Graa Maria Viana Monteiro
Evoluo da Atmosfera nos Planetas Interiores
Departamento de Geologia Faculdade de Cincias da Universidade do Porto
2001
Graa Maria Viana Monteiro
Evoluo da Atmosfera nos Planetas Interiores
v L v i U r i b ^ Q
AGRADECIMENTOS
Este trabalho teve incio em Setembro de 1999 e, ao longo de um ano e meio
houve um caminho percorrido que permitiu a sua concretizao.
Torna-se grato recuar no tempo e verificar que as primeiras palavras de gratido
vo para a Sr.a Professora Doutora Manuela Marques cuja orientao, persistncia e
disponibilidade tornaram possvel o alcance dos objectivos que eu pretendia atingir.
Quero ainda agradecer ao Eng. Orlando Matos Leite que, com amizade
concretizou, nas tecnologias de informtica, o CD-ROM que me havia proposto realizar.
Tambm me encontro em dvida para com a Empresa Alves McDade & Filhos,
Lda., pela cedncia de disponibilidade espacial e material, para a apresentao grfica
da tese.
Finalmente, no quero deixar de mostrar a minha gratido a todos os colegas,
amigos e familiares que, embora no mencionados especificamente, hajam contribudo
para que eu pudesse levar a bom termo a tarefa que me propus encetar.
RESUMO
Os planetas do nosso Sistema Solar so muito diferentes uns dos outros no seu aspecto exterior, tamanho e temperatura superficial. Mas, sendo a planetologia uma cincia em expanso, muitas das aparentes diferenas revelam-se, como, caminhos evolutivos divergentes. Neste trabalho explorada essa evoluo no que respeita s atmosferas dos planetas interiores, em especial de Vnus, da Terra e de Marte. Apesar de, possivelmente, os planetas interiores terem iniciado os seus percursos atmosfricos de forma semelhante, denota-se que houve alguns factores que os levaram ao presente estado. Dentro destes factores incluem-se a proximidade ao Sol, a estrutura interna planetria, os satlites e a existncia ou no de vida.
O trabalho aborda, nos Captulos I e II, a gnese das estrelas, das galxias e do Sistema Solar. Esta primeira parte da tese fundamental para a compreenso da constituio das atmosferas dos planetas interiores e suas possveis evolues, tema focado no Captulo III.
O resultado do estudo feito nos Captulos I, II e III, foi aplicado na organizao de um workshop destinado a Professores cuja licenciatura de Ensino de Biologia e/ou Geologia. O workshop constitui o Captulo IV e est organizado em duas partes. A primeira uma abordagem terica sobre a formao e constituio do Sistema Solar, seguida da evoluo da atmosfera nos planetas interiores. A segunda parte consta de exerccios que cimentam os conceitos tericos focados anteriormente, utilizando-se diverso material para o efeito.
Proporciona-se ento, um instrumento de trabalho que contribui para aumentar os conhecimentos dos docentes de Cincias Naturais do 7o ano e de Cincias da Terra e da Vida do 10 ano de escolaridade.
Uma das concluses retiradas desta apresentao refere-se necessidade de introduo de uma disciplina que aborde os contedos do Sistema Solar nos curricula universitrios dos cursos acima citados. Ao privilegiar os conhecimentos cientficos e didcticos do Professor, est-se a contribuir decisivamente para a eficcia do processo ensino/aprendizagem.
IN SHORT
The planets of our Solar System differ form each other in the way they look, their size and surface temperature. However, the planetology is an expanding science, and many of the apparent differences reveal as divergent ways of evolution. In this work it is explored the atmospheres evolution of the terrestrial planets, mainly of Venus, Earth and Mars. Besides of the possible similar atmospheric evolution in the terrestrial planets, there were few factors that took them to the present state. They are included in this factors the distance to the Sun, planetary internal structure, satellites and presence or not of life.
This work deals, in Chapters I and II, with star and galaxies genesis, and Solar System constitution. This first part of the thesis is fundamental to the understanding of the inner planets atmosphere composition, limelight subject on Chapter III.
The study on Chapters I, II and III results in a workshop bound for teachers, whose degree is in Biology and/or Geology. The workshop makes Chapter IV, divided in two parts. The first one is theoretic, dealing with the Solar System genesis and its constitution, followed by the atmospheric evolution on the terrestrial planets. The second part, consist of practical exercises about the first part, using much didactic material to reach the proposes.
It is given a work instrument which increases the knowledge of the Natural Science and Life and Earth Science teachers.
One of the conclusions taken after the workshop presentation, is the need of a subject introduction about Solar System, on the university curricula courses cited above. By privileging the scientific and didactic knowledge of Teachers, the learning/teaching process is favoured.
RESUME
Les plantes du systme solaire sont trs diffrents les uns des autres soit dans l'aspect extrieur, soit en dimension et en temprature superficielle. Mais, comme la planetologie est une science en expansion, beaucoup de ces diffrences se rvlent par chemins volutifs divergents. Dans ce travail s'explore l'volution dans ce qui concerne aux atmosphres des plantes intrieures, notamment de Vnus, de la Terre et de Mars. Certainement que les plantes intrieures ont inici leurs parcours volutifs de faon semblable et c'est remarquable, qu'il y a des facteurs qui les ont conduit l'tat prsent. D'entre eux s'inclut la proximit du Soleil, la structure interne du plante, les satlites et l'existence de la vie.
Le travail aborde, dans les Chapitres I et II, l'origine des toiles, des galaxies et du systme solaire. Cette premire partie de la thse est fondamentale pour la comprhension de la constitution de l'atmosphre des plantes intrieures et leurs probables volutions, thme dj abord au Chapitre III.
Le rsultat de l'tude fait aux Chapitres I, II et III, a t apliqu l'organisation d'un workshop destin aux Professeurs licencis l'Enseignement de Biologie et Gologie. L'workshop a t trait au Chapitre IV et s'est organis en deux parties. La premire fait un abordage thorique sur la formation et constitution du Systme Solaire, suivie de l'volution de l'atmosphre aux plantes intrieurs. La deuxime partie est un ensemble d'exercices qui solidifient les matires abordes auparavant, en utilisand le matriel le plus divers.
Se proportionne de cette faon, un instrument de travail qui va augmenter le savoir des professeurs de Sciences Naturelles et de Sciences de la Terre et de la Vie.
Une des conclusions a prendre de la prsentation de cet workshop, se rapporte au besoin d'introduire une discipline sur le Systme Solaire aux curricula universitaires des Licencis. Se privilgie le savoir scientifique et didactiques des Professeurs et le procs enseignement/apprentissage qui rehaussera son efficacit.
INDICE pgina
Introduo 1
CAPTULO I- ESTRELAS E GALXIAS 2
1- Estrelas 2
1.1- A natureza da luz 2
1.2- Tipos de estrelas 6
1.3- O Sol 9
2- Galxias 14
2.1- Tipos de galxias 14
2.2-A Via Lctea 16
CAPTULO II- SISTEMA SOLAR 19
1- Constituio do Sistema Solar 19
1.1- Os planetas 19
1.2- Asterides, meteoritos e cometas 27
2- Origem do Sistema Solar 30
2.1- Introduo histrica 30
2.2- Conhecimentos actuais sobre a gnese do Sistema Solar 31
CAPTULO III- A TMOSFERA DOS PLANETAS INTERIORES 3 5
1- Atmosfera terrestre 35
1.1- Estrutura da atmosfera 3 5
1.2- Fotoqumica da atmosfera 38
1.2.1 - A fotoqumica da troposfera 41
1.2.2- Fotoqumica da estratosfera 45
1.2.3- Fotoqumica da mesosfera e da atmosfera superior 50
1.3- Relao da atmosfera com outros sistemas 52
1.3.1- A actividade biolgica e a atmosfera 53
1.3.2- Relao da hidrosfera e litosfera com a atmosfera 55
1.4- Evoluo da atmosfera terrestre 59
2- Atmosfera de Vnus 65
2.1- A estrutura da atmosfera 67
2.2- Ionosfera de Vnus 69
2.3- Qumica da atmo sfera de Vnus 71
2.4- Circulao da atmosfera de Vnus 75
2.5- Evoluo da atmosfera de Vnus 77
3- Atmosfera de Marte 80
3.1- A estrutura da atmosfera e da ionosfera de Marte 83
3.2- Fotoqumica da atmosfera de Marte 83
3.3- Dinmica da atmosfera de Marte 85
3.4- Evoluo da atmosfera de Marte 88
CAPTULO IV- ORGANIZAO DE UM WORKSHOP 92
- Concluses 97
- Referncias Bibliogrficas 100
Anexos 105
INTRODUO
A necessidade de encontrar uma explicao para a gnese e evoluo do nosso sistema
planetrio e do Universo em geral, conduziu ao desenvolvimento de novas tecnologias,
algumas das quais so amplamente divulgadas atravs dos meios de comunicao,
nomeadamente da internet. Neste contexto e fruto da sua curiosidade natural, os jovens esto
particularmente sensibilizados para este tipo de problemas, sendo cada vez mais necessria a
sua discusso na sala de aula. Os professores devem, por conseguinte, estar preparados e
permanentemente actualizados para que a dinmica do ensino/aprendizagem progrida
satisfatoriamente.
O estudo do Sistema Solar um dos contedos programticos da disciplina de Cincias
Naturais do T ano do Ensino Bsico e Cincias da Terra e da Vida do 10 ano do Ensino Secundrio. Para compreender esta problemtica , no entanto, fundamental conhecer a origem
das galxias e das estrelas, do sistema solar e, em particular, dos planetas interiores, uma vez
que a Terra pertence a este grupo de planetas. Por outro lado a origem e evoluo da vida
parecem estar intimamente relacionadas com as caractersticas fsicas dos planetas e, em
particular, com a estrutura, composio e evoluo da atmosfera. Atendendo a todos estes
aspectos escolhi como tema para o trabalho de Mestrado a Evoluo da Atmosfera nos
Planetas Interiores.
O trabalho ser organizado em quatro captulos, dos quais os trs primeiros constituem
o substracto terico para a organizao de um workshop e a elaborao de um CD-ROM
destinado a proporcionar materiais de trabalho exclusivamente para professores.
Assim, nos Captulos I e II, sero abordados alguns aspectos relacionados com a
gnese das estrelas e das galxias e analisada a problemtica relativa ao sistema solar e aos
mtodos utilizados para o seu estudo. O Captulo III ser dedicado ao estudo da estrutura e
evoluo das atmosferas dos planetas interiores, com destaque especial para o planeta Vnus
por possuir uma atmosfera diferente de todas as outras. Por fim, no Captulo IV, ser discutida
a estruturao de um workshop destinado a professores licenciados em Biologia, Geologia e
Ensino da Biologia-Geologia que leccionam o 3o Ciclo do Ensino Bsico e o Secundrio.
1
CAPTULO I - ESTRELAS E GALXIAS
1- ESTRELAS
A luz uma forma de energia qual os nossos olhos so sensveis. atravs dela que
observamos tudo o que nos rodeia. Essa energia que nos chega da maior parte das estrelas
comeou a sua longa viagem muito antes de termos nascido. H estrelas mais distantes, cujo
trajecto luminoso anterior ao aparecimento do Homem na Terra. Algumas estrelas esto to
distanciadas da Terra, que a sua luz demora milhares de anos a chegar at ns. A luz do Sol,
distanciado apenas de 149,6 milhes de quilmetros, leva cerca de 8 minutos a chegar Terra.
As enormes distncias a que se situam os diferentes corpos do universo, obrigam utilizao
de unidades especficas das quais a mais frequente o ano-luz1.
O Sol a estrela mais prxima da Terra. Comparada com outras estrelas quase
insignificante, embora a possamos considerar grandiosa por estar perto de ns. As estrelas com
mais brilho no so necessariamente as que esto mais prximas de ns. Vrias estrelas com
menos brilho esto, na realidade, mais perto do nosso planeta do que a maioria das brilhantes.
O estudo da natureza da sua luz emitida pelas estrelas permite conhecer melhor a sua
composio e compreender a sua gnese e evoluo.
1.1- A natureza da luz
A luz visvel irradiada pelas estrelas e captada pelo olho humano um conjunto de
ondas, uma elctrica e outra magntica, sendo conhecida tambm pelo nome de onda
electromagntica e avana no vcuo a uma velocidade constante de 300 000 km/s (Fig.1.1).
A relao ntima entre as foras elctricas e magnticas conduzem-nos ideia da
existncia de regies onde as referidas foras so sentidas. Assim, uma carga elctrica
envolvida por um campo elctrico e um man circundado por um campo magntico.
Oscilaes perpendiculares entre campos elctricos e magnticos constituem a radiao
electromagntica.
1 O ano-luz (ai) corresponde distncia percorrida pela luz, durante um ano, velocidade de 300 000 km/s (9,46 x IO12 km). O Parsec (pc, equivalente a 3,26 al) e a Unidade Astronmica (UA, correspondente distncia mdia em km entre a Terra e o Sol = 1,496 x 10 8 km) so outras unidades de distncia utilizadas em astronomia.
O brilho das estrelas est relacionado com a sua luminosidade (quantidade de energia luminosa emitida pelas estrelas em cada segundo).
2
Comprimento de onda
Onda magntica
Fig.I.l- Esquema de radiao electromagntica.
A luz visvel possui um comprimento de onda extremamente curto, cerca de cem vezes
menor do que um milmetro. Para expressar medidas to reduzidas criou-se uma unidade de
medida suficientemente curta, o nanmetro (nm), que corresponde a IO"9 m. O comprimento
de onda da radiao visvel varia de 400 nm e 700 nm (do violeta ao vermelho, respectivamente).
A radiao invisvel, isto , aquela cujo comprimento de onda se situa fora dos limites da
visibilidade humana foi, durante vrios anos, objecto de estudos vrios, chegando-se
concluso que existem diversos tipos de radiao deste tipo. Para facilitar a compreenso e
localizao dos comprimentos de onda das radiaes visveis e no visveis, criou-se o espectro
electromagntico, que abarca todas as radiaes conhecidas (Fig.1.2). Acima dos 700 nm existe
a radiao infravernelha (700 nm a 0,2 mm) seguida das ondas rdio (0,2 mm a 10 km). Abaixo
dos 400 nm aparece a radiao ultravioleta (400 nm a 10 nm), os raios X (10 nm a 0,01 nm)
e, por fim, os raios gamma (abaixo dos 0,01 nm).
De toda a gama de radiaes conhecidas, as visveis e as ondas rdio so as que chegam em
maior quantidade superfcie terrestre. Para captar a radiao visvel utilizam-se os telescpios
pticos, sendo as ondas rdio captadas por radiotelescpios. A radiao infravermelha absorvida
pelo vapor de gua atmosfrico, da que os observatrios deste tipo de radiao se situem em locais
com pouca humidade. Porm, a localizao ideal para os instrumentos sensveis s radiaes
infravermelha e ultravioleta a atmosfera a cerca de 900 km de altitude. A aparelhagem que
3
permite a sua deteco so satlites astronmicos, sondas-balo e foguetes, equipados com
sensores destas radiaes, emitindo-as para receptores situados na superfcie terrestre.
Se um feixe de luz visvel (ou branca) passar atravs de um gs, os seus tomos
absorvero a radiao num comprimento de onda muito especfico apresentando um padro de
linhas escuras, que constituem as linhas espectrais. Estas revelam-se muito importantes em astromomia podendo fornecer-nos informaes sobre a composio qumica de objectos muito
distantes. O seu estudo sistemtico tratado pela Espectroscopia.
Comprimento
de Radiao
onda
inferior a 0,01 nm Raios Gamma
0,01 a 10 nm Raios X
10 a 400 nm Radiao Ultravioleta
400 a 700 nm Radiao Visvel
700 a 2000 nm Radiao Infravermelha
0.2 mm a 10 km Ondas Rdio
Fig.1.2- Espectro electromagntico (adaptado de Lopez e De Granurt 1999).
Os tomos e as molculas so responsveis pela produo de espectros.
Bohr tentou estudar a relao entre o espectro atmico e a estrutura atmica,
comeando pelo elemento mais simples e leve, o hidrognio, cujo tomo constitudo por um
ncleo rodeado de um electro (Fig.1.3).
O ncleo dos tomos contm protes e neutres. Os primeiros tm carga elctrica positiva, igual e oposta do electro, de tal modo que o tomo no seu todo tem carga elctrica neutra. Por outro lado o neutro no possui carga elctrica.
4
,'"' Electro..
\ \ \ Ncleo I j I
\ \ ^ ' / / \ \ y* /
Fig.1.3- Esquema de um tomo de hidrognio (ncleo rodeado por um electro).
Bohr concluiu que o nico electro do tomo de hidrognio s poderia orbitar o ncleo
numa determinada rbita, estabelecendo assim os conceitos de estado base (aplicvel a todos
os outros elementos) e de rbitas de Bohr. Para um electro saltar de uma rbita de Bohr para
outra, o tomo de hidrognio tem de ganhar ou perder uma determinada quantidade de
energia. Se o electro for para uma rbita mais exterior, ter de absorver energia, passando-se
o contrrio no caso de ir para uma rbita interior. o chamado estado excitado de um tomo
e como no uma situao estvel, o electro tem tendncia a voltar ao seu nvel base,
restituindo-se ao exterior a energia recebida sob a forma de fotes (unidade indivisvel de
energia) (Fig.1.4).
Fig.1.4- Transferncia de um electro para uma rbita superior e sua restituio ao estado base (adaptado de Lopez e De Granrut 1999).
Quando um electro que se encontra numa rbita mais baixa absorve um foto com
comprimentos de onda na ordem dos 91 nm (radiao ultravioleta), elevado a uma rbita de
infinito (oo) muito distante e longa, significando que o electro escapou ao seu ncleo,
tornando-se o tomo original ionizado. A perda de um electro implica que a estrutura do
tomo passe a ser semelhante de um tomo com um nmero atmico inferior (nmero
atmico iguala o nmero de protes existentes no ncleo).
5
O nmero de protes do ncleo de um tomo, determina o elemento de que se est a
tratar. No entanto, o mesmo elemento pode ter (no seu ncleo) um nmero diferente de
neutres, constituindo os istopos. O oxignio um bom exemplo de um elemento com vrios
istopos, pois possui 8 protes, mas pode ter 8, 9 ou 10 neutres, sendo representados por 160, 170 e 180, respectivamente3 (Gil e Cardoso 1987a, Guillemot 1996, Kaufinann e
Freedman 1998).
1.2- Tipos de estrelas
As estrelas so corpos celestes capazes de produzir energia. Quando observadas a olho
nu possvel vislumbrar algumas diferenas. A intensidade luminosa por exemplo. No entanto,
caractersticas como a sua massa, as dimenses, a temperatura superfcie e a magnitude
absoluta4 s so detectveis com a utilizao de instrumentos especficos.
Os astrnomos tm estudado as linhas espectrais das estrelas. Algumas apresentam
espectros nos quais o hidrognio dominante, embora outras, incluindo o Sol, mostrem linhas
espectrais correspondentes a elementos mais pesados como o clcio, o ferro e o sdio. Quando
os espectros estrelares aparecem sob a forma de bandas espectrais, significa que se est perante
uma composio molecular, como, por exemplo, o xido de titnio, o xido de zircnio e os
compostos de carbono.
Para facilitar o estudo e classificao das estrelas, estas foram agrupadas de acordo
com o seu espectro em classes espectrais (O B A F G K e M) cada uma das quais pode ser
subdividida em patamares (0 a 9) denominados tipos espectrais. A sequncia espectral reflecte
a temperatura da estrela, pertencendo as de maior temperatura classe O (acima dos 25 000
K ) e as de temperaturas mais baixas classe M (cerca dos 3000 K).
Sendo o hidrognio um dos elementos mais abundantes no Universo, foroso concluir
que tambm exista na composio estrelar, sobretudo nas estrelas que apresentam
temperaturas superiores a 10 000 K. Os fotes vindos de seu interior conduziro os tomos do
gs de hidrognio ao estado ionizado, o que implica a ausncia de linhas espectrais para o
hidrognio ou a presena de linhas muito fracas para este elemento, tal como acontece nas
3 Os algarismos 16,17 e 18 representam o nmero de massa (somatrio dos protes e neutres). 4 A magnitude das estrelas pode ser aparente ou absoluta. A magnitude aparente refere-se ao brilho aparente de uma estrela, visto da Terra. A magnitude absoluta a verdadeira quantidade de energia luminosa libertada por uma estrela. 5 K o smbolo utilizado para kelvin, unidade termodinmica de temperatura.
6
estrelas O e B2. Nas estrelas com temperaturas inferiores a 10 000 K, a maioria dos tomos de
hidrognio esto num estado de energia base conduzindo a linhas espectrais fortes para este
elemento, como o caso das estrelas AO e A5. Para temperaturas de 3000 K as bandas espectrais
so predominantemente referentes ao xido de titnio (estrelas M6). O Sol uma estrela G2, sendo
rica em ferro e clcio.
Hertzsprung e Russel verificaram existir um determinado padro quando compararam a
magnitude das estrelas com as suas cores6 e tipos espectrais. Das suas observaes resultou
um diagrama no qual a luminosidade das estrelas comparada com a temperatura e
caractersticas do espectro, o Diagrama H-R (Hertzsprung-Russel) (Fig.1.5).
L
U
M
I
N
O
S
I
D
A
D
E
(LO)
10 6 _
104
IO2
IO"2
10"
Temperatura da superfcie (K)
25000 10000 8000 6000 5000 4000 5000
Sequncia Principal
05 B0 AO 4-M8
- -10
F0 GO
Tipo espectral
Fig.1.5- Diagrama Hertzsprung-Russel (adaptado de Kaufmann e Freedman 1998).
Magnitude absoluta
+5
+10
-15
6 As cores das estrelas esto directamente relacionadas com a sua temperatura superficial. Se uma estrela possui baixa temperatura superficial a sua cor avermelhada. No caso de uma estrela possuir alta temperatura a sua colorao azul. As estrelas com temperatura intermdia, como o Sol, so amarelas.
7
Todas as estrelas existentes se enquadram neste diagrama. As estrelas pertencentes
Sequncia Principal, incluem a maioria das estrelas visveis, desde as quentes e brilhantes,
estrelas azuis (parte superior do diagrama), s frias, indistintas e estrelas vermelhas (parte
inferior direita do diagrama). As que pertencem Sequncia Principal, tal como o Sol, esto
numa fase de evoluo onde & fuso termonuclear (combusto do hidrognio e produo de
hlio) o processo dominante. O tempo total que uma estrela demora a consumir o hidrognio
do ncleo corresponde ao tempo de vida como estrela da Sequncia Principal. Uma vez
esgotado o hidrognio, a estrela deixa de lhe pertencer e evolui em funo da sua massa
original. Para estrelas com a massa do Sol ou um pouco superior a evoluo passa por um
estdio de Gigante Vermelha (Fig.1.6). Estas terminaram o seu tempo como estrelas da
Sequncia Principal, perdendo uma razovel quantidade de massa e aumentando os seus
dimetros. O Sol tornar-se- numa Gigante Vermelha, ou at numa AGB7. Antes de chegar a
um termo crtico, vai perdendo progressivamente a sua massa, as suas camadas exteriores,
ficando com o ncleo exposto e circundado de esferas de gs ejectado (nebulosa planetria).
Uma vez que no ocorrem reaces termonucleares, ele simplesmente arrefece, conduzindo ao
aparecimento de uma relquia da estrela, & An Branca.
Nas estrelas com grande massa (25 vezes a massa do Sol), o consumo de hidrognio
vai originar a adio de uma nova esfera de material volta do ncleo. Devido s reaces
termonucleares, a energia destas estrelas libertada para as camadas externas a to altos
valores que as camadas externas se expandem tremendamente. O resultado uma estrela
Supergigante, muito luminosa e maior do que as Gigantes Vermelhas, com um raio 1000 vezes
superior ao do Sol. Numa estrela Supergigante as sucessivas camadas circundantes do ncleo
consomem as restantes reservas de hidrognio. Quando este estdio conduz a um fim violento,
as camadas externas ficam suficientemente finas e uma poro de energia escapa-se numa
torrente de luz, a Supernova, recomeando um ciclo de reaces termonucleares e a sntese de
novos elementos. No centro da supernova pode ficar um ncleo constitudo por neutres, a
estrela de neutres. O colapso de estrelas ainda mais massivas pode terminar numa regio
densa e com tanta gravidade que atrai toda a matria, no emitindo nenhuma forma de luz, o
chamado buraco negro (Baker 1971, Dorozynski 1997, Kaufmann e Freedman 1998).
As estrelas AGB (as>mptofcgjartbranslar)sbesi ^ segunda\ez.
8
Massa da sequncia principal (MG) -
0,1 1 10 100
0,5 i 3 10 Massa final - |
Fig.1.6- Sequncia da evoluo estrelar, tendo por base a massa (adaptadodeKaufinarmeFreedman 1998).
1.3- O Sol
Sendo o corpo mais importante do Sistema Solar, o Sol tem sido objecto de diversos
estudos nomeadamente atravs do Observatrio Heliosfrico e Solar (SOHO), lanado para o
espao em 1995 pela Agncia Espacial Europeia em conjunto com a Aeronutica Nacional e
Administrao Espacial. Em 1996 esta sonda chegou a uma posio estratgica, obtendo
informaes e dados que permitem o actual conhecimento deste corpo (Lang 1998).
O Sol , basicamente, uma grande bola de gs constituda essencialmente por
hidrognio. No seu interior, a temperatura atinge valores muito elevados (15 x 10 K) e a
presso aumenta tanto que se inicia um ciclo de reaces nos ncleos de hidrognio, de que
9
resulta a sua fuso e produo de ncleos de hlio. & fuso nuclear ou fuso termonuclear
(Encrenaz e Bibring 1985, URL 10).
Para produzir a luminosidade do Sol necessrio converter em hlio cerca de 6 x 10n kg
de hidrognio por segundo. Neste caso, o processo de fuso nuclear corresponde, na verdade,
a um conjunto de reaces denominado de Reacoproto-proto (Fig.1.7).
Protes
Deutrio
Hlio 4
Fig.1.7- Esquema da reaco proto-proto (adaptado de Kaufmann e Freedman 1998).
Devido s elevadas temperaturas do interior das estrelas natural que dois protes do
hidrognio choquem e se unam ou fundam para formar deutrio, um istopo de hidrognio
( H). Neste processo um dos protes convertido em neutro, libertando duas pequenas
partculas, um neutrino (sem carga elctrica e quase nenhuma massa) e um positro (electro com carga positiva). Um terceiro hidrognio (proto) funde-se com o deutrio para produzir
hlio (3He) com emisso de um foto gama, seguindo-se a fuso de dois ncleos de hlio
( He), para formar um istopo estvel de hlio (4He), com a libertao de dois tomos de
hidrognio. So ento necessrios 4 ncleos de hidrognio para formar um nico ncleo de
10
hlio (4He). Durante todo este processo perdeu-se uma pequena quantidade de massa que
convertida em energia, libertada sob a forma de fotes (Fvre 1999).
Toda a energia gerada por reaces no ncleo, energia termonuclear, transportada
para a camada de gs mais fina do Sol (fotos/era) que emite a luz visvel para o espao. A
opacidade da fotosfera tem a ver com a adio de um electro extra aos tomos de hidrognio,
o que os torna ies negativos. Esse electro extra s pode ser desligado se absorver um foto, de
qualquer comprimento de onda visvel, e uma vez que os referidos ies existem em grande
quantidade e so eficientes absorvedores de luz, a fotosfera torna-se opaca, da que essa seja
considerada a superfcie do Sol (Henarejos 1998, Kaufmann e Freedman 1998, Khalatbari
1999).
A fotosfera (5800 K) apresenta um padro granulado, em que cada um dos grnulos
mede 1000 km de comprimento e rodeado por limites mais escuros de temperatura mais
baixa (300 K). Estas granulaes parecem dever-se a movimentos circulares entre gases mais
quentes e mais frios (conveco) produzindo, os primeiros, a parte brilhante e, os segundos, as
zonas mais escuras e frias. Maiores e mais escuras que os limites das granulaes so as
manchas solares que ocorrem devido interaco de campo magntico solar com os gases
quentes da fotosfera. Nas regies onde o campo magntico particularmente forte, os ies e
electres carregados (plasma) so projectados para fora, resultando uma zona mais fria.
Observaes destas manchas solares revelaram que o seu nmero varia periodicamente num
ciclo de 11 anos, o Ciclo de Manchas Solares.
Quando ocorre um eclipse total a cromos/era solar torna-se visvel. Embora se estenda
at 2000 km acima da fotosfera, apresenta uma temperatura de 25 000 K e os electres do gs
que a compe, ao passarem de nveis energticos superiores para inferiores, emitem fotes que
lhe conferem o aspecto rosado, devido aos comprimentos de onda emitidos se situarem nos
656,3 nm do espectro da luz visvel. A observao da cromosfera com filtros especiais revelou
a existncia de numerosos filamentos verticalizados, as espculas (Fig.1.8).
Geralmente as espculas encontram-se organizadas em super grnulos, regies de
clulas convectivas muito grandes na fotosfera. Ainda relacionada com a cromosfera e as
manchas solares, est a formao de proeminncias solares arqueadas de gs magnetizado
(Fig.1.9).
l i
Fig.1.8- Espculas na cromosfera (in, Kaufmann e Freedman 1998).
Fig.1.9- Proeminncia solar (in, URL 17).
O SOHO tambm ajudou a conhecer a atmosfera solar ou coroa, zona que se estende da cromosfera at vrios milhes de quilmetros. constituda por tomos em altos estdios
de ionizao que, devido s altas temperaturas (> 2 x IO6 K), se movem a altas velocidades.
Este gs completamente ionizado, com protes e electres de alta velocidade e composio
qumica semelhante da fotosfera, mas sem os ies pesados, constitui o chamado vento solar (URL 10). Fotografias de raios X da coroa solar revelam que, entre densos arcos magnticos,
existem regies menos densas onde tubos de fluxo magntico esto abertos ao espao
interplanetrio. Estes buracos da coroa, que cobrem, primordialmente, as regies polares, estendem-se tambm s regies equatoriais em determinadas longitudes, podendo constituir a
fonte da maior parte do vento solar.
Os objectos do Sistema Solar constituem variados tipos de obstculos fsicos ao fluxo
radial do vento solar, dependendo o comportamento deste, das caractersticas dos corpos que
se colocam no seu caminho, nomeadamente a presena ou no de atmosfera nesse corpo, a
existncia de um campo magntico intrnseco e do estado fsico do seu interior (Fig.1.10).
12
Fig.1.9- Comportamento do vento solar perante objectos do Sistema Solar com diferentes caractersticas, a) o vento solar intera^ directamente com o corpo; b) o vento solar interage com a densa atmosfera; c) o corpo bom condutor e desprovido de atmosfera e campo magntico intrnseco; d) corpo com campo magntico intrnsrointerro(adar*adodeEheren^
Nos casos a) e c) o vento solar incide directamente no corpo central. A Lua um
exemplo do tipo a) em que o corpo absorve os ies do vento solar, uma vez que no bom
condutor (interior quase todo slido) e o fluxo magntico existente entre os planetas {fluxo interplanetri) entra por difuso. Em c) o corpo bom condutor e impede que o fluxo interplanetrio penetre no seu interior. Cria-se uma espcie de lenol magntico volta do
corpo central. O caso b) apresenta-se como um corpo central possuindo atmosfera, mas sem
campo magntico, o que vai conduzir a uma interaco directa entre o vento solar e a
atmosfera superior do corpo (Vnus, Marte, Titan, cometas). Por fim, no caso d), o corpo
possui um campo magntico exterior {magnetosfer) suficientemente forte para deflectar o
13
campo magntico do vento solar (Mercrio, Terra, Jpiter, Saturno e Urano) (Encrenaz e
Bibring 1985, Atreya et ai. 1989, Bourdial e Guillemot 1999).
2- GALXIAS
Em algumas zonas do espao as estrelas aglutinam-se em estruturas que se designou
chamar de galxias. Nelas encontramos estrelas jovens e velhas que evoluem ao longo de
milhes de anos. A anlise da luz emitida por galxias distantes mostra que se esto a afastar
de ns a uma velocidade directamente proporcional sua distncia. Este facto permite afirmar
que nos encontramos num universo em expanso.
Fred Hoyle foi o primeiro cosmologista a utilizar o termo Big-Bang para designar a
teoria que explica a formao do Universo. Considera-se, actualmente, que h cerca de 15
bilies de anos o Universo teve origem num ponto extremamente denso (singularidade) que se
expandiu aps exploso (Big-Bang) gerando o tempo e o espao. Houve libertao de grande
quantidade de energia que se foi transformando progressivamente em matria. Nos primeiros
momentos s existiam partculas elementares (quarks) que se foram juntando para formar as
partculas fundamentais (protes e neutres). Estes, por seu lado, agruparam-se constituindo
os ncleos de hidrognio, hlio e outros elementos como o ltio, o boro e o berlio. Surgiram
os electres e os fotes. Aps algum tempo comearam a formar-se as primeiras estrelas
(estrelas de Ia gerao) e as galxias. As estrelas, por sua vez, foram formando
progressivamente os outros elementos mais pesados (Ikonicoff 1996, Greffoz 2000a, Greffoz
2000b, Ikonicoff 2000).
2.1- Tipos de galxias
As galxias mantm-se muito prximas umas das outras devido existncia de foras
atractivas. Observaes do Telescpio Espacial Hubble, sugerem que a gnese das galxias
est relacionada com atraces gravticas entre muitas nuvens de gases e protoestrelas,
evoluindo, posteriormente, para a estrutura galctica. A referida estrutura no igual para
todas as galxias existentes no Universo. Existe um padro que as permite agrupar em
galxias em espiral, galxias elpticas e galxias irregulares.
As galxias em espiral (Fig.1.10) apresentam braos arqueados de estrelas que partem
de um ncleo central. De perfil tm a forma de uma lente convexa. As zonas dos braos
contm estrelas de Ia gerao (Populao II) constitudas pelos elementos mais leves como o
14
hidrognio e o hlio. Quando evoluem para o estdio de consumo termonuclear do hlio,
geram carbono e oxignio ou elementos mais pesados no caso de serem estrelas mais massivas.
Ao chegarem ao fim de suas vidas expelem as camadas externas, conduzindo formao de
estrelas de 2agerao ou Populao I (com idade no superior a IO7 anos) ricas em elementos
pesados e encontradas, geralmente, no plano da galxia fora dos braos da espiral (Pottasch
1984,Veilleuxetal. 1998).
Fig. 1.10- Galxia em espiral (in, URL17).
As galxias elpticas tm precisamente a forma que o prprio nome sugere e so
desprovidas de material interestrelar8. Por esse motivo, a formao de novas estrelas no se processa, da que a sua maioria seja Populao II, gigantes vermelhas (Fig.I.l 1).
Fig.I.l 1- Galxia elptica (in, Kaufmann e Freedman 1998).
Por fim, as galxias irregulares (Fig.I.l2) apresentam-se com formas distorcidas e
assimtricas. Podem surgir de colises com outras galxias e so ricas em hidrognio ionizado
(H I). Estas galxias so associaes de estrelas jovens pertencentes s classes espectrais O e
8 O material interestrelar essencialmente constitudo por gases e poeiras cuja natureza no , ainda, bem conhecida.
15
B {associaes OB). De salientar ainda que as galxias intermdias entre as elpticas e as
irregulares tm a designao de galxias lenticulares.
Fig.1.12- Galxia irregular (in, Kaufinann e Freedman 1998).
Estudos revelam que os milhes de galxias de todas as classes no esto distribudas
ao acaso no Universo. Encontram-se em agrupamentos galcticos denominados de enxames. A
galxia onde se encontra o Sol, a Via Lctea, pertence a um enxame de apenas 17 galxias, no
grupo local, sendo a galxia Andrmeda (galxia em espiral) a maior e mais massiva. Os
prprios enxames de galxias agrupam-se formando os super enxames (Uchupi e Emery 1993,
Kaufinann e Freedman 1998, Peebles et ai. 1998).
2.2- A Via Lctea
A nossa Galxia pertence classe das galxias em espiral reunindo cerca de 100.000
milhes de estrelas e material interestrelar. Possui um ncleo central do qual saem dois braos
que vo espiralando a estrutura.
Vista de lado, a Via Lctea achatada no plano onde se encontram quer os braos da
espiral quer a regio fora dos braos {disco galctico) dilatando na zona do ncleo. Nos
braos h predominncia de estrelas da Populao II pobres em metais. Na regio central
ocorrem estrelas das Populaes I e II, sendo estas ltimas j muito antigas.
A distribuio de aglomerados de estrelas velhas, Populao II ou enxames globulares,
determina a distribuio esfrica do halo galctico, que roda mais lentamente do que o resto
da Galxia (Fig.1.13).
16
^/"Enxames globulares
Halo galctico
Fig.1.13- Esquema da Via Lctea (adaptado de Khalatbari 1999).
Estudos de emisses rdio na nossa Galxia revelaram que todo o material, incluindo o
Sol, gravita em torno do seu centro na mesma direco com uma velocidade aproximadamente
constante.
Para que a rotao se mantenha constante entre as estrelas exteriores ao Sol, os
astrnomos suspeitam da existncia de grandes quantidades de matria entre elas. No entanto,
esta matria no emite luz nem to pouco aparece no espectro electromagntico. Da a
denominao de matria negra. Embora no se saiba bem a sua composio, h suspeitas de que se trata de estrelas indistintas ou pequenos buracos negros. Outra possibilidade a
existncia de partculas constituintes dos tomos, partculas subatmicas, que no emitem ou absorvem radiao electromagntica. A quantidade de matria negra diminui medida que se
avana para o centro da Galxia, contrariamente ao aumento de densidade do gs ejectado
pelas estrelas da Populao II. Muitas dessas estrelas com mais de 3 massas solares
consomem-se mais rpida e intensamente, com a consequente formao de elementos pesados.
Neste estdio a estrela aumenta o seu dimetro e expele as suas camadas externas, antes de se
transformar numa an branca ou numa supernova. Este processo implica o deslocamento do
meio interestrelar, dando origem a compresses que, possivelmente, esto na origem de novas
estrelas e sistemas planetrios. Como j foi referido, a exploso de uma estrela supergigante
17
pode conduzir a uma concentrao de massa infinitamente grande numa regio em que a
gravidade imensa, ou seja, um buraco negro. Uma vez que no emite luz, supe-se que no
centro da nossa Galxia existe um buraco negro (Baker 1971, Pottasch 1984, Kaufmann e
Freedman 1998).
18
CAPITULO II- SISTEMA SOLAR
O Sol e o seu sistema planetrio formam um pequeno e limitado conjunto na vastido
do Universo. Se reduzssemos o Sol s dimenses de uma laranja, o planeta mais distante,
Pluto, seria do tamanho da cabea de um alfinete e estaria afastado 400 m da laranja. A
gnese e constituio do nosso Sistema Solar foi, de h muitos sculos, objecto de estudo,
com formulao de teorias que serviram de base para o conhecimento actual. Desde a
observao directa, a olho nu, at pesquisa por radiotelescpios, lanamento de telescpios
espaciais e de sondas equipadas com radares, altmetros e espectrmetros, muitos dos
mistrios encontraram soluo, enquanto que outros tomavam o lugar dos primeiros.
1- CONSTITUIO DO SISTEMA SOLAR
Na Via Lctea, uma de entre os milhes de galxias existentes no Universo, encontra-
se o Sistema Solar (SS), constitudo pelo Sol, Planetas, Asterides e Cometas, para alm de
poeiras, gs e partculas energticas emitidas pelo Sol (vento solar). O Sol , sem dvida, o
maior e o mais importante corpo do Sistema Solar, concentrando cerca de 99% de toda a sua
massa. A sua volta orbitam nove planetas, milhares de asterides e ainda os corpos mais
gelados do SS, os cometas.
1.1- Os planetas
De acordo com as pesquisas at hoje feitas so conhecidos nove planetas a orbitar o
Sol no mesmo sentido, sendo Mercrio o mais prximo, a 5,79 x IO7 km (0,387 UA),
seguindo-se Vnus, Terra, Marte, Jpiter, Saturno, Urano, Neptuno e Pluto, o ltimo, a
5,909 x IO9km (39,54 UA).
Num plano prximo do equador do Sol as rbitas planetrias aproximam-se da forma
circular, excepo das rbitas de Mercrio e Pluto, que so elpticas, tendo por isso
elongao ou excentricidade (Encrenaz e Bibring 1985, Beatty et ai. 1999).
Os planetas mais prximos do Sol completam uma rbita solar em menos tempo do que os mais afastados. Alm disso, possuem um perodo rotacional ou seja, giram em torno do seu eixo imaginrio. Este pode variar a sua posio relativamente ao plano da rbita, criando
um ngulo designado por inclinao axial, responsvel pela existncia de estaes.
19
De acordo com as suas caractersticas fsicas, os planetas dividem-se em dois grandes
grupos. Por um lado, aqueles com composio semelhante terrestre, densos, rochosos e com
superfcie slida, correspondentes aos quatro planetas mais prximos do Sol e denominados
por Planetas interiores ou telricos e, por outro lado, os mais distantes, frios, de grandes dimenses, essencialmente gasosos e sem superfcie slida, denominados por Planetas exteriores, gasosos ou Jovianos 9(Fig.II. 1).
Pluto um caso parte devido sua composio e dimenses, no sendo considerado
em nenhum dos dois grupos. ainda notvel a grande quantidade de corpos menores ou
satlites que orbitaram todos os planetas, excepo de Mercrio e Vnus. Os trs maiores planetas do SS, Jpiter, Saturno e Urano possuem mais de uma dezena deles.
As principais caractersticas dos nove planetas esto sintetizadas na Tabela I, onde se
inclui a distncia mdia ao Sol, o dimetro equatorial, a massa, a densidade, o perodo orbital,
o perodo rotacional e o nmero de satlites naturais.
Fig.II. 1- Constituio do Sistema Solar (adaptado de URL17).
Os quatro planetas interiores ou telricos so os mais prximos do Sol, muito densos
quando comparados com os exteriores e possuem atmosferas que apenas constituem uma
pequena fraco das suas massas totais. A Terra , naturalmente, o termo comparativo entre
estes planetas. Da o hbito de se designarem tambm de planetas terrestres.
9 O termo Joviano utilizado para Jpiter, Saturno, Urano e Neptuno, por apresentarem caractersticas semelhantes a Jpiter.
20
oo o> o>
c CD E
LL
CD
CD a o a CO Q . CD n 2u. i5 o
CO CD
E CD
CO o o t/5 TO "S c
_C0 Q_ (/) o
a to
8 CD
LO 'CD Q . O 1*. 00
Per
odo
ro
taci
onal
CD 0 0 L O
a.
S o co" CN
xz 0 0 CD co" CN
CN CO T " CN
2? 00 O
CN o"
O) ai
"O
O) CO co"
Per
odo
or
bita
l
O)
00
*" CN CN
CD CN L O " CD CO
00 O) co" 0 0 CO
CO O0_
V
s CD O)" CN 00
00 t " CD
r~-" CN
Den
sida
de
(g/c
m3)
00
LO" CN L O "
LO L O "
C3) co"
co co_
1^-o"
CO CD
CO o CM"
Mas
sa
(kg)
CO CN
O
X CO co"
CN
O
X O)
CN
o X
o co"
CN
O
X co~
1 ^ CN
o X
CS
CD CN
o X
L O "
CN
O
X
00"
CD CN
O
X o
o
X CO
Uni
dade
s as
tron
mic
as
(UA)
1"-00 CO o"
CO CN
o" CN IO
CO o CN L O "
LO IO ai
CN CN o>" o"
CO
LO os" CO
Dis
tnc
ia
ao S
ol
(km
)
CO
O
X a> r--" LO
co O
X CN oo" O r
CO
o X
CO ai a-
CO
O
X a> S - * CN CN
CO O T -X
oo"
CD
o X o ai CN X T
CD O * X o LO"
oo CN
CD o * X o a-" o LO
CO
o X
o co" a> LO
O r * u
3 U L . CU S
10 3 C
>
cd s_ s_
Mercrio (Fig.II.2) o primeiro planeta a partir do Sol sendo conhecido desde tempos
antigos. Apresenta-se, muitas vezes, como um dos corpos celestes mais brilhantes. Como
possui uma atmosfera quase negligencivel de hlio e sdio, os valores da temperatura
superficial so extremos. Assim, durante o dia as temperaturas so da ordem dos 427C,
enquanto que noite baixam para os -183C, temperatura suficiente para congelar o dixido de
carbono e o metano.
Comparativamente com os outros planetas interiores muito denso possuindo cerca de
60% a 70% de metal na sua composio, o que indica a presena de um ncleo que ocupa
cerca de 42% do volume do planeta. Dados obtidos pela sonda Mariner 10, indicam um
campo magntico equivalente a 1% do campo magntico terrestre, provavelmente gerado por
correntes elctricas num ncleo no estado lquido (Kaurmann e Freedman 1998, URL 15). A
superfcie de Mercrio muito semelhante da Lua, crivada de crateras de impacto,
produzidas pela coliso de corpos do SS, nomeadamente asterides e meteoritos.
Fig.II.2- Planeta Mercrio (in, URL17).
Vnus considerado o planeta irmo da Terra, pois ambos possuem dimetros,
densidades e campos gravticos muito semelhantes (Fig.II.3). No entanto, este planeta revela-
22
http://Fig.II.2
se completamente diferente em muitos aspectos. Embora esteja mais distanciado do Sol que
Mercrio, tem uma temperatura superficial superior (cerca de 480C), provocada por um
enorme efeito de estufa devido presena de uma espessa atmosfera rica em dixido de
carbono, o que implica uma presso superficial cerca de 92 vezes superior da Terra. As
primeiras observaes de Vnus pareciam indicar um rpido movimento de rotao. Contudo,
a utilizao de radares permitiu estudar a superfcie oculta pelas densas nuvens e determinar o
seu lento movimento de rotao. Com efeito, a espessa camada de nuvens que envolve o
planeta movimentada por ventos fortes (cerca de 350 km/h), responsveis pela ideia inicial de
uma rotao planetria muito elevada. Esta de facto excepcionalmente lenta (243 dias
terrestres) e retrgrada. A inexistncia de campo magntico neste planeta pode estar
relacionada com a lenta rotao planetria. Na superfcie venusiana foi possvel identificar
estruturas de vrios tipos, nomeadamente crateras de impacto, vastas plancies e estruturas
vulcnicas, entre outras (Encrenaz e Bibring 1985, Uchupi e Emery 1993, Frankel 1996,
URL8).
Fig.II.3- Superfcie venusiana obtida por radar e tratada em computador (in, URL 17).
A Terra o terceiro planeta do SS, ocupando uma posio privilegiada relativamente a
todos os outros (Fig.II.4). Encontra-se a (1UA) 149,6 milhes de km do Sol. O seu invlucro
gasoso estende-se, tal como em Vnus, por mais de 100 km acima da superficie, mas
constitudo na sua maioria por azoto e oxignio. A atmosfera terrestre responsvel pela
presena de temperaturas mdias de cerca de 20C superfcie do planeta, o que permite a
23
http://Fig.II.3
existncia de vida ao contrrio do que acontece nos outros planetas. Foi com o aparecimento
dos primeiros seres vivos (algas azuis e verdes) que a quantidade de oxignio atmosfrico
aumentou devido fotossntese. Neste processo os seres vivos utilizam a energia solar,
molculas de gua e de dixido de carbono, convertendo-as em matria orgnica e molculas
de oxignio. As nuvens que cobrem quase metade do planeta so formadas por vapor de gua,
composto que ocorre tambm sob a forma lquida, ocupando uma rea de 71% da superfcie.
A morfologia terrestre bastante variada sendo progressivamente modificada devido
dinmica interna e externa do planeta. Os processos internos, estreitamente relacionados com a
dinmica das placas tectnicas, so responsveis pela gnese da maior parte das grandes
estruturas terrestres, nomeadamente cadeias montanhosas, depresses e terrenos complexos.
Por outro lado, os agentes dinmicos externos, como o vento, a gua e o gelo, actuam sobre
essas estruturas modificando o seu aspecto e gerando novas morfologias. Neste contexto, as
estruturas de impacto deixadas pelo choque de meteoritos atravs da histria do planeta, so
hoje pouco visveis, porque uma grande parte j foi destruda ou modificada pelos agentes
dinmicos terrestres.
Fig.II.4- Planeta Terra visto do espao (in, URL 17).
O planeta interior mais afastado do Sol Marte (Fig.II.5), tambm chamado planeta
vermelho. Apresenta grandes variaes trmicas com temperaturas oscilando entre os 20C e
os -140C. Estas variaes devem-se a uma atmosfera muito tnue composta essencialmente
por dixido de carbono, retida por um campo gravitacional fraco e exercendo uma presso
24
http://Fig.II.4
superficial de 1% em relao da Terra. Marte tem uma inclinao axial semelhante da
Terra, apresentando, tal como o nosso planeta, estaes do ano (Kaufinann e Freedman 1998,
Jakosky 1998, Ravallec 2000, URL15).
Das observaes feitas na superfcie do planeta, verificou-se existirem estruturas com
origem muito diversa, desde crateras devidas ao impacto de meteoritos, at estruturas
vulcnicas, elevaes, depresses e plancies. Nas regies polares encontram-se acumulaes
de compostos gelados sendo visveis estruturas provocadas por fortes ventos que assolam a
superfcie do planeta.
Fig.II.5- Imagem da superfcie marciana (in,URL3).
Os planetas exteriores, com a excepo de Pluto, so tambm designados por planetas
gigantes, devido s suas dimenses. Tm baixa densidade, um elevado nmero de satlites e
possuem sistemas de anis. As suas atmosferas constituem uma percentagem importante da
massa total do planeta e so compostas essencialmente de hidrognio e hlio. De acordo com
medies e estudos tericos, estes planetas podero conter um ncleo central de material
gelado ou rochoso envolto por hidrognio e hlio a elevadas presses, no sendo conhecidas
estruturas superficiais.
Jpiter o maior planeta do SS, um gigante gasoso com temperaturas da ordem dos
-110C, medidos na superfcie da atmosfera, isto , na parte superior das nuvens. Dados
fornecidos por sondas espaciais evidenciaram a presena de tempestades em toda a atmosfera.
A Grande Mancha Vermelha (Fig.II.6) conhecida desde h 300 anos, uma estrutura
25
http://Fig.II.5
atmosfrica oval e tempestuosa cujas dimenses ultrapassam o dimetro terrestre (40 000 km
por 14 000 km).
H pouco tempo foi descoberto o sistema de anis de Jpiter constitudo por poeiras
finas mantidas em rbita pela enorme fora gravitacional do planeta. Os 16 satlites so
igualmente atrados por essa fora, podendo dizer-se que Jpiter funciona como um SS em
miniatura, chegando mesmo a emitir mais radiao do que aquela que recebe. Quatro destes
satlites (Io, Europa, Ganymede e Callisto), so designados por Satlites Galileanos e orbitam
no plano equatorial do planeta.
Fig.II.6- A grande Mancha Vermelha de Jpiter (in, URL17).
Saturno (Fig.II.7) o segundo maior planeta gasoso e, semelhana de Jpiter, emite
mais radiao do que a que recebe. A sua estrutura atmosfrica mais alargada do que a de
Jpiter, embora seja tambm constituda por hidrognio e hlio. Contm nuvens cuja
temperatura chega a atingir os -180C, mas o que mais chama a ateno em Saturno o
espectacular sistema de anis constitudos por partculas rochosas e gelo (ou ambos
conjugados), com dimenses muito variadas (micromtricas a mtricas). Os anis so mantidos
em rbita equatorial devido s foras gravitacionais do planeta e dos seus satlites (Atreya et
ai. 1989).
26
http://Fig.II.6
Fig.II.7- Saturno e seus anis (in, URL17).
Urano o terceiro planeta exterior. igualmente gasoso, encontrando-se a uma
distncia aproximada de 19,22 UA (2,867 x IO9 km) do Sol. Com uma temperatura na parte
externa da atmosfera de -218C, um planeta com menos turbulncia atmosfrica do que os
planetas anteriores, muito embora a composio atmosfrica seja idntica. Possui um sistema
de anis muito finos, um elevado nmero de satlites e um eixo rotacional quase paralelo ao
plano da sua rbita.
Neptuno assemelha-se em tudo a Urano, embora tenha o seu eixo menos inclinado,
apresente uma maior actividade atmosfrica e um menor nmero de satlites.
Pluto o ltimo planeta do SS com uma temperatura mdia de -223C. Imagens
obtidas pelo telescpio Espacial Hubble, revelaram a presena de zonas polares geladas e de
um satlite, Caronte. Estudos pormenorizados permitiram concluir que Pluto e Caronte tm
dimenses semelhantes e que os seus movimentos parecem indicar deslocaes orbitais mtuas
(Encrenaz e Bibring 1985, Kaufmann e Freedman 1998, Beatty et ai. 1999).
1.2- Asterides, meteoritos e cometas
Entre as rbitas de Marte e Jpiter, entre 2,2 e 3,4 UA do Sol, gravitam milhares de
corpos designados por asterides (Fig.II.8). De acordo com a Lei de Bode10, nesta regio do
SS, seria de esperar a presena de um planeta, precisamente na rbita de Ceres, o maior dos
asteride (1020 km). Verifica-se, no entanto, que esse planeta no existe mas sim um conjunto
de corpos planetesimais gravitando no seu lugar. O modelo mais utilizado para explicar este
10 A Lei de Bode procura explicar atravs de uma expresso matemtica o espaamento entre os planetas do SS.
27
http://Fig.II.7
facto est relacionado com a impossibilidade de accreo dos corpos planetesimais devido a
perturbaes gravitacionais induzidas pela presena de Jpiter.
o Y
y Terra
Vnus
T Mercrio
Fig.II.8- Localizao da cintura de asterides no SS.
Estudos vrios revelam que os asterides so corpos com forma irregular, de
composio rochosa e metlica, cuja superfcie se apresenta crivada de crateras de impacto
resultantes de colises entre eles. Estas colises produzem fragmentos, os meteorides, que
podem atingir os planetas interiores, incluindo a Terra. Quando um meteoride de pequenas
dimenses entra na atmosfera terrestre, desintegra-se originando um rasto luminoso,
denominado de meteoro (tambm conhecido por estrela cadente). Se o meteoride sobrevive
ao trajecto na atmosfera planetria e atinge a sua superfcie, denomina-se de meteorito. O
resultado desta coliso , pois, uma cratera de impacto cujo aspecto e dimenses dependem de
vrios factores, nomeadamente da direco de impacto e do tamanho dos corpos. A grande
cratera de impacto no Arizona (Fig.II.9), o exemplo de uma estrutura deste tipo. Com 200
km de profundidade e 1,2 km de dimetro, foi formada h cerca de 50 000 anos devido ao
impacto de um meteorito de composio essencialmente metlica, com 50 m de dimetro e
animado de uma velocidade de 40 000 km/s.
1 Asterides Marte
Jpiter
28
http://Fig.II.8
Fig.II.9- Cratera de impacto no Arizona (in, Beatty et al. 1999).
Para l da rbita de Pluto encontram-se os corpos mais frios do SS, os cometas.
(Fig.II.10). A distncias superiores a 49,39 UA, as temperaturas so suficientemente baixas
para gelar a gua, a amnia, o metano e dixido de carbono, compostos estes que agregados
com partculas rochosas formam o ncleo destes corpos, com apenas alguns quilmetros de
dimetro. Devido grande excentricidade das suas rbitas, quando se aproximam do Sol, a
radiao solar funde parcialmente os compostos gelados e forma-se uma camada de hidrognio
sua volta, o envelope, com 15 000 a 1 000 000 km A progressiva desgaseificao do ncleo e
do envelope desenvolve a cabeleira, uma espcie de nuvem composta por gs e finas poeiras,
visvel e distendida numa direco oposta da radiao solar e que chega a atingir milhes de
quilmetros (Baker 1971, Atreya et ai. 1989, Uchupi e Emery 1993). Aps vrias rbitas
volta do Sol, o cometa acaba por desaparecer devido progressiva fuso e extino das suas
camadas externas. No entanto o material meteortico embebido nas substncias congeladas,
continua a gravitar o Sol numa corrente de meteoros.
Fig.II.10- Cometa (in, URL17).
29
http://Fig.II.9http://Fig.II.10http://Fig.II.10
A maioria dos cometas com perodos inferiores a 200 anos so designados por cometas
de perodo curto e parecem localizar-se entre a rbita de Neptuno e 500 UA, na chamada
Cintura de Kuiper. Os cometas de perodo longo demoram entre 1 a 30 mil anos a completar a
rbita solar e situam-se para l da Cintura de Kuiper, at cerca de 50 000 UA, num
reservatrio de trilies de cometas, a Nuvem de Oort (Encrenaz e Bibring 1985, Kaufmann e
Freedman 1998, Beatty et ai. 1999).
2- ORIGEM DO SISTEMA SOLAR
H milhares de anos pensava-se que o nosso planeta era o centro do Universo. O Sol, a
Lua, os Planetas e as estrelas eram como que divindades. Porm, alguns duvidavam que assim
fosse e faziam observaes e registavam medidas. Foi apenas no princpio do sculo XVII que
o Homem compreendeu, pela primeira vez, qual a verdadeira posio da Terra relativamente
ao Sol e aos outros planetas.
2.1- Introduo histrica
As primeiras interrogaes srias sobre problemas de astronomia surgem com os
pensadores Gregos. A princpio pensava-se que os planetas, o Sol e a Lua, rodavam volta da
Terra, erro que perdurou por mais de 15 sculos. Alguns astrnomos gregos, entre os quais
Eratstenes, compreenderam que a Terra e os outros planetas se deslocavam em torno do Sol
em rbitas aproximadamente circulares. Durante a Idade Mdia os escritos destes autores
foram ignorados. Apenas na altura do Renascimento a cultura europeia redescobriu o sistema
heliocntrico, teoria segundo a qual o Sol o centro do Sistema Solar, com os planetas a
gravitar em torno dele. Foi Coprnico que props tal conceito e Galileu apoiou-o com
raciocnios de lgica irrefutvel. Mas s com o surgimento do telescpio que a veracidade da
teoria foi confirmada. No fim do sc.XVII, Newton exps a sua teoria da mecnica do
movimento dos corpos celestes e os mtodos matemticos para o calcular. Esta nova conquista
terica, em conjunto com a utilizao do telescpio, chamou a ateno de todos os
astrnomos para o SS, sendo descobertos novos planetas e satlites.
Havia comeado uma fase de estudo sistemtico dos planetas e do SS da qual
emergiram diferentes modelos explicativos para a sua formao. Descartes (sc.XVII) foi o
primeiro a tentar explicar cientificamente a existncia do SS, avanando com uma teoria
30
baseada na turbulncia, segundo a qual o Universo est repleto de turbilhes (vrtices) com
grande variedade de tamanhos. Mas, aps a descoberta das trs leis de Newton, foi
abandonada, uma vez que no explicava o aparecimento desses mesmos turbilhes. Mais tarde,
Kant (sc.XVII) e Laplace (sc.XVII-XVIII), propuseram uma teoria explicativa da formao
do SS baseada numa nbula primitiva, a partir da qual o Sol e todos os planetas se teriam
formado. A presumvel nuvem de gases em rotao contraa e, posteriormente, transformava-
se num disco que formava substncias slidas, os planetas e satlites. Esta teoria foi fortemente
criticada, pois os gases tm tendncia para se dispersarem e se a maioria da massa do SS se
encontra no Sol, este seria detentor da maioria do momento angular11, o que no se verifica.
Ainda no sc.XVIII, Buffon props uma teoria catastrfica para a gnese do SS.
Sugeriu que este se teria formado a partir da ejeco de material solar aps a coliso de um
cometa com o Sol, h cerca de 70 000 anos. A ideia da coliso de um cometa foi mais tarde
substituda por Bickerton (1880), Chamberlain (1901) e Moulon (1905) pela coliso com uma
outra estrela. Os materiais estelares, por sua vez, poderiam accrecionar ou unir para formar os
planetas, segundo as teorias accrecionais. Para Arrhenius (1859-1927) e Alfvn (1908), o Sol
encontrou duas nbulas, uma de gros mais densos, no volteis, que se foi condensando de
modo a formar os planetas interiores e outra constituda principalmente por hidrognio, que
aps condensar mais longe, formou os planetas exteriores, menos densos e gasosos (Baker
1971, Encrenaz e Bibring 1985, Kaufnann e Freedman 1998).
2.2- Conhecimentos actuais sobre a gnese do Sistema Solar
Os conhecimentos actuais sobre a origem e formao do SS baseiam-se nas teorias de
que o Sol e os planetas tiveram origem na contraco e condensao gravitacionais de uma
nuvem ou nbula planetria inicial. Os progenitores de uma nbula planetria inicial podem ser
as estrelas gigantes vermelhas ou as supernovas, quando comeam a ejectar as suas camadas
gasosas externas.
A onda de choque provocada por esse fenmeno vai comprimir o meio interestrelar
circundante, acelerando quer o incio de reaces quer a sntese de novos elementos. O estudo
dos elementos radioactivos permite determinar a idade aproximada do SS. Dataes
radiomtricas, em meteoritos, indicam uma idade de 4,6 Ga. Elementos como o plutnio 244 e
11 O momento angular o produto do momento de inrcia pela velocidade angular.
31
o iodo 129, mostram que entre o isolamento do material protoestrelar e a formao dos
planetas deve ter decorrido um tempo de cerca de IO8 anos. Esta a fraco temporal
correspondente passagem da nuvem protoestrelar por entre os braos da espiral galctica
(Martinez 1987, Atreya et ai. 1989, Kaufmann e Freedman 1998).
A nbula planetria, composta por gases e poeiras em turbulncia, inicia atraces
gravitacionais e, consequentemente, para que o momento angular se mantivesse constante, a
rotao aumentou, o disco achatou e expandiu na zona equatorial, como ilustra a Fig.II.ll. O
raio desta esfera de gs seria aproximadamente IO4 raios solares, igualando a rbita de Pluto.
A maior concentrao da matria localizava-se na regio central chamada Protosol, muito
densa e precursora do Sol. Passados cerca de 100 milhes de anos, aps o incio da contraco
gravitacional da nbula, a temperatura elevou-se acima dos 2000 K, tendo-se iniciado as
reaces termonucleares que deram origem a uma nova estrela.
Fig.II. 11- Esquema da rotao da nbula solar (adaptado de Kaufmann e Freedman 1998).
Aps esta fase foi atingido o equilbrio entre as presses e temperaturas dos
constituintes do disco achatado que girava em torno da estrela recm formada. Este disco
protoplanetrio arrefeceu e os seus constituintes comearam a solidificar de acordo com as
suas temperaturas de condensao12, determinando a distribuio dos elementos na nbula
protoplanetria. Substncias pouco densas como a gua, o metano e a amnia, que condensam
a temperaturas baixas, ficaram naturalmente, mais afastados da fonte trmica, ao contrrio de
elementos densos e com altas temperaturas de condensao como o alumnio, o titnio, o
clcio, o magnsio, o silcio, o ferro, o sdio e o enxofre, que se distriburam mais prximo do
12 A temperatura de condensao a temperatura a que um determinado elemento ou composto solidifica.
32
http://Fig.II.ll
Sol (Pottasch 1984, Uchupi e Emery 1993). De facto, o primeiro planeta do SS, Mercrio,
rico em ferro e possui uma grande densidade, ao contrrio de Neptuno, mais afastado e
essencialmente constitudo por hlio e amnia.
A partir do arrefecimento da nbula protoplanetria, as poeiras chocaram
aleatoriamente e accrecionaram. O resultado das sucessivas colises foi a formao de
planetesimais e, posteriormente, de protoplanetas, de maiores dimenses. Aps novos
choques entre eles formaram-se os planetas interiores. Podem estes ter iniciado a sua existncia
como esferas de rochas parcialmente fundidas, onde os elementos mais densos foram atrados
gravitacionalmente para o centro, formando o ncleo. Em contrapartida, os elementos menos
densos dos planetas recm formados, ficaram superfcie, constituindo, posteriormente, a
crusta. A formao das atmosferas dos planetas interiores poder ter ocorrido durante o
primeiro bilio de anos desde o incio do processo accrecionrio e, provavelmente, foi
removida ou modificada ao longo da histria colisional. J mais afastado do Sol, onde a
amnia e o metano so condensveis, formaram-se os planetas exteriores, detentores de
pequenos ncleos rochosos e de espessas atmosferas.
Os anis de Jpiter, Saturno e Urano continuam a lanar dvidas sobre as suas origens.
So interpretados como restos da nbula planetria que nunca accrecionou ou como
fragmentos resultantes da coliso de planetesimais quer com o planeta quer com os seus
satlites. Os protoplanetas que possuam uma rotao inibidora da formao de um corpo
planetrio nico, teve como resultado, a accreo desse material num grande nmero de
planetas secundrios ou satlites. No entanto, os planetas podem capturar outros mais
pequenos, devido sua fora gravitacional, transformando-os em satlites. A Lua, por
exemplo, formou-se a partir de material ejectado da prototerra aquando da coliso de um
asteride de grandes dimenses (Baker 1971, Encrenaz e Bibring 1985, Hnarejos 1998,
Reyraud 2000). No possvel, contudo, generalizar a origem dos satlites dos planetas do SS,
uma vez que cada planeta um caso isolado de evoluo.
Os asterides, como j foi referido, so planetesimais que nunca chegaram a
accrecionar devido fora gravtica de Jpiter que alterava, frequentemente, as suas rbitas. O
seu estudo , pois, muito importante na compreenso da evoluo e composio dos planetas
interiores.
33
Os corpos mais afastados e gelados do SS encontram-se em dois grandes reservatrios
situados a enormes distncias do Sol. Os cometas so, pois, como que vestgios gelados de
uma nbula inicial, pelo que o seu estudo se revela importante para conhecermos a sua possvel
composio (Beatty et ai. 1999).
CAPTULO III- ATMOSFERA DOS PLANETAS INTERIORES
H cerca de 4,6 bilies de anos, quando todos os planetas se formaram a partir da
accreo da nbula planetria, as suas atmosferas primitivas eram muito semelhantes. Com o
decorrer do tempo, cada planeta evoluiu de forma diferente, de tal modo que hoje a atmosfera
de Mercrio quase nula, a de Vnus de uma densidade enorme, possuindo a Terra e Marte
igualmente atmosferas muito prprias.
O estudo da composio e estrutura das atmosferas destes planetas e dos processos
que a tm lugar constituem o objectivo principal deste captulo. Naturalmente, a atmosfera
terrestre ser a primeira a ser abordada uma vez que vai funcionar como termo de comparao
para o estudo das atmosferas dos outros planetas.
1- ATMOSFERA TERRESTRE
A camada gasosa que envolve o planeta Terra ou seja, a atmosfera, apresenta-se com
uma composio extremamente rica em oxignio, constituindo um caso nico no SS. Desde a
sua formao, h cerca de 4,6 bilies de anos, ocorreram modificaes importantes que
justificam a presena de determinados elementos. Actualmente, estende-se desde o nvel do
mar at uma altitude de mais de 900 km sendo retida pela fora da gravidade.
constituda por 77% de azoto, 21% de oxignio, 0,35% de dixido de carbono e
cerca de 1% de gua no estado gasoso (Beatty et ai. 1999, URL2).
1.1- Estrutura
Ao analisar, em altitude, a presso e a temperatura da atmosfera, verifica-se um padro
de variao que permite a sua diviso em vrias camadas (Fig.III.l). Cerca de 90% do total da
massa da atmosfera encontra-se concentrada nos primeiros 16 km, altitude a partir da qual a
atmosfera adquire temperaturas mais baixas e se torna mais rarefeita, at a um ponto em que
no fcil definir um limite entre a atmosfera e os gases interplanetrios (Encrenaz e Bibring
1985, YukeDeMore 1998).
35
Presso (torr)
10"' 10 IO'' I 10 10!
100
90 A L SO 1 1 70 T U 60 D E 50
(km) 40
30
20
10
0 -400 -300 -200 -100 0 100
Tempcralura (C)
Fig.III.l- Perfil da variao da temperatura e da presso nas diferentes camadas da atmosfera terrestre (adaptado de Pitts 1996). 1 atmosfera = 760 Torr.
Os primeiros 16 km da atmosfera constituem a troposfera, onde se verifica tom decrscimo da temperatura e da presso com a altitude. Esta camada tambm designada por
baixa atmosfera sendo limitada superiormente pela tropopausa cuja espessura varia com a latitude (atingindo cerca de 7 km nos plos e 17 km no equador). As variaes de
temperatura nesta camada esto directamente relacionadas com a emisso da energia
acumulada na superfcie do planeta. Com efeito a superfcie terrestre absorve essencialmente a
radiao solar de comprimento de onda visvel e perto do ultravioleta, e ao emitir a energia
acumulada, f-lo atravs de comprimentos de onda maiores, na gama dos infravermelhos, a
radiao trmica. As molculas de gua e de dixido de carbono concentradas na parte inferior da troposfera, ao absorver essa radiao, aquecem produzindo um efeito de estufa. Como resultado disso, a temperatura sobe, originando correntes de conveco entre as massas atmosfricas mais quentes e mais frias.
Estas variaes de temperatura so responsveis pela circulao dos gases atmosfricos
que, aliados ao movimento de rotao da Terra, formam o padro das nuvens circulares to
caracterstico do nosso planeta (Fig.III.2).
Acima da troposfera existe a estratosfera, camada que se estende at estratopausa,
situada a cerca de 50 km de altitude. Trata-se de uma regio caracterizada por um aumento da
temperatura at aos 0C (ver Fig.III.l) onde no se verificam correntes de conveco. O
. Termosfera /
>v / Presso / Temperatura
X . Mesosfera \
X \ \ v J
> v /
Estratosfera
, \ >s-
Troposfera
V i
36
aumento da temperatura na estratosfera deve-se essencialmente absoro da radiao solar
ultravioleta pelo ozono13 (Pitts 1986, Morrison 1993, URL2).
Fig.III.2- Padro de nuvens terrestres (imagem de satlite) (in, URL17).
Graas a este gs a radiao ultravioleta com poder fotodissociativo no chega
troposfera protegendo assim os seres vivos destas radiaes letais. A temperatura volta a
decrescer na camada seguinte, a mesosfera, que se estende dos 50 aos 80 km de altitude, e
cujo limite superior designado por mesopausa. Aqui a densidade dos gases pesados como o
ozono, o oxignio e o vapor de gua menor havendo menos molculas capazes de absorver a
radiao solar e, consequentemente, de aquecer a referida camada. Ao conjunto formado pela
estratosfera e a mesosfera tambm dado o nome de atmosfera mdia.
Verifica-se nova subida de temperatura na termosfera, situada acima da mesosfera e
limitada aos 800 km de altitude pela termopausa. Nesta camada o aumento de temperatura
deve-se absoro da radiao solar com comprimento de onda inferior a 200 nm por tomos
isolados de oxignio e molculas de ozono.
A radiao solar de to baixo comprimento de onda no s capaz de produzir a
fotodissociao de molculas, como tambm de as ionizar, ou fotoionizar, em particular o
oxignio e o azoto. Uma vez que a densidade dos gases na atmosfera decresce com a altitude,
aos 500 km eles so retidos pela velocidade de escape do planeta. Um gs em movimento, tal
como qualquer objecto, possui uma energia designada de energia cintica que depende da
massa do gs. Quando esta baixa, a temperatura necessria para que o gs se escape para o
13 O ozono, produzido por uma srie de reaces qumicas entre o oxignio molecular e a radiao solar.
37
http://Fig.III.2
espao interplanetrio, reduzida. Um gs s retido por um planeta, quando a velocidade de
escape do planeta , pelo menos, seis vezes superior velocidade mdia desse gs. O oxignio,
por exemplo, tem uma velocidade mdia de 0,48 km/s, que multiplicada por seis d 2,88
km/s, um valor inferior aos 11,2 km/s da velocidade de escape do planeta Terra. O nosso
planeta no tem, por isso, problemas na reteno do oxignio na atmosfera, no se passando o
mesmo com o hidrognio que, para uma temperatura de 295 K, possui uma velocidade mdia
1,9 km/s. Este valor multiplicado por seis de 11,4 km/s, ou seja, superior velocidade de
escape da Terra, no sendo, por isso, um gs facilmente retido na nossa atmosfera. A ttulo
comparativo, Vnus possui uma velocidade de escape de 10,4 km/s e Marte apenas de 5,0
km/s.
A zona a partir da qual se processam as ionizaes a ionosfera e comea aos 500 km
na termosfera superior, alargando-se at ao fim no distinguvel da ltima camada da
atmosfera.
A camada atmosfrica mais longnqua da superfcie do planeta a exosfera e estende-
se a partir da exobase, aos 800 km, at a um limite no definido que pode exceder os 1000 km.
Trata-se, pois, de uma zona de transio entre a atmosfera e o espao interplanetrio. Ao
conjunto formado pela termosfera e exosfera tambm costume chamar-se atmosfera superior
(Atreya et ai. 1989, Marov et ai. 1997, Kaufmann e Freedman 1998).
1.2- Fotoqumica da atmosfera
Toda a atmosfera terrestre est exposta radiao e ao vento solar. As molculas e os
tomos dos gases da atmosfera esto sujeitos incidncia de fotes solares com diversos
comprimentos de onda. Estes funcionam como indutores nos variados tipos de reaces que
ocorrem na atmosfera. Os processos que levam formao dos novos elementos so
designados por processos fotoqumicos efotofsicos.
Os processos fotoqumicos, para alm da fotodissociao, incluem ainda, os rearranjos
intramolecular es, a fotoisomerizao, a fotodimerizao, a abstraco do tomo de H e as
reaces fotossintetizadas14. Na qumica da atmosfera o processo mais importante a
fotodissociao. Como j foi referido a fotodissociao uma reaco induzida por fotes
solares que provoca a separao de molculas em tomos. Estes podem ficar no seu estado
14 Trata-se de processos fotoqumicos complexos que na maior parte dos casos actuam a nvel das molculas.
38
base, excitados, ou agrupados em radicais livres (compostos muito reactivos como o radical
hidroxilo).
Os processos foto fsicos incluem as transies radiativas e as no radiativas. As
primeiras envolvem a emisso de luz, com retorno ao estado base, na forma de fluorescncia e
fosforescncia1''. A transio no radiativa inclui a transferncia de estados dentro da mesma
molcula sem haver emisso de radiao (Pitts 1986, Gil e Cardoso 1987a).
Ao penetrar na atmosfera o fluxo solar sofre modificaes devidas a disseminao,
refleco (de gases e partculas) e absoro. Estes fenmenos, que vo alterar os
comprimentos de onda da radiao solar, so responsveis pelas reaces que se processam ao
longo da atmosfera (Tabela II).
Na atmosfera superior existem tomos de oxignio, azoto e molculas de ozono,
responsveis pela absoro de radiao solar de comprimento de onda igual ou superior a 300
nm. natural que pouca radiao solar deste comprimento de onda chegue superfcie
terrestre. Mas s na presena de fotes com comprimento de onda igual ou superior a 290 nm
que as reaces fotoqumicas se processam na troposfera. A esta radiao tambm se d o
nome de radiao actnica. O fluxo actnico para um determinado volume de ar ainda
afectado pelo ngulo de incidncia solar ou ngulo de znite, pelas reflexes na superfcie e
pela presena de nuvens.
A disseminao e absoro do fluxo solar atravs da atmosfera so devidas absoro
da radiao ultravioleta (UV) pelo ozono, s molculas areas que disseminam a radiao e s
partculas que no s disseminam como absorvem a radiao solar (Fig.III.3).
15 Fluorescncia a emisso de luz devido a uma molcula que se encontra num elevado estado de excitao, enquanto que a fosforescncia definida como a emisso de luz devido a transies entre diferentes estados de spin.
39
00 ON
3 1 I 2
"8. "o
o n3
-9 o-1 C8
1 H
r
0 3 r/1 a O ,
H 0 1:. T3 (U
M u Vu eu H - *1 03 d
0 S3
0 . M
^ 3 I 6
'S
I i
1 &
.1 d g. s. 6 " 3 I 'a
Cu p |
1
-6 q < a
o !a
.b J2
2 I a s S "3
Espao Radiao . . Solar q u e Radiato que vai saindo chega Onda curta Onda longa
100 20
Atmosfera
Absorvido pelo vapor de l gua. poeira e 0^
Absorvido pelas ^-w, / nuvens 3 >
Superficie do plunelu
38
Emisses pelo vapor de gua eCO :
Emisso pelas nuvens (2s
Absoro pelo vapor de gua e C 0 : |
Fluxo de calor latente
Emisso de radiao Muxo sensvel de comprimento de de calor
onda longo
U Fig.III.3- Radiao mdia e balano trmico relativo a 100 unidades de radiao solar que chega Terra
(adaptado de Pickering e Owen 1997).
1.2.1- Fotoqumica da troposfera O ozono responsvel pela absoro da maioria da luz de comprimento de onda menor
ou igual a 310 nm. Na troposfera, a regio dos 300 nm fundamental para induzir a produo
dos radicais livres, como o radical hidroxilo. Este um dos principais agentes de limpeza da
atmosfera que reage com compostos nocivos, tornando-os inofensivos. Ao longo deste
processo decorrem reaces de oxidao e reduo ou reaces redox, em que o principal
interveniente o oxignio. As molculas dos gases so responsveis pela disseminao da luz ou difuso
Rayleigh. Aqui, a luz solar incidente espalhada noutra direco. A disseminao, por parte das partculas, mais complexa, pois h vrios parmetros a ter em conta como a sua dimenso, composio qumica e concentrao. O somatrio da disseminao e absoro total dos raios solares pelas partculas, conhecido como extino dos aerosis.
A quantidade de radiao solar que chega a um determinado volume de atmosfera,
pode ter origem directa ou indirecta, neste caso relacionada com a luz reflectida e disseminada pela superfcie da Terra (Fig.III.4). Naturalmente que a quantidade de luz reflectida pela
superfcie ou albedo superficial, tem a ver com o tipo de superfcie e com o comprimento de
41
http://Fig.III.3
onda da luz incidente. A ttulo de exemplo, a neve altamente reflectiva (reflecte cerca de 85%
da luz incidente), ao contrrio de um manto de lava basltica.
Na presena de nuvens troposfricas, o fluxo actnico altera-se e as reaces
fotoqumicas podem no se processar. As nuvens revelam-se muito importantes na manuteno
das temperaturas da atmosfera terrestre, uma vez que tambm reflectem a luz solar incidente,
arrefecendo a superfcie. Por outro lado, dependendo do tipo de nuvem, pode haver absoro
de determinados comprimentos de onda da radiao solar, provocando efeito de estufa e
conduzindo a um aquecimento superficial.
7 Sol \
AvT Radiao ^ ^ > ^ _ ^ \ J ( \&ssemraada """'"'"'"yv'1
J ( \ s-~ ^^^^^"""^ Radiao // / \_/VohnneV^ '' solar directa //
r i l " I /C J J V Gases 1 / \ ^
* f ARadiaao reflectida / v ^
Disseminao por gases e parricidas
Terra
Fig.III.4- Diferentes fontes da radiao que chega a um volume de gases na atmosfera (adaptado de Pitts 1986).
Devido alterao do fluxo actnico por parte das nuvens, a fotodissociao do
dixido de azoto, que geralmente leva formao do ozono (Reaces 1 e 2) pode no
ocorrer ou processar-se de forma mais lenta.
N0 2 + foto (290 a 430nm) => NO + O Reaco 1
O + 0 2 => 0 3 Reaco 2
O ozono que existe na troposfera, conhecido por ozono troposfrico, exerce um
enorme efeito de estufa. tambm um gs txico para as plantas, humanos e outros
organismos. Felizmente que a maior parte do ozono se situa na estratosfera. A partir desta
42
http://Fig.III.4
camada, algum ozono poder ser transferido para a troposfera, muito embora este processo
seja inibido pela diferena de temperatura entre as duas camadas. Podem, no entanto, ocorrer
determinados fenmenos meteorolgicos, na descontinuidade da tropopausa, que conduzem a
uma mistura parcial dos gases ricos em ozono da estratosfera com a troposfera. Esta troca de
gases entre as duas camadas adjacentes mais efectiva durante os meses do fim do inverno e
princpio da primavera e est relacionada com as diferenas de temperatura durante estas
estaes (Pitts 1986, GileCardoso 1987b).
A existncia de ozono na baixa atmosfera tem a ver com reaces fotoqumicas atravs
de xidos de azoto e compostos no metanognicos (veja-se Reaces 1 e 2). Esses xidos de
azoto so principalmente produzidos pela actividade humana ou seja, so gases
antropognicos, e esto mais concentrados no hemisfrio norte, onde existe maior
industrializao. A concentrao de gases antropognicos, neste hemisfrio, degrada a
qualidade do ar (poluentes) com a agravante de produzir mais ozono troposfrico.
O ozono troposfrico entra na qumica troposfrica e pode sofrer fotodissociao
formando oxignio molecular e radicais hidroxilo (Reaces 3 e 4).
0 3 + foto (comprimento de onda < 320nm) => O + 0 2 Reaco 3
O + H20 => 2 HO Reaco 4
Estes radicais so responsveis pela remoo de espcies atmosfricas como o
monxido de carbono convertendo-o em dixido de carbono, principal gs de efeito de estufa.
Se o monxido de carbono oxidar com o radical hidroxilo forma-se dixido de carbono
e hidrognio o qual, na sua vez, vai reagir com o oxignio e dar origem ao radical peroxilo
(H02) (Reaces 5 e 6). Quando o monxido de azoto est presente em elevadas
concentraes, oxida pelo radical peroxilo (Reaco 7) produzindo-se o dixido de azoto, que,
de acordo com a qumica descrita nas reaces 1 e 2, produz o ozono. Em resumo, na
presena de elevadas concentraes de monxido de azoto, por cada molcula de monxido de
carbono oxidada, forma-se uma de ozono.
HO + CO => H + C02 Reaco 5
H + 0 2 => H02 Reaco 6
43
H02 + NO => HO + N02 Reaco 7
Por outro lado, quando a concentrao de monxido de azoto baixa, a reaco 7 no
se processa, e os radicais peroxilo reagem entre si na formao de perxido de hidrognio e
oxignio (Reaco 8). Neste caso a oxidao do monxido de carbono no alterou o nmero
de molculas de ozono.
H02 + H02 => H2O2 + 0 2 Reaco 8
No entanto, se o radical peroxilo reagir com uma molcula de ozono, ocorre a sua
destruio (Reaco 9). Em suma, quando a concentrao de monxido de azoto baixa, o
nmero de molculas de ozono pode ser mantido ou reduzido.
H02 + 0 3 => HO + 2 0 2 Reaco 9
Uma outra espcie atmosfrica que oxidada pelo radical hidroxilo o metano
(Reaco 10). Um dos produtos dessa oxidao, o metilo (CH3), tambm oxidado em radical
peroximetilo (CH3O2) que na presena de grandes concentraes de monxido de azoto
origina o radical metoxi (CH30) (Reaces 11 e 12). Este, por sua vez, oxidado em metanal
(ou formaldedo) (CH20) (Reaco 13).
OH + CH4 => H20 + CH3 Reaco 10
CH3 + 0 2 => CH3O2 Reaco 11
CH3O2 + NO => CH3O+ N02 Reaco 12
CH3O + 0 2 => CH20 + H02 Reaco 13
O metanal pode ser removido da troposfera por trs processos distintos. O primeiro a
sua fotodissociao, de que resultam produtos como o hidrognio e o monxido de carbono
ou o radical formil (HCO) (Reaco 14 e 15). Este radical um produto reactivo, podendo ser
oxidado (Reaco 16).
44
CH20 + foto => H2 + CO Reaco 14
CH20 + foto => HCO + H Reaco 15
HCO + 0 2 => CO + H02 Reaco 16
O segundo processo de remoo do metanal por reaco com o radical hidroxilo,
com a formao de radical formil e gua (Reaco 17).
CH20 + HO => HCO + H20 Reaco 17
O terceiro processo de remoo atmosfrica feito atravs da chuva.
Ao longo de todo este processo em que a concentrao do monxido de azoto
elevada, o dixido de azoto formado ser fotodissociado e o ozono produzido (veja-se
Reaces 1 e 2). Se a concentrao de monxido de azoto baixa no se formar ozono, pois
decorrem reaces de eliminao do radical peroximetilo da atmosfera por aco do radical
peroxilo e hidroxilo.
O tempo de permanncia na atmosfera de determinados compostos varivel. Os
xidos de enxofre e o cido ntrico, por exemplo, so altamente solveis na gua, sendo
eliminados da troposfera pela chuva o que implica ficarem em permanncia atmosfrica por
um perodo mdio de 10 dias. Outros compostos, como o cido carbonoso (H2CO) e o
iodometano (CH3I), fotodissociam-se a comprimentos de onda acima dos 310 nm, e
permanecendo pouco tempo na atmosfera. O monxido de carbono e o metano, oxidam por
reaco com o radical hidroxilo. No entanto, como a concentrao troposfrica destes radicais
varivel em funo da estao do ano e, como as reaces so em grande nmero, a sua
permanncia pode atingir vrios meses ou at mesmo anos. H ainda molculas que no so
removidas por nenhum dos processos acima referidos sendo, em ltima instncia, destrudas na
atmosfera superior (Pitts 1986, Yuk e DeMore 1998).
1.2.2- Fotoqumica da estratosfera
Na estratosfera encontra-se a camada de ozono, caracterstica nica do nosso planeta.
O ozono estratosfrico ainda conhecido por ozono protector ou bom ozono, uma vez que
protege a superfcie terrestre da radiao ultravioleta, letal vida.
45
As reaces qumicas que ocorrem nesta camada tm como base a formao e a
destruio do ozono. Compostos como os xidos de azoto (NOx), os radicais hidroxilo (HOx),
os xidos de enxofre e os alogneos (cloro, bromo, flor e iodo) so de grande
importncia em todas as reaces na estratosfera.
Chapman foi o primeiro a sugerir uma srie de reaces simples, explicativas da
formao e destruio do ozono. Assim, quando uma molcula de oxignio absorve um foto
de comprimento de onda inferior a 290 nm sofre fotodissociao e formam-se dois tomos
de oxignio excitados. Um deles combina-se com uma molcula de oxignio para formar o
ozono que por sua vez, sofre fotodissociao (Reaco 3 e Fig.III.5). Durante este processo,
os produtos resultantes podem adquirir energia cintica, libertando-a sob a forma de calor, o
que leva a um aumento da temperatura nesta camada atmosfrica (Marov et ai. 1997).
Radiao UV Ozono
+ S Molcula de tomo de
oxignio oxignio
Fig.III.5- Qumica natural de formao e decomposio do ozono (adaptado de Hcke