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Silas Malafaia e os Direitos LGBT: Uma Análise das Interações na Página do Pastor
no Facebook1
Márcia FELICIANI2
Aline DALMOLIN3
Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS
Resumo
Silas Malafaia, líder evangélico da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, é
conhecido por seus discursos críticos a respeito de temas polêmicos. No presente artigo,
pretende-se observar a circulação desses discursos em sua página oficial no Facebook nos
anos de 2011 e 2012 com relação ao PLC/122 (mais conhecido como Lei Anti-Homofobia),
visto que nesse período as discussões sobre o projeto e o tema da homossexualidade
intensificaram-se. Buscaremos, assim, entender a atuação de Silas nos campos religioso,
político e midiático, segundo Bourdieu (2008), bem como seu papel de empreendedor
moral (BECKER, 2008) com relação à formação de opinião de seus fiéis.
Palavras-chave: Silas Malafaia; homossexualidade; Facebook; campos;
empreendedorismo moral.
1. Introdução
Os embates entre a Igreja Católica Apostólica Romana e a ciência começaram há
muito tempo e são marcados por acusações, punições por heresia e perseguição da Santa
Inquisição. Mesmo com o nascimento da Igreja Protestante, que criticava muitos dos
posicionamentos católicos, a religião continuou se sobrepondo ao conhecimento científico e
ao Estado como um todo. No Brasil, a própria colonização portuguesa não teria sido
possível sem o apoio da Igreja Católica, que também acabou por contribuir com a criação
da legislação do país, mesclando o direito dos homens com o direito divino.
Hoje, o Brasil é um país oficialmente laico, mas embora não tenha uma religião
oficial, ainda é o país com maior número de católicos no mundo4. Além disso, também
temos uma bancada religiosa composta por líderes evangélicos e católicos de vários
partidos, em grande parte adeptos da direita conservadora brasileira. Isso motiva a tensão
1 Trabalho apresentado na Divisão Temática de Comunicação, Espaço e Cidadania, da Intercom Júnior – XII Jornada de
Iniciação Científica em Comunicação, evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2 Acadêmica do 4º semestre do curso de Comunicação Social – Produção Editorial da Universidade Federal de Santa
Maria (UFSM). E-mail: [email protected]. 3 Professora do Departamento em Ciências da Comunicação da Universidade Federal de Santa Maria, doutora e mestre em
Ciências da Comunicação pela Unisinos. E-mail: [email protected]. 4 Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2013/07/brasil-ainda-e-o-maior-pais-catolico-do-mundo-
mesmo-com-reducao-de-fieis.html>.
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contínua entre religião e Estado. Ou seja, ainda que não seja autorizado, pela lei, que
ninguém imponha sua crença aos demais e que nenhum grupo possa tornar suas leis
religiosas parte integrante das leis civis, na prática não é bem o que se vê. Segundo o artigo
18 da Declaração dos Direitos Humanos:
Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este
direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar
essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância,
isolada ou coletivamente, em público ou em particular. (ONU, 1948)
Infelizmente, a prescrição não parece bem clara para alguns religiosos, que
confundem a livre manifestação da religião com uma liberdade de expressão sem limites.
Por conta disso, muitos temas que mobilizam a opinião pública e que, inicialmente,
deveriam ser pautados no campo político, acabam sendo discutidos, e muitas vezes
definidos, pelo campo religioso, como as pesquisas com células-tronco, a eutanásia, os
direitos sexuais e reprodutivos e, claro, as questões ligadas à homossexualidade. Com
relação à última, muitos atores religiosos manifestam no espaço público sua contrariedade à
livre expressão da orientação sexual, muitas vezes fazendo uso de discursos de ódio.
No Brasil, a lei 7.716/89 tipifica criminalmente a prática de discriminação devido à
raça, cor, etnia, procedência nacional ou religião, especificando condenação mais dura
quando ligada à divulgação do nazismo. Contudo, a legislação não prevê punição específica
a vários tipos de discurso de ódio – como é o caso de preconceito em função do gênero e
orientação sexual –, nem mesmo prescreve penas mais duras em casos de violência física ou
mesmo homicídio derivado de intolerância. Nesses casos, a saída legalmente encontrada no
judiciário vem sendo enquadrar criminalmente os casos de discriminação como “abuso de
direito”, pela falta de uma regulamentação específica para esses crimes.
O PLC/122, também conhecido como Lei Anti-Homofobia, foi proposto em 2006
pela deputada Iara Bernardi no sentido de suprir essa lacuna. Uma das principais
justificativas para a aprovação da lei, além do próprio combate à violência homofóbica,
seria o de incluir na legislação brasileira uma tipificação para a punição da violência
simbólica contra a população LGTBQIA, ampliando a abrangência das leis já existentes.
Apesar de proposto em 2006, as discussões acerca do projeto intensificaram-se entre 2011 e
2012, período em que houve audiências públicas para discussão do tema. O Pastor Silas
Malafaia, líder da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, foi convidado a participar
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dos debates como representante evangélico da população brasileira e manifestou fortemente
suas opiniões a respeito, promovendo campanhas e manifestações contrárias à aprovação do
projeto.
Presença constante nas mídias digitais, contando com os sites da Associação Vitória
em Cristo e do Portal Verdade Gospel, ambos de seu ministério, um canal no Youtube e
perfis no Facebook e no Twitter, Malafaia usou e abusou das plataformas disponíveis para
discutir questões referentes a direitos (ou privilégios, como ele afirma) dos homossexuais e
liberdade de expressão.
Como bem colocam Campos, Gusmão & Mauricio Jr. (2015), foram esses embates a
respeito do PLC/122 que fizeram de Silas “ator político e maior representante dos grupos
evangélicos conservadores” no contexto atual. A este estudo, cabe identificar a
movimentação midiática do Pastor e de seus seguidores em sua página no Facebook,
compreendendo seu papel de empreendedor moral em tal caso. Para tanto, percebe-se
necessária uma explanação a respeito do campo religioso, bem como de sua intersecção
com os campos político e midiático.
2. Campo religioso e sua intersecção com os campos político e midiático na
contemporaneidade
Campo, segundo Bourdieu (1983), refere-se a um espaço estruturado por posições
sociais e responsável por estruturá-las. Resumidamente, trata-se de um jogo, no qual os
agentes lutam entre si pelo domínio do respectivo capital – que é específico em cada
campo.
No caso do campo religioso, a movimentação do capital está ligada tanto a fatores
internos quanto externos. É perceptível a relação existente entre as crenças e seu contexto
social: os próprios desenvolvimento e institucionalização do campo religioso como tal estão
ligados ao crescimento das cidades (BOURDIEU, 1983).
É importante destacar que o campo religioso não é homogêneo, sendo composto por
uma infinidade de crenças com diferentes denominações, procedências e objetivos. Só no
Brasil, através do censo realizado pelo IBGE em 2000, constatou-se o surgimento de mil e
duzentas novas denominações religiosas em comparação à pesquisa anterior, de 1991
(CAMPOS, 2004). Segundo Bourdieu (2008), isso seria um reflexo da principal
característica de tal campo: a concorrência.
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Dentro das instituições religiosas também não há homogeneidade: existem
diferentes perfis de membros. Há os leigos (ou simples adeptos), de conhecimento mais
básico, e os dominantes, detentores de parte do capital simbólico em circulação no campo.
São esses que, através de seus discursos e do uso do carisma, são capazes de mobilizar os
demais em benefício das causas de seu interesse, despertando neles a necessidade de aliar-
se a elas (BOURDIEU, 2008).
Tal mobilização é perceptível na relação dos evangélicos com a política, que, como
aponta Maia (2006), encontra-se em constante crescimento. A influência exercida pelas
lideranças nos membros de congregações evangélicas é maior por vários fatores, dentre eles
a baixa renda e escolaridade de boa parte dos fiéis e, principalmente, a grande exposição
argumentativa a que estes são submetidos, visto que a maior parte deles pratica atividades
religiosas frequentemente. (MAIA, 2006).
Com a entrada das personalidades religiosas na política, a influência passou a se dar
no sentido de conquistar, além de fiéis, eleitores. Para isso, são dois os tipos de discursos
utilizados pelas lideranças: os considerados laicos, que apelam para valores e
conservadorismo (como no caso de Malafaia, que nega interesse religioso em seus
argumentos), e os efetivamente religiosos, que consideram os problemas políticos como
uma guerra espiritual e acreditam que só a presença de homens de Deus naquele meio pode
ser uma solução (MAIA, 2006).
Além do poder político adquirido pelas personalidades protestantes, há ainda a
ampliação do capital econômico de suas instituições. A concentração desse capital, por
consequência, permite a “invasão evangélica da mídia” (CAMPOS, 2004), multiplicando o
alcance dos discursos religiosos e fulminando a discussão acerca dos circuitos entre os
campos religioso e político (BRAGA, 2012). Esse contexto de intensa disputa pelos fiéis,
não raro é articulado a partir de estratégias de marketing, publicização e segmentação
características do campo midiático, sobretudo por parte das igrejas neopentecostais, de
modo que não é estranho ao contexto atual observarmos no Brasil o fracionamento de
igrejas não por cismas doutrinários, como ocorria no passado, mas sobretudo na orientação
por atingir um determinado público-alvo.
Percebe-se, então, que a reverberação de tais embates se dá, principalmente, pelo
processo de midiatização (BRAGA, 2012). O tema tem sido motivo de forte discussão entre
as alas mais conservadoras dos grupos religiosos, não só evangélicos (o Padre Paulo
Ricardo, representante católico da direita ultraconservadora, também é conhecido por seus
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discursos opressivos de forte oposição ao PLC/122). Malafaia destaca-se pelo vigor com
que discute a questão e, principalmente, por negar influência religiosa em seus argumentos.
Foi capaz de mobilizar (e ainda mobiliza) uma grande massa de fiéis a agir em
contrariedade à causa LGBTQIA, sendo os debates e manifestações relacionados ao PLC o
maior reflexo disso. A pergunta é: como ele desempenha tal papel? Uma resposta pode estar
no conceito de empreendedor moral, de Howard Becker (2008).
3. Silas Malafaia e o empreendedorismo moral
A lógica da concorrência não se verifica apenas dentro do campo religioso, mas
pauta a atuação dos diferentes atores religiosos para adentrar nas lógicas do campo
midiático. No contexto atual do campo evangélico brasileiro, observamos uma verdadeira
“guerra” por visibilidade (CUNHA, 2013), tanto por parte dos leigos quanto dos
dominantes – usando a terminologia bourdiana –, nas quais se enquadram disputas
simbólicas travadas com estratégias advindas de ambos os campos. Nessa guerra,
salientam-se as disputas em torno de questões referentes à ingerência sobre a vida humana e
a sexualidade.
Nesse contexto belicoso, muitos líderes religiosos evangélicos, qualificados de
considerável capital simbólico nas trincheiras de suas denominações religiosas, lançam-se
no campo midiático atuando como “profetas” (BOURDIEU, 2008), tendo que conquistar
simpatizantes pela manipulação simbólica. Nessa categoria poderíamos enquadrar
lideranças religiosas como Edir Macedo, Marco Feliciano e o próprio Silas Malafaia, que
aqui compreendemos em seu papel de empreendedor moral no debate público
contemporâneo.
Empreendedores morais, segundo Becker (2008), são, resumidamente, líderes de
opinião – com a diferença de que suas ações se dão no sentido de discutir regras e questões
referentes à moralidade social. Conforme o autor, os empreendedores dividem-se em
criadores e impositores de regras.
Os primeiros, como o próprio nome sugere, são responsáveis pela criação de regras
a partir do que consideram correto. Fazem de sua missão uma coisa quase sagrada,
acreditando que o mal do mundo só pode ser exterminado com a criação de regras. Por
preocuparem-se mais com o conteúdo, deixam a disseminação de suas leis para os
impositores: estes dedicam-se integralmente à persuasão dos demais, assegurando que as
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regras criadas sejam cumpridas, justificando sua posição e conquistando respeito. No
campo jurídico, a leitura dessas duas categorias pode ser exemplificada através das imagens
do jurista e do policial: o primeiro responsabiliza-se como criador, enquanto o segundo atua
como impositor de regras.
A partir da leitura de Becker (2008), podemos questionar-nos em qual dessas
categorias Malafaia classificar-se-ia. À primeira vista, podemos compreendê-lo como
impositor de regras, visto que ele sustenta seu discurso sobre homossexualidade como
“baseado na Bíblia” (quando cita trechos das escrituras que supostamente condenariam tal
prática) e justificado pelas garantias da Constituição (quando lança mão do conceito de
liberdade de expressão para defender seu direito a posicionar-se publicamente contra a
homossexualidade).
Contudo, Malafaia se atém a uma leitura fundamentalista da Bíblia, que ignora
interpretações que relativizam o contexto histórico da época na qual os textos foram
escritos, bem como postula a liberdade de expressão e de culto como direitos absolutos, que
se sobreporiam ao respeito às liberdades individuais como a livre expressão do amor e da
sexualidade. A partir dessa leitura, podemos alinhar a percepção de Malafaia como um
criador de regras, pois muitas das regras por ele preconizadas derivam de uma releitura da
tradição religiosa com base em uma moral conservadora. Também encontramos aí uma das
características dos indivíduos dominantes no campo religioso, segundo Bourdieu (2008): a
tendência à recepção seletiva e à reinterpretação das mensagens tradicionais.
Outra alternativa para interpretarmos a atuação de Silas Malafaia à luz da discussão
trazida por Becker (2008) seria propor uma terceira categoria ainda inspirada no autor,
contudo mais apropriada ao contexto da midiatização. Esta seria compreender a atuação de
empreendedores morais religiosos como Silas Malafaia enquanto reformuladores de regras:
a base dos regramentos que eles impõem já está criada, mas a leitura por eles realizada gera
divergências, por permitir mais de uma interpretação.
Essas diferentes articulações podem ser percebidas ao observarmos as atitudes do
Pastor de forma separada, nos campos religioso e político. Dentro de sua Igreja, Malafaia
atuaria mais como um impositor de regras, pois pelo fato de seus fiéis encontrarem-se em
um domínio simbólico próximo ao dele, Silas pode fazer uso das palavras da Bíblia para
embasar seus argumentos. Já quando se trata de uma discussão de nível público, no
contexto das redes sociais, por exemplo, Malafaia procura evitar referências religiosas,
utilizando a Constituição e estudos da psicologia para defender sua posição – reformulando,
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assim, as regras já existentes no sentido de dirimir as divergências e apontar sua visão como
correta. Na sequência, analisaremos com detalhe como Malafaia e os interagentes de sua
página no Facebook se posicionam com relação a esse debate.
4. Resultados da análise
Através da coleta das postagens realizadas na página do Facebook de Malafaia no
período de junho de 2011 a junho de 20125, obtivemos um total de 156 postagens dos mais
diferentes tipos - frases bíblicas, divulgação de eventos e produtos, chamadas para
programas, etc. Dessas, 11 diziam respeito aos embates entre o Pastor e seus fiéis e
homossexuais.
Apesar de serem, em sua maioria, frases curtas que levam a outros veículos (4 levam
ao programa de TV do Pastor, 1 leva a um vídeo no Youtube, 1 a uma matéria no site da
Folha de S. Paulo e 5 ao da Revista Veja, que contém matérias e notas relacionadas a Silas,
bem como uma entrevista), são bastante sugestivas da visão de Malafaia sobre a
homossexualidade e o PLC/122.
O Pastor alega amar os homossexuais, mas critica duramente suas práticas – que,
segundo ele, são condenadas por Deus. Como psicólogo, ainda defende a ideia de que a
homossexualidade é um fator comportamental e pode ser “revertida” com tratamento (foi
um dos grandes apoiadores do PDC/234 de 2011, projeto que ficou conhecido como “cura
gay”). Por fim, com relação ao PLC, seu argumento é de que fere um dos princípios básicos
da Constituição: o de liberdade de expressão. No caso da homossexualidade, Malafaia
difere opinião de discriminação, criticando fato de que, com a aprovação do projeto, ele e
os demais membros do campo religioso que compartilham de seu pensamento não poderiam
opinar a respeito do tema sem ser condenados.
Já com relação aos comentários, a coleta foi bem mais satisfatória: foram 1294
comentários recolhidos, onde se notou a divisão de opiniões entre os usuários. Realizamos
uma categorização das principais recorrências, selecionando os comentários mais
5 Faz-se importante destacar que os dados podem apresentar variações, devido a dois problemas na realização da pesquisa:
o primeiro refere-se ao fato de que, na primeira observação feita da página de Silas no Facebook, a rede social
disponibilizava o recurso de retorno aos anos anteriores; na segunda, quando fomos em busca das interações relacionadas
a cada postagem, essa opção já não se encontrava disponível. Tivemos, então, que procurar manualmente pelas postagens
que já havíamos coletado. Isso levou-nos ao segundo problema, que foi a perda de uma das postagens originais (não
conseguimos encontrá-la por tratar-se de imagem sem descrição) e o encontro de outras de que não tínhamos
conhecimento, o que sugere que a plataforma, na primeira observação, não nos apresentou todas as postagens do período.
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significativos e percebendo, assim, a presença de indivíduos apoiadores e contrários ao
Pastor.
Dentre os apoiadores, há a) os que utilizam o discurso religioso propriamente dito,
b) os que utilizam argumentos laicos e c) não-evangélicos com vinculação religiosa
explícita que apoiam o Pastor. Já quanto aos críticos das ações de Malafaia, há d)
indivíduos dotados de fé religiosa que não concordam com as ideias do Pastor, e) os que se
afirmam como homossexuais e defendem sua causa e f) os que não expressam ligação com
a causa LGBT, mas discordam do pensamento de Silas. Faremos, a seguir, uma explanação
a respeito de cada uma das categorias, apresentando exemplos dos comentários recolhidos.
a) Indivíduos que utilizam discursos religiosos: uso de argumentos que colocam a
homossexualidade como pecado, sendo, por isso, condenada por Deus. Na Figura 1, por
exemplo, percebe-se a crença no fato de que basear-se na Bíblia Sagrada isenta qualquer
indivíduo da acusação de discriminação; na Figura 2, o interagente faz uso de um versículo
da Bíblia para justificar o combate à homossexualidade; na Figura 3, por fim, o usuário faz
referência ao episódio bíblico da destruição da cidade de Sodoma (considerada
pecaminosa), comparando o destino de seus moradores ao dos homossexuais.
Figura 1: Comentário do interagente 1.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 2: Comentário do interagente 2.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 3: Comentário do interagente 3.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
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.
b) Indivíduos que utilizam argumentos laicos: reforçam os argumentos de que os
movimentos homossexuais têm o objetivo de impedir que os cristãos usufruam de sua
liberdade de expressão, usando expressões como “mordaça” e “censura”. Na Figura 4, o
interagente alega que a prioridade não são os direitos homossexuais, mas o exercício da
liberdade de expressão de quem não concorda com tal prática; o interagente da Figura 5
menospreza o movimento homossexual; na Figura 6, percebe-se referência à música
“Cálice (cale-se)”, de Chico Buarque, utilizada como forma de protesto à repressão durante
o Regime Militar. Coloca, assim, o PLC/122 como sendo uma forma de censura.
Figura 4: Comentário do interagente 4.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 5: Comentário do interagente 5.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 6: Comentário do interagente 6.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
c) Indivíduos com fé religiosa que discordam de Malafaia: argumentos de religiosos
que defendem a disseminação do amor de Cristo e o fim da perseguição aos homossexuais
promovida por Malafaia. O interagente da Figura 7 critica a postura de Silas e dos demais
líderes religiosos envolvidos na causa, alertando os demais fiéis com relação a tais atitudes.
Já na Figura 8, há uma crítica direta ao Pastor: para o interagente em questão, ele devia
preocupar-se em pregar a Palavra de Deus ao invés de promover tal comoção.
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Figura 7: Comentário do interagente 7.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 8: Comentário do interagente 8.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
d) Não-evangélicos que apoiam Silas: casos em que indivíduos de outras vinculações
religiosas manifestaram-se a favor do Pastor e alegaram concordância com seus
argumentos. Na Figura 9, um seguidor católico expressa admiração pelo Pastor. Ainda, faz
referência aos “católicos convertidos de verdade”, ou seja: declara-se membro da ala mais
conservadora do catolicismo. No caso da Figura 10, Malafaia e seus fiéis receberam apoio
de um ateu, que apresenta concordância no argumento referente à liberdade de expressão.
Figura 9: Comentário do interagente 9.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 10: Comentário do interagente 10.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
e) Homossexuais que defendem sua causa: alegam preconceito e discriminação por
motivos religiosos, e defendem que a crença de um grupo não deve afetar a sociedade em
geral. O interagente da Figura 11 não vê motivo para tal comoção, afirmando que os
homossexuais “se amam igual a todos”; na Figura 12, há uma crítica à discriminação
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promovida contra os homossexuais; a interagente da Figura 13 alega sentir-se discriminada
e critica pessoalmente as atitudes de Malafaia.
Figura 11: Comentário do interagente 11.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 12: Comentário do interagente 12.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 13: Comentário do interagente 13.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
f) Indivíduos que não se afirmam como homossexuais, mas defendem a causa LGBT:
acreditam que os homossexuais devem ser tratados com respeito, principalmente pelo fato
de o Estado ser laico. Na Figura 14, há menção a fatos históricos de perseguição religiosa,
comparando-os com o contexto atual; na Figura 15 há reforço do argumento de que a crença
de um grupo não deve aplicar-se à sociedade em geral – argumento fortalecido pelo
comentário da Figura 16, que apela para o princípio de laicidade do Estado.
Figura 14: Comentário do interagente 14.
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Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 15: Comentário do interagente 15.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Figura 16: Comentário do interagente 16.
Fonte: Página de Silas Malafaia, Facebook.
Há, ainda, casos em que os comentários são apenas de apoio a Malafaia (sem
participação efetiva no debate) e, também, inúmeros de baixo calão. É perceptível que o
debate entre os grupos é acirrado, com ambos os lados tentando defender e justificar sua
posição. Também nota-se a repetição de elementos nas falas dos interagentes e, inclusive,
deles próprios, que estendem sua participação em discussões acaloradas e provocativas,
evidenciando a tensão existente entre os campos religioso e político.
5. Considerações finais
A página no Facebook trata-se de apenas uma ponta no iceberg da rede de ação do
Pastor. Sua igreja apresenta níveis de crescimento impressionantes no que se refere a
número de membros e concentração de capital econômico, ação que ultrapassa os limites do
campo religioso e atinge os demais setores da sociedade.
Apesar de as postagens não apresentarem conteúdo satisfatório com relação aos
argumentos de Malafaia em específico, é possível perceber a circulação (BRAGA, 2012)
que ocorre a partir de seus discursos. O Pastor mostra-se cada vez mais capaz de mobilizar
uma grande massa nas causas de seu interesse, agindo como um verdadeiro líder do campo
religioso (BOURDIEU, 2008) e, por fim, como um empreendedor moral (BECKER, 2008)
dentro do espaço público social.
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Referências
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desvio. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p 153-167.
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<http://www.amigodecristo.com/2012/09/biografia-do-pastor-silas-malafaia.html>. Acesso em 4 de
julho de 2016.
Biografia de Silas Malafaia, Mensagens com Amor. Disponível em:
<http://www.mensagenscomamor.com/biografia-de-silas-malafaia>. Acesso em 4 de julho de 2016.
BOURDIEU, Pierre. Gênese e estrutura do campo religioso. In: _____. A economia das trocas
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_____. Algumas propriedades dos campos. In: _____. Questões de sociologia. Rio de Janeiro:
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CAMPOS, Renata; GUSMÃO, Eduardo; MAURICIO JR., Cleonardo. A disputa pela laicidade:
uma análise das interações discursivas entre Jean Wyllys e Silas Malafaia. Religião e Sociedade,
vol. 35, n. 2, p. 165-188, 2015.
CUNHA, Magali. A interseção mídia religiosa e mercado e a ressignificação de signos bíblicos
pelos evangélicos. Relegens Thréskeia: estudos e pesquisa em religião, vol. 3, n. 1, p. 1-24, 2014.
_____. O lugar das mídias no processo de construção imaginária do “inimigo” no caso Marco
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