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Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da ComunicaoXXXI Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao Natal, RN 2 a 6 de setembro de 2008
E sem piru. Que tal? Mdia sonora atravs do estudo do jingle Pipoca e Guaran1
Gabriel de Oliveira MORAIS2Eneus TRINDADE3
Universidade de So Paulo, So Paulo, SP
RESUMO
O artigo visa uma reflexo sobre a mdia publicitria sonora utilizando um dos grandes clssicos brasileiros Pipoca com Guaran de 1991. Atravs das anlises dos diticos de espao, sujeito e tempo e explorando os elementos de letra e msica, h um caminho terico percorrido que envolve a enunciao e a semitica. Autores como Tatit, Schaffer e Wisnik nos auxiliam nessa reflexo sobre som na publicidade. O trabalho faz parte do projeto de iniciao cientfica: A enunciao publicitria em linguagem sonora: estudos dos jingles do Guaran Antrtica e se mostra como um passo para a consolidao de uma metodologia de estudo.
PALAVRAS-CHAVE: Publicidade; Jingles; Guaran Antrtica; Semitica; Som.
Do Corpus sonoro na publicidade e suas possibilidades tericas O material sonoro, natural ou produzido, o nosso ponto de partida. Na verdade no
sua definio ou o que consideramos som, e sim como o estudamos. O som estudado
como lugar de memria e histria, sob um olhar mais antropolgico e esttico. Pouco se
estuda sobre o som como linguagem, muito menos publicitria, o que tambm lhe d
uma carga de dinamismo.
A reflexo aqui presente visa sanar essa ausncia de estudo e at mesmo revitalizar a
importncia da mdia sonora para os mais variados suportes miditicos. Para tal misso
escolhemos o jingle Pipoca com Guaran de 1991.
Tendo em vista a abrangncia e a responsabilidade da anlise de um clssico da
propaganda brasileira, nosso foco e inteno aqui se restringem em duas instncias: a
anlise da enunciao publicitria pelo estudo dos diticos de espao, tempo e sujeito
presentes na cano e pelos estudos semiticos percebendo como eles se mostram
1 Trabalho apresentado na Sesso Comunicao organizacional, relaes pblicas e propaganda , da Intercom Jnior Jornada de Iniciao Cientfica em Comunicao, evento componente do XXXI Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao.2 Estudante de Graduao 3. semestre do Curso de Publicidade e Propaganda da ECA-USP, email: [email protected] Orientador do trabalho. Professor do Curso de Publicidade e Propaganda da ECA-USP, email: [email protected].
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eficazes em favor da identidade e do consumo. A outra instncia est no casamento
entre som e letra, como essa juno se mostra eficaz enquanto apelo e como isso leva ao
nascimento de um novo meio de interao.
Com o conceito Este o sabor, a campanha do Guaran Antrtica de 1991,
desenvolvida pela agncia DM9DDB, concebeu o seguinte jingle:
EPipoca na panela EComea a arrebentar EPipoca com sal EQue sede que d APipoca e Guaran. Que programa legal F# S eu e voc BE sem piru. Que tal? EQuero ver pipoca pular EPipoca com Guaran EQuero ver pipoca pularEPipoca com Guaran E G# FEu quero ver pipoca pular, pular E ESoi louca por pipoca e Guaran A A (EABE)Ah Ah Gua-ra-n
Este o sabor 1991 ( Acesso em 30 de junho de 2008)
Como apresentado, cabe agora uma reflexo sobre os diticos e como eles esto
dispostos no jingle. Concebemos como ditico o vnculo presente entre a mensagem e
as representaes de pessoa (interlocutor e/ou de quem se fala); de tempo (momento da
comunicao) e de espao em que esta comunicao acontece. Ou seja, a relao entre
os signos e o vnculo que eles mantm com o referente. A anlise dos diticos torna-se
essencial para a busca de intencionalidades do emissor e tambm o caminho de
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decodificao da mensagem pelos receptores. Os diticos tambm permitem a
descoberta e estudo dos hibridismos no discurso e suas influncias na mensagem.
por essa caracterstica que consideramos os diticos porta para o estudo e parte de
uma metodologia eficiente para anlise nas propostas. Como a comunicao abre espao
para uma anlise interdisciplinar entre as teorias de enunciao e os estudos semiticos,
encontramos aqui apoio para o direcionamento pretendido do estudo. Entende-se por
enunciao a ao de construo dos discursos, ou seja, daquilo que dito
(BENVENISTE,1966). Expandindo o conceito, essa ao comunicativa no se limita
apenas ao dito, mas tambm ao que pode se dar a ver, a escutar e ao sentir, como
manifestao de linguagem que inclui o verbal e o no-verbal. (BARBOSA
&TRINDADE, 2003. P.10). Ou seja, mesmo que haja poucos estudos sobre o enfoque
interdisciplinar dado, o estudo das teorias enunciativas so importantes pois permitem
que os enunciados se revelem, principalmente quanto aos valores de consumo da
sociedade. Entender que os enunciados publicitrios so, na verdade, um processo
dinmico, passo fundamental para a anlise de qualquer material publicitrio e, no
nosso caso, do jingle atravs dos diticos.
Diticos de tempo
Aqui cabe uma anlise sobre marcas do tempo dentro do prprio jingle e sobre suas
marcas de contexto. No jingle h um enredo das aes que vo se apresentando. Devido
a seu formato e ps adaptao para televiso como videoclipe no h uma
superposio rpida de informaes. Nos primeiros versos h uma clara definio das
aes, at o quarto verso, quando atravs da palavra sede o produto inserido e
apresentado ao receptor no verso posterior Pipoca e Guaran. Que programa legal.
O ditico de tempo tambm se mostra semelhante ao ato do estouro da pipoca. Isso
ser mais aprofundado quando a msica for analisada. Por ora, percebe-se que no incio
apresenta carter mais descritivo, simulando quando o milho ainda no se transformou
em pipoca. No refro acontece um estouro e a juno entre a pipoca e o Guaran.
Holenstein (1978, P.83) nos d uma prvia Jackobsoniana sobre a nfase da percepo
dos signos: signos visuais a dimenso espacial que predomina, nos signos auditivos,
a dimenso temporal.
Sobre o contexto, sabemos que o jingle foi veiculado nacionalmente em 1991,
contando principalmente com a divulgao na televiso e rdio. No h meno
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explcita sobre acontecimentos marcantes no ano. Apenas o apelo garrafa (som de
abridor no verso Que sede que d) diferentemente de hoje com apelos s latas e as
marcas lingsticas (expresso Soi loca). Aqui explcita a lngua como marca das
relaes sociais e temporais. Ou seja, a importncia do apelo lingstico se deve a
influncia poderosa que exerce a organizao hierarquizada das relaes sociais sobre
as formas de enunciao (BAKTHIN, 2002, P. 43).
Analisando a trajetria das campanhas do Guaran Antrtica, vemos que a de 1991
surgiu com um elemento novo. Mesmo preservando a caracterstica de jingles, as
campanhas percorriam um caminho de identidade nacional (ligao Guaran - Brasil) e,
o que foi potencializado mais tarde, um produto jovem. A campanha anterior, 1990,
um bom exemplo4. A associao de Guaran Antrtica com outros produtos nunca
havia sido feita e mostrou-se inovadora e eficaz. Prova maior a repetio dessa
associao nas campanhas de 20015 associando Guaran Antrtica com Sanduches (X-
Tudo e Hot Dog). A campanha de 1991 contava com outras duas peas, lanada logo
em seguida Pizza com Guaran tambm foi um grande sucesso, e no comeo de 1992
Sanduba com Guaran, lembrando o vero, mas que no teve tanta repercusso como as
outras.
Diticos de espao
Diferentemente da anlise anterior, os diticos de espao se concentram num mbito
de referncias externas, pois uma definio de espao para a ao e o formato de jingle
informaes apresentadas de maneira simples, rpida e em excesso tornam-se
secundria para a elaborao e compreenso da mensagem.
Esse formato designa tambm um constante apelo ao receptor para a manuteno do
canal construdo. Versos como S eu e voc e Que tal? so necessrios para que
uma interao acontea, no mbito da codificao pelo emissor e pela recodificao do
receptor.
4 Guaran Antrtica/ Brasileiro Antrtica/ Todo mundo um dia vira um Guaran/ Uhh...Antrtica (back vocal)/ Guaran Antrtica/ Vira e mexe a gente vira um Guaran/ Eu fico na minha/ Vira e mexe eu fico no meu Guaran/ Guaran An-tr-ti-ca Transcrio de Acesso em 29 de junho de 20085 X...Burguer/X Salada/ X Calabresa/ Com Guaran Antrtica o sabor fica beleza/ Chapeiro aqui meu chapa/ Sabe preparar/ Sabor que sai da chapa s com Guaran Antrtica/ Esquenta a chapa e chama um Guaran/ Tudo pede Guaran Antrtica/ Esquenta a chapa e chama um Guaran/ Tudo pede Guaran Antrtica Tudo Pede Guaran Antrtica 2001 Transcrio de Acesso em 29 de junho de 2008
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Todo signo, como sabemos, resulta de um consenso entre indivduos socialmente organizados no decorrer de um processo de interao. Razo pela qual as formas do signo so condicionadas tanto pela organizao social de tais indivduos como pelas condies em que a interao acontece. (BAKTHIN, 2002, p. 44)
Uma caracterstica interessante, que transcende um pouco o ditico espacial, mas cabe
aqui, o estudo sobre a conveno da pipoca. Mesmo que em nenhum momento do
jingle haja referncia explcita, a pipoca o elemento clssico presente como
acompanhamento de filmes e cinema. Num primeiro momento, considerando o contexto
de 1991, a conexo feita entre pipoca seria com o refrigerante Coca-Cola, e no com o
Guaran Antrtica. Dono dos maiores mitos da publicidade, a interveno de mensagens
subliminares nos filmes nos anos 50, a Coca Cola buscou essa associao com snacks
sorvetes, cachorros-quentes e pipoca principalmente no incio de suas campanhas,
unindo refrescncia ao consumo dos produtos, principalmente nos cinemas, teatros e
drive-ins.
No contexto brasileiro tambm havia essa relao, com uma menor fora. Essa fora
foi a brecha encontrada para a estratgia criativa para o desenvolvimento da mensagem
e que encontra ecos at hoje, como dito, a manuteno do contexto em 2003 e a
reformulao em 2008 para o carnaval de Salvador. A nova verso foi gravada por
Carlinhos Brow e foi a aposta da Guaran Antrtica, que se posicionou como
patrocinadora oficial dos pipocas de folies. Pipoca o folio que acompanha os trios
eltricos sem abad e fica por fora das cordas que limitam o espao dos folies
pagantes. Ou seja, houve uma modificao da organizao social dos indivduos e das
condies que a interao com a marca, resultando numa modificao do prprio
signo.
Diticos de sujeito
Aqui os sujeitos se dividem entre enunciador e receptor. Nesse caso, os sujeitos
aparecem em um mesmo momento nos versos: S eu e voc/ E sem piru. Que tal?
em que o emissor prope algo ao receptor e essa proposio se mostra um convite ao
consumo, afinal, o verso anterior a juno entre pipoca e Guaran (Pipoca e Guaran.
Que programa legal). Explicando melhor, o jingle possui um sujeito emissor claro que
nos trs primeiros versos explicam a ao (preparao pipoca) no quarto verso lana o
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primeiro elemento do universo do Guaran (sede) e no quinto verso faz o encontro
entre os dois (Pipoca e Guaran. Que programa legal).
Os versos seguintes possuem uma grande carga expressiva devido msica que ser
explicada mais adiante e unio do universo semntico da pipoca (panela, arrebentar,
sal) com o universo semntico do refrigerante (sede, Guaran). Alm da unio que j
estava proposta, os versos constroem um novo campo de significao. Em S eu e
voc/ E sem piru. Que tal? no h apenas o universo da pipoca ou do Guaran, mas
sim a fuso dos dois para a criao de um novo universo semntico: o da Pipoca com
Guaran. A prova mais concreta o termo piru. Originalmente referente ao milho
que no se transforma em pipoca, aqui ele abre para uma nova significao, pois no se
refere simplesmente pipoca, mas sim ao modo como o encontro vai acontecer.
Esse novo universo, e reiterando as citaes de Bakthin, esse novo signo, que
determina o sujeito e faz com que o convite ao receptor seja mais convincente.
tambm uma forma mais clara de se mostrar ao ouvinte. Ele prope a unio, mostra
que ela vantajosa (Que programa legal ), convida o receptor para pertencer a esse
universo (Que tal?) e ainda envolve um elemento de valor a marca e, se encarado
com severidade, um convite ao consumo exacerbado (Soi loca por pipoca e Guaran).
A prpria pipoca traz com ela um elemento de exagero, mas essa afirmao s seria
comprovada se utilizssemos os componentes visuais para anlise, o que foge da nossa
reflexo.
Da semitica da cano antropologia do som.
Nesse momento a reflexo segue para a conciliao da msica com letra, na busca
pelas possveis construes de sentido. Cabe ressaltar que a parte musical da reflexo
limitada, pois o enfoque aqui o trabalho lingstico que permeia a comunicao
publicitria. Para isso utilizam-se autores como Wisnik (1999), Schaffer (1991) e Tatit
(1994), que tambm procuram esse enfoque.
Wisnik em O Som e o Sentido (1999) busca mais o uso da msica, melhor dizendo,
um estudo das ferramentas musicais durante a histria musical. nessas ferramentas
que encontra a chave terica para repensar os fundamentos da histria dos sons (...) Ela
exige que o pensamento, ele mesmo, se veja investido de uma propriedade musical: a
polifonia e a possibilidade de aproximar linguagens aparentemente distantes e
incompatveis (WISNIK, 1999, P. 11-12).
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Em uma busca mais emprica, Schaffer tambm postula O ouvido pensante (1991)
num carter descritivo de recursos didticos musicais. O diferencial que a didtica
supera a educao musical e se torna uma reflexo, praticamente epistemolgica, do que
msica e do que seja fazer msica.
Finalizando a lista, Tatit em Semitica da Cano (1994) e em Anlise Semitica
atravs das Letras (2002) investiga esse carter emprico da msica, mas em um
mbito estritamente terico, com o auxlio da semitica, j que sua preocupao est no
sentido. Para Tatit:
O desafio est em definir o valor profundo e o lugar terico ocupado por essas entidades (musicais) reconhecidas em superfcie. Mais que isso, esperamos poder deduzir essas ocorrncias de um modo semitico mais amplo que, comprometido com a descrio do ser do sentido, oferea parmetros tericos homogneos para a anlise de melodias, de letras, de arranjos instrumentais, de espetculos, de videoclipes, enfim, de qualquer modelizao que o sentido receba (TATIT, 1994, P. 13)
nesses modelos de sentidos que compreendemos os jingles e tomando como base tais
autores, a preocupao no meramente lingstica, mas tambm musical. Nessa parte
da reflexo, segue todos os entraves musicais que o jingle Pipoca com Guaran traz, e
toda a influncia no campo significativo e receptivo.
Sobre a melodia, pode-se afirmar que foi concebida em Mi sustenido. Por conveno6,
uma tonalidade feliz, usada em msicas de carter alegre/festivo. A tonalidade
maior tambm transparece um lado mais extrovertido em bemol (b) o jingle
preservaria um lado mais dramtico o que a deixa adequada a sua funo: um jingle
comercial.
Na maioria do jingle a melodia mantm a mesma estrutura harmonia semelhante a
canes folclricas, o que facilita a assimilao pelo ouvinte. As mudanas esto no
verso Que sede que d e em S eu e voc/E sem piru. Que tal? que garantem maior
expressividade melodia.
No jingle tambm aparecem alguns sons adicionados msica. Em Que sede que d
h o som de uma garrafa abrindo, e por toda a msica sons como manteiga na panela,
tilintar de slidos lembrando pipoca estourando so adicionados e alternados, exceto
nos versos S eu e voc/E sem piru, que tal? em que h um silncio.
6 Apenas esclarecendo que no acreditamos nos tons como de natureza feliz ou triste, mas essa concluso devida a uma conveno social e no a uma caracterstica das notas.
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Nos versos em que a letra encontra maior expresso de sentido semntico (S eu e
voc. E sem piru. Que tal?) tambm quando a msica ousa mais e permite uma
maior variao harmnica. A insero do Guaran no jingle se d no verso Que sede
que d, verso esse em que a melodia tambm sucumbe em uma maior expressividade.
Assim, no h como desconsiderar a melodia na anlise do jingle, pois a descrio
acima permite afirmar que a melodia no neutra perante a letra e que uma das
responsveis para a assimilao e expressividade do jingle. Principalmente no que tange
as diferenas tonais, h uma similaridade com que afirma Tatit - Em se tratando de
cano, contudo, o plano da expresso no se caracteriza apenas pela ordenao
fonmica e prosdica, que geralmente pouco elaborada, mas, sobretudo, pela
estabilizao e conservao do elemento meldico (TATIT 1994, p. 237). Tambm nos
permite ir para um caminho terico entre a juno de letra e msica, que d base para
desvendar os mistrios desse suporte miditico e de considerar som e letra um novo
meio de interao.
Focando nossa ateno na letra musical, percebemos que o universo semntico
tambm engloba um universo fontico semelhante (pipoca, panela, pular, piru) nos
remetendo ao som lingstico Jakobsoniano e suas implicaes - Os sons lingsticos,
so, em compensao, caracterizados por uma inteno de significao e por uma
orientao social. (HOLENSTEIN,1978,p. 84). Ou seja, os jingles mesmo se
apresentando como pea musical, manteriam o carter lingstico, pois seriam revestido
de inteno e sentido estritamente direcionados. Transparece tambm um carter de
objetividade do jingle e sua funo. Essa objetividade adequada estrutura musical
porque a msica trabalha, como dizia Hegel, na objetivao sonora em que a
subjetividade se reconhece e se supera, com a concordncia, a oposio e a mediao
dos sons. (WINISK, 1999, P. 169).
Quanto ao carter lingstico, Schaffer (1991) nos apresenta um contraponto:
Para que a lngua funcione como msica, necessrio, primeiramente, faz-la soar e, ento, fazer desses sons algo festivo e importante. medida que o som ganha vida, o sentido definha e morre (...) quando a fala se torna cano, o significado verbal deve morrer (SCHAFFER, 1991, p. 240).
Para Schaffer, haveria um mximo significado, restrito a fala convencional, e um
mximo som, manipulados eletronicamente, logo os jingles estariam entre esses dois
extremos, mas seria vazio de significado lingstico. Continua:
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A lngua e a msica precisam ser mutuamente excludentes? Ou podem integrar-se num equilbrio que satisfaa todas as necessidades de cada uma delas? (...) Ser que esse delicado equilbrio entre as palavras e a msica perdeu-se desde a Idade Mdia? Poder ser redescoberto? (SCHAFFER, 1991, p. 240).
Devemos considerar que em nenhum momento da obra O Ouvido Pensante
Schaffer (1991) se props a analisar jingles. Sua obra estuda msica e composio. A
nica atividade proposta a seus alunos que envolvia jingles foi uma pequena atividade
utilizando o rdio, mas para estudo do conceito de som e rudo.
Aps a citao acima, Schaffer (1991, P. 242) apresenta uma figura:
Figura 1: Words and Music - Palavras e Msica. (SCHAFFER, 1991, p. 242)
Como vimos, para ele o sentido se perderia aps essa fuso. Depois de todas as
consideraes feitas aqui, fica impossvel acatarmos as idias do autor pelo menos
nesse quesito. Compreendemos que no estamos tratando de msica em seu sentido
artstico, mas sim na anlise de um jingle com intenes estritamente comerciais, e
essas intenes nos fazem compreender que o sentido lingstico essencial para o
jingle sendo letra e msica. Voltando a Jakobson Som e sentido so os dois aspectos
correlativos irredutveis um ao outro, de todo o signo lingstico (HOLENSTEIN, 1978, P. 83).
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Uma nova interpretao da figura poderia ser feita, sendo a fuso entre words and
music no com uma em detrimento da outra, mas sim na criao de um novo campo de
significao. Podemos afirmar com certeza que esse campo compreende um campo de
significao lingstica. Podemos afirmar tambm que h um novo campo de
significao musical, contudo, estamos buscando um caminho para melhor entend-lo.
O jingle se mostra a maior tentativa desse entendimento, pois o instrumento de unio
desses dois campos. No caso do Pipoca com Guaran no podemos ousar em explicar
tamanho sucesso e repercusso, s podemos considerar que esse casamento perfeito
entre som e letra que permitiu a criao de um novo campo de significao, facilitando
a apreenso e explicando, em parte, o porqu do jingle ser to marcante na histria da
publicidade e na memria das pessoas.
Consideraes Finais
A proposta aqui foi propor uma reflexo sobre os recursos sonoros, sua avaliao,
influncia e estudo, visto que h uma desvalorizao muito grande sobre o ambiente
sonoro principalmente do rdio justificado por uma busca de interao. Vale
lembrar que a maioria dos sucessos televisivos se resume a bons jingles, e isso inclui as
campanhas do Guaran Antrtica. Essa busca por uma interao desconsidera as
correntes de significao j criadas e campo frtil para a rea criativa. H aqui a
expanso do conceito de interao e cabe aos estudiosos o estudo das plataformas
miditicas, j que todas mantm esse vnculo interativo.
Um pequeno comeo foi dado de um estudo que parte agora para a busca da
investigao do receptor, e de como esses apelos enunciativos so decodificados e
armazenados na memria dos consumidores. Esse assunto ser fruto de outras
discusses tericas no cabveis aqui.
Finalizamos a misso de anlise e esquematizao total de um dos jingles mais
famosos, seno o mais, da Guaran Antrtica e toda a mudana de percepo de marca
que ele proporcionou. Acreditamos que a reflexo e metodologia se mostrou eficaz e
atendeu ao objetivo do artigo.
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REFERNCIAS
BARBOSA &TRINDADE Por uma enunciao Publicitria. II Congresso Latino-Americano de Estudos do Discurso. Puebla.Universid Autnoma Benemrita de Puebla/ALED. 2003.
BAKTHIN, M. (V.N. Volochnov) Marxismo e Filosofia da Linguagem. So Paulo: Editora Hicitec AnnaBlume, 2002.
BENVENISTE, E. Problmes de linguistique gnrale. Paris: Gallimard, 1966.
HOLENSTEIN, E. Introduo ao pensamento de Roman Jakobson. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978.
TATIT, L. Semitica da Cano melodia e letra. So Paulo: Editora Escuta, 1994.
________ .Anlise Semitica atravs das Letras. So Paulo: Editora Ateli, 2a ed., 2002.
SCHAFFER, M. R. O Ouvido Pensante. So Paulo: Editora Unesp, 1991.
WISNIK, M. J. O Som e o Sentido uma outra histria das msicas. So Paulo: Companhia das Letras, 1999.
Sites
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Campanhas
Guaran Antrtica 1990 Acesso em 29 de junho de 2008
Pipoca e Guaran 1991 . Acesso em 30 de junho de 2008
Pizza com Guaran 1991 Acesso em 30 de junho de 2008
Sanduba com Guaran 1992Acesso em 30 de junho de 2008
Tudo Pede Guaran Antrtica X-Tudo - 2001 Acesso em 29 de junho de 2008
Tudo Pede Guaran Antrtica Hot Dog 2001Acesso em 30 de junho de 2008
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