho, houve reclamação sobre o sistema de ar condicionado, que
causa desconforto devido ao frio (cabe citar que o local de trabalho é um ambiente grande que
durante o dia fica cheio de pessoas e de noite o número fica bem reduzido). Também citaram a
maior liberalidade em relação ao uso da internet e multimídias em geral e uma mesa e telefone
com fone de ouvido para cada um como aspectos em que a empresa poderia intervir. Com relação
a esse ponto, é importante relatar que os funcionários trabalham em baias, onde cada um
compartilha o computador e telefone com os demais colegas do setor, que vão alternando as
posições de trabalho na troca de turno – por exemplo, sai a pessoa do turno da manhã e entra a
pessoa do turno da tarde, que utiliza os mesmos instrumentos e posição de trabalho. Além disso,
existe uma orientação para que esses funcionários evitem ao máximo o uso da internet e do
computador para assuntos pessoais e de lazer, como para acesso a e-mails pessoais e assistir
filmes. Essa regra vale também para horário noturno, fins de semana e feriados. Como as
atividades desses trabalhadores segue um ritmo inconstante e dinâmico, em um momento pode
haver muito serviço e no outro não ter nada para fazer, a insatisfação se refere ao fato de não
poder “se distrair” nos momentos em que não tem trabalho, até como recurso para controlar a
sonolência nos horários incomuns.
De acordo com os relatos de E3 e E4, pode-se perceber certo “esquecimento” da empresa com
relação a esses funcionários, de certa forma, já que eles informam que não recebem elogios e não
tem suas ideias e sugestões levadas em consideração. E4 até aponta a falta de preparação da chefia
direta como possível agente causador dessas questões levantadas: “A empresa precisa preparar
melhor os seus líderes e acompanhá-los.”.
6. Conclusão
O presente estudo teve por objetivo analisar a relação entre motivação e trabalho em turnos
e/ou noturnos. Dessa forma, seu desenvolvimento se propôs a responder a seguinte questão:
quais fatores favorecem ou dificultam o processo de motivação de quem atua em turnos e/ou
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período noturno e de que forma a empresa pode atuar, segundo a concepção desses
trabalhadores, de modo a minimizar as dificuldades relacionadas ao bem-estar orgânico e
social inerentes a essa situação?
Diante dos resultados, podemos concluir que em relação aos fatores motivacionais, à luz da
Teoria Bifatorial de Herzberg, eles são os mesmos de qualquer trabalhador, como necessidade
de reconhecimento, satisfação no desenvolvimento da atividade e responsabilidade. Porém,
com relação aos fatores higiênicos, houve conexão de alguns dados com o horário de trabalho
flexível, pois os fatores de insatisfação relatados (distúrbio de sono, inadequação de horário de
trabalho e atividades pessoais) são consequências do trabalho em regime de escala, das
condições específicas relacionadas à execução da atividade.
O trabalho em turnos e/ou noturno tem vantagens e desvantagens, e não apenas desvantagens,
como em princípio pode se pensar. Em relação à saúde, esta pode ser afetada por questões
relacionadas aos horários de trabalho.
No que tange à montagem da escala de trabalho, pode-se observar que a mesma tende a
funcionar como fator higiênico, já que todos os funcionários relataram insatisfação associada à
mesma. É interessante observar que a empresa, de certa forma, foi apontada como a maior
responsável por isso.
Os prós e contras existem. Porém, dependendo de diversos fatores, os prós podem superar os
contras e a satisfação no trabalho em turnos e/ou noturno pode ser alcançada. E, nesse ponto, a
empresa tem papel de suma importância, de forma a prover condições e ambiente favorável
para que os funcionários possam atingir o nível de satisfação.
As empresas deveriam se preocupar em considerar não só as suas necessidades quando estipula as
jornadas de trabalho, mas também as necessidades dos trabalhadores. Muito do potencial desses
trabalhadores pode estar sendo simplesmente desperdiçado por conta de insatisfações que
poderiam ser evitadas, caso eles conseguissem se adaptar, ou melhor, se o trabalho se adaptasse a
eles.
O presente estudo não teve o intuito de definir a solução dos problemas inerentes ao trabalho em
turnos e/ou noturno de uma forma geral. Até porque isso seria impossível nesse caso, dado o
caráter multidimensional e multifacetado da questão, onde a variabilidade dos indivíduos e
aspectos ambientais são infinitos. Mas, sim, conscientizar sobre a importância dos gestores
estarem atentos a realidade desses trabalhadores e acompanhar de perto seu desempenho e
necessidades. Trata-se de uma questão, em primeiro lugar, de humanidade, de preocupação com a
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saúde e bem estar dos trabalhadores, percebendo que a situação desses é diferenciada dos demais
e, por isso, devem assim contar com cuidados específicos e especiais.
Os gestores precisam cuidar para que os trabalhadores em turnos e/ou noturnos sejam, apesar
de suas atividades em horários atípicos e com várias implicações que podem impactar de forma
negativa, tanto ou mais motivados que os demais trabalhadores em jornadas normais de trabalho.
Afinal, estudos na área afirmam: trabalhador motivado tende a ter um melhor desempenho!
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