Download - A Caminhada Para Um Futuro Incerto
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CINCIAS HUMANAS
LEV SALOMO MATSINHE
MOAMBIQUE: UMA LONGA CAMINHADA PARA UM FUTURO
INCERTO?
PORTO ALEGRE
2011
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LEV SALOMO MATSINHE
MOAMBIQUE: UMA LONGA CAMINHADA PARA UM FUTURO INCERTO?
Dissertao apresentada como
requisito parcial obteno
do grau de Mestre em
Relaes Internacionais pelo
Instituto de Filosofia e
Cincias Humanas da
Universidade Federal do Rio
Grande do Sul
Orientadora: Prof Dr Maria Susana Arrosa Soares
PORTO ALEGRE
2011
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LEV SALOMO MATSINHE
MOAMBIQUE: UMA LONGA CAMINHADA PARA UM FUTURO
INCERTO?MOAMBIQUE: UMA LONGA CAMINHADA PARA UM FUTURO
INCERTO?
Dissertao apresentada como
requisito parcial obteno do
grau de Mestre em Relaes
Internacionais pelo Instituto de
Filosofia e Cincias Humanas da
Universidade Federal do Rio
Grande do Sul
Aprovado pela banca examinadora em 1 de maro de 2011.
BANCA EXAMINADORA
---------------------------------------------------
Prof Dr Maria Susana Arrosa Soares (Orientadora, UFRGS)
---------------------------------------------------
Prof Dr Ondina Maria Fachel Leal (UFRGS)
-----------------------------------------------
Prof. Dr. Ral Enrique Rojo (UFRGS)
------------------------------------------------------------
Prof. Dr. Rivair Macedo (Programa de Ps-Graduao em Histria, UFRGS examinador
externo)
Porto Alegre
2011
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Dedico este trabalho minha mulher
Olga Cristina Chitsondzo, s minhas
filhas Cristiana Raimundo Ndlalane,
Jssica da Felicidade Lev Matsinhe e ao
meu filho Lev Salomo Matsinhe Jnior
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AGRADECIMENTOS
Agradeo a todos que direta ou indiretamente contriburam para que este sonho se tornasse
uma realidade.
Em primeiro lugar agradeo ao CNPQ pela concesso da bolsa; Ministra da Funo Pblica
pela confiana que depositou em mim e por causa disso ter concordado com a minha
formao.
O meu agradecimento estende-se ao corpo docente e s secretrias do Programa de Mestrado
em Relaes Internacionais do Instituto de Filosofia e Cincias Humanas da Universidade
Federal do Rio Grane do Sul. Aos Docentes pelos conhecimentos transmitidos durantes os
dois anos de formao. s secretrias do Programa Biatriz Accorsi e Nara Widholzer pelo
apoio e simpatia.
O meu especial obrigado vai para a minha orientadora Prof Dr Maria Susana Arrosa Soares
pela pacincia e solicitude durante o percurso da realizao desta dissertao, e a todos
docentes do programa pelo conhecimentos transmitidos durante os dois anos de formao.
Agradeo ao Dr. Jos Ibrrahimo Naran Perreira Antunes do Gabinete das Zonas Econmicas
de Desenvolvimento Acelerado (GAZEDA), ao Centro de Promoo de Investimentos (CPI),
ao Dr Florncio Chavango do Ministrio do Comrcio, ao Sr. Henrique Manjate do
Departamento da Dvida Pblica no Ministrio das Finanas, ao Dr. Lus Eugnio Tobela do
Ministrio da Planificao e Desenvolvimento Dr Regina Macuacua da Kenmare e ao Sr.
Antnio Mulicote, tambm da Kenmare pela solicitude e disponibilizao de informaes e
dados que tornaram possvel a elaborao desta dissertao.
Agradeo em extenso aos meus colegas de turma, em especial para o Leonardo Ales e
George Sturaro.
Aos meus pais por me terem nascido; milha mulher e meus filhos pela felicidade, coragem e
confiana que me do na difcil e tenebrosa caminhada da vida.
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RESUMO
A trajetria de Moambique desde a independncia, ocorrida em 1975, at 2009 foi marcada
pela transio de uma economia centralmente planificada (socialista) para uma economia de
mercado (capitalista). A transio para o capitalismo abriu espao para financiamentos de
Ajuda Externa ao Desenvolvimento das Instituies de Bretton Woods (Banco Mundial BM
e Fundo Monetrio Internacional FMI) e Investimentos Estrangeiros Diretos em forma de
mega-projetos das corporaes multinacionais em Zonas Francas Industriais e Zonas
Econmicas Especiais. Entretanto, a aliana da elite nacional como o capital estrangeiro
favoreceu a corrupo, a transferncia de lucros das multinacionais para os pases de origem,
fazendo com que a Ajuda Externa ao Desenvolvimento e os Investimentos Estrangeiros
Diretos no produzissem desenvolvimento econmico e bem-estar social, com se pretendia
que fosse. Este estudo identificou o Ajustamento Estrutural, a Ajuda Externa ao
Desenvolvimento, a corrupo e as Zonas Francas Industriais como os principais viles da
situao de pobreza em que Moambique se encontra e concluiu que Moambique nunca ir
reduzir a pobreza de forma significativa, contando apenas com ajuda externa, mega-projetos,
investimentos estrangeiros e ZFI. O que se pensava que seria o remdio para a sada do
marasmo do subdesenvolvimento de Moambique, (portanto, a ajuda, mega-projetos e ZFI)
tornou-se um obstculo ao desenvolvimento do pas.
Palavras-chave: mega-projetos; Zonas Francas Industriais em Moambique; crescimento
econmico e social de Moambique.
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ABSTRACT
The trantion from socialism to capitalism characterized the Mozambican trajectory after its
independence, held in 1975. This transition gave place to external aid by Bretton Woods
(World Bank and International Monetary Fund) and direct investments from multinational
corporations mega-projects in special economic free zones. The alliance between the national
elite with foreign capital brought corruption, transference of profits from the multinational
corporations in Mozambique to its countries of origin. Because of this, the external aid and
foreign investments did not develop the Mozambican economy and also did not bring the
social well being to the people in Mozambique. This research, identified the structural
adjustment, external aid, corruption and special economic free zones as the factories of
poverty in Mozambique, and concluded that Mozambique will never reduce poverty looking
to external aid, mega-projects, direct foreign investments and special economic free zones.
What where thought it was an elixir (mega-projects, external aid, foreign direct investments
and special economic free zones) became an obstacle to development.
Key words: mega-projects; special economic free zones in Mozambique; economic and
social growth in Mozambique
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LISTA DE TABELAS
TABELA 1- AGRESSO MILITAR E ECONMICA CONTRA MOAMBIQUE
30
TABELA 2-FLUXO DE AJUDA POR SETORES 46
TABELA 3-PROJETO POR DOAODOR/ AGNCIAS DAS NU POR ANO (EM US
$)
55
TABELA 4-EMPRESAS DE ZONAS FRANCAS INDUSTRIAIS
56
TABELA 5-COMUNIDADES BENEFICIRIAS DOS PROJETOS DE
RESPONSABILIDADE SOCIAL DA KMAD
56
TABELA 6-IDENTIFICAO E CARACTERIZAO DOS PRINCIPAIS MEGA
PROJETOS EM MOAMBIQUE
57
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LISTA DE GRFICOS
GRFICO 1- DESENVOLVIMENTO DA PRODUO DE 1975 A 1986
26
GRFICO 2- IMPACTO ECONMICO DO PROGRAMA DE REABILITAO
ECONMICA: ALTERAES ANUAIS EM PORCENTAGEM
46
GRFICO 3-EVOLUO DA DVIDA EXTERNA DE MOAMBIQUE
55
GRFICO 4- ANLISE DA CARTEIRA DA DVIDA EXTERNA
56
GRFICO 5-COMPOSIO DA DVIDA EXTERNA
56
GRFICO 6- DVIDA EXTERNA PELOS NOMES DOS CREDORES
57
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SUMRIO
1 INTRODUO
15
2 EVOLUO POLTICA, ECONMICA E SOCIAL DE MOAMBIQUE APS A
INDEPENDNCIA (1975-1983)
22
3 OBSTCULOS QUE DETERMINARAM O FRACASSO DO SOCIALISMO EM
MOAMBIQUE
28
3.1 DETERMINANTES GLOBAIS E REGIONAIS
28
3.2 CIRCUNSTNCIAS INTERNAS QUE DITARAM O FRACASSO DO PROJETO
SOCIALISTA
32
4 AS REFORMAS NEOLIBERAIS EM MOAMBIQUE (1984-1987) 34
4.1 O IMPACTO DO PROGRAMA DE REABILITAO ECONMICA EM
MOAMBIQUE
34
4.2 AJUDA EXTERNA EM MOAMBIQUE
36
4.3 FATORES QUE LEVARAM MOAMBIQUE A ADERIR AO PROGRAMA DE
AJUSTAMENTO ESTRUTURAL (PAE)
42
4.4 OBJETIVOS DO PROGRAMA DE REABILITAO ECONMICA
45
4.5 IMPACTO DO AJUSTAMENTO ESTRUTURAL EM MOAMBIQUE
54
4.6 A CRISE DA DVIDA EXTERNA EM MOAMBIQUE
58
5 AS ZONAS FRANCAS INDUSTRIAIS (ZFI) E ZONAS ECONMICAS
ESPECIAIS (ZEE) EM MOAMBIQUE
59
5.1 CONCEITO DE ZONA FRANCA INDUSTRIAL E ZONA ECONMICA
ESPECIAL
61
5.2 OBJETIVOS DA CRIAO DAS ZONAS FRANCAS INDUSTRIAIS E ZONAS
ECONMICAS ESPECIAIS EM MOAMBIQUE
62
5.3 VANTAGENS DAS ZONAS FRANCAS INDUSTRIAIS E ZONAS
ECONMICAS ESPECIAIS
63
5.4 CONTEXTO EM QUE SURGEM AS ZONAS FRANCAS INDUSTRIAIS E
ZONAS ECONMICAS ESPECIAIS EM MOAMBIQUE
67
5.5 ZONA ECONMICA ESPECIAL (ZEE) DE NACALA
68
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5.6 ZONA FRANCA INDUSTRIAL (ZFI) DE MOMA
68
5.6.1 AREIAS PESADAS DE MOMA (KENMARE)
69
5.6.2 PROJETOS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL
69
5.6.3 EDUCAO
72
5.6.5 EMPREGO
73
73
5.6.7 ZONA FRANCA INDUSTRIAL DA BEIRA
75
5.8 ZONA FRANCA INDUSTRIAL DE MOATIZE
76
5.8.1 MEGA-PROJETO DE EXTRAO DE CARVO MINERAL DA VALE
MOAMBIQUE
78
5.8.2 MEGA-PROJETO DE EXTRAO DE CARVO MINERAL DE BENGA
(RIVARSDALE)
78
5.8.3 ZONA FRANCA INDUSTRIAL DE BELULUANE
79
5.9 CONTRIBUTO DAS ZONAS FRANCAS INDUSTRIAIS NO CRESCIMENTO
ECONMICO E SOCIAL DE MOAMBIQUE
82
6 MEGA-PROJETOS EM MOAMBIQUE
87
CONCLUSES
91
REFERNCIAS
95
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Lista de Abreviaturas
AED Ajuda Externa ao Desenvolvimento
ACNUR Alto Comissariado das Naes Unidas Para os Refugiados
ANC African National Congress
APIE Administrao do Parque Imobilirios do Estado
BM Banco Mundial
Bd M Banco de Moambique, letra maiscula para diferenciar com Banco Mundial
BPD Banco Popular de desenvolvimento
COMEA Concil for Mutual Economic Assistance
DPCCN Departamento de Preveno e Combate s Calamidades Naturais
MEC Complexo Mineral-Energtico Sul-africano
CAIL Complexo Agro Industrial do Limpopo
CIA Central Inteligence Agency
CONSAS Constellation of Southern Africa States
DETA Direo de Explorao dos Transportes Areos
EUA Estados Unidos da Amrica
EE Empresa Estatal
EMOCH Empresa Moambicana de Ch
Felimo Frente de Libertao de Moambique, mais tarde, em 1977, transformado em
partido de vanguarda marxista leninista
FAO Food and Agriculture Organization
FMI Fundo Monetrio Internacional
UNICEF Fundo das Naes Unidas Para a Infncia
GAPO Gabinete de Apoio Produo
GAZEDA Gabinete das Zonas Econmicas de Desenvolvimento Acelerado
HIV/SIDA Human Imuno Deficiency Vrus/Sndrome da Imune Deficincia Adquirida
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HIPC High Indebted Poor Coutries
IFI Instituies Financeiras Internacionais
FNUAP Fundo das Naes Unidas Para a Populao
IED Investimento Estrangeiro Direto
IDA International Development Association
KMAD Kenmare Moma Associao de Desenvolvimento
MONAP Mozambique Nordic Assistance Program
MOTRACO Mozambique Transmission Company
MOZAL - Mozambique Aluminium
OCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico
OPEP Organizao dos Pases Produtores e Exportadores do Petrleo
OTAN Organizao do Trado de Atlntico Norte
ONU Organizao das Naes Unidas
ONUSIDA Organizao das Naes Unidas para o combate Sndrome de Imune
Deficincia (SIDA)
ONGs Organizaes No Governamentais
OPEP Organizao dos Pases Produtores e Exportadores do Petrleo
OMS Organizao Mundial de Sade
PEC Plano Econmico Central
PRE Programa de Reabilitao Econmica
PAE Programa de Ajustamento Estrutural
PMA Programa Mundial de Alimentao
PNB Produto Interno Bruto
PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento
RAS Repblica Sul Africana
RDA Repblica Democrtica Alem
RENAMO Resistncia Nacional de Moambique
-
RFA Repblica Federal Alem
ROMOS Rodoviria de Moambique Sul
ROMOC Rodoviria de Moambique Centro
ROMON Rodoviria de Moambique Norte
SADCC Southern Africa Development Conference
SWAPO South West Africa People's Organization
SASOL Suid Afrikaanse Steenkool en Olie - Carvo e leo Sul-Africanos
UNESCO United Nations Educational, Scietific and Cultural Organization
URSS Unio das Repblicas Socialistas Soviticas
UTRE Unidade Tcnica para a Reestruturao das Empresas
ZANU Zimbabwe African Peoples Union
ZFI Zonas Francas Industriais
ZEE Zona Econmica Especial
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1 INTRODUO
A longa caminhada que Moambique iniciou h 34 anos com a independncia
nacional ocorrida em 1975, foi marcada por uma sucesso de crises. Moambique saiu de
uma economia planificada centralmente para uma economia de mercado; da guerra para a paz
e de um sistema poltico de partido nico para o multipartidarismo1. As transformaes
polticas e econmicas que o pas teve que introduzir, para sair do marasmo que a guerra de
desestabilizao e a seca tinham provocado e as orientaes das Instituies de Bretton
Woods (BM e FMI), levaram o pas a um empobrecimento absoluto, endividamento e
dependncia econmica e poltica de pases ocidentais.
Problemas e entraves polticos, econmicos e sociais internos (domsticos), regionais
e globais marcaram as diferentes etapas da histria de Moambique ps-colonial. A agresso
movida, primeiro, pela Rodsia do Sul, atual Zimbabwe, pela frica do Sul do apartheid e,
depois, pelo Movimento de Resistncia Nacional de Moambique (Renamo), a seca que
assolou o pas na dcada de 1980 e a crise econmica dos anos 1980 motivada pela alta dos
preos do petrleo foram responsveis pelo fracasso do socialismo.
Por outro lado, o processo de Ajustamento Estrutural, acompanhado pela emergncia
da corrupo patrocinada e apadrinhada pelas Instituies de Bretton Woods, com apoio das
elites locais, tomou de assalto o pas em sua fase socialista. Todos esses fatos, conjugados,
tornaram incerto o futuro do pas.
Moambique, como Estado soberano, participa do sistema internacional global e
insere-se num subsistema internacional a regio da frica Austral. O sistema internacional e
o subsistema regional em que Moambique se insere, composto por entidades polticas
independentes e outros atores das Relaes Internacionais como Organizaes Internacionais
e empresas multi e transnacionais que interagem freqentemente umas com as outras com
base em processos regulamentados produzindo relaes de cooperao e conflitos (HOLST,
citado por WILLIAMS e OUTROS 1994, p.57- 58).
No processo de interao com outros Estados e outros atores do sistema internacional,
Moambique estabeleceu relaes de cooperao. No perodo que se seguiu ao processo de
independncia, manteve relaes estreitas com os pases do Leste Europeu pertencentes ao
bloco socialista bem como cooperou com atores globais das Relaes Internacionais como o
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FMI, BM, ONU, corporaes multinacionais e pases do bloco ocidental como EUA,
Inglaterra, Frana. Aps a independncia Moambique tentou construir o socialismo no pas,
mas no teve o sucesso esperado. Apos a queda do bloco socialista, a alternativa encontrada
pelo pais levar adiante um programa de desenvolvimento foi submeter-se s polticas neo-
liberais que, na poca, haviam adquirido hegemonia na economia internacional.
Na frica Austral, Moambique desenvolveu relaes conflituosas e/ou de cooperao
com os outros Estados da regio. Desde 1976, o pas sofreu agresses militares da Rodsia do
Sul, da frica do Sul e uma guerra de desestabilizao movida pela Renamo. Em 1992
assinou o acordo de paz com a Renamo, ato que marcou o fim do conflito armado em
Moambique.
As agresses externas enfrentadas por Moambique resultavam de seu apoio aos
movimentos de libertao na frica do Sul e no Zimbabwe. Tambm cooperou com todos
pases da frica Austral que lutavam contra o colonialismo e a discriminao racial na regio
e participou na construo da Southern Africa Developmente Conference (SADCC) em
1980, visando criar uma plataforma de integrao regional que libertasse os restantes Estados
da regio da dependncia da frica do Sul.
Nos dois principais perodos da histria de Moambique entre 1975 a 2009, houve dois
perodos: entre 1975 e 1983, tentou-se estabelecer o socialismo no pas e, no segundo, de
1984 at 2009, procurou-se implantar uma economia capitalista de mercado.
Aps a independncia, ocorrida em 1975, Moambique teve sua economia planificada,
baseada no modelo socialista de desenvolvimento, que trouxe expectativas de que o
desenvolvimento nacional seria alcanado. A construo de Cooperativas Agrcolas (CA) e de
Consumo (CC), Empresas Estatais (EE) sob gesto do Estado seriam adotadas para
modernizar as zonas rurais e levar a um rpido desenvolvimento (num perodo de 10 anos).
Porm, catstrofes ecolgicas e polticos de origem interna, regional e global levaram ao
fracasso desse desenvolvimento.
O projeto socialista fracassou em decorrncia de vrias circunstncias: a guerra civil e
de desestabilizao movida pela Rodsia do Sul de Ian Smith, pela frica do Sul e pelo
Movimento de Resistncia Nacional de Moambique (Renamo); a alta dos preos do petrleo
e o desequilbrio ecolgico, que em 1983, provocaram a seca e o aumento da dvida externa
do pas; a recusa da entrada de Moambique no Council for Mutual Economic Assistance, o
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Conselho para Assistncia Econmica Mtua (COMECON) e o fim da Guerra-Fria. O pais,
ento, optou por um desanuviamento2 em suas relaes com o mundo ocidental, levando
adiante um projeto de transformao da experincia socialista em um projeto neoliberal.
Em 1983, iniciou-se a segunda fase da historia da criao do Estado nacional
moambicano. Moambique, seguindo as recomendaes de Bretton Woods3, liberalizou a
economia, abriu o mercado e implantou uma democracia multipartidria. Polticas neoliberais
foram incorporadas no Programa de Ajustamento Estrutural (PAE)4 em 1987. O Programa de
Reabilitao Econmica (PRE), no mbito do PAE, abriu a economia de Moambique aos
Investimentos Estrangeiros Diretos (IED); realizaram-se cortes nas despesas pblicas em
reas sociais crticas, como educao e sade, e as empresas estatais e complexos agro-
pecurios e industriais foram privatizados. Estas medidas geraram um desemprego em massa,
que impactou profundamente nas famlias pobres que, perderam o poder de compra, uma vez
que a maior parte dos chefes de famlias havia perdido o emprego.
As privatizaes resultantes do Programa de Reabilitao Econmica, alm de terem
aberto a economia ao Investimento Estrangeiro, deram origem a uma burguesia nacional que
enriqueceu atravs de mecanismos corruptos, abrindo espao para a implantao de um
capitalismo selvagem5. A formao do setor privado empresarial, em Moambique, resultou
de investimentos de capitais locais aliados ao capital externo, formando uma tripla aliana
Instituies de Bretton Woods Capital Interno Capital Externo (MOSCA 2000, p. 316).
Nesta dinmica as Instituies de Bretton Woods agiram no front line obrigando os
pases pobres como Moambique a flexibilizarem suas legislaes de forma a atrair as
corporaes multinacionais com as quais se associaram as elites locais. Sob uma forte
influncia das IBWs, a corrupo cresceu e as elites nacionais associaram-se ao capital
estrangeiro. Dessa associao, entre as elites e o capital estrangeiro, resultou o rool back dos
recursos da ajuda destinadas ao desenvolvimento do pas para os pases de origem atravs dos
parasos fiscais, em troca de programas de ajuda como criao de infra-estruturas bsicas de
sade e educao, visando a sobrevivncia do Estado e no o desenvolvimento do pas.
A abertura da economia ao Investimento Estrangeiro facilitou a entrada no pas de
corporaes multinacionais. Em Moambique, as corporaes multinacionais atuam sob a
forma de mega-projetos localizados em Zonas Francas Industriais (ZFI) e Econmicas
Especiais (ZEE). As ZFI e ZEE instalaram-se na provncia nortenha de Nampula, onde foi
fixada a ZEE de Nacala, que abarca os distritos de Nacala-porto e Nacala-a-velha. Na mesma
provncia, funciona a ZFI de Moma onde foi instalado o projetos das Areias Pesadas de
Moma da Kenamre na localidade de Topuito.
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Na provncia central de Sofala foi instalada a ZFI da Beira que alberga os projetos de
Ferro e Ao da Beira (BL&SP) e o projeto petroqumico da Beira. Ainda no centro do pas,
localiza-se a ZFI de Moatize, na provncia de Tete com dois projetos de explorao de carvo
mineral: o projeto da Vale Moambique ( antiga Companhia do Vale do Rio Doce) e da
Rivarsdale ( um consrcio australiano e a Tata Steel indiana).
No Sul do pas, na provncia de Inhambane, localiza-se o projeto de extrao de gs
natural de Pande, pertencente Sasol e, em Maputo a ZFI de Beluluane que alberga vrias
empresas que prestam servios Mozambique Alumunium (MOZAL) e, a prpria MOZAL,
que funciona em regime de ZFI.
Durante o perodo de economia planificada no existiam Zonas Francas Industriais
nem Econmicas Especiais. Entretanto, a partir de 1987, com as mudanas ocorridas na
economia internacional e a conseqente aceitao das polticas do FMI e do BM, houve uma
modificaes na legislao moambicana, para facilitar a liberao da entrada de capitais
estrangeiros e de empresas multinacionais. Com a entrada de capitais estrangeiros e essas
modificaes legais, instalaram-se as Zonas Francas Industriais e Zonas Econmicas
Especiais, que deram origem aos enclaves econmicos que caracterizaram a economia do
pas.
As potencialidades econmicas de Moambique tm despertado o interesse de
investidores estrangeiros interessados em investir em ZFI e ZEE, como tambm de
pesquisadores nacionais e estrangeiros interessados em compreender a problemtica de
desenvolvimento de frica, em geral, e da frica austral, em particular.
Estudos relativos problemtica de desenvolvimento da frica, em geral, e da frica
austral, em particular, sub-regio do continente africano onde Moambique se localiza, tm
sido desenvolvidos em pases que, como o Brasil, possuem interesses de natureza variada, que
os levam a analisar o futuro da frica, em geral, e da frica Austral, em particular. Tais
estudos tm sido desenvolvidos em Sucia, Inglaterra, Brasil, Estados Unidos da Amrica,
Portugal, Noruega e outros.
Com relao ao desenvolvimento de Moambique, todavia, reduzido o nmero de
pesquisadores que produzem trabalhos sobre a origem e as circunstncias que tm
obstaculizado o avano o desenvolvimento do pas aps a sua independncia. Chama ateno
o reduzido nmero de intelectuais moambicanos que se tm preocupado em encontrar as
razes que levaram Moambique atual situao de pobreza, desemprego e analfabetismo.
Moambique , segundo o ltimo relatrio de Desenvolvimento Humano, um dos pases com
menor ndice de Desenvolvimento Humano do mundo, ocupando a 165 posio na tabela de
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classificao. Importantes excees de intelectuais cometidos com a atual situao de pobreza
do pas so: Carlos Nuno Castel-Branco, Joo Mosca, Jos Castiano e outros. Quanto
produo de estudos de autores estrangeiros sobre Moambique, destacam-se as contribuies
de Hans Abrahamsson e Anders Nillson, Joseph Hanlon e Kenneth Hermele.
Em geral, os trabalhos produzidos pelos autores mencionados tm privilegiado as
variveis econmicas, sociais e polticas do subdesenvolvimento moambicano com destaque
para os conflitos polticos com pases vizinhos. Nesses estudos no tratado com devido rigor
o carter de enclave da economia moambicana.
Essa constatao, motivou a escolha do tema, desta pesquisa que destaca o
Ajustamento Estrutural, o papel da Ajuda Externa e a criao e expanso das Zonas Francas
Industriais e as Zonas Econmicas Especiais em Moambique como fatores de atraso do
desenvolvimento econmico e social do pas.
Esta pesquisa tem como objeto de estudo identificar as razes e os atores que, no
perodo analisado, contriburam para que Moambique, apesar de dispor de uma abundncia
de recursos- energia eltrica, gs natural, carvo mineral, areias pesadas- ; ser beneficirio de
Ajuda Externa ao Desenvolvimento e receber Investimentos Estrangeiros Diretos, no tenha
conseguido desenvolver sua economia, melhorar bem-estar de sua populao e desenvolver
uma poltica externa voltada aos interesses do pas.
Para tanto, os objetivos sero: 1. analisar a dependncia econmica e financeira de
Moambique com relao aos pases ocidentais e s Instituies Financeiras Internacionais; 2.
relacionar o fracasso dos programas de Ajustamento Estrutural, com ajuda externa e a
presena do capital estrangeiro (MOSCA 2005, p. 316); 3. analisar o papel das relaes
entre as elites nacionais e o capital estrangeiro, caracterizadas pela corrupo, na
permanncia da situao de atraso e pobreza predominante na sociedade moambicana.
O perodo em estudo vai do ano de 1975, quando Moambique se tornou
independente, at 2009 e est dividido em dois sub-perodos. O primeiro de 1975 a 1987,
quando ocorreu a experincia de criao de uma economia planificada, de orientao
socialista e, o segundo, de 1987 a 2009, quando a economia do pas transformou-se numa
economia capitalista de mercado. Entre os dois perodos houve um perodo de transio do
socialismo para o capitalismo entre 1983 e 1987, no qual a economia moambicana entrou em
colapso devido guerra de desestabilizao, desequilbrio ecolgico e deu-se o incio s
conversaes que terminaram com a aceitao de Moambique como membro do FMI e do
BM em 1984.
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A dissertao baseia-se na teoria da dependncia e no conceito de enclave econmico.
Ambos permitem compreender a dependncia econmica e financeira de Moambique com
relao s Instituies Financeiras Internacionais e ao Investimento Estrangeiro Direto e o
papel das ZFI e ZEE no empobrecimento do pas.
O conceito de enclaves econmicos6 possibilita a anlise da estrutura de dependncia
da economia moambicana. Ele permite avaliar e analisar o papel dos mega-projetos das
corporaes multinacionais que se localizam nas Zonas Francas Industriais e Zonas
Econmicas Especiais e os mecanismos econmicos e legais que permitem sua autonomia
com relao economia nacional. Ao mesmo tempo, possibilita entender seu descolamento da
sociedade e os reduzidos ganhos desta resultantes de seu funcionamento.
As autoridades governamentais e a classe capitalista moambicana aliaram-se s
corporaes multinacionais. Esta aliana deu origem dependncia econmica internacional e
a supresso da autonomia poltica do pas. Tais ligaes com as elites do centro, funcionam
como pontes de interesse e conexo (GALTUNG 1971)7, citado por (CHASE DANN 2008,
P.723). Grupos poderosos politicamente, em face da debilidade econmica e necessidade de
manter o poder, associaram-se a empresas estrangeiras criando enclaves econmicos que
caracterizam a economia de Moambique (CARDOSO e FALETTO 2004, p.100).
A primeira parte da dissertao descreve a evoluo poltica, econmica e social de
Moambique no perodo ps-independncia, quando ocorreu a experincia poltica e
econmica socialista.
A segunda aborda primeiro, o impacto das reformas neoliberais sobre a sociedade
moambicana, introduzidas em 1983; em segundo lugar aborda a substituio da constituio
socialista por uma constituio democrtica, e; em terceiro lugar o Programa de Reabilitao
Econmica implantado em 1987.
Em ultimo lugar descreve as Zonas Francas Industriais e Zonas Econmicas Especiais
criadas como recurso para a implantao da nova poltica neoliberal pautada pelos rgos
internacionais.
Para a realizao desta dissertao foi usado o mtodo de estudo de caso com recurso
fontes primrias baseadas em entrevistas com quadros seniores do Gabinete de Zonas
Econmicas de desenvolvimento acelerado (GAZEDA), do Ministrio das Finanas, do
Ministrio de Comrcio e do Projeto de Areias Pesadas de Moma Kenmare.
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Foram, tambm, usadas, como fontes secundrias, obras produzidas por diversos
autores, documentos do GAZEDA, do Centro de promoo de Investimentos (CPI), do
Ministrio das Finanas, Ministrio da Indstria e Comrcio e do Ministrio da Funo
Pblica.
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2 EVOLUO POLTICA, ECONMICA E SOCIAL DE MOAMBIQUE APS A
INDEPENDNCIA (1975-1983)
A evoluo poltica, econmica e social de Moambique aps a independncia,
ocorrida em 1975, foi marcada pela tentativa de construo de um modelo socialista de
desenvolvimento. De 1975 a 1977 foram introduzidas reformas econmicas e sociais visando
consolidar o socialismo8 como modelo de desenvolvimento econmico e social. A
propriedade privada foi substituda pela propriedade estatal e pelas cooperativas agrcolas;
foram construdas aldeias comunais; as empresas e o patrimnio imobilirio antes pertencente
aos colonos portugueses foram nacionalizados; reas sociais como sade e educao foram,
tambm, nacionalizados. A Frelimo9 deixou, em 1977, de ser um movimento de libertao e
passou a ser um partido de vanguarda maxista-leninista.
As polticas econmicas introduzidas para implementar o socialismo foram as
seguintes: eliminao da propriedade privada dos meios de produo; eliminao das
autoridades comunitrias pela sua alegada ligao com o poder colonial; nacionalizao das
propriedades privadas abandonadas por estrangeiros de origem portuguesa e indiana;
organizao da produo rural em cooperativas e propriedades coletivas e estatais, que
demandava a concentrao da populao em aldeias comunais; gesto centralmente
planificada da economia e assinatura de acordos de cooperao com a ex- Unio das
Repblicas Socialistas Soviticas (URSS) e outros pases do bloco leste. Como resultado
destas medidas, entre 1977 e 1981 conseguiu-se deter a queda nos nveis de produo e a
exportao aumentou 83% (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p. 44).
A Frelimo deu incio estruturao do novo poder e a sociedade inspirada na
ideologia marxista-leninista. Assumiu as funes de partido Estado; centralizou o poder e
a planificao da economia; a organizao da populao e da economia passou a ser
controlada pela burocracia partidria no poder; os discursos passaram a fazer referncia ao
capitalismo como um sistema de explorao, coletivizao dos meios de produo, a terra
como propriedade do Estado e prioridade da resoluo das necessidades do povo.
(MOSCA 2005, p.148-9)
O Segundo (JOS 2005, p.5) citando o artigo 4 da constituio de 1975, o projeto
poltico, econmico e social que o Estado moambicano pretendia adotar foi explicitado na
Constituio de 1975. A constituio fixava como objetivos fundamentais: nomeadamente, a
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23
eliminao das estruturas de opresso e explorao coloniais e tradicionais e da mentalidade
que lhes est subjacente; e extenso e reforo do poder popular democrtico; a edificao de
uma economia independente e a promoo do progresso cultural e social; e edificao da
democracia popular e a construo das bases material e ideolgica da sociedade socialista10
.
O novo Estado independente devia satisfazer s necessidades da populao atravs da
eliminao da propriedade privada. Para tal, foram feitas nacionalizaes em seis reas: terra,
banca, parque imobilirio (edifcios de habitao) em reas sociais como sade, educao e
agncias funerrias.
O Decreto Lei n 16/76, de 13 de Fevereiro de 1975, permitia a interveno e tutela
do Estado sobre as empresas e as propriedades agrcolas abandonadas e sabotadas pelos seus
antigos proprietrios. Durante o perodo de transio, muitos cidados estrangeiros
abandonaram (ou foram forados a abandonar) o pas. Entre eles estavam os proprietrios de
unidades fabris, comerciantes e profissionais qualificados. A produo decresceu
rapidamente; o comrcio rural entrou em colapso, uma vez que comerciantes asiticos e
portugueses haviam abandonado o pas; os camponeses no podiam vender o seu excedente
do seu trabalho ou comprar bens de consumo. Muitos farmeiros portugueses abandonaram as
farmas matando o gado e destruindo tratores. Todavia, era necessria a interveno do Estado
sobre as empresas abandonadas para garantir o emprego e continuao da produo (JOS
2005, p. 6-7) citando (HANLON 1984, p. 72)11
.
Os Ministrios da Agricultura, Indstria e Comrcio responsveis pela tutela das
empresas abandonadas e sabotadas, criaram os Gabinetes de Apoio Produo (GAPO)
(CARDOSO 2000, p. 133)12
citado por (MOSCA 2005, p.148). Os Gabinetes de Apoio
produo tinham como funo centralizar a gesto, a solicitao de financiamentos banca,
assistncia tcnica, apresentao de planos de investimento e de bens de consumo de
equipamentos a importar e elaborao da contabilidade.
Os grandes monoplios constitudos por grandes plantaes, parcelas de terra
abandonadas pelos portugueses e as grandes empresas de fornecimento de energia eltrica,
gua e telecomunicaes foram transformadas em Empresas Estatais (EE). As propriedades
agrcolas estatais foram criadas imagem dos sovkhoz13
soviticos. Por exemplo, as grandes
plantaes de ch na provncia da Zambzia deram origem a Empresa Moambicana de ch
(EMOCH) e as grandes parcelas do Complexo Agro Industrial do Limpopo (CAIL)
abandonadas pelos portugueses foram o exemplo de empresas estatais socialista: grandes em
dimenses, com infra-estrutura que permitissem a intensificao produtiva e com aldeias
comunais.
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24
Aps a tomada do poder pelo governo de transio, em 1974, e particularmente
depois da independncia, a socializao do meio rural tornou-se uma prioridade.
Devia ser feita atravs das aldeias comunais, empresas estatais e cooperativas
agrcolas. A cooperativizao era concebida como uma forma de eliminar o
individualismo, e as aldeias comunais para eliminar a disperso e as dificuldades de
controlo da populao e facilitar a prestao de servios sociais (educao, sade,
gua e melhoria da habitao) (CASAL 1992, p. 45) citado por (MOSCA 2005,
p.176).
Este modelo de organizao da produo era resultado da adoo da experincia das
Ujamaa House, adquirida na Tanznia, onde a direo a Frelimo permaneceu durante grande
parte da luta de libertao. (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p. 38)
As populaes foram concentradas em aldeias comunais e as propriedades
antigamente pertencentes a colonos portugueses em cooperativas agrcolas, propriedades
estatais e coletivas. As aldeias visavam garantir a assistncia social e fornecimento de
servios bsicos de saneamento, habitao sade e educao s populaes. A transformao
das propriedades abandonadas em propriedades estatais e cooperativas agrcolas visava
responder necessidade de industrializao, atravs dos excedentes agrcolas, aumentando a
produo e produtividade agrcola, e substituir o chibalo (trabalho forado) por uma forma de
trabalho mais digna.
Durante a luta de libertao nacional surgiu a idia de industrializar rapidamente com
os excedentes agrcolas. Para que isso pudesse acontecer, a agricultura devia ser mecanizada
para produzir excedentes para exportao, alimentos e metria-prima para a indstria. O
campo devia ser modernizado, e para tanto devia ter suas atividades mecanizadas, o uso da
quimizao e intensificao produtiva. Para tanto foram realizados grandes investimentos no
setor agrcola, importaram-se equipes de tcnicos e equipamentos dos pases socialistas com
dezenas de profissionais especializados de vrias reas14
.
A agricultura foi mecanizada rapidamente para aumentar a produtividade e para
substituir o chibalo e o trabalho manual duro, na perspectiva de restituir a dignidade ao
cidado, por uma forma de agricultura moderna. As populaes foram concentradas em
aldeias comunais e, as propriedades abandonadas foram transformadas em propriedades
estatais e cooperativas agrcolas, sendo que as propriedades estatais deviam financiar as
cooperativas.
Aps a independncia, as grandes empresas pblicas do perodo colonial passaram
diretamente para o controle do Estado moambicano; tal foi o caso das empresas de transporte
areo (a Direo de Explorao dos Transportes Areos DETA que deu origem s Linhas
Areas de Moambique LAM); os Caminhos de Ferro de Moambique (CFM) que
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25
mantiveram o mesmo nome. As empresas rodovirias de transporte de passageiros foram
integradas em trs grandes monoplios regionais sul, centro e norte com o nome de
Rodoviria de Moambique Sul (ROMOS), Rodoviria de Moambique Centro (ROMOC) e
Rodoviria de Moambique Norte (ROMON).
Os bancos portugueses que operavam em Moambique foram estatizados e criadas
duas novas instituies: o Banco de Moambique (BdM), com funes de Banco Central e de
operaes externas e o Banco Popular de Desenvolvimento (BPD), banco comercial com
atribuies de financiamento da economia.
Paralelamente, foi nacionalizado o sector imobilirio e setores sociais como sade e
educao. O parque imobilirio passou tutela da Administrao do Parque Imobilirio do
Estado (APIE).
Com a nacionalizao das reas de sade e educao, houve melhoria e expanso da
rede sanitria e educacional. O nmero de docentes de nvel bsico e secundrio aumentou de
dez para vinte mil em 1982 e fez-se um plano para alfabetizar os adultos. Entre 1975 e 1980,
o analfabetismo diminuiu de 93% para 70%. As escolas secundrias e profissionais no
encerraram, a Universidade de Loureno Marques passou a ser designada Universidade
Eduardo Mondlane (UEM). A educao tornou-se gratuita e as acessibilidades deixaram de
estar determinadas pelas condies econmicas das famlias, aumentou o nmero de escolas
de ensino bsico.
A rede sanitria expandiu-se. O nmero de postos de sade aumentou quatro vezes
durante os primeiros sete anos da independncia e o nmero de habitantes por instituio de
sade materno-infantil, aumentou. Foi levada a cabo uma das mais louvveis campanhas de
vacinao do mundo em que todas as crianas foram beneficiadas.
O projeto de desenvolvimento socialista implantou-se no terceiro congresso da
Frelimo, em 1977, quando a Frelimo deixou formalmente de ser um movimento de libertao
e assumiu a condio de partido marxista-leninista. A transformao da Frelimo em partido de
vanguarda marxista-leninista visava no s a implantar um modelo de desenvolvimento
socialista, como tambm convencer os pases socialistas da sua opo pelo socialismo, como
forma de atrair apoio do bloco socialista para a materializao do projeto de desenvolvimento
socialista uma vez que a escolha poltico-ideologica da Frelimo limitava o apoio do bloco
ocidental.
A base social do poder assentou-se na aliana operrio-camponesa. Os pases
socialistas foram considerados aliados naturais; houve uma intensificao das relaes
diplomticas com pases socialistas com o objetivo de obter apoio financeiro para os mega-
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26
projetos de agricultura. Contudo, a tentativa de Moambique integrar o Concil for Mutual
Economic Assistance (COMECON), foi frustrada em 1981.
A partir de 1977 o governo tomou a iniciativa de estruturar e aplicar o modelo
econmico socialista. A gesto da economia passou a ser centralmente planificada. Foi
aprovado o Plano Estatal Central (PEC), instrumento de direo econmica.
Entre 1977 e 1981 a economia registrou um crescimento significativo. Algumas
empresas recuperaram a sua produo. Elaborou-se o Plano Prospectivo Indicativo (PPI), para
10 anos, 1980 e 1990, integrado por um conjunto de metas econmicas e sociais, com o
objetivo de acabar com o subdesenvolvimento e construir um pas socialista (MOSCA 2005,
p. 210).
GRFICO 1- DESENVOLVIMENTO DA PRODUO DE 1975 A 1986
Fonte: Ratilal, 1990, och informao Estatstica, CNP, in Abrahamsson e Nilsson (1994, p. 47)
Depois da bonana veio a tempestade. A seca e guerra de desestabilizao provocaram
uma crise que levou ao decrescimento da economia. O desequilbrio ecolgico que assolou a
regio da frica Austral entre 1982 e 1983, que provocou a seca e a guerra de
desestabilizao poltica e econmica movida primeiro pela Rodsia do Sul, depois pela
frica do Sul e mais tarde pela Renamo, foram responsveis pela crise econmica.
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27
A guerra tinha como alvos preferenciais as infra-estruturas econmicas e sociais:
estradas de ferro, rodovias, fbricas, escolas e hospitais. Com a seca, o ndice de produo de
alimentos baixou ao mesmo tempo em que a guerra bloqueava as vias de escoamento campo
cidade provocando escassez de alimentos dos dois lados campo e cidade.
A estrutura poltica do Sistema Internacional fez com que a guerra em Moambique
fosse enquadrada no padro do conflito global leste oeste, no contexto da Guerra Fria. O
incorporamento do conflito moambicano dentro dos padres do conflito global, justificava o
realismo poltico que caracterizou o mundo ps segunda guerra mundial, 1945 1990. Os
principais protagonistas os Estados Unidos da Amrica (EUA) e a URSS tinham a idia do
potencial destrutivo que significaria uma confrontao direta. Por isso, o conflito foi
transferido para outros pases majoritariamente do terceiro mundo como Moambique.
A Poltica Externa americana com relao frica do Sul desempenhou um papel
preponderante tanto na manuteno da boa relao da frica do Sul e os pases vizinhos, por
um lado e, por outro, na relao conflituosa que caracterizou as relaes frica do Sul e
Moambique na dcada de 1890 1990, na administrao Botha. A poltica dos direitos
humanos de Carter tinha influenciado a constructive engageent de Ronald Reagan que teve
impacto na total strategy de Pieter Botha, depois de Vorster.
Em 1977, j tinha sido iniciada por Vorster a estratgia das Constellation of Southern
Africa States (CONSAS) - poltica de constelao de Estados com o objetivo de integrar todos
os pases da frica Austral no mesmo sistema econmico cujo centro seria a frica do Sul.
Este projeto foi de novo retomado por Botha na dcada de 1980, todavia, no teve sucesso,
pois a maior parte dos pases da frica Austral fundaram a organizao dos pases da Linha
da Frente, em 1977 que foi mais tarde, em 1980, substituda pela SADCC Conferncia para
a Coordenao do Desenvolvimento da frica Austral.
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3 OBSTCULOS QUE DETERMINARAM O FRACASSO DO SOCIALISMO EM
MOAMBIQUE
3.1 DETERMINANTES GLOBAIS E REGIONAIS
Circunstncias polticas regionais e globais inviabilizaram a implantao do
socialismo em Moambique. A Guerra-Fria e a presena de governos de minoria branca na
Rodsia do Sul e na frica do Sul15
so apontados como alguns graves e profundos
obstculos que impediram a construo do socialismo em Moambique.
A frica do Sul recebia apoio do ocidente, sobretudo da Inglaterra e dos EUA e
Moambique dos pases do Leste e da China. O que fez com que as relaes entre os dois
pases fossem influenciadas pelo conflito Ocidente Leste no mbito da Guerra-Fria.
A frica do Sul alm de ser importante produtor mundial de ouro e de outros minrios
importantes destinados ao mundo ocidental industrializado, era o bastio ocidental branco na
frica Negra. Moambique era um Estado negro marxista-leninista, que alm de ter recebido
apoio da Unio Sovitica e da China durante a luta armada de libertao nacional, contou com
ajuda desses pases socialistas no apoio ao Congresso Nacional Africano (ANC), para derrotar
o apartheid e o capitalismo na frica do Sul. (ABRAHAMSSON & NILSSON 1994, p. 103)
A poltica externa de Moambique era favorvel aos movimentos nacionalistas16
contra a ocupao colonial na Nambia, o apartheid na frica do Sul e contra o governo de
minoria branca na Rodsia do Sul. Moambique apoiou o Zimbabwe African Peoples Union
(ZANU), do Zimbabwe; o African National Congress (ANC), da frica do Sul e o South
West Africa People's Organization (SWAPO) e, em cumprimento deciso da Organizao
das Naes Unidas (ONU) de embargo contra o governo ilegal de Ian Smith fechou a
fronteira com a Rodsia do Sul o que motivou uma srie de ataques militares da Rodsia do
Sul e da frica do Sul contra Moambique.
O apoio que Moambique passou a dar aos movimentos nacionalistas regionais, depois
da independncia, fez desaparecer os Estados tampo de que a frica do Sul se fazia rodear
antes da independncia de Moambique. A Sudoeste encontrava-se a Nambia ocupada pela
frica do Sul; ao Norte a Rodsia do Sul de minoria branca e a Nordeste a colnia
portuguesa de Moambique que dependia economicamente da frica do Sul.
A Rodsia do Sul atacou militarmente Moambique como retaliao ao apoio deste
pas guerrilha da ZANU e ao fechamento da fronteira. Com a independncia de
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29
Moambique, desapareceria a aliana do governo de Ian Smith com o poder colonial
portugus, instalado em Moambique, e o seu adversrio, a Frelimo que apoiava a ZANU,
seria reforado pela Inglaterra, que pretendia aumentar as sanes, contra a Rodsia,
oferecendo apoio econmico a Moambique.
A interveno sul-africana em Angola, fez desaparecer o compromisso de no
agresso e no apoio ao ANC, traado no acordo secreto de 1974 entre a frica do sul e
Moambique. Os dois pases comearam a violar o acordo. Moambique deu retaguarda ao
ANC e por conta disso, a frica do Sul foi levando a cabo uma campanha de ataques militares
contra Moambique. A frica do Sul atacou Moambique em nome de perseguio de
agentes do ANC, que se encontravam em Moambique e da the comunist total onslaugh17
no mbito da total strategy18 do ento presidente sul-africano Pieter Botha.
O pas, desde a independncia, tinha sido vtima de uma guerra de agresso
conduzida primeiro pela Rodsia do Sul e depois pela frica do Sul. Esta guerra
englobava todas as formas inimaginveis de agresso, desde bombardeamentos
areos at criao da Resistncia Nacional de Moambique (Renamo), uma
organizao homicida selvagem, desde ataques perpetrados por comandos tanto
contra civis como contra alvos econmicos estratgicos, at a desestabilizao
econmica, atravs do corte de linhas de energia, reduzindo os rendimentos em
divisas (HERMELE 1990, p. 6).
Os ataques militares sul africanos a Moambique eram, tambm, uma demonstrao
de fora para que o pas reconhecesse a importncia econmica da frica do sul. Os sul-
africanos queriam que Moambique reconhecesse a importncia econmica de continuar a ser
leal e de cooperar economicamente com a frica do Sul. Para provar, a frica do Sul
diminuiu o nmero de mineiros moambicanos de 120.000 para 40.000 entre 1975 e 1976
(ABRAHAMSSON & NILSSON 1994, p. 103). Os ataques dirigiam-se infra-estrutura
econmica e sociais tais como: ferrovias, rodovias, pontes, complexos industriais, escolas e
hospitais. Os ataques tinham como objetivo sabotar o parque industrial para impedir o
crescimento econmico do pas. A tabela 1mostra o impacto da poltica de hostilidade.
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30
TABELA 1- AGRESSO MILITAR E ECONMICA CONTRA MOAMBIQUE
Atividade Militar
Nmero de escolas primrias fechadas 1983-1987 2600
Porcentagem de rede escolar destruda 45%
Nmero de postos de sade fechados 1982-1987 820
Porcentagem de rede de sade destruda 31%
Nmero de lojas rurais fechadas 1981-1988 3200
Porcentagem de rede Rural destruda 50%
Guerra econmica
Reduo do n de trabalhadores migrantes moambicanos na frica do Sul 1975-1987 67%
Reduo da mercadoria da frica do Sul em trnsito pelo Porto de Maputo 1975-1983 80%
Reduo dos rendimentos de servios frica do Sul 1975-1987 93%
Fonte: HERMELE, Kenneth (1990, p. 7). Moambique numa encruzilhada econmica e poltica na era do
Ajustamento estrutural
Em 1976, teve inicio a guerra da Renamo, desencadeada pelos servios secretos da
Rodsia do Sul, por grupos dissidentes da Frelimo, por antigos militares moambicanos das
foras especiais do exrcito portugus e, ainda, por colonos portugueses com interesses
econmicos que, contra a sua vontade, tinham abandonado e residiam na Rodsia e na frica
do Sul. Com a independncia do Zimbabwe, a frica do Sul passou a financiar a Resistncia
Nacional de Moambique e a us-la como seu instrumento de desestabilizao militar em
Moambique (MOSCA 2005, p. 142) citando (FLOWER 1987)19
e (BERNARDO 2003)20
.
Aps a independncia do Zimbabwe, a polcia secreta sul-africana passou a ter o
controle da Resistncia Nacional de Moambique e a fazer o seu financiamento. O
movimento passou a constituir o instrumento principal da desestabilizao militar de
Moambique movida pela frica do Sul (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p.
102).
Moambique alm de apoiar o Congresso Nacional Africano (ANC), fato que
incomodava a frica do Sul, tinha uma localizao geoestratgica junto ao Oceano ndico que
conferia-lhe um papel importante no mbito da Southern Africa Developmenta Coordenation
Conference Conferncia para a Coordenao do Desenvolvimento da frica Austral
(SADCC).
Moambique responsabilizava-se pelo setor de transportes e comunicao que
contribuiu para que o regime do apartheid fosse isolado. A melhoria de infra-instruturas, de
transportes e comunicao como linhas frreas e portos, com apoio de governos nrdicos
como a Sucia, faria com que as transaes comerciais dos pases do interior passassem a ser
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31
feitas atravs de Moambique e no pela frica do sul. Estas aes foram punidas pelo
presidente Botha que deu incio desestabilizao militar e econmica.
O papel que Moambique assumiria no mbito da SADCC21
na rea de transportes e
comunicao22
custou a destruio das suas infra-estruturas econmicas e sociais (escolas,
hospitais, rodovias, estradas de ferro, pontes, etc.). As destruies visavam enfraquecer
economicamente o pas e boicotar as iniciativas estrangeiras (norueguesas e suecas) de
revitalizar e fortificar o sector de transportes e comunicao de Moambique.
Uma vez forte, o setor moambicano de transportes e comunicao, viabilizaria as
iniciativas de desenvolvimento regional da SADCC, apertando cada vez mais o cerco para a
frica do Sul.
A vingana sul-africana derivava, tambm, da opo socialista de Moambique, que
frustrou os projetos de expanso geopoltica e imperialista da frica do Sul na regio da
frica Austral no mbito da Constellation of Southern Africa States (CONSAS) Poltica
de Constelao de Estados23
- e para que o sucesso alcanado em Moambique nas reas de
educao e sade no fosse um exemplo para a maioria negra que reivindicava cada vez mais
da excluso social o que tornaria o ANC mais radical.
O socialismo em Moambique no preocupava apenas os sul africanos. Preocupava,
tambm, os americanos. Washington estava preocupado com a presena sovitica e
radicalizao da Frelimo com a sua transformao num partido de vanguarda marxista-
leninista em 1977. A situao piorou quando em 1981, Moambique expulsou diplomatas
americanos acusados de serem gentes da Contra Inteligncia Americana (CIA) 24
. A partir
daqui as relaes entre EUA e Moambique deterioraram-se. A oposio direita de Reagan
comeou a exigir que os EUA apoiassem a Renamo e durante muito tempo os EUA negaram
ajuda internacional a Moambique. (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, P. 88)
As relaes diplomticas de Moambique com o Ocidente, a partir deste evento foram
de azedume. A ajuda dos pases ocidentais a Moambique diminuiu significativamente e
ajuda de emergncia da ONU ficaram condicionados soluo do desentendimento com os
EUA. Moambique passou a enfrentar um bloqueio diplomtico do Ocidente que se estendeu
at 1984 quando foi aceito como membro do Fundo Monetrio Internacional e do Banco
Mundial.
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32
3.2 CIRCUNSTNCIAS INTERNAS QUE DITARAM O FRACASSO DO PROJETO
SOCIALISTA
Circunstncias internas tambm foram responsveis pelo fracasso do projeto socialista
em Moambique. A extino das autoridades comunitrias ligadas ao poder colonial
(autoridades gentlicas); a falta de propriedades fundirias para os camponeses; a construo
das aldeias comunais; a transformao das propriedades pertencentes a antigos colonos
portugueses, em propriedades coletivas e cooperativas agrcolas; o projeto de
desenvolvimento industrial baseado na modernizao atravs da mecanizao agrria; a
radicalizao da poltica do partido no poder e as medidas tomadas no terceiro congresso da
Frelimo, que resultaram na implementao da ideologia marxista-leninista, contriburam para
a crise econmica e o fracasso do projeto socialista em Moambique.
A Frelimo considerava as autoridades comunitrias obscurantistas, classistas e
exploradoras do povo. As autoridades coloniais cobravam os impostos, impunham as culturas
obrigatrias e recrutavam a mo-de-obra para realizar trabalhos forados nas grandes
plantaes o chibalo. O papel destas autoridades como intermedirias na opresso do povo,
foi o motivo de ciso com o novo poder da Frelimo, fato que fez com que se aliassem mais
tarde Renamo como alternativa de poder.
Vrios dos dirigentes mais tradicionais do poder poltico ou cultural da sociedade
moambicana sentiram-se desamparados quando a Frelimo denunciou os seus
hbitos e costumes como `tribaise `obscurantistas. Aqui, quebrou-se um lao da
luta armada, quando a Frelimo fez compreender que os polgamos e religiosos no
pertenciam ao partido marxista-leninista em que a Frelimo se tinha transformado em
1977, apenas dois anos aps a independncia. Esta ruptura com o poder tradicional
teve considerveis conseqncias e foi aproveitado pelas foras hostis
transformao social e ao socialismo (HERMELE 1990, p. 5).
Com a independncia os camponeses esperavam receber terra, instrumentos de
trabalho e aumentos salariais, prometidos durante a mobilizao. Contrariamente s
expectativas, os camponeses foram agrupados em aldeias comunais, foram criadas
cooperativas agrcolas, propriedades coletivas e estatais para evitar a propriedade privada,
marginalizando, deste modo, as populaes. A estratgia no enquadrou as razes pelas
quais um importante estrato do campesinato tinha apoiado a luta de libertao, a recuperao
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33
da terra da qual os camponeses haviam sido desapossados pelos portugueses (HERMELE
1990, p. 5). Os camponeses mantiveram-se sem acesso propriedade, o que decepcionou a
maior parte da populao rural que viu suas terras serem ocupadas pelas cooperativas e
empresas estatais. Este aspecto foi bem aproveitado pela Renamo, que ao servio da poltica
externa sul-africana e da Guerra Fria, contra Moambique, usou o descontentamento popular
para obter apoio e bases junto s populaes rurais.
A criao das aldeias comunais e as cooperativas foi outro n de estrangulamento
entre as populaes rurais e as autoridades da Frelimo. Embora tivessem o objetivo de
socializar o meio rural, eliminar o individualismo e a disperso das populaes que
dificultaria a prestao de servios essenciais de sade, educao, gua, habitao e
saneamento do meio, as aldeias comunais e as cooperativas no consideraram os costumes e
a importncia do espao na organizao social e econmica das famlias. Elas foram
concebidas fundamentalmente como uma mudana fsica do local de residncia (MOSCA
2005, p. 160). Esta transformao chocou-se com os valores histricos e antropolgicos das
populaes.
A modernizao da agricultura exigia a participao de tcnicos especializados,
maquinarias e recursos financeiros. Mas, os tcnicos vinham do estrangeiro, sobretudo, dos
pases do Leste e Nrdicos, e no conheciam a realidade local. Utilizaram recursos
tecnolgicos que resultaram no empobrecimento dos solos. Os recursos para financiar estes
projetos vinham dos pases do Leste e Nrdicos, o que levou o pas ao endividamento e
dependncia externa.
O resultado de tais projetos foi uma crise econmica que inviabilizou o socialismo em
Moambique. Com a crise econmica, Moambique viu-se obrigado a filiar-se Concil for
Mutual Economic Assistance (COMECON), mas no foi aceito. Como alternativa, a Frelimo
desenvolveu negociaes com pases ocidentais e as Instituies de Bretton Woods (IBWs)
em 1983, e, em 1984, foi aceito como membro do Fundo Monetrio Internacional (FMI) e do
Banco Mundial (BM). Tais fatos levaram abertura da economia do pas aos Investimentos
Estrangeiros Diretos (IED) e deu origem ao Programa de Reabilitao Econmica (PRE) no
contexto do Programa de Ajustamento Estrutural (PAE).
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34
4 AS REFORMAS NEOLIBERAIS EM MOAMBIQUE (1984-1987)25
As reformas neoliberais foram iniciadas em 1984 com a aceitao de Moambique
como membro do Banco Mundial (BM) e do Fundo Monetrio Internacional (FMI) e
introduzidas em 1987, com o Programa de Reabilitao Econmica (PRE)26
. O PRE surgiu no
contexto do Programa de Ajustamento Estrutural (PAE)27
inspirado nas decises do Consenso
de Washington.
As reformas visavam substituir o modelo socialista de desenvolvimento pelo
capitalismo. Empresas do Estado foram privatizadas; reduziram-se os gastos do Estado com
educao e sade e; em 1990 uma nova constituio foi aprovada com o objetivo de acomodar
a democracia multipartidria e propriedade privada.
A guerra, a seca, a crise econmica dos anos 1980 e o isolamento diplomtico haviam
piorado a situao econmica e social e aumentado as necessidades de apoio externo de
Moambique. A guerra havia destrudo as infra-estruturas econmicas e sociais como escolas,
hospitais, vias frreas, indstrias e rodovias; a seca causou a escassez de alimentos; a crise
econmica agravou a dvida externa e o isolamento diplomtico impedia o acesso ajuda
internacional de emergncia na rea alimentar.
As reformas neoliberais foram introduzidas para garantir a concesso de ajuda de
emergncia por causa da fome, acabar com a guerra de desestabilizao (movida pela Renamo
com suporte da frica do Sul), negociar o reescalonamento da dvida e acesso a novos
crditos e romper o isolamento diplomtico com os pases ocidentais.
4.1 O IMPACTO DO PROGRAMA DE REABILITAO ECONMICA EM
MOAMBIQUE
O Programa de Reabilitao Econmica em Moambique teve duas fases. O Programa
de Reabilitao Econmica (de 1987 a 1990) e o Programa de Reabilitao Econmica e
Social (PRES) de 1990 at aos anos 2000. A terapia de choque imposta pelo Fundo Monetrio
Internacional, provocou cortes drsticos nas despesas pblicas, a reduo de salrios e um
aceleradssimo processo de privatizaes de empresas estatais e bancos comerciais, o que
provocou graves e profundas manifestaes sociais.
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35
Greves, mobilizaes sociais, conflitos sociais e degradao moral da sociedade
caracterizaram esse processo. A conseqncia de inmeras manifestaes de
descontentamento (greves e mobilizao de cidados e trabalhadores), levou em 1990,
transformao do Programa de Reabilitao Econmica em Programa de Reabilitao
Econmica e Social. (MOSCA 2005, p. 350)
Em 1983 Moambique vivia uma forte crise econmica causada pela seca, o
fechamento da fronteira com a Rodsia do Sul, o isolamento diplomtico e a guerra de desestabilizao. Este estado das coisas agravou a dvida externa do pas que chegou a
atingir 97% e precisava ser escalonada (HERMELE 1990, p. 2). Para resolver o problema
da fome e as conseqncias da guerra, em 1981 Moambique tentou, sem sucesso, filiar-se ao
COMECON para obter apoio, no s para enfrentar a fome como tambm para acabar com a
guerra de desestabilizao. Diante da recusa, Moambique encetou negociaes com o mundo
ocidental, que condicionou a ajuda, o reescalonamento da dvida e novos financiamentos,
assinatura de acordo de paz com a frica do Sul e adeso s Instituies de Bretton Woods
(IBWs) Fundo Monetrio Internacional (FMI) e Banco Mundial (BM). As IBWs
impuseram a Moambique um conjunto de obrigaes:
Cortar as despesas do governo diminuio de salrios e servios sociais.
Acabar com o envolvimento do Estado na economia e, o acesso ao crdito s podia ser
determinado pelas foras de mercado.
Privatizar servios e empresas do Estado ou controladas pelo Estado.
Acabar com subsdios e controlo de preos.
Desvalorizar drasticamente a moeda.
Abolir os regulamentos que restringiam as atividades das empresas privadas.
Liberar o comrcio internacional de barreiras e minimizar as taxas de importao e
exportao; a produo nacional no podia ser protegida.
Encorajar o investimento e as exportaes (HANLON, 2008 p. 39).
Mutatis Mutandi28
, Moambique iniciou um processo de reformas polticas e
econmicas para atender s condicionalidades impostas pelas IBWs para conceder ajuda
solicitada. Foram feitas reformas na poltica interna e externa do pas. A Frelimo deixou de
ser um partido de vanguarda marxista-leninista e deu incio ao estabelecimento de alianas
com os antigos poderes comunitrios.
Apesar de ter resgatado o pas dos escombros da guerra e da fome que matava
milhares de pessoas, as reformas neoliberais, em Moambique, tiveram conseqncias
-
36
deletrias. O desemprego, a dvida externa, a corrupo, fuga de quadros do setor pblico para
o setor privado; Organizaes No Governamentais e representaes de Instituies
Financeiras Internacionais e a degradao da qualidade de vida dos cidados foram as
conseqncias da implementao das polticas reformistas.
As reformas mais do que aliviar o pas da desastrosa situao em que se encontrava,
apoiaram os interesses polticos e econmicos dos pases ocidentais e das grandes corporaes
multinacionais.
Moambique precisava romper o isolamento diplomtico para se aproximar de pases
influentes como os EUA, a Comunidade Econmica Europia (CEE) atual Unio Europia
(EU) subscrevendo-se ao tratado de Lom29
. A aproximao ao Ocidente permitiria ao pas
receber ajuda para enfrentar a crise econmica, a guerra, filiar-se s Instituies Financeiras
Internacionais (IFI) e receber investimentos privados atravs do Investimento Estrangeiro
Direto (IED) (ABRAHAMSSON & NILSSON, 2001, p. 180).
4.2 AJUDA EXTERNA EM MOAMBIQUE
Com o Ajustamento Estrutural realizado, em 1987, Moambique comeou a receber
ajuda bi e multilateral de emergncia de diversos pases do mundo; de Instituies Financeiras
Internacionais; de Organizaes No Governamentais internacionais e de Agncias das
Naes Unidas, pois, a partir de 1982 a Unio Sovitica tinha deixado de ser o parceiro
estratgico para a soluo das que Moambique enfrentava a guerra e a crise econmica.
O governo da Frelimo comeou a aproximar-se do Ocidente e, em 1983 Moambique
aceitou a proposta dos EUA de realizar um acordo com a Repblica da frica do Sul, em que
as duas partes se comprometiam a no apoiar aes contra outro pas a partir do seu territrio.
Em 1984 foi assinado o acordo de Nkomati e, conseqentemente, Moambique pde ser
membro do FMI e do BM, reduzindo suas relaes com a Unio sovitica (ABRAHAMSSON
& NILSSON, 2001, p. 180-1).
A necessidade urgente de ajuda alimentar internacional e de novos crditos
internacionais, juntamente com a necessidade de apoio internacional poltico e
diplomtico para a luta contra o regime de minoria branca na frica do Sul, fizeram
com que Moambique alterasse as suas alianas internacionais. A juntar a isso veio
o fato de Moambique no ter sido aceito como membro da organizao de
cooperao econmica dos pases de Leste, Concil of Mutual Economic Aid
(COMECON). Por essa razo, ficaram frustradas as possibilidades de uma
cooperao aprofundada com os pases socialistas, como alternativa ao sistema de
-
37
crditos ou ao apoio poltico dos pases ocidentais. As exigncias do Ocidente eram
inequvocas. A ajuda alimentar internacional, assim como o aumento de acesso a
crditos internacionais e a prorrogao do prazo de pagamento das dvidas, exigiam
a introduo de uma economia de mercado cuja estabilidade pudesse ser aprovada
pelo Fundo Monetrio Internacional. Para alm disso, havia a exigncia
incondescendente de negociaes de paz com a frica do Sul e de cessao de
apoio de Moambique ao Congresso Nacional Africano (ANC) (ABRAHAMSSON
& NILSSON, 1994, p. 110).
Moambique realizou uma srie de reformas polticas e econmicas. Subscreveu-se ao
Programa de Ajustamento Estrutural e a constituio marxista-leninista de 1975 foi
substituda por uma constituio democrtica. Em 1991 a Frelimo deixou de ser um partido
de vanguarda marxista-leninista e adotou uma constituio que introduziu o sistema
multipartidrio. A economia deixou de ser planificada centralmente e passou a economia de
mercado mais liberal. (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p. 106)
Moambique comeou, a partir de ento, a receber ajuda bi e multilateral. Recebeu
ajuda humanitria de emergncia de Organizaes No Governamentais ocidentais e norte
americanas. A ajuda vinha em resposta calamidade natural que assolou o pas entre 1982 e
1983 a seca que provocou fome. Recebeu ajuda, financiamentos feitos diretamente ao
governo e/ou atravs de transferncia de governos, dos EUA e de pases europeu e de
Instituies Financeiras Internacionais como o Fundo Monetrio Internacional e o Banco
Mundial para o governo moambicano. A ajuda que Moambique recebeu serviu para pagar
as importaes petrleo, alimentos, medicamentos e etc. no para reconstruir as indstrias
dos ramos de alimentao, vesturio, e processamento de produtos agrcolas que tinham sido
destrudas pela guerra, que iriam competir com as indstrias ocidentais. Foi promovida a
importao no lugar da promoo da produo domstica.
A ajuda externa veio dos Estados Unidos da Amrica, da Comisso Europia
(Inglaterra, Espanha, Alemanha, Portugal, Itlia, Frana, Pases Baixos, Dinamarca, Noruega,
Sucia, Sua e outros). Essa ajuda destinava-se a apoiar projetos nas reas de educao,
fornecimento de gua e saneamento, governo e sociedade civil, direitos humanos, transportes
e comunicao, agricultura, energia, bancos e servios financeiros, comrcio, sade e outras.
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38
TABELA 2-FLUXO DE AJUDA POR
SETORES
Fonte: ODAmoz Mozambique Donor Atlas 2008
Tambm houve ajuda humanitria de agncias das Naes Unidas: Food and
Agriculture Organization (FAO), Organizao das Naes Unidas para o combate Sndrome
de Imune Deficincia (SIDA) (ONUSIDA), Programa das Naes Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), United Nations Educational, Scietific and Cultural Organization
(UNESCO), Fundo das Naes Unidas Para a Populao (FNUAP), Alto comissariado das
Naes Unidas Para os Refugiados (ACNUR), Fundo das Naes Unidas Para a Infncia
(UNICEF), Programa Mundial de Alimentao (PMA), Organizao Mundial de Sade
(OMS), de Organizaes No Governamentais (ONGs) como a Care Internacional, United
StatesAgency For International Development (USAID). O PMA contribuiu com 30.000
toneladas de milho e a Sucia, atravs da ASDI contribuiu com 30 caminhes para o
transporte da ajuda at os pontos de distribuio.
-
39
TABELA 3-PROJETO POR DOAODOR/ AGNCIAS DAS NU POR ANO (EM US $)
2060 projetos correntes
Doador 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Total
ADB 91.313.433 125.765.509 79.519.403 88.997.531 190.889.996 112.582.090 0 689.067.961
AUSTRIA 5.364.967 8.045.313 2.961.644 8.962.306 6.918.143 5.763.160 77.714 38.093.247
BELGICA 7.894.541 10.425.272 11.338.825 9.857.074 10.863.813 11.457.940 6.000.000 67.837.465
CANADA 18.397.753 20.187.152 26.339.160 53.080.621 66.415.098 66.973.362 67.102.549 318.495.695
DINAMARCA 45.469.339 44.266.356 65.886.172 61.121.212 41.433.096 69.168.674 68.024.691 395.369.540
COMISSO
EUROPEIS 102.546.237 94.609.132 108.011.105 122.576.003 94.222.466 22.992.249 7.526.697 552.483.890
FINLAND 25.937.587 28.173.683 27.915.227 38.081.997 44.777.581 36.914.293 12.742.000 214.542.369
FLANDRES 19.999.097 3.950.994 20.317.946 5.026.241 3.163.357 4.833.827 0 57.291.463
FRANA 18.199.689 20.112.314 19.094.099 20.123.827 21.689.643 28.298.794 31.547.844 159.066.210
ALEMANHA 15.888.553 27.632.824 35.998.416 40.055.233 38.967.168 28.660.293 8.590.000 195.792.487
IRLANDA 26.474.160 26.679.693 60.471.666 65.144.143 56.054.949 55.785.714 55.785.714 346.396.039
ITLIA 26.379.424 34.277.546 42.360.984 30.145.766 24.127.511 42.865.226 27.645.714 227.802.171
JAPO 406.204 13.742.935 20.323.041 14.425.062 25.393.997 18.802.254 10.841.623 103.935.116
MCC 0 4.506.226 1.600.796 8.577.864 49.421.287 97.044.348 140.496.667 301.647.188
IRLANDA 56.289.724 62.413.387 81.284.764 100.740.329 67.151.024 76.572.381 65.823.477 510.275.087
NORUEGA 59.594.350 59.708.053 65.454.300 71.686.744 64.686.978 71.226.942 58.204.959 450.562.326
PORTUGAL 26.399.003 25.451.430 22.982.003 24.271.229 11.333.089 29.040.411 0 139.477.164
ESPANHA 22.008.321 26.931.634 35.050.423 30.642.591 29.509.829 20.495.469 15.342.857 179.981.124
SUECIA 78.971.158 95.545.149 97.957.851 114.034.930 109.847.968 102.301.552 91.130.867 689.789.475
NOVAZELNDIA 15.715.209 12.438.363 19.498.224 20.449.960 12.130.952 476.190 0 80.708.898
REINO UNIDO 78.395.833 171.597.169 122.271.496 40.266.563 93.888.600 130.924.510 135.117.647 772.461.818
USAID 58.348.343 73.467.636 106.064.761 191.836.674 133.417.470 180.672.397 180.672.397 924.479.678
BANCO
MUNDIAL 240.820.000 222.685.000 239.682.821 311.140.000 129.828.000 174.300.000 103.230.000 395.369.540
GRANDE TOTAL 1.040.812.926 1.212.612.769 1.312.385.125 1.471.243.900 1.326.132.015 1.388.152.077 1.085.903.419 8.837.242.230
Agencias das NU 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Total
FAO 2.971.132 5.226.900 4.413.123 5.082.151 8.312.157 5.084.633 3.528.592 34.618.688
GLOBALFUND 16.384.567 23.387.475 42.336.774 50.176.449 45.599.209 0 0 177.884.474
IFAD 2.545.281 2.934.694 3.442.971 3.949.338 1.431.545 3.200.000 796.840 18.300.669
UNAIDS 73.540 209.252 203.688 317.126 607.000 145.000 0 1.555.606
UNDP 4.829.293 6.612.487 15.569.895 12.009.739 1.900.000 2.072.830 2.011 42.996.255
UNESCO 0 182.178 993.800 2.975.777 20.000 0 0 4.171.755
UNFPA 0 0 23.827.111 10.364.137 4.036.434 0 0 38.227.682
UNHABITAT 442.992 161.581 0 0 0 0 0 604.573
UNHCR 0 0 450.750 1.346.058 1.389.185 0 0 3.185.993
UNICEF 7.466.660 8.110.257 28.281.870 45.188.136 35.079.279 250.000 0 124.376.202
UNIDO 0 863.000 1.268.000 2.245.000 6.736.000 6.280.000 2.480.000 19.872.000
WFP 27.248.000 28.784.000 32.247.600 45.356.998 22.234.694 0 0 155.871.292
WHO 0 0 0 1.496.985 3.101.650 3.411.815 3.411.815 11.422.265
GRANDE TOTAL 61.961.465 76.471.824 153.035.582 180.507.894 130.447.153 20.444.278 10.219.258 633.087.454
NB: Os valores totais das agncias das NU incluem financiamentos bilaterais reportados pelo ODAmoz.
Fonte: Comisso Europia, Naes Unidas e Embaixada da Irlanda em Moambique
Apesar do elevado montante de ajuda humanitria em bens de alimentao e
financiamentos para o desenvolvimento que o pas recebeu, a situao das populaes no
melhorou substancialmente, como seria de se esperar. A ajuda alimentar americana era
poltica30
e visava pressionar o Governo de Moambique a abandonar o socialismo.
-
40
Por outro lado, as aes de emergncia tm sido de curto prazo e, Moambique no foi
exceo, por isso, no se compatibilizaram com as perspectivas de desenvolvimento do pas
do Programa de Reabilitao Econmica, como por exemplo, a promoo da produo e a
produtividade da economia nacional com a finalidade de aumentar o volume das exportaes
e diminuir as importaes para equilibrar a balana de pagamentos.
A interveno do Estado no monitoramento do processo de distribuio da ajuda
humanitria de emergncia foi limitada. No foi estabelecido um sistemas de controle da
distribuio da ajuda alimentar de emergncia o que estimulou o crescimento de desvios,
roubos, corrupo (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p. 123).
Por seu turno, os fundos de ajuda ao desenvolvimento disponibilizados pelas
Instituies Financeiras Internacionais, ao invs de serem aplicados em projetos de
desenvolvimento, foram aambarcados para fins que no estimularam a produo interna de
bens de consumo e de promoo de desenvolvimento econmico e social do pas e; mesmo
sabendo que os fundos disponibilizados para desenvolvimento do pas eram investidos em
infra-estruturas contraproducentes, como casas e carros de luxo, o BM e FMI seguiam
transferindo recursos alimentando a corrupo e gangsterismo na gesto de bens
pblicos, como referem Couto, (MOSSE, 2004) e (HANLON, 1991) mais adiante.
A ajuda alimentar devia ser canalizada atravs do Ministrio do Comrcio Interno,
pela empresa estatal de comercializao de produtos agrcolas (AGRICOM), pela rede
comercial existente nas reas rurais, ou atravs do rgo estatal de combate s situaes de
emergncia, DPCCN (Departamento de Preveno e Combate s Calamidades Naturais) ora
vinculado ao Ministrio dos Negcios Estrangeiros. Mas os EUA exigiram que a distribuio
fosse feita por estruturas separadas do Estado, as ONGs internacionais (ABRAHAMSSON &
NILSSON, 1994, p. 111). Vrias ONGs internacionais como a CARE internacional, uma
ONG norte americana, a ASDI e instituies das NU como o PMA responsabilizaram-se pela
distribuio da ajuda alimentar.
A CARE assumiu o poder executivo dentro do DPCCN sem uma estrutura
administrativa competente para proceder ao transporte e distribuio dos bens destinados
ajuda alimentar. Os tcnicos estrangeiros no tinham competncia tcnica para a tarefa de
distribuio da ajuda. O pessoal da CARE era constitudo por antigos membros do peace
corps sem qualquer experincia profissional sobre transporte e logstica e as autoridades
moambicanas no haviam recebido os curricula vitae dos tcnicos estrangeiros, o que tornou
impossvel influenciar em seu recrutamento. Por isso, a CARE no foi capaz de desenvolver
um mtodo de controle dos fretes e desalfandegamento dos produtos e de controle de peas
-
41
sobressalentes das viaturas usadas na distribuio dos bens (ABRAHAMSSON & NILSSON,
1994, p. 121).
Questionado sobre estas irregularidades, o representante do financiador americano
fez o seguinte comentrio: nunca foi inteno da poltica externa dos EUA reforar a administrao moambicana ajudando a formar uma organizao estatal nacional
para o combate emergncia. Pelo contrrio, quanto mais depressa essas tentativas
corroerem, mais fcil se tornar para os interesses privados e para as ONGs
encarregarem-se da distribuio da ajuda de emergncia e chegar aos grupos alvo.
Tm a minha autorizao para citar as minhas afirmaes quanto este ponto (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p. 121).
Com a distribuio da ajuda conduzida de forma catica e desordenada, era evidente
que no se conseguisse lograr os objetivos desejados, uma distribuio eficiente dos bens aos
grupos afetados pela fome e pela guerra. Tudo havia sido feito para o descrdito do processo
pelos doadores que passaram a exigir que a distribuio fosse feita atravs de estruturas
paralelas separadas do Estado e do DPCCN e que deviam ser controladas por rgos
multilaterais nas NU ou ONGs estrangeiras. Estas exigncias reduziram a soberania do pas e
o seu direito de tomar decises de forma independente sobre o direcionamento e realizao da
ajuda de emergncia fazendo com que as pessoas que estavam em frente enriquecessem cada
vez mais a custa deste processo.
A ajuda alimentar teve efeitos negativos em Moambique. Ela no estimulou a
produo local, na medida em que os prprios doadores vinculavam as necessidades de ajuda
aos interesses das suas polticas agrrias. Os produtos agrcolas que chegavam a Moambique
eram adquiridos a preos do mercado internacional subvencionado, o que fez com que a ajuda
alimentar em Moambique se tornasse um obstculo ao desenvolvimento da produo interna
de produtos alimentares. Por outro lado, a ajuda alimentar estimulou o roubo e a corrupo.
Algumas regies do Norte de Moambique, no haviam sido afetadas pela seca,
mantinham alguns excedentes de produo de bens alimentares que podiam ser destinados
para socorrer as populaes afetadas pela fome. Mas, os doadores internacionais recusaram-se
a comprar excedentes de alimentos produzidos em Moambique. A ajuda alimentar no foi
posta disposio de Moambique em forma de dinheiro com o qual o pas pudesse comprar
alimentos localmente ou no mercado internacional e transport-los para a populao, segundo
as necessidades e prioridades identificadas pelo governo. Foram os doadores que puseram a
comida disposio, ditando, eles prprios as condies e deixando para Moambique sem
poder influenciar o processo (ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p. 121).
-
42
Por outro lado, os doadores impuseram que a distribuio da ajuda de emergncia
fosse gratuita. Por ser gratuita, tambm, atingiu populaes que tinham poder de compra, das
reas urbanas, por exemplo. Este fato, levou diferenciao entre as populaes urbanas e
rurais. As pessoas com poder de compra, passaram a revender os alimentos dando origem
roubos e corrupo. Eles enriqueceram ainda mais e bloquearam a produo nacional de
alimentos. Esta situao fez com que a ajuda alimentar no fosse benfica para Moambique
(ABRAHAMSSON & NILSSON, 1994, p. 124).
A ajuda alimentar no correspondeu s reais necessidades da populao. Ela estava
vinculada s polticas agrrias dos pases doadores. Eram fornecidos cereais que no
correspondiam aos padres de consumo das populaes criando uma nova dependncia a
longo prazo. Foi fornecido trigo e arroz no lugar de milho branco que constitui a base da
alimentao da populao moambicana (idem).
4.3 FATORES QUE LEVARAM MOAMBIQUE A ADERIR AO PROGRAMA DE
AJUSTAMENTO ESTRUTURAL (PAE)
Razes internas, regionais e globais estiveram na origem do Ajustamento Estrutural
que inspirou o Programa de Reabilitao Econmica (PRE) em Moambique. A crise
econmica que assolou o pas no perodo compreendido entre os anos 1982 e 1987, provocada
pela guerra de desestabilizao econmica e poltica; a reduo de receitas em divisas devido
ao fechamento da fronteira com a Rodsia do Sul e a reduo do uso de infra-estruturas de
transportes e comunicao (portos e caminhos de ferro) pela frica do Sul; a necessidade de
ajuda dos pases ocidentais em decorrncia da recusa de apoio do COMECON e a crise
econmica que gerou a alta de preos de petrleo, so apontados como principais fatores que
levaram Moambique a aderir ao Programa de Ajustamento Estrutural (PAE) que em
Moambique, foi denominado Programa de Reabilitao Econmica (PRE).
Moambique tinha conseguido sair da crise econmica do perodo ps independncia,
quando os colonos portugueses abandonaram o pas e, entre 1980-81, a economia do pas
havia crescido. Todavia, a guerra de desestabilizao, o fechamento da fronteira com a
Rodsia do Sul, em 1976, o bloqueio diplomtico do Ocidente, a diminuio do recrutamento
de mo-de-obra moambicana para trabalhar nas minas da frica do Sul, do trfego sul
africano na rede de transportes e comunicao de Moambique e o cancelamento do acordo
de pagamento do trabalho de moambicanos nas minas sul-africanas em diferido, resultaram
-
43
numa grave recesso econmica e no agravamento da dvida externa que acompanharam a
evoluo poltico-econmica do pas at 1987, quando foi criado o Programa de Reabilitao
Econmica (PRE).
Em 1976, em cumprimento deciso da ONU de embargo ao governo ilegal de Ian
Smith, Moambique encerrou a fronteira com a Rodsia do Sul. O encerramento da
fronteira com a Rodsia reduziu o trfego internacional de mercadorias, uma das
principais fontes de divisas; os prejuzos decorrentes das sanes e de agresses da
Rodsia do Sul foram estimados em 16.500 mil contos. (CARDOSO 2000, p. 133)31
citado por (MOSCA 2005, p. 147).
Em Abril de 1978, o Governo da frica do Sul rescindiu unilateralmente o Acordo
de 1928 assinado com o governo colonial, atravs do qual parte do salrio dos
trabalhadores moambicanos nas minas era utilizado para adquirir ouro ao preo
fixo. Assim, receitas que durante dcadas financiavam a economia colonial,
subitamente deixaram de fazer parte da arrecadao de divisas para a nossa balana
de pagamentos (RATILAL)32
.
A produo industrial e agrcola haviam parado em decorrncia da guerra e da
estiagem; as exportaes haviam diminudo e a dvida externa aumentara. A produo
agrcola s podia satisfazer 10% das necessidades que o mercado tinha de bens alimentares. A
indstria trabalhava a cerca de 20-40% da sua capacidade instalada. Os preos do mercado
paralelo eram 20-40 vezes mais altos do que os preos oficiais. Entre 1980 e 1981 o Produto
Nacional Bruto (PNB) tinha diminudo 30%. (ABRAHAMSSON & NILSSON 1994, p. 48).
A crise do petrleo provocou o colapso econmico de Moambique. Durante o
perodo dessa crise, nos anos de 1980, Moambique recebeu petrleo da Unio das
Repblicas Socialistas Soviticas (URSS), Arglia, Lbia e Angola. Da Lbia recebeu petrleo
a crdito, at 1983 e de Angola recebeu 3 navios com 35000 toneladas de petrleo (RATILAL
in jornal SAVANA 07.05.2010)33
. A intensificao da guerra no incio dos anos 1980; a
queda das exportaes e a subida dos preos de petrleo e das taxas de juro resultaram na falta
de dinheiro para as importaes. As exportaes caram abruptamente provocando um
colapso econmico em Moambique.
A fome e a guerra seguiam matando gente. As populaes eram obrigadas a
deslocarem-se das suas reas de residncia para outras consideradas mais seguras nos pases
vizinhos e/ou junto aos arredores das cidades; a estiagem devastava os campos e, na URSS
principal aliado de Moambique estava em curso a Perestrica e a glasnost34 que
culminaram com o fim do bloco socialista que marcou o fim da Guerra- Fria em 1990.
Em 1981, Moambique tentou em vo obter o apoio da COMECON. Diante de um
quadro de sofrimento das populaes afetadas pela fome, guerra e visvel gradual
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decadncia da URSS na dcada de 1980, Moambique decidiu recorrer aos pases ocidentais e
s Instituies de Bretton Woods (IBWs) com o objetivo de obter recursos e financiamentos
para a recuperao econmica do pas.
A economia foi reestruturada seguindo as regras do Consenso de Washington e das
polticas neoliberais. Foi criada a Unidade Tcnica para a Reestruturao das Empresas
(UTRE). Foi aprovada a Lei n 15/91, regulamentada pelo Decreto n 28/91 que fixava
normas para a reestruturao e regulamentao do setor empresarial do Estado, incluindo a
sua privatizao e, importantssimos bancos comerciais (O Banco Comercial de Moambique
BCM e o Banco Popular de Desenvolvimento BPD). Estes bancos tinham assegurado a
sobrevivncia do Estado durante o crtico perodo da guerra.
4.4 OBJETIVOS DO PROGRAMA DE REABILITAO ECONMICA
O Programa de Reabilitao Econmica tinha o objetivo de realizar reformas
econmicas no quadro do Ajustamento Estrutural do FMI e BM, que preparassem
Moambique para receber Ajuda Externa ao Desenvolvimento:
1) Reverter o declnio da produo e restaurar um nvel mnimo de consumo e rendimento para
toda a populao, particularmente nas reas rurais.
2) Reduzir substancialmente os desequilbrios financeiros internos e reforar as contas externas e
as reservas.
3) Aumentar a eficincia e estabelecer as condies para um regresso a nveis mais altos de
crescimento econmico logo que a situao de segurana e outras limitantes exgenas
tivessem melhorado.
4) Reintegrar os mercados oficiais e paralelos.
5) Restaurar a disciplina das relaes financeiras com parceiros comerciais e credores
(HERMELE 1990, p. 14).
Apesar da ajuda destinar-se a resolver os problemas econmicos e sociais que
assolavam o pas, ela aumentou a pobreza e reduziu o poder do Estado sobre as corporaes
multinacionais, que investiam no pas. A dvida externa aumentou e o pas passou a depender
econmica e financeiramente da ajuda externa dos pases ocidentais. Quanto mais ajuda o pas
recebia mais dependente dela se tornava uma vez que a ajuda no se destinava a construo
infra-estruturas que emancipariam o pas da condio de pobreza.
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4.5 IMPACTO DO AJUSTAMENTO ESTRUTURAL EM MOAMBIQUE
Apesar do declnio econmico, no perodo de 1985-1990 ter apresentado uma
reverso, o ajustamento estrutural ocorrido em Moambique teve conseqncias perversas. As
classes mais pobres, sobretudo das cidades, sentiram o efeito mais cruel do ajustamento
estrutural. Os funcionrios pblicos viram os seus salrios diminudos, reduzindo o seu poder
de compra, sem poder levar os seus filhos escol