Literatura infantil: construção, recepção e
descobertas
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Literatura infantil: construção, recepção e
descobertas
1ª Edição
Fabiano Tadeu Grazioli
Alexandre Leidens
(Organizadores)
Rio de Janeiro Mares Editores
2017
Copyright © da editora, 2017. Capa - Dane D' Angeli Editoração - Mares Editores
Dados Internacionais de Catalogação (CIP)
Literatura infantil: construção, recepção e descobertas / Fabiano Tadeu Grazioli; Alexandre Leidens. – Rio de Janeiro: Mares, 2017. 155 p. ISBN 978-85-5927-034-1 1. Análise e crítica literária. 2. Literatura Infantil I. Título.
CDD 801.95
CDU 82
2017 Todos os direitos desta edição reservados à Mares Editores Contato: [email protected]
Sumário
Apresentação .......................................................................................... 9
A Literatura Infantil nos espaços da creche pelo olhar de educadores ............................................................................................. 14
A influência e o despertar da Literatura Infantil para formação de adultos leitores ........................................................ 36
Sem contos de fadas: a construção da materialidade na coleção Antiprincesas ...................................................................... 62
O livro-ilustrado e a formação de leitores .............................. 88
Estética da Recepção e a leitura da narrativa clássica e de versões contemporâneas de “Chapeuzinho Vermelho” ............................................................................................. 117
Sobre os Autores .............................................................................. 151
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Apresentação
A literatura oferecida à criança, desde o início de sua vida,
precisa ser alvo de estudo por parte dos professores, pais,
bibliotecários, animadores culturais e demais mediadores de leitura.
Para os autores da presente coletânea, a literatura, seja ela
reconhecida na contação de histórias, no livro-ilustrado, nas
biografias, nos contos de fadas tradicionais e nas suas versões
contemporâneas, tem importância indiscutível na formação de
leitores, e, portanto, na formação de pessoas sensíveis, capazes de
compreender o mundo que se apresenta ao seu redor, de maneira
ampla e inclusiva.
Ao se debruçarem sobre os temas de seus capítulos, os autores
aqui reunidos contribuem para a preparação de uma função que se
torna tão especial desde o nascimento da criança até sua vida adulta:
o conhecimento em literatura para crianças e a preparação para a
construção da ponte que precisa se articular, seja na família, seja na
escola e nos espaços culturais, entre manifestações literárias e
leitores. Ao escolhermos o título da coletânea, a expressão
“construção” quer fazer referência aos trabalhos aqui acolhidos que se
orientam pela análise do fazer literário para a infância, analisando
textos, imagens e demais elementos que constituem o livro
endereçado ao pequeno leitor na atualidade. Na seleção da palavra
“recepção” está nossa intenção de registrar a presença dos textos que
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pensam a leitura e a recepção da literatura, seja por meio da palavra
falada, seja por meio da palavra escrita, ou por meio da palavra
transformada em imagem. Quanto à expressão “descobertas”, além
de cada capítulo ser uma descoberta para leitor adulto que se
aproximar do presente material, queremos registrar que a literatura
pensada para a criança é a grande descoberta que a criança faz desde
a primeira infância, dentre os produtos cultuais disponíveis na
sociedade para o seu consumo. Descobre ela, por meio da literatura,
a si mesma, os outros, o mundo.
No primeiro capítulo, intitulado A Literatura Infantil nos
espaços da creche pelo olhar de educadores, Laíse Soares Lima
apresenta um estudo que tem por objetivo identificar como os
educadores de creches aproximam as crianças do universo da
literatura infantil, ressaltando seus objetivos e suas práticas
pedagógicas. As análises foram realizadas a partir de Rodas de
Conversas, efetivada em duas creches do estado de Sergipe, pela
possibilidade que detém de permitir que os educadores compartilhem
em diálogos formativos suas experiências e conhecimentos, buscando
(re) configurações de práticas literárias para crianças de 0 a 3 anos de
idade. As reflexões construídas fundamentam-se em aportes da
Sociologia da Infância e no trabalho de pesquisadores que retratam a
importância da literatura infantil, estabelecendo um diálogo acerca da
criança participativa e potente de significados e da literatura como
essencial para o desenvolvimento do imaginário e da reflexão.
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Em A influência e o despertar da Literatura Infantil para
formação de adultos leitores, Priscila Dantas Fernandes e Verônica dos
Reis Mariano Souza apresentam a influência da literatura infantil na
formação de adultos leitores. Para tanto, as autoras realizaram uma
pesquisa bibliográfica e aplicação de questionários com alunos
universitários. O gosto ou desgosto pela leitura inicia-se no universo
infantil, podendo ser estimulado, cotidianamente, por educadores e
pela família. As formas e a maneira como os textos são introduzidos
na vida de uma criança determinam seu interesse ou repúdio pela
leitura. O estudo demonstra que a interação, frequentemente, com a
diversidade de textos escritos manifesta-se como uma atitude de
desenvolver o hábito e o gosto da criança, destacando-se os tipos e
obras pelas quais eles se sentem atraídos. Concluem as autoras do
capítulo que, se desde cedo os alunos foram incentivados ao anseio da
leitura, criarão um hábito o qual levarão por toda vida, tornando-se
então, adultos leitores e assíduos.
No terceiro capítulo, Sem contos de fadas: a construção da
materialidade na coleção Antiprincesas, Adriana Rodrigues Gonçalves
e Izabel Cristina Silva Diniz têm por objetivo discutir os aspectos
relativos à materialidade de três livros infantis pertencentes à coleção
Antiprincesas, publicados pela editora argentina Chirimbote, a saber:
Clarice Lispector para meninas e meninos; Frida Kahlo para meninas e
meninos; e Violeta Parra para meninas e meninos, obras de Nadia Fink
e Pitu Saá. Para analisar os elementos intrínsecos às obras em
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destaque, as autoras utilizaram o conceito de peritexto, de Gérard
Genette, desenvolvido em Paratextos editoriais (2009), além de
buscarem fundamento teórico em estudos orientados para a história
do livro e da leitura. As discussões das autoras apontam para a
importância da construção dos aspectos materiais de um conteúdo
literário-informacional (biografia não ficcional), apresentado em
formato de livro infantil (objeto).
No quarto capítulo, O livro-ilustrado e a formação de leitores,
Soraia Maria da Silva, Edilson Alves de Souza e Flávio Pereira Camargo
apresentam algumas considerações sobre uma das novas formas de
expressão literárias no âmbito da literatura infantil e juvenil: o livro-
ilustrado, destacando-o como produto que contribui para a
instauração de um novo conceito de leitura e para a constituição de
um tipo de literatura, semanticamente, mais autônomo. O estudo
demonstra que o livro-ilustrado exige daquele que lê novas demandas
hermenêuticas e que pode ser usado para o desenvolvimento de
habilidades e competências no processo de formação de um novo
leitor.
Estética da Recepção e a leitura da narrativa clássica e de
versões contemporâneas de Chapeuzinho Vermelho, de Alexandre
Leidens e Fabiano Tadeu Grazioli, tem o intuito de discutir, no último
capítulo da obra, os pressupostos teóricos da Estética da Recepção,
utilizando estudos de Jauss (1979; 1994), e apresentar uma proposta
didático-metodológica com base no Método Recepcional para o
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ensino de literatura. Tal proposta se desenvolve baseada em obras
como Chapeuzinho Vermelho, dos Irmãos Grimm (2011), Seu Lobo, de
Sérgio Capparelli (2008), e Uma Chapeuzinho Vermelho, de Marjolaine
Leray (2012). Acreditam os autores que apresentar uma proposta
dessa natureza, que vise à emancipação dos estudantes, utilizando
temas que já conhecem e que vão ao encontro dos seus interesses,
seja um processo facilitador para o trabalho do professor e, além disso,
fundamental para o desenvolvimento das capacidades leitoras dos
estudantes a partir da recepção literária.
Esperamos que cada capítulo encontre ressonância nos
mediadores de leitura que procurarem este material e que as ideias e
propostas aqui contidas provoquem os leitores no sentido de levar
conhecimento, seja por meio da novidade ou, então, por meio da
desconstrução e reconstrução daqueles saberes e práticas que
precisam ser revistas para que a literatura infantil encontre os seus
leitores e se coloque em sintonia com o universo da infância e a vias
do imaginário dos pequenos leitores.
Os organizadores
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A Literatura Infantil nos espaços da creche pelo
olhar de educadores
Laíse Soares Lima1
De qual história falamos?
Decorrente de uma pesquisa de Mestrado em Educação, que
teve por objetivo compreender as concepções de linguagens da
infância a partir das narrativas que permeiam os discursos e práticas
de educadores de creches, o presente estudo é um recorte das
discussões que problematizam como a literatura infantil pode ser um
recurso essencial na rotina pedagógica, a fim de desenvolver as
múltiplas linguagens das crianças, considerando sua potencialidade
criativa e imaginativa.
Buscamos contextualizar como a literatura infantil se insere no
cenário educacional, evidenciando a capacidade das crianças de
atribuir significados as histórias lidas e contadas, e reafirmando o
papel do professor como parceiro, tendo uma escuta sensível e
mediadora em todo processo que além de educativo pode se tornar
exultante.
1 Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Alagoas – Campus do Sertão. Especialista em Psicopedagogia - UCAM. Mestre em Educação pela Universidade Federal de Sergipe. Professora Substituta da Universidade Federal de Alagoas – Campus do Sertão. E-mail [email protected]
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Deste modo, com evidências históricas desde o século XVII a
literatura infantil se acentua no cenário social e educacional atuando
com diferentes perspectivas ao longo do tempo. Um percurso que
possui início na França, principalmente pelas obras de Perrault
responsável pelo impulso literário, com ênfase nos contos de fadas,
mas que ganha destaque no contexto da Inglaterra devido o fundo
econômico e social do processo de industrialização, com acesso as
mais diversas matérias primas de produção e um mercado consumidor
cada vez mais amplo (LAJOLO; ZILBERMAN, 1999).
Conseguinte do processo de industrialização, a literatura
infantil é percebida como mercadoria, como produto de lucro advindo
da expansão livreira, no entanto, dependente da capacidade das
crianças de leitura. Necessidade que edifica a relação entre a literatura
e a escola, pois, sendo instituição capaz de ensinar o aprendizado das
letras e números, sejam escritos ou verbalizados, a escola possibilitaria
que as crianças fossem um público consumidor das obras impressas.
Para Lajolo e Zilberman (1999, p.18):
Isto aciona um circuito que coloca a literatura, de um lado, como intermediária entre a criança e a sociedade de consumo que se impõe aos poucos; e, de outro, como caudatária da ação da escola, a quem cabe promover e estimular como condição de viabilizar a sua própria circulação.
Dessa maneira, a literatura infantil assume características de
propiciar as crianças, não só a imaginação e fantasia da ficção, mas de
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adentrá-la no universo adulto, a partir de recursos estéticos e
emocionais. Segundo Lajolo e Zilberman (1999), os textos literários
para as crianças apresentavam o modo como os adultos gostariam que
elas visualizassem o mundo. Uma busca pela construção de um mundo
melhor, através das interpretações sensíveis decorrentes da possível
aproximação com os sonhos e a realidade.
Tais aspectos não se distanciam do surgimento da literatura
infantil brasileira. Com aparecimento apenas no século XIX, começa-se
a publicação de livros literários para a infância, principalmente com
instalação da Imprensa Régia, contudo, em um momento intenso de
transformações políticas e sociais (LAJOLO; ZILBERMAN, 1999).
Com o país tendo uma nova forma de governo, a República, e
ambicionando por uma modernização, a procura pelos centros
urbanos se multiplica e consequentemente há necessidade de atender
esse novo público totalmente diversificado e consumidor. Desse
modo, distintas publicações começam a ser produzidas, como as
revistas femininas, os romances, os materiais escolares e os livros para
as crianças, para que todos tivessem acesso a produtos culturais
modernos e específicos as suas singularidades.
Logo, a nova configuração do país em economia e política,
contribui para uma sociedade que se preocupa com o consumo de
bens culturais, pois conforme Lajolo e Zilberman (1999, p.27):
Este é favorável em princípio, ao contato com livros e literatura, na medida que o consumo desses bens
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espalha o padrão de escolarização e cultura com que esses novos segmentos sociais desejam apresentar-se frente a outros grupos, com os quais buscam ou identificação (no casso da alta burguesia) ou a diferenciação (os núcleos humildes de onde provieram).
Caracterizando uma sociedade que necessita de sujeitos
alfabetizados, que saibam ler e escrever, para assim, formarem-se
cidadãos e possuírem prestígio social. De tal modo, a escola é a
instituição primordial nesta consolidação das ideologias, valores e
conhecimentos que a criança deve aprender para futura participação.
Tendo o livro infantil papel de auxiliador deste processo, possibilitando
a formação do leitor.
Todavia, cabe destacar que as histórias infantis difundidas no
período eram obras estrangeiras, alertando a necessidade de
materiais que se adequassem a realidade das crianças brasileiras, pois
com idiomas e traduções deficitárias, bem como, com a apresentação
de uma paisagem distanciada, dificultava o trabalho formativo e
interpretativo com as crianças. Assim, com o impulso de intelectuais,
jornalistas e professores se iniciam produções literárias paras escolas
da infância.
Como aliados do processo de escolarização das crianças, as
obras de literatura infantil, seriam fontes para formar esses sujeitos a
habitar nesse novo contexto social e político moderno. Mais do que a
reprodução de atitudes e normas para vivência social, a literatura
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infantil na escola acaba sendo “um instrumento de difusão do civismo
e patriotismo (LAJOLO; ZILBERMAN, 1999, p.34)”.
Portanto, a literatura infantil apresenta uma história inicial que
acompanha as transformações sociais. Como um bem cultural, que
auxilia no processo de leitura e escrita das crianças no espaço escolar,
propaga o ideário de homem e mundo perfeito, além de promover o
amor à Pátria, as normas e valores para defesa e condução dos
cidadãos. Igualmente, a imagem da família tradicional, composta pelo
pai, a mãe e seus filhos é defendida nas histórias infantis, com
personagens diversos que exalta a imensa paisagem territorial
brasileira. Uma proposta conciliável com a ideia de modernidade e
imprescindível na difusão de uma ideologia, a partir da sensibilidade e
imaginação que a leitura oferta.
Percebendo a relação que a literatura infantil historicamente
obteve com a transformação da sociedade, inicia-se a discussão deste
estudo abordando qual a finalidade que a mesma vem sendo utilizada
nos espaços escolares.
Com características e funções distintas, reconhecemos
incialmente três caminhos que a literatura se delineia nos espaços da
educação infantil. O primeiro centralizado na alfabetização, percebe
como os textos podem ser recursos para ensinar as crianças os códigos
da leitura e da escrita. Os textos transformados em exercícios de
memorização e repetições deixam as interpretações infantis de lado
para dar visibilidade ao processo alfabetizante e preparatório para
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etapas seguintes de escolarização. O segundo caminho apresenta
como a literatura pode ser o caminho para ensinar as crianças valores,
regras e normas de uma cultura. Os adultos imprimem nas narrativas
o que gostariam que as crianças aprendessem e construíssem no meio
social, abordando, portanto, modelos a seguir numa homogeneização
da infância. Por fim, a terceira possibilidade que percebe como a
literatura pode propiciar as crianças interpretações e imaginações
distintas, levando-as a refletir e criticar a realidade e o fictício. Este
caminho torna natural o contato e aprendizado da leitura literária,
permitindo relações com os contextos vivenciais, transformando a
atividade em momentos de aprendizado e deleite.
Neste sentido, é valido salientar que não se tratam de
caminhos isolados ou que as práticas pedagógicas atuais não tragam
consigo resquícios destas posições. O que nos leva a indagar como os
educadores de creches aproximam os bebês e as crianças pequenas do
universo da literatura infantil?
Um estudo que buscou na pesquisa-ação-colaborativa-crítica
embasamento metodológico a fim de construir um trabalho em
parceria com os educadores de creche, percebendo as narrativas dos
pesquisadores e participantes como essenciais para construir um
trabalho reflexivo que vise melhorias na organização das práticas
pedagógicas para crianças (FRANCO, 2005; BARBIER, 2007; JESUS,
2005).
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Contadores de histórias e suas narrativas
Por meio de um trabalho com caráter participativo, onde os
dados são produzidos juntos para além de uma coleta de registros e
julgamentos, a pesquisa-ação-colaborativa-crítica nos auxiliou a
construir com os educadores o respeito às distintas percepções e a
certeza que a aprendizagem pode ocorrer por meio do diálogo e da
troca de experiências. O que acentua a escolha por esse viés
metodológico, por possibilitar na formação do grupo de educadores
que todos tivessem o direito de se posicionar, compartilhando seus
saberes e escutando demais colocações a fim do crescimento
profissional.
Com a criação de espaços de estudos e reflexões sobre as
práticas de linguagens na creche, buscamos desenvolver com os
educadores a (re) configuração de concepções e práticas que visem
integrar as crianças como atuantes e comunicativas, desde bebês.
Uma pesquisa que visou colaborar com os educadores, estudando com
eles teorias e práticas, além de proporcionar a criticidade sobre suas
ações, permitindo que novas práticas sejam aprimoradas.
De tal modo, participaram desse estudo 14 educadores, entre
eles, gestoras, coordenadoras pedagógicas, professoras, cuidadores e
estagiários, atuantes em duas creches municipais da cidade de Nossa
Senhora do Socorro – SE. Cabendo salientar que os educadores
escolheram nomes fictícios para serem ilustrados nesta pesquisa.
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Os dados foram produzidos após a aprovação no Comitê de
Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de
Sergipe e da autorização dos educadores através de Termos de
Consentimento Livre e Esclarecido. Tendo as Rodas de Conversas
como principal instrumento, entendidas aqui como momentos
singulares de partilhas, espaços de diálogo e formação coletiva, no
qual os educadores puderam dividir seus saberes e experiências,
refletindo criticamente a fim de transformações.
As Rodas de Conversas foram organizadas após encontros nas
instituições, sendo eleitas temáticas que os educadores apresentavam
dúvidas e questionamentos. Assim, foram realizadas cinco Rodas de
Conversas, acompanhadas por textos e atividade que conduziram os
discursos. Com o apoio das videogravações e com a transcrição parcial
dos dados, foram eleitas três categorias de analise discutidas na
Dissertação de Mestrado desenvolvida.
Todavia, nesse trabalho priorizamos relatar sobre as
concepções e práticas acerca da literatura infantil, por perceber que
nas narrativas dos educadores há um trabalho com as múltiplas
linguagens das crianças, considerando atividades distintas, mas tendo
a literatura como prática fixa da rotina diária.
Logo, partimos do pressuposto que os educadores devem
permitir a aproximação da criança aos mais distintos instrumentos da
leitura a fim de estabelecer seus próprios sentidos e significados. A
leitura literária permite a aproximação da criança com o texto de
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forma mais íntima, abrindo espaços pra construções de sentidos e
interpretações múltiplas sobre o mundo.
Deste modo, compreendendo a importância da leitura para as
crianças, e como a escola tem papel primordial nessa relação,
buscaremos apresentar a seguir como as educadoras reconhecem o
significado da literatura infantil e organizam suas práticas literárias nas
creches com crianças de 0 a 3 anos de idade.
Literatura infantil: imaginário e formação de leitor em foco
A literatura infantil ganha destaque das educadoras, por elas
possuírem diferentes práticas de contação de histórias para as crianças
desde bebês. Com a imaginação e a fantasia em profunda articulação,
a literatura apresenta sentidos e abre espaço para criação, para
elaboração mental de possibilidades, não se reduzindo apenas à
escrita dos livros, mas a objetos e personagens de um mundo fictício,
que pode ou não apresentar características da realidade.
A contação de histórias não surge com a educação infantil.
Como afirma Abromovich (1995, p. 17) “contar histórias é a mais
antiga das artes”. Porém, existe uma especificidade em ler ou contar
histórias para crianças, por aguçar-lhes além da imaginação, a
curiosidade em buscar compreender a dimensão desse mundo que se
distingue do real. Atentas que são, as crianças ouvem, sentem e
visualizam toda fantasia apresentada, tendo no caso dos bebês, a
necessidade de uma mediação, uma organização da leitura, um
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planejamento que conduza quais as histórias e materiais que podem
inseri-los na cultura literária. A este respeito:
Lua: É interessante quem conta a história fazer um estudo anterior, porque assim, não é só você pegar qualquer livro, ler qualquer história. No início de nossa experiência com a sala de leitura, a história que era contada para os grandinhos era contada pra todos, até para os bebês. Mas no boneco de lata foi um chororó, porque ela (professora) constrói tudo, o cenário, o boneco, etc. E nós estávamos trabalhando a semana da consciência negra, e o boneco de lata que ela fez foi negro, ela contou com uma bonequinha de pano e quando eles viram o boneco assustou. Então eles também vão assistindo até certo ponto, depois perdem o interesse. Então para os mais novos tem que ser mais rápido, cantando, mostrando objetos, com movimento. Porque se você ficar contando como para as crianças maiores eles perdem o interesse, e assim vão se adaptando. Agora é uma questão de estudo ela se debruça, é um trabalho muito elaborado, ela prepara em uma semana o que vai ser utilizado na semana seguinte (4ª RODA DE CONVERSA – 07/05/2016).
A educadora apresenta a importância da formação e do
cuidado para contar histórias para bebês. Há toda uma preparação,
que se inicia na escolha do livro até a execução, da entonação e dos
materiais. Contudo, foram características apreendidas com a
experiência. Por perceber que cada criança possui singularidades e
gostos diferentes, que os bebês demandam de uma atenção maior, de
práticas que os instigue, promovendo o interesse e a participação.
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Consequentemente, percebe-se que a literatura tem suas
contribuições para a aprendizagem dos bebês, pois é pela literatura
que a criança inicia-se no mundo das letras, percebendo que há algo
que perpassa o que está escrito, que as letras e os livros trazem
histórias ou informações.
A escuta das histórias é o primeiro passo para a formação de
leitores, a fonte de descobertas, sendo essencial na educação infantil.
Ouvir histórias provoca emoções, olhares, interesses, expressões,
linguagens que só a imaginação é capaz de fomentar. Sendo
responsabilidade do educador, leitor, nas instituições de educação
infantil apresentar às crianças as possibilidades que a leitura
representa, pois para que a criança compartilhe dessa prática precisa
compreender sua funcionalidade, constituindo, assim, o hábito de
leitor (ABROMOVICH, 1995).
A inclusão da leitura na rotina das crianças é uma das formas
de possibilitar que as mesmas tenham acesso aos livros e histórias, o
que exprime como as crianças precisam de orientações e
representações; e se o adulto não se mostra leitor na sala de aula,
dificilmente as crianças terão condutas para leitura. Conforme
afirmam as educadoras:
Maia: A experiência que eu tive essa semana também na segunda feira no berçário, a contação de história, o que me chamou atenção foi assim, quando eu cheguei pra contar a historinha pra eles. Falei o nome do livro, e mesmo que eles não
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entendam a gente tem que conversar, conversando com eles, né? E o que me chamou atenção foi quando terminou a historinha que Nicole ela pegou o livro assim, eu dei o livrinho a ela, e ela começou a folhear as páginas, e aquela coisa, aquele entusiasmo, porque geralmente as crianças quando pegam o livro quer logo ou colocar na boca, ou rasgar, né? E ela não, ela interagia de uma forma tão bonita, colocando o dedinho assim (indicando) na figura, eu disse “menina que interessante” (3ª RODA DE CONVERSA – 30/04/2016).
Lua: Na sala de leitura mesmo, é tudo do tamanhozinho deles, e você não vê eles entrarem, arrancarem, rasgarem, não, eles entram tiram e colocam os livros. Ai tá a importância de educar e de ter uma rotina. Porque no começo eles querem explorar tudo. Mas com o passar do tempo você com aquela rotina, mostrando, dizendo o que é, eles começam a se encontrar naquele espaço (3ª RODA DE CONVERSA – 30/04/2016).
Maia: E com relação à sala de leitura sabe, eu estava observando uma criança do maternal 3, que já aconteceu umas três a quatro vezes, que quando termina a contação de história, ela vem pra mim e diz “tia, deixe eu contar a minha história”, aí eu digo assim a ela “você vai contar já, daqui a pouco, daqui a pouquinho”, pronto, aí depois que termina a história eu digo “vamos sentar, que nós vamos ouvir a coleguinha”, aí ela abre o livro, do jeitinho dela, aí vai criando aquela coisa, vai falando. Ela já está começando a criar aquele hábito, né isso? Então eu acredito que esse hábito dela vai criar também naqueles outros que tem interesse. Eu achei bem interessante, eu deixei uma, duas vezes e percebi que ela estava mesmo empolgada (risos). E ela diz, tia me dê esse negocinho aí, com uns
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animais, figuras que eu levo que está na escola, e ela pede “tia me dê”, aí eu deixo pegar, digo que a coleguinha vai contar a história, e ela pega vai mostrando do jeitinho dela e contando a história. Eu fico impressionada (3ª RODA DE CONVERSA – 30/04/2016).
A primeira fala de Maia expõe como as crianças pequenas,
através da observação, conseguem reproduzir as práticas de leitura. O
manuseio do livro, sabendo folhear as páginas e indicar as imagens, é
uma construção que se aprende ao vivenciar está condução. Deste
modo, quanto mais cedo a criança tiver aproximação com a literatura,
mais ela aprenderá hábitos para se tornar uma leitora, construindo
uma postura do que fazer e como contar as histórias. Como afirma
Abromovich (1995, p. 16) “[...] Ah, como é importante para a formação
de qualquer criança ouvir muitas, muitas histórias... escutá-las é o
início da aprendizagem para ser leitor, e ser leitor é ter um caminho
absolutamente infinito de descobertas e de compreensão do mundo”.
Do mesmo modo, Lua coloca a importância de os materiais de
leitura serem de fácil acesso às crianças. É certo que em um primeiro
momento elas irão explorar de várias formas causando muitas vezes
danificação, mas para que a criança aprenda a utilizar, principalmente
os livros, eles precisam estar presentes e acessíveis, além de ter uma
mediação do educador, uma vez que, o aprendizado requer um auxilio
motivador para acontecer.
Esta motivação refere-se também ao respeito em considerar as
colocações infantis, como narra Maia na sua segunda fala. Dar espaço
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para que as crianças contem suas histórias e imaginações é abrir portas
para que a literatura esteja presente na educação infantil. O interesse
de reprodução das crianças não é apenas de copiar o que o professor
realiza, mas de entender o que a leitura é capaz. A imitação, possibilita
a produção, a reinvenção. E com a leitura literária é fundamental
considerarmos a participação infantil, seja na contação ou discussão,
abrindo espaços para que as linguagens se manifestem através das
expressões e comunicações.
Nesta perspectiva, o som, o ritmo, a entonação, os materiais,
dentre outras formas de efetivar a leitura na sala de aula, serão os
grandes auxiliadores para que as crianças gostem e sintam-se atraídas
pelo hábito de ler. A leitura para as crianças pequenas é mais que a
decodificação e verbalização de palavras. Envolve uma interpretação
e condução dinâmica, transformando o escrito para melhor
compreensão. O leitor é quem dará a ênfase na história, produzindo
melhores formas, seja por práticas ou a própria entonação, para que a
criança elabore seus significados.
De tal modo, as educadoras ressaltam sobre suas práticas de
leituras para as crianças pequenas:
Maria: E eu estava mostrando um vídeo e fotos pra elas (outras educadoras), que eu fiz ano passado o “Era uma vez”. Eu ficava na dúvida como trabalhar histórias com as crianças de seis meses, no berçário. E eu e minha colega fizemos painéis e fantasias, nos vestimos e a elas também, e fotografei as expressões dos rostos delas falaram
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tudo, eles ficaram surpresos, a alegria deles era diferente, eles viveram aquele momento diferente, e eu coloquei o nome da experiência de era uma vez (3ª RODA DE CONVERSA – 30/04/2016).
Ana: Na contação de história foi muito interessante semana passada que a tia Maia levou uma caixa, bem coloria, com um furo no meio, e aí ela colocava a mão tirava sempre algo de dentro, e aí eles começaram a observar e arrodearam a caixa, e toda vez que ela colocava a mão, trazia alguma coisa da história. Eles observaram que ela sempre trazia algo e quiseram colocar a mão também, foram colocando a mão e pegando tudo que ela colocou, e depois eles queriam entrar na caixa, como se dissessem “agora quem vai entrar sou eu, pra vocês me acharem”. E ela ria, e falava que não ia conseguir contar o resto da história (risos). Mas criou uma nova (3ª RODA DE CONVERSA – 30/04/2016).
Estrela: E geralmente eu faço assim, eu passo mais de uma semana com a mesma história. Eu leio pra elas, eu conto e vou tentar dramatizar. Com o que tem na sala. Com os três porquinhos eu já venho trabalhando há um tempo, fiz as casinhas representando e peguei eles e cada um foi um personagem e os outros assistindo. E na hora que o lobo mau caiu dentro do caldeirão, foi aquele grita, grita, todo mundo correu em volta da mesa, e aí a diretora veio ver ne (risos) quando ela chegou já tinha parado. Ela foi ver o que estava acontecendo, mas já estava aquele silêncio. Foi o momento de descontração que eles se envolveram na história (3ª RODA DE CONVERSA – 30/04/2016).
Portanto, percebe-se a importância de práticas que despertem
o interesse e o prazer pela leitura, sendo parte da rotina diária nas
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instituições. As práticas podem variar, como as educadoras
apresentam práticas diferentes, mas devem possuir o mesmo caráter
que a leitura literária proporciona, que envolve desde a imaginação à
participação das crianças. Logo, torna-se eficiente o trabalho com
ilustrações, objetos, fantoches ou a dramatização, como citados,
salientando as crianças como construtoras ou narradoras da história.
Ao pensar atividades de leitura para as crianças pequenas é
preciso levar em conta sempre o interesse e a motivação. Buscar
atividades que as motive a ler, auxiliando e instigando no processo
criativo, fazendo com que seu interesse não finalize ao fim da história,
mas que seja constante na sua realidade.
Assim, é fundamental que a leitura seja prazerosa e não uma
obrigação para as crianças, o que consequentemente será fruto da
forma que o educador conduzirá essa prática. Como referência, a
educadora Lu afirma:
Lu: Muitas crianças entram no ensino fundamental e não gostam do livro, porque não viram o livro como algo prazeroso. Às vezes alguns professores só reproduzem o livro didático e não dão oportunidade dessas crianças verem que a leitura é uma coisa boa, não é só ler porque eu preciso pra aprender alguma coisa mas ler por prazer, por lazer (4ª RODA DE CONVERSA – 07/05/2016).
Evidenciando como o educador tem papel importante na forma
que a leitura é apresentada e “sentida” pela criança. O prazer, o gosto
e o hábito de leitor é construído gradualmente a partir das influências
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que a criança vivencia. Logo, há a importância de toda uma preparação
cuidadosa e planejada, para que a leitura ocorra. Pois quando as
crianças ouvem uma história as sensações se distinguem, e como
aponta Abramovich (1995, p. 17):
[...] é através de uma história que se pode descobrir outros lugares, outros tempos, outros jeitos de agir e de ser, outras regras, outra ética, outra ótica. É ficar sabendo história, filosofia, direito, política, sociologia, antropologia, etc. sem precisar saber o nome disso tudo e muito menos achar que tem cara de aula.
Igualmente a variação dos gêneros textuais, incluindo poesias,
contos, fábulas, lendas, entre outros, é essencial para aproximar as
crianças da rica diversidade escrita que possuímos. Buscando sempre
trabalhar não somente o que está escrito, mas todos os elementos
presentes na história, como autor, título, imagens, etc., para ampliar
experiências e criar intimidade com os materiais.
Mesmo para as crianças que ainda não leem, ou no caso dos
bebês, não verbalizam, é necessário conceder-lhes distintas
oportunidades de leitura, para que realizem por suas múltiplas
linguagens descobertas da função da escrita. São por essas
oportunidades que o prazer e o gosto pela leitura se eleva, fazendo
com que a criança se aproprie das histórias preferidas, como podemos
notar nas afirmações:
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Flor: Eu tive uma experiência com os alunos de três anos na sala de leitura. As crianças de uma turma saíram e a sala ficou aberta, as crianças estavam no recreio, e um entrou para sala e começou a mexer nos livros, aí eu perguntei “você quer que tia leia uma historinha pra você?” e ele disse que queria. Aí eu fui ler sobre uma bruxinha, perguntei pra ele o que era que a tia utilizava pra contar a história pra ele, mostrando no livro, ele me disse que eram letras. Aí conforme eu fui contando a história, os outros que estavam lá fora brincando começaram a entrar na sala de leitura. Deixaram o momento da brincadeira, pra ficar na sala de leitura. Acabou o recreio eu contei a última história e levei eles pra sala. Então naquele momento a leitura foi mais interessante do que o momento do recreio (4ª RODA DE CONVERSA – 07/05/2016).
Melissa: Na nossa sala são os de 2 aninhos e a gente sempre conta histórias, quando foi ontem, colocamos um brinquedo, o minhocão, dentro da sala, e tem uma aluna nossa que ela presta muita atenção nas historinhas e ela não quis brincar no minhocão, mesmo a gente insistindo. Aí tinha um livro lá solto, ela pegou o livro, sentou e começou a ler, e contando “a princesa pegou...” e eu só observando, chamei a professora pra ver, e ela contando a história todinha da Chapeuzinho vermelho, que veio o lobo mau, que tinha a vovozinha e ficou um tempão contando. Todo mundo brincando não estavam nem aí pra ela, e ela nem aí pra ninguém, no mundinho dela, lendo. Ela estava lendo, num mundo letrado, né? E o livro que ela estava não era a história da Chapeuzinho Vermelho, não tinha nada a ver, era um livro da Cinderela, mas ela guardou na mente a história. Muitas vezes a gente acha que eles não estão prestando atenção, mas estão. E vão aprendendo
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os contos preferidos (4ª RODA DE CONVERSA – 07/05/2016).
Os exemplos apresentados pelas educadoras conferem o que
discutimos até o momento, sinalizando que quando a leitura é
prazerosa para a criança se torna muitas vezes mais importante do que
qualquer outra atividade. A fantasia emergente das histórias prende a
imaginação da criança, e seu interesse pelo que escutam é
demonstrado pelas expressões que se distinguem em contentamento
ou medo, numa mistura de curiosidade e interpretações. Logo, as
sensações que uma criança emite na escuta ou prática de ler são
reconhecidas por quem está à sua volta, sejam adultos ou demais
crianças, despertando interesses em compartilhar de tais emoções
(ABRAMOVICH, 1995).
Contudo, é preciso que os educadores acreditem nas
potencialidades das crianças e nas possibilidades que livro ou as
histórias contadas detém. Mais do que informações ou ensinamentos,
com a leitura o prazer pode emergir possibilitando a produção das
narrativas infantis.
Considerações finais
Acompanhando as transformações sócio-históricas de um país
com culturas diversas, a literatura infantil é apresentada as crianças
com diferentes objetivos nas escolas brasileiras, de instrumentos
fundamentais para alfabetização à mecanismos de prazer que exaltam
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os sentidos e a imaginação. Deste modo, é perceptível a relação
indissociável entre a leitura e o espaço social, uma vez que, por meio
desta prática há possibilidades de interpretações e posicionamentos
do sujeito leitor às representações escritas lhes apresentadas.
Neste sentido, as práticas de leituras com crianças desde
bebês, ressaltadas nesta pesquisa, demonstram a importância da
aproximação da criança com o universo das histórias e letras. A
literatura provoca na criança sentimentos diversos, em que a fantasia
e a imaginação se entrelaçam permitindo reflexões sobre a realidade
e o fictício.
A leitura para criança pequena deve ir além da decodificação
de códigos escritos, é preciso que o professor se utilize das histórias
infantis não apenas como forma de ensinamentos de valores, normas
ou conteúdo, mas que permita a criança sentimentos de prazer,
permitindo oportunidades de a criança desfrutar da leitura e realizar
diferentes descobertas.
Logo, as expressões das crianças, de medo, curiosidade,
contentamento, entre outras são ocasionadas, quando a leitura ou
contação de histórias lhes permitem imaginar ludicamente. A escuta
de histórias literárias é essencial para formação de crianças leitoras,
que sintam e descubram as possibilidades que a leitura e a escrita
detém. O que revela a importância da literatura infantil desde a
creche, com práticas diversificadas que apresentem tais
possibilidades, permitindo a criança além da imaginação, fantasia e
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criatividade, o uso social da leitura no contexto a qual está inserida,
pelas suas interpretações conclusivas. Mais do que uma atividade
aparentemente individual, a leitura nos espaços da creche pode
permitir a participação das crianças, a interação e socialização de
ideias, de modo dinâmico e sensível.
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Referências
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BARBIER, R. A pesquisa-ação. Tradução de Lucie Didio. Brasília: Liber Livro Editora, 2007.
BORDINI, Maria da Glória. Literatura: a formação do leitor. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993.
CORSARO, William A. Sociologia da Infância. Porto Alegre: Artmed, 2011.
FRANCO, M. A. S. Pedagogia da Pesquisa-Ação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, set./dez. 2005.
KLEIMAN, Ângela. O processo de leitura. In: BECKER, Paulo Ricardo e RÖSING, Tânia M. K. (Org). Leitura e animação cultural – repensando a escola e a biblioteca. Passo Fundo: UPF, 2002.
JESUS, D. M. Formação continuada: constituindo um diálogo entre teoria, prática, pesquisa e educação inclusiva. In: JESUS, D. M. de et al. (Org.). Pesquisa e educação especial: mapeando produções. Vitória: EDUFES, 2005. p. 203-218.
LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. Literatura Infantil Brasileira: história e histórias. São Paulo: Ática, 1999.
SARMENTO, Manuel Jacinto e PINTO, Manuel. As crianças e a infância: definindo conceitos, delimitando o campo. In: PINTO, Manuel E SARMENTO, Manuel Jacinto. As crianças, contextos e identidades. Braga, Portugal. Universidade do Minho. Centro de Estudos da Criança. Ed. Bezerra, 1997. p. 09-30.
YUNES, Eliana. Políticas públicas de leitura – modos de fazer. In: RETTENMAIER, Miguel e RÖSING, Tânia M. K. (Org). Questões de leitura. Passo Fundo: UPF, 2003.
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A influência e o despertar da Literatura Infantil
para formação de adultos leitores
Priscila Dantas Fernandes2
Verônica dos Reis Mariano Souza3
Introdução
A literatura infantil é fundamental para a formação escolar das
crianças, possibilitando-lhes a aquisição de novos conhecimentos, a
constituição da oralidade e o aprimoramento das suas capacidades de
leitura e escrita. Uma criança ao ler um texto de literatura infantil,
percebe a fantasia, o belo, o prazeroso, o fantástico, o mágico; viaja,
mergulha sem medo neste universo cheio de encantamentos e
emoções. Desse modo, a “[...] literatura infantil, por seu caráter lúdico-
mágico é o caminho natural, a chave mágica que abre a porta de
entrada principal que dá acesso ao mundo da leitura e a tudo o que
ela pode nos proporcionar” (FRANTZ, 1997, p. 8). É ludismo,
imaginação, questionamento, e, dessa forma, consegue ajudar a
encontrar respostas para as inúmeras indagações do mundo infantil,
enriquecendo no leitor a capacidade de percepção das coisas.
2 Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Sergipe 3 Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia. Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal de Sergipe
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Oliveira (1996), sobre os livros infantis, constatou que eles
abrem um leque de possibilidades para o empreendimento de
atividades pedagógicas. O emprego didático deste tipo de impresso
pode orientar os educadores a criarem práticas educacionais, que
através do lúdico, estimulem a imaginação das crianças. A literatura
infantil é observada como material que estabelece uma ponte entre as
concepções ideológicas de seus autores, professores e alunos.
A literatura constitui, especialmente, comunicação uma vez
que promove a relação entre autor e leitor. Nas situações de ensino-
aprendizagem, a utilização da literatura poderá desenvolver no seu
público alvo as faculdades de reflexão, de comunicação e de
criatividade. Para Magalhães (2001, p. 24), “a literatura infantil não é,
portanto, uma literatura de crianças e nem uma literatura sobre
crianças, mas uma literatura para crianças, cujos componentes
intrínsecos devem ser adequados às exigências de seu público”. Há
autores que dizem que não é somente uma literatura para crianças, é
para qualquer pessoa que se identifique com ela e que corresponda de
alguma forma, aos anseios do leitor.
Partindo desse sentido, o objetivo deste texto é apresentar a
influência da literatura infantil na formação de adultos leitores. O
texto está dividido em três momentos: inicialmente, expõe-se as
origens da literatura infantil a nível internacional e nacional; em
seguida, faz-se a conceituação enfatizando algumas de suas formas.
Realiza-se posteriormente, a análise e discussão dos dados;
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finalizando-se com as considerações finais. Para tanto, realizou-se uma
pesquisa bibliográfica, como também aplicação de questionários.
Gênese da Literatura Infantil: âmbito global e nacional
A literatura infantil se configurou como gênero a partir do
século XVII. Anteriormente, não havia literatura destinada às crianças,
pois não havia distinção entre a fase adulta e a infantil, ou seja, não
existia “infância”4. Segundo Zilberman (2003), os primeiros livros para
criança foram produzidos ao final do século XVII e durante o século
XVIII.
Em meio à Idade Moderna, foi que sucedeu a concepção de
uma faixa etária diferenciada com interesses próprios, a qual
necessitava de formação específica. Essa mudança se deveu à
emergência de uma nova noção de família, centrada não mais em
amplas relações de parentesco, mas no núcleo unicelular, preocupado
em manter sua privacidade e estimular o afeto entre seus membros
(ARIÈS, 1981).
Havia diferenças também com relação às crianças (umas com
as outras), cada uma tinha acesso a um tipo de literatura. As crianças
da nobreza liam e/ou ouviam os grandes clássicos, já as das classes
menos favorecidas liam e/ou ouviam histórias de aventuras,
cavalarias, lendas e contos folclóricos. Neste contexto, a noção de
4 Segundo Ariès (1981), a infância era desconhecida e correspondia a um período de transição cuja lembrança era logo perdida.
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infância só surge a partir do século XVIII, quando a criança passa a ser
considerada um ser diferente do adulto.
Charles Perrault também contribuiu para a criação da literatura
infantil com os “Contos da Mamãe Gansa”, publicada em 1697. No
entanto, os irmãos Grimm dominaram as crianças de todo o mundo
com seus personagens, como o Pequeno Polegar, Branca de Neve,
João e Maria e Chapeuzinho Vermelho. De acordo com Magalhães
(2001, p. 25-26),
A origem da literatura infantil relaciona-se com a publicação de Contos para crianças e famílias, coletânea de narrativas populares compiladas pelos irmãos Grimm, em 1812, na Alemanha [...], constituída de contos folclóricos, mais conhecidos como contos de fadas, tornou-se a primeira literatura das crianças burguesas. A publicação desses contos marca o início da adaptação na literatura infantil.
No século XVII, foram escritas algumas obras que
posteriormente seriam consideradas adequadas à infância, como “As
Aventuras de Telêmaco”, de François de Salignac de La Mothe-
Fénelon, lançadas em 1717, e as “Fábulas”, de La Fontaine, lançadas
entre 1668 e 1694. Arroyo (1990, p. 32-34) aponta uma cronologia
com alguns autores de maior repercussão e contribuição da literatura
infantil universal:
[...] La Fontaine (1621-1695), com Fábulas [...] Charles Perrault (1623- 1703), com os Contos de
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ma Mère l’Oye, fixando em livro a tradição oral. Madame D’Aulnoy (1650-1705), com Contes de Fèes, introduzindo pela primeira vez o elemento fada na literatura para crianças. Comenius (1592- 1670), com Orbis Pictus (1658), primeiro livro didático ilustrado, para crianças. Fénelon (1651-1715), com Fables, e Télémaque, com o que se inaugura a fase consciente da literatura infantil. [...] Daniel Defoe (1661- 1731), com o universal Robison Crusoe. Jonathan Swift (1667-1745), com As Viagens de Gulliver. [...] Jacó Luís e Guilherme Carlos Grimm (1785- 1863 e 1786-1859), com as célebres narrativas hauridas na tradição popular. [...] H. C. Andersen (1805-1875), que retoma os temas da tradição popular com seus livros de contos. [...] Walt Disney (1901-1966), o gênio da imagem, desta se servindo para uma nova dimensão da literatura infantil pelos seus desenhos e pelo seu cinema.
Estes autores representam as principais fases da literatura
infantil universal, ou seja, representam basicamente o que de mais
significativo houve no gênero ao longo dos anos de sua formação.
A literatura infantil brasileira surgiu no século XVIII com a
publicação de “Narizinho arrebitado” (1921), obra de Monteiro
Lobato. Sua produção marca o início de uma verdadeira literatura
nacional, pois, no começo do século XX, as obras literárias designadas
a crianças brasileiras eram textos europeus adaptados à linguagem
brasileira. Ao publicar esta obra, implantou um novo modelo literário
no Brasil - um modelo renovador rompendo com os moldes
tradicionais. Essa renovação foi concebida como um artifício que podia
modificar a visão de mundo e libertar os seus leitores.
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Nesta perspectiva, nos anos 20 e 30, as editoras começam a
prestigiar esse novo gênero e aumentam significativamente a
produção. Já os anos 40 e 60 caracterizam-se pela especialização e
expansão do mercado composto por leitores. Nos anos 60 e 80, outros
aspectos assinalam a produção da literatura voltada às crianças, como
uma nova maneira de compor personagens, enredos que incorporam
a temática urbana, e a valorização da linguagem oral. A partir desse
novo modelo literário, os valores, os comportamentos e as atitudes
vigentes na sociedade promovidos pela leitura, continuaram em
sintonia com uma concepção de leitura e literatura infantil que os viam
como auxiliares no processo civilizador e educativo.
As principais obras de Lobato são: “Urupês” (1918), “Cidades
mortas” (1919), “Negrinha” (1920), “O choque (1926)”, “Reinações de
narizinho” (1931 - obra que reúne várias histórias infantis), “Sítio do
Pica-pau Amarelo” (1939). Outros autores também deram os
primeiros passos no Brasil, como as obras de Carlos Jansen - “Contos
seletos das mil e uma noites”, Figueiredo Pimentel - “Contos da
Carochinha”, Coelho Neto, Olavo Bilac e Tales de Andrade (LIMA,
2010).
Literatura infantil: formas e usos
O primeiro contato da criança com um texto é feito oralmente,
através da voz da mãe, do pai ou dos avós, contando trechos da Bíblia,
contos de fada, histórias inventadas, poemas, entre outros. Ouvindo
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as histórias pode-se sentir raiva, alegria, tristeza, saudade, amor,
pavor, medo, ou seja, tudo aquilo que a narrativa proporcionar ao
leitor.
Para tanto, o professor primeiramente precisa gostar da obra
literária antes de contá-la, pois, se assim não o fizer, pode
desestimular o aluno, mesmo sem perceber. O docente deve ler uma
obra com entusiasmo, com emoção para despertar o interesse e o
gosto da leitura no aluno, pois, este tem o professor como modelo de
leitor. Para prender a atenção do aluno, o educador deve saber utilizar
a voz, a expressão corporal, os gestos, entre outras formas que
possibilitem um maior interesse do educando pelo que está sendo
contado. O professor também precisa conhecer a história a ser
contada, para garantir um bom desempenho, por isso, é importante
saber escolher bem a história que vai levar para os alunos.
A contação de histórias juntamente com brincadeiras, danças
e outros recursos pedagógicos no processo de ensino e aprendizagem
desenvolvem a responsabilidade e a autoexpressão, fazendo com que
a criança construa seu conhecimento de mundo. O professor ao lidar
com a contação nas séries iniciais, deve ter o cuidado com a estrutura
da narração, a qual deve ter uma linguagem fácil e recursos
imagéticos, podendo ser exploradas de forma lúdica, cujas narrativas
possibilitem as crianças um melhor desenvolvimento da capacidade de
produção e compreensão textual. Segundo Abramovich (1997), o ato
de ouvir contos é o princípio para a aprendizagem de se tornar um
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leitor. Proporcionar estas oportunidades educativas às crianças
significa desenvolver todas as suas potencialidades dentro da língua
materna.
Outra maneira para se trabalhar estas práticas é recontar
histórias pelas próprias crianças. Poder reconstruir textos originais de
histórias conhecidas com o auxílio do professor. “Ao narrar uma
história, o aluno estará exercitando a comunicação verbal. Por isso o
professor, atento ao processo de comunicação, criará espaços onde os
alunos possam desenvolver o seu potencial de comunicação através
das histórias infantis” (OLIVEIRA, 1996, p. 56).
Nesta perspectiva, Bamberger (1991) afirma que, nos
primeiros anos de escola, contar e ler histórias em voz alta e falar sobre
livros de gravuras é importantíssimo para o desenvolvimento do
vocabulário, e mais importante ainda para a motivação da leitura. O
professor deve conhecer bem os livros que irar fazer uso, deve ler
várias vezes antes, deve senti-lo, percebê-lo e saboreá-lo, assim,
passará emoção verdadeira, o ritmo e a cadência pedidos.
É preciso também verificar qual o interesse dos educandos em
determinada obra, é possível que algo considerado atrativo pelo
educador não o seja para os estudantes. Para isto não ocorrer, uma
boa alternativa é trazer elementos que façam parte da vida deles.
[...] o professor deverá ter o cuidado de fazer [...] das experiências de leitura algo realmente prazeroso, gratificante para criança. Caso quiser
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prolongar o prazer dessa leitura ou explorá-la sob outros ângulos, cuidara de propor atividades lúdico-artísticas afinadas com o texto literário infantil (que é essencialmente lúdico, mágico, artístico). (GREGORIN FILHO, 2009, p. 10).
A literatura infantil apresenta-se de algumas formas, a saber:
fábulas, contos de fadas, lendas e poesias. As conhecidas fábulas são
narrativas alegóricas vivenciadas por animais, referenciando uma
situação humana com o objetivo de transmitir moralidade. A presença
dos animais deve-se à convivência afetiva entre homens e animais
antigamente. Associações foram feitas pelas fábulas entre animais e
características humanas, permanecendo até os dias atuais, como leão
– poder real; lobo - dominação do mais forte; raposa - astúcia e
esperteza; cordeiro – ingenuidade.
O francês Jean La Fontaine (1621/1692) introduziu a fábula na
literatura ocidental. Podemos citar algumas delas, como "O lobo e o
cordeiro", "A raposa e o esquilo", "Animais enfermos da peste", "A
corte do leão", "O leão e o rato", "O pastor e o rei", "O leão, o lobo e a
raposa", "A cigarra e a formiga", "O leão doente e a raposa", "A corte
e o leão", "Os funerais da leoa", "A leiteira e o pote de leite”.
No Brasil, Monteiro Lobato destina um volume de sua
produção literária às fábulas para crianças, algumas delas foram
adaptadas de Fontaine. Destacam-se os seguintes textos dessa
coletânea, "A cigarra e a formiga", "A coruja e a águia", "O lobo e o
cordeiro", "A galinha dos ovos de ouro" e "A raposa e as uvas".
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Os famosos contos de fadas são conhecidos pela mistura de
fantasia e realidade, magia e encantamentos através do “Era uma
vez...”. Tratam de questões gerais, como conflitos de poder e
formação de valores. Esse gênero literário caracteriza-se pelo
componente “fada”. Os contos são importantes, pois lidam com
problemas existenciais dos humanos, como amor, medo, dificuldades
de ser criança, carência – seja ela, afetiva ou material –, perda, solidão.
Neste sentido, de acordo com Oliveira (1996, p. 55)
Os contos de fadas são exemplos importantes de como a literatura infantil oferece às crianças (leitor) novas dimensões da realidade à sua imaginação, que por si só não poderiam descobrir. Sugerem ainda imagens com as quais as crianças podem estruturar seus devaneios e com eles dar melhor sentido a sua vida.
As personagens geralmente são mulheres muito bonitas,
dotadas de poderes sobrenaturais, auxiliando na vida dos homens em
situações em que as soluções naturais já não são mais possíveis.
Podem também, se apresentar sob forma de bruxas, encarnando o
mal. O enredo dos contos de fadas mostra provas que precisam ser
vencidas pelo herói na busca do “eu”, ou no intuito de alcançar sua
autorrealização existencial, ou, ainda, pelo encontro da princesa, a
qual encarna o ideal a ser alcançado. "Rapunzel", "A Bela e a Fera" e
"Branca de Neve e os Sete Anões" são alguns exemplos de contos de
fadas.
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As lendas são narrativas transmitidas e conservadas pela
tradição oral (preservação de histórias, usos e costumes através da
fala) ao longo dos anos. Relatam acontecimentos misturando o real e
o imaginário. Exemplos de lendas brasileiras: “Boitatá”, “Caipora”,
“Cuca”, “Curupira”, “Iara”, “Mula-sem-cabeça”, “Negrinho do
pastoreio”, “Saci Pererê” e “Vitória Régia”. As lendas fornecem
esclarecimentos que, até certo ponto, são considerados aceitáveis,
para coisas não comprovadas cientificamente, como por exemplo,
casos sobrenaturais. No entanto, por a forma de transmissão ser oral,
sofre alterações à medida que vão sendo recontadas, ao longo das
gerações.
De acordo com Frantz (1997, p. 67), “a iniciação poética infantil
começa em casa com a mãe cantando cantigas de ninar para o bebê
dormir. Depois vêm as parlendas, as quadrinhas, as cantigas de roda,
as advinhas, os trava-línguas que são passados oralmente de geração
a geração”.
Nas poesias infantis são abordadas a ludicidade verbal, musical
ou sonora e o jogo de palavras. Utilizam-se também esse jogo na
música brasileira, como por exemplo: Chico Buarque criou para a peça
“Os Saltimbancos”, chamado “A galinha”. Há poetas que brincam com
as palavras, fazendo as crianças ouvirem e lerem naturalmente. Há,
ainda, na literatura infantil, várias narrativas contadas em forma de
versos, rimadas e/ou melodiosas. As poesias retratam os sonhos, os
desejos, as vontades, as sensações, as emoções, as experiências que o
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poeta está sentido. Vários autores são destacados no que diz respeito
à poesia infantil, como Cecília Meireles, Mário Quintana, Vinicius de
Morais, entre outros.
O sistema educativo é um grande responsável no processo de
comunicação do aluno, destacando-se aqui as diferentes formas da
literatura infantil, pois é a escola quem deve ajudar os indivíduos em
determinada cultura a se identificar. Neste sentido, a partir das
narrativas, é possível construir uma identidade e encontrar-se dentro
da própria cultura.
Resultados e discussões
A coleta de dados da pesquisa foi realizada por meio de
questionários abertos aplicados com alunos do 3o período do curso de
Pedagogia da Universidade Federal de Sergipe (UFS). A análise deu-se
com base em 33 questionários, sendo 3 do sexo masculino e 30 do
sexo feminino, na faixa etária entre 20 e 35 anos. Os resultados obtidos
pelos participantes visaram conhecer a influência da literatura infantil
na formação de adultos leitores.
Na sociedade contemporânea, a leitura é imprescindível pois
utiliza-se a todo o momento para pegar ônibus, procurar telefone, ver
letreiro ou fazer comprar num supermercado. De acordo com Cagliari
(2005), o primeiro contato das crianças com a leitura se dá através da
leitura auditiva, por meio de cantigas de ninar e contação de histórias;
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ao ouvi-las, aprendem a decifrar os sons das letras em diversos
contextos. Isso fica evidente na resposta de uma aluna:
A professora adotava a prática de leitura em conjunto, onde cada aluno da turma lia um pequeno trecho do texto. [...] a professora lia um determinado livro e junto com a turma encenava para representar a história abordada, fazendo com que se despertasse o interesse em nós de fazermos o mesmo. Os livros que me lembro de ter utilizado foram: Peter Pan, Os Três Porquinhos e Chapeuzinho Vermelho.
O gosto e o prazer pela leitura devem ser incentivados desde
cedo, é preciso que as crianças interajam com a diversidade de textos
escritos em seu cotidiano; mediante jornais, revistas, bulas de
remédios, receitas de bolo, livros, a criança aprende a ler. Nesse
sentido, um aluno aborda essa questão na sua formação: “[...] aos três
anos de idade copiava rótulos que eram retirados das embalagens,
mesmo sem compreender o sentido dos símbolos ali representados”.
Na escola, é interessante que o professor ofereça uma leitura
atraente para o aluno e não uma leitura mecânica. Desta maneira, o
educador irá incutir no educando o gosto e não a aversão à leitura,
pois ninguém gosta de fazer coisas em que encontra muita dificuldade,
e principalmente uma criança, a qual recorrerá a outro tipo de
informação ou mesmo um passatempo. Nesse ínterim, três alunas
recordaram e descreveram alguns momentos da leitura: “o momento
da leitura ocorria com todos sentados em torno de uma roda no chão
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e a professora (tia Edna) trazia algum livro”; na escola tinha uma
biblioteca e [...] toda semana era passada historinhas para os alunos.
[...]. Os livros de histórias de Contos de Fadas, Cinderela e etc.”; “na
“1a série” eu já conseguia fazer textos e criar histórias. Os livros que eu
lembro e que marcaram este processo foi um clássico de Ruth Rocha,
Bom dia todas as cores e a Viagem de barquinho de Sylvia Orthof”.
O professor pode também lançar mão de diferentes estratégias
de leituras para que o aluno aprenda as informações contidas nos
diversos textos. Através da leitura, processo no qual o leitor constrói o
significado de um texto, de acordo com conhecimentos sobre o
assunto, as crianças aprendem a ler o mundo e dão sentido a ele.
Apesar dessa extrema relevância no processo leitor, duas
alunas relataram a falta de leitura nas aulas: “minha professora não lia
livros para a turma na sala”; “sempre gostei de gibis e livrinhos de
história, inclusive, ainda tenho alguns guardados [...]. A minha
professora não lia para nós”. Assim sendo, a familiaridade com que os
textos são lidos em sala de aula é muito importante, visto que torna
possível a produção de conexões entre a realidade, o mundo literário
e a identificação dos alunos com o que é lido. Contudo, não é
interessante restringir a sala de aula a um ambiente onde se vê apenas
o que é familiar, deve-se começar por esse ponto e ir muito além.
[...] por gostar de ler e não ter livros em casa devido a situação financeira pedi a professora para ir à escola no horário contrário ao que estudava para
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aproveitar a biblioteca que existia no fundo da nossa sala, com estantes pequenas e muitos livros de “Era uma vez”, ou seja, contos de fadas. Assim desarnei na leitura e vivi essa experiência fantástica de mergulhar nesse mundo mágico onde tudo é possível. Eu me perdia nos livros e cada vez aprendi mais.
É fundamental que o professor conheça os tipos de leitura e
suas fases para indicar textos aos alunos. Desta forma, a leitura será
mais prazerosa, tornando mais fácil a compreensão do texto pelos
leitores. Conforme Bamberger (1991), a leitura pode ser informativa,
escapista, literária e, cognitiva. A leitura informativa tem a
necessidade de orientação na vida e no mundo. A informação escrita
merece mais confiança do que a oral, podendo ser encontrada em
jornais, revistas, romances de literatura. A leitura escapista remonta a
necessidade de satisfazer desejos, evadir-se da realidade, viver num
mundo sem responsabilidades nem limites. É predominantemente
negativa. Revistas ilustradas e romances baratos devem sua existência
à propensão para a leitura escapista.
A leitura literária procura o significado interno, o
reconhecimento do simbólico nos acontecimentos cotidianos. São as
leituras de textos literários, romances, contos e outros, analisando os
estilos, a forma, a narrativa. Por fim, a leitura cognitiva apresenta a
mesma motivação que a filosofia: o anseio do conhecimento e da
compreensão de si mesmo, dos outros e do mundo. É a leitura
profunda, feita para o estudo de pesquisas, exigindo-se argumentos.
- 51 -
As fases da leitura (ou idades de leituras) são cinco: idade dos
livros de gravuras e dos versos infantis (de 2 a 5 ou 6 anos); idade do
conto de fadas (de 5 a 8 ou 9 anos); idade das “histórias ambientais”
ou da leitura “fatual” (de 9 a 12 anos); idade da história de aventuras,
realismo aventuroso ou a “fase de leitura não-psicológica orientada
para o sensacionalismo” (de 12 a 14 ou 15 anos); e os anos de
maturidade (de 14 a 17 anos) (BAMBERGER, 1991).
Na idade dos livros de gravuras e dos versos infantis, a criança
faz pouca distinção entre o mundo interior e o exterior, só
experimenta o meio em que vive em relação a si mesma (idade do
pensamento mágico). Os livros de gravuras ajudam quando
apresentam objetos simples, sozinhos, retirados do meio em que a
criança vive. Na idade do conto de fadas, a criança gosta
principalmente de contos de fadas, os quais representam um
ambiente que lhe é familiar. Já na idade das “histórias ambientais” ou
da leitura “fatual”, a criança começa a se orientar no mundo concreto,
objetivo. O interesse pelos contos de fadas e pelas sagas ainda é
evidente nessa fase intermediária orientada para os fatos, mas
também começa a surgir o anseio pelo aventuroso.
Na idade da história de aventuras, predominam as
demonstrações de agressividade e a formação de gangues. O interesse
dos leitores pode ser despertado principalmente através do enredo,
dos acontecimentos, do sensacionalismo. Interesses gerais: livros de
aventuras, romances sensacionais, livros de viagens, histórias
- 52 -
ordinárias e de um sentimentalismo barato. Nos anos de maturidade,
além da trama, a forma e o conteúdo também são valorizados no
material de leitura. Interesses de leitura: aventura de conteúdo mais
intelectual, histórias de amor, atualidades, literatura engajada,
material fatual que frequentemente se relacione com preferências
vocacionais.
Os bons livros infantis são o fundamento do ensino da leitura.
O interesse pelo enredo e pelo destino das personagens leva a criança
a terminar o livro num curto prazo de tempo. Quando isso acontece,
obtém-se o efeito prático tão necessário à compreensão na leitura. É
nesse ponto que a influência da sala de aula se combina com as
inclinações na esfera pessoal. Mais importante, porém, do que toda a
leitura feita na escola é a influência do professor sobre os hábitos
particulares de leitura (BAMBERGER, 1991). Desse modo, um
professor que é um assíduo leitor, passará a incentivar direta e
indiretamente os alunos, incutindo-lhes a curiosidade e o desejo pelo
mundo da leitura.
Com uma grande estimulação que recebia em casa de meus pais, aprendi cedo algumas letras, palavras e números. Desde o início da pré-escola, eu estava um pouco mais adiantada que o restante da turma. Em leituras em sala a professora sempre me chamava para ajudar com a leitura e esse estímulo me ajudava, sempre fazíamos a leitura da história da Branca de Neve, Cinderela, Chapeuzinho Vermelho e cantávamos músicas: Meu Lanchinho, Ciranda Cirandinha.
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Para formar leitores, a família, juntamente com a escola e a
sociedade, deve estar convencida da relevância da leitura e dos livros
para a vida individual, social e cultural das crianças. Por ser com a
família o primeiro contato para o processo de formação de leitores, é
ela que favorece a remoção das barreiras educacionais tão faladas,
concedendo oportunidades mais justas de educação, principalmente
através da promoção do desenvolvimento da linguagem e do exercício
intelectual, e aumenta a possibilidade de normalização da situação
pessoal de um indivíduo (BAMBERGER, 1991).
O relato de uma aluna afirma isso: “[...] um dos que eu mais
gostei de conhecer e levar para casa foi Catarina Malagueta, me
recordo que minha mãe lia para mim”. De acordo com Silva (1983),
esse potencial de leitura desponta em termos de conhecimento e ação
a partir do momento em que a criança recebe estímulos
socioambientais dentro de relações familiares e sociais específicas, o
ler versus não ler depende, dos incentivos do meio sociocultural.
Quando o educador trabalha com literatura infantil em sala de
aula, cria condições para a formação de leitores de arte, leitores de
mundo, leitores plurais. Muito mais do que uma simples atividade
inserida em propostas de conteúdos curriculares, oferecer e discutir
literatura em sala de aula é poder constituir leitores, é ampliar a
competência de ver o mundo e dialogar com a sociedade (GREGORIN
FILHO, 2009). Duas alunas expuseram sobre isso: “[...] uma das
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histórias lidas pela professora foi a da Formiga e do Gafanhoto”; “[...]
lembro que os livros eram bastantes ilustrativos e facilitava muito para
mim no que diz respeito à assimilação”.
A exigência dos educadores para que os jovens em processo
formativo leiam obras de literatura, constitui uma atitude negativa. A
situação é agravada quando se tem em conta a aplicação de avaliações
envolvendo o conteúdo dos livros infantis. Sendo assim, a
obrigatoriedade da leitura destes materiais didáticos faz com que os
alunos se sintam “[...] coagidos, tendo de ler uma obra que não lhes
diz nada. Tendo de submeter-se a uma avaliação, e sendo punido se
não cumprir as regras do jogo, que ele não definiu, nem entendeu”
(CUNHA, 1997, p.51).
As escolas quase sempre utilizam a literatura infantil com fins
didáticos: “para o reconhecimento dos fonemas eram utilizados
contos infantis (os três porquinhos, chapeuzinho vermelho, patinho
feio), o uso de cantigas (boi da cara preta, cuca, se eu fosse um
peixinho, meu lanchinho)”; “[...] tínhamos que ler paradidáticos, 1 por
semestre, lembro de: Aprender a perder, As viagens de Gulliver e um
de uma garota ciumenta”.
Os momentos de leitura em que me recordo, são das que eram feitas dos textos e histórias que vinham nos livros didáticos, onde cada aluno lia respectivamente uma frase até finalizar o texto, depois respondíamos as questões de interpretação de texto no livro didático.
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Não é necessário que a literatura seja lida ou usada com
intenção pedagógica ou didática, o importante é trabalhar o
imaginário e a fantasia. Através da leitura, a imaginação pode ser
muito estimulada. Inicialmente, no momento em que a história está
sendo contada, as crianças têm a oportunidade de imaginar tudo o que
está sendo dito, após isso, elas podem ser estimuladas a produzir
desenhos ou textos a partir da leitura. Pode-se verificar no relato de
uma aluna: “a professora lia muitas historinhas, uma delas é muito
conhecida, Os Três Porquinhos, ela também levava materiais para
associar a palavra ao objeto e construíamos algumas vezes objetos
com materiais recicláveis”.
Para Cagliari (2005), a escola deve respeitar a leitura de cada
criança, deve ensinar a ler no próprio dialeto, tornando fundamental
para formar bons leitores. No entanto, a escola que ainda é
responsável pelo processo leitor dos indivíduos na sociedade, só está
preocupada em avaliar como o mesmo realiza a leitura e de forma
mecanizada valores classificatórios a mesma. Por isso, faz-se
necessário superar algumas concepções sobre o aprendizado inicial da
leitura. Primeiro a de que ler é simplesmente decodificar, converter
letras em sons. Por causa desta compreensão equivocada a escola vem
produzindo grande quantidade de “leitores” capazes de decodificar
qualquer texto, mas com enormes dificuldades para compreender a
informação escrita.
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Saber ler é compreender o que se decifra, traduzir em
pensamentos, ideias, emoções e sentimentos um pequeno desenho
estendido ao longo de uma linha. Saber ler equivale a dispor de um
novo meio de comunicação com o próximo. No entanto, não devemos
nos contentar em ensinar os nossos alunos a lerem, temos de levá-los
a gostar da leitura e a descobrir os prazeres e alegrias que ela lhes pode
proporcionar (MIALARET, 1968). À vista disso, para que se possa
transmitir a leitura, é necessário saber como enriquecê-la no cotidiano
da sala de aula, com o intuito de expressar no indivíduo o seu prazer
crítico, reflexivo e criativo.
Sabe-se que grande parte da população não tem acesso aos
livros devido a inúmeros fatores. Dentre esses, está a estrutura social,
a qual favorece a classe dominante nas atribuições de uso da cultura.
As classes menos favorecidas são alienadas pela elite sobre um futuro
e um país melhor e, desta forma, elas não expressam suas ideias e nem
criticam os fatos.
[...] as condições de acesso à leitura, em nossa sociedade capitalista, são diferenciadas: discriminam-se as camadas populares pelo reforço de sua concepção pragmática da leitura, a que se atribui apenas um “valor de produtividade”, enquanto, para as classes dominantes, ler é proposta de lazer e prazer, de enriquecimento cultural e ampliação de horizontes; supervaloriza-se um discurso escrito que legitima a ideologia das classes dominantes, expropriando as classes dominadas de seu próprio discurso; sonega-se às camadas populares o acesso à produção escrita,
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facilitando-o, porém, às classes favorecidas. (ZILBERMAN e SILVA, 1995, p. 25).
Para formar leitores e melhorar a atual situação no país, a
família, juntamente com a escola e a sociedade, deve estar convencida
da relevância da leitura e dos livros para a vida individual, social e
cultural das crianças. Por ser com a família o primeiro contato para o
processo de formação de leitores, é ela que favorece a remoção das
barreiras educacionais tão faladas, concedendo oportunidades mais
justas de educação, principalmente através da promoção do
desenvolvimento da linguagem e do exercício intelectual, e aumenta
a possibilidade de normalização da situação pessoal de um indivíduo
(BAMBERGER, 1991). Dessa forma, um aluno mencionou a influência
da mãe em seu processo de formação leitor.
[...] minha mãe desde cedo fazia leitura diárias para mim e meu irmão. [...] uma leitora voraz, o que nos influenciava. [...] Com cinco anos já possuía meus primeiros livros nos quais escrevia a primeira frase elaborada por mim: “Este livro é de Rodrigo”. Acredito que esta fase da minha vida me fez tornar o viciado leitor que hoje sou. Livros lidos nesta fase: Soprinho, Coleção Fantasminha, Mundo dos Bichos e vários de Ana Maria Machado.
De acordo com Silva (1983), esse potencial de leitura desponta
em termos de conhecimento e ação a partir do momento em que a
criança recebe estímulos socioambientais dentro de relações
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familiares e sociais específicas, o ler versus não ler depende, dos
incentivos do meio sociocultural.
No intuito de incentivar a leitura para crianças e
consequentemente vender mais, as indústrias editoriais publicam
livros com diferentes formas e texturas: macios, coloridos, com
atividades educativas, com textura, com ímãs, com fantoches, com
adesivos, com CD, para colorir, sonoros, entre outros. Desse modo, as
crianças têm uma vasta gama de possibilidades de leitura, com
diferentes atrativos, entretanto, essas possibilidades são inacessíveis
para a maioria das crianças, por não terem o hábito de ler, devido à
cultura dos pais, por não terem condições de comprar livros ou porque
a escola didatiza a literatura, que deve ser, antes de tudo, prazer e
diversão.
É forçoso mencionar que a relação da criança com o livro só
acontece se for estimulada desde os primeiros anos de vida,
independentemente das condições sociais e/ou culturais dos pais. A
criança deve ser incitada ao hábito da leitura, contribuindo dessa
forma, a tornar-se um adulto leitor.
Considerações Finais
O gosto ou desgosto pela leitura inicia-se no universo infantil,
podendo ser estimulado, cotidianamente, por educadores e a família.
A literatura infantil possibilita a criança a percepção de um mundo de
fantasia, cheio de encantamentos e emoções; o seu manuseio
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estabelece comunicação entre autor e leitor. As formas e a maneira
como os textos são introduzidos na vida de uma criança, determina
seu interesse ou repúdio pela leitura. A interação, frequentemente,
com a diversidade de textos escritos manifesta-se como uma atitude
de desenvolver o hábito e o gosto da criança. Vale destacar a
importância de se considerar os tipos e obras que eles se sentem
atraídos.
Nessa perspectiva, a literatura infantil é um meio fecundo para
expandir pensamentos, sentimentos, concepções e atitudes. Seu uso
exerce grande influência na aquisição de práticas de leitura entre os
alunos, possibilitando o interesse e o gosto pelo universo leitor nos
primeiros anos escolares. Configura-se então, como primordial, pois
traz elementos que encantam as crianças (e também os adultos). Se
desde cedo os alunos têm um contato prazeroso com as obras, a
chance de se tornarem bons leitores é, sem dúvida, bem maior.
Portanto, pode-se ressaltar que se desde cedo os alunos forem
incentivados ao anseio da leitura, criarão um hábito, os quais levaram
por toda vida, tornando-se então, adultos leitores e assíduos.
Destarte, a leitura da literatura infantil e suas diferentes formas é um
meio de lazer e de prazer, de aquisição de conhecimentos e de
enriquecimento cultural, de ampliação das condições de convívio
social e de interação. Interação verbal entre indivíduos, e indivíduos
socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na
estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros.
- 60 -
Referências
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ARIÈS, P. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 1981.
ARROYO, L. Literatura Infantil Brasileira. São Paulo: Melhoramentos, 1990.
BAMBERGER, R. Como incentivar o hábito de leitura. 5a ed. São Paulo: Ática, 1991.
CAGLIARI, L. C. Alfabetização e linguística. 10a ed. São Paulo: Scipione, 2005.
CUNHA, M. A. A. Literatura e educação. In: Literatura infantil: teoria e prática. 16a ed. São Paulo: Ática, 1997.
FRANTZ, M. H. Z. O ensino da literatura nas séries iniciais. Ijuí: UNIJUÍ, 1997.
GREGORIN FILHO, J. N. Literatura infantil: Múltiplas linguagens a formação de leitores. São Paulo: Melhoramentos, 2009.
LIMA, L. E. A. Literatura infanto-juvenil. Aracaju: Gutemberg, 2010.
MAGALHÃES, M. do S. R. Literatura infantil: fantasia e o domínio do real. Teresina: UFPI, 2001.
MIALARET, G. Saber ler. In: A aprendizagem da leitura. 2a ed. São Paulo: Estampa, 1968. p. 13-19.
OLIVEIRA, M. A. de. Literatura prazer: interação participativa da criança com a literatura infantil na escola. 6a ed. São Paulo: Paulinas, 1996.
- 61 -
SILVA, E. T. Leitura & realidade brasileira. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1983.
ZILBERMAN, R. & SILVA, E. T. (Orgs). Leitura: perspectivas interdisciplinares. 3a ed. São Paulo: Ática, 1995.
ZILBERMAN, R. A literatura infantil na escola. São Paulo: Global, 2003.
- 62 -
Sem contos de fadas: a construção da
materialidade na coleção Antiprincesas
Adriana Rodrigues Gonçalves5
Izabel Cristina Silva Diniz6
“Um livro não chega jamais a um leitor sem marcas”. (Pierre Bourdieu)
Nas fronteiras da coleção Antiprincesas
O mercado editorial tem investido cada vez mais nos aparatos
paratextuais, que, segundo Gérard Genette (2009, p. 9), seriam “aquilo
por meio de que um texto se torna livro”. Essa definição se refere tanto
aos elementos internos (peritexto) quanto aos elementos externos
(epitexto) à obra. Desse modo, para Genette, peritexto seria aquilo
que está em torno do texto, que se refere à realização material do
livro: formato, composição, título, capa, página de rosto, prefácio,
anexo etc. Por meio da observação desses aspectos, é possível inferir
qual público-alvo busca-se atingir, o tipo de publicação materializada,
dentre outras características que a obra apresenta com o objetivo de
atrair o leitor e mantê-lo interessado.
Assim, com base nos pressupostos teóricos apresentados por
5 Mestranda em Estudos de Linguagens pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. 6 Doutoranda em Estudos de Linguagens pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais.
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Genette (2009), abordaremos os aspectos paratextuais de três livros
da coleção Antiprincesas. Os títulos selecionados para este estudo são
dedicados: à escritora modernista brasileira Clarice Lispector cujo
nome da obra é Clarice Lispector para meninas e meninos; à pintora
mexicana Frida Kahlo, intitulado Frida Kahlo para meninas e meninos;
e à cantora chilena Violeta Parra, denominado Violeta Parra para
meninas e meninos, todos na versão em língua portuguesa. Nas obras
selecionadas, analisaremos os seguintes elementos peritextuais: a
capa, o título, a folha de rosto e a disposição de texto e imagem em
seu interior.
Livro para crianças
Gregorin Filho (2009) descreve que as crianças, tal como
conferimos sentido, outrora liam apenas a literatura adulta, pois,
como ainda não havia uma concepção de infância,
consequentemente, não se produzia uma literatura destinada aos que
eram considerados adultos em miniatura. Além disso, o contato com
livros era dado consoante à classe social participante do poder, isto é,
os que ocupavam “altas posições” na sociedade tinham acesso aos
clássicos, enquanto os mais pobres se conectavam à literatura oral.
O livro infantil surge a partir da identificação das necessidades
particulares da criança, sendo adaptadas a ela a linguagem, o formato
e o design (SILVA, 2009). Manguel (1997) relata que no século XV, por
volta de 1493, o duque Gian Galeazzo Storza, de Milão, mandou
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confeccionar um livro de horas7 para seu filho de três anos. O jovem
garoto aparecia representado em uma das páginas, conduzido por um
anjo através de uma região inóspita. Essa obra intitulada II Dulcheto
contém uma personificação, pois o menino Francesco ganha a forma
de personagem e, assim, pode tanto se identificar com a imagem
quanto se perceber como parte da obra. Na atualidade, seria
improvável esperar que isso ocorresse, já que o livro se tornou um
artefato industrial produzido em grande escala (NECYK, 2007).
Na segunda metade do século XVIII, adaptações de clássicos da
literatura são reeditadas especialmente para crianças. Dessa forma,
com o passar do tempo, a sociedade foi definindo o que é ser criança
e o que essa deveria ler, ou seja, qual seria a linguagem temática
aceitável para cada etapa da infância. Nos últimos anos, segundo
Marisa Lajolo e Regina Zilberman (2009, p.160), os livros infantis
ampliaram a abordagem de temas ― poesias infantis, lendas
brasileiras e assuntos regionais ― para além da ideia de fantástico, nas
palavras das autoras: “são, assim, muitas as formas pelas quais o texto
infantil contemporâneo busca romper com a esclerose a que o
percurso escolar e o compromisso com uma pedagogia conservadora
parece ter confinado o gênero”.
Vale ressaltar que o aprimoramento de técnicas e
equipamentos de impressão somados a outros fatores, sobretudo ao
7 Livro de horas é um livro de orações pessoal, fabricado à mão ou impresso durante a Europa Medieval.
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aumento do número de pessoas alfabetizadas, tornou o livro acessível.
Na antiguidade, os livros eram objetos caríssimos e, portanto,
indicavam o status social a que seus proprietários pertenciam. Fischer
(2006) chama a atenção para o fato de ao final da Idade Média ser
comum a alguns fidalgos exibirem livros em determinados cômodos
da casa para serem apreciados como objetos de adorno e de poder
aquisitivo, já que em alguns casos seus donos não sabiam ler.
Ademais, a quantidade de leitores, bem como a quantidade de
obras, aumentou exponencialmente desde a antiguidade. Apesar do
crescimento do número de leitores, do número de títulos e do
aumento da produção literária infantil no país, a sobrevivência de
muitas editoras depende das demandas escolares. Em outras palavras,
a escola é a instituição que sustenta o mercado livreiro no Brasil, quiçá
no mundo.
Os laços entre a literatura e a escola têm início, como afirmam
Lajolo e Zilberman (1984, p. 17), desde “a habilitação da criança para
o consumo de obras impressas”. Afinal, faz parte do papel da escola
alfabetizar, ou seja, ensinar a ler os futuros consumidores de livros.
Ainda segundo as referidas autoras, cabe a essa instituição social
promover e estimular condições de viabilizar a circulação e o consumo
de material literário e didático. Assim sendo, a missão escolar é formar
um público leitor e, por consequência, consumidor de literatura.
Nesse contexto, o livro de literatura destinado a crianças é,
muitas vezes, definido em oposição ao livro didático, por ser isento de
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objetivo pedagógico e por não se destinar ao cumprimento do
currículo escolar. Contudo existem algumas interseções nessa relação,
como, por exemplo, a linguagem simplificada e o uso de ilustrações
tão comuns a ambas as publicações. O ato de usar o livro como
instrumento pedagógico é descrito como uma tendência por Magda
Soares (2009). Segundo a autora, corre-se o risco de que o livro infantil
seja visto muito mais pelo viés de um objeto que ensina, do que um
lugar de fruição. Embora não possua o objetivo de cumprir o currículo
escolar, o livro infantil de literatura está, de alguma forma, enleado ao
ensino (NECYK, 2007). A coleção em análise não foge a essa regra,
como demonstraremos neste trabalho.
Quanto aos temas recorrentes na produção editorial infantil,
estes se dividem, de acordo com Aparecida Paiva (2008), em três
grupos, a saber: os contos de fadas e fábulas, os livros de assuntos
transversais e os livros de temas cotidianos. No primeiro eixo, destaca-
se a fantasia, que coloca o bem e o mal de forma excludente, usam-se
imagens de animais, e lugares como: circo, parque, zoológico e
fazenda. O segundo possui os elementos comuns a uma narrativa, com
a inserção de um tema contemporâneo como, por exemplo, a questão
da água ou da reciclagem. E, por fim, em menor quantidade, os livros
que abordam temas relacionados à subjetividade humana: medo,
decepção, amor e morte.
Paiva (2008) esclarece que o primeiro eixo possui uma forte
tradição, pois a fantasia é quase inquestionável enquanto literatura, já
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o segundo é amplamente aceito pela escola e, consequentemente,
produzido pelas editoras, ao passo que o último – que aproximaria a
criança de uma literatura atada à arte, à experiência humana, à
realidade da vida – acaba sendo menos explorado pela dificuldade de
se tratar do tema. A autora declara que é problemática essa visão
sobre tal eixo, uma vez que este possibilitaria à criança desenvolver
sua sensibilidade por meio de referências estéticas, éticas e culturais,
e, por conseguinte, o mercado editorial não se estacionaria na maciça
produção de obras repetitivamente pedagógicas.
Tendo em vista o contexto apresentado, observamos que
frequentemente as opções de livros destinados às crianças se referem
aos contos de fadas. Mas o que aconteceria se essa prática fosse
deliberadamente questionada? E se os livros contassem histórias reais
de pessoas comuns de carne e osso? E se as princesas e os príncipes
dessem espaço à representatividade de mulheres e homens que vão
além de um padrão europeu e estadunidense? Atendendo a esses
questionamentos, a editora argentina Chirimbote idealizou e editou
obras que valorizam artistas da América Latina.
Antiprincesas em cena
O livro infantil contemporâneo é dotado de certas
características projetuais que o faz um produto de fácil
reconhecimento e, podemos afirmar, com base em Hunt, 2010; Lajolo,
1984; Necyk, 2007, que o traduz um gênero específico. A capa
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ilustrada e os formatos diferenciados quase sempre são suficientes
para que um livro seja identificado como pertencente ao gênero
infantil, antes mesmo de ser folheado. A materialidade do livro é, sem
dúvida, um fator de atração para o público mirim e, também, adulto.
Nesse caso, a aparência é de vital importância para o estabelecimento
das primeiras relações entre o leitor e o livro.
A materialidade do livro infantil o distingue inteiramente de
outras formas de leitura (NECYK, 2007). Esse tipo de obra explora as
possibilidades de forma, impressão, tipografia, alta gramatura da capa
e do papel, uso de ilustrações e outros aspectos. Diante disso, a
configuração do livro se dá como artefato final de um processo
industrial cujos elementos materiais essenciais são: a capa, a folha de
rosto, os tipos de letras, o formato da página, a disposição da mancha
gráfica no espaço da página, o estilo gráfico de ilustração.
Imersas nesse contexto, as coleções denominadas
Antiprincesas8 e Anti-heróis da editora argentina Chirimbote, de
autoria de Nadia Fink e Pitu Saá, apresentam, ao público infantil, as
histórias de vida de mulheres e homens latino-americanos que se
destacaram em sua área de atuação. O primeiro desses livros conta a
história de vida da artista Frida Kahlo, o segundo é dedicado à cantora
Violeta Parra, já o terceiro livro é sobre Juana Azurduy, militar que
participou das lutas pela independência da América espanhola. E ainda
8 Distribuição SurLivro.
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há outros dedicados a Gilda, Clarice Lispector, Julio Cortázar e Eduardo
Galeano.
Primeiramente, os livros foram publicados em espanhol e,
mais recentemente, alguns títulos em português. A maior parte dos
livros que compõe a coleção está em fase de tradução. Em 2015 e
2016, foram publicados em português: #1 Frida Kahlo, #2 Violeta Parra
e #3 Clarice Lispector, sobre os quais nos deteremos.
Capa: o chamariz das obras
Alan Powers (2008, p. 10) descreve como se deu o advento das
capas de livros infantis, ainda no século XVI, a partir dos chamados
chapbooks, impressos dobrados em doze ou dezesseis partes de baixo
custo: “A capa do livro ilustrado surgiu associada a crianças – e
permaneceu uma constante na edição de literatura infantil, sendo
depois imitada pela indústria de livros”. Os livros, anteriormente, eram
publicados com capa provisória, até John Newbery (1713-1767),
ilustrador e editor, fazer uso de desenhos em uma obra e disseminar
essa ideia. Outra grande estratégia do autopromotor foi vender os
livros ao lado de brinquedos.
As mudanças impulsionadas, principalmente, pelas inovações
tecnológicas na produção de obras escritas, ao longo dos tempos,
proporcionaram que a impressão fosse acessível e alcançasse diversos
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títulos da literatura infantil. Em entrevista9 à Cosac Naify, o referido
autor descreve a função deste peritexto:
A função da capa tem sido a mesma por muitos anos. Com exceção dos livros de capa do tipo brochura e algumas poucas edições especiais, com encadernações luxuosas, as capas continuam sendo a primeira ponte para o leitor, fornecendo uma visão instantânea do gênero e do conteúdo do livro. (POWERS, 2008, texto web).
Atualmente, apesar dos avançados recursos tecnológicos
disponíveis para produção de ilustração e impressão de livros, a capa,
elemento peritextual que Gérard Genette (2009) considera um grande
chamariz, enfrenta o desafio de se fazer notar em meio a tantos
estímulos visuais. As capas dos livros infantis investigados trazem uma
ilustração das personagens (quase uma caricatura), como se vê a
seguir.
9 Disponível em: <http://editora.cosacnaify.com.br/ObraEntrevista/11138/53/Era-uma-vez-uma-capa--Hist%C3%B3ria-ilustrada-da-literatura-infantil.aspx> Acesso em: 4 mar. 2017.
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Imagem 1 – Capas dos livros Frida Kahlo, Clarice Lispector e Violeta Parra, coleção Antiprincesas. Fonte: Internet, dez. 2016.
Como é possível perceber, as capas expostas são constituídas
pela imagem ilustrada das personagens, com o emprego de brilho e
cores vibrantes. As artistas são retratadas como bonecas, tal efeito se
dá, principalmente, pelo uso de bochechas marcadas por uma bola
rosada e pelo formato da boca, em particular de Lispector. Nessas
capas, não se tem a ilustração de objetos que remetem à área de
atuação das protagonistas, com uma exceção. Cada uma delas é
retratada em um cenário: Frida cercada pelo verde da natureza, que
aparece, em sua obra, cheio de vida e beleza; Clarice em um espaço
fechado, com janela e cortina ao fundo – que nos remete ao lugar da
leitura e da escrita; e Parra segura o violão, que alude diretamente ao
seu talento musical.
Dois aspectos nos chamam a atenção nas capas em destaque:
o selo da coleção e a referência “para meninas e meninos”. O primeiro
conta com uma coroa ao avesso demonstrando já de início a proposta
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dos livros de não fantasiar a história narrada com os elementos tão
comuns aos contos de fadas. A indicação do público-alvo também
tende a demonstrar que, ao contrário dos contos de fadas que
estereotipicamente se voltam mais para as meninas, as publicações
em questão convidam tanto os meninos a lerem as histórias de artistas
quanto as meninas a lerem os livros de anti-heróis. Quebra-se,
portanto, a ideia de que “isso é para menina/menino”, abarcando
ambos os públicos.
Título: apresentação das artistas e do público-alvo
Gérard Genette (2009) segue a premissa de que o título tem
como função: identificar a obra, indicar seu conteúdo e valorizá-lo. O
autor (2009, p.76) declara que “o título [...] é o ‘nome’ do livro e, como
tal, serve para nomeá-lo, isto é, designá-lo com tanta precisão quanto
possível e sem riscos demasiados de confusão”. Nesse sentido, ao
observarmos os nomes dados aos livros da coleção, percebemos a
referência direta à temática das obras e ao público a que se destinam.
Nesse sentido, Nikolajeva e Scott (2006) apontam que
ilustrações na capa antecipam o enredo, principalmente em obras com
os títulos: A história de... Uma viagem para... Essas autoras elencam,
quanto ao título das obras por elas analisadas, algumas das principais
características dos livros destinados a crianças, a saber: título
nominativo – aquele em que está explícito o nome da personagem
principal; título de personagens coletivos – identifica um grupo de
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personagens que possui alguma característica em comum; título de
histórias – associa o nome de uma personagem ou o narrador à estória
narrada; e, por último, título de objetos – associa a narrativa ao objeto
central da história.
Em relação aos livros investigados, os títulos são nominativos
(NIKOLAJEVA e SCOTT, 2006), pois expõem o primeiro nome e o
sobrenome das personagens centrais. Os nomes das mulheres
representadas podem ser um grande chamariz para o futuro
comprador do livro, uma vez que as tais foram muito representativas
em suas áreas de atuação. As crianças que são as leitoras, mas não as
compradoras do livro, podem se sentir mais atraídas pela imagem em
forma de boneca, ao passo que os mediadores da leitura, com seu
respectivo arcabouço cultural, podem se interessar pelas obras por
reconhecerem a importância de cada artista. Assim, a ilustração
impressa na capa somada a denominação da obra antecipam, pelo
menos em parte, o enredo a ser narrado, bem como atraem de
diferentes maneiras o leitor e o comprador de livros infantis.
Folha de rosto: o adeus de Branca de Neve
Peter Hunt (2010) afirma que no percurso de produção do livro,
este passa pelo autor, editor e leitor. Hunt pondera que o autor
carrega consigo experiências de vida, códigos culturais, valores e
questões que o formam para escrever determinado livro. Por outro
lado, o editor, com o poder em mãos, parte da ideologia de sua marca,
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e/ou aceita o que o mercado propõe, no momento de publicar um
livro. No final dessa ponte está o leitor, que pode ser influenciado por
questões socioculturais, didáticas e que, por fim, realiza a recepção da
obra segundo sua bagagem de experiências.
Compreendendo todo esse percurso, cada parte constitutiva
da obra põe à disposição do leitor um significado à narrativa. Logo na
página de rosto das três obras analisadas, observamos a figura
incompleta (somente a parte inferior do corpo) da personagem
clássica Branca de Neve, seguida de um balão escrito
“#tchauvouembora”, como é possível constatar no exemplo a seguir.
Imagem 2 – Folha de rosto coleção Antiprecisas, livro Violeta Parra. Fonte: FINK e Pitu, 2016.
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Tal imagem provoca no leitor a compreensão de que até as
princesas entenderam que aquela publicação não lhes reservou
espaço, pois não se trata de um conto de fadas. Há ainda a
compreensão do próprio leitor sobre a proposição da obra, pois à
medida que se publica um novo exemplar da coleção a figura da
Branca de Neve diminui, destarte uma nova consciência se instala.
Nesse sentido, Sophie Van der Linden (2011, p.62) aponta que
a folha de rosto constitui um patamar convencional que precede a narrativa. Por isso, tudo o que se aparenta a uma narrativa e intervém antes dessa página é sentido como uma espécie de “pré-narrativa”, à maneira de “pré-créditos”, sendo por vezes evidente a comparação com o cinema [...].
Nessa perspectiva, observamos que a página de rosto traz
ainda ao leitor um texto que ratifica a intencionalidade da publicação.
No primeiro livro, Frida Kahlo, questiona-se, por exemplo, o porquê de
as princesas permanecerem tão “vestidinhas” e não brincar ou se
sujar. O segundo se atém mais à apresentação de Clarice Lispector
enquanto uma antiprincesa que “quebrava as estruturas das frases;
virou pelos avessos gêneros literários, bagunçou pontos e vírgulas”. O
terceiro, dedicado à Violeta Parra, justifica o fato de a coleção retratar
mulheres latino-americanas, questionando a hierarquia das princesas,
“as quais vivem tão longe da realidade” (FINK e SAÁ, 2015 e 2016).
Analisando o peritexto no conjunto da obra, percebemos
claramente a proposta da edição. Ressaltamos que as escolhas
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editoriais não são aleatórias, mas formam, na conjuntura da obra, um
sentido que antecipa, convida, instiga, atrai o leitor de variadas formas
para dentro da narrativa. A escolha dos editores por não retratar
princesas, ao mesmo tempo que alude aos clássicos contos de fadas,
propõe um novo olhar sobre os estereótipos criados por esse tipo de
publicação. Torna-se, portanto, uma escolha política da editora
abordar a vida e a obra de artistas da América Latina, que ultrapassam
a cultura da fantasia e recuperam a importância dos conflitos humanos
no livro infantil.
Relação verbo-visual
As obras em foco utilizam recursos tipográficos para destacar
e, ao mesmo tempo, distinguir as vozes que se entrecruzam e que
somadas constituem a narrativa. No caso da coleção Antiprincesas,
verificamos: (i) a voz das personagens sinalizada, principalmente, pelo
uso de negrito e cor preta; (ii) as perguntas realizadas pelos cachorros
ou pelo passarinho têm fonte distinta das demais vozes e sempre
aparecem em balões; e (iii) a voz do narrador apresenta-se, muitas
vezes, em caixas, ou seja, dentro de contornos. Apontamos que em
dois livros há uma personagem recorrente, um cão que ajuda o
narrador a conduzir a história. Ele é apresentado, pelo narrador, como
o cachorro perguntador da protagonista, seja ela Clarice ou Frida. Já
na obra sobre Violeta Parra, tem-se um passarinho que também
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realiza perguntas ao narrador. Chama-nos a atenção essa figura ser um
pássaro, que em tom poético nos alude ao cantarolar e à liberdade de
Parra. Ademais, a narrativa sempre demonstra uma relação positiva
de respeito dessas mulheres para com os animais.
A relação espacial entre texto e imagem determina os
processos de leitura e visualização das gravuras. Algumas disposições
favorecem a maior integração visual ou até a mixagem dos elementos
imagéticos e textuais. Quando texto e imagem se encontram
visualmente integrados tendemos a aprendê-los de maneira
diferenciada daquela de uma disposição separada (NODELMAN, 1988;
NECYK, 2007). As ilustrações no livro infantil podem aparecer sobre um
fundo ou podem constituir o próprio fundo, gerando várias relações
espaciais com o texto. Isso significa que a maneira pela qual texto e
ilustração são dispostos produz significados na sua relação, ou seja, o
aspecto espacial influencia o aspecto semântico.
No caso das obras em análise, a mancha gráfica se dá de forma
que todos os espaços das folhas foram preenchidos com textos, cores,
papéis de parede, fotografias e ilustrações, levando à interpretação de
que a vida das protagonistas foi muito intensa. Notamos, com isso, que
vários recursos foram explorados, atestando a literatura infantil como
o espaço favorável ao processo de criação. A opção por escrever uma
narrativa não contínua, isto é, constituída por meio de muitas vozes e,
também, por recortes de fatos vivenciados pelas artistas, reflete-se na
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forma como foram distribuídos, nas páginas dos livros, textos escritos
e gravuras.
A ocupação espacial da ilustração em relação ao texto, na
página, pode se dar de quatro maneiras principais, segundo Nodelman
(1988): (i) a ilustração é aplicada numa área separada do texto; (ii) a
ilustração é empregada parcialmente em união ao texto; (iii) o texto é
aplicado de modo a intermediar ou se relacionar com a forma da
ilustração; (iv) o texto é empregado dentro da área de ilustração.
Quanto à disposição de textos e imagens nos livros da coleção
Antiprincesas, observamos a ocorrência das quatro formas descritas
por Nodelman (1988), todavia percebemos uma preferência pela
disposição do texto verbal nas páginas à esquerda. Assim, nessas
páginas, o texto é aplicado no mesmo espaço que as imagens, sendo
separado por molduras ou outros recursos. Nas páginas da direita, por
sua vez, concentra-se somente uma cena ilustrada, ou seja, tem-se
uma ilustração que ocupa toda a página, com raros fragmentos de
textos verbais inseridos na imagem. Nessas páginas, a ilustração é
aplicada separada do texto, com algumas poucas exceções, como se
vê no seguinte exemplo.
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Imagem 3 – Livro Clarice Lispector, coleção Antiprecisas. Fonte: FINK e Pitu, 2015.
As imagens estão distribuídas por todo o livro, no entanto as
páginas da direita foram preenchidas com gravuras maiores,
representando apenas uma cena, ao passo que nas páginas da
esquerda têm-se um mosaico composto por textos verbais e não
verbais. Em outras palavras, as ilustrações são aplicadas, na página à
direita, numa área separada do texto, salvas algumas exceções, como
ilustra a Imagem 3. Já as páginas à esquerda apresentam sempre, sem
restrição, o texto aplicado de modo a intermediar ou se relacionar com
a forma da ilustração.
As ilustrações que compõem as páginas da direita da coleção
Antiprincesas são, em quase sua totalidade, reproduções de algum
trecho do texto verbal localizado na página anterior, ou seja, da
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esquerda. Destacamos que tal escolha contribui pouco para o
desenvolvimento da leitura de imagens por parte do leitor mirim
(HUNT, 2010; LAJOLO e ZILBERMAN, 1984), uma vez que apenas traduz
o texto escrito.
Quando se observa o texto verbal das obras em foco, há
indícios de que este é destinado a crianças entre nove e 12 anos, o que
seria considerado um leitor fluente ou crítico, segundo os parâmetros
propostos por Nelly Novaes Coelho (apud Soares, 2008), que distingue
um pré-leitor (até 6 anos), leitor iniciante (6/7 anos), leitor em
processo (8/9 anos), leitor fluente (10/11) e leitor crítico (12/13).
Nesse sentido, as obras parecem evocar um leitor fluente e crítico,
principalmente pela extensão do texto, pela estrutura linguística
utilizada, pelo emprego de alguns termos científicos, tais como:
surrealismo e crônica. No entanto, quando se observa as ilustrações,
estas fazem parte de um universo mais infantilizado, capaz de atrair
também um leitor iniciante. Tal fato demonstra um trabalho de autoria
e ilustração que, ao mesmo tempo que abarca crianças de diferentes
idades, pode desencadear um estranhamento no conjunto de
interpretação texto-imagem. Daí a importância de se pensar o livro
infantil como um texto coerente e uniforme, pois é fundamental,
nesse tipo de obra, obter um bom trânsito entre as duas linguagens.
Mesmo com o aumento da utilização de fotografia, a maior
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parte dos livros infantis manteve a arte da ilustração como forma de
produção de imagens (NECYK, 2007). No caso da coleção
Antiprincesas, usam-se, no interior dos livros, algumas fotografias das
personagens (com exceção de Violeta Parra para meninas e meninos),
remetendo os leitores à versão real das protagonistas.
Nas obras analisadas são empregadas ilustrações e imagens
fotográficas das personagens, de algum objeto ou de alguma
localidade relacionadas à vida pessoal ou à profissão delas. Dessa
forma, percebemos um cruzamento entre a esfera ficcional10,
acessível por meio das ilustrações (que traduzem o universo infantil),
e a realidade, disponível por meio de fotografias em preto e branco e,
raramente, em cores.
É interessante destacar que as pinturas de Kahlo, selecionadas
para compor o livro dedicado a ela, foram adaptadas ao universo
infantil, isto é, alguns dos quadros dessa pintora estão reproduzidos,
no livro Frida Kahlo para meninas e meninos, de forma fiel ao original,
exceto pelo emprego de cores essencialmente primárias, como se vê
no exemplo a seguir.
10 Ficcional é compreendido, neste artigo, como elaboração, criação imaginária, fantasiosa ou fantástica; fantasia.
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Imagem 4 – Livro Frida Kahlo, coleção Antiprecisas. Fonte: FINK e Pitu, 2015.
Vemos, na Imagem 4, o uso predominante das cores primárias
na versão reproduzida da tela O abraço amoroso entre o Universo, a
Terra, Eu, Diego e o Senhor Xólotl (1949), de Frida Kahlo.
Os livros infantis investigados apresentam características
comuns a materiais paradidáticos, sobretudo devido à inserção de
quadros com notas explicativas sobre alguns termos, bem como a
inclusão de proposta de atividades ao final das obras. Isso nos leva a
crer que a editora tem como propósito oferecer os livros da coleção
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Antiprincesas como material de ensino à escolha de professores. Vale
ressaltar que, conforme apontamos, a criança não é a compradora
direta do exemplar, assim, seu contato com a obra sofre
intermediação de pais, escola, editora, governo.
Considerações finais
Na visão de Chartier (2003), o texto e seus suportes de
apresentação e transmissão estão profundamente ligados, como
ocorre nas obras de literatura destinadas ao público mirim. Logo,
examinar a materialidade de um livro infantil justifica-se à medida que
é possível revelar a associação entre materialidade e sentido, numa
confluência que converge para a cultura material da literatura e,
portanto, para a própria história cultural, sendo o livro, enquanto
objeto, um dos elementos reveladores de orientações estéticas e
ideológicas.
A primeira relação entre texto e imagem na obra de literatura
infantil, como exposto, se dá na capa do livro. Se de um lado, a capa é
apreendida como parte integrante (identidade) do objeto livro, do
outro, é parte integrante da história nele contida. Os títulos também
ganham conotação especial já que carregam consigo “o peso do nome
das artistas”, que desconstruindo a noção de princesas foram à luta e
conquistaram seus espaços nas artes. E ainda, destacamos que as
folhas de rosto, antes de serem um elemento obrigatório no livro,
aparecem como uma pré-narrativa do pano de fundo em que as
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biografias se estabelecem; bem como, oferecem caminho para a
compreensão dos projetos editoriais.
Sobre a mancha gráfica e a distribuição espacial de imagem e
texto verbal, sabemos que a localização do texto e das imagens
influencia a leitura da página e do livro como um todo. No caso da
coleção Antiprincesas, o texto verbal localiza-se, majoritariamente,
nas páginas da esquerda. Por sua vez, as ilustrações e as imagens estão
em todas as páginas das obras investigadas. Ademais, a forma como é
disposto o texto escrito e a inclusão de propostas de atividades ao final
das obras remetem aos conteúdos descritivos e avaliativos
encontrados em livros paradidáticos. Tal escolha revela-nos como o
mercado editorial se mantém refém da educação escolar.
O livro infantil contemporâneo, em especial aquele voltado
para a primeira infância, produz progressiva familiarização com os
mecanismos e as convenções da linguagem, e, possivelmente, esta
constitui uma de suas principais funções. Segundo Bourdieu (2001), a
forma como o objeto livro é elaborado direciona a interpretação.
Diante disso, surgem as seguintes questões: que leitor a coleção
Antiprincesas deseja formar? Uma criança que não almeja ser uma
princesa de conto de fadas ou uma criança que conhece e admira as
pessoas que estão inseridas na história sociocultural de seu país e/ou
de seu continente? A mediação de leitura pode propor um ou outro
caminho e quem sabe ambos. Afinal, há nas obras analisadas um claro
questionamento das histórias de princesas amplamente divulgadas
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pelas produções Disney.
A ideia de falar a meninas e meninos sobre a vida de
personalidades que viveram na América Latina parece-nos
interessante à medida que a criança toma conhecimento do mundo
em que ela vive e das experiências humanizadoras.
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Referências
BOURDIEU, Pierre. A leitura: uma prática cultural: debate entre Pierre Bourdieu e Roger Chartier. In CHARTIER, Roger. Práticas da leitura. 2ª ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2001.
CHARTIER, Roger. Formas e sentido – cultura escrita: entre distinção e apropriação. Campinas: Mercado de Letras, Associação de Leitura do Brasil, 2003.
FINK, Nadia e SAÁ, Pitu. Clarice Lispector para meninas e meninos. Tubarão: Editora Chirimbote, 2016.
FINK, Nadia e SAÁ, Pitu. Frida Kahlo para meninas e meninos. Tubarão: Editora Chirimbote, 2015.
FINK, Nadia e SAÁ, Pitu. Violeta Parra para meninas e meninos. Tubarão: Editora Chirimbote, 2016.
FISCHER, Steven R. História da leitura. Tradução Claudia Freire. São Paulo: Editora UNESP, 2006.
GENETTE, Gérard. Paratextos editoriais. Tradução Álvaro Faleiros. Cotia: Ateliê Editorial, 2009.
GREGORIN FILHO, José Nicolau. Literatura infantil: múltiplas linguagens na formação de leitores. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2009.
HUNT, Peter. Crítica, teoria e literatura infantil. Trad. Cid Knipel. São Paulo: Cosac Naify, 2010.
LAJOLO, Marisa e ZILBERMAN, Regina. Literatura Infantil Brasileira. História & Histórias. São Paulo: Ática, 1984.
LINDEN, Sophie Van der. Para ler o livro ilustrado. Tradução: Dorothée de Bruchard. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
- 87 -
MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. Trad. Pedro Maia Soares. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
NECYK, Barbara Jane. Texto e Imagem: um olhar sobre o livro infantil contemporâneo. Dissertação de Mestrado – Departamento de Artes e Design. Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2007. 167p.
NIKOLAJEVA, Maria e SCOTT, Carole. How Picturesbooks Work. Routeledge: New York, 2006.
NODELMAN, Perry. Words about Images: the narrative art of Children’s Picture Book. Athens: University of Georgia Press, 1988.
PAIVA, Aparecida e SOARES, Magda (organizadoras). Literatura infantil: políticas e concepções. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008.
POWERS, Alan. Era uma vez uma capa. Tradução: Otacílio Nunes. São Paulo: Cosac Naify, 2008.
SILVA, Aline Luiza da. Trajetória da literatura infantil: da origem histórica e do conceito mercadológico ao caráter pedagógico na atualidade. Revista Eletrônica de Educação do UNIVEM, Marília, v.2-n.2, p.135-149, 2009. Disponível em: ˂http://revista.univem.edu.br/REGRAD/article/view/234˃. Acesso em: 4 mar. 2017.
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O livro-ilustrado e a formação de leitores11
Edilson Alves de Souza12
Soraia Maria da Silva13
Flávio Pereira Camargo14
Introdução
O livro-ilustrado, diferentemente do livro com ilustrações,
coloca em evidência a imagem de maneira que se suprimi, tal como
ocorre em muitos de seus exemplares, a necessidade de um texto
verbal na sua constituição (HUNT, 2010, p. 233). Com o livro-ilustrado,
a literatura adere, de maneira mais sistemática, a indispensabilidade
da imagem para a composição, para a organização e,
consequentemente, para a compreensão do texto literário, durante os
procedimentos de recepção.
11 Este texto está vinculado ao projeto de pesquisa de doutorado “A metaficção e o papel do leitor na Literatura Infantil e Juvenil brasileira contemporânea”, desenvolvido no Programa de Pós-graduação da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás, com bolsa do CNPq, orientado pelo Prof. Dr. Flávio Pereira Camargo 12 Doutorando e Mestre em Letras e Linguística (Estudos Literários), pelo Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás. 13 Especializanda em Literatura Infantil e Juvenil pela Universidade Estadual de Goiás – Campus Pires do Rio. Graduada em Letras Português/Inglês pela Universidade Estadual de Goiás – Campus Pires do Rio. 14 Professor Adjunto de Literatura Brasileira da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás.
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Até então, a imagem era tida como um elemento ornamental
que contribuía para iluminar e esclarecer o texto. Ela não perdeu essa
função, mas, desenvolveu e assumiu outras como aquelas que eram,
quase que exclusivamente, pertencentes à palavra. A palavra cumpria,
desde as percepções aristotélicas, o papel de instrumento principal
para a realização da mímesis. Porém, na contemporaneidade – não
obstante a manifesta adesão e flexão da mímesis a outros parâmetros
(LIMA, 2003; CAGNETI, 2013) –, a imagem tem abandonado seu
espaço secundário/”ilustrativo” e tem admitido novos usos, como o de
“substituição” da palavra, na atividade mimética (ZILBERMAN, 2014,
p. 160).
Do vasto conjunto de expressões literárias, a que mais tem
acolhido, valorizado e sabido utilizar os recursos imagéticos é a
literatura infantil, que, de acordo com Peter Hunt (2010, p. 233) “toma
emprestadas características de todos os gêneros”, mas, que vem
colaborando, significativamente, para a existência de um gênero em
especial: “o livro-ilustrado”. Este, por sua vez, cria novos sistemas de
diálogo entre leitor e o livro literário, estabelecendo e oferecendo
caminhos para que a leitura – em um sentido que extrapole a
decodificação verbal – produza (ou não) algum efeito estético.
Importa destacar que, para ler um livro-ilustrado, não há
necessidade de que o leitor saiba nomenclaturas técnicas, fazer
análises e/ou elaborar críticas sistemáticas sobre a construção da obra
em si. Mas, é importante que ele consiga, autonomamente – como
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acontece com livros que se utilizam apenas da palavra –, assimilar os
signos que são dispostos no livro-ilustrado dentro da organização
proposta pelo autor/ilustrador, criando uma ponte entre o que ele já
conhece e o que desconhece. Isso não quer dizer que o leitor deverá
interpretar de acordo com a intenção do autor/ilustrador – o que pode
ser impossível, dependendo do referente e do contexto de ambos.
Porém, ele precisa conseguir construir significados com o livro lido
dentro de níveis intertextuais que suas experiências de leitor o
permitem (ECO, 2010).
Essa problemática sobre a recepção desse gênero literário põe
em realce a busca por um novo tipo de leitor, que consegue mobilizar
outras formas de conhecimento nos procedimentos de leitura e
interpretação literárias. Nesse sentido, é justa a preocupação com a
formação de leitores competentes e habilidosos capazes de um
contato mais profícuo não apenas com livros que se utilizam do
material textual verbal, mas, também, do imagético. Com vistas para
essa constatação, o presente trabalho busca abordar o livro-ilustrado
com vistas para sua contribuição para a formação do leitor.
A Literatura Infantil e o livro-ilustrado
Além de pertencer à literatura infantil, o livro-ilustrado
compartilha tanto de suas glórias quanto de seus problemas e críticas,
principalmente, por fazer parte do quadro de composições e
produções que recebem o rótulo “infantil” e por ser um tipo de
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expressão literária que foge dos parâmetros de representação
mimética (verbal). Para o compreendermos melhor, é importante
empreendermos sua localização histórica enquanto produto literário
infantil e enquanto gênero.
Nascida em meados do século XVII, sob os auspícios da Era
Moderna, (COELHO, 1991, p. 75), a literatura infantil – da mesma
forma que a infância – é uma invenção recente. A começar pelas
adaptações feitas a partir de obras clássicas, que tiveram um papel
importante e privilegiado no processo de formação e criação de uma
cultura literária direcionada ao público não adulto, o caminho tomado
pelos autores foi, de certa forma, a “infantilização” do literário. Para
se apreender essa realidade, importa destacar que se acreditava “que
a criança fosse um simples homúnculo, cujas diferenças do adulto se
limitassem a tamanho e se reduzissem a aspectos quantitativos”
(CARVALHO, 1983, p. 18, grifo da autora). Porém, sem desconsiderar
as semelhanças e diferenças que, visivelmente, há entre crianças e
adultos, a ciência moderna revolucionou vários âmbitos do
conhecimento (como a educação, a medicina e a psicologia),
apontando que “a infância constitui uma fase especial de evolução e
formação, como as suas implicações específicas e suas complexidades,
em nada comparável com o adulto” (CARVALHO, 1983, p. 18). Nessa
direção, uma gama de produtos sociais diversificados foi ajustada ou
criada em função dessa nova forma ou fase de ser homem.
- 92 -
A literatura, abraçando esses novos pressupostos sobre o
desenvolvimento humano, também trabalhou, direta e indiretamente,
como divulgadora dessa realidade de que a criança é portadora de um
imaginário particular e que, por isso, é preciso considerar que a
“criança é criativa e precisa de matéria-prima sadia, e com beleza, para
organizar seu ‘mundo mágico’, seu universo possível, onde ela é a
dona absoluta” (CARVALHO, 1983, p. 20-21, grifos da autora).
Contudo, as novas formas de produção literárias – a exemplo do que
acontece com as vanguardas – depararam-se com críticas “contentes”,
que aderiram a ideia de um projeto estético voltado à infância, e
“descontentes”, que julgaram essa modalidade literária (e, por vezes,
o leitor, por extensão (HUNT, 2010, p. 119)) como menor, inferior e
decadente (CARVALHO, 1983, p. 21; LAJOLO; ZILBERMAN, 2003, p. 11).
A sobrevivência da literatura infantil durante esses mais de 3 séculos,
o crescente e massivo número de publicações, a migração ou a
alternância de escritores da literatura (dita) adulta para a infantil e o
reconhecimento de autores, por meio de premiações importantes, a
nível internacional, são argumentos suficientes para provar que essa
“inferiorização” engendrada pela parte descontente não tem
fundamento.
Não obstante às críticas, foi em função da figura do “infantil”
que a literatura para crianças surge. Entre os séculos XVII e XIX, com
os escritores Charles Perrault, Jacob Grimm e Wilhelm Grimm (os
Irmãos Grimm) e Hans Christian Andersen, nasce a grande tradição da
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literatura para crianças, que influenciou (e ainda influencia) a
produção literária brasileira, de um modo especial, as narrativas de
fadas (CARVALHO, 1983; COELHO, 1991; LAJOLO; ZILBERMAN, 2003, p.
20-21). O francês Charles Perrault adaptou narrativas populares e
deixou contos como: “Cinderela”, “Barba Azul”, “O Gato de Botas” e
“O Pequeno Polegar”; os alemães Irmãos Grimm, que recolheram
contos da tradição popular alemã e os adaptaram, são responsáveis
por chegar a nós: “Chapeuzinho Vermelho”, “Branca de Neve”, “A Bela
Adormecida” e “João e Maria”; e o dinamarquês Hans Christian
Andersen, sendo o primeiro deles com ficções autorais, trouxe à luz os
contos: “A Pequena Sereia”, “A roupa nova do imperador” e “O
Patinho Feio” (TATAR, 2004).
Segundo Marisa Lajolo e Regina Zilberman (2003, p. 23), se a
literatura infantil na Europa se iniciou quando Charles Perrault
publicou o livro Contos da Mamãe Gansa, em 1697, a “literatura
infantil brasileira só veio a surgir muito tempo depois, quase no século
XX, muito embora ao longo do século XIX reponte, registrada aqui e
ali, a notícia do aparecimento de uma ou outra obra destinada a
crianças”. Durante esse período de tímida expressão, conforme as
autoras, observa-se uma forte presença da literatura estrangeira,
traduzida e adaptada, como histórias infantis (mesmo que,
originalmente, não fossem), formando um conjunto de obras
considerável entre as quais estão Robson Crusoé (1885), Viagens de
Gulliver (1888) e D. Quixote de la Mancha (1901), sem contar as
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narrativas feéricas de Perrault, dos Irmãos Grimm e de Andersen
(LAJOLO; ZILBERMAN, 2003).
Na produção literária nacional, que crescia a passos lentos, em
meados do fim do século XIX e início do XX, entre verso e prosa,
despontam nomes como Júlia Lopes de Almeida, Adelina Lopes Vieira,
Olavo Bilac, Coelho Neto, Manuel Bonfim, Zalina Rolim, João Köpke e
Francisca Júlia – mesmo que ainda baseados em modelos europeus.
Alinhadas a uma retórica pedagógica, moralista e patriótica,
configurando-se, simultaneamente, aos objetivos escolares, as
produções das letras brasileiras aderiram a um projeto ufanista de
nacionalização que esquematizou os primeiros traços da literatura
infantil no Brasil (LAJOLO; ZILBERMAN, 2003; COELHO, 1991).
As “inexpressivas” convenções literárias até aí cultivadas
encontram outro panorama quando culminam em José Bento
Marcondes Monteiro Lobato. Monteiro Lobato, como ficou conhecido,
além de precursor dos conceitos do modernismo brasileiro – antes
mesmo dos realizadores da semana de 22 – (FRANCA, 2007, p. 32), é
considerado idealizador, fundador e pai da literatura infantil no Brasil,
destacando-se por exercer um papel extremamente decisivo que não
se restringe as suas contribuições literárias. Verifica-se isso pelo seu
profundo interesse pela cultura nacional e pela inserção de novos
valores sociais, como a ratificação e o delineamento do que se
compreendia por infância (COELHO, 1991, p. 225-238).
- 95 -
Lobato, aliando criatividade, inteligência e um agudo senso
crítico sobre seu contexto histórico-social, trouxe o impulso que a
literatura para crianças precisava no início do século XX. De 1920 a
1947, conforme a pesquisadora Vanessa Gomes Franca (2007, p. 35-
37), o escritor publica, sistematicamente, um volumoso conjunto de
obras, dentre as quais estão: A menina do narizinho arrebitado (1920),
Fábulas de Narizinho (1921), O pó de pirlimpimpim (1931), As caçadas
de Pedrinho (1933), Emília no país da gramática (1934) Dom Quixote
para crianças (1936), Histórias da Tia Nastácia (1937), O pica-pau
amarelo (1939), Os doze trabalhos de Hércules (1944), entre outras
que legaram a Lobato uma grande projeção. E, como “a aceitação de
seus livros foi ampla e irrestrita” (COELHO, 1991, p. 231), os
personagens lobateanos do Sítio do Pica-Pau Amarelo, como a Emília,
Narizinho (Lúcia), Pedrinho, Visconde de Sabugosa, D. Benta e Tia
Nastácia, tornaram-se a tendência que movimentou a primeira
metade do século XX.
Simultaneamente, Lobato dedicava-se à literatura adulta, à
tradução, à adaptação e à revisão de traduções em uma atividade
quase frenética, que, somada ao seu interesse pela infância brasileira,
mudou o prisma sob o qual se pensava a cultura (literária) para
crianças (FRANCA, 2007). Na esteira de Franca (2007), Coelho (1991,
p. 238, grifos da autora) afirma que “[a] criança, por natureza, precisa
crescer, cumprir seu ciclo vital e cultural”, por meio da adesão a “um
projeto de vida em que se engaje e no qual aplique, de maneira
- 96 -
dinâmica e harmoniosa com o todo, toda a potencialidade de suas
energias vitais. Monteiro Lobato deu-lhe [...] um projeto cultural” que
considera a particularidade dos petizes, “mostrando o valor essencial
da literatura e abrindo à sua frente o mundo maravilhoso da Cultura”.
A partir de Lobato, as imagens passaram a ter uma importância
fundamental na composição das capas dos livros – fato que
revolucionou a tipografia dessa época (FRANCA, 2007, p. 129-130).
Com vistas para a utilização da imagem nos livros direcionados às
crianças, muitos autores atravessaram pelas passagens abertas por
Lobato, o que pode ser constatado pelo aumento no número de
publicações e tipos de livros que ganharam relevo, como os
quadrinhos, que associam imagem e texto de maneira a criar novos
contextos de uso da linguagem (COELHO, 1991, p. 342-252) – que
repercutiram, de alguma forma, na década de 1980, nas narrativas em
quadrinho de Eva Furnari (ZILBERMAN, 2014, p. 167), que usa as
imagens sem a fala. Nas décadas de 1930, 1940 e 1950, por meio de
suplementos e revistas, os quadrinhos se popularizam, o que
contribuiu para alimentar uma literatura aventuresca, policial e
repleta de heroísmo, tanto em traduções como em produções
nacionais (COELHO, 1991, p. 241-246). Apesar dessas inovações, as
letras nacionais, de algum modo, ainda estavam ligadas ao pedantismo
pedagógico (COELHO, 1991, p. 247). É o momento que a
“infantilização” do literário que pretendia atender a necessidade
simbólica da criança sede à “‘infantilização’ da fala” e abandona o
- 97 -
projeto de Lobato, criando uma linguagem superficial, pobre e
medíocre (COELHO, 1991, p. 247, grifo da autora)
Entretanto, observa-se, nas décadas seguintes – entre os anos
de 1960, 1970 e 1980 –, que na literatura infantil, associado a um
conjunto de fatores sociais, políticos, culturais, econômicos,
tecnológicos e educacionais, acontece o conhecido estouro/boom de
criatividade que, além de novos autores e livros, trouxe novos
caminhos de composição literária, como aqueles ligados a visualidade
(LIMA, 2008, p. 36-37). O boom é uma consequência tardia da
revolução modernizadora lobateana, que abriu caminho para a
possibilidade, inclusive, de outras formas de expressão artística
dialogarem com a literatura.
A realidade literária pós-boom instaurada na literatura infantil,
confirmando esse panorama, provocou o surgimento de novas formas
de fazer textos para crianças, que tem reflexos na
contemporaneidade, como se pode observar com a presença de
autores comprometidos “em criar, através da imagem, uma linguagem
narrativa autônoma” (COELHO, 1991, p. 260). As transformações
históricas do livro renovaram conceitos e os produtos desses
conceitos. Por isso, nota-se que se faz “presente o novo estatuto do
visual não só no mundo moderno, como nas representações dele que
se querem modernas” (LAJOLO; ZILBERMAN, 2003, p.14), como é o
caso do livro Flicts (1969), do escritor e ilustrador Ziraldo, no qual,
conforme Regina Zilberman (2014, p. 159), “as imagens, não
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figurativas, não correspondem a um ornamento do texto,
complementando as informações escritas; pelo contrário, as cores é
que falam”.
Destarte, levando em conta as novas concepções de ilustração
derivadas dessas mudanças histórico-literárias, verifica-se também o
surgimento de livros que usam a imagem como meio (principal) de
realizar a mímesis: os livros-ilustrados. Helen Denise Danares Lemos
(2010, p. 314-215) confirma tal tendência ao apontar que “a partir dos
anos 60, [...] surgiu o picturebook” que deu vasão a novas
configurações da literário no que diz respeito ao texto e à imagem. A
imagem nos livros-ilustrados não se comporta apenas como um
“elemento a mais para reforçar a história e a atração que o livro pode
exercer sobre os pequenos leitores” (LAJOLO; ZILBERMAN, 2003, p.
13), mas, sim, como recurso autônomo.
Esse tipo livresco evidencia a imagem, uma das mais antigas
manifestações estéticas da humanidade, como assevera, Graça Lima
(2008, p. 37, grifos nossos):
A experiência visual é fundamental para que possamos compreender o ambiente humano e a ele reagir; a informação visual é um dos mais antigos registros da história humana. As pinturas das cavernas representam o relato intencional mais antigo que se preservou o mundo tal como ele podia ser visto cerca de trinta mil anos atrás.
- 99 -
As complexas relações estabelecidas entre o homem e a
imagem, dos “primórdios” à contemporaneidade, respeitam as
sensibilidades que advêm da expressão imagística e os formatos e
suportes que admitem ao longo da história, como aqueles registrados
na literatura (LEMOS, 2010). Assim, a imagem, na modalidade literária
do livro-ilustrado, é usada como elemento fundamental para sua
constituição por ser ela um tipo de “linguagem específica e
heterogênea” (ROLLA, 2004, p. 119) que abriga não apenas um
conjunto de conceitos, mas, também, escolhas de representação que
demandam uma visão atenta as suas peculiaridades no processo de
leitura e interpretação.
Diante das tendências contemporâneas da literatura infantil,
na classificação de Coelho (2000, p. 161, grifos da autora), a
singularidade dos livros-ilustrados os enquadra na “linha de narrativa
por imagens”, uma vez que são “[l]ivros que contam histórias através
da linguagem visual, de imagens que ‘falam’ (desenhos, pinturas,
ilustrações, fotos, modelagem ou colagem fotografadas, etc.)”. Com
vistas para essas particularidades do livro-ilustrado, é importante
destacar alguns dos seus elementos constituintes mais comuns.
Um elemento que contribui para a composição do livro-
ilustrado é o formato do livro. Os formatos (se mais retangulares, se
mais quadrados, ou se outra forma não convencional) e as orientações
da leitura deles advindas (se horizontal, se vertical, ou uma direção
não convencional), mostram que a parte física dialoga com o conteúdo
- 100 -
expresso. Determinado o formato, no livro (ilustrado, ou não), os tipos
de papel, de acordo com o material de que são feitos, a textura e a
consistência podem ser usados para gerar um conjunto de sensações
(como a aspereza) que confirmam a mensagem do enredo. Com a
modernidade da publicação de livros, ambos os aspectos
mencionados, formato e papel, estão estreitamente aliados à
produção de efeitos gráficos e tipográficos no anseio de reforçar a
história ou provocar alguma impressão (proposital) no leitor.
Somando-se a esse conjunto, o tipo de imagem está ligado ao
tipo de mensagem que se quer passar, uma vez que ela é o recurso
principal utilizado para esse fim. A tipologia da imagem se refere ao
estilo das ilustrações, que ora é muito característico, imprimindo uma
marca que pode ser realista, fantasiosa, caricaturesca (Caricatura),
cartunizada (Cartoon) entre outras, ora pode exigir uma personalidade
eclética e versátil, mesclando vários estilos. O tipo de imagem, isto é,
seu estilo, vai determinar o traço, a forma, as tonalidades das corres e
a iluminação das ilustrações que corroboram o enredo. Isso fica claro,
principalmente, quando se busca representar aspectos de uma época
ou imitar um estilo de Arte vigente em certo tempo da história da
humanidade (LEMOS, 2010, p. 308).
A pretensa intenção inicial do autor/ilustrador que compõe ou
dispõe as imagens no livro-ilustrado, além de considerar os fatores
citados acima, leva em conta a posição e a ordem das imagens para a
composição de efeitos, visto estes dois elementos constituírem o
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“traço condutor” do leitor na atividade hermenêutica. Por outro lado,
as imagens podem ser dispostas e deixar o leitor “traçar”, ao seu
próprio gosto, a ordenação dos “fatos” “ditos” pelas imagens. Nessa
direção, tanto o leitor como a imagem gozam de uma autonomia que
promove uma experiência estética distinta daquela em que “tudo” –
até mesmo as reações diante da leitura – é previsto.
Denota-se, a partir dessas breves descrições acerca do gênero
livro-ilustrado, a complexidade de sua composição e como as outras
formas de linguagem possuem um potencial pouco explorado dentro
da comunicação literária. “Os recursos não verbais têm sido um dos
motores de mudança da literatura infantil moderna” (COLOMER, 2003,
p. 316) e, mesmo assim, o livro de imagens, ou livro-ilustrado, ainda
partilha da crítica negativista feita à literatura infantil.
Celia Berridge (apud HUNT, 2010, p. 233) destaca que “o
verdadeiro motivo dos livros-ilustrados obterem tratamento tão
sintético nas resenhas não é por serem considerados deficientes a
partir de uma avaliação séria, mas por serem todos considerados a
parte menos importante do universo do livro”. Talvez, seja esse mais
um reflexo da “marginalidade da [literatura] infantil” (LAJOLO;
ZILBERMAN, 2003, p. 11) que precisa ser superada na
contemporaneidade. Assim, é reafirmada a ausência de cuidado com
a qual os livros infantis e o livro-ilustrado são tratados – o que justifica
a presente pesquisa, não apenas como uma resposta, mas, como uma
busca de preenchimento (ainda que não suficiente) da lacuna aberta
- 102 -
pela (falta de) crítica. O intuito é discutir se o livro-ilustrado pode
contribuir para a formação de leitores, assunto que ocupa, de maneira
mais detida, os próximos tópicos desse trabalho.
A formação de leitores
A formação de leitores tem sido uma temática bastante
discutida e, por isso, tem se tornado uma tendência teorias e práticas
de leitura se multiplicarem numerosamente (COENGA, 2010, p. 13-14;
COSTA, 2015, p. 153-154). Porém, contrariamente a isso, ainda é
comum o leitor mal formado, desmotivado e sem competências para
se engajar em letramentos diferentes ou para avançar no processo de
(auto) formação. Essa situação crítica instala uma “crise” que é reflexo
de um duplo dilema e que, evidentemente, perpassa a incapacidade
de comunicação e recepção contemporânea: ou a prática e a teoria,
ao invés de se coadunarem e se complementarem em bons resultados,
estão se anulando, ou ambas não conseguem corresponder às novas
demandas de leitura.
Pelo quantitativo de reflexões sobre o tema da leitura
(COENGA, 2010, p. 13-14; COSTA, 2015, p. 153-154), parece ser
evidente que essa “situação crítica”, a priori, não é derivada de uma
falta de informação sobre os benefícios da leitura literária. Mesmo não
tendo, muitas vezes, uma finalidade prática, a literatura influi na
formação cultural; nos posicionamentos críticos que o homem
assume; no desenvolvimento da imaginação; na sensibilidade; na
- 103 -
educação da subjetividade; e ainda alimenta uma consciência
diferente sobre as relações sociais. Como destaca Ângelo Monteiro,
em seu ensaio “As diversas funções da arte na educação humana”,
“[d]e Nietzsche a Platão [...], o círculo da realidade encontra sua
justificação na arte tomada como centro, pois pela arte – e este é seu
alcance mais pedagógico, e a maior das paidéias – redime-se
continuamente a realidade” (2004, p. 216). Além dos aspectos
mencionados, há outros que ainda não podem ser medidos de
imediato (como a formação do caráter).
Estar ciente dos benefícios (consequências) da leitura é um
passo para buscar compreender os métodos para alcançá-los. É
especulando os métodos que se apreende seus princípios orientadores
(suas causas). Sobre os princípios das práticas leitoras na atualidade,
estão os programas governamentais, os projetos independentes de
promoção da leitura e os eventos culturais e científicos, que têm
promovido um “adestramento” para leitura, como se o indivíduo,
“forçosamente”, devesse adequar-se a um padrão social de “hábito”
de leitura. Essa concepção de leitura e de leitor está mais próximo de
um “claustro”, que tende a provocar apenas um sentimento de
inadequação, quando, na verdade, deveria resultar na liberdade (de
escolha e de pensamento). Nesse sentido, verifica-se que a raiz da
“crise” não está exatamente nas práticas, mas na concepção de leitura
e leitor que tem orientado (“inocentemente”) essas práticas. Assim
- 104 -
sendo, é preciso mudar esse conceito, essa orientação reguladora, e
investir no ato autônomo da leitura.
É preciso que o leitor se interesse. Com isso, não se pretende
certa simpatia com a ingenuidade de pensar que o processo formativo
precisa cair na malha do lúdico, abrangendo a ideia (equivocada) que
tudo tem de ser divertido, acessível ou atraente. Nem todas as leituras,
ou nem todas as etapas da leitura, são agradáveis ou sedutoras.
Porém, é importante que seja desafiante e instigante para que o leitor
não apenas seja cativado, mas consiga atribuir sentido ao lido. Ou,
mesmo que a leitura não seja cativante, mas que tenha pelo menos
sentido. Isso deve ocorrer sob a ação crítica do próprio leitor.
Na tentativa de desarticular esse “adestramento”, é
indispensável valorizar o poder educativo e formativo das
diversificadas experiências de leituras que, longe das tendências
metodológicas pedagogizantes escolares (pois, ainda, em muito, se
confunde a formação de leitores com a leitura escolarizada), são
acessíveis a qualquer ambiente educacional. A formação de leitores
precisa transcender o âmbito das instituições (escolares) que impõem
e controlam o ato de ler, o livro e, por fim, o próprio leitor. Nesse
sentido, compreende-se que promotores de leitura que não possuem
habilidades para “manusear” a riqueza simbólica da arte literária
correm o risco de cair “na armadilha de transformar o universo
imaginário e os poderes de sedução de uma boa história em um texto
de aprendizagem formal e comportamental” (COSTA, 2015, p. 159).
- 105 -
Essa “armadilha” reflete a, ainda atual, tendência pragmática
na utilização do texto literário de maneira que o desfigura enquanto
tal (BRASIL, 1997, p. 30) e que faz, consequentemente, fenecer a
experiência estética que ele pode (ria) promover diante do ato da
leitura. Há a necessidade de buscar formas de diálogo com outros
“leitores experientes” (BRASIL, 1997, p. 41) e passar por “mares” que
a formação de leitores ainda não teve a ousadia de atravessar – como
a insegurança de explorar um gênero literário novo (como o livro-
ilustrado, por exemplo) ou a própria experiência de vida/leitura do
aluno. Todavia, independente do caminho adotado para a promoção
da leitura, o que importa é orientar a prática de forma a engajar o
leitor no processo, despertando-o para assumir sua responsabilidade
(e não obrigação) de ser protagonista na cognição. O caminho precisa
ser o que proporciona a liberdade em que o leitor é impelido a
participar do jogo simbólico, que é próprio dos textos literários,
transitando (bem) entre a realidade que vive e a realidade que lê.
Em outras palavras, é preciso compreender que a interlocução
entre a obra e o leitor não é estática. O leitor se movimenta diante do
texto e se mobiliza. “A leitura só se torna um prazer no momento em
que nossa produtividade entra em jogo, ou seja, quando os textos nos
oferecem a possiblidade de exercer as nossas capacidades” (ROLLA,
2004, p. 114). Essa concepção é prevista em documentos oficiais da
educação (e precisa sair da atmosfera discursiva), como se observa no
PCN de Língua Portuguesa (1997, p. 41, grifos nossos): “A leitura é um
- 106 -
processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção do
significado”. Assim, quando teoria e prática se coadunarem e
tornarem um auxílio na formação (e não na determinação) do leitor,
atuarão, também, de maneira mais humanizadora e despertarão no
homem uma visão mais crítica sobre si mesmo e sobre o mundo.
Por isso, a seleção de obras deve ser orientada por esse anseio
de autonomia leitora. A escolha do material literário, usualmente,
baseia-se em uma imposição do cânone, que, muitas vezes, ignora a
capacidade simbólica de outras produções. Não se trata, aqui, de
negar os clássicos (ou a importância deles), mas de uma preocupação
de alimentar o gosto pela leitura de textos literários, respeitando o
caráter processual e diversificado da formação do leitor. O livro-
ilustrado é uma forma de expressão artístico-literária que permite essa
flexibilidade e que, ao mesmo tempo, é um misto equilibrado de lúdico
e desafio, no qual a recepção é ativa, pois convoca o leitor a participar
do processo de significação. À vista disso, propõe-se, neste trabalho, o
uso desse gênero livresco para a formação do leitor.
O livro-ilustrado e a formação de leitores
As relações entre o texto-imagem e o leitor, além de uma
compreensão mais ampla do texto literário, põe em relevo a
emergência da investigação por uma nova concepção de leitura. O
livro-ilustrado que, na maior parte de seus exemplares, suplanta a
presença da linguagem verbal, auxilia na concretização dessa busca, o
- 107 -
que coincide com o comparecimento da imagem como objeto de
leitura com uma linguagem mais acessível para leitores crianças e
adultos. A imagem, como elemento do texto literário, propõe uma
dinâmica diferente e subtrai a restrição da atividade de leitura como
ação prevista para acontecer apenas com palavras. Ela mostra que a
leitura começa com a percepção das coisas e não apenas com o
reconhecimento verbal.
Diante disso e do que pode oferecer o livro-ilustrado, a obra
Ida e volta, de Juarez Machado, por exemplo, considerado por Franca
(2007, p. 155) como o “nosso primeiro livro de imagem”, demostra a
sensibilidade que permeia a atividade interpretativa da imagem. Sem
o auxílio de palavras, no referido livro, a ilustração de pegadas (Figura
1), situadas em diferentes ambientes (cômodos de casa (como
banheiro, copa e sala), rua, lojas, etc.), conta o trajeto diário de uma
pessoa e forma o enredo do livro. De maneira ousada, Juarez Machado
dota a imagem de uma autonomia com a qual ela conduz a narrativa
e, a cada página, ao leitor é solicitado o engajamento de sua
experiência lógico-imagética. Assim, verifica-se que “[n]ão se trata
simplesmente de extrair informação da escrita, decodificando-a letra
por letra, palavra por palavra”, mas, sim, “de uma atividade que
implica, necessariamente, compreensão na qual os sentidos começam
a ser constituídos antes da leitura propriamente dita” (BRASIL, 1997,
p. 41).
- 108 -
Figura 1 – Capa e páginas do livro Ida e volta, de Juarez
Machado.
Fonte: https://pt.slideshare.net/CamilaRibeiro35/ida-e-volta
Nessa direção, mesmo que, evidente e convencionalmente, em
dada situação a linguagem “alfabetizada” seja privilegiada, não seria
infeliz considerar pertinente o que Paulo Freire (1989, p. 9, grifos
nossos) diz sobre o ato de ler ao afirmar que ele “não se esgota na
decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas que
se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do mundo
precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não
possa prescindir da continuidade da leitura daquele”. Freire (1989)
chama a atenção para um elemento fundamental para a formação de
leitores que faz compreender a imagem (e o livro-ilustrado) enquanto
item importante nesse processo: a leitura do mundo.
A leitura do mundo é a busca por captar, entender, interpretar
e significar o que está no mundo. Essa atividade proporciona um
conjunto de experiências que levaram o homem a apreender (/ler?) as
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realidades que são dispostas a cada ser humano diante de seus
contextos social, econômico, político e cultural. “A leitura do mundo”,
como se percebe, “precede a leitura da palavra” e esse aspecto
evidencia que se vê/lê o mundo, como ele é, antes de lê-lo em
palavras. Isto é, antes da experiência verbal, há a experiência com a
imagem. Desse modo, pode-se afirmar que o livro-ilustrado é a
oportunidade de realizar a atividade de leitura do mundo dentro de
um “sistema” literário. Se a leitura do mundo se configura como uma
experiência “base” no processo de formação de leitores, compreende-
se, portanto, que trabalhar com os livros-ilustrados é contribuir para a
efetivação bem-sucedida desse processo.
Coelho (2000, p. 161, grifos a autora), usando uma metáfora
próxima a de Freire, destaca que a narrativa por imagens promove um
“[p]rocesso lúdico de leitura que, na mente infantil, une os dois
mundos em que ela precisa aprender a viver: o mundo real concreto à
sua volta e o mundo da linguagem, no qual o real-concreto precisa ser
nomeado para existir definitivamente e reconhecido por todos”. Desse
modo, o leitor é inserido em um complexo universo em que os códigos
literários se encontram com os códigos da vivência em um processo de
trocas e empréstimos semânticos. No caso do leitor mais experiente,
o contato com o livro-ilustrado pode também proporcionar um
contraste, quase instantâneo, entre formas de expressão literárias,
realizando o “[...] exercício de reconhecimento das singularidades e
das propriedades compositivas que matizam um tipo particular de
- 110 -
escrita” (BRASIL, 1997, p. 30). Tal peculiaridade evidencia a formação
crítica que pode ser proporcionada pelo uso do livro-ilustrado, o que é
animador diante de um cotidiano em que “a ilustração tem
conquistado espaço e funções sempre mais dinâmicas em relação à
linguagem verbal, nos permitindo novas formas de comunicação e de
expressão, felizmente, mais comuns a cada dia” (LEMOS, 2010, p. 316,
grifos nossos).
Essas “novas formas de comunicação” exigem do leitor novas
demandas hermenêuticas ou oferecem um contexto, criticamente,
novo. Por exemplo, no caso da capacidade intertextual e analógica,
que é exercitada no ato da leitura e é renovada diante do novo
ambiente textual-imagético, espera-se que o leitor identifique
“elementos implícitos; que estabeleça relações entre o texto que lê e
outros textos já lidos; que saiba que vários sentidos podem ser
atribuídos a um texto; que consiga justificar e validar a sua leitura a
partir da localização de elementos discursivos”; e que, também, “com
as diferentes formas de leitura em função de diferentes objetivos e
gêneros”, leia “buscando as informações relevantes, ou o significado
implícito nas entrelinhas, ou dados para a solução de um problema”
(BRASIL, 1997, p. 41, grifos nossos).
É importante observar que as configurações genéricas da
modalidade de texto lida podem indicar um caminho para a
compreensão de como a leitura deve ser feita. Por vezes, certos livros-
ilustrados podem estabelecer uma dinâmica que exige uma forma
- 111 -
própria de recepção – como no caso de Ida e volta, de Juarez Machado,
em que se precisa seguir as pegadas ilustradas para construir a
narrativa. Assim, o “leitor competente” vai “utilizar estratégias de
leitura adequada para abordá-los de forma a atender a essa
necessidade” (BRASIL, 1997, p. 41) e o não tão competente é,
gradualmente, inserido, sem desrespeitar seu nível de leitura e a
capacidade polifônica do texto. Por isso, é importante a figura do
mediador preparado. O educador que conduz o momento de leitura
deve ter a cautela de equilibrar a atividade interpretativa,
contribuindo para a percepção e a construção do significado do texto
literário, sem ser coercivo. Isso é compreender a polissemia do texto
que se revela ao somar as experiências individuais aos horizontes de
expectativa do leitor. Na literatura, de modo particular no livro-
ilustrado, como destaca Angela da Rocha Rolla (2004, p. 115), a
“interpretação não é pessoal nem arbitrária, apesar de depender do
sujeito leitor. Não está tampouco previamente dada, podendo ser
atualizada em cada momento histórico, diferenciando-se do momento
de sua criação e das intenções de seu autor”.
Na leitura, as experiências se imbricam em prol do
desenvolvimento do leitor. Mas, na leitura do livro-ilustrado verifica-
se que ele é mais autônomo e pode criar “seus próprios movimentos”
(ROLLA, 2004, p. 115). Destarte, com o livro-ilustrado, a leitura ganha
um novo status. Agora, ela se trata
- 112 -
de uma situação na qual é necessário que o aluno ponha em jogo tudo que sabe para descobrir o que não sabe, portanto, uma situação de aprendizagem. Essa circunstância requer do aluno uma atividade reflexiva que, por sua vez, favorece a evolução de suas estratégias de resolução das questões apresentadas pelos textos (BRASIL, 1997, p. 42).
A leitura, compreendida na direção apresentada pelos PCN,
confirma que a função pedagógica da imagem na formação das
crianças (e também de adultos) sai da atmosfera da inocência
informativa e incorpora uma atitude mais reflexiva e crítica que
refletirá no leitor em formação. A liberdade que dá voz às imagens faz
destas pontes para a emancipação do leitor.
Considerações finais
Diante do exposto, percebe-se que a imagem, além de ser
utilizada na literatura infantil e juvenil como ferramenta
enriquecedora, lúdica e criativa, isto é, como elemento (acessório) de
composição, tornou-se uma via pela qual o leitor é levado a assumir
um novo papel, haja vista que a literatura contemporânea trouxe
novas perspectivas sobre como se fazer narrativas e os efeitos que elas
podem produzir. Esse novo status desvela a imagem não apenas como
um adorno ou complemento, mas, como portadora de uma série de
elementos constitutivos que ditam sua capacidade de provocar
- 113 -
percepção, interpretação e significado diante dos procedimentos de
recepção.
“Muitas pessoas ainda acreditam que a ilustração serve apenas
para embelezar um livro, para mostrar como são os heróis ou os vilões
na história, ou ainda para facilitar a leitura à criança” (FRANCA, 2007,
p. 142). Contudo, a discussão tecida neste trabalho sobre como o livro-
ilustrado contribui para a formação do leitor contraria essa maneira de
ver a imagem bem como deixa margem para se compreender a
literatura contemporânea (que é bastante diversa e complexa) como
elemento (indispensável?) para o processo de formação do homem
moderno. O livro-ilustrado, a exemplo dos clássicos, responde,
esteticamente, a sua época, apresentando caminhos diferentes de
pensar a experiência com a literatura, as formas de representação
artística do homem e do mundo e a formação educativa da sociedade.
Não obstante a relevância dos clássicos e de outras literaturas
mais comuns nas prateleiras das casas e bibliotecas, é importante que
as novas relações entre literatura e imagem, advindas do livro-
ilustrado, estejam à disposição dos leitores, pois, aquele dialoga
melhor com as experiências destes. Por isso, não pode ser visto apenas
como estimulo à leitura, mas, sim, como um produto estético que tem
autonomia, que tem voz, que corresponde, coerentemente, com as
demandas de leitura atuais e que compreende seu leitor, uma vez que,
dele, exige um novo comportamento ao passo que também o forma.
- 114 -
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Estética da Recepção e a leitura da narrativa
clássica e de versões contemporâneas de
“Chapeuzinho Vermelho”
Alexandre Leidens15
Fabiano Tadeu Grazioli16
Introdução
Os estudos literários constituem vertentes variadas, as quais
possuem concepções distintas que se valeram, em tempos mais
remotos, da vida dos autores, dos aspectos que dizem respeito à
construção da obra, ou de aspectos que correspondem à sua
leitura/recepção pelo público de diversas épocas (entre outros
aspectos que podem constituir um campo de estudo em torno da obra
literária). Essas diferentes correntes podem levar o objeto literário a
ser visto de forma histórica ou estática. Na contemporaneidade,
vivemos um momento em que um mesmo texto pode possibilitar
várias leituras, gerar inúmeras discussões e subsidiar a argumentação
15 Mestrando em Letras no Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus de Pato Branco/PR (UTFPR). Orientador de atividades: Letramento, no SESC de Francisco Beltrão/PR. 16 Doutorando em Letras na Universidade de Passo Fundo/RS (UPF). Mestre em Letras pela mesma universidade. Professor do Departamento de Linguística, Letras e Artes da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI), Campus de Erechim/RS e da Faculdade Anglicana de Erechim/RS.
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de pontos de vista diferentes. O texto aberto faz com que caiba mais
ao leitor do que ao texto as responsabilidades pela leitura.
É justamente esse o aspecto refletido pela Estética da
Recepção. A recepção de um texto é tão complexa quanto distantes
estão as realidades do próprio texto e do leitor. Sendo assim, essa
frente de trabalho observa a formação do leitor a partir das leituras
que ele faz; e não apenas isso: também a partir das reflexões e do
entendimento que o leitor adquire durante a leitura e como a
recepção desse texto atua sobre ele, como o transforma e o prepara
para novas inserções em leituras desconhecidas e mais desafiadoras.
Para isso, a Estética da Recepção dispõe do Método
Recepcional, criado por Maria da Glória Bordini e Vera Teixeira de
Aguiar (1993), que aproxima a teoria da prática pedagógica. As autoras
desenvolvem uma sequência didático-metodológica bastante sólida
em que conseguem, de fato, chegar aos resultados pretendidos e
supostos pela teoria durante as aulas de literatura.
Neste artigo, faremos uma análise introdutória à Estética da
Recepção, tecendo algumas considerações e nos baseando nos
pressupostos de Hans Robert Jauss (1979; 1994) e Wolfgang Iser
(1979). Na sequência, trabalharemos com o Método Recepcional,
observando todas as etapas propostas por Bordini e Aguiar (1993) e,
por fim, proporemos uma atividade dentro dessa metodologia,
subsidiando-nos na leitura do conto “Chapeuzinho Vermelho”, uma
tradução de Tatiana Belinky para o texto do Irmãos Grimm; na versão
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do conto no formato de um poema, “Seu Lobo”, de Sérgio Capparelli,
e na versão “Uma Chapeuzinho Vermelho”, da escritora e ilustradora
francesa Marjolaine Leray. Assim sendo, os objetivos desse trabalho
são elucidar brevemente alguns aspectos teóricos da Estética da
Recepção e propor, sob as concepções dessa teoria e do Método
Recepcional, uma sequência didático-metodológica tematizada no
conto “Chapeuzinho Vermelho” e em duas releituras contemporâneas
da história.
Estética da Recepção: algumas considerações
A Estética da Recepção se transformou, a partir de 1966, em
uma teoria de comunicação literária. Nos próximos parágrafos,
apresentamos alguns de seus aspectos teóricos a partir dos estudos de
Jauss e Iser, que estabeleceram os princípios para o novo modelo de
interação entre leitor e obra que emergia naquela época e que
continuam a ter importância na atualidade, a ponto de tais teorias
abrirem espaço a diversos estudos que tematizam a leitura literária.
A literatura e a arte em geral proporcionam prazer ao leitor ou
ao público. Essa afirmação pode parecer supérflua e desnecessária
frente às inúmeras fontes de pesquisa ligadas à literatura. Entretanto,
em alguns momentos, quando se fala em teoria da literatura ou em
metodologias para o ensino da literatura, tem-se esquecido que a
ligação primordial e mais tênue entre leitor e texto se dá pelo prazer,
pelo deleite ou ainda pelo gosto ou elo que tem um com o outro. Esse
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prazer é naturalmente diverso e complexo e age ou é recebido em
vários níveis, dependendo do seu apelo e de outras variáveis possíveis,
que se ligam mais ao leitor do que à obra, podendo ir da simples
reflexão e compreensão às lágrimas. Não apenas por isso, mas
também reconhecendo a parcela exercida pelo prazer na recepção de
produções literárias ou artísticas, a experiência estética se mostra
bastante aberta e imponente. Essa experiência, que se liga
naturalmente ao prazer – embora não apenas a ele – é elementar para
a função formativa da arte. O leitor, enquanto usa a liberdade que
possui no que concerne à tomada de posição frente ao objeto estético,
pode ter prazer tanto no objeto estético quanto em si mesmo, e esse
prazer é, por vezes, superior, inclusive, ao encontrado por ele em sua
vida privada.
Na conduta estética, o sujeito sempre goza mais do que de si mesmo: experimenta-se na apropriação de uma experiência do sentido do mundo, ao qual explora tanto por sua própria atividade produtora, quanto pela integração da experiência alheia e que, ademais, é passível de ser confirmado pela anuência de terceiros. (JAUSS, 1979, p. 77).
O prazer estético, apesar de desprezado por alguns, é iminente
e aparece não quando há uma convergência entre o que pensa o leitor
e o que apresenta o texto, mas sobretudo, quando o texto é uma
tragédia. Desde Aristóteles e, posteriormente, com a psicanálise
(JAUSS, 1979), especulou-se que à tragédia cabe uma maior atenção
- 121 -
do sujeito receptor, de forma a se tornar perceptível que o ser humano
se sinta mais tocado por temas dessa natureza do que pelo contrário.
De fato, aparentam ser humanizadores a tragédia, a comoção e o
fracasso, além de proporcionarem uma profunda experiência ao ser
humano.
O prazer estético não é de fácil recepção nem de rasa absorção
pelo homem e, sobretudo, se distingue e afasta de outros simples
prazeres, tendo como pressuposto básico um leitor atento e ativo,
capaz de perceber as nuances do texto e converter, de fato, o texto
em objeto estético. “Enquanto o eu se satisfaz no prazer elementar, e
este, enquanto dura, é autossuficiente e sem relação com a vida
restante, o prazer estético exige um momento adicional, ou seja, uma
tomada de posição, que exclui a existência do objeto e, deste modo, o
converte em objeto estético”. (JAUSS, 1979, p. 75).
Ainda que o conceito de beleza seja uma perspectiva relativa,
mutável e divergente, pode-se afirmar que é na e pela tragédia,
sobretudo, que são desenvolvidas, recebidas, concebidas e criadas as
obras de arte mais impactantes e marcantes, sendo elas consideradas
em um primeiro momento “belas” ou não. A beleza, no entanto, é
constituída no imaginário do receptor e não está disposta na própria
obra, como uma característica evidente, é um conceito que existe
apenas para ele e não é carregado naturalmente pelo objeto estético,
mesmo podendo determinar o prazer sentido pelo leitor.
Acompanhando Jauss (1979), o imaginário não é belo por si, mas é
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necessário para que haja o conceito de beleza na realidade do objeto
estético.
O imaginário do leitor é modificado e modifica o texto literário
toda vez que entra em contato com ele. No ato da leitura, o sujeito é
acometido de tal forma pela trama, pelos acontecimentos ali
expressos que vive, sente e os percebe como se sofresse realmente as
consequências daquilo e é, grosso modo, isso o que acontece. Vive o
outro por si mesmo em segurança, mas sem evadir-se do seu efeito. O
leitor, dessa forma, abandona a vida real por aqueles breves
momentos para então viver plenamente a literatura, como explica
Jauss, a partir de Freud:
O expectador no teatro ou o leitor de romances pode gozar-se como uma figura importante e se entregar de peito aberto a emoções normalmente recalcadas, pois o seu prazer tem por pressuposto a ilusão estética, ou seja, o alívio da dor pela segurança de que, em primeiro lugar, trata-se de um outro que age e sofre, na cena, e, em segundo lugar, de que se trata apenas de um jogo, que não pode causar dano algum à nossa segurança pessoal. Desse modo, o prazer estético da identificação possibilita participarmos de experiências alheias, coisa de que, em nossa realidade cotidiana, não nos julgaríamos capazes. (JAUSS, 1979, p. 78, grifo do autor).
A experiência estética tem uma função comunicativa de
conhecimento comum entre todas as teorias que se ligam ao prazer
estético e aflora na vida do leitor a partir de três experiências,
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consideradas “categorias” por Jauss (1979): Poiesis; Aisthesis e
Katharsis. A Poiesis é o prazer sentido pelo sujeito perante a sua
própria obra. É por ela que o indivíduo se usa da criação artística e se
satisfaz de sua necessidade geral de sentir-se parte do mundo,
retirando dele o que concebe como estranheza e tornando-a sua
própria obra. É, portanto, o prazer de sentir-se coautor da obra. A
Aisthesis é o prazer estético sentido na recepção da obra. Ela é a
recepção prazerosa do objeto estético em visão intensificada sem
nenhum conceito ou no processo de estranhamento como observação
renovada. Já a Katharsis conduz o ouvinte ou receptor à reflexão, leva-
o a repensar suas convicções e crenças e, de maneira geral, está ligada
ao propósito básico das artes como função social, ela liberta o
expectador do seu cotidiano e lhe dá a capacidade de julgar através do
prazer de si e do outro. Jauss (1979, p. 81, grifo do autor) alude às três
categorias afirmando que
[…] a conduta de prazer estético, que é ao mesmo tempo liberação de e liberação para realiza-se por meio de três funções: para a consciência produtora, pela criação do mundo como sua própria obra (poiesis); para a consciência receptora, pela possibilidade de renovar a sua percepção, tanto na realidade externa, quanto da interna (aisthesis); e, por fim, para que a experiência subjetiva se transforme em intersubjetiva, pela anuência ao juízo exigido pela obra, ou pela identificação com normas de ação predeterminadas e a serem explicitadas.
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Poiesis, Aisthesis e Katharsis não constituem uma hierarquia,
embora possam ser vistas como uma sequência; cada uma delas
carrega funções autônomas, sem que haja subordinação de uma à
outra. A função comunicativa não é obrigatoriamente medida pela
função catártica na experiência estética. Ela pode provir da aisthesis
se o observador em sua percepção compreende as informações como
determinantes do mundo do outro, ou ainda se apropriando de uma
norma de ação. No entanto, a atividade da aisthesis pode se converter
também em poiesis. De fato, não há uma subordinação, mas sim uma
relação possível e necessária entre as três funções.
A função comunicativa não é possível sem que haja interação
entre leitor e obra. “Como atividade comandada pelo texto, a leitura
une o processamento do texto ao efeito sobre o leitor. Esta influência
recíproca é descrita como interação”, afirma Iser (1979, p. 83), que
enxerga a leitura e a interação como um processo ativo completo, pois
vai da primeira leitura até o efeito que ela causa sobre o leitor. Ou seja,
ultrapassa o ato da leitura e chega no seu resultado e influência.
A interação, no entanto, é bastante vasta e já discutida na
psicologia social e na psicanálise. Há uma imprevisibilidade latente e
dominante na interação, isso pode se converter em condição precípua
e constitutiva ou ainda diferencial do processo de interação dos
parceiros. A teoria da interação tipifica os modos de interações
humanas de acordo com suas contingências. Divide-os em quatro
grupos, baseando-se em planos de conduta: a) a pseudocontingência,
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que domina o plano de conduta tão bem que sabe as reações e
respostas do outro, acabando por fazer desaparecer a contingência; b)
a contingência assimétrica, que acontece quando o primeiro sujeito
deixa o seu plano de conduta de lado e segue o do outro, adaptando-
se a ele; c) a contingência reativa, que se dá pela contingência em
reação dominante em um momento específico, impedindo a
expressão dos planos de conduta; d) a contingência recíproca, que
propicia a orientação pelo seu próprio plano de conduta, como
modificá-lo de acordo com as reações momentâneas do parceiro.
A interação acaba por submeter os planos de conduta dos
parceiros a testes de situação que não são esperados por nenhum
deles. Essa fase demonstra a sua fragilidade ou maleabilidade e
provoca uma reorganização das estratégias de comportamento ou
uma modificação dos planos de conduta dos parceiros. Quando há a
mudança dos planos de conduta, a contingência se transforma em um
dos tipos de interação. A contingência nasce da interação e é sua
propulsora (ISER, 1979). Por um lado, é a interação, então, uma
constante reorganização das estratégias de comportamento do
sujeito. Não se pode, por outro lado, aplicar à obra literária toda a
tipificação elencada pela teoria da interação, justamente pelo leitor
não estar diretamente ligado em situação face a face com seu
interlocutor. Nessas situações, a cada interstício ou incerteza, o
participante pode interromper para que volte ao controle da
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conjuntura. Na obra literária, o leitor não detém esse poder e não tem
a confirmação de que suas hipóteses sobre a leitura estão corretas.
No caso da interação entre texto e leitor, “[...] são os vazios, a
assimetria fundamental entre texto e leitor, que originam a
comunicação no processo da leitura”. (ISER, 1979, p. 88). Nessa forma
de interação, os vazios são formados por haver um desequilíbrio na
assimetria entre o texto e o leitor. Esse desequilíbrio dado pelos vazios
no texto só encontrará uma solução, um novo equilíbrio, com o seu
preenchimento. Assim, o processo se complexifica, uma vez que o
preenchimento de todos os vazios do texto é improvável e até
indesejável, mantendo sempre questões em aberto. Essa dificuldade é
crescente e, em determinado momento, obrigará o leitor a abandonar
algumas representações, corrigindo-as, e nesse ponto cria-se o
horizonte de referências da situação. A correção das representações
criadas pelo leitor com base nos vazios do texto é o que fará o leitor
capaz de experimentar o que não se encontrava em seu horizonte no
momento anterior à leitura.
O processo de comunicação assim se realiza não através de um código, mas sim através da dialética movida e regulada pelo que se mostra e se cala. O que se cala, impulsiona o ato de constituição, ao mesmo tempo que este estímulo para a produtividade é controlado pelo que foi dito, que muda, de sua parte, quando se revela o que fora calado. (ISER, 1979, p. 90).
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A constituição da comunicação é bastante complexa, o leitor
deve ficar atento não só ao que está escrito na obra literária e
encontrar meios para conseguir a compreensão e a interação de uma
forma eficaz e profícua, observando, também, o que lá não está
escrito. A inexistência de um signo caracteriza, por si, um determinado
signo, sua expressão dentro da obra é que pode variar.
A perspectiva dos vazios permite afirmar que o texto é um
sistema que exige combinações e pelos vazios é que são elas sugeridas,
de forma que são oferecidos para a ocupação do leitor. Os vazios,
trabalhando dessa forma, servem como um comutador na interação
do texto com o leitor, mas, para isso, o texto vale-se também das
negações que, em conjunto com os vazios, contribuem para o processo
de comunicação. “Através dos vazios do texto e das negações nele
contidas, a atividade de constituição decorrente da assimetria entre
texto e leitor adquire uma estrutura determinada, que controla o
processo de interação”. (ISER, 1979, p. 91-92).
Em uma análise semelhante, como expõe Iser (1979), Ingarden,
refere-se aos vazios como pontos de indeterminação. Primeiramente,
parte do quadro de referências fenomenológico, trabalhando com
objetos reais, que são universalmente determinados, e objetos ideais,
que são os objetos autônomos. A obra de arte, por sua vez, é um
objeto intencional, ao qual falta determinação. As sentenças de um
texto funcionam como uma orientação que, ao serem lidas, fazem uma
produção esquemática. Essa formação esquemática forma inúmeros
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pontos de indeterminação que não conseguem ser eliminados de
forma alguma em uma obra literária finita, mesmo que durante a obra,
alguns desses pontos possam ser preenchidos e temporariamente
suprimidos. Os pontos de indeterminação tornam o objeto intencional
aberto e, de certo modo, impossível de ser fechado. A determinação
da obra acontece na sua concretização, todavia, toda e qualquer
concretização é questionável e sujeita a adequações.
É natural que a variedade de aspectos abordados no texto
provoque a necessidade de determinação que, por sua vez, aumenta
os elementos indeterminados. Entretanto, há um limite para a
indeterminação, pois seu crescimento em demasia pode extrapolar o
caráter polifônico da obra de arte ou nem deixar que ela exista.
Mesmo sendo de difícil definição, os valores estéticos e as qualidades
metafísicas da obra literária orientam a norma da concretização, que
pode ser correta ou não, pode ter sucesso ou fracassar. As qualidades
metafísicas são, até certo ponto, percebidas empaticamente pelo
leitor durante o ato da leitura e, delineadas com os valores estéticos,
constituem a assimetria entre o texto e o leitor, que garante a
concretização da obra.
Os estudos de Ingarden, aproveitados por Iser (1979) afirmam
que a primeira fase da experiência estética durante a leitura se dá na
intranquilidade interna, que caracteriza a emoção original. A empatia
e a emoção motivam a conexão entre texto e leitor e isso produz o
objeto estético harmoniosamente. A concretização é dada pela
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emoção, sob a qual são subordinados os pontos de indeterminação.
Nem todos os pontos de indeterminação, no entanto, devem ser
preenchidos forçosamente durante a leitura, de modo que é natural
que alguns sejam esquecidos, negligenciados ou permaneçam abertos.
Eles são fundamentais na constituição do objeto artístico e podem
alterar o valor estético de determinada obra. Além disso, acontece
uma ilusão de totalidade durante a leitura, na concretização da obra.
“O alcance e a significação dos pontos de indeterminação varia de
acordo com a sua função: aparecem como pertinentes em relação ao
objeto intencional; tendem a se tornar confusos e incontroláveis em
relação à recepção daquele objeto”. (ISER, 1979, p. 99).
Uma vez transposta por Ingarden a perspectiva da singela
representação da vida pela arte, é importante ressaltar que o texto
ficcional tem uma função não na comparação com a realidade, mas na
mediação de uma realidade organizada por ela. A ficção desnorteia
toda e qualquer tentativa de julgamento com base no real; em
contrapartida, dá pistas e sugere caminhos para a sua própria
realidade.
Como estrutura de comunicação, não é idêntica nem com a realidade a que se refere, nem com o repertório de disposições de seu possível receptor, pois virtualiza tanto a forma de interpretação dominante da realidade, com que cria seu repertório, quanto o repertório das normas e valores de seu possível receptor. A não identidade da ficção com o mundo, assim como da ficção com
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o receptor é a condição constitutiva de seu caráter de comunicação. (ISER, 1979, p. 105).
A indeterminação é a condição para uma comunicação do texto
com o leitor e dela derivam os vazios. Os vazios demonstram a
necessidade de combinação e preenchimento do texto, que, por sua
vez, exige inter-relações. É preciso, para isso, um leitor ativo e que
reflita constantemente sobre o que está lendo e sobre as suposições
que mantém na forma de descoberta. Não raramente, faz parte das
atribuições desse leitor encontrar erros, possibilidades infinitas ou
inúmeros motivos para repensar e reformular todo o preenchimento
de vazios e interpretação feita durante a leitura. O leitor é levado ao
questionamento sobre a obra e sobre a sua própria tarefa e isso só é
possível por intermédio dos vazios e dos pontos de indeterminação
elencados por ela. “Se os vazios dos textos ficcionais os orientam
contra o pano de fundo da linguagem pragmática, contribuindo para a
desautomatização das expectativas habituais do leitor, então este
precisa reformular para si o texto formulado, a fim de ser capaz de
recebê-lo”. (ISER, 1979, p. 109).
Os vazios rompem a esquematização simples e a sua própria
conectabilidade, de maneira que provocam uma atividade responsiva
e compositiva do leitor, que é obrigado a combinar esquemas
opositivos, chegando a uma contraposição frente à sua expectativa
inicial. A importância estética do vazio aparece sobretudo nesse
processo, uma vez que a quebra na expectativa inicial do leitor é
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fundamental para a criação de uma imagem que, grosso modo, se
atualiza ou, durante a leitura, é esquecida em prol de outra. Desse
modo, dos vazios são criadas imagens de primeiro e segundo graus:
estas são sempre geradas quando as expectativas iniciais para aquelas
não são realizadas. Há uma colisão entre a primeira e a segunda
imagem durante a leitura; embora aparentem se distinguir
completamente, há uma grande liberdade na formação da imagem no
objeto imaginário. “A colisão impede a degradação do conhecimento,
pois este processo não conclui, mas sim obriga ao leitor abandonar a
imagem e construir uma outra. Ele próprio põe em movimento uma
interação de suas imagens, interação que é articulada pelo texto”.
(ISER, 1979, p. 113-114).
O processo de colisão designa ao leitor uma tarefa bastante
pertinente na leitura. Além de obrigá-lo a repensar o que planejara ou
o que supunha, tem de duvidar de si próprio, se permitir errar e recriar
o espaço imaginário que pensara anteriormente. “Como o vazio é
estruturado pela sequência de posições no fluxo temporal da leitura,
o ponto de vista do leitor não pode proceder arbitrariamente; a
posição tematicamente vazia sempre age como o ângulo a partir do
qual se realiza uma interpretação seletiva”. (ISER, 1979, p. 130). Dessa
forma, o vazio provoca operações estruturadas no leitor, que se
orienta e até modifica sua percepção do texto a partir dos vazios e das
imagens provenientes deles.
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Toda a concepção de colisão, de subsequências de imagens, de
interação do texto com o leitor e de prazer perante a obra de arte é
subsídio para a perspectiva da Estética da Recepção quando tem em
vista o horizonte de expectativas do leitor. Todo leitor, por mais
diferente que seja, está condicionado a desenvolver determinadas
crenças e a estabelecer – por si só ou por intermédio alheio, pelo meio
de onde provém e por outras variáveis – um determinado horizonte
histórico, do qual se subtrai o seu horizonte de expectativas, que, por
sua vez, se aplicará na leitura de qualquer obra literária. Como já
explicitado anteriormente, o leitor busca um texto pressupostamente
por motivos individuais e emocionais e, no ato de ler, estabelece uma
interação com o texto, relação que permeia toda a leitura. A interação
é desenvolvida a partir de vazios e de pontos de indeterminações
regados pelo texto e sobre os quais o leitor criará imagens que,
durante a leitura – com base nas suposições e interpretações do
próprio leitor –, confrontar-se-ão; dessa colisão, novas imagens
deverão surgir, sobrepondo e ultrapassando as possibilidades e
perspectivas que o leitor tomara para si. Sendo assim, o sujeito que
esperava certo tipo de leitura, com uma trama desenvolvida em
consonância com suas crenças e perspectivas, é surpreendido,
sobretudo pelo fato de a obra ir além desse ponto, apresentando a
contrariedade ou outras formas de visão de determinados temas, além
de repentinas reflexões que o texto lhe propõe.
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Na hipótese de um texto não apresentar nenhuma quebra das
pressuposições do leitor e ir ao encontro de todas as suas crenças e
perspectivas, sem fazer com que ele questione ou se defronte com
nada novo durante a leitura, terminará o seu horizonte de expectativas
da mesma forma com que começou a leitura. Não sofrerá mutação e
nenhum alargamento. O leitor manterá sua postura e não somará ao
seu horizonte de expectativas nenhuma reflexão, nem sequer a
confrontação de posições com as quais convive ou acredita. Uma obra
dessa natureza não apresenta nenhum valor estético, pois o que o
determina é a forma com que a obra é recebida.
O horizonte de expectativas de uma obra, que assim se pode reconstruir, torna possível determinar seu caráter artístico a partir do modo e do grau segundo o qual ela produz seu efeito sobre um suposto público. Denominando-se distância estética aquela que medeia entre o horizonte de expectativas preexistente e a aparição de uma obra nova – cuja acolhida, dando-se por intermédio da negação de experiências conhecidas ou da conscientização de outras, jamais expressas, pode ter por consequência uma “mudança de horizonte” –, tal distância estética deixa-se objetivar historicamente no espectro das reações do público e do juízo da crítica (sucesso espontâneo, rejeição ou choque, casos isolados de aprovação, compreensão gradual ou tardia). (JAUSS, 1994, p. 31, grifo do autor).
A cada vez que o sujeito tem o seu sistema de crenças
confrontado de qualquer forma pela obra de arte, o seu horizonte de
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expectativas sofrerá rompimento e alargamento, estará ele, então,
pronto para novas experiências, para novas leituras e novos desafios.
O horizonte de expectativas é aumentado prioritariamente com a
frustração das expectativas do leitor. Esse é o momento mais
importante da recepção da obra literária, não só pela colisão entre o
pensamento do leitor e o sugerido pela obra, mas por ser a frustração
um agente preparador para novas experiências. As reflexões causadas
pela leitura no confronto entre o horizonte do leitor com o
apresentado pela obra são fundamentais para um crescimento não só
intelectual, mas também social e humano do mesmo, pois “[...] a
experiência literária do leitor adentra o horizonte de expectativas de
sua vida prática, pré-formando seu entendimento do mundo e, assim,
retroagindo sobre seu comportamento social”. (JAUSS, 1994, p. 50).
Observa-se não só a realização desse processo de alargamento do
horizonte de expectativas, mas sobretudo a sua necessidade na
construção de um leitor mais atento, mais preparado para a recepção
de novas obras e de complexidade crescente, que caminha pelos
vários campos da literatura com destreza, pronto e capaz de interagir
com todos eles. Em relação à obra literária, mais valor terá quanto
mais conseguir o alargamento do horizonte de expectativas do leitor.
É deste entremeio que, em oposição, surge a ideia de uma obra
conformadora, aquela que não abala o conhecimento do leitor, e de
uma obra capaz de fazê-lo, considerada, por isso, emancipatória.
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O Método Recepcional
Com base na Estética da Recepção, Bordini e Aguiar (1993)
criaram um método de ensino de literatura. As autoras afirmam que o
processo de recepção é iniciado necessariamente antes do contato do
leitor com o texto, de modo que ele já carrega um horizonte de
expectativas construído previamente e, na leitura, busca, com esse
horizonte, fazer a ligação da sua experiência anterior com a leitura que
está realizando. Para isso, o indivíduo se utiliza de um campo de
referências variado, que são os caminhos por onde conversam e
interagem leitor e obra.
Segundo Zilberman (1982), esse quadro de referências pode
existir em vários aspectos, como social, quando faz alusão à hierarquia
do ser humano na sociedade; intelectual, quando a visão de mundo do
leitor e da obra são compatíveis, dependendo de sua educação formal;
ideológica, que se liga aos valores vigentes na sociedade naquele
momento e dos quais não consegue o leitor se desvencilhar;
linguística, tendo como base a linguagem utilizada, seguindo ou não a
norma padrão e também relacionando-se com a sua educação formal
e com o espaço social no qual está inserido; literário, que abarca todas
as leituras já realizadas e as preferências artísticas vigentes no
momento. Além desses, Bordini e Aguiar (1993) sugerem os fatores de
ordem afetiva, que podem provocar adesões ou rejeições aos
anteriores, independentemente de quais sejam.
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Os valores e as expectativas do leitor podem se identificar ou
se estranhar com os descritos acima, que são apresentados de uma
forma ou outra no texto. A comunicação inicial do leitor com o texto
se dá por esse meio, pela confirmação ou contradição do apresentado
pelo texto, tendo por base o sistema de valores do leitor.
Nesse meio, o Método Recepcional de ensino de literatura
compara o familiar com o novo, o conhecido e esperado com o
desconhecido e surpreendente. Na medida em que avança, expande
também o horizonte de expectativas do leitor, encadeando-se obras
cada vez mais complexas que referenciam determinados temas,
previamente selecionados, e que proporcionarão ao leitor uma
capacidade cada vez mais producente e eficaz de fazer reflexões não
apenas sobre essa temática, mas também sobre muitas outras que
venham a surgir. A metodologia terá seus objetivos alcançados na
medida em que os estudantes sejam capazes de efetuar as leituras de
um modo compreensivo e crítico, receberem adequadamente novos
textos e outras leituras, questionarem as leituras com base no seu
próprio horizonte de expectativas e, por fim, expandirem o seu
horizonte de expectativas. A transformação e alargamento do
horizonte de expectativas do leitor se dará principalmente pelo
estranhamento, de maneira a romper com as expectativas iniciais do
leitor e, de certo modo, surpreendê-lo. Da análise dessa surpresa, do
seu entendimento e reflexão e da possibilidade de compreensão de
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todo esse processo é que se transforma o horizonte de expectativas
do indivíduo.
A transformação do horizonte de expectativas, no caso de um estudante, alvo primeiro do Método Recepcional de ensino de literatura, depende, pois, da operacionalização de alguns conceitos básicos: receptividade, disponibilidade de aceitação do novo, do diferente, do inusitado; concretização, atualização das potencialidades do texto em termos de vivência imaginativa; ruptura, ação ocasionada pelo distanciamento crítico de seu próprio horizonte cultural, diante das propostas novas que a obra suscita; questionamento, revisão de usos, necessidades, interesses, ideias, comportamentos; assimilação, percepção e adoção de novos sentidos integrados ao universo vivencial do indivíduo. (AGUIAR; BORDINI, 1993, p. 88, grifo das autoras).
Sendo assim, o Método Recepcional detém uma
sistematicidade determinante. A primeira etapa é o estabelecimento
do horizonte de expectativas do estudante ou da classe. Para isso, o
professor pode se usar de constatações anteriores sobre quaisquer
meios válidos, como leituras anteriores, conversas, observação do
comportamento, discussões e respostas, entre outras. Nessa etapa,
serão conservadas as crenças e os valores mantidos pelos estudantes.
A segunda etapa, uma vez determinados os horizontes de expectativas
dos estudantes, satisfaz esses horizontes, com obras que colaboram e
reiteram o sistema de valores dos estudantes, apenas. Além disso, as
atividades propostas posteriormente podem seguir uma trajetória já
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dominada por todos. A terceira etapa do método é a ruptura do
horizonte de expectativas dos estudantes. Para isso, o professor
escolherá textos que se assemelham aos anteriores em algum aspecto,
mas que divergem em outros e que pressuponham uma maior
exigência na leitura. Haverá uma ruptura entre o esperado e o
apresentado ao leitor. A próxima etapa é o questionamento do
horizonte de expectativas. Essa etapa coloca em debate os dois níveis
apresentados pelas obras, a primeira e a segunda leitura são
comparadas e propulsionam a reflexão sobre o comportamento dos
estudantes durante a leitura, seus desafios e sua superação, o
processo pelo qual passaram na leitura dos dois textos em sequência
na forma de uma autorreflexão ou até autocrítica. Como término, a
quinta etapa é o momento da ampliação dos horizontes de
expectativas dos estudantes. Da auto-observação no ato da leitura, os
estudantes percebem que a sua capacidade de decifrar o que não é
conhecido ou o que contradiz o seu sistema de valores foi aumentada
com essa prática, tomam consciência sobre a necessidade de buscar
textos cada vez mais desafiadores e complexos.
A aplicação do Método Recepcional não é única e não termina
com a quinta etapa; é importante a ciência de que “o final desta etapa
é o início de uma nova aplicação do método, que evolui em espiral,
sempre permitindo aos alunos uma postura mais consciente com
relação à literatura e à vida”. (BORDINI; AGUIAR, 1993, p. 91).
Ademais, o método não indica previamente um momento ideal para
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seu uso, mas sugere, ao contrário, uma utilização contínua,
independentemente da faixa etária ou nível escolar. Atenta-se, ainda,
que não necessariamente o método deva se manter aos meios
escolares, pode ele também ser seguido por leitores comuns de fora
da escola em seus processos e descobertas literárias.
Sugestão de aplicação do Método Recepcional
Seguindo as orientações e as etapas já observadas e sugeridas
pelas autoras, proporemos uma aplicação do Método Recepcional
com base no tema “Chapeuzinho Vermelho”, sem determinar o
momento a ser executada, tampouco a seriação ideal para a
realização, pois são as possibilidades com o Método Recepcional
maleáveis e passíveis de aplicação em variados níveis. Caberá, então,
ao professor regente dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, ao
professor de Língua Portuguesa, no caso dos Anos Finais do Ensino
Fundamental, ou de Literatura, no caso do Ensino Médio, a seleção do
momento ideal para a inserção da sequência didática em sua turma. É
importante que leitores de menor idade convivam mais tempo com a
versão primeira que vamos apresentar na sequência didática, sendo
um momento especial a apresentação das outras versões do conto,
pois com elas se diluirão as visões tradicionais que os leitores possuem
dos personagens Lobo e Chapeuzinho Vermelho. Por isso o momento
de desenvolver a sequência didática precisa ser bem planejado.
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A primeira etapa do método é a determinação do horizonte de
expectativas do estudante. Nesse momento, para que haja, de fato,
algo em comum no que se refere às leituras dos estudantes dentro
dessa temática, valendo-se, ainda, das vivências anteriores, será
entregue aos alunos a versão do conto “Chapeuzinho Vermelho”
registrada pelos Irmãos Grimm. A versão do conto em questão é
conhecida e bastante disseminada entre os leitores de várias idades.
Os leitores participantes da atividade provavelmente convivem com
essa versão desde muito cedo. O momento que ora propomos é
importante para que todos os alunos retomem a história a partir de
uma tradução confiável, que mantém todos os elementos simbólicos
do texto. Sugerimos, para a atividade, a tradução de Tatiana Belinky
(Paulus, 2011). Os alunos devem fazer uma leitura silenciosa e, em
seguida, em conjunto e em voz alta, momento em que todos poderão
repensar e sanar as possíveis dúvidas que venham a surgir durante a
leitura. Nesse momento, todos os estudantes estarão em um nível
muito parecido de leitura e com um conhecimento semelhante da
história. Provavelmente, não haverá nenhuma novidade, pois a versão
dos Irmãos Grimm é mais conhecida até que a registrada por Charles
Perrault, anterior à dos alemães. Assim, dar-se-á a determinação do
horizonte de expectativas dos estudantes.
Uma vez que, com a leitura do conto original dos Irmãos
Grimm, o horizonte de expectativas dos estudantes já foi
contemplado, nesta nova etapa, tal horizonte começa a ser alterado a
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partir de uma leitura que exigirá um pouco mais dos leitores. O
professor entregará o texto “Seu Lobo”, de Sérgio Capparelli, que será
lido em um primeiro momento em silêncio e, na sequência, em voz
alta e em grupo, de maneira a tirar as eventuais dúvidas e
questionamentos. O texto, que é um poema que conserva um diálogo
entre a Chapeuzinho Vermelho e o Lobo, em uma série de dísticos não
rimados, pode ser lido considerando a entonação de cada personagem
na configuração do diálogo. Tal procedimento pode ser explorado até
que todos os alunos passem pela experiência de ler o texto fazendo
um dos personagens. Este texto apresenta uma releitura do conto
original em uma forma resumida: Chapeuzinho pede para o Lobo sobre
suas características, como olhos, pernas, braços, patas e nariz; por fim,
quando questiona sobre sua boca, o Lobo, aparentemente cansado de
tantas perguntas e pouco interessado sobre as mesmas, muito
distante ainda de desejar devorá-la, responde: “Ah, deixa de ser
enjoada, Chapeuzinho!” (CAPPARELLI, 2008, p. 19), tentando
desvencilhar-se dela. Evidenciam-se, assim, as diferenças com o conto
original, modificando suas características, formas de agir e sua função
na história. A mudança de rota na narrativa, do ataque esperado para
a inércia, é o que causa o maior espanto no leitor e, também, o que
modifica, em um primeiro momento, o seu horizonte de expectativas.
Esse texto, se observado perante o primeiro, trabalha com uma
distinção até certo ponto comum, mantém-se apenas no diálogo entre
Lobo e Chapeuzinho, permanecendo no momento de maior tensão
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daquela narrativa: a conversa que antecede o ataque do Lobo. O leitor
que já conhece a primeira trama, a dos Irmãos Grimm, tem, em sua
mente, um esquema formado que contém as ações dos personagens
e o rumo que a história toma. Essa estrutura norteia a perspectiva de
recepção do texto pelo leitor que, no entanto, não é cumprida nessa
segunda obra. Essa quebra inesperada das expectativas do leitor na
história por meio de outro rumo da trama é o que o faz repensar não
só o texto com o qual acaba de ter contato, mas também o texto que
lera anteriormente. Os pontos de indeterminação do texto que antes
eram tidos como fechados, certos e até imutáveis pelo leitor são,
agora, modificados em uma ordem maior ou menor, ou até
esquecidos. Isso reabre a possibilidade de reflexão do leitor sobre a
história, sobre as formas com que são colocadas e narradas as
informações e sobre a sua leitura, seu entendimento, sua recepção e
sua reflexão sobre o texto. Grande parte do que já era tido como
determinado pela leitura primeira, agora volta a ser indeterminado ou
modificado para que outros pontos possam ser fechados, podendo,
ainda, permanecerem como estão ou desaparecerem. Nesse texto, de
fato, a indeterminação causada pela surpresa e pela quebra nas
expectativas iniciais do leitor são o que tornam o texto aberto e não
conformador. O leitor não sabe até que ponto tem certeza sobre a
leitura que está realizando; não obstante, obtém consigo a evidência
de que dialoga com um determinado texto, nesse caso, o conto dos
Irmãos Grimm, que já lera. Neste passo, quanto maior for o diálogo,
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tanto maior serão a abertura no horizonte de expectativas do
estudante e sua consciência como leitor. Nesse ínterim, os
questionamentos e reflexões causados pela leitura são bastante
importantes, quanto mais forem os estudantes instigados a pensar e
questionar o conto original realocando e revendo as possibilidades de
ação dos personagens, mais interessante e proveitosa será a leitura.
A seguir, para a concretização da terceira etapa do método –
que é a ruptura do horizonte de expectativas–, o professor
apresentará um novo texto. Essa leitura será “Uma Chapeuzinho
Vermelho”, de Marjolaine Leray, e ocorrerá em sala de aula da mesma
maneira, primeiramente de uma forma silenciosa e, em seguida, em
grupo e preferivelmente com debate. A análise dar-se-á com base na
trama, que é mais surpreendente e instigadora do que as duas
anteriores. Nessa obra, Chapeuzinho Vermelho é levada pelo Lobo
para uma mesa e se nega a ser comida por ele, dizendo que ele está
com mau hálito. Posteriormente, dá a ele uma bala que o faz morrer
envenenado. Chapeuzinho termina a trama rindo da ingenuidade do
Lobo, afirmando que ele é um “tolinho” (2012, s.p.). Essa obra é
bastante inovadora, inclusive no que tange à ilustração, com traços
fortes e apenas em duas cores, preto e vermelho, contrastando com
as ilustrações tradicionais encontradas na edição do conto utilizada no
início da sequência didática. A ilustração do livro de Leray sugere uma
Chapeuzinho desinibida, sem medo e até invasiva, e um Lobo grande,
assustador, mas ingênuo, que se deixa levar pela pequena
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personagem. Há um recurso ousado também no que se refere ao texto
no livro da autora francesa. Não temos a presença de travessões no
texto, o que colabora para se distinguir quem fala em cada momento
da história, além do contexto das cenas, é o fato de o texto do Lobo
ser escrito com a cor preta e o da Chapeuzinho com a cor vermelha,
como podemos perceber na Figura 1.
Figura 1 – Reprodução de trecho da obra “Uma Chapeuzinho Vermelho”. Fonte: Leray, 2012.
Nos utilizamos da reprodução das duas páginas também para
demonstrar que a fonte da letra utilizada no livro é cursiva e lembra a
escrita das crianças. Os desenhos também lembram criações infantis.
Há uma sintonia entre desenhos, textos e o uso do preto e do
vermelho nas falas de cada personagem, e o resultado é uma obra que
equilibra os recursos citados no intuito de construir um livro com
projeto gráfico arrojado. É importante registrar que esta versão do
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conto está em um nível máximo de subversão em relação ao texto
original, pois os leitores, que no início da sequência didática se
depararam com um lobo cruel, agora percebem essa mesma
característica na Chapeuzinho Vermelho. E o Lobo perde sua astúcia e
é enganado pela menina, que, aqui, é esperta e não apresenta a
ingenuidade da personagem da versão do conto registrada pelos
Irmãos Grimm. Pelo contrário, ela precisa agir com astúcia máxima
para não ser, desta vez, a vítima da história. Na primeira leitura, os
estudantes criam inevitavelmente um esquema por meio dos pontos
de indeterminação do texto, que tem sua estrutura quebrada no
segundo. O leitor é levado a questionar a sua construção,
interpretação e reflexão tanto na primeira quanto na segunda obra.
Quando realiza a leitura de Leray (2012), a estrutura criada
anteriormente sofre um baque muito maior, surpreendendo o leitor e
levando-o a analisar as novas atitudes dos personagens em uma trama
que aturde a sua expectativa. Nesta obra, estão Chapeuzinho e Lobo
em uma situação que se assemelha com a perspectiva da narrativa já
conhecida. Chapeuzinho, nesse texto, também está a ir para a casa da
Vovozinha e o Lobo também quer devorá-la, os dois mantém um
diálogo de certa forma parecido com o que insere a tensão anterior ao
ataque do Lobo no conto original. O restante do enredo é bastante
aberto e inesperado, como a colocação de Chapeuzinho em uma mesa
e a conversa com maneiras um tanto quanto desajeitadas do Lobo
(sugeridas até mesmo pelas ilustrações), assim como a astúcia de
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Chapeuzinho para matá-lo. Todos esses aspectos são determinantes
para a recepção da obra e abalam as expectativas iniciais do leitor,
abrem as possibilidades de reflexão para um patamar maior e relegam
aos leitores o preenchimento dos vazios e das indeterminações da
obra, mesmo sendo isso, até certo ponto, involuntário. Cabe ressaltar
que tal característica não pode ser atribuída ao trabalho norteado pela
aula de literatura e ocorrido a partir de uma análise contrastiva entre
o conto original dos Irmãos Grimm e as releituras apresentadas na
sequência.
A quarta etapa é o questionamento do horizonte de
expectativas. A partir desse momento, o professor fará com que os
estudantes analisem as leituras realizadas até então, comparando-as
e contrastando-as. O estudante repensará suas leituras e as observará
de forma diferente, em um panorama mais amplo, entendendo as
igualdades e diferenças entre as obras, além de refletir sobre o seu
comportamento durante a leitura e suas reações na possível quebra
de suas perspectivas iniciais.
Após, os estudantes chegarão à quinta etapa: a ampliação do
horizonte de expectativas. Eles perceberão o processo pelo qual
passaram, não apenas observando as leituras em si, mas como
evoluíram a partir das leituras em sequência instigadas pelo professor.
Deverão ver como seus horizontes de expectativas foram ampliados
com as leituras e como deverão, ainda, ampliar-se com o desenvolver
das futuras leituras. A auto-observação e a percepção das
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consequências do processo de ruptura e aumento do horizonte de
expectativas são tão necessárias para a finalização do trabalho quanto
a leitura e a reflexão a partir das obras.
Conclusão
Ao ensino de literatura cabe um papel fundamental na
formação do leitor, não apenas na faixa etária em que se começa a
estudar a matéria Literatura, previamente constituída na escola, mas
também antes, na leitura ainda na infância, quando a literatura e o
fantástico são tão reais e importantes. A formação do ser humano
perpassa obrigatoriamente pela formação do leitor. De fato, a
literatura humaniza, sobretudo quando desconstrói o esperado e
constituído e trabalha diretamente com o novo: com novas
perspectivas e desafios, novas tramas e dificuldades, novas formas de
ver o mundo e novos questionamentos sobre o texto, sobre o autor ou
inclusive sobre o leitor, novas reflexões sobre o tema, sobre a escrita,
sobre a forma de leitura e suas consequências, bem como sobre as
inúmeras possibilidades de leitura.
A Estética da Recepção dá subsídios para que haja um
crescimento na capacidade leitora, reflexiva e humana dos estudantes.
Com o Método Recepcional, no entanto, são apresentadas
possibilidades mais concretas para que isso aconteça. Passo a passo,
Bordini e Aguiar (1993) trazem uma sequência didático-metodológica
que, de certa forma, supre a necessidade que havia de se aplicar os
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princípios da Estética da Recepção nas aulas de literatura e no
processo de formação de leitores empreendido pela escola.
Dessa forma, compete aos professores e pesquisadores
oferecer algumas possibilidades e propostas didático-metodológicas
baseadas e adequadas ao Método Recepcional com diferentes
temáticas, como a que apresentamos aqui, para que o método em
questão tenha um alcance cada vez maior.
É de fundamental importância que os leitores que passam pelo
sistema escolar reconheçam as histórias clássicas como “Chapeuzinho
Vermelho”, dos Irmãos Grimm (ou, no caso de alguns leitores,
conheçam a versão dos alemães), e convivam com seus elementos
simbólicos, responsáveis pela constituição de sua subjetividade, como
sugerem os psicanalistas. Mas é importante também que esses
mesmos leitores conheçam as releituras que foram sendo elaboradas
ao longo das últimas décadas. No caso de algum leitor conhecer uma
versão contemporânea da história de Chapeuzinho Vermelho antes
das versões clássicas, o que é não é difícil de acontecer – temos no
cinema infantil, por exemplo, versões contemporâneas do conto,
como “Deu a louca na Chapeuzinho” (Hoodwinked, 2005), animação
dirigida por Cory Edwards –, torna-se fundamental apresentar a esse
leitor uma versão clássica da história, como a dos Irmãos Grimm, para
que ele tenha parâmetros para perceber em que medida os autores
contemporâneos foram retrabalhando a história, a ponto de termos
um lobo que se farta das perguntas da menina e desiste de atacá-la,
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como na versão de Capparelli (2008), ou então uma Chapeuzinho
Vermelho que, posta em perigo, reage, engana o Lobo e trama a sua
morte, como na versão de Leray (2012).
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Referências
AGUIAR, Vera Teixeira de; BORDINI, Maria da Glória. Literatura: a formação do leitor: alternativas metodológicas. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993.
CAPPARELLI, Sérgio. 111 poemas para crianças. Porto Alegre: L&PM, 2008.
GRIMM, Irmãos. Chapeuzinho Vermelho. (Tradução de Tatiana Belinky). São Paulo: Paulus, 2011.
ISER, Wolfgang. A interação do texto com o leitor. In.: JAUSS, Hans Robert. (et al.). A literatura e o leitor: textos de estética da recepção. (Tradução de Luiz Costa Lima). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
JAUSS, Hans Robert. O prazer estético e as experiências fundamentais da Poiesis, Aisthesis e Katharsis. In.: ______. A literatura e o leitor: textos de estética da recepção. (Tradução de Luiz Costa Lima). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
______. A história da literatura como provocação à teoria literária. (Tradução de Sérgio Tellaroli). São Paulo: Ática, 1994.
LERAY, Marjolaine. Uma Chapeuzinho Vermelho. (Tradução de Júlia Mortiz Schwarcz). São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2012.
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Sobre os Autores
Adriana Rodrigues Gonçalves http://lattes.cnpq.br/3764763726430897 Mestranda em Estudos de Linguagens pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, onde também se bacharelou em Letras Tecnologias de Edição. É também Licenciada em Português pelo Programa Especial de Formação Pedagógica de Docentes do CEFET-MG. Alexandre Leidens http://lattes.cnpq.br/6727112596101206 Mestrando em Letras, pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná, campus de Pato Branco. Graduado em Letras - Língua Portuguesa pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões. Foi bolsista dos projetos de extensão - O Ensino de Gramática: muito além do conceito e O ensino de gramática reflexiva. Durante a graduação, também, atuou como bolsista do PIBID (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência). Edilson Alves de Souza http://lattes.cnpq.br/7172652832929346 Graduado em Letras Português/Inglês pela Universidade Estadual de Goiás (UEG) - Campus Campos Belos; Especialista em Metodologia do Ensino de Língua Inglesa pelo Centro Universitário Barão de Mauá; Mestre e Doutorando em Letras e Linguística (Estudo Literários) pela Universidade Federal de Goiás (UFG) - Campus Goiânia. Atualmente, é docente UEG (Campus de Campos Belos), atuando na graduação, no Curso de Letras, e na pós-graduação lato sensu, nos cursos Literatura Infantil e Juvenil: práticas de leitura e ensino (UEG - Campus Pires do Rio) e Linguagens, letramento e cibercultura na educação básica. (UEG (Campus Campos Belos). Também faz parte do Grupo de Estudo e Pesquisa em Literaturas de Língua Portuguesa/GEPELLP. Em seus estudos acadêmicos, tem atuado na área de Literatura e Teoria Literária, dando ênfase nos seguintes temas: Bestiário Medieval e Sete Pecados Capitais; literatura infantil/juvenil; narrativas feéricas; Relações mitológicas nos contos de Marina Colasanti; e Metaficção. Fabiano Tadeu Grazioli http://lattes.cnpq.br/6013536493561767 Doutorando em Letras na Universidade de Passo Fundo. Possui Mestrado em Letras - Estudos Literários cursado na mesma instituição, Especialização em
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Metodologia do Ensino de Literatura pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões e Graduação em Letras - Português / Espanhol e respectivas Literaturas pela mesma universidade. É Professor da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões e da Faculdade Anglicana de Erechim. Desenvolve projetos sobre os temas Leitura, Literatura e Teatro junto a prefeituras e instituições por intermédio da Dueto Produções Culturais e Artísticas Ltda., produtora cultural da qual é sócio-proprietário. Coordenou o segmento de Literatura Infantojuvenil da Habilis Press Editora por cinco anos. Tem experiência na área de Letras, com ênfase no ensino de literatura, atuando principalmente nos seguintes temas: literatura infantojuvenil, leitura, formação do leitor e dramaturgia. Contemplado com a Bolsa FUNARTE de Produção Crítica sobre Conteúdos Artísticos em Mídias Digitais/Internet - Edição 2009, a partir da qual desenvolveu a pesquisa "Leitura e fruição na tela: um olhar crítico em direção à ciberpoesia". Contemplado com a Bolsa FUNARTE de Circulação Literária - Edição 2010, com a qual desenvolveu o projeto "Leitura dramática: revelando a dramaturgia brasileira para jovens leitores e suas comunidades". Contemplado com a Bolsa Biblioteca Nacional/FUNARTE de Circulação Literária - Edição 2012, a partir da qual desenvolveu o projeto "Dramaturgia e jovens leitores: encontros necessários nos territórios da cidadania". Flávio Pereira Camargo http://lattes.cnpq.br/5015485726957185 Flávio Pereira Camargo é professor adjunto de Literatura Brasileira da Faculdade de Letras, da Universidade Federal de Goiás, com atuação na Graduação e no Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística. Suas pesquisas se concentram em estudos sobre a narrativa brasileira contemporânea, atuando principalmente nos seguintes temas: narrativa metaficcional, literatura e homoerotismo, literatura e experiência urbana, representação e autorrepresentação de grupos marginalizados na literatura. Organizou vários livros sobre literatura brasileira contemporânea e sobre literatura e homoerotismo, além de ter inúmeros artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais. É líder do Grupo de Pesquisa "Estudos sobre a narrativa brasileira contemporânea" (CNPq/UFG) e membro do GT "Homocultura e Linguagens", vinculado à ANPOLL. E-mail: [email protected]
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Izabel Cristina Silva Diniz http://lattes.cnpq.br/5433933734735957 Possui graduação em LETRAS pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2005) e mestrado em Estudos de Linguagens pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (2013). Atualmente é aluna do curso de doutorado em Estudos de Linguagens pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Língua Portuguesa, atuando principalmente nos seguintes temas: língua portuguesa, Timor-Leste, formação de professor, letramento, gênero textual e correção de texto. Laíse Soares Lima http://lattes.cnpq.br/0263245684291178 Mestre em Educação pela Universidade Federal de Sergipe - UFS (2017). Especialista em Psicopedagogia e Educação Especial pela Universidade Candido Mendes - UCAM (2015). Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Alagoas - UFAL (Campus do Sertão) (2014). Atualmente é professora substituta na Universidade Federal de Alagoas - Campus do Sertão. Possui experiência na área de pesquisa em Educação, principalmente nos seguintes temas: Formação de Professores; Práticas Pedagógicas; Educação Infantil e Linguagens da Infância. Priscila Dantas Fernandes http://lattes.cnpq.br/3182971100591320 Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Sergipe. Mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Universidade Federal de Sergipe (2014). Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Sergipe (2012). Especialização em Gestão Escolar - Pedagogia Empresarial, Faculdade São Luís de França (2014). Realiza pesquisas na área de História da Educação de Surdos, Formação de Professores, Alfabetização e Educação Especial na perspectiva inclusiva. Faz parte do Núcleo de Pesquisa em Inclusão Escolar da Pessoa com Deficiência (NUPIEPED/UFS). Soraia Maria da Silva Especialista em Literatura Infantil e Juvenil: práticas de leitura e ensino, pela Universidade Estadual de Goiás – Campus Pires do Rio. Graduada em Letras Português/Inglês pela Universidade Estadual de Goiás – Campus Pires do Rio. Em seus estudos, tem se dedicado aos estudos literários, pesquisando os
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seguintes temas: Literatura Infantil e Juvenil, Ilustração, Livro-ilustrado, Leitura e Formação do Leitor. E-mail: [email protected]. Verônica dos Reis Mariano Souza http://lattes.cnpq.br/4646126026926019 Possui mestrado em Educação pela Universidade Federal de Sergipe (2000) e doutorado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (2007). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal de Sergipe, no curso de Pedagogia e nos Núcleos de Pós-Graduação em Educação e de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Fundamentos da Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: inclusão, história da educação especial, surdez, educação, brincadeiras infantis, educação e arte, deficiência e aprendizagem da língua.
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A literatura oferecida à criança, desde o início
de sua vida, precisa ser alvo de estudo por
parte dos professores, pais, bibliotecários,
animadores culturais e demais mediadores de
leitura. Para os autores da presente coletânea,
a literatura, seja ela reconhecida na contação
de histórias, no livro-ilustrado, nas biografias,
nos contos de fadas tradicionais e nas suas
versões contemporâneas, tem importância
indiscutível na formação de leitores, e,
portanto, na formação de pessoas sensíveis,
capazes de compreender o mundo que se
apresenta ao seu redor, de maneira ampla e
inclusiva.