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MEMORIAL DR. ANTÓNIO AGOSTINHO NETO       

DR. ANTÓNIO AGOSTINHO NETO ESCRITOR (1940 – 1960)

     

Luanda/2014 

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INTRODUÇÃO

Agostinho Neto foi um homem de cultura. Fez os seus estudos primários e secundários em Angola, licenciou-se em

medicina em Portugal.

Antes da sua partida para Portugal em 1947, colaborou na publicação “Farolim” com textos sobre as duras

condições humanas dos angolanos. Em Portugal sempre esteve ligado a actividade política. Empenhou-se na vida

associativa da Casa dos Estudantes do Império (CEI). Nesta cidade com Lúcio Lara, Antero Abreu e Orlando de

Albuquerque, lançou os cadernos “Momento”. Filiou-se no Movimento de Unidade Democrática (MUD) Juvenil, tendo

sido igualmente um dos fundadores com Mário de Andrade, Amílcar Cabral e Francisco José Tenreiro do Centro de

Estudos Africanos (CEA) que teve grande actividade entre 1951-1954. O objectivo do CEA, segundo Mário de

Andrade, era relacionar os sentimentos de se pertencer a um mundo de opressão e despertar a consciência nacional

através de uma análise dos fundamentos do continente.

Agostinho Neto e os seus companheiros de caminhada sentiram que, particularmente no contexto angolano, a

verdadeira missão da poesia deveria ser a identificação com as aspirações populares, reflectindo a condição social e

a humilhação do colonizado angolano, no espírito da palavra de ordem lançada em Luanda “Vamos Descobrir

Angola”, em finais dos anos 40. A poesia devia descer a rua, não se limitando à exteriorização de estados de alma;

poesia almejando fins políticos concretos de total negação face à ordem social injusta vigente, neste caso, contra o

sistema colonial e o fascismo português.

 

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Percurso Literário: época e geração

Agostinho Neto escreveu poemas entre 1945 e 1960. Que se saiba, não terá escrito poemas nesta

data.

Poeta da Geração Mensagem, Agostinho Neto emergiu como escritor na década de 50, durante o

período político-cultural angolano, conhecido como “Vamos Descobrir Angola”.  Ao longo de toda a

sua vida de homem público, a escrita revelou-se uma atividade fundamental. Participou, como

colaborador, em várias publicações periódicas de Angola, de Portugal e do Brasil. Seus textos foram

publicados em diversos jornais e revistas, como: Mensagem, Cultura, Itinerário e Notícias de

Bloqueio. As suas primeiras colaborações escritas datam do período compreendido entre 1942 e

1944 e foram publicadas no jornal O Estandarte. Além das obras mencionadas, encontram-se

também publicados alguns dos seus discursos e reflexões sobre a cultura angolana, tais como:

Introdução a um colóquio sobre a poesia angolana, de 1959; Sobre a União dos Escritores Angolanos,

de 1975; Sobre a Literatura, de 1977; Sobre a Cultura Nacional, Sobre as Artes Plásticas e Sobre a

Associação dos Escritores Afro-Asiáticos, de 1979; ... Ainda o Meu Sonho...e  Discursos sobre a

Cultura Nacional, de 1985.

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Agostinho Neto é considerado um dos grandes autores de expressão portuguesa no mundo. O

poeta é comparado muitas vezes a Léopold Sédar Senghor, senegalês de expressão francesa e

um dos fundadores da Négritude- movimento que, nos anos 30 do século passado, lutava em

favor da restituição dos valores e da dignidade negra. Agostinho Neto ultrapassou, sem dúvida,

o que se podia esperar de um homem de grande cultura. Utilizava a sua inteligência e

conhecimento para reagir contra a opressão, na denúncia da injusta situação colonial. Com

implacável vigor, o poeta também buscou construir um futuro de liberdade e igualdade para

todos. Foram-lhe atribuídos diversos prémios políticos e literários, dentre os quais: o Prémio

LOTUS, em 1970, e o Prémio Nacional de Literatura, em 1975. Sagrada Esperança, de

1974, é a sua obra mais publicada. Foi traduzida para diversas línguas e serve de base para

muitos estudos, sobretudo na área das Ciências Sociais e Humanas.

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SAGRADA ESPERANÇA

Os poemas de Sagrada esperança, escritos aproximadamente entre o ano de 1945 a 60, podem dividir-se

em três fases não cronologicamente estaques, correspondentes a temas, estilo e imagens diferenciados.

- De 1945 a 1948-50, a fase do Neo – realismo, caracterizada pelos textos geralmente mais curtos, a que

têm os bairros populares de Luanda, o mato e lavras circundantes por palco, com figuras de colonizados,

traçada com esquissos rápidos de personagens narrativas, prefigurando situações de alineação, exploração

ou tenção/repressão, em linguagem contida, descritiva, geralmente de serenidade e constatação.

Correspondendo principalmente ao Neo-realismo, agrupa os primeiros 16 poemas do livro, de «Adeus a hora

da largada» até «Contratados».

- De 1949 a 1955, a fase da negritude, do Negro genérico, negro de todo mundo, mas também africano e

angolano, sem demasiados pormenores regionais, em que aparecem algumas excepções («Não me peças

sorrisos», «Um aniversário», «Kinaxixi», «Mussunda amigo», etc.), uns ainda tocados pelo Neo – realismo,

outros mais intimamente líricos e outros ainda versando sobre temas como o massacre e a solidariedade

africana. Do texto «Confiança» até «O verde da palmeiras da minha mocidade», o livro de Neto engloba 21

poemas, curiosamente é nesta parte que aparecem os três poemas da negritude («As terras sentidas»,

«Criar» e «Fogo e Ritmo»).

- De 1950 a 1960, uma fase do combate, do apelo a liberdade nacional, formada por 14 poemas, escritos nas

prisões do regime fascista português (Caxias, Aljube de Lisboa, PIDE do Porto e de Luanda e Ponta Sol, em

Cabo Verde). Estes poemas referem-se genericamente à libertação nacional.

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Identificação dos grupos temáticos

A leitura dos livros de poesia, segundo Luís Kandjimbo, em especial o Sagrada Esperança e renúncia Impossível,

este último publicado a título póstumo, permite efetivamente detetar os vários sinais de descontinuidade que

dão origem ao discurso poético de ruptura.

Ao pretender traçar o perfil identitário do poeta, Luís Kandjimbo iniciou tal exercício pela identificação dos grupos

temáticos em que se organiza o livro:

a) Poemas libertários (revolucionárias): Adeus a hora da largada; Consciencialização; Assim clamava

esgotado; Noites de Cárcere; Aqui no Carcere; O içar da Bandeira; Depressa; Luta; Campos verdes; Havemos

de Voltar; Criar; Não me peças sorrisos;

b) Poemas radicalmente líricos poemas que comportam temas intimistas, subjectivos, sentimentais,

como o amor, a saudade: Um universitário; Mussunda amigo; Poema; Um bouquet de rosas para ti; Para

enfeitar os teus cabelos; Dois anos de distância; Desterro; Sombras; Desfile de sombras, etc.

c) Poemas da relação do homem angolano com a sua paisagem: Sinfonia; Caminho do Mato; Kinaxixi; O

verde das palmeiras da minha mocidade;

d) Poemas tematizando a miséria social colectiva: Desfile de sombras; Civilização ocidental; Noite; Para

além da poesia, etc.

e) Poemas Pan-africanistas: Velho Negro; Comboio Africano; Confiança; A reconquista, etc.

 

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Obra Poética: cronologia e publicações

1952 – Náusea. In: Revista Mensagem

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1957 – Quatro Poemas de Agostinho Neto.

1961 – Poemas. Lisboa: Casa dos Estudantes do Império.

1963 – Com os olhos secos.

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1963 – Con occhi asciutti.

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1974 – Sagrada Esperança

1982 – A Renúncia Impossível – negação. In: A renúncia impossível – poemas inéditos. (edição póstuma).

1998 – Agostinho Neto: Poesia. In: Colecção Kiamba (edição póstuma).

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CONCLUSÃO

As reflexões sobre o perfil e a trajectória de Neto revelam-nos traços de distinção do

seu caracter.

A poesia de Neto forma um processo contínuo de resistência nas suas variadas

manifestações. Ao interpretarmos a obra de Neto, estaremos a alcançar a dimensão

social, ideológica, cultural, filosófica e política do seu legado.

A poesia do Dr. Agostinho Neto traz o reconhecimento de que nunca se está só, de que

não se pode ignorar a presença do outro, mesmo que o outro reduza suas

possibilidades de ser.

Revela um grande humanismo, em que são evidentes o amor profundo pela vida e o

conhecimento do sofrer humano, que amiúde obriga o poeta a utilização de um

realismo feroz nos seus versos. A sua obra principal, Sagrada Esperança, é uma

amostra valiosa não só da poesia de combate e contestação (sem ser panfletária, no

entanto) mas também da poesia lírica e intimista, frequentemente modulada por uma

religiosidade profunda.

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BIBLIOGRAFIA

LARANJEIRA, Pires, Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa,

Universidade Aberta – 1995;

NETO, António Agostinho, Sagrada Esperança;

LARANJEIRA, Pires; ROCHA, Ana T. Noção de Ser – Textos

Escolhidos Sobre a Poesia de Agostinho Neto, Fundação António

Agostinho Neto e Colecção Novo Rumo, 2014. 


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