SOCIOLOGIA - 2º ANO - Apostila nº 1 - Prof. Renato Fialho Jr.- Página 1
1. Cidadania, direitos humanos e movimentos sociais
Direitos civis, políticos e sociais
"Alguns pensadores entendem a história da sociedade
capitalista como uma história marcada por uma evolução
dos direitos do homem, de caráter irreversível. Dentre esses
autores, o mais citado nesse sentido tem sido o inglês T. H.
Marshall.
"Marshall estuda a formação do Estado do Bem-Estar Social
- o Welfare State -, considerado, durante parte do século
XX, como um exemplo de que o capitalismo - e não o
socialismo... era o sistema econômico, político e social ideal,
o único capaz de garantir verdadeiramente a prosperidade e
uma vida segura, livre e igualitária para todos os seus
cidadãos. Realmente, entre o fim da II Guerra Mundial e o
início dos anos 1970, os países capitalistas mais
avançados, conhecidos como o "Primeiro Mundo",
conheceram níveis de progresso e de riqueza antes nunca
vistos. E o Estado era o principal responsável em prover a
subsistência digna de todos os seus cidadãos, garantindo
para todos educação e saúde públicas de qualidade,
saneamento, transporte, rede de energia elétrica e, depois
de tudo, uma aposentadoria tranqüila. Esse Estado
Providência, de pleno emprego, altos salários e plenos
direitos para todos os indivíduos, era caracterizado pela
democracia como regime de governo, com partidos políticos
representativos, inclusive dos trabalhadores - como se
apresentavam os partidos identificados com o Estado do
Bem-Estar, defensores da social democracia e do
trabalhismo.
"(...) Mas o Estado do Bem-Estar Social durou apenas cerca
de trinta anos! Estes foram chamados depois de os "Trinta
Anos Gloriosos" do capitalismo.
"Pois bem: Marshall apresentava esse Estado como uma
conseqüência natural do progresso capitalista. Um
progresso que teria acontecido aos poucos na história, a
partir da evolução da organização das sociedades que
realizaram a Revolução Industrial.
"Tomando a Inglaterra como modelo, Marshall (1967)
procurou mostrar que, desde o século XVIII, teria acontecido
uma "ampliação progressiva" da cidadania. Primeiro, no séc.
XVIII, teriam se constituído os direitos civis, relacionados à
liberdade individual e às relações de trabalho. Depois, no
séc. XIX, a cidadania passou a compreender os direitos
políticos, ou seja, os trabalhadores passaram a ter o direito
de participar no exercício do poder político. Por fim, já no
séc. XX, o Estado do Bem-Estar inglês significou a
conquista dos direitos sociais, no qual todos passaram a
ter acesso à distribuição da riqueza produzida no país,
através da elaboração de políticas sociais universais."
Cidadania: capitalismo ou socialismo?
"Karl Marx e Friedrich Engels, os principais teóricos do
socialismo científico, mostraram, em diversos trabalhos, que
o capitalismo era um sistema baseado numa injustiça
estrutural, já que ele era movido por uma brutal exploração
da mão-de-obra dos trabalhadores. Assim, portanto, uma
verdadeira cidadania somente seria possível se o
proletariado superasse o capitalismo, através da Revolução
Socialista. Mais adiante, no comunismo, o pleno exercício
da cidadania seria estendido a todos os seres humanos."
A experiência socialista, levada a cabo no séc. XX, a partir
da Revolução Soviética de 1917, não se sustentou. Entre
1989-91, ocorre a queda do socialismo no Leste Europeu e
na URSS. Por outro lado, o capitalismo tem se mostrado
ainda mais utópico com seu inalcançável lema "liberdade,
igualdade e fraternidade". O sistema, que tem por finalidade
o lucro egoísta, é incapaz de garantir direitos plenos de
cidadania. Produz e reproduz, de forma ampliada, o
desemprego, a pobreza, a miséria e as favelas, a fome e as
doenças, o analfabetismo, a alienação e a ignorância, a
insegurança, a violência e as guerras...
"... O capitalismo é estruturalmente um sistema baseado na
desigualdade social e na exclusão, dos seus benefícios, da
maioria da população. Estamos falando de um sistema
global. Assim, podemos dizer que as sociedades capitalistas
mais avançadas socialmente - como a Inglaterra citada por
Marshall, para exemplificar o Estado do Bem-Estar Social
europeu - só puderam garantir aqueles 'trinta anos
gloriosos', exatamente porque se tratava de se construir um
modelo que pudesse se contrapor à atração exercida pelo
progresso econômico da URSS, o desenvolvimento do
Primeiro Mundo estava diretamente relacionado à intensa
exploração das riquezas naturais e da mão-de-obra barata
do Terceiro Mundo (América Latina, África e Ásia) pelas
multinacionais americanas, japonesas e européias".
(Extraído e adaptado do livro "Sociologia para jovens do
século XXI": Oliveira, L. F. & Costa, R. C. R.)
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Declaração Universal dos Direitos Humanos Adotada e proclamada pela Assembleia Geral na sua Resolução 217A (III) de 10 de Dezembro de 1948.
Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;
Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos humanos conduziram a atos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do homem;
Considerando que é essencial a proteção dos direitos humanos através de um regime de direito, para que o homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão;
Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações;
Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declaram resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla;
Considerando que os Estados membros se comprometeram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais;
Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso:
A Assembleia Geral
Proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.
***
Artigo 1º
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.
Artigo 2º
Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania.
Artigo 3º
Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Artigo 4º
Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos.
Artigo 5º
Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
Artigo 6º
Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento em todos os lugares da sua personalidade jurídica.
Artigo 7º
Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.
Artigo 8º
Toda a pessoa tem direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei.
Artigo 9º
Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.
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Artigo 10º
Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida.
Artigo 11º
1. Toda a pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.
2. Ninguém será condenado por ações ou omissões que, no momento da sua prática, não constituíam ato delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o ato delituoso foi cometido.
Artigo 12º
Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei.
Artigo 13º
1. Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado.
2. Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país.
Artigo 14º
1. Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países.
2. Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por atividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas.
Artigo 15º
1. Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade.
2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade.
Artigo 16º
1. A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm direitos iguais.
2. O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos.
3. A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado.
Artigo 17º
1. Toda a pessoa, individual ou coletiva, tem direito à propriedade.
2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade.
Artigo 18º
Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.
Artigo 19º
Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.
Artigo 20º
1. Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas.
2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.
Artigo 21º
1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direção dos negócios públicos do seu país, quer diretamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos.
2. Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país.
3. A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos; e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.
Artigo 22º
Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país.
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Artigo 23º
1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego.
2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.
3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social.
4. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.
Artigo 24º
Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres e, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e a férias periódicas pagas.
Artigo 25º
1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade.
2. A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma proteção social.
Artigo 26º
1. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental.
O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional deve ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito.
2. A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.
3. Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o gênero de educação a dar aos filhos.
Artigo 27º
1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam.
2. Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria.
Artigo 28º
Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração.
Artigo 29º
1. O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade.
2. No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática.
3. Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente aos fins e aos princípios das Nações Unidas.
Artigo 30º
Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma atividade ou de praticar algum ato destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.
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Neoliberalismo no Brasil e suas implicações
para os movimentos sociaisTexto de Eraldo Leme Batista
Pretendemos neste texto abordar as questões relativas
ao neoliberalismo e suas implicações para o conjunto da
classe trabalhadora. Entendemos que as ideias
neoliberais expandiram-se pelo mundo tornando-se
referência para muitos governos implantarem políticas
públicas sob este viés ideológico e político, fortalecendo
o mercado e enfraquecendo o Estado enquanto
implementador de políticas públicas.
Segundo Moraes (2001), o neoliberalismo "(...) é uma
corrente de pensamento e uma ideologia, isto é, uma
forma de ver e julgar o mundo social; um movimento
intelectual organizado, que realiza reuniões,
conferências e congressos", além de organizar
publicações, divulgando-as, defendendo, justificando sua
concepção de mundo. Os neoliberais difundiram
amplamente as "políticas adotadas pelos governos
neoconservadores, sobretudo a partir da segunda
metade dos anos 1970, e propagadas pelo mundo a
partir das organizações multilaterais criadas pelo acordo
de Bretton Woods (1945), isto é, o Banco Mundial e o
Fundo Monetário Internacional (FMI)" (Moraes, 2001, p.
10)
Este movimento político e ideológico torna-se forte
diante da crise capitalista ocorrida na década de 1970,
divulgando críticas severas ao Estado de Bem-estar
Social, culpando as teses keynesianas e as experiências
ocorridas na Europa, pós 1945, como responsáveis pela
crise. Este movimento conservador ganha mais força
com as vitórias de governos como os de "(...) Ronald
Reagan, nos EUA (1980), Margareth Thatcher, na
Inglaterra (1979); Yasuhiro Nakasone, no Japão (1982);
e Helmut Kohl, na Alemanha (1982)", que passam a
defender e implementar políticas de redução nos
investimentos em políticas sociais, um Estado sob
controle fiscal, ampliação das políticas de
desregulamentação das leis trabalhistas, ações
autoritárias com o movimento sindical (Heloani, 2003, p.
99).
Na mesma linha de raciocínio, Corrêa (2003), entende
que:
As origens do neoliberalismo remontam à década de 1940,
logo após a Segunda Guerra Mundial, como uma reação
teórica e política contra o Estado intervencionista e de
bem-estar social vigente. O seu surgimento, e posterior
hegemonia mundial, como uma forma de acumulação
flexível do capital e uma ideologia que perdura até os dias
atuais, marcam o fim do modelo industrial fordista e do
modelo político-econômico keynesiano. O modelo fordista
foi gradualmente sendo substituído na esfera econômica
pela terceirização, desregulamentação, predomínio do
capital financeiro, dispersão e fragmentação da produção,
centralização/ velocidade da informação e velocidade das
mudanças tecnológicas. Por sua vez, o modelo keynesiano
do Estado de bem-estar social foi condenado pela política
neoliberal que, em seu lugar, criou o Estado mínimo, a
desregulação do mercado, a competitividade e a
privatização da esfera pública. Temos, portanto, um
modelo econômico e político que no plano da ideologia se
materializa no predomínio do fetichismo da mercadoria;
no plano econômico e social traduz-se no processo
crescente de exclusão social, a partir da exclusão
econômica e social da classe trabalhadora; e no plano das
teorias, na crise da razão (Corrêa, 2003, p. 39).
Em novembro de 1989, ocorre na cidade de Washington
uma reunião com a presença de altos funcionários do
governo norte-americano, funcionários de organismo
financeiros internacionais, como o FMI, Banco Mundial e
BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), com o
objetivo de discutirem assuntos relacionados aos países
latino-americanos. O objetivo desta reunião era "(...)
proceder a uma avaliação das reformas econômicas
empreendidas nos países da região. Para relatar a
experiência de seus países também estiveram presentes
diversos economistas latino-americanos. Às conclusões
dessa reunião é que se daria, subsequentemente, a
denominação informal de Consenso de Washington"
(Batista, 1994, p. 5).
Este encontro também tinha por objetivo definir
orientações para as reformas que deveriam ser
implementadas pelos governos dos países dependentes
deste continente. Serviu também para registrar, ratificar
e apoiar as políticas neoliberais que já estavam sendo
implementadas pelo mundo e para fortalecer as
orientações para os países periféricos implementarem as
mesmas.
Trata-se de uma ideologia que se concretiza, sobretudo,
na estruturação de uma economia voltada somente à
vantagem individual, ou seja, ao lucro e à sua
maximização, situando tudo numa função instrumental e
transformando qualquer ser vivente, até a pessoa
humana, em mercadoria a serviço do lucro. Para Moraes
(2001), a ideologia neoliberal:
(...) prega o desmantelamento das regulações produzidas
pelos Estados nacionais, mas acaba transferindo muitas
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dessas regulações (produção de normas, regras e leis)
para uma esfera maior: as organizações multilaterais
como o G7, a OMC, o Banco Mundial, o FMI, dominadas
pelos governos e banqueiros dos países capitalistas
centrais. Durante os séculos XIX e XX, os movimentos
trabalhistas haviam lutado para conquistar o voto, o
direito de organização e, assim, influir sobre a elaboração
de política, elaboração de leis e normas. Agora que
conquistaram esse voto, o espaço em que ele se exerce é
esvaziado em proveito de um espaço maior, mundializado,
onde eles não votam nem opinam (Moraes, 2001, p. 39).
O instrumento privilegiado pelo neoliberalismo para
alcançar a vantagem individual é o mercado livre, onde
não haja intermediações do Estado e exista a única lei da
demanda e da oferta que é o coração do comércio, e onde
tudo possa ser considerado "mercadoria".
Este movimento ideológico parte do pressuposto de que
a instituição por excelência capaz de viabilizar este
projeto é o mercado. Para tanto, é necessário promover a
associação de todos os países sob a égide de um mercado
mundial, o que supõe uma política comercial comum e a
liberalização generalizada de tarifas alfandegárias.
Definimos o neoliberalismo como a hegemonia das
esferas política e econômica da maior liberdade para as
forças de mercado, menor intervenção estatal (Estado
mínimo), desregulamentação, privatização do
patrimônio público, preferência pela propriedade
privada, abertura dos mercados, ênfase na
competitividade internacional e redução da proteção
social.
Com relação a abertura de mercados, por exemplo,
Batista (1994) nos informa que uma das justificativas
para a mesma era a ineficiência do protecionismo, como
obstáculos aos interesses do "consumidor nacional" e
também como impedimento para maior inserção
"competitiva na economia mundial".
Nas teses aclamadas no Consenso de Washington não se
levava em conta o caráter oligopolista do comércio
internacional dominado pelas grandes empresas dos
países centrais:
Nem o fato de que substancial parcela desse comércio já se
faz intrafirmas, entre matrizes e subsidiárias, o que torna
ainda mais difícil o controle das práticas restritivas de
negócio. Nem se toma em consideração como a má
estrutura da distribuição de renda pode afetar a
propensão a importar. Nesse raciocínio, desconsidera-se
também o risco da desindustrialização e do desemprego, o
que, aliás, inevitavelmente reduziria o número dos
consumidores cuja defesa se invoca (Batista, 1994, p. 32).
Constatamos a partir do exposto pelo autor, que, em
linhas gerais, a defesa do Consenso de Washington sobre
a abertura dos mercados tinha por objetivo beneficiar
ainda mais as empresas oligopolistas, pois o
protecionismo, em nenhum momento, foi colocado em
questão.
Corrêa (2003) alerta que é no plano ideológico que se dá
a ofensiva deste movimento. É a partir de ideias
defendidas especialmente por Hayek e Friedman que
ocorreu o crescimento deste movimento ideológico e
político:
a crise do capitalismo é passageira e
conjuntural;
o capitalismo é a única forma possível de
relações econômicas e sociais historicamente
comprovada com a queda do muro de Berlim, o
fim do socialismo real, o fim da história;
a utopia socialista esvaziou-se com o colapso do
socialismo real, varrida para o "lixo da história";
a igualdade leva à servidão humana, e a
liberdade de mercado à prosperidade;
o surgimento da sociedade do conhecimento, o
desaparecimento do proletariado e a
emergência do cognitariado marcam o fim do
trabalho como categoria fundamental;
o advento do pós-modernismo marca o fim da
razão etnocêntrica e totalitária (sobre as
categorias gerais como universalidade,
objetividade, ideologia, verdade) e o surgimento
do subjetivismo narcísio (ênfase na diferença,
alteridade, subjetividade, contingência,
descontinuidade, privado sobre o público,
particularidade e localismo) (Corrêa, 2003, p.
39-40).
Para os neoliberais, o capitalismo é a única possibilidade
de organização societal, principalmente após a queda do
muro de Berlim. A crise do socialismo real, mostrou para
o mundo, segundo os neoliberais, que o socialismo não
se sustenta como proposta de organização da sociedade.
Com a vitória de governos sob orientação neoliberal na
década de 1970 e aumento das crises dos governos
considerados socialistas, a política de disseminação das
teses neoliberais ganha força, principalmente após a
crise do Estado de bem-estar social. Neste período, o FMI
empresta dinheiro para os países endividados com juros
altíssimos, e o Banco Mundial passa a financiar projetos
sociais desde que sejam dentro de suas orientações.
Neste sentido fortalece cada vez mais o discurso da
ampla reforma do Estado, transformando num dos
principais objetivos das políticas públicas dos anos 1980,
principalmente nos países periféricos. Isso posto,
informamos a nossa concordância com as análises
realizadas por Chesnais (1992, p. 265). Para ele, essas
organizações multilaterais foram fundamentais para as
formulações e orientações políticas neoliberais, que
deveriam ser implementadas nos países periféricos.
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A acelerada desregulamentação dos mercados financeiros
"emergentes", instigada pelo FMI e pelo Banco Mundial,
significou a completa submissão desses países ao
neoliberalismo, mas também trouxe consigo mais um
elemento de risco sistêmico, no plano internacional.
Incorporar, ao sistema "incompleto" de mundialização
financeira, países que, antes, tinham sistemas fechados,
com dirigentes pouco experimentados nas sutilezas das
finanças de mercado, acaba resultando na criação de
economias muito frágeis, nas quais certos abalos
financeiros, dominados pelas reações dos investidores
estrangeiros, podem se propagar de forma contagiosa,
atingindo funções essenciais do sistema financeiro e
estendendo-se à esfera da produção e intercâmbio
(Chesnais, 1999, p. 265).
Tornam-se mais constantes novos conceitos, como
empregabilidade, desregulamentação, privatização,
mercado, terceirização, flexibilização dos contratos de
trabalho, administração pública gerencial. Além de novos
conceitos, surge também como forma de dar suporte à
avalanche neoliberal, teorias como a do fim da história,
da "obsolescência" dos clássicos e da "total inutilidade"
de todo pensamento crítico. Dessa forma, a priori, o
pensamento crítico é tido como não instrumental, não
diretamente aplicável ao "mundo prático" (Heloani,
2003).
Entendemos, assim como Heloani (2003, p. 101), que o
"neoliberalismo propõe a 'despolitização' radical das
relações sociais, em que qualquer regulação política de
mercado (quer por via do Estado ou de outras
instituições) é já a princípio repelida".
Ao analisar o neoliberalismo e suas implicações para o
mundo do trabalho, Antunes (2009) observa que este
movimento combateu radicalmente o sindicalismo de
esquerda, desmontou os direitos sociais:
(...) com a enorme expansão do neoliberalismo a partir de
fins de 70 e consequente crise Welfare State, deu-se um
processo de regressão da própria social democracia que
passou a atuar de maneira muito próxima da agenda
neoliberal. O neoliberalismo passou a ditar o ideário e o
programa a serem implementados pelos países
capitalistas, inicialmente no centro e logo depois nos
países subordinados, contemplando reestruturação
produtiva, privatização acelerada, enxugamento do
Estado, políticas fiscal e monetária sintonizadas com os
mecanismos mundiais de hegemonia do capital, como o
FMI e o BIRD, desmontagem dos direitos sociais dos
trabalhadores, combate cerrado ao sindicalismo de
esquerda, propagação de um subjetivismo e um
individualismo exacerbados, dos quais a cultura 'pós-
moderna' é expressão, animosidade direta contra
qualquer proposta socialista contrária aos valores e
interesses do capital (Antunes, 2009, p. 187).
As políticas neoliberais estimularam os processos de
reestruturação produtiva, ampliando o desemprego, os
processos de terceirização e também as diversas formas
de trabalhos temporários, fragmentados, despossuídos
de direitos e precários. Verificamos a face destrutiva do
capital diante da demolição das "forças produtivas, do
espaço ambiental e particularmente à força viva do
trabalho" (Antunes, 2005, p. 75).
Entendemos que a proliferação das políticas neoliberais
na década de 90 no Brasil teve por objetivo
desregulamentar o mercado de trabalho, flexibilizar as
leis trabalhistas, controlar os sindicatos, fragilizar a
organização sindical diante das mudanças de orientação
do Estado brasileiro, principalmente diante da repressão
sobre as mobilizações dos trabalhadores como ocorreu
em 1995, com a forte repressão do governo FHC sobre os
trabalhadores petroleiros.
Neoliberalismo na América Latina e
os movimentos sociais (alguns trechos do texto)
Neste tópico iremos analisar a questão do
neoliberalismo na América Latina e a resistência dos
movimentos sociais. Um dos setores afetados pelas
políticas neoliberais foi a educação, e iremos observar
destas políticas neoliberais não se deu sem resistências,
protestos e mobilizações dos profissionais deste setor.
Barreto e Leher (2003), por exemplo, nos informam que
a participação de uma "pequena intelligentsia crítica"
contribuiu decisivamente para a elaboração dos
congressos nacionais de educação e também na
"elaboração de um Plano Nacional de Educação da
sociedade brasileira, bem como no Fórum Mundial de
Educação" (Barreto e Leher, 2003, p. 55).
[...] A partir de suas pesquisas, esses autores observam
que mesmo sob dificuldades dos limites impostos "por
uma correlação de força em que os trabalhadores são o
pólo mais frágil, de oferecer resistência, às custas de
greves difíceis, fortemente reprimidas pelos governos
regionais e locais", e apontam ainda a necessidade e
importância da resistência contra as políticas
neoliberais.
[...] Uma questão importante destacada pelos autores é a
visão de classe, entendimento de classe, ou seja:
(...) Não serão os educadores que isoladamente, reverterão
o quadro de heteronomia cultural vigente (...) é preciso
enfatizar que somente o conjunto da classe-que-vive-do-
trabalho pode reverter o substrato da heteronomia que é a
condição capitalista dependente do país. Enquanto as
malhas do capital continuar a estrangular a esfera
pública em benefício do deslocamento da riqueza
socialmente produzida para os donos do poder, as
mudanças serão muito restritas (Barreto e Leher, 2003, p.
56)
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Mesmo sob estas considerações, os autores observam a
importância desta luta, pois é resgate da luta docente e
contribui para fortalecer a categoria. Os educadores não
podem se subordinar a essa lógica, à agenda neoliberal;
precisam lutar, resistir ao avanço desta ideologia e as
políticas implementadas pelo governo federal.
[...] Segundo Antunes (2005), tem aumentado em todo
planeta manifestações contra o neoliberalismo e contra
toda e qualquer forma de exclusão social. Este autor cita
algumas organizações no Brasil, como o Grito dos
Excluídos, a luta pela terra e principalmente o Fórum
Social Mundial, que teve suas primeiras atividades em
Porto Alegre (Brasil) e que são demonstrações claras de
resistência e busca de alternativas ao sistema vigente.
Muitos foram os debates, as deliberações e
principalmente o compromisso de fazer avançar a luta
pela justiça, inclusão social, mudanças nos rumos da
sociedade global. Antunes (2005) considera importante
o fato de ter se estabelecido uma articulação entre
milhares de movimentos sociais e organizações
comprometidas com as bandeiras de mudanças deste
mundo, sob o lema "Um outro mundo é possível".
[...] Este autor entende ainda que as lutas sociais devem
ser articuladas cada vez mais a uma luta de amplitude
internacional. Esta luta mundial deve ter como objetivo
se contrapor ao movimento do capital internacional...
Extraído do Livro: 'Movimentos sociais, trabalho associado e educação
para além do capital', Rodrigues, Fabiana C.; Novaes Henrique T.;
Batista, Eraldo L. (orgs.), vol. 2.
Nota: Por questão de espaço, foram suprimidas as Referências
bibliográficas.
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Elitismo e democracia
Trecho de texto extraído do livro "Teoria das Elites",
de Cristina Buarque de Hollanda. Rio: Editora Zahar, 2011.
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