A JUSTIÇA RESTAURATIVA E O PROFESSOR DE DIREITO: o núcleo central das representações sociais sobre Justiça Restaurativa de professores do ensino
jurídico
Rudy Heitor Rosas1
RESUMO
O artigo tem como objeto representações sociais sobre justiça restaurativa, embasado na Teoria do Núcleo Central. Existe contemporaneidade no tema e necessidade de mapear o que se compartilha entre pessoas que ensinam sobre isso. Partindo de questionário com um estímulo e posterior classificação, os dados foram analisados no software OpenEvoc, levantou-se o núcleo central da representação. A hipótese de que se parte é que professores do ensino superior ainda não sabem o que a Justiça Restaurativa significa. Participaram da pesquisa 15 professores de instituição de ensino privado de Guarapuava – Paraná. Os resultados permitiram confirmar a hipótese. Palavras-chave: Representações Sociais. Núcleo Central. Justiça Restaurativa. Professores de Direito.
1 INTRODUÇÃO
O estudo parte da atuação do autor em instituição de ensino privado.
A despeito de a Justiça Restaurativa vir dia a dia alcançando maior relevância
dentro do cenário jurídico nacional, tendo sido inclusive acolhida como meta do Poder
Judiciário para 2016, verifica-se que muitos dos professores de Direito não têm
conhecimento sobre o tema, ou a abordam como hipótese muito remota, porventura
não condizente com o sistema jurídico brasileiro.
A reflexão surgiu também a partir de uma afirmação de Nils Christie, citada
por, na já clássica obra sobre Justiça Restaurativa, “Trocando as Lentes” (2008, p. 77):
A educação jurídica é um treinamento em simplificações. É uma incapacidade aprendida que faz com que o profissional, em vez de olhar todos os valores de uma situação, selecione somente os que têm relevância jurídica, ou seja, aqueles definidos pelos altos escalões do sistema como relevantes.
Para se verificar a referida hipótese, optou-se por analisar a problemática a
partir da Teoria do Núcleo Central das Representações Sociais, submetendo
questionários a professores de diversas áreas jurídicas, atuantes no curso de Direito
1 Mestrando em Ciências Sociais Aplicadas – UEPG, especialista em Ciências Criminais –
Faculdade Campo Real, professor de Prática Penal na Faculdade Campo Real, Advogado Criminalista.
da Faculdade Campo Real, em Guarapuava no Paraná. Assim, a primeira parte do
trabalho se dedica a delinear alguns itens principais da mencionada teoria, assim
como os autores em que se fundamenta.
Em seguida, abordam-se alguns aspectos da Justiça Restaurativa, para se
demonstrar a importância de que o ensino jurídico também se amolde a este novo
paradigma, para que sejam formados profissionais aptos a sua administração (apesar
da Justiça Restaurativa não se tratar de instrumento meramente jurídico).
Um dos principais elementos a ser despertado nos professores e nos
egressos que estes pretendem formar é a abertura para o estudo interdisciplinar, uma
vez que os conflitos que são submetidos aos profissionais do Direito em geral não são
plenamente solucionados apenas com leis e técnica jurídica.
Por fim, será demonstrada a metodologia e seus resultados.
2 A TEORIA DO NÚCLEO CENTRAL DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
A Teoria do Núcleo Central é área de expansão da Teoria das
Representações Sociais, essa última funciona como epistemologia guarda-chuva,
tendo embaixo de si múltiplas formas de se abordar diversos temas, todos na
perspectiva europeia de análise. Isso significa basicamente o oposto das
características americanas de Psicologia Social: “individualismo, experimentalismo,
microteorização, cognitivismo e a-historicismo”. (SÁ, 1996, p. 15).
A abordagem europeia assenta-se em Moscovici e busca entender como o
ser humano interage entre si e com o social, sofrendo influências e influenciado o meio
numa relação simbiótica que se altera conforme momentos históricos e os conceitos.
Pelo que se esboça é possível perceber o afastamento europeu do paradigma
americano já que, ao considerar Moscovici uma “teoria guarda-chuva” fica afastada a
ideia de microteorização; ao levantar a simbiose social-individual fica afastada a
característica individual e também a experimental, visto beirar o impossível o controle
laboratorial (experimento) quando no seio da dinâmica social. A característica da
contextualização histórica ainda permite negar o a-historicismo americano.
O ponto de contato seria o cognitivismo, mas como esboçado, esse
cognitivismo em Moscovici e nas teorias que dele irradiam devem minimamente ser
social e não individual. Esse posicionamento é sustentado por Sá (1996, p. 23).
A teoria de Moscovici está sediada em diversos conceitos e construções, mas
o que tem de mais relevante é a opção por estudar o universo consensual em
detrimento do universo reificado e analisar os dois motores (processos) formadores
das representações sociais: a ancoragem e a objetivação (MOSCOVICI, 2013, p. 60).
O universo consensual seria as trocas de conhecimentos ocorridas entre o
senso comum, entre as pessoas no seu cotidiano, sem muita pesquisa (universo
reificado). É esse conhecimento socialmente partilhado e que nem sempre
corresponde à realidade verificada em laboratórios e estudos que interessa à teoria
das representações sociais, ir até a comunidade, aos grupos e desvendar o que estão
pensando em relação à determinado assunto, objeto, fato, e especialmente os motivos
que levaram eles a criar o conteúdo partilhado dessa forma e nesse perspectiva.
Nesse momento entram os dois fatores, ancoragem e objetivação no estudo, pois são
eles que auxiliam no mapeamento prática da representação social.
Transformando em exemplo prático fica mais simples a explicação. Imagine
que uma criança escute pela primeira vez o termo “ornitorrinco”. Essa criança, ao não
dominar o termo, provavelmente não saberá do que realmente se trata aquilo. Isso
ocorre porque ela ainda não tem um conceito sobre isso, muito menos tem uma
imagem. Caso ela tivesse algum conceito, iria fazer o processo de ancoragem, ou
seja, resgataria o conceito já existente e passaria a tentar ter uma imagem sobre
aquilo, esse imagem é a criação de um objeto mental, ou simplesmente, objetivação.
Prosseguindo no mesmo exemplo, essa criança pergunta aos seus pais sobre
o que de fato é um ornitorrinco. Os pais sem acesso a uma foto imediata do bicho,
explicam que parece um pato, pois tem bico e pés de pato (conceito 1), mas o corpo e
o rabo são de castor (conceito 2). Isso fará a criança recuperar o que já domina
(ancoragem) e, possivelmente, constituirá uma imagem (objetivação):
Ancoragem do conceito 1 + Ancoragem do conceito 2
=
Objetivação
Fonte: O autor, com uso do Google Imagens.
Esse processo remete a uma terceira categoria de Moscovici, a
transformação do não-familiar em familiar (MOSCOVI, 2013, p. 60).
Por isso existe a possibilidade de enquadrar o estudo na teoria, pois a
escolha do grupo “professores” é específica, no recorte temporal 2016, dentro da
conjuntura histórica “expansão da Justiça Restaurativa no Brasil”. E, apesar de serem
grupo de profissionais do ensino superior, a novidade do tema faz com que o aparente
universo reificado de professores se transforme num universo consensual, pois ainda
não existe normativa, nem conceituação pacificada dentro de tribunais ou referenciais.
2 A JUSTIÇA RESTAURATIVA
O paradigma de solução de conflitos denominado Justiça Restaurativa ainda é
tratado como novidade no Brasil, apesar de ser baseado em práticas já há décadas
utilizada em outros países, práticas estas milenares, fruto dos usos de tribos e
comunidades neozelandesas e africanas. Assim ensina Rafaella da Porciuncula
Pallamolla:
Apesar da explosão da Justiça Restaurativa acontecer somente nos anos 90, antes dela já havia valores, processos e práticas restaurativas. Todavia, foi na década de 90 que o tema voltou a atrair o interesse de pesquisadores como um possível caminho para reverter a situação de ineficiência e altos custos, tanto financeiros como humanos, do sistema de justiça tradicional e o fracasso deste sistema na responsabilização dos infratores e atenção às necessidades e interesses das vítimas.(2009, p. 34)
É possível encontrar diversos conceitos de Justiça Restaurativa, optando-se
aqui por apresentar o conceito constante da Resolução 2012/02 do Conselho
Econômico e Social da Organização das Nações Unidas:
I – Terminologia 1. Programa de Justiça Restaurativa significa qualquer programa que use processos restaurativos e objetive atingir resultados restaurativos 2. Processo restaurativo significa qualquer processo no qual a vítima e o ofensor, e, quando apropriado, quaisquer outros indivíduos ou membros da comunidade afetados por um crime, participam ativamente na resolução das questões oriundas do crime, geralmente com a ajuda de um facilitador. Os processos restaurativos podem incluir a mediação, a conciliação, a reunião familiar ou comunitária (conferencing) e círculos decisórios (sentencing circles). 3. Resultado restaurativo significa um acordo construído no processo restaurativo. Resultados restaurativos incluem respostas e programas tais como reparação, restituição e serviço comunitário, objetivando atender as necessidades individuais
e coletivas e responsabilidades das partes, bem assim promover a reintegração da vítima e do ofensor. 4. Partes significa a vítima, o ofensor e quaisquer outros indivíduos ou membros da comunidade afetados por um crime que podem estar envolvidos em um processo restaurativo. 5. Facilitador significa uma pessoa cujo papel é facilitar, de maneira justa e imparcial, a participação das pessoas afetadas e envolvidas num processo restaurativo.
Apesar de falar em partes e em processo, não se trata do modelo tradicional
de justiça, não sendo mencionados advogados ou juízes neste contexto. Exatamente
este o ponto que poderia gerar resistência entre os profissionais da área.
Interessa à Justiça Restaurativa deslocar o Estado como principal interessado
na solução dos conflitos e devolver a questão a seus verdadeiros “donos”, vítima e
agressor, tal como reflete Nils Christie no basilar artigo Conflito como Propriedade. As
pessoas envolvidas em um problema devem relacionar-se entre si e não com o Estado
e seus representantes. Conforme adverte Howard Zehr, na justiça tradicional, os
dramas são travados entre abstrações, vítima e réu deixam de ser pessoas para se
tornarem meros personagens em narrativas feitas por terceiros (2008, p. 18).
Daniel Achutti apresenta algumas das principais características da Justiça
Restaurativa: a) Empoderamento da vítima, com participação efetiva nos debates; b)
Possibilidade de não resultar em prisão, mesmo diante de confissão e aparato
probatório; c) Possibilidade de acordo entre as partes, independente de homologação
judicial; e) Operadores jurídicos não são imprescindíveis, mas não são
dispensáveis; f) Participação do meio social de ambas as partes, com direito de voz;
g) O facilitador não interrompe os debates; h) A solução não necessariamente deve
ser pecuniária; i) Nenhuma decisão é imposta; j) Decisão não deve ser aceita em
casos em que o acusado não reconhece o seu erro (ACHUTTI, 2009, p. 100).
3 METODOLOGIA APLICADA
Na escolha de Sá como referencial teórico e do Núcleo Central como forma
de abordar o problema, é possível escolher entre três técnicas/métodos dentro da TNC
(Teoria do Núcleo Central): “a evocação ou associação livre, a hierarquização de itens
e a indução por cenário ambíguo. (SÁ, 1996, p. 115). A opção metodológica aqui foi
pela evocação livre, que permite uma vasta espontaneidade dos sujeitos na hora de
responder ao que se propões (SÁ, 1996, p. 115-116).
O emprego se dá através de questionário, dividido em duas etapas. Sobre a
resposta, é solicitado que os respondentes não façam qualquer busca para auxiliar na
resposta e que respondam de forma espontânea aquilo que vier imediatamente à
cabeça, sendo informados que não existe resposta certa ou errada.
Na etapa 1 é dado um estímulo indutor ao respondente, solicitando que
preencha 04 espaços com as primeiras palavras ou expressões que vieram à mente.
Na etapa 2 é solicitado que volte às suas resposta e as enumere em ordem
de importância, onde 1 é o que ele considera mais relevante e 4 é o menos relevante.
O indutor utilizado foi: “Justiça Restaurativa é...”.
A imagem abaixo é o questionário, na exata maneira como foi aplicado:
Imagem 1 – Instrumento
Fonte: O autor.
Essa técnica permitiu que os dados colhidos fossem tratados através do
software OpenEvoc, de acesso livre, baseado no software Evoc, desenvolvido por
Vergès. O programa faz a leitura lexical das evocações dadas pelos sujeitos cruzando
dois dados fundamentais: 1º número de evocações, 2º ordem de classificação de
relevância da evocação.
O programa cria 04 quadrantes, que podem ser assim entendidos:
Quadro 1 – Quadrantes
Núcleo Central – maior frequência e menor ordem
(já que a ordem 1 é a mais relevante).
1ª Periferia – maior frequência e maior ordem (o
número de evocações auxilia na formação da
representação).
Zona de Contraste – menor frequência, porém
com menor ordem (este quadrante é relevante
ainda que pela baixa frequência, já que são
classificados como importantes pelos sujeitos).
2ª Periferia – menor frequência e maior ordem
(elementos com baixa evocação e alta ordem
são os menos relevantes)
Fonte: O autor - extraído através da interpretação de Vergès (2002).
Além do auxílio do programa, também foi realizada uma filtragem de léxicos.
Foram agrupados os léxicos de significado semelhante, para aproximar a pesquisa ao
núcleo central da representação em estudo. Assim, rodou-se novamente o sistema,
obtendo-se um segundo resultado.
Os questionários foram respondidos por 15 professores do Curso de Direito.
Pretendia-se investigar o quanto os professores do curso já se apropriaram da Justiça
Restaurativa, seus conceitos principais e valores. Para tanto, os questionários foram
submetidos a professores de diversas áreas do curso, considerando que a Justiça
Restaurativa pode ser aplicada a todo tipo de conflito (não apenas criminais ou
familiares, por exemplo).
Partia-se da hipótese de que os professores de Direito ainda conhecem
pouco sobre a Justiça Restaurativa, o que reflete na formação de profissionais ainda
adaptados a um Direito adversarial, baseado sempre no “ganhar ou perder”, que
dificilmente incentivariam potenciais clientes a optarem por práticas restaurativas. Os
questionários foram aplicados entre os dias 20 a 25 de junho de 2016.
Interessante pontuar sobre certa resistência por parte dos professores em
responder o questionário sem antes realizar alguma pesquisa sobre o tema.
Certamente tal resistência pode ser imputada à sensação de estarem sendo avaliados
por um colega de trabalho.
4 RESULTADOS DA PESQUISA
Abaixo é possível verificar os resultados obtidos a partir da submissão das
respostas dos sujeitos ao programa utilizado:
Quadro 2 – Resultados do OpenEvoc sem nenhum filtro
Fonte: O autor – através do OpenEvoc.
Ainda antes de uma “filtragem” dos termos encontrados, chegou-se ao
seguinte elenco de léxicos levantados pelos sujeitos pesquisados, a partir do qual é
possível observar a repetição de termos e a semelhança entre vários deles:
Quadro 3 – Léxicos brutos
;acordo entre as partes
;agilidade processual
;alternativa à justiça retributiva
;celeridade
;conversa entre autor vítima e comunidade sobre consequências do delito
;desburocratização
;direitos humanos
;dirimir a lide
;falha no sistema atual
;harmonia
;harmonizar a relação entre as partes
;humanização
;igualdade
;infração penal
;infância e juventude
;inovadora
;justiça não punitiva
;mediação
;melhor justiça
;novas possibilidades
;pacificação
;padrão não punitivo
;participação
;prevenção
;reabilitação do ofensor
;reconstrução de relações
;recuperação
;redução de custos
;reestabelecer equilíbrio entre as partes
;reinserção
;reintegração
;reparação
;reparação de danos
;resolução de conflitos
;responsabilização
;restaurar
;restaurar a sociedade de forma consensual
;restaurar conflitos
;restaurar/indenizar sem pena
;restauração
;satisfação
;sociabilidade
;socialização
;solução de conflitos
;solução de conflitos entre indivíduos
;tratar o crime como relação interpessoal
;valor
;valorização da vítima
;vítima-comunidade-ofensor
Fonte: O autor.
No quadro bruto de léxicos foram encontrados 49 resultados diversos, porém
essas mesmas 49 palavras e/ou expressões apareceram 60 vezes quando se trata de
evocações. Esse número demonstra a realidade da pesquisa e a divergência entre os
sujeitos, já que foram quinze os participantes, cada um respondendo com 4 palavras
ou expressões (total de 60 evocações), conseguiram apresentar 49 respostas que não
tinham idêntica composição. Isso significa que a diversidade está em
aproximadamente 81,5% das respostas, porém existe uma aproximação do conteúdo,
e é isso que justifica uma “purificação dos dados”, que é a aproximação dos léxicos
que contenham conteúdo semelhante em termos subjetivos.
Essa purificação foi feita da seguinte forma: as palavras semelhantes em
conteúdo, ainda que diversas em forma, como é o caso de “solução” e “resolução”,
foram agrupadas sob um só léxico, por exemplo, “solução”. Após forma inseridas
novamente no sistema para leitura do programa.
No quadro que segue estão expostos os termos que foram transformados
num só léxico. A opção por incluir a tabela bruta e a tabela de “purificação” se deu
para que o leitor tenha a possibilidade de analisar as opções do autor, bem como tecer
críticas que contribuam para a melhora das pesquisas vindouras, criando assim uma
metodologia de análise mais eficaz:
Quadro 3 – Purificação dos Dados
Categoria: Solução de Conflitos
;dirimir a lide
;resolução de conflitos
;solução de conflitos
;solução de conflitos entre indivíduos
Categoria: Restauração
;restaurar
;restaurar a sociedade de forma consensual
;restaurar conflitos
;restaurar/indenizar sem pena
;restauração
Categoria: Celeridade
;agilidade processual
;celeridade
;desburocratização
Categoria: Nova Justiça
;alternativa à justiça retributiva
;falha no sistema atual
;melhor justiça
;novas possibilidades
Categoria: Harmonização das Relações
;conversa entre autor vítima e comunidade sobre consequências do delito
;harmonia
;harmonizar a relação entre as partes
;pacificação
;reconstrução de relações
;vítima-comunidade-ofensor
Fonte: O autor.
As categorias esboçadas tomaram o lugar dos antigos léxicos e assim na
nova leitura do sistema continuaram aparecendo as 60 evocações, porém agora com
32 léxicos, ou seja aproximadamente 53% de diferença entre palavras ou expressões.
O resultado do sistema para o núcleo central e demais áreas do quadro de
análise, ficou da seguinte forma:
Quadro 4 – Núcleo Central, Zona de Contraste e Periferias
Fonte: O autor – através do OpenEvoc.
O que se pode extrair dos dados da forma como estão expostos vai – em
certa medida – de encontro ao que se tinha como hipótese inicial. A palavra
restauração ao que parece surge nos dados como mera decorrência do próprio nome
deste modelo de resolução de conflitos e não necessariamente do conhecimento de
suas intenções. Observa-se também a tendência em atribuir qualidades positivas à
Justiça Restaurativa, o que pode ser decorrência do conhecimento de que o autor
interessa-se pelo tema e é partidário da aplicação das práticas restaurativas.
Aparecem também expressões diretamente relacionadas à formação jurídica,
como a preocupação com “dirimir a lide”, “agilidade”, “celeridade” e “redução de
custos” do processo. O que não são exatamente objetivos da Justiça Restaurativa.
5 CONCLUSÕES
É necessário avançar no sentido de perceber que nem todo o Direito vem do
Estado, vindo dele apenas a lei. Por isto talvez seja mais fácil a profissionais de outras
áreas, tais como da Psicologia ou do Serviço Social, assimilar o paradigma
restaurativo, uma vez que não estão tão atrelados à noção de monopólio das soluções
de problemas apenas nas mãos dos Estados.
Restou evidente a possibilidade de novas pesquisas com o mesmo padrão
de sujeitos, para se aferir o conhecimento prático sobre o funcionamento da Justiça
Restaurativa e preconceitos quanto ao âmbito de sua aplicabilidade – veja-se, por
exemplo, que entre possíveis categoria de conflitos o que apareceu nos resultados foi
infância e juventude.
Trata-se da necessidade de modernização da Justiça, que não virá sem a
necessária modernização do ensino jurídico. Não se deve sucumbir à tentação de
encaixar a Justiça Restaurativa aos moldes da justiça tradicional, talvez com isso
reproduzindo os mesmos problemas desta.
Conclui-se com a certeza de que a difusão da Justiça Restaurativa entre os
professores de cursos jurídicos é fundamental para a superação da visão dos
profissionais do Direito como “ladrões profissionais” (CHRISTIE, 1977), tal como
exposto pelo autor norueguês e realidade em diversos ambientes jurídicos.
6 REFERÊNCIAS
ACHUTTI, Daniel. Modelos contemporâneos de justiça criminal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. CHRISTIE, Niels. Conflict as property. The Britsh Journal of Criminology. v. 17. n.1. jan/1977. Disponível em: <bjc.oxfordjournal.org>. Acesso em: 4 abr 2015. JUSTIÇA 21. Resolução 2002/12 da ONU - PRINCÍPIOS BÁSICOS PARA UTILIZAÇÃO DE PROGRAMAS DE JUSTIÇA RESTAURATIVA EM MATÉRIA CRIMINAL. Disponível em: http://justica21.org.br/j21.php?id=366&pg=0#.U_JNjxt0zDc. Acesso em 2 /08/2014. MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigação em psicologia social. 10 ed. Traduzido por Pedrinho A. Guareschi. Petrópolis: Vozes, 2013. PALLAMOLLA, Rafaella da Porciuncula. Justiça restaurativa: da teoria à prática. São Paulo: IBCCRIM, 2009. SÁ, Celso Pereira de. Núcleo central das representações sociais. Petrópolis: Vozes, 1996. ZEHR, Howard. Trocando as lentes. São Paulo: Palas Athena, 2008.