Download - Chuva de Panelas
CHUVA DE PANELAS Dianna Moreno
CHUVA DE PANELAS
DIANNA MORENO
Introdução
A performance chuva de panelas é uma interpretação poética registrada em vídeo a
partir de uma junção de relatos sobre a biografia de uma mulher. Tal comportamento me
proporcionou logo na minha infância, leituras daquilo que eu acreditava ser justo ou não. Cresci com
exemplos machistas que dominavam e se sobressaíam nas mais diversas situações sociais. A
formação dos meus valores está carregada de estereótipos dos gêneros Mulher e Homem e, pude
nesse trabalho, expressar parte desse desapego e da desconstrução da ideia que me foi apresentada
e ainda é fortemente presente na minha vida. A performance é uma narrativa composta por
elementos essenciais os quais na minha reflexão carregam significados naquilo que a sociedade
entende como lugar da mulher.
A narrativa se inicia na
cozinha vazia ao som do relógio
comum de parede. Ao poucos as
panelas são introduzidas uma a
uma se sobrepondo na pia. Em
meio a essa alternância, a mulher
(performer) é apresentada de
vestido de gala preto andando
lentamente descalça na beira da
piscina. Panelas estão amarradas
aos seus pés. Essa oscilação entre
os dois ambientes se dá ate o
momento em que a pia se
encontra empilhada de panelas. O
silencio domina a cena por alguns
minutos.
A poética da performance é a respeito da vida que minha bisavó mantinha em seu casamento.
Questões como reconhecimento, igualdade e feminismo são frequentes no trabalho sendo fatores cruciais
da narrativa. A panelas representam o ambiente em que a mulher daquela época passava a maior parte do
tempo, fazendo uma analogia (por ser um recipiente onde se faz a comida), ao manter e alimentar essa
situação e condição que ela, e muitas outras mulheres se encontravam. As mesma panelas presas aos pés
descalços nos remetem drasticamente aos pesos presos por correntes que mantinham os prisioneiros de
escapar. A pia, no inicio do vídeo não é suficiente para conter a quantidade de panelas e agua que a
ocupam, o que na narrativa representa esse turbilhão de sentimentos transbordando a alma da
personagem e ultrapassando esse limite. Já a piscina comporta as panelas que caem em abundância, os
recipientes se opõe, os espaços são contrários. A piscina profunda e extensa simboliza o útero do
renascimento, onde apenas o som da alma pode ser ouvido.
A personagem que executa a
performance, essa mulher (eu), que no ápice
da emoção e da necessidade de contestar
sua condição seus desejos e escolhas, se
lança nas aguas escuras desse útero para o
renascimento. O trabalho teve como
contribuição textos de obras da filósofa
norte americana Judith Butler (1956), que
compreende a ideia de que o feminismo
ainda circunda o conceito Homem e Mulher
como verdade da sexualidade e, acredita
numa desmontagem de quaisquer tipos de
identidade de gênero que venha oprimir as
individualidades que não se encaixam nos
comportamentos julgados corretos nas
relações entre as pessoas. Segundo Judith
Butler, nem a sexualidade nem o sexo seriam
verdade essenciais, mas construídas pela
história. As analises criadas pela filosofa
ultrapassam a reflexão apenas no conceito
do gênero homem e mulher, questionando
mais afundo o próprio sentido do verbo ser.
Nesse sentido, Judith vai ao contra a norma
ontológica onde a correção é praticada pela
exclusão do individuo, onde seria preciso
desmontar as categorias de classificação e
dar expressão aos silenciados e
descriminalizados. Num contexto onde as
identidades forma formadas e impostas á
sociedade, a única saída se torna a
desmontagem das classificações que nos são
impostas como as únicas e corretas.
Video
https://vimeo.com/106963672
TEXTO CRÍTICO
Por Julia Cavazzini
Em uma sala azul, com panelas no chão, ao som de gotas pingando e um vídeo sendo projetado, a
performance “Chuva de Panelas” de Dianna Moreno nos faz imergir em um ambiente sereno e
desconhecido. O vídeo projetado é uma narrativa de uma mulher (a própria performer) em que se vê
diante de símbolos de seus sofrimentos caseiros. As panelas presentes na sala são as mesmas que a
protagonista carrega na calda de seu vestido preto. A protagonista carregando as panelas, arrastadas em
seu vestido, e de forma lenta anda em direção da piscina, onde se desprenderia destas panelas que viriam
a chover na piscina. Ao se desamarrar destes símbolos de opressão caseira, a performer como em um
suicídio se joga na piscina. Com o lento balançar de seu vestido meio as águas, o corpo dança nas nuanças
de azul da piscina e por fim, se afunda e afoga.
O simbolismo da mulher que é presa as necessidades domésticas e que as carrega como peso, neste vídeo
se liberta desses paradigmas no seu suicídio. O suicídio neste caso não precisa necessariamente ser da
morte da mulher, neste caso poderia até mesmo ser uma parte que era dependente e preso ao papel
estipulado pela sociedade da mulher que aqui morre, portanto, uma morte libertária. O que se afoga
naquelas águas são as angústias de ter de carregar um peso ou um cargo que não mais é só da mulher.
Quando Dianna Moreno retrata em seu vídeo a pia que se enche de água e transborda, escorrendo e se
espalhando pelo chão mostra que é esse sofrimento é incontrolável e que invade essa casa/corpo.
Em “Chuva de Panelas” além da presença de questionamentos reais e ainda pouco abordados, sobre o
papel da mulher da sociedade, no vídeo Dianna Moreno trata de forma sútil e serena. A presença forte da
cor azul, tanto no vídeo quanto na sala, mostra um tratamento não gritante e típico de espetáculo, mas
uma visão sensível que aqui parece ser tão próxima a artista. O azul que aqui é tranquilizante e sereno,
pode estar ligado novamente a imagem da libertação da morte, de uma libertação não brusca, mas calma.
CHUVA DE PANELASLINGUAGEM DA PERFORMANCE
DIANNA MORENO