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Alm da carestia e do isolamento:produo rural e redes de comrcio nas minas do
Cuiab e do Mato Grosso (1716-1750)*
Tiago Kramer de Oliveira
Doutorando em Histria Econmica Universidade de So Paulo
Resumo
A produo histrica brasileira sobre a colonizao portuguesa nos territrios que ormariam o estado
de Mato Grosso, no oeste brasileiro, construiu uma imagem sobre esta sociedade colonial como isolada,
desarticulada onde inexistia um setor agropastoril signifcativo e em que apenas a explorao aurera,
rapidamente esgotada, motivava os colonos a migrar para a regio. Esta imagem pode ser encontrada nas
obras de diversos historiadores como Capistrano de Abreu, Washington Lus, Caio Prado Jnior, Srgio
Buarque de Holanda, Nelson Werneck Sodr e Celso Furtado. Neste artigo apresentamos a partir da
anlise de uma diversidade de tipologias documentais, uma interpretao que diverge desta imagem,
demonstrando a diversidade e a importncia da produo nos ambientes rurais e sua articulao com o
comrcio em diversas escalas.
Palavras-chave: colonizao portuguesa; agrrio colonial; Mato Grosso colonial.
Abstract
The historical image concerning Portuguese colonization in areas o western Brazil, such as the modern
state o Mato Grosso, depicts an isolated, disconnected society lacking signifcant agricultural production.
Only a brie, quickly exhausted, gold cycle motivated the migration o settlers to the region. This image can
be ound in the works o various historians including Capistrano de Abreu, Washington Lus, Caio Prado
Jnior, Srgio Buarque de Holanda, Nelson Werneck Sodr and Celso Furtado. In this paper we present,
rom the analysis o a variety o documents, an interpretation emphasizing the diversity and importance oproduction in rural areas and their relationship to local and inter-regional trade.
Key words: Portuguese colonization; colonial agriculture; colonial Mato Grosso.
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Alm da carestia e do isolamento: produo rural e redes de comrcio
Descobrira-se o ouro, ali precisamente emCuiab, em 1718. Porm jazidas e aluviesescassas, comparadas s das Minas Gerais.O auxo de populao foi muito menor, adecadncia mais acentuada e rpida. Da a
estrutura demogrca muito mais simples.Ao abrir-se o sculo passado achava-se acapitania reduzida a dois pequenos centrosinsignicantes: Cuiab (...) e Mato Grosso(Vila Bela).Caio Prado Jnior (1997, p. 58)
Uma regio (Mato Grosso) cujo povo-amento se zera em um sistema de altaprodutividade, e em que a mo-de-obrafora um fator extremamente escasso, invo-
luiu numa massa de populao totalmentedesarticulada, trabalhando com baixssimaprodutividade numa agricultura de subsis-tncia. Em nenhuma parte do continenteamericano houve um caso de involuoto rpida e to completa de um sistemaeconmico constitudo por populaoprincipalmente de origem europia.Celso Furtado (2003, p. 91)
ois dos mais importantes autoresda histria econmica brasileira,Caio Prado Jnior e Celso Furtado,
assim reconstruram as caractersticas prin-cipais da economia colonial reproduzidana capitania de Mato Grosso. Em nossaspesquisas sobre a reproduo econmicana regio, ainda na primeira metade dosculo XVIII, a anlise documental permitiua reconstruo de aspectos que possibilitam
uma interpretao diversa sobre as caracte-rsticas da economia colonial interiorizadano centro da Amrica do Sul. No nossoobjetivo advogar pela desvalorizao denossos clssicos, ao contrrio, acredita-mos que revisit-los, apontando eventuaislacunas e equvocos, a melhor forma devaloriz-los, tomando-os como refernciapara novas anlises.
D
O territrio ao centro da Amricado Sul onde espacializaram-se ambientescoloniais luso-americanos era percorridopor vassalos portugueses desde pelo menos
o nal do sculo XVII. Estes, atrados pelapossibilidade de aprisionarem amerndiose vend-los como cativos, adentravam cadavez mais ao interior da Amrica. No entanto,foi somente com os descobrimentos aur-feros no rio Coxip-mirim, auente do rioCuiab, a partir de pelo menos 1716 queforam formados ambientes coloniais xos.A cada vez mais efetiva presena luso-ame-ricana na regio e a articulao desta com
outras partes da Amrica Portuguesa, possi-bilitou que, entre 1716 e 1727, a coloniza-o consolidasse posies portuguesas.
Alm dos interesses dos colonos,tambm havia, desde 1718, a inteno for-mal, do Conselho Ultramarino, em fundarcolnia nas Minas do Cuiab (ROSA,1996,p. 65). Ainda segundo Carlos Rosa
em ns de 1721 o bispo do Rio nomeou
Vigrio da Vara (juiz eclesistico) paraCuiab. Em 1723 criou-se freguesia oucomarca eclesistica no Cuiab, sediadana Igreja Bom Jesus, elevada a Matriz. Emjunho o rei mandou fundar vila no Cuiab(ROSA, 2003, p. 15).
A ordem real de fundar vila s foicumprida em 1727, com a vinda Cuiab,do governador da capitania de So Paulo,
Rodrigo Csar de Meneses.Apesar de no haver explorao au-
rfera considervel no rio Cuiab, mas emseus auentes, as minas da regio foramsempre referenciadas como minas doCuiab, topnimo que se confundia at1734 com o termo (o que hoje chamar-amos de rea do municpio) da Vila Real.As minas do Cuiab estavam administra-
* Este artigo traz alguns resultados da pesquisa que desenvolvemos no mestrado em Histria pela Universidade Federal de Mato Grosso(OLIVEIRA, 2008), sob orientao do proessor Carlos Alberto Rosa. Agradeo os apontamentos eitos a verso original deste artigo pelo
proessor John Schulz.
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tivamente submetidas capitania de SoPaulo. Ao nvel local, a cmara, instituioimperial portuguesa, intermediava relaesinstitucionais entre o local, o colonial e o
metropolitano. A expanso das conquistaspossibilitou que, a partir de 1734, houvessenovos descobertos em direo oeste da VilaReal, nas minas que caram conhecidas como topnimo Mato Grosso.
O que motivava a invaso por colo-nos portugueses, principalmente advindosda capitania de So Paulo, aos territriosamerndios no centro da Amrica do Sul,era a reproduo de atividades que com-
punham o que se convencionou denominarde sertanismo.
O sertanismo pode ser denidoalm da simples execuo de atividades,como o aprisionamento e venda de ame-rndios como escravos ou a procura eexplorao de metais preciosos. As prticassertanistas devem ser compreendidas articu-ladas a uma srie de relaes econmicas esociais, sendo parte de um sistema, que,do ponto de vista econmico, possibilitavaa mobilizao e reproduo de capitais e doponto de vista social provocou uma srie derupturas e reterritorializaes.
O prprio termo sertanismo tendea mascarar este carter eminentementemercantil e moderno destas prticas,encobrindo de rusticidade relaes sociais,econmicas e culturais que, embora tenham
contornos especcos, podem ser pensadas,ampliando a escala, como parte de umsistema de relaes tpicas do processo deacumulao de capital na poca Moderna,assim como, guardando as devidas propor-es, o trco negreiro.
Em 1718, o caminho, essencialmenteuvial, que ligava Cuiab sua sede adminis-
trativa, So Paulo, era de difcil trnsito. Almdos obstculos naturais, a pouca presenade ambientes rurais ao longo dos rios, osconfrontos entre colonos e alguns povos
amerndios tornavam a situao mais com-plicada. H indcios seguros, todavia, de queos portugueses conseguiram, no comeo dadcada de 20, tornar esta ligao um cami-nho regular e de mo-dupla entre as minasque estavam no mais interior de todo o Estado doBrasil (AHU/NDHIR/UFMT, 08-01-1732)1e So Paulo atravs da rota uvial que come-ava no porto de Cuiab e terminava apscerca de cinco meses de viagem no porto de
Araritaguaba, em Itu. Ao longo do caminhouvial que levava s minas, formaram-sevrias espacialidades rurais que abasteciamas tropas2 compostas por uma diversidadede agentes sociais.
Em 1723, foi des-coberto, no territrio dosndios Caiap, o varadou-ro de Camapu o que pos-sibilitou a comunicao,atravs de um caminhode terra entre duas redeshidrogrcas distintas di-minuindo o tempo e as di-culdades da viagem. Mais do que apenas umcaminho de terra, Camapu tornou-se localde comercializao de produtos rurais comas mones. No apenas gneros alimentciosmais conhecidos (milho, feijo, carnes), mas
tambm tabaco e aguardente, produzidoslocalmente, eram comercializados.O relato de viagem de Cabral Camelo,
escrito entre 1727 e 1730, faz referncia aosproprietrios das roas de Camapu comodois pobres roceiros, o que no deve nos levara concluses precipitadas sobre as caracte-rsticas deste ambiente rural. As roas de
A cmara, instituio
imperial portuguesa,
intermediava relaes
institucionais entre o local,o colonial e o metropolitano
1 AHU (Arquivo Histrico Ultramarino) NDHIR (Ncleo de Documentao Histria e Inormao Regional) UFMT (Universidade Federal de
Mato Grosso) APMT (Arquivo Pblico do Estado de Mato Grosso).2 Apesar de geralmente o termo tropas azer reerncia a grupos que percorriam com mulas e cavalos caminhos terrestres, no sculo XVIII otermo tambm azia reerncia s expedies que percorriam em embarcaes os caminhos uviais. (AHU/NDIHR/UFMT, 12-04-1736;07-10-1736).
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Alm da carestia e do isolamento: produo rural e redes de comrcio
Camapu contavam com marcante presenade trabalhadores escravos3, inclusive sendoestes segundo Camelo, os responsveis portransportar as cargas e empurrar os carros,
nos quais se transportavam as canoas queeram atravessadas de um lado a outro dovaradouro, em um percurso que durava dequinze a vinte dias. Alm do trabalho escravo,a observao de se tratarem de duas roaspovoadas um indcio de que alm dos doisroceiros e de escravos tambm famliasde livres pobres habitavam o varadouro deCamapu (CAMELO, 1951, p. 134).
As primeiras sesmarias doadas por
Rodrigo Csar de Meneses nas minas doCuiab, entre 1726 e 1728, em um total detrinta e oito, conferiram direitos de posseocial da terra, principalmente a colonos
que j as ocupavam, asquais estavam localizadasprincipalmente ao longodo caminho de Camapu Cuiab, com especialintensificao neste rio medida que se aproxi-mava a Vila Real. Tambmforam concedidas sesma-rias nas imediaes dosdescobertos aurferos nos
auentes do rio Cuiab, principalmente osrios Coxip-Mirim e Coxip-Assu. Ao norteda Vila Real, rio Cuiab acima, na Chapada(Atual Chapada dos Guimares) tambm fo-
ram concedidas sesmarias (CANAVARROS,2004, p. 93-94). O nmero de trinta e oitoconcesses entre 1726 e 1728 pequenoem relao a real ocupao das terras, pois
muitas posses no eram reivindicadas comosesmarias (SO PAULO, 1994).
A diversidade dos ambientes ruraisesteve condicionada em parte pela diferen-
ciao entre os grupos sociais e em partepelas diferentes atividades que podiam serdesenvolvidas de acordo com interesses doscolonos. A produo de gneros aliment-cios, como milho e feijo, e a criao de pe-quenos animais (porcos, galinhas e cabras),contou tanto com a explorao do trabalhoescravo como com a produo camponesa.Havia diferenciao na documentao entrefazendas e roas que embora no fosse
rgida, principalmente na documentaono-oficial, ajustava-se a utilizao emmaior ou menor escala de trabalho escravona produo de alimentos4.
Alm das roas e das criaes de ani-mais tambm os engenhos compunham apaisagem rural. Ao contrrio da produode alimentos, os engenhos exigiam maiorinvestimento de capital. Nas minas do Cuiabhavia apenas um engenho em 1727, cinco em1730 e por volta de 1750, dezesseis (FON-SECA, 2001, p. 16). Alm dos instrumentosnecessrios para a fabricao dos derivadosda cana, trabalhavam em cada engenho deCuiab cerca de vinte a trinta escravos (AHU/NDHIR/UFMT, 07-10-1736). Nmeropequeno se comparado com os grandes en-genhos de Pernambuco e Bahia, mas conside-rveis no contexto econmico e demogrco
em questo. Os proprietrios destes engenhoseram reconhecidos pelo poder metropolitanocomo senhores de engenho, o que lhesconferia prestgio social.
Ao contrrio da
produo de alimentos, os
engenhos exigiam maiorinvestimento de capital
3 No temos uma estimativa do nmero de escravos, mas em 1730, em uma carta para o governador de So Paulo, D. Joo V chama a atenopara o ato de que em Camapu como no caminho dos Goiazes, nestes poucos anos passados, tem eito os ditos gentios (Caiap) muitos danos ehostilidades, porque s aos roceiros tem morto quarenta escravos (APMT, 08-10-1730).4 Apesar de esta dierenciao entre roas e azendas estar presente tanto na documentao ofcial quanto nos relatos, por muitas vezes dicil dierenciar as roas e as azendas. O termo roa e roceiro de uma orma geral caracterizava ambientes rurais de pequena produo
encabeados por livres pobres. J vimos, no entanto, que apesar da produo do varadouro de Camapu ser marcadamente escravista, a ormade espacializao e os senhores destes escravos, so descritos por Camelo como roas e roceiros. No percebemos o contrrio, ou seja, no hreerncias de azendas de pequenos produtores no escravistas. Apesar destas ponderaes a cerca dos limites de uma caracterizao precisa deroas e azendas, acreditamos ser vlida, como instrumento analtico a percepo de uma e outra como ambientes rurais distintos.
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A produo de cana-de-acar porlivres pobres e, inclusive, por amerndiosrelativamente autnomos, tambm veri-cvel na documentao e, provavelmente,
colaboravam no abastecimento destes en-genhos articulando a explorao escravistacom o trabalho campons e amerndio(AHU/NDHIR/UFMT, 08-01-1732).
Os currais foram tambm ambientesque compuseram a paisagem rural tanto dasminas do Cuiab quanto das minas do MatoGrosso. Entre 1718 e 1737 a criao de gadono pode ser desenvolvida plenamente emrazo da diculdade dos colonos em adqui-
rir reses. O caminho uvial tornava penosoo transporte destes animais. O principal for-necedor de gado neste perodo, assim comode cavalos, foram os ndios Mbay-Guaycuru,tambm denominados de Cavaleiros(AHU/NDHIR/UFMT, 07-10-1736). Esteseram senhores de um extenso territrioonde submetiam outros povos amerndiose possuam um incontvel rebanho de gadoe cavalos (COSTA, 1997, p. 38).
A partir de 1737, com a concluso docaminho de terra que ligava Cuiab a Gois,o uxo de gado e cavalos tornou-se contnuopossibilitando a expanso da pecuria. A par-tir, principalmente da dcada de 1740, for-maram-se grandes latifndios na parte nortedo Pantanal, mudando inclusive o perl dospedidos de sesmarias para a regio, antesprincipalmente para a criao de porcos e
cultivo de roas construo de engenhos eagora fundamentalmente para a formaode currais (SIQUEIRA, 1997, p. 37-40).Mas muitos currais eram abertos sem orequerimento de sesmarias, fato que resultouem queixas das autoridades portuguesas(AHU/NDHIR/UFMT, 09-02-1741).
Alm do abastecimento de carne, acriao local em maior escala de gado ede cavalos tornava as atividades comerciais
mais geis e, inclusive, melhorava o uxo demercadorias e de pessoas entre as minas doCuiab e as minas do Mato Grosso. Em 1736,
quando foi aberto o primeiro caminho deterra estes as minas do Cuiab e as minas doMato Grosso os produtos eram conduzidosnas costas dos negros, segundo as autori-
dades, por no haver cavalos nestas minas,situao que foi solucionada aps a efetiva-o da ligao por terra entre Cuiab e Gois(AHU/NDHIR/UFMT, 08-09-1739).
At a abertura deste caminho a nicarota comercial que ligava a regio ao lito-ral era a rota uvial Cuiab - Araritaguaba(Itu). Depois da abertura destes caminhosos comerciantes das mones tiveram queconcorrer com as tropas que percorriam os
caminhos de terra, integrando as duas re-gies mineradoras (Cuiab e Mato Grosso)do termo Vila Real de Cuiab, no apenasa Gois, mas tambm ao litoral sudeste enordeste da Colnia.
De forma geral, arota Gois-Cuiab vistacomo uma via de mo-nica na qual apenas tra-zia-se gado, cavalos emuares para as minas doCuiab e do Mato Grosso,no entanto, a produode mercadorias de altopotencial mercantil em escala considervel,como a aguardente e o tabaco, so indciosque de que a produo do termo da VilaReal estava ligada a relaes comerciaismais amplas com outras praas comerciais
da Amrica Portuguesa. Outros indcios do-cumentais nos levam a defender a hiptesede uma articulao sistmica, atravs docomrcio, entre as atividades econmicasdesenvolvidas no meio rural, localmente,com atividades desenvolvidas em outraspartes do Imprio Portugus.
A produo rural, desde o princpio dacolonizao, destinou-se em boa parte pro-duo de mercadorias para o mercado local.
So poucos os registros de preos e no hdocumentao especca da produo parao perodo estudado. Em 1726, o secretrio
O principal fornecedor
de gado neste perodo,
assim como de cavalos,
foram os ndiosMbay-Guaycuru
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do governador de So Paulo, que integroua comitiva de Rodrigo Csar de Menesespara fundar a Vila Real, registrou preos dasmercadorias ao longo do caminho uvial eno arraial do Senhor Bom Jesus.
Alm destes gneros que Gervsio
Rebelo discrimina os preos, o secretrio dogovernador tambm cita outros que eramcomercializados no arraial: arroz, carnede peixe, canjica, cuscuz, bolos, biscoitos,pastis, pipoca, catimpuera, aloja, angu,farinha de cachorro, aguardente. Os preosem Cuiab eram mais altos do que ao longodo caminho uvial o que se deve a doisfatores determinantes: o longo perodo deestiagem na dcada de 20 e o aumento da
demanda, uma vez que ndice demogrcotriplicou com chegada da dita comitiva.Mesmo assim apesar da alegada carestiade alimentos, no h indcios conveispara armar que faltaram gneros aliment-cios para abastecer as minas do Cuiab.
A comparao entre os preos pra-ticados em Camapu entre 1726 e 1727mostra o aumento do at 100% do alqueire
de milho (9 para 16 e 18 oitavas) e de 20% do alqueire de feijo (16 para 20 oitavas)(REBELO, 1961, p. 121-123; CAMELO,
1961, p. 134). No entanto em carta envidapara o rei D. Joo V em 1727, o governa-dor Rodrigo Csar de Meneses registra emCuiab os mesmos preos de 1726 (AHU/NDHIR/UFMT, 03-1727).
Em meados da dcada de 20 dos
setecentos a produo do meio rural sofriacom os perodos de seca, obrigando, mui-tas vezes, os agricultores a replantarem asroas. A falta de chuvas prejudicava no sas atividades rurais, como tambm a mi-nerao e provocava o aumento dos preos(REBELO, 1961, p. 129). Alm da estiagemhavia tambm as pragas que prejudicavama agricultura. As queixas sobre a carestiade alimentos eram recorrentes nas corres-
pondncias das autoridades metropolitanase nos relatos de viagem e crnicas.
A historiadora Ilana Blaj analisouas reclamaes em relao carestia dealimentos em So Paulo. Ao invs, de comovrios outros autores, aceitar passivamenteo contedo dos documentos que apontamestas queixas e perpetuar a viso de pobreza (...),da quase inexistncia (...) de um setor mercantil, do
nomadismo (...) de seus habitantes ou mesmo de sua propalada auto-sufcincia e independncia (BLAJ,1996, p. 456), Blaj analisa as tenses exis-
Fonte: (REBELO, 1961, p. 121-123)
Gnero Preo em oitavas de ouro
Prox. do rio Pardo Varadouro de Camapu Arraial do S. B. J. do Cuiab
Milho (alqueire) 12 9 14Farinha de Milho - - 20
Feijo (alqueire) 12 16 20
Galinha (unidade) - 3 3
Carne de porco fresca (libra) - - 1
Carne de porco salgada (libra) - - 2
Abboras (dzia) 1 - -
Toucinho (arroba) - 32 -
Aguardente (frasco) - 15 -Ovos (dzia) - - 11/
2
Tabela 1. Preo registrados por Gervsio Leite Rebelo em 1726
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tentes nestes discursos. Primeiro apontaque a reclamao de carestia de alimentosnunca se deveu a falta destes produtos, massim aos altos preos que estes alcanavam
(BLAJ, 1996, p. 450).Curiosamente justamente no pe-rodo entre 1727 e 1730, que notamosum adensamento populacional no meiorural em Cuiab e a expanso das ativida-des produtivas. Enquanto em 1727, porexemplo, havia apenas um engenho, em1730, j havia cinco. Tambm em relaoa este perodo, Cabral Camelo aponta quecomerciantes, homens brancos, com-
pravam a produo rural dos roceiros erevendiam-na alcanando altos lucros comesta atividade (CAMELO, 1961, p. 134).
A carestia, portanto, em Cuiab,assim como arma Blaj para So Paulo ex-pressa a dialtica do movimento. Enquanto al-guns reclamavam dos preos, comerciantese produtores lucravam com comercializaodos gneros alimentcios. Segundo Blaj estasqueixas, mostram as tenses emergentes devido articulao com a regio mineratria e expressamtambm a dinamizao da produo e do comrcio
paulistano, enriquecendo e ortalecendo assim uma elitelocal (BLAJ, 1996, p. 456).
Momentos de diminuio das ativi-dades mineratrias no signicavam, con-tudo, necessariamente crise nas atividadesrurais. O relato de Cabral Camelo sobre asatividades comerciais no porto de Cuiab
indica a dinamicidade da economia local,apontando que havia, inclusive, comercian-tes que viviam apenas do comrcio de g-neros alimentcios comprados dos roceirose outros que conseguiam seus rendimentossomente com o comrcio de peixes, ouseja, compravam peixes dos pescadores,que eram vendidos, secos ou salgadosno mercado local, o que demonstra noapenas a diversicao das atividades, mas
a criao de redes especcas de comrciodependentes do desenvolvimento destas(CAMELO,1961, p. 139).
No h dvida de que uma crise naatividade mineratria diminui a circulaode dinheiro nas regies mineiras, mas necessrio compreender que longe do
improviso e da instabilidade, as relaes decomrcio eram baseadas em cadeias de cr-dito. Para utilizarmos as palavras do ouvidorde Cuiab, o costume de comprar e ender fado(AHU/NDHIR/UFMT, 06-03-1730) noera apenas um acordo entre comerciantese consumidores, mas tambm envolvia osistema administrativo portugus, uma vezque nesta terra os homens comerciam uns com osoutros roupas e escravos e outras quaisquer azendas
por escrituras pblicas e crditos. Deste modo aeconomia movimentava-se de forma que advida de um, transformada em escrituraspblicas, poderia tornar-se a garantia depagamento de outrem,movimentao que seriaobviamente interrompi-da, se houvesse estado dequeda livre na extraodo ouro, o que no foio caso (ARRUDA, 1991,p. 47).
Outro fator que apontado para justicar ahiptese de uma precariedade no desenvolvi-mento das atividades econmicas nas minasdo Cuiab a suposta evaso populacional des-tas minas aps o descobrimento das minas doMato Grosso, no vale do rio Guapor. Com os
achados das minas de Mato Grosso o uxode muitos mineradores das minas de Cuiabpara Mato Grosso foi evidente, no entanto, istono signicou a evaso da populao. Se porum lado descartamos a hiptese de uma evasopopulacional das minas do Cuiab para asminas do Mato Grosso, por outro refora-mos a importncia da formao de ambientescoloniais nestas minas para compreendermosa dinmica da economia colonial espacializada
no centro da Amrica do Sul.A explorao aurfera e a formao
de um mercado consumidor nas minas do
A economia movimentava-se
de forma que a dvida de
um poderia tornar-se a
garantia de pagamentode outrem
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Mato Grosso, impulsionou as atividades pro-dutivas e comerciais em todo o termo da VilaReal. Os valores registrados entre os produtosnas duas regies mineradoras evidenciam a
diferena de preos entre os dois distritos.
Alm de registrar os preos das mer-cadorias em 1736, Caetano Borges, apontaque o milho era produto das roas e plantas
do mesmo descoberto, no apontando o
mesmo para o feijo, o que um sinal de queo mesmo no seria produzido localmente,ou no seria produzido o suciente paraabastecer os arraiais e povoados do distrito
de Mato Grosso. Este fato poderia explicar acontnua alta do preo do feijo que depois,pelos anos adiante, passou a valer 20 oitavas;chegou a valer a quantia de ouro uma quarta(BORGES, 2001, p. 16) e a queda do preodo milho de 6 para 4 oitavas. A tendnciageral dos preos no distrito do Mato Grossoaponta valores bem mais altos do que ospraticados no distrito de Cuiab, mas os pre-os de uma forma geral apontam para uma
tendncia de queda entre 1736 e 1737. preciso apontar que no documento
citado como referncia dos preos de 1738nas minas do Mato Grosso consta que ospreos em Cuiab so os mesmos praticadosh pelo menos dez anos.
Referncia 1736 1738
Milho (alqueire) 6 4
Farinha de Milho 8
Feijo (alqueire) 10 20
Carne de vaca (libra) 2 1Carne de porco (libra) 2 1
Toucinho (libra) 2,5
Aguardente (frasco) 15
Sal (prato) 4
Marmelada branca (caixeta) 5 8
Marmelada de sumo (libra) 6 e 7*
Acar (libra) 6 e 7* 4
Galinha 6 4Camisa de linho 6 2
Ceroulas 4
Chapu de baeta 4
Cvado de baeta 4 4
Plvora (libra) 4
Tabela 2. Preos (em oitavas) de mercado-rias nas minas do Mato Grosso (Arraial deSo Francisco Xavier)5
* Na referncia est descrito: uma libra de algumamarmelada de sumo que aparecia valia seis e 7/8; epelo mesmo preo, uma libra de acar.
** No especica que se trata de marmelada branca.Fonte: BORGES, Francisco Caetano. Anais de Vila Belada Santssima Trindade. Publicaes Avulsas n 28.Cuiab: IHGMT, 2001 p. 16. CARTA de Joo GonalvesPereira ao rei D. Joo V. Vila Real do Senhor Bom Jesusdo Cuiab, 08-09-1739. mss., microlme Rolo 02,doc. 127, (AHU) NDIHR/UFMT.
RefernciaMinas do
Mato GrossoMinas doCuiab
Milho (alqueire) 4 1
Farinha de Milho 8 2
Feijo (alqueire) 20 2
Carne de vaca(libra)
1 1/4
Carne de porco(libra) 1
1
/4
Marmelada(caixeta)
8 1/2
Acar (libra) 4 3/4
Galinha 4 1
Camisa de linho 2 2
Cvado de baeta 4 1/2
Tabela 3. Preos (em oitavas) de merca-dorias nas minas do Mato Grosso (Arraialde So Francisco Xavier) e na Vila Real do
Senhor Bom Jesus do Cuiab em 1738
Fonte:CARTA de Joo Gonalves Pereira ao rei D. Joo V. VilaReal do Senhor Bom Jesus do Cuiab, 08-09-1739. mss.,microlme Rolo 02, doc. 127, (AHU) NDIHR/UFMT.
5 Os preos de alguns itens no puderam ser comparados pela escassez dos dados, mas atestam a diversidade de mercadorias.
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Se compararmos os preos praticadosem Cuiab antes da fundao da Vila Real(Tabela I), com os praticados nas minasdo Mato Grosso, veremos que os preos
nestas ltimas so bem menores. A esta-bilidade dos preos em Cuiab deveu-se ampliao da produo, regularidade doabastecimento e taxao de preos pelacmara da Vila Real. O fato dos preos nasminas do Mato Grosso no ter alcanado osvalores praticados em Cuiab no princpiode sua colonizao certamente est ligadoaos efeitos da consolidao e a estabilidadeda produo nas minas do Cuiab.
Apesar de elucidativa, a percepo dasatividades produtivas e comerciais a nvel lo-cal insuciente para entender as relaes deintercmbio que articulam estas atividadescom outras redes comerciais da Amrica Por-tuguesa, atravs, inclusive da produo rural,condicionando dinmicas de explorao demo-de-obra e de recursos naturais.
Atravs da anlise de alguns trechos deum longo documento, uma carta do ouvidorde Cuiab, datada de 20 de setembro de1740 (AHU/NDHIR/UFMT, 20-09-1740),podemos desvendar alguns aspectos da ar-ticulao entre as atividades produtivas domeio rural e o comrcio. Neste documentoouvidor de Cuiab corresponde-se com o rei,representando os interesses dos comerciantesde Cuiab. O ouvidor anexa sua carta umabaixo-assinado destes comerciantes6.
A primeira questo que este docu-mento apresenta que os comerciantes deCuiab, constituam um grupo social quelutava por seus interesses e que possuamvnculos com o poder local e conseguiamapoio de autoridades metropolitanascomo o ouvidor Joo Gonalves Pereira.Os comerciantes haviam comandado umadiligncia para os territrios que julgavamestratgicos para o contato com os sditos
de Castela, sob a alegao de que para sepode-rem povoar necessrio explorar-se primeiro para servir
no conhecimento de seus terrenos e capacidades.Desde o princpio da colonizao
portuguesa no centro da Amrica do Sul, oscolonos tinham percepo da proximidadecom os territrios hispnicos. No entanto,as atividades exploratrias (diligncias,expedies, bandeirinhas) tornaram estapercepo mais concreta. No documentoos comerciantes procuraram articular seusinteresses geograa poltica de Portu-gal. O sistema administrativo portugusatribua especial importncia dimenso
territorial da conquista. Segundo o ouvidor,undaram os suplicantes sua resoluo no captulovinte e seis do regimento do vice-rei e governador geraldesse Estado no qual determina v. majestade se povoemtodos os domnios.
Tanto cuidado emjusticar as prticas ado-tadas por estes comer-ciantes no era um sim-ples recurso narrativo. Eracom muito receio que orei de Portugal e seus con-selheiros em assuntos doultramar viam as relaesentre os sditos das coroas ibricas. Posicio-namento poltico que emanava do podercentral e que se reproduzia nas relaeslocais de poder, desencadeando disputas etenses. O intendente e provedor de Cuiab,
Manuel Rodrigues Torres, escreveu ao rei,no mesmo ano de 1740, denunciando oouvidor Joo Gonalves Pereira de ambi-cionar entregar as minas aos castelhanos.O intendente e provedor ainda se queixada injusta priso que sofria por ordemdo mesmo ouvidor (AHU/NDHIR/UFMT,17-08-1740).
O desdobramento destas tenses no o objeto deste artigo. A percepo da ar-
Desde o princpio, os
colonos tinham percepo
da proximidade com osterritrios hispnicos
6 ABAIXO-ASSINADO dos comerciantes das minas do Cuiab ao rei D. Joo V. Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiab (AHU/NDHIR/UFMT, 20-09-1740).
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ticulao destas aos interesses comerciais,contudo, mostra a expresso das atividadescomerciais a nvel local e a formao de umaelite de homens de negcio, voltados para as
atividades comerciais. As tenses, inerentess disputas de poder, entre defensores eopositores da abertura de comrcio com osespanhis, via centro da Amrica do Sul, nose encerravam na cmara da vila de Cuiab.Para termos uma noo da dimenso de talproposta, o Conselho Ultramarino pediupareceres dos governadores de So Paulo edo Rio de Janeiro, do procurador da Coroae do provedor da Real Fazenda.
Segundo os comerciantes, uma vezpovoados os territrios contguos aos dom-nios espanhispoderiam seus habitantes fcar comcontgua vizinhana aos moradores das povoaes daquele
monarca, e estas so subrbiosdo opulentssimo reino do Peru,sendo este abundante de riquezas,
populosas vilas e cidades. Como interesse de abastecer omercado peruano de fa-zendas e mais gneros,os suplicantes pediam amerc para comerciar comos castelhanos pelos meios que
parecerem mais convenientes.Os suplicantes argumentaram que
atravs deste comrcio os castelhanosdeixariam parte do precioso de suas riquezas e
muitos gados quadrpedes, de que abundam as pampas
paraguaianas. Mais do que apenas prever osefeitos imediatos e locais, os comerciantesapontavam conseqncias mais amplas des-te comrcio: 1) aumentaro as povoaesnestes to dilatados estados de v. majestade;2) ter multiplicados os direitos da real azenda tanto
nas alndegas dos portos martimos, 3) ter maioraumento o contrato dos dzimos 4) ampliao daslavouras para abastecer o comrcio (AHU/NDHIR/UFMT, 20-09-1740).
importante salientar que mesmotratando-se de um projeto, a proposta doscomerciantes insere-se em uma lgica de
funcionamento das atividades econmicas ede seus efeitos sobre as outras caractersticasda sociedade. Nosso intuito no demons-trar que os comerciantes estariam corretos
na previso sobre os efeitos de um projetoque sequer foi concretizado, mas demons-trar atravs dos indcios alguns aspectosrelacionados a articulao entre o comrcioe outras atividades produtivas.
As atividades econmicas, em particu-lar as desenvolvidas no meio rural nas minasdo Cuiab, podem ser compreendidas, emseu aspecto econmico, alm da perspec-tivava de um mercado local. O caminho
uvial Cuiab-Araritaguaba, a abertura docaminho de terra de Gois a Vila Real doSenhor Bom Jesus do Cuiab e desta vilaat os arraiais do distrito de Mato Grosso eo contato com os espanhis completaramuma linha tortuosa que unia o centro daAmrica do Sul aos oceanos Atlntico e Pa-cco. A produo rural das minas do Cuiabe do Mato Grosso estava ligada a circuitosmercantis locais, regionais, coloniais, emrelaes comerciais do estado do Brasil como estado do Gro-Par e Maranho e aindacom os territrios espanhis.
A respeito das ligaes da produolocal com outras partes da Amrica Por-tuguesa reveladora de muitos aspectosa anlise sobre a construo de engenhosnas minas do Cuiab. A coroa portuguesaproibia a construo de engenhos em reas
de minerao. A proibio ocorreu ainda em1715, no contexto da formao de enge-nhos em Minas Gerais. As duas principaisjusticativas da proibio foram: o fato daslavouras ocuparem muitos trabalhadoresescravos que deveriam ser aproveitados naextrao de ouro e; a perturbao do sos-sego pblico causada pela embriaguez dosmesmos (ZEMELLA, 1990, p. 212).
Zemella arma que a despeito dessas
leis proibitivas, multiplicaram-se de talmodo os engenhos que (...) rara era a fazen-da, ainda que pequena, onde no houvesse
As atividades econmicas
podem ser compreendidas,
em seu aspecto econmico,
alm da perspectivava deum mercado local
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produo de aguardente (ZEMELLA, 1990,p. 213). Ainda tratando-se de Minas Gerais,Guimares e Reis, em um trabalho pioneirosobre o desenvolvimento da agricultura na
primeira metade do sculo XVIII, armamque a coroa portuguesa tinha conhecimentoe no impediu a implantao de engenhos, nas Minas,ossem de moer ou de piles. Para os autores entrea existncia da proibio sua obedincia, vai umalonga distncia. A coroa sempre deixou brechas emsua legislao, permitindo que ela osse desnecessria(GUIMARES, 1886, p. 19).
Apesar de concordarmos a priori comGuimares e Reis, nos arriscamos a lanar
uma terceira interpretao sobre o assunto.Se existiam brechas na legislao portu-guesa estas eram espaos de disputa entreos grupos que controlavam a produo e ocomrcio de derivados de cana, principal-mente a aguardente.
A relao de Minas Gerais com seuprincipal fornecedor de mercadorias, oRio de Janeiro, expe elementos sobre aquesto. Segundo Florentino e Fragoso ogovernador do Rio de Janeiro queixava-se do movimento da sada de pessoas eriquezas para as Minas Gerais, segundo ele,tais movimentos estariam desaparelhando os engenhose azendas, e levando a completa runa da cidade. Aconcorrncia dos engenhos das Gerais ea sada de produtores do Rio de Janeiropara estas minas geraram uma crise nosengenhos uminenses (FLORENTINO e
FRAGOSO, 2001, p. 73-74).Assim como a construo de enge-nhos nas minas Gerais ia contra o interessedos senhores de engenho uminenses, aexistncia de engenhos nas minas do Cuiabcontrariava os interesses dos produtores ecomerciantes paulistas que dominavam ocomrcio monoeiro. A cmara de So Pau-lo, queixava-se ao rei sobre o prejuzo que se aza estes povos a brica de umos e tabacos e aguardentes
em Minas (Cuiab e Gois) e que era conveniente ve-dar a dita abrica delas (APMT, 20-02-1743).Os argumentos so sempre os mesmos da
proibio de 1715: o prejuzo mineraopela utilizao de escravos africanos e osdanos ao bem comum causados pelaembriaguez.
A descoberta das minas do MatoGrosso e a rmao das minas do Cuiabcomo produtor e entreposto comercialpara o Mato Grosso, motivaram o grupo desenhores de engenho, atravs da Cmara daVila Real, por meio de uma Junta:
A primeira junta foi sobre a conservao,ou demolio dos engenhos, em que sefabricam as guas-ardentes de cana; nela seassentou conservassem os que atualmentepermanecem e que no novo descobri-mento do Mato Grosso se no plantassecanas, nem fabricasse engenho algum denovo; sem embargo do que tenho notciaque j destas Minasforam alguns instru-mentos para se fabri-car um engenho nodito descobrimento;que se conservem os
que esto nestas Mi-nas parece justo, parano perder de todoos donos deles; de sefabricarem de novo, eprincipalmente em descobertos divertir(...) de minerar vinte ou trinta escravos,que em cada um se ocupam, e buscar meiopara se perderem muitos homens combebidas, como aqui se experimenta e serjustssimo que Vossa Majestade proba compenas graves que seno faam no futurosemelhantes engenhos; e assim o praticouo general desta capitania Antonio da SilvaCaldeira na criao das minas dos Goyases,por experincia ter mostrado o prejuzoque causam os ditos engenhos (AHU/NDHIR/UFMT, 07-10-1736).
Os mesmos argumentos utilizadospela cmara de So Paulo e do Rio de Janei-
ro, para que no se fabricassem engenhosem reas de minerao, foram utilizadospelos membros da cmara e pelos senhores
Brechas na legislao
portuguesa eram espaos de
disputa entre os grupos que
controlavam a produo e ocomrcio de derivados de cana
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de engenho da Vila Real do Senhor BomJesus do Cuiab para tentar impedir que seconstrussem engenhos nas minas do MatoGrosso. Outra semelhana importante com
o documento de 1715, que os senhoresde engenho de Cuiab pedem o mesmo be-nefcio pedido pelos senhores de engenhodas Minas Gerais, qual seja, no criar-senovos engenhos e no demolir os j exis-tentes, o que garantiria aos atuais senhoresde engenho uma reserva de mercado paraseus produtos.
Analisando a Junta, ainda podemosperceber que os interesses tambm se
voltavam para as minas goianas, principal-mente com a eminncia da concluso daabertura do caminho de terra que ligavaGois a Cuiab. Apesar das tentativas dos
senhores de engenho deCuiab, estes acabarammalogrando em seu ob-jetivo, pois os documen-tos apontam que tantoem Gois, quanto nasminas de Mato Grossoforam construdos en-genhos. O que, contudo,no nos autoriza armarque a aguardente pro-
duzida em Cuiab no abastecia tambmestes mercados.
A coroa relutava em tomar medidasdenitivas a respeito da conservao ou
demolio dos engenhos em reas de mine-rao. O rei em 1739, escreve ao governadorde So Paulo ordenando que
enquanto eu no tomo a ltima re-soluo sobre esta matria (...) vosaviso, para que no deis licena, nemconsintas que se erijam de novo os ditosengenhos nos distritos do novo governo(APMT,12-10-1739)7.
Demoraria mais quatro anos paraD. Joo V decidir sobre a questo. Apesardos empenhos das cmaras da Vila Real doSenhor Bom Jesus do Cuiab e tambm
da Cmara da Vila Boa de Gois (AHU/NDHIR/UFMT, 23-05-1744), o rei em1743, lanou ordem que parecia denitivasobre os engenhos,
Fao saber a vos governador e capito gene-ral da capitania de So Paulo, que sendo-mepresente que sem embargo das minhas or-dens se fabricam nas minas do Gois e Cuia-b muitas engenhocas de fazer aguardentes,de que resultam vrios inconvenientes e
detrimento grande aos moradores de serraacima dessa capitania sendo tambm noci-vas a conservao destas minas (...) ndosque sejam os atuais contratos dos dzimosas minas dos Gois e Cuiab, faais demolirtodas as engenhocas que nelas se acharem,proibindo a sua reedicao e nova cons-truo (APMT, 12-06-1743).
Nesta ordem rgia cam mais eviden-
tes os interesses que estavam envolvidos nadiscusso sobre a demolio dos engenhosem Cuiab e em Gois. O ponto interessanteneste documento que o rei justica suaresoluo, alm dos inconvenientes jconhecidos desde o decreto de 1715, peloprejuzo causado aos moradores de So Pau-lo, ou seja, aos comerciantes, plantadores decana e produtores de aguardente.
A ordem do rei para que se espere o
ndar dos contratos dos dzimos para de-molir os engenhos um indcio da impor-tncia dos tributos pagos pelos engenhos.Um olhar sobre os valores dos contratosdos dzimos revela que houve a queda dovalor deste contrato, justamente aps otrmino do contrato vigente at 1743, de6.000.430 ris anuais para 2.000.500 milris (AHU/NDHIR/UFMT, 12-09-1740),
A coroa relutava em
tomar medidas a respeito
da conservao ou
demolio dos engenhosem reas de minerao
7 interessante perceber que o rei retifca sua resoluo ordenando que no concedas licenas, nem consintas, ou seja, o rei no s tinhaconhecimento que era concedido o direito de construir engenhos sem a legalizao do empreendimento, como tambm buscava controlar (o que
no quer dizer que controlava) os instrumentos no legais de concesso deste direito.
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o que poderia reforar uma hiptese deque os engenhos tivessem sido demolidos.Percebemos, no entanto, que esta ordemno teve efeito, nem no terno da Vila do
Cuiab nem no termo da Vila Boa de Gois.Em 1744 o governador de So Paulo escreveao rei anexando documentao da cmarada Vila Boa de Gois e uma carta do ouvi-dor da Vila do Cuiab. O ouvidor insiste naimportncia da manuteno dos engenhosarmando que estes eram os nicos bens de raizque h nestas minas e acrescenta que, inda que hajadistantes descobertos, ou [...] alta de ouro sempre osdonos dos ditos engenhos se conservam neles, como se viu
quando houve o descoberto do Mato Grosso (AHU/NDHIR/UFMT, 03-10-1744). Outros do-cumentos como a Notcia da Situao deMato Grosso e Cuiab de Jos GonalvesFonseca, conrmam a continuidade e aexpanso dos engenhos produtores deaguardente, que de cinco em 1730 passa-ram, no nal da dcada de quarenta, a seremdezesseis (FONSECA, 2001, p. 34).
A relao entre as lavouras e o comr-cio pode ser percebida alm dos engenhosque j analisamos, tambm na produo dealimentos como milho, feijo e na criaode animais. O comrcio com as minas doCuiab articulava-se com a produo agr-cola de outras regies, como por exemplo,de Itu. De acordo com Godoy, em 1728,mesmo ano em que h vrias concessesde sesmarias nas minas do Cuiab, so con-
cedidas sesmarias em Araritaguaba com oobjetivo de atender as rotas que iam para asminas (GODOY, 2002, p. 134).
O carter mercantil destas espacia-lidades rurais evidente, sendo evidentetambm a articulao entre as espacialidadesrurais engendradas em diferentes regiesda Amrica Portuguesa. Alm das fazendasde explorao de trabalho escravo, segundoGodoy, tambm os pequenos agricultores
vendiam parte de sua produo para abaste-cer as empresas monoeiras (GODOY, 2002,p. 144). Ilana Blaj estudou a mercantiliza-
o da economia paulista a partir do naldo sculo XVII, mercantilizao esta queos descobertos aurferos nas Gerais vmapenas dinamizar e acentuar tendncias e
movimentos j existentes (BLAJ, 1996,p. 446). Levando em conta que em 1718comea de forma efetiva a colonizaoportuguesa na parte mais central da Amricado Sul, podemos inferir que o mercadoconsumidor nas minas do Cuiab emergecomo parte da rede que ligava a elite pau-lista a mercados internalizados em reas deproduo aurfera.
Voltando ao abaixo-assinado dos co-
merciantes de Cuiab, estes armam queaumentado-se a povoao necessariamente se ho deaplicar alguns moradores a tratar de lavoura, outros acomerciar conorme a inclinao e possibilidade de cadaum (...). Alm da lavourae do comrcio, os supli-cantes tambm apontamque certo que estas campanhasto dilatadas e em todas elash ouro, e razo para que senoextrai por no haver quem o
procure e tire. Comrcio,lavoura e minerao, trsatividades que contavamcom uma diversidade de agentes sociais parasua execuo, so sendo, portanto, apenasa possibilidade nanceira que determinaa prtica de uma ou outra atividade, mastambm a inclinao, ou seja, o interesse
pelo ouro era indubitavelmente presente,particularmente por parte da elite, compos-ta por senhores de engenho, proprietriosde grandes currais, comerciantes e mine-radores, mas havia vrias formas de obt-lo.O alto preo das mercadorias, sobretudodos escravos, ferramentas, sal, plvora soindcios que boa parte do ouro que circu-lava nas minas do Cuiab e do Mato Grossocasse nas mos dos comerciantes.
Os comerciantes previam de formadetalhada como funcionariam as feito-rias, apontando valores percentuais para
A relao entre as lavouras
e o comrcio pode ser
percebida alm dosengenhos que j analisamos
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os comerciantes que zessem uso desta,assim como do aparato necessrio para suadefesa. Os colonos sabiam do interesse daCoroa em obter, atravs do comrcio, a prata
dos castelhanos, tanto que, comparavam,apontando as vantagens, a realizao docomrcio na Colnia de Sacramento, noextremo sul da Amrica Portuguesas comas s feitorias que seriam constitudas nocentro da Amrica do Sul.
Concomitantemente ao projeto dedesenvolver o comrcio com as grandespraas comerciais hispano-americanas, oscomerciantes tambm buscavam desenvolver
relaes comerciais com as misses jesuticas,principalmente ao longo do rio Guapor.
Os comerciantes que ambicionavamdesenvolver comrcio com os espanhis
negociavam escravos afri-canos, aguardente, taba-co, gneros alimentcios,vestimentas, e fazendasem Cuiab e no MatoGrosso. A intensicaodo comrcio de escravosafricanos teria implicaosobre os portos do Atln-tico e, portanto, sobre aalfndega, a produo e
venda de tabaco e aguardente, se contassecom a produo paulista e uminense, teriaefeito sobre o direito das entradas.
A venda da produo agrcola e dos
derivados das lavouras das minas do Cuiab edo Mato Grosso aumentaria a arrecadao dosdzimos e aumentaria o valor dos contratosadministrados pela cmara, como o corte decarne, o comrcio de aguardente e etc. Ainda,em relao a todas as mercadorias que fossemlevadas s feitorias, deveria ser pago dez porcento do valor destas para a manuteno dasmesmas. No entanto, apesar de correspondera formas de explorao do trabalho e a cadeias
produtivas diversas, todas estas mercadorias,indistintamente, serviriam para obter prata,couro, e outras fazendas dos espanhis.
A demasiada preocupao dos his-toriadores com as formas de reproduoeconmica na Amrica Portuguesa e aformao de elites coloniais levou a mio-
pia em relao s articulaes do mercadointerno com as relaes econmicas maisamplas. Guilhermo Palacios observou quena produo histrica brasileira, a imagemtradicional do mercado interno como mer-cado interior continua inquebrantvel,apesar, como aponta o autor da agranteobviedade da constituio da AmricaPortuguesa como partes integrantes e sis-tematicamente articuladas de um imprio
(PALACIOS, 2004, p. 58).As mercadorias, quando adquiriam
uma forma-valor, tinham silenciadas as re-laes de sua produo, sejam em transaeslocais ou atlnticas e que possibilitavamacumulaes de capital em diferentes escalas.No havendo, portanto, duas lgicas distintasde acumulao de capital, uma interna, outraexterna, mas um sistema que articulava aproduo voltada para o mercado internoe para o mercado externo, o que pode serdemonstrado tanto atravs da anlise dasrelaes comerciais quanto na lucrativaarrematao dos contratos rgios .
Em Cuiab e Mato Grosso os mesmoscomerciantes que negociavam nas minasdo Cuiab e do Mato Grosso, sal, escravosafricanos, roupas vindas da Europa e dasndias Orientais, comercializavam tambm
mercadorias produzidas localmente, por suavez, todo o capital reproduzido com estasatividades comerciais servia para abastecero sistema como um todo, desde o respon-svel em aprisionar escravos na frica at osroceiros que vendiam alimentos ao longodos caminhos, passando pelos grandes co-merciantes do Rio de Janeiro e de Lisboa.
No caso dos contratos rgios esta rela-o ca ainda mais evidente j que todas as
mercadorias pagavam direitos de entradas aoscaminhos que levavam as minas, assim comotoda a produo seja ela produzida por mo-
Em relao s mercadorias
que fossem levadas s feitorias,
deveria ser pago dez por
cento do valor destas para amanuteno das mesmas
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de-obra escrava, ou de livres pobres, deveriampagar os dzimos. A Coroa e o arrematador docontrato retiravam seus lucros da exploraode todas estas atividades em conjunto.
Sobre a articulao das atividadescomerciais no centro da Amrica do Sul aoImprio Portugus, o ouvidor que apia oprojeto dos comerciantes argumenta que pa-rece novo o requerimento dos suplicantes, mas to antigocomo so as eitorias da sia, da Costa da rica....Alm de relacionar o projeto com outrosdomnios portugueses, os colonos luso-ame-ricanos o relacionam conjuntura dos outrosgrandes imprios coloniais europeus,
por car sendo aos castelhanos o trato quea eles oferece por estes arraiais com maiscomodidade da distncia, do que pelaColnia (Sacramento) com os portugueses;e pela contra costa do mar [...] com osfranceses, holandeses e ingleses, e havendoguerras [...] os socorros dos (castelhanos)ser o dito comrcio (AHU/NDHIR/UFMT, 20-09-1740).
Uma percepo relativamente clarada dinmica econmica que envolvia ocomrcio Atlntico e Pacco, por parte doscomerciantes, reveladora de como umaregio em que estes oceanos eram quaseeqidistantes pensavam-se e desenvolviam-seatividades econmicas tendo como parme-tros a dinmica do Imprio Portugus, doqual fazia parte no limite de sua fronteira, eo Imprio Hispnico com o qual rivalizavamterritrios litigiosos e estabeleciam direta ouindiretamente uma srie de contatos.
Nosso objetivo no demonstrar queos comerciantes eram vassalos leais ouque tinham uma identidade portuguesa,
o que no est em questo. Procuramosdemonstrar que estes articulavam seus in-teresses aos do Imprio Portugus, do qualse sentiam parte e tinham certa percepo
de seu funcionamento. No entanto, almdo imprio havia a percepo no toclara, mas evidente, do funcionamento deuma economia mundial que articulava ointeresse dos comerciantes de Cuiab comoutros imprios emergentes como o fran-cs, o ingls e o holands.
Foi com muita cautela que a Coroaavaliou o desenvolvimento de relaescomerciais com os espanhis. Em carta en-
viada, em 1746, Vila Real, foram citadosos pareceres do governador de So Paulo,do governador do Rio de Janeiro, do pro-curador da Fazenda Real e do procuradorda Coroa. Apesar dos pareceres diferencia-dos, nenhum deles apoiou a proposta doscomerciantes, prevalecendo uma polticade defesa com a proposta da construo defortalezas e no de feitorias. A consulta doConselho Ultramarino acatada pelo rei, noapenas fazia referncia s feitorias,
as bandeirinhas sertanejas e abertura de pi-cadas ou caminhos novos serviam de algu-ma utilidade particular, mas de prejuzo eruna do pblico, porque muitos morriamnas mos dos brbaros, e se fazia notrioaos castelhanos a vizinhana de nossas ter-ras, ou do nosso ouro e diamantes, o que sefazia muito perigoso, tendo aquela nao
mais poder, e sendo mais numerosa que anossa; e que assim parecia se devia repetira ordem que proba abrir caminhos novosprincipalmente para a parte que connamcom os castelhanos e o comerciar com estes(AHU/NDHIR/UFMT, 26-04-1746)8.
8 O parecer desta consulta do Conselho Ultramarino demonstra que as inormaes passadas pelo provedor da Fazenda Real, Manuel RodriguesTorres, tiveram uma importncia decisiva na ormulao deste: E dando-se tudo vista o procurador da azenda respondeu: que nestas ltimascartas do ouvidor do Cuiab Joo Gonalves Pereira, se conhecia j este ministro, que no era to conveniente como ao princpio se persuadir
a vizinhana descoberta das ndias de Castela: que est conhecido, que estes nossos confnantes tem muitas povoaes grandes junto das nossasterras, e que do seu partido esto muitos ndios domsticos, e guerreiros o que tudo altava da nossa parte (...) nesta certeza lhe parecia que nos deveria ordenar ao governador de So Paulo e aos ouvidores da mesma capitania que probam todo e qualquer comrcio com os castelhanos,castigando severamente os que no observam esta ordem (...) (AHU/NDHIR/UFMT, 26-04-1746).
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No mesmo documento o conselhosugere que ministros envolvidos neste co-mrcio deveriam perder seus cargos e oscomerciantes que por si, ou por outrem, fzerem
aquelas negociaes teriam confscados os bens. Via-se frustrada a inteno dos luso-americanosem introduzir suas mercadorias, via centro daAmrica do Sul ao opulentssimo reino do Peru.
Apesar do insucesso do projeto doscomerciantes, o longo documento queanalisamos deixa bastante evidente os laosque ligavam as atividades econmicas nocentro da Amrica do Sul a mltiplas espa-cialidades. Rejeitando, assim, qualquer tese
que conra a caracterstica de isolamentos atividades produtivas e comerciais de-senvolvidas no termo da Vila Real do SenhorBom Jesus do Cuiab. Ademais, a efetivao
de uma rota comercialefetiva e regular se con-cretizaria na segunda me-tade do sculo XVIII coma fundao da Companhiade Comrcio do Gro Pare Maranho, controladano por comerciantes deCuiab, mas pelas autori-dades metropolitanas.
E speramos quenossa anlise possa ter contribudo para aruptura com a percepo consagrada pelaproduo histrica sobre a reproduo daeconomia colonial no centro da Amrica
do Sul, marcada pelo isolamento e pelacarestia, ou pela inexistncia de produosignicativa.
Apesar das linhas de argumentao quedesenvolvemos neste artigo, algum historia-dor poderia questionar: mas anal de contas
qual a efetiva importncia econmica dessaproduo agrcola e dessas redes de comr-cio para a economia colonial? Obviamenteque nosso historiador j teria uma resposta
pronta para esta questo. Ele tem nmeros daproduo aucareira das capitanias do nor-te, da produo aurfera das Minas Gerais,do volume do trco de escravos e os dzimosda alfndega dos portos de Salvador e doRio de Janeiro, tem os valores dos dzimosdas diversas capitanias. Ou seja, dispe detodos os dados que demonstram que apesarde qualquer esforo de pesquisa emprica, aeconomia reproduzida nas minas do Cuiab e
do Mato Grosso, assim como de outras reasperifricas insignicante.
Nosso objetivo, contudo, no de-monstrar uma suposta proeminncia dasminas do Cuiab e do Mato Grossono Brasil colonial ou no imprio luso,inserindo o centro da Amrica do Sul nadisputa com Minas Gerais, Rio de Janeiro,Pernambuco e Bahia para impor-se comocentro dinmico da economia colonial.
O que pretendemos foi problema-tizar a expanso da economia colonial e aintegrao de um imenso territrio a estaeconomia, a partir da anlise sobre a pro-duo rural e as redes de comrcio. Apesarda pequenez desta economia em termosmonetrios, tendo como parmetro as ca-pitanias mais prsperas, acreditamos queuma anlise sobre a reproduo econmica
nas minas do Cuiab e do Mato Grosso podeser signicativa no apenas para o estudo decaractersticas locais ou regionais, mas paraa problematizao sobre o funcionamento ea reproduo daquilo que se convencionouchamar de Sistema Colonial.
O documento que
analisamos deixa bastante
evidente os laos que ligavam
as atividades econmicas nocentro da Amrica do Sul
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Tiago Kramer de Oliveira
Reerncias Bibliogrfcas
Fontes Primrias
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CARTA do ouvidor Joo Gonalves Pereira ao rei D. Joo V; Vila Real do Senhor Bom Jesus doCuiab, 07-10-1736; mss., microlme Rolo 01, doc. 89, (AHU) NDIHR/UFMT.CARTA do rei ao governador da capitania de So Paulo, Lisboa 12-06-1743. mss., livro C001doc.136, APMT.CARTA do rei ao governador da capitania de So Paulo, Lisboa, 20-02-1743. mss., livroC001 doc.128, APMTCARTA do rei D. Joo V ao governador Antnio da Silva Caldeira Pimentel, Lisboa, 08-10-1730. Registro de Cartas Expedidas Livro C 001, APMT.CARTA do rei do governador da capitania de So Paulo. Lisboa, 12-10-1739. mss., livroC001 doc.113, APMT.
CONSULTA do Conselho Ultramarino ao rei D. Joo V. Lisboa, 26-04-1746. mss., microlmeRolo 03, doc. 196, (AHU) NDIHR/UFMT.PARECER do Conselho Ultramarino ao rei D. Joo V. Lisboa, 09-02-1741. mss., microlmeRolo 03, doc. 144, (AHU) NDIHR/UFMT.RELAO (cpia) do ouro da Real Capitao. Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiab, 12-09-1740; mss., microlme Rolo 03, doc. 137, (AHU) NDIHR/UFMT.REPRESENTAO de Rodrigo Csar de Meneses ao rei D. Joo V. Lisboa, 08-01-1732; mss.,microlme Rolo 01, doc. 54, (AHU) NDIHR/UFMT.
Documentos PublicadosBORGES, Francisco Caetano.Anais de Vila Bela da Santssima Trindade. Publicaes Avulsas n 28.Cuiab: IHGMT, 2001.
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Alm da carestia e do isolamento: produo rural e redes de comrcio
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