Anais do V Congresso de Letras da UERJ-São Gonçalo
Adjunto adverbial de tempo: termo acessório? uma abordagem funcionalista
MILENA TORRES DE AGUIAR
RESUMO:
Considerando o que as gramáticas tradicionais da língua por-tuguesa pressupõem para separar e classificar os termos de uma ora-ção usando nomenclaturas como essenciais, integrantes e acessórios, o presente trabalho questionará se realmente o adjunto adverbial de tempo pode ser funcionalmente considerado um termo acessório, já que fazemos uso dele em muitos momentos da nossa vida cotidiana, nos levando a crer ser ele um termo importante para a compreensão de uma mensagem e pelas funções que desempenham em um proces-so de comunicação.
Sabemos que as gramáticas tradicionais apresentam algumas incoerências em certos conceitos por privilegiar os aspectos estrutu-rais em detrimento das perspectivas semânticas e pragmáticas, o que torna o estudo da língua em certos momentos contraditório e cansati-vo, pois o que estudamos muitas vezes não condiz com o que viven-ciamos e usamos, já que somos falantes dessa língua.
Por esse motivo, pretendemos neste trabalho nos valer dos pressupostos funcionalistas, que investigam a sintaxe em termos da semântica e da pragmática, cujos domínios funcio-nais são interdependentes. A teoria funcionalista é definida como uma “corrente de estudo do uso interativo da língua, que busca explicar as regularidades observadas nesse uso a partir da análise das condições discursivas em que o mesmo se verifi-ca” (VOTRE apud FURTADO DA CUNHA, 1991, p. 55)
Então, distanciando-nos da metodologia tradicional, que estuda a língua a partir de orações isoladas, esta pesquisa será baseada em trechos de textos reais, produzidos em situação específica de coleta de material do Corpus Discurso & Gramá-tica. Essa coleta foi realizada com 18 informantes niteroienses, estudantes de escolas públicas e particulares, distribuídos de
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acordo com as variáveis sociais, nível de escolaridade e sexo. São no total 72 textos (36 orais e 36 escritos), em narrativas de experiência pessoal e narrativas recontadas. Foram seleciona-dos esses dois tipos de textos dentre outros, por acreditarmos que na narrativa é típico de serem encontrados os adjuntos ad-verbiais de tempo. Introdução
Considerando o que as gramáticas tradicionais da língua por-
tuguesa pressupõem para separar e classificar os termos de uma ora-
ção usando nomenclaturas como: essenciais, integrantes e acessórios,
o presente trabalho levantará questionamentos se realmente o adjunto
adverbial de tempo pode ser funcionalmente considerado um termo
acessório, já que fazemos uso dele em muitos momentos da nossa
vida cotidiana, nos levando a crer ser ele um termo importante para a
compreensão de uma mensagem e pelas funções que desempenham
em um processo de comunicação.
Sabemos que as gramáticas tradicionais privilegiam os aspec-
tos estruturais em detrimento das perspectivas semânticas e pragmá-
ticas, o que torna o estudo da língua em certos momentos contraditó-
rio e cansativo, pois o que estudamos muitas vezes não condiz com o
que vivenciamos e usamos, já que somos falantes dessa língua.
Por esse motivo, pretendemos neste trabalho nos valer dos
pressupostos funcionalistas, que investigam a sintaxe em termos da
semântica e da pragmática, cujos domínios funcionais são interde-
pendentes. A teoria funcionalista é definida como uma “corrente de
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estudo do uso interativo da língua, que busca explicar as regularida-
des observadas nesse uso a partir da análise das condições discursi-
vas em que o mesmo se verifica” (VOTRE apud FURTADO DA
CUNHA, 1991, p. 55).
Então, distanciando-nos da metodologia tradicional, que estu-
da a língua a partir de orações isoladas, esta pesquisa será baseada
em textos reais produzidos em situação específica de coleta de mate-
rial do Corpus Discurso & Gramática. São ao todo 36 textos orais e
seus correspondentes escritos, produzidos por 18 estudantes niteroi-
enses, estudantes de escolas públicas e particulares, distribuídos de
acordo com as variáveis sociais, sexo e nível de escolaridade (da
educação infantil até o ensino superior). Porém, nesta pesquisa serão
apresentados apenas trechos do material de alguns informantes. Foi
selecionado um informante para cada grau de escolaridade diferente,
sendo ao todo, então, o material de cinco informantes para tratar do
assunto em questão. Os textos escolhidos foram as narrativas de ex-
periência pessoal e as narrativas recontadas. Foram selecionados
esses dois tipos de textos dentre outros, por acreditarmos que na nar-
rativa é típico de serem encontrados os adjuntos adverbiais de tempo.
Vale ressaltar que os textos na íntegra se encontram disponíveis na
página www.uff.br/d&g.
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Pressupostos da Tria Funcionalista
As gramáticas tradicionais normativas, como por exemplo, a
de Cunha e Cintra (1985), ao se referir aos termos acessórios, cita:
“Chamam-se ACESSÓRIOS os TERMOS que se juntam a um nome
ou a um verbo para precisar-lhes o significado. Embora tragam um
dado novo à oração, não são eles indispensáveis ao entendimento do
enunciado. Daí a sua denominação.” (CUNHA; CINTRA, 1985, p.
145).
Visto isso e entendendo que os adjuntos adverbiais de tempo
possuem sua função em uma oração, nossa pesquisa será calcada nos
pressupostos do Funcionalismo Lingüístico Contemporâneo. Segun-
do esta teoria, a sintaxe é uma estrutura que se transforma de acordo
com as estratégias de organização da informação utilizadas pelos
falantes no momento do discurso. Então, para entender a sintaxe
seria necessário estudar a língua em uso, pois é neste momento que a
gramática se constitui. “Numa gramática funcionalista, portanto, a
língua é interpretada como um sistema de significados, acompanhado
de formas através das quais se expressam os significados” (Costa,
2000, p. 55).
De acordo com Givón, pioneiro nestes estudos, “a sintaxe e-
xiste para desempenhar uma certa função, e é esta função que deter-
mina sua maneira de ser” (MARTELOTTA; AREAS, 2003, p. 24).
Então, não se deve analisar a forma como algo isolado, e sim como
motivada pelo contexto discursivo.
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A mudança na função discursivo-pragmática de uma sentença
causa mudanças na sua estrutura sintática, e os usos lingüísticos, ao
longo dos tempos, é que dão forma ao sistema; logo a sintaxe deve
ser investigada segundo os aspectos semânticos e pragmáticos da
língua. Deste modo, gramática e discurso estão relacionados e não
dissociados, como afirmam os estruturalistas.
Dentre as categorias discursivas mais produtivas do funciona-
lismo, utilizaremos algumas que serão relacionadas a seguir, por
estarem de acordo com a nossa proposta.
Informatividade
A informatividade diz respeito ao que os interlocutores com-
partilham ou supõem que compartilham, ao que é criado e recriado
através da interação. O fundamento cognitivo dessa categoria baseia-
se na idéia de que nos comunicamos, entre outros motivos, para in-
formar nosso interlocutor sobre alguma coisa, que pode ser algo do
mundo externo ou do nosso próprio mundo interior.
Chafe (1977) acredita que, antes da produção do discurso, o
falante apenas tem em mente uma idéia geral sobre o evento. “À
medida que produz o discurso, esse falante organiza e detalha o con-
teúdo ao mesmo tempo em que situa os seres no evento e assinala os
papéis que eles desempenham por meio de uma categorização ade-
quada” (CHAFE, 1977; GÖRSKY apud CUNHA, COSTA, CEZA-
RIO, 1985, p. 44-5).
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E os adjuntos adverbiais de tempo são utilizados justamente
para organizar nosso discurso e situar nosso interlocutor sobre o
momento em que o fato narrado por nós ocorreu.
Planos discursivos
Os falantes organizam seu texto de acordo com seus objetivos
comunicativos e sua percepção das necessidades do interlocutor.
Deste modo, o texto apresenta uma parte central e uma parte perifé-
rica. Buscando transmitir sua mensagem de modo satisfatório, em
que a mesma perspectiva seja partilhada pelos interlocutores, o emis-
sor orienta o receptor a respeito do grau de centralidade e de
perifericidade dos enunciados do seu discurso. Em se tratando da
estrutura do texto, ou dos planos discursivos, a distinção entre
central e periférico corresponde à divisão entre figura e fundo.
Segundo Hopper (1979), a figura corresponde ao que é narra-
do, é o conjunto das seqüências narrativas. São os eventos concluí-
dos, pontuais, afirmativos, realis, realizados por um agente, que
constitui a comunicação central. Por outro lado, o fundo corresponde
às circunstâncias que estão fora da seqüência narrativa, mas que de
alguma forma a complementam. É a descrição das ações simultâneas
à figura; também é a descrição de estados, da localização dos partici-
pantes da narrativa e dos comentários avaliativos.
O fundamento cognitivo que motiva essa categoria é o fato de
que identificamos mais rapidamente as entidades que se nos a-
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presentam em primeiro plano, do que aquilo que passa a ser
menos percebido, o qual localizamos em segundo plano, ou
plano de fundo.
Sabemos que os adjuntos adverbiais representam o fundo em
um conjunto de seqüências narrativas, pois são as circunstâncias que
estão fora da seqüência propriamente dita, mas as complementam,
sendo a informação necessária à compreensão e à localização de um
evento que é relatado no núcleo. Não é porque o adjunto adverbial de
tempo é considerado fundo, que isso quer dizer que ele não é impor-
tante e necessário a uma oração. Em alguns momentos, o fundo é
considerado mais importante do que a figura, pois dizer, por exem-
plo, se concordamos com algo ou não é o de menos valor, o mais
importante são as circunstâncias que nos fizeram concordar ou não.
Iconicidade
No domínio da Lingüística Funcional, o princípio da iconici-
dade diz respeito à motivação na relação entre o plano da expressão
e o do conteúdo. A suposição seria a de que a forma da língua deve
refletir a função que exerce ou ser restringida por ela. Sendo assim, a
codificação morfossintática é, na sua maioria, resultado do uso da
língua, das experiências dos falantes.
Como a linguagem é uma faculdade humana, supõe-se que a
estrutura lingüística revela as propriedades da conceitualização hu-
mana do mundo ou as propriedades da mente dos homens em geral.
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Daí surge a concepção de língua como estrutura maleável, sujeita às
pressões de uso e constituída de um código não totalmente arbitrário;
e de gramática, como uma conjunto de estratégias utilizadas para
efetuar uma comunicação coerente.
Então, a estrutura da língua é entendida como o resultado
de fenômenos não-lingüísticos, especialmente de processos
cognitivos. Desse modo, a gramática está se estruturando con-
tinuamente, mas nunca se estabiliza.
Segundo o filósofo Peirce (1940), a sintaxe das línguas
naturais não é totalmente arbitrária, como afirmam os conven-
cionalistas, mas sim isomórfica ao seu referente mental. Porém,
esse isomorfismo da sintaxe é moderado. Na codificação sintá-
tica, princípios icônicos, ou seja, motivados, interagem com
princípios mais simbólicos, ou arbitrários, que respondem pelas
regras convencionais.
Peirce estabeleceu dois tipos de iconicidade: a imagética e a
diagramática, sendo esta última a que nos interessa particularmente.
A iconicidade diagramática seria um arranjo icônico de signos, sem
necessária intersemelhança.
Segundo Givón (1990), o princípio da iconicidade se manifes-
ta em três subprincípios, são eles:
I) Subprincípio da quantidade: a) quanto maior a quantidade de in-
formação, maior será a quantidade de forma utilizada na codificação
dessa informação; b) quanto mais nova for a informação para o inter-
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locutor, maior será a quantidade de forma utilizada; c) quanto mais
relevante for a informação em termos de continuidade temática ou
discursiva, maior será a quantidade de forma requerida para codificá-
la.
Então, voltando-nos para a nossa proposta, quando as infor-
mações forem novas para o interlocutor, o locutor achará necessário
contá-las com detalhes e com isso aumentará o número de forma. E à
medida que o número de forma aumenta, aumenta também o número
de adjuntos adverbiais de tempo para organizá-la numa seqüência
narrativa. Também utilizamos esses adjuntos para dar continuidade
temática e discursiva ao nosso texto e fala.
II) Subprincípio da proximidade ou integração: De acordo com esse
subprincípio, os conceitos que estão mais integrados conceptual,
funcional ou cognitiva-mente também se apresentam com maior
integração morfossintática, já que serão postos mais próximos no
nível da codificação – o que está mentalmente junto coloca-se sinta-
ticamente junto. Então, o grau de liberdade relativa entre os constitu-
intes de uma palavra, de um sintagma, de uma oração, de um período
ou de um parágrafo são indícios do grau de integração entre os com-
ponentes cognitivos desses constituintes.
Os adjuntos adverbiais de tempo apresentam uma “aparente li-
berdade” quanto à anteposição ou posposição em relação ao núcleo.
Qualquer que seja a posição, o advérbio se mostra tipicamente como
preenchedor de margens. Ou seja, ele é um tipo de adjunto, um pre-
enchedor sintático.
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É esse o fato que leva muitos autores a atribuir-lhe uma no-
menclatura de acessório. Ele é sintaticamente um adjunto, porém
possui suas funções discursivas, como bem o veremos nesta pesquisa
através de falas e textos reais.
III) Subprincípio da ordenação linear: a) A ordem das orações no
discurso coerente tenderá a corresponder à ordem temporal de ocor-
rências dos eventos descritos; b) A informação mais importante ten-
derá a ser colocada em primeiro lugar (isto é, antes, na fala; à es-
querda, na escrita).
A codificação linear dos constituintes reflete a seqüência tem-
poral dos eventos descritos. E de acordo com a nossa proposta, ve-
remos que os informantes organizam seu discurso de acordo com a
ordem temporal de ocorrências dos eventos narrados e para isso,
utilizam os adjuntos adverbiais de tempo.
Conclui-se então, que a língua não é composta de enunciados
e idéias arbitrárias, pois razões de complexidade e importância hu-
manas refletem-se nos traços estruturais das línguas. Na forma e na
organização, as estruturas sintáticas não devem ser muito diferentes
das estruturas semânticas e cognitivas.
Funções da linguagem
Halliday (1970) propõe três funções da linguagem, assim de-
nominadas: ideacional: corresponde a um tipo de função/finalidade,
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que é a de referir ou denotar; interpessoal: envolvendo a fun-
ção/evento ao expressar papéis e atitudes dos interlocutores numa
situação de comunicação; textual: refere-se à função/texto, atuando
na organização do discurso.
Então, de acordo com essa proposta, usamos a linguagem ba-
sicamente para: falar sobre nossa experiência de mundo, inclusive do
nosso mundo interior, descrevendo situações, pessoas e coisas en-
volvidas; interagir com outras pessoas, estabelecendo e mantendo
contato com elas, para influenciá-las ou para mostrar nosso ponto de
vista; organizar a mensagem ajustando-a a outras mensagens e a um
contexto maior.
Os adjuntos adverbiais de tempo fazem parte do nosso discur-
so, ajudando-nos a completar nossa finalidade ao contar uma histó-
ria, ou seja, fazer o outro rir ou se emocionar, ou até mesmo contar
apenas uma experiência vivida; o nosso evento, isto é, dentro da
história narrada, os participantes mostram suas atitudes, seus pensa-
mentos durante a interação; e o nosso texto, pois utilizamos os adjun-
tos adverbiais de tempo para organizarmos o nosso discurso, para
bem o elaborar.
Análise do corpus discurso & gramática
Como vimos, os fundamentos básicos do funcionalismo pres-
supõem a estrutura como uma variável dependente, pois os usos da
língua, ao longo dos tempos, é que dão forma ao sistema.
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Logo, nesse momento da pesquisa, apresentaremos trechos da
coletânea utilizada, tal como definido anteriormente na Introdução
deste trabalho.
Através da análise, mostraremos os diversos usos dos adjuntos
adverbiais de tempo nesses textos e perceberemos que no nosso coti-
diano sempre fazemos uso desses termos, pois estamos a todo mo-
mento nos comunicando, contando casos e experiências uns para os
outros e necessitamos situar nosso interlocutor do momento em que
esses fatos ocorreram.
Para nossa melhor percepção, nesses trechos estão sublinhados
os adjuntos e as locuções adverbiais de tempo encontradas. Infor-
mamos também que somente foram extraídos os trechos em que não
havia os adjuntos adverbiais de tempo e as partes em que não fariam
falta ao entendimento da história, ou seja, nenhuma informação im-
portante para o desenrolar da história e para a conclusão da idéia
defendida nesta pesquisa foi retirada.
Trechos e análise dos textos
Informante: Eliane – Ensino superior
a) Narrativa de experiência pessoal
Fala:
I: ((tosse)) bom... essa história que vou contar... eh::.. foi muito divertida... quer dizer... me constrangeu um pouco... mas no final foi muito divertido... eh::... estava fazendo estágio na fundação... chamada Fundação de Traba-lho... que faz estudos sobre trabalho... né? então... teve um congresso na/no dia quinze de dezembro... esse hotel/ esse... esse... esse... eh::... esse egre/
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esse::.. esse:: congresso... foi realizado no dia quinze de dezembro... semana passada... então o congresso foi reali... eh... realizado nesse hotel... no hotel Novo Mundo... no Flamengo... [...] antes disso... no estágio... eu trabalhei como::/ fazendo... eh:: críticas de questionário que iam a campo... e quando voltavam eu fazia a crítica... bom... então chegando na hora do almoço... né? pulando drasticamente aí a:: coisa... chegando na hora do almoço... uma amiga minha... né? do... do evento e tal... na hora de almoçar... ela escolheu uma mesa onde não tinha garfo... nem... nem... nem copo... nem nada... e tanta mesa bonita... [...]quando eu chego na mesa... assim per/ próximo à mesa... veio o garçom... já estava já distribuindo os garfos... a faca... [...] aí botei/ joguei os garfos... e as facas... todas na mesa... entendeu? [...] e eu estava querendo sentar já numa mesa... estava tudo bonito... com flores... com garfos... aí eu acho que já fiquei já:: meio... irritada... aí eu já... não queria mais saber de etiqueta... fui logo pegando os talheres... os garfos... [...] No final... todo mundo riu... e a gente estava num hotel... hotel... mais ou menos um hotel com uma certa/ um certo nível... [...]
Escrita:
I: Estava participando como estagiária do curso de Ciências Sociais em uma Fundação. Nesse período, houve um congresso no Hotel NOVO MUNDO, localizado no Flamengo. [...] No intervalo para o almoço, nos retiramos para a nossa jornada gastronômica. [...] Uma amiga resolveu escolher o lugar para sentar-mos, e no meio de tanta mesa bonita escolheu justamente a mais feia, digo, a pouco, um grupo havia acabado de almoçar e ainda não estava preparada para sentarmos. [...] Como o garçom estava demorando, voluntariosamente, resolvi levantar-me e a providenciar os talheres para a mesa. [...] Quando voltei à mesa, o garçom já estava provi-denciando todos os apetrechos da mesa, me senti ridícula com aquele monte de talheres na mão. Que gafe que eu tinha dado, mais logo eu que parecia saber tudo. O pior, foi quando os meus queridos colegas começaram a rir da minha cara pelo meu embaraço, tentei disfarçar mais não teve jeito. [...]
� Na fala, a informante narra uma história grande e engraçada, se-
gundo o seu ponto de vista, e podemos observar a grande quanti-
dade de adjuntos adverbiais de tempo utilizada para situar o ou-
vinte de quando aconteceu e para contar o desenrolar de sua histó-
ria. Isso se adequa ao subprincípio da quantidade, pois é uma in-
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formação nova para o interlocutor, então, maior foi a quantidade
de forma utilizada para contá-la. Na escrita, a informante também
organiza seu texto com os adjuntos adverbiais de tempo, como fez
na fala.
b) Narrativa recontada
Fala:
I: bom... eu lembrei agora não sei por que... de uma... de uma história assim um pouco... um pouco triste... né? de uma colega que estava trabalhando comigo... [...] então ocorreu um fato na vida dela... de separação dos pais... tal... e ela estava apaixonada por um rapaz... esse rapaz morreu atropelado... e ela tentou:: cortar... um dos pulsos... ela me contou assim::... eu:: fiquei tão::/ um pouco chocada... porque eu... assim... não conheci ninguém que já tenha... eh::... praticado assim/ tentando suicídio... entendeu? então eu fiquei muito chocada com isso... aí depois eu tive até que rir... porque ela contan-do.. né? como é que ela cortou o pulso... então ela cortou só um pulso... e numa linhazinha assim bem fininha... [...] cortou bem de leve o braço... então eu cheguei a rir... quer dizer... parecia ser um história triste mas no final... deu tudo certo... [...]
Escrita
Certo dia, eu e uma colega de Faculdade, conversávamos sobre alguns pro-blemas existenciais. E em determinado momento da conversa, contou-me que sofreu muito na época em que seus pais estavam se separando, que tinha sido um processo muito doloroso para todos de sua família, e ela nun-ca soube lidar direito com esse problema. No decorrer de sua adolescência, ela conheceu e se apaixonou por um menino que morava perto da casa de seu padrinho. E como a vida tem seus percalços, volta e meia, prega uma peça na gente, esse menino veio a falecer sendo vítima de um atropelamen-to. Parecia que a vida estava lhe roubando a melhor parte de sua própria vida. Foi quando ela me contou que tentou cortar os pulsos, logo após o acontecido. [...] Disse-me que só havia cortado um dos pulsos e o corte foi de leve. Senti um grande alívio e, ao mesmo tempo, uma vontade de rir, afinal, graças a Deus, a sua tentativa de suicídio não se configurou. Acaba-
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mos rindo e fazendo piadas da “triste” situação. Pedi-lhe que nunca mais ousasse repetir a dose.
� Na fala, a informante utiliza os adjuntos adverbiais de tempo para
contar uma história de outra pessoa com começo, meio e fim. Es-
se fato se encaixa no subprincípio da ordenação linear, como vi-
mos. No momento da escrita, a informante utiliza muitos adjuntos
adverbiais de tempo para situar o leitor sobre os fatos narrados,
pois ela organiza melhor o seu texto e percebe a necessidade de
fazer uso dos adjuntos adverbiais de tempo para isso.
Ela utiliza adjuntos não-prototípicos como “volta e meia”; “no
decorrer de sua adolescência”; “em determinado momento da
conversa”.
Informante: Pablo – Ensino médio
a) Narrativa de experiência pessoal
Fala:
I: eh:: eu vou falar da pré-estréia... né? que... no caso é uma::/ é um encon-tro que os alunos do... do meu colégio... Instituto ABEL... fazem todo ano... os alunos do pré-vestibular... pra:: arrecadar dinheiro para festa de formatu-ra... né? e::... foi muito bom pra mim esse ano... ano passado... 98... que eu fiz... [...] desde o início do ano que todo mundo já falava ne... ne/ na pré-estréia... tudo... e:: eu sempre falando com... com os meus amigos... né? eles sabiam que eu... podia interpretar bem... eu nunca tinha interpretado na minha vida nada... mas... eles sabiam... que eu sempre (sou) palhaço... em festa e tudo... aí a gente combinando sempre desde o início do ano... fazer Ratinho Livre... ((riso de E)) é... montar o Ratinho Livre... bom... foi pas-sando um ano... um ano... e a gente nada de fazer... [...] uma semana antes de começar... a pré-estréia... meus amigos/ dois amigos meus me chama-ram... “vamos fazer o texto... que ainda dá tempo...” aí corri num domingo... fui à tarde pra casa de um amigo meu... comecei a fazer/ aí:: nós... nós pe-gamos a câmera... [...] a gente ficava a tarde toda lá e não tinha tempo pra
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apresentar... (daí) foi passando e eu ficando nervoso... todo dia ensaiando... aí de repente... entrou uma outra... história do... do/ dos amigos meus... que vieram me chamar pra fazer Fantasia... né? ((risos)) me chamar pra fazer Fantasia... aí... eles falaram que tinham feito o texto no recreio... fizeram rápido... estava precisando de gente... eu ia ficar lá de dançarino... [...] e o cara que ia apresentar... ia ser a apresentadora... falou que não queria fazer porque já tinha uma outra peça pra fazer... então não ia fazer porque era muita coisa... aí o pessoal me chamou pra fazer... virei a apresentadora ((risos)) nem acredito... aí me deram o texto assim... no que eu fiz a primei-ra vez e o pessoal já gostou... né? [...] eu nunca tinha feito nada na minha vida de teatro... cara... não tinha nem noção como é que... fiquei nervoso... quando aquele negócio começou... no que eu entrei... que eu... isso no en-saio... né? No que eu entrei... o pessoal já começou a rir... aí eu fiquei mais tranqüilo... depois fiz Ratinho... ensaiei o Ratinho... no ensai... no ensaio era só o pessoal... que ia trabalhar lá mesmo... que ia ver/ que estava vendo... aí quando eu fui::/ fiz/ ver no/ na sexta... no sábado... no domingo... de verda-de mesmo... o teatro... pra valer... quinhentas pessoas assistindo... aquele troço mesmo todo... o que eu fiz o pessoal adorou... morreu de rir... foi legal... foi uma experiência boa... e todo mundo lembra disso até hoje... [...]
Escrita:
Desde o início do ano de 98 eu já comentava com meus amigos sobre o que faríamos na Préestréia, que é uma apresentação que os alunos do pré-vestibular do colégio em que eu estudava fazem para arrecadar fundos para a festa de formatura. Mas apesar dos comentários que fazíamos, até uma semana antes do dia da apresentação nós não tinhamos organizado nada. Decidimos então escrever uma sátira sobre o programa Ratinho Livre. A partir dai, passamos a semana inteira. Alem disso, no meio da semana fui convidado a apresentar outra peça chamada Fantasia e aceitei fazer. Partici-pei das duas com a platéia rindo muito.
� Na fala, o informante conta algo que aconteceu em sua vida e que
o faz sentir muito orgulho dele mesmo. Por isso, conta detalha-
damente o que aconteceu desde muito tempo antes do fato princi-
pal, talvez para se valorizar ainda mais. Logo, faz uso de muitos
adjuntos adverbiais de tempo. Isso se adequa também ao subprin-
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cípio da quantidade, no que diz respeito ao fato de que quanto
mais relevante for a informação em termos da continuidade temá-
tica ou discursiva, maior será a quantidade de forma requerida pa-
ra codificá-la. Na escrita o informante também conta o fato ocor-
rido desde muito tempo antes, mas elimina o excesso de detalhes.
Então, há menos adjunto adverbial de tempo, mas para o tamanho
do seu texto, ainda tem uma quantidade grande desses adjuntos.
O informante utiliza também adjuntos não-prototípicos como “a
primeira vez”, “no que eu entrei”. Este último tem a mesma idéia
de “quando eu entrei”.
b) Narrativa recontada:
Fala:
I: um amigo meu... há pouco tempo... ele... viajou pra Cabo Frio ((falha na gravação)) diz ele que quando ele foi pra praia... estava muito bem jogan-do... frescobol com o irmão... estava lá... jogando... de repente ele viu... uma garota... que ta/ que ele desconfiou que estivesse com o biquíni... do lado (do) avesso... aí... ele:: ficou meio desconfiado... né? foi/ continuou jogando o frescobol dele... depois de um tempo... a garota estava deitada... foi confe-rir... isso é o que ele me diz... né? para ver como é que era... e tudo... aí... viu que estava trocado mesmo... [...] aí ele... percebeu aquilo e ficou... eh:: ele ficou olhando... e tudo... até disse que... juntou a família toda dele o-lhando... [...] aí... ele:: falou “pô... vamos/” falou pro irmão dele... pra... ajudar a dar um toque na garota mas não... direto... né? [...] de repente ela percebeu que... que estava trocado/ que era com ela... ela ficou toda enver-gonhada... [...] Escrita:
Um amigo meu me contou que em sua viagem a Cabo Frio ele assistiu uma cena diferente na praia. Ele disse que viu uma garota usando um biquini de laço onde a parte da frente estava correta e a de trás ao contrário. Após ver isso, ele foi com o primo dele para perto da garota e começaram a gritar: “Deve estar em moda usar biquini ao contrário”, para ver se ela percebia até que percebeu e correu para o banheiro mais próximo para trocar.
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� Na fala, vemos que o informante conta uma história pequena,
com começo, meio e fim e faz uso dos adjuntos adverbiais de
tempo para isso. Então, vemos aqui também o subprincípio da or-
denação linear. E a mesma lógica da fala permanece na escrita.
O informante usa um adjunto não-prototípico no seu texto: “até
que”, que tem a mesma idéia de “quando”.
Informante: Simone – Oitava série do ensino fundamental
a) Narrativa de experiência pessoal
Fala:
I: bom... quando eu tinha cinco anos... ocorreu um fato muito chato... mi-nha mãe separando do meu pai... eles já discutiam muito... e aquilo me:: me magoava de alguma/ de todas as formas... isso ficou muito marcante... por-que:: foi triste... porque eu logo... logo tive/ tinha que ficar longe... longe do meu pai... porque ele quis/ sempre estava ali comigo... eu ia ter que ficar distante... porque logo depois que ele se separou da minha mãe... ele teve que... morar em Fortaleza... esquecendo de toda relação de pai e filha que ele tinha comigo... aí depois... quando fiz uns quatorze anos... eu fui lá... em Fortaleza visitá-lo... pensando que... eu ia morrer de:: de amores::... eu ia abraçar... beijar... ia ter muita vontade... né? mas na realidade... eu não senti nada... pra mim ele era um estranho... e isso sim... me marcou muito...
Escrita:
Quando eu tinha + ou – 5 anos ocorreu um fato muito triste a separação dos meus pais. Foi muito difícil, eles brigavam muito e não se davam bem, então a conclusão foi a separação isso foi dolorozo pois eu só tinha 5 anos e logo não veria mais o meu pai, porque depois da separação ele viajaria para Fortaleza me deixando sem contato algum. Eu sofri com isso durante alguns anos, e depois esqueci. Um ano atrás eu fui a Fortaleza verí meu pai, mas não teve sentimento algum pra mim ele era um estranho eu mal tinha vonta-
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de de abraça-lo. Hoje eu vejo que sofri d+ por ser menina, e agora que sou uma moça não preciso mais dele.
� Percebemos na fala de Simone que ela narra sua história de vida
desde os cinco anos até os dias de hoje, no que diz respeito a co-
mo encarou a separação dos seus pais. Para isso, precisa usar os
adjuntos adverbiais de tempo que irão marcar esses momentos,
então aqui também se encaixa o subprincípio da ordenação linear.
Visivelmente a informante utiliza mais adjuntos adverbiais de
tempo na escrita do que na fala. Na escrita ela teve mais tempo
para organizar melhor o seu discurso e sentiu a necessidade de
separar os fatos usando esses adjuntos.
b) Narrativa recontada
Fala:
I: bom... hoje... quando eu estava vindo pra escola... foi muito engraçado... meu colega me parou... e me perguntou o que que... eu tinha... recebido de presente de dia dos namorados... eu ri... olhei pra ele e falei “ah... ganhei esse par de brincos...” aí ele: “hum:: bonitinho...” aí eu falei assim “e aí... Leandro... e você... como foi?” aí ele “Simone... nem te conto... [...] cha-mei... aí ela desceu toda sorridente... com um embrulhinho na mão... aí eu fiquei meio sem graça... não tinha comprado nada pra ela... aí ela veio ‘aqui ó... seu presente do dia dos namorados...’ minha cara foi no chão... eu não tinha nada pra dar a ela... aí eu fui... procurei... procurei... olhei... a primeira coisa que eu vi foi meu relógio... eu olhei pra cara dela... e falei ‘aqui... você gostou? isso aqui é pra você...’ [...]
Escrita:
Hoje quando eu estava indo para a escola, meu amigo Leandro me parou na rua e me perguntou como foi o meu dia dos namorados e que que eu ganhei eu respondi: - Foi ótimo e ganhei estes brincos. Aí foi a minha vez quando eu fui perguntar a ele, ele abaixou a cabeça e riu me contando. Eu fui na
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casa da minha namorada a noite, chegando lá, ela veio toda sorridente com uma caixa na mão. Aquí seu presente! Que vergonha! Eu não tinha levado nada. Fiquei todo sem graça comecei a gaguejar olhei pra meu braço e a 1ª coisa que veio na minha cabeça o relógio, amostrei a ela e perguntei se ela gostou tirando do meu braço e botando no dela detalhe acabei perdendo um relógio.
� Na fala e na escrita da informante vemos que ela conta uma histó-
ria dentro de outra. Então, precisa usar os adjuntos adverbiais de
tempo em ambas as histórias.
Um adjunto não-prototípico utilizado por ela foi “de dia dos na-
morados”.
Informante: Bruna – Quarta série do ensino fundamental
a) Narrativa de experiência pessoal
Fala:
I: outro dia que eu estava vindo da casa de meu padrasto... aí eu conheci meu pai... meu pai trabalha no:: 44... eu estava esperando o 54... estava indo embora... e depois... [..] estava... a minha prima Pâmela também... aí a mi-nha mãe falou assim “olha lá Bruna teu pai” aí eu falei assim “vamos lá mãe”... aí abriu a porta pensando que era passageiro... ela falou assim “sobe logo”... aí:: ela falou assim “você... você se lembra dela?”... aí ele falou assim... “não...” “Bru::na”... aí ele... aí ele falou assim “Bru::na”... aí minha mãe (falou assim) “já esqueceu de::la?”... [...]
Escrita:
Eu estava vindo da casa do meu padrasto quando Eu estava esperando o cinquenta e quatro quando Eu conheci meu pai Ele trabalha no 44 quando minha mãe falou assim Bruna olha-la seu pai ai Eu disse assim vomos la mãe Ele abril a porta do onibus pensamdo que Era passageiro Ele falou assim sobe logo ai minha mãe falou asim você se lembra dela aí Ele disse asim não quem nhe Bruna Ele disse assim Ela e minha filha minha mãe disse e sua filha agora Eu sei o nome dela se chama Bruna Eu vou proucula Ela e se Ela não gosta de mim de pois que Ela tevil no onibos
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� Na fala a informante não situa o dia exato em que a história nar-
rada ocorreu, ela fala “outro dia”, que não deixa de ser um adjun-
to adverbial de tempo. Utiliza um “depois” e um “já”. Esta infor-
mante fala muito pouco em comparação aos informantes mais ve-
lhos. Para organizar-se melhor, na escrita ela aumenta o número
de adjuntos adverbiais de tempo, os repetindo algumas vezes
também.
b) Narrativa recontada
Fala:
I: minha... minha colega Monique me contou... que a irmã dela tinha sofri-do um acidente... o cavalo correu pro meio da ru::a... aí o carro foi... atrope-lou ela... aí o cara falou assim:: “vai lá oh::... oh amiga de Monique... vai lá chamar:: a Maria”... aí eu falei assim “calma aí que eu já estou indo”... aí eu fui lá... chamei ela... ela disse assim... “espera lá que eu já estou indo já”... [...] aí depois a:: Maria foi lá... na casa dela chamou a mãe dela... aí a mãe dela se arrumou...levou ela pro... pro hospital... chegou lá no hospital ela desmaiou...
Escrita:
minha colega monique me disse que a irma dela sofrel um asidente Esse asidente foi de carro Ela estava corendo do cavalo quando Ela correu para o menho da rua e o carro batel na perna dela ela ficou esticado no menho da rua quando a irma dela ficou desesperada quando a tinha dela estava sobin-do a casa Eu fui chamar maria Ela falou a decha Ela la que Eu jato indo jà Eu vou lem casa chamar minha mãe ai depois o motorista do carro levou Ela para o ospital e queria que Eu fosse com jaqueline depois Ela voutou para casa dentro de cinco dia.
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� O mesmo da narrativa de experiência pessoal acontece nesta nar-
rativa. A informante utiliza um “depois” e três “já”. Fala muito
pouco também. Na escrita a informante aumenta novamente o
número de adjuntos adverbiais de tempo e os repete mais vezes.
Informante: Luiz Eduardo – Educação infantil
a) Narrativa de experiência pessoal
Fala:
I: [...] eh... eh... quando eu fui numa praia que eu nunca fui... com a minha tia me levou... [ahn] lá tinha peixe colorido que eu tentava pegar... aí de repente:: que veio uma onda... e trouxe pra beira... eu estava com um poti-nho tentando pegar... aí eu fiz assim...quando a água puxou veio pra dentro do pote... eu... eh... eu falei pra minha mãe... [...] aí a gente cavava rápido... se não a água vinha e enchia o buraco de água... aí quando você vê uma coisa branca... assim:: parece uma concha... aí você tira... pra ver se é tatuí...
Escrita:
Mes pasado eu fui na praia com minha mãe minha irma e minha tia comdo chegei na praia vi muintos pexinhos na bera daguá e fiqui muinto felis
� O informante usa os adjuntos adverbiais de tempo para organizar
a sua fala. Ele fala pouco também, como a informante anterior.
Na escrita ele resume demasiadamente a história e com isso o
número de adjuntos adverbiais de tempo diminui também. Porém,
ele informa melhor quando o fato ocorreu dizendo “mes pasado”.
b) Narrativa recontada
Fala:
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I: eh... eh... minha mãe contou... que... eh... minha amiga... que estudou comigo no segundo período... eh... eh... estava doente... assim:: muito.. né? que perdeu... eh... num tem a:: a proteína... eh... a bolinha... num tem boli-nha:: vermelha... e... eh... a que... bolinha vermelha e:: amarela... ela perdeu/ ela perdeu todas as vermelhas... a vermelha não... a amarela... né? Aí ficou/ aí ela ficou doente... foi/ ficou internada no médico... monte de dias... aí daqui a pouco... aí el/ela ficou boa... aí... depois... eh... eu vi ela só um dia... porque:: outros eu não sei se ela:: saiu...
Escrita:
Minha mãe me contou um dia que minha amiga tava doente e ficou interna-da no ospitau porque estava fraca porque ela perdeu as bolinhas vermelias e brancas do sange.
� Como na narrativa de experiência pessoal, na narrativa recontada
o informante utiliza também os adjuntos adverbiais de tempo para
organizar seu discurso e situar o seu interlocutor sobre o momen-
to dos fatos narrados. Fala pouco também. Na escrita percebemos
que esse informante tem a tendência a resumir bastante sua histó-
ria, pois o faz aqui também. Mas mesmo assim, utiliza um adjun-
to adverbial de tempo.
Considerações Finais
O estudo aqui apresentado procurou mostrar a importância dos
adjuntos adverbiais de tempo em uma oração e de forma geral, na
interação comunicativa cotidiana.
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Com o arcabouço da teoria funcionalista, acreditamos que es-
ses adjuntos possuem sua função discursiva, pois necessitamos fazer
uso deles quando nos comunicamos com outras pessoas, e estamos
sempre contando nossas experiências externas ou internas. E, dentro
dessa fala do dia-a-dia, utilizamos os adjuntos adverbiais de tempo
para que a nossa fala seja clara, coerente e obtenha o êxito comunica-
tivo.
As gramáticas tradicionais afirmam que esses adjuntos adver-
biais são termos acessórios, pois analisam a língua sob um ponto de
vista estrutural, formal; não levam em conta a função semântica e
pragmática da oração, o que faz a teoria funcionalista. Além disso,
nos seus estudos, elas utilizam como exemplos orações simples, em
que tudo é prototípico, ou seja, ideal. Já as análises lingüísticas se
baseiam no uso concreto da língua pelos falantes.
E, segundo os termos de Hopper (Op. cit.) “o usuário da língua
não extrai ‘palavras de um catálogo por causa de sua adaptabilidade
a uma construção sintática particular, mas, ao contrário, a forma
categorial que uma palavra assume é um reflexo de sua função num
contexto retórico particular” (HOPPER apud DECAT, 1988, p. 164).
Acreditamos que as gramáticas tradicionais têm o seu valor
em mostrar a língua de modo padrão. Porém acreditamos também
que se deva dar espaço para a fala do cotidiano, pois na interação do
dia-a-dia muitas expressões surgem, e às vezes, essas gramáticas não
conseguem alcançar todos os vocábulos novos e esperam também,
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que eles tenham a aceitabilidade da maioria do grupo de falantes para
serem institucionalizados.
E é na necessidade de se buscar uma teoria que abranja a fala
real cotidiana que buscamos o funcionalismo, não para discriminar a
gramática normativa, mas para complementar o seu estudo e oferecer
uma visão nova ao que ela faz. Acreditamos que se trabalharmos
utilizando os dois estudos, as aulas de português serão mais produti-
vas, pois muitas vezes nossos alunos não vêem no dia-a-dia deles a
aplicabilidade do que estudam e passam a considerar o português, a
língua falada por eles, uma “matéria” chata e cansativa, o que é uma
incoerência.
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE. Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas. Instituto de Letras. Grupo de Estudos Discurso & Gramática, coordenado por Sebastião Votre e Mariânge-
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la Rios de Oliveira. Apresenta a língua falada e escrita na cidade de Niterói. Disponível em: <www.uff.br/d&g>. Acesso em 31 julho 2007.