dom alberto taveira - reflexões para a cnbb sobre o dom de línguas

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1 Renovação Carismática Católica Brasil Grupo de Reflexão Teológico Pastoral Texto da RCC apresentado por D. Alberto Taveira Corrêa, arcebispo metropolitano de Palmas-TO na 58ª Reunião do Conselho Permanente da CNBB, em 10.11.2005. Conforme original 58 a REUNIÃO DO CONSELHO PERMANENTE Esclarecimentos sobre alguns pontos da RCC Foi-me pedido fazer uma breve comunicação a respeito de alguns pontos sobre a Renovação Carismática Católica. Escolhi dois caminhos, sendo o primeiro uma consulta feita aos coordenadores nacionais da RCC, aos quais encaminhei as perguntas feitas, com respostas que me foram apresentadas por Reinaldo Beserra, do Escritório Nacional da RCC e membro do Conselho Internacional da RCC - (ICCRS). Depois, desejo apresentar algumas propostas. I - Esclarecimentos solicitados pelo CO N SEP, a pedido de Dom Rafael 1 : 1. "Benefícios" da oração em línguas: Os carismas, sejam extraordinários ou humildes, são graças do Espírito Santo que têm, direta ou indiretamente, uma utilidade eclesial, ordenados como são à edificação da Igreja, ao bem dos homens e as necessidades do mundo." 2 Carismas são ”manifestações do Espírito para proveito comum". São dons úteis, instrumentos de ação, para servir à comunidade. Conceituação: a) "É um dom de oração 3 cujo valor, enquanto 'linguagem de louvor', não depende do fato de que um linguista possa ou não identificá-to como linguagem no sentido corrente do termo". É uma linguagem a-conceitual, que se "assemelha" às línguas conceituais. Não supõe absolutamente um estado de "transe" para praticá-la, não corresponde a um estado "extático", e nem a uma exagerada emoção, permanecendo aquele que a pratica no total domínio de si mesmo e de suas emoções, pois o Espírito Santo jamais se apossa de alguém de modo a anular-lhe a personalidade. b) É um dom que leva os fiéis a glorificar a Deus em uma linguagem não convencional, inspirada pelo Espírito Santo. É uma forma de louvar a Deus e uma real maneira de se falar e se entreter com ele. Quando o homem está de tal maneira repleto do amor de Deus que a própria língua e as demais formas comuns de se expressar se revelam como que 1 cf. 1Cor 12, 7 2 João Paulo II, Christifideles Laia, n° 24. Esse texto, no documento, vem depois da citação de 1Cor 12, onde está incluso o dom de línguas. 3 Quem jamais ouviu tal forma de oração, não pode imaginar, de modo algum, como ela se faz e se apresenta. É, no entanto, possível indicar alguns elementos preparatórios para tal oração "sem sentido". Assim, por exemplo, a música gregoriana conhece seqüências de tons prolongados, nos quais só se canta a vogal "a" (como o final de um "alleluia"). Esse modo prolongado de cantar diante de Deus não tem nenhum "sentido" que possa ser captado intelectivamente e deduzido pela análise lingüística. Brota de camadas mais profundas da emoção pessoal. Acontecimento semelhante é a repetição constante e freqüente de certas palavras ou orações

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Page 1: Dom Alberto Taveira - Reflexões para a CNBB sobre o Dom de Línguas

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Renovação Carismática Católica – Brasil

Grupo de Reflexão Teológico Pastoral

Texto da RCC apresentado por D. Alberto Taveira Corrêa, arcebispo metropolitano de Palmas-TO na 58ª Reunião do Conselho Permanente da CNBB, em 10.11.2005.

Conforme original

58a REUNIÃO DO CONSELHO PERMANENTE

Esclarecimentos sobre alguns pontos da RCC

Foi-me pedido fazer uma breve comunicação a respeito de alguns pontos sobre a Renovação Carismática Católica. Escolhi dois caminhos, sendo o primeiro uma consulta feita aos coordenadores nacionais da RCC, aos quais encaminhei as perguntas feitas, com respostas que me foram apresentadas por Reinaldo Beserra, do Escritório Nacional da RCC e membro do Conselho Internacional da RCC - (ICCRS). Depois, desejo apresentar algumas propostas.

I - Esclarecimentos solicitados pelo CO N SEP, a pedido de Dom Rafael1:

1. "Benefícios" da oração em línguas: Os carismas, sejam extraordinários ou humildes, são graças do Espírito Santo que têm, direta ou indiretamente, uma utilidade eclesial, ordenados como são à edificação da Igreja, ao bem dos homens e as necessidades do mundo."2 Carismas são ”manifestações do Espírito para proveito comum". São dons úteis, instrumentos de ação, para servir à comunidade.

Conceituação:

a) "É um dom de oração3 cujo valor, enquanto 'linguagem de louvor', não depende do fato de que um linguista possa ou não identificá-to como linguagem no sentido corrente do termo". É uma linguagem a-conceitual, que se "assemelha" às línguas conceituais. Não supõe absolutamente um estado de "transe" para praticá-la, não corresponde a um estado "extático", e nem a uma exagerada emoção, permanecendo aquele que a pratica no total domínio de si mesmo e de suas emoções, pois o Espírito Santo jamais se apossa de alguém de modo a anular-lhe a personalidade.

b) É um dom que leva os fiéis a glorificar a Deus em uma linguagem não convencional, inspirada pelo Espírito Santo. É uma forma de louvar a Deus e uma real maneira de se falar e se entreter com ele. Quando o homem está de tal maneira repleto do amor de Deus que a própria língua e as demais formas comuns de se expressar se revelam como que

1 cf. 1Cor 12, 7

2 João Paulo II, Christifideles Laia, n° 24. Esse texto, no documento, vem depois da citação de 1Cor 12, onde está

incluso o dom de línguas.

3 Quem jamais ouviu tal forma de oração, não pode imaginar, de modo algum, como ela se faz e se apresenta. É,

no entanto, possível indicar alguns elementos preparatórios para tal oração "sem sentido". Assim, por exemplo, a música gregoriana conhece seqüências de tons prolongados, nos quais só se canta a vogal "a" (como o final de um "alleluia"). Esse modo prolongado de cantar diante de Deus não tem nenhum "sentido" que possa ser captado intelectivamente e deduzido pela análise lingüística. Brota de camadas mais profundas da emoção pessoal. Acontecimento semelhante é a repetição constante e freqüente de certas palavras ou orações

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insuficientes, dá plena liberdade à inspiração do Espírito, de modo a "falar uma língua" que só Deus entende.

2. O "falar em línguas", consignado nas Escrituras4 comporta três modalidades:

a) a oração em línguas, de caráter usualmente particular, pessoal, e que portanto não requer interpretação5. Embora de caráter pessoal, ela pode ser exercitada também de modo coletivo, o que acontece nas assembléias onde todos exercem o "dom particular de orar em línguas", ao mesmo tempo; obviamente, não supõe interpretação. No entanto. Deus - que ouve a oração que milhares de fiéis lhe dirigem concomitantemente de todos os cantos da Terra - por certo entende. Vale a intenção que está em nosso coração.

b) Essa oração também pode ser expressa em modalidade de canto, uma oração com uma melodia que não foi pré-estabelecida.6 Também essa modalidade não requer interpretação. A diferença em relação à modalidade anterior, é que aqui se trata de orar em línguas, mas num ritmo não falado, de expressão e cadência musical, de notas que se sucedem improvisadamente, numa modulação lírica com que se celebra as maravilhas de Deus. São cânticos que brotam geralmente nos momentos de louvor e adoração da assembléia, do grupo de oração, e que pouco tem em comum com os cânticos eclesiásticos tradicionais, ou também com os cantos de "composição artística"7. Santo Agostinho, comentando as palavras do Salmo "Cantai ao Senhor um Cântico novo", adverte que o cântico novo não é coisa "de homens velhos". "Aprendem-no os homens novos, renovados da velhice por meio da graça, pertencentes ao Novo Testamento, que já é o Reino dos Céus. Por ele manifestamos todo o nosso amor e lhe cantamos um canto novo. Quando podes oferecer-lhe tamanha competência que não desagrade a ouvidos tão apurados?... Não busques palavras, como se pudesses dar forma a um canto que agrade a Deus. Canta com júbilo! Que significa cantar com júbilo? Entender sem poder explicar com palavras o que se canta com o coração. Se não podes dizer com tuas palavras, tampouco podes calar-te. Então, resta-te cantar com júbilo, se modo que te entregues a uma alegria sem palavras e a alegria se dilate no júbilo”8.

c) Uma terceira modalidade do dom das línguas é aquela de uso essencialmente público, que quando é acompanhado do seu complemento, o dom da interpretação, tem como seu propósito a edificação dos fiéis e a convicção dos descrentes9. Aqui o falar em línguas não assume o caráter de oração, mas de uma mensagem em línguas, dirigida à assembléia e não a Deus, como é o caso da oração, e que portanto requer o exercício do outro dom apontado por Paulo, o dom da interpretação. O Espírito dá a alguém a inspiração de "falar em línguas" em alta voz. Suas palavras contém uma mensagem espiritual para um ou mais ouvintes. A mensagem permanece incompreensível, enquanto não for interpretada10. A mensagem interpretada assume, regularmente, as características de uma profecia carismática, que, segundo S. Paulo11, edifica, exorta e consola a assembléia. Autores há que, em vista de maior clareza, dão outro nome a esta forma de falar em línguas. Chamam-na de "mensagem em línguas", ou ainda de

4 Cf. Atos 10, 46; 19, 6

5 cf. 1Cor 14, 2

6 cf. Ef 5,19-20; Cl 13,16-17; e I Cor 14, 26.

7 Heribert Muller afirma que "sem dúvida, o Espírito Santo atua também nos cantos tradicionais, mas a palavra de

São Paulo: "Sob a inspiração do Espírito, cantai a Deus de todo coração salmos, hinos e cânticos espirituais" (cf 3, 16; cf. Ef 5, 19), se dirige a todos os cristãos e não somente àqueles particularmente dotados de qualidades musicais ou que compõem hinos na Igreja, (in "Fé Cristã Renovada", pg. 226, Ed. Loyola, 1980).

8 Enarrationes in Ps. XXXII, 8: PL 36, col. 283.

9 1Cor 14, 5. 22

10 1Cor l4, 27ss

11 1Cor 14,3

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"profecia em línguas". Em oposição ao "falar em línguas" durante a oração, este dom não está livremente à disposição da pessoa. Exige-se uma inspiração peculiar. Muitas vezes, ela está acompanhada de outra inspiração, a saber, num dos ouvintes que então "interpreta" a mensagem e a traduz em linguagem comum, para a comunidade. O dom de "falar mensagem em línguas" é um dom transitório manifestado vez ou outra nas reuniões de oração; e o Senhor pode servir-se ora deste, ora daquele, enquanto que o dom da interpretação geralmente é considerado permanente; é dom que pode ser pedido na oração.12

3. Quando se deve orar em línguas? Só em atos próprios da RCC? Na TV para todos? Pode ser utilizada durante a Santa Missa, como parece ter acontecido na Oração dos fiéis nas missas de TV?13

a) Sendo um dom do Espírito e um dom de oração, ele deveria ser permitido onde sempre é permitido orar. Nos atos próprios da RCC, o Documento 53, n. 25 da CNBB, já o levou em consideração.

b) Se a TV está transmitindo um ato próprio da RCC, não é possível "encenar" um comportamento que anule a identidade do Movimento. O exercício do carisma de orar em línguas é parte constitutiva da RCC. De nossa parte - os "carismáticos" - não temos de que nos envergonhar dessa prática, e nem temos nada a esconder. Somos assim, nossos Grupos de Oração estão sempre com as portas abertas, e qualquer um pode lá conferir á o que somos e o que praticamos.

c) Na Santa Missa: Se são missas celebradas em atos específicos da RCC, parece-nos que sim, desde que se exercite essa oração nos momentos ditados pelo bom senso e pela orientação do celebrante, de modo respeitoso, profundamente oracional, não exibitório, especialmente como glorificação a Deus, como expressão de contrição, como petição, e como ação de graças.

d) A RCC tem clara consciência de que a Igreja, durante muito tempo, não se abriu à essa forma de se exercitar os carismas. Por isso ela sabe que, esse reavivamento de perfil pentecostal que se colocou em marcha no último século - especialmente a partir de Helena Guerra, que motivou Leão XIII a escrever uma Encíclica sobre o Espírito Santo, passando por João XXIII, que pediu um novo Pentecostes para a Igreja e a "renovação dos sinais e prodígios da aurora da Igreja", bem como pelo Concílio Vaticano II, onde Deus, providencialmente, lançou as bases e os fundamentos que tomaram possível o surgimento e a fundamentação do Movimento Pentecostal Católico14, até João Paulo II com sua Dominum et Vivificantem, e a inspirada exortação pronunciada na celebração de Pentecostes de 29 de maio de 2004, que dizia: "Desejo que a espiritualidade de Pentecostes se difunda na Igreja como um impulso renovado de oração, santidade, comunhão e anúncio. [...] Abram-se com docilidade aos dons do Espírito Santo! Recebam com gratidão e obediência os carismas que o Espírito não cessa de oferecer!"

12

1Cor 14,13

13 A renovação das Comunidades de Igreja já ficará paralisada logo no início se o dom das línguas for considerado

o sinal principal da presença do Espírito Santo, ou se ele for esperado de cada cristão. Nem tampouco se confirma a experiência a tese de que por certo o dom de línguas é o menor de todos os dons, mas que, justamente por isso mesmo, ele é a porta de entrada para a dimensão carismática inteira, sendo então comparável ao trinco da porta, que dá acesso a todo o resto. Para muitos cristãos, o dom de línguas é um dom carismático acessório, um enriquecimento da sua oração pessoal (particular), e nunca será demais insistirmos nas observações críticas de S. Paulo: quanto à realização particular desse modo de rezar (= "em línguas", "consigo mesmo e com Deus": 1Cor 14,28), ele não tem nada a observar; mas quando se trata de praticar esse modo de rezar no culto público, ele tem suas reservas e limitações: durante o culto religioso público, não deve haver muitos que falem em línguas ("quando muito, dois ou três"); além disso, não devem falar simultaneamente, mas um após' outro; enfim, ninguém deve falar em línguas, se não houver alguém para "interpretar" a oração em línguas (1Cor 14,27s.) - Por outro lado, deve ser lembrada a outra observação do mesmo Paulo: "...não proibais o dom de línguas!" (1Cor 14,39). O Apóstolo deseja até que todos rezem em línguas (1Cor 14,5), insistindo em que o dom de línguas, tanto quanto os demais carismas, é "instituído" por Deus.(1Cor 12,28)

14 L.G. 4 e 12; PO. 9; AA 3; AG 4

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- precisa ser acolhido com abertura de espírito e destemor, mas também com bom senso, com humildade, com respeito pelas diferentes opções de engajamento na pastoral orgânica da Igreja, em absoluta adesão à doutrina da Igreja Católica, não escandalizando por falta de decoro litúrgico ou religioso, dentro da ordem, mas também não deixando de ser fiel à vocação que Deus nos faz, de, nesses tempos, contribuir para "revelar à Igreja aquilo que já lhe é próprio: sua dimensão carismática".15

e) No rito do Sacramento da Crisma, ao final da Oração dos fiéis, o Bispo reza: "Ó Deus, que destes o Espírito Santo a vossos apóstolos e quisestes que eles e seus sucessores o transmitissem aos outros fiéis, ouvi com bondade a nossa oração e derramai nos corações de vossos filhos e filhas os dons que distribuístes outrora no início da pregação apostólica".

f) É de se esperar que, recebendo tais dons, possamos exercitá-los, pois "da aceitação desses carismas, mesmo dos mais simples, nasce em favor de cada um dos fiéis o direito e o dever de exerce-los para o bem dos homens e a edificação da Igreja e do mundo, na liberdade do Espírito Santo, que "sopra onde quer"16 e ao mesmo tempo na comunhão com os irmãos em Cristo, sobretudo com seus pastores, a quem cabe julgar sobre a autenticidade e o uso dos carismas dentro da ordem, não por certo para extinguirem o Espírito, mas para provarem tudo e reterem o que é bom".17

g) “Na lógica da originária doação donde derivam, os dons do Espírito Santo exigem que todos aqueles que os receberam os exerçam para o crescimento de toda a Igreja, como no-lo recorda o Concílio".18

4 - Repouso no Espírito: O Documento 53, no número 65, aborda o tema e diz a respeito; "Em Assembléia, grupos de oração, retiros e outros reuniões evite-se a prática do assim chamado "repouso no Espírito". Essa prática exige maior aprofundamento, estudo e discernimento".

a) O Cardeal Suenens, que escreveu muito sobre a RCC e a apoiou, foi muito cauteloso em relação à prática do repouso no Espírito, recomendando reserva.19

b) Pe. Robert De Grandis foi quem muito a divulgou aqui pelo Brasil e tem um livro sobre o assunto.

c) Pe. Antonello, da Arquidiocese de S. Pauto, pratica-o com bastante freqüência e também escreveu sobre o assunto.

d) Não há fundamentação bíblica consistente sobre ele, embora sua prática remonte aos grupos qualificados de entusiastas, especialmente nos grupos de reavivamento nos Estados Unidos entre os séculos XVII e XIX.

e) "O Espírito Santo, ao confiar à Igreja-Comunhão os diversos ministérios, enriquece-a com outros dons especiais, chamados carismas. Podem assumir as mais variadas formas, tanto como expressão da liberdade absoluta do Espírito que os distribui, como em resposta às múltiplas exigências da história da Igreja"20. Em muitas ocasiões - especialmente quando praticado em atendimentos pessoais, em clima de oração — , de modo especial em atendimentos de oração por cura interior, essas manifestações se revelam perceptivelmente legítimas, sem componentes de perfil patológico, gerando em quem a experimenta profunda paz e bem estar, com conseqüente reavivamento ou novo

15

João Paulo II, no discurso durante o I Encontro Mundial com os Movimentos Eclesiais e Novas Comunidades, no Pentecostes de 1998, em Roma. 16

Jo 3,8

17 cf. 1Ts 5,12.19.21; João Paulo II, Christifidelis Laici 24

18 ChL 24

19 Cf."0 repouso no Espírito", Ed. Paulinas, 1991.

20 ChL 24

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compromisso, com os compromissos relativos à fé. Pe. Isaac Isaías Valle, por exemplo, de Porto Feliz, na Arquidiocese de Sorocaba, sacerdote muito estudioso e preparado doutrinariamente, atende as pessoas utilizando-se dessa prática.

f) Em muitas ocasiões - especialmente em grandes encontros - há um visível descontrole emocional da parte de muitos nos quais se manifesta tal fenômeno, chegando-se mesmo a identificáveis casos de histeria, seja por desequilíbrio de cunho psicológico. Como diz João Paulo II, "na verdade, a ação do Espírito Santo, que sopra onde quer, nem sempre é fácil de se descobrir e de se aceitar. Sabemos que Deus atua em todos os fiéis cristãos e estamos conscientes dos benefícios que provém dos carismas, tanto para os indivíduos como para toda a comunidade cristã. Todavia, também temos consciência da força do pecado e as confusões na vida dos fiéis e da comunidade."21

g) Assim, não é oportuno incentivar tal prática. Mas há vezes em que, sem que ninguém estimule, ocorre tal manifestação. Então, surge a oportunidade para cumprir o que determina o Documento 53, buscando aprofundar o entendimento sobre a matéria, pela observação com um estudo do caso, até perguntando à pessoa como é que ela está se sentindo, se aquilo lhe gerou paz, se o seu é um histórico sem comprometimentos outros, etc, para chegar a um discernimento sobre as características que possam nos ajudar a identificar a legitimidade do repouso.

5 - Sobre as inspirações particulares: Em geral a liderança da RCC tem tido bastante bom senso no exercício dessas chamadas inspirações, ou moções. Junto com os dons da Palavra de Ciência e a Palavra de Sabedoria, a RCC se esmera em fazer uso do Dom do Discernimento Carismático. Podem ocorrer exageros e afoitas condutas? Claro que sim. Mas a realidade dos fatos logo "traz para a terra" aqueles espíritos mais atabalhoados, e que agem por impulsos meramente humanos, e de maneira até irresponsável. Na observância dos resultados práticos e dos frutos produzidos por tais inspirações é que a RCC busca aprender a deixar-se conduzir pelo Espírito, que - segundo a Apostolicam Actuositatem - distribui também aos leigos dons e carismas para capacitá-los a anunciar o Reino, com poder22. É possível encontrar-se falsas moedas. Mas não vamos, com elas, jogar fora as legítimas, as verdadeiras. Em 2003, o Pontifício Conselho para os Leigos convidou a RCC a dar sua contribuição no Colóquio Internacional sobre a Oração para pedir de Deus a cura, realizado em Roma, sob os auspícios daquele Conselho, reconhecendo nela essa prudência.

II - Propostas:

a) Ao acompanhar a RCC, percebo que existe seriedade, busca de maior conhecimento teológico em suas lideranças e docilidade. Sugiro que a Comissão Episcopal de Doutrina promova um estudo sobre os Carismas e as práticas da RCC, com seus representantes. Pode até surgir uma nova e mais atualizada orientação pastoral.

b) Sugiro que os senhores bispos verifiquem em suas Dioceses os eventuais problemas, proporcionando uma orientação segura, através de um assistente diocesano que possa acompanhar de perto.

c) Nos Congressos Estaduais da RCC, seria muito oportuno que o Bispo do local em que o mesmo se realiza se fizesse presente com a apresentação de um tema de formação. Penso que "adotando a criança", poderemos orientar melhor e os membros da RCC não se sentirão marginalizados, mas membros vivos das Igrejas particulares.

Dom Alberto Taveira Corrêa

21

ChL 24

22 cf. AA 3