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CIP-Brasil. Cataloga~o-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.
Fico, Carlos F468c Como eles agiarn I Carlos Fico.- Rio de Janeiro: Record,
2001.
Anexos lnclui bibliografia ISBN 85-01-05984-6
I. Brasil- Hist6ria- 1964-1985. 2. Servi~o Nacional de Informa~ao (Brasil). 3. Servi~os de inteligencia - Brasil -Hist6ria - 1964-1985. r. Titulo.
01 -0014 CDD - 981.06 CDU -981
Copyright 2001 by Carlos Fico
Capa: Sergio Campante Imagens de capa: Alberto Fran~a/ Agencia JB; Acervo da DSI/ Arquivo Nacional
Direitos exclusivos desta edi~ao reservados pela DISTRIBUIDORA RECORD DE SERVI
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0 DIFiCIL DESMONTE
0 projero de "distensao poHtica", posteriormente conhecido como "abertura", iniciado por Ernesto Geisel, teria de conside-rar o problema dos 6rgaos de segurans;a. Geisel, nao podendo nem desejando extingui-los, precisava, ao menos, controla-los -de tal forma que so mente as operas;6es legais fossem efetuadas (eliminando-se, portanto, a tortura, os atentados eo assassina-te de presos poHticos).
A simples mens;ao ao projeto de "distensao" gerou imensa reas;ao interna nas comunidades de segurans;a e de informa-
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lhada daqueles dias. 2 Alguns aspectos, porem, devem ser con-siderados.
Atraves dos 6rgaos de informa~6es, a comunidade de segu-ran~ disseminava defini~6es e avalia~6es truncadas, associan-do a "abertura'' a amea~ comunista:
Os meios democraticos sentem e nao admitem a perigosa aber-
tura, por onde a filosofia marxista-leninista, com os seus co-
nhecidos principios de solapa~ao, desmoraliza~ao e
desagrega~ao, esta-se infiltrando na vida brasileira. Constan-
temente, ha de se ficar alerta, porquanto bern se sabe, aqui,
como em outros paises, o custo da liberdade responsavel.
Constitui-se marca de nosso seculo a pronta resposta aos de-
safios; a necessidade gera a solu~ao mais rapida.3
Na verdade, a linha dura teve de ser enfrentada por Ernesto Geisel, e, para tanto, ele precisou lan~ar mao de seus mais apri-morados dotes de general desp6tico. Nao o fez quando acon-selhado por Golbery do Couto e Silva, em janeiro de 1975, para punir os torturadores do ex-deputado comunista Marco AntO-nio Tavares Coelho, que o supliciaram no DOl paulista.4 0 enfrentamento direto viria sob a forma da demissao do co man-dante do II Exercito (SP), general Ednardo Davilla Melo. Em outubro de 1975, o jornalista Vladimir Herzog foi assassinado nas dependencias do mesmo DOl, unidade subordinada ao co-mando do general Ednardo. Geisel deu ordens expressas para q; o epis6dio nao se repetisse;5 pon!m, no dia 17 de janeiro de 19-outro assassinate se verificou, desta vez vitimando o operan Manuel Fiel Filho. Geisel, entao, demitiu sumariamente o g~ ral, causando grande comoo no Exercito:
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A partir do dia 20 ( ... ) o ministro do Exerdto come~ou a sentir
o problema. Noticias de rea~oes chegavam de toda a parte, de
todos os exercitos e comandos militares de area. Principal-
mente entre os integrantes dos 6rgaos de seguran~a e infor-
ma~oes e os oficiais das unidades de tropa, nao se podia
admitir que urn general de quatro estrelas sofresse tamanha
humilha~ao por parte do governo.6
Uma reuniao do Alto Comando do Exercito foi convocada para o dia 22, e o tema foi debatido. lmporta destacar que, apesar de resultar em apoio a decisao do presidente, a reuniao afirmou tam hem a manutenc;ao "das medidas para a seguranc;a interna, sem, contudo, aceitar a pratica de abusos ou violen-cias" .7 Ou seja, aceitava-se o controle, mas nao a desativac;ao.
Todas as ac;oes dos setores da sociedade civil tendentes a iden-tificar os responsaveis por tortura e assassinato eram monitoradas,
especialmente no contexto da Campanha pela Anistia. A DSI do Ministerio da Justic;a, por exemplo, apontava que
o Movimento Justi~a e Paz esta planejando realizar urn levan-
tamento dos militares, policiais e civis, que trabalharam em
6rgaos de repressao, utilizando o expediente de procurar pes-
seas que atualmente [1979] labutam em profissoes liberais e
que ja serviram naqueles 6rgaos.8
Durante a "abertura'', sem ter mais os velhos inimigos con-tra quem lutar, a linha dura sentia-se ameac;ada de extinc;ao, acuada por ser identificada como grupo nao democratico e com medo de punic;oes que poderiam advir do retorno ao Estado de Direito (algo que nunca se verificaria, em grande medida grac;as ao esforc;o do setor durante a negociac;:io da anistia polf-
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tica).* Foi essa combina~o de decadencia e medo que levou a comunidade de seguran~a a patrocinar alguns dos atos mais barbaros do regime militar.** Nessa fase, lutar contra o
combalido PCB soava rid!culo. AAgencia Central do SNI, em
seus documentos sigilosos, deixava transparecer uma especie de saudosismo da luta armada:
Se antes a linha militarista e foquista dos subversives apre-sentava fates concretes de guerrilha urbana e rural, que co-locavarn a opiniao publica ao lado do governo revolucionario,
atualmente, a infiltrar;ao insidiosa e o trabalho de massa cor-rosive, ambos dificeis de serem identificados, mostrados e
conhecidos, estao influindo na opiniao publica do pais, de maneira desfavoravel as metas revolucionarias; por sua vez,
a orquestrar;ao dos temas do PCB difundidos pela imprensa, oposir;ao politica e clero, esquerdistas, vao torna-los corriquei-ros no dia-a-dia da popular;ao, tirando-lhes as caracteristicas subversivas e tornando dificil a separar;ao dos elementos sub-versives e dos d6ceis, inconsequentes e interessados
repetidores de suas teses ( ... ). A incrementar;ao da carnpanha dos "presos politicos, torturados e desaparecidos" ( ... ) fatal-mente conduzira os 6rgaos de seguranr;a e informar;oes a uma retrar;ao nas suas ar;oes, tendo em vista a tensao atualmente existente, fruto de duvidas ja surgidas no meio rnilitar, parti-
cularmente pela nao aplicar;ao de sanr;oes aos politicos ja, comprovadarnente, comprometidos com o PCB.!'
*A anistia de 1979 perdoou tambem os militares envolvidos em acusa~oes de tor-tura, atentados e assassinatos polfticos. **Em agosto de 1976, bombas explodiram nos predios da ABI e da OAB. Ec: abril de 1981, outras explodiram durante urn show de musica popular. No peritr do, dezenas de atentados desse tipo foram cometidos pelos 6rgaos de seguran~
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No inicio do governo Geisel, diante da ameac;a de decaden-cia dos 6rgaos de seguranc;a, advinda tanto do projeto de "distensao polftica" quanto da vis1vel fragilidade dos comunis-tas, o SISSEGIN empenhou-se em "mostrar servic;o" e afirmar a necessidade de sua permanencia, lanc;ando mao de supostos planes de "tomada do poder" de autoria de uma "frente" de varias organizac;oes comunistas. Segundo altos dirigentes do SISSEGIN, o mirabolante plano estabelecia a seguinte estran!-gia a ser seguida pela "frente de comunistas":
( ... )mover uma campanha ( ... )para os temas do "Restabelecimento do Estado de Direito no Brasil" [e outros] ( ... ). Durante a fase dessas "Campanhas", as organiza~oes nao executariam nenhum ato terrorista ( ... ). Caso o govemo atendesse a todas essas reivin-dica~oes, permaneceriam durante alguns meses sem praticar qualquer a~ao terrorista, aguardando a total desmobiliza~ao dos 6rgaos de seguran~a. isto e, ate a extin~ao do SISSEGIN. Uma vez extinto esse sistema( ... ) recome~ariam toda a onda de terror( ... ). Formariam uma "Frente" ( ... ) e a pretexto de "derrubar a ditadu-ra", fariam uma revolu~ao.10
Tal "plano", evidentemente urn embuste dos 6rgaos de se-guranc;a, expressava, na verdade, o temor da comunidade de seguranc;a em rela
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do SISSEGIN, decisao que Geisel deixou para Figueiredo to-mar. Figueiredo, alias, foi aconselhado neste sentido por
. Golbery do Couto e Silva, 11 quando do epis6dio do Rio centro, mas somente extinguiu o sistema no fim do seu governo.
0 caso Riocentro foi urn marco. A tentativa &acassada de atentado, na qual os pr6prios agentes do DOl do I Exercito acabaram vitimados, desmoralizou bastante os sistemas de in-formas:6es e de segurans:a, contribuindo para a sua decaden-cia, 12 sobretudo dentro das pr6prias Fors:as Armadas.
Porem e preciso lembrar que o SNI foi bastante refors:ado durante a gestao do general Otavio Medeiros, justamente no governo de Figueiredo, consolidador da "abertura'':
0 SNI, na gestao do Medeiros, chegou a ter urn poder extraor-
dinario, algo como uma quarta forc;a armada. Chegou a ter,
dentro do setor policial em que se localizava, uma industria
-a Pr61ogo- que produzia cript6grafos para todo o Brasil.
( ... ) conseguiu vantagens que comec;aram a irritar o pessoal
das corporac;oes militares ( ... ).13
Como explicar, entao, que o general-presidente responsa-vel pela fase final da "abertura'' estivesse investindo tanto no SNI? A explicas:ao provavelmente decorre do fato de que seria relativamente mais simples justificar a necessidade de urn 6r-gao central de informas:6es- comum em diversos pafses de-mocraticos- do que de urn sistema de seguran
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COMO ELES AGIAM
Evidentemente senti descontentamento em alguns setores.
Muita gente nao concordava. Mas a verdade e que nao acabei como que vinha sendo feito. Apenas procurei dosar adequada-
mente o emprego dos meios que eu tinha para a atividade de
informac;ao e dei maior importanda a informac;oes externas.15
A distins:ao que busquei caracterizar, entre 6rgaos de informa-es e 6rgaos de seguran
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Desde meados do governo Geisel, ponanto, a con juntura eco-nomica, social e pollcica tornou desacreditado 0 discurso das co-munidades de seguranc;a e de informac;6es. Ora, o poder simbolico so mente e chancelado quando urn grupo nele se reconhece, isto e, enquanto e ignorado como dado arbitrario.19 Ao longo de aproxi-madamente 10 anos, os militares radicais reescreveram cenos "tex-tos" arquetfpicos- notadamente os da Escola Superior de Guerra, mas tambem os que se originaram em Carlos Lacerda e no IPES/ IBAD, para citar alguns exemplos -, gerando uma narrativa ca-paz de prover de semido suas ac;6es. Nos momentos em que com-bateram contendores mais visiveis, como as guerrilhas urbana e rural, puderam usar, sobretudo, imagens recorrentes no campo estritamente politico (o subversivo perigoso, o plano insidioso de comuniza
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N OTAS DO CAPiTULO 6
1. Ver, a prop6sito, a parte introdut6ria de D'ARAUJO, Maria Celina,
SOARES, G!aucio Ary Dillon, CASTRO, Celso (Int. e Org.). A volta aos quarteis: a memoria militar sobre a Abertura. Rio de Janeiro: Relume-Dumara., 1995 e DINIZ, Eli. A transic;:ao po!itica no Bra-sil: uma reavaliac;:ao da dinamica da Abertura. Dados - Revista de Ciencias Sociais, vol. 28, n2 3, pp. 329-346, 1985.
2. Para narrativas alentadas sobre o tema, consultar SKIDMORE,
Thomas. Brasil: de Castelo a Tancredo. 1964-1985. 4. ed. Rio deJa-neiro: Paz e Terra, 1991 e COUTO, Ronal do Costa. Historia indis-
creta da ditadura e da abertura. Brasil: 1964-1985. Rio de Janeiro: Record, 1998.
3. lnformafiio C. n2 454/74. 2 out. 1974. MC/A. Cx. 4109-34. 4. GASPARI, Elio. Alice eo camaleao. ln. GASPARI, Elio, VENTU-
RA, Zuenir, HOLLANDA, Heloisa Buarque de. Cultura em transi-to: da repressao a abertura. Rio de Janeiro: Aero plano, 2000. p. 15.
5. Depoimento do general Ernesto Geisel publicado em D'ARAUJO,
Maria Celina, CASTRO, Celso (Orgs.). Ernesto Geisel. 2. ed. Rio de
Janeiro: FGV, 1997. p. 225.
6. ABREU, Hugo. 0 outro !ado do poder. Rio de Janeiro: Nova Fron-teira, 1979. p. 112.
7. Idem. p. 113. 8. lnforme C. n2 369/04/79. 3 dez. 1979. MC/A. Cx. 4113-38. 9. lnformafiio C. n2 415/75 (originada na Agencia Central do SNI). 1.
jul. 1975. MC/A. Cx. 4111-36. 10. Sistema de Seguranfa lnterna. SISSEGIN. Documento classificado
como "secreto". [1974?]. Capitulo 2, fl. 45. 11. ARGOLO, Jose, RIBEIRO, Karia, FORTUNATO, Luiz A.M. A di-
reita explosiva no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad, 1996. pp. 267-268.
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12. Depoimento do general Octavio Costa publicado em D'ARAUJO, Maria Celina, SOARES, G!aucio Ary Dillon, CASTRO, Celso (Int. e Org.). Op. cit. p. 132.
13. Idem. p. 117. 14. Depoimento do general Ivan de Souza Mendes publicado em
D'ARAUJO, Maria Celina, SOARES, Glaucio Ary Dillon, CAS-TRO, Celso (Int. e Org.). Op. cit. p. 166.
15. Idem. 16. LAGCA, Ana. SNI: como nasceu, como funciona. Sao Paulo:
Brasiliense, 1983. p. 109. 17. Depoimento do general Ernesto Geisel publicado em D'ARAUJO,
Maria Celina, CASTRO, Celso (Orgs.). Op. cit. p. 228. 18. COUTO, Ronaldo Costa. Op. cit. p. 287. 19. BOURDIEU, Pierre. 0 poder simbolico. 2a ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 1998. pp. 14 e 183. 20. ELIAS, Norbert. A sociedade dos individuos. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1994. p. 150.
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