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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU A DANÇA COMO CONTRIBUIÇÃO NO DESENVOLVIMENTO MOTOR, SOCIAL E COGNITIVO NA CRIANÇA Ingrid de Melo Labeta ORIENTADORA: Prof. Marta Relvas Rio de Janeiro 2018 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEIDE DIREITO AUTORAL

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Page 1: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEIDE DIREITO AUTORAL · Paulo Freire propôs uma pedagogia liberta e autônoma, pautada em temas geradores escolhidos a partir das experiências dos alunos,

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

A DANÇA COMO CONTRIBUIÇÃO NO DESENVOLVIMENTO

MOTOR, SOCIAL E COGNITIVO NA CRIANÇA

Ingrid de Melo Labeta

ORIENTADORA:

Prof. Marta Relvas

Rio de Janeiro

2018

DOCUMENTO P

ROTEGID

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LEID

E DIR

EITO A

UTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

A DANÇA COMO CONTRIBUIÇÃO NO DESENVOLVIMENTO

MOTOR, SOCIAL E COGNITIVO NA CRIANÇA.

Apresentação de monografia à AVM como

requisito parcial para obtenção do grau de

especialista em Neurociência Pedagógica.

Por: Ingrid de Melo Labeta

Rio de Janeiro

2018

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha orientadora, Profa. Marta Relvas, e ao Prof. Vasco Amaral

pela dedicação em transmitir seus conhecimentos, o que contribuiu de forma

decisiva para a escolha desta pesquisa.

Gostaria de agradecer a todos os professores que tanto contribuíram para

minha formação. Não podendo deixar de agradecer também pelo apoio ao

longo do curso dos amigos que fiz e ressaltar o importante e especial suporte

de todos que me incentivou a buscar cada vez mais novos conhecimentos.

Por fim, agradeço à minha mãe e ao Michel Bergamini que me incentivam e

proporcionam o suporte emocional, o carinho e a paciência fundamental para

minha trajetória.

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DEDICATÓRIA

Dedico à minha mãe pela abnegação, devotamente e amor.

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RESUMO

O presente estudo teve como objetivo refletir a respeito do funcionamento do

cérebro durante o aprendizado da dança. Aprender a dançar envolve uma série

de processos no cérebro que podem ser estudados através da neurociência.

Na busca de compreender o funcionamento de tais processos, através de uma

pesquisa bibliográfica, os resultados permitiram observá-la como propiciadora

de criação de novas conexões neurais. Assim, a importância do estudo das

bases neurofisiológicas da dança visa contribuir para a compreensão dos

aspectos cognitivos, motores, afetivos e sociais relacionados à aprendizagem

dessa arte, legitima a experiência artístico-pedagógico como estratégia de

ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: Dança; Neurociência; Aprendizagem.

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METODOLOGIA

Para atender ao objetivo proposto pelo estudo foi desenvolvido uma pesquisa

de natureza básica por meio de uma pesquisa exploratória de cunho

bibliográfico, no qual as referências puderam ampliar a compreensão da ação

da arte como contribuinte ao meio escolar ao longo do processo de

desenvolvimento infantil, permitindo a compreensão a respeito dos processos

neurofuncionais durante a aprendizagem da Dança.

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SUMARIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

A complexidade do meio, da cultura e da plasticidade 11

CAPÍTULO II

O desenvolvimento de um corpo que dança 55

CAPÍTULO III

Observar, imitar, refletir, criar... 88

CONCLUSÃO 101

BIBLIOGRAFIA 102

ÍNDICE 112

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INTRODUCÃO

No Brasil, com a recente publicação da Lei 13.278/16, a dança ao

ser inserida no currículo escolar deverá contribuir com o processo de ensino-

aprendizagem para uma instrução que estimule a criatividade, a autonomia, a

relação com o outro e a consciência crítica sobre o meio, de forma que

favoreça a identificação de questões, levantamentos de hipóteses e reflexões

sobre situações relacionadas ao fazer e ao pensar.

Paulo Freire propôs uma pedagogia liberta e autônoma, pautada em

temas geradores escolhidos a partir das experiências dos alunos, visto que os

temas existem nos corpos e nas relações com o mundo. O que talvez seja o

grande desafio dos futuros professores de dança dentro do meio escolar é

compreender que não se constrói competências em um vago investigar, como

também nenhum investigar por si só faz desenvolve uma competência. Embora

haja desafios e contradições, principalmente na rede pública de ensino,

conteúdos expressos apenas em lousas não são mais recomendados. É

necessário permitir vivenciar esses saberes.

Com a alteração da LDB 9394/96, discussões a respeito da dança

no contexto escolar reapareceram, principalmente acerca da participação

efetiva no ensino-aprendizado escolar, como o diálogo com a

interdisciplinaridade e o desenvolvimento da capacidade criativa e imaginativa

do estudante. Nesse caminho, os desafios se multiplicam e o enfoque a ser

abordado parte para a compreensão da criação da própria biologia e dela

acharmos o melhor caminho para estimular a percepção, a memória, a

criatividade, a consciência dentre outros.

Embora admiráveis e todas muito ricas no seu contexto cultural, não

será tratado ou defendido nesta pesquisa, um gênero ou modalidade de dança

específica. Será discutido uma dança em meio a diversidade, dos diferentes

corpos e potencialidades, entretanto em favor ao ensino e ao desenvolvimento

individual do educando no seu processo de aprendizagem.

A dança enquanto atividade interdisciplinar pode estimular a

interação social, através do qual, o estudante não apenas se relaciona com o

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outro como também garante acesso a informação e à produção de

conhecimentos e saberes, construindo uma visão de mundo, de si e do outro,

permitindo uma compreensão mútua de todo e qualquer conteúdo envolvido.

Esta pesquisa tem como objetivo refletir a importância do ensino da

dança com enfoque interdisciplinar para a formação de pessoas participativas,

autônomas e conscientes de si e do seu meio. Diante dessa ótica, tem-se a

preocupação de estimular e contribuir para novas abordagens e a construção

de melhores meios que despertem a criatividade, a inovação e a reflexão

através da dança, sem perder a sensibilidade da arte, na colaboração de

questões cotidianas no ambiente escolar.

O diálogo com as demais áreas de conhecimento mostra-se

enriquecedor. Permite uma maior apreensão e compreensão daquilo que o

cerca como também do seu próprio corpo. A dança, dessa forma, pode

contribuir para o entendimento social e cultural.

Os estudos no campo da neurociência vêm contribuindo

significativamente para o conhecimento do cérebro humano e sua relação com

o aprendizado. Desta forma, pode contribuir ao educador o conhecimento

sobre o neurodesenvolvimento, permitindo a compreensão a respeito do

processo da linguagem, da memória, da atenção, do desenvolvimento cerebral

e os processos envolvidos na aprendizagem escolar, favorecendo à própria

atuação do educador em sala de aula.

Além de discutir sobre a importância da dança nos diferentes

contextos da educação, é necessário refletir como a dança vem sendo

ensinada nos diferentes contextos. Esta arte inserida no currículo escolar,

neste primeiro momento, tem uma árdua missão de romper barreiras e

preconceitos, além de trazer ao corpo e pelo corpo a construção do saber e do

conhecimento, consistindo na transmissão de valores, ética e moral

indispensáveis para o processo de evolução social.

Para atender ao objetivo proposto pelo estudo foi desenvolvido uma

pesquisa de natureza básica, com a abordagem qualitativa, não requerendo o

uso de métodos e técnicas estatísticas. Já quanto o ponto de vista dos

objetivos foi uma pesquisa exploratória de cunho bibliográfico, no qual as

referências puderam ampliar a compreensão da ação da arte como contribuinte

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ao meio escolar durante o processo de desenvolvimento na infância, permitindo

a compreensão a respeito do processo da linguagem, da memória, da atenção,

do desenvolvimento cerebral e os processos envolvidos na aprendizagem.

Além desta introdução, o texto está organizado em itens que se

integram. O primeiro capítulo: “A complexidade do meio, da cultura e da

plasticidade” está constituído na compreensão do sistema nervoso, da

plasticidade neural e das transformações da dança ao longo do tempo. No

segundo capítulo: “O desenvolvimento infantil de um corpo que dança” será

abordado sobre as modificações sofridas ao longo da infância, assim como o

funcionamento do cérebro humano para o aprendizado e as formas que são

compreendidas durante esse processo. No terceiro capítulo: “Observar, imitar,

refletir, criar...” consiste em analisar algumas atuações das metodologias em

usadas nas aulas de dança e reflete sobre as ações pedagógicas a fim de um

melhor desempenho cognitivo do educando.

Pretende-se então, nessa pesquisa apresentar algumas

contribuições neurocientíficas sobre o estudo dos diferentes processos neurais

que podem se desenvolver pela vivência em dança. Pela perspectiva da

neurociência cria-se um novo entendimento de corpo trazendo novas reflexões

principalmente no que se refere ao ensino e aos processos criativos em dança.

Dessa forma, questões referentes à importância do movimento e suas

implicações no desenvolvimento do sistema nervoso e no funcionamento

cerebral se faz necessário em prol de estimular a elaboração de novas

metodologias.

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CAPÍTULO I

A COMPLEXIDADE DO MEIO, DA CULTURA E

DA PLASTICIDADE

Para a compreensão de uma prática docente é necessária uma

análise, mesmo que breve, a respeito das variáveis que compõem o contexto

dessa prática. Para compreender o método dialógico de Paulo Freire, por

exemplo, é importante perceber que um dos pressupostos da metodologia é a

ideia de que ninguém educa ninguém e ninguém se educa sozinho. A atuação

freireana não poderia partir da realidade e experiências do educador, levando

seu material pronto correspondendo a realidade do seu próprio mundo, do seu

saber, do material do seu método e da sua fala. A ideia central dessa prática de

ação dialogal entre educadores e educandos deve partir de uma prática de

ação comum entre as pessoas a serem alfabetizadas e as da comunidade

(BRANDÃO, 1981).

Marques (2011) em sua proposta metodológica, Dança no Contexto,

busca inter-relacionar a formação e a leitura a partir do tripé arte-ensino-

sociedade, articulando-o a rede: problematização-articulação-crítica-

transformação, na busca de sentidos transformadores. A mesma autora baseia-

se na Proposta Triangular para ensino de artes (apreciar, fazer e

contextualizar), da professora e pesquisadora Ana Mae Barbosa, para a

elaboração dessas relações. Dessa forma, entende-se para a Dança no

Contexto a necessidade de propostas de aulas que alcem uma relação

proximal entre os saberes específicos da dança. Relações estas entre os

próprios subtextos, textos e contextos da dança.

Desse ponto de vista, tendo o contexto dos alunos como ponto de

partida, essa proposta metodológica trabalharia com os subtextos da dança

apresentados por Marques (2011). Tais subtextos seriam: a coreologia,

elementos estruturais da dança e elementos socioafetivo-culturais.

Especificamente, esses conhecimentos estariam diretamente ligados a forma

na qual seria expressada essa dança, ou seja, estaria correlacionada a

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consciência corporal, o funcionamento do corpo, possibilidades e limites

individuais, coordenação etc., além de considerar o significado implícito de um

movimento/gesto para cada educando.

Em contrapartida, há um ensino de dança dito como modelo

tradicional. Nesse modelo trabalha-se a observação e a repetição da

movimentação criada unicamente pelo professor. Assim, educando não

participa do processo de criação, e em alguns casos essas criações estariam

em desarmonia com suas limitações, normalmente físicas. Refletindo essa

temática ao processo de desenvolvimento da "consciência do Eu", Fonseca

(2010) afirma que:

A tendência comportamental, manifestada pelo bebê humano para interagir, estabelecer reciprocidade mímico-emocional, apelar a carícias e afiliações, desencadear e compartilhar a atenção e reproduzir ecocinesicamente comportamentos dos outros, é uma herança fundamentalmente da espécie humana e, simultaneamente, filogenética e sociogenética (FONSECA, 2010, p. 25)

Essa disposição para a construção gnóstica do corpo pela

observação do outro e só posteriormente internalizar, personalizar e

autocontrolar se dá devido a operação dos neurônios-espelho. Sendo esta

capacidade de atribuir estados mentais, intenções e desejos de ação a outros

seres humanos uma conquista evolutiva da espécie humana (FONSECA,

2010).

Uma atuação metodológica que privilegia exclusivamente

reprodução e a repetição, poderia estar de acordo aos chamados corpos

dóceis de Foucault.

O corpo humano entra numa maquinaria do poder que o

esquadrinha, o desarticula e o recompõe. Uma ‘anatomia

política’, que é também igualmente uma ‘mecânica do poder’,

está nascendo; ela define como se pode ter domínio sobre o

corpo dos outros (...). A disciplina fabrica assim corpos

submissos e exercitados, corpos ‘dóceis’. A disciplina aumenta

as forças do corpo (em termos de utilidade) e diminui essas

mesmas forças (em termos políticos de obediência)

(FOUCAULT, 1987, p. 127).

Marques (2010) destaca que aulas de dança meramente

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reprodutivas, seja de ensaios de repertórios ou de sequências de passos pré-

estabelecidas, sem aprofundamentos ou discussões proporcionam contatos

entre o universo da dança e seus alunos. Entretanto, "na passividade, na

acomodação, não tem consequência, simplesmente copiam e reproduzem"

(MARQUES, 2010, p. 29). Ainda sobre essa estrutura, Ianitelli (2004) aponta

que:

Existem duas formas predominantes da mesma abordagem metodológica da técnica de Dança no Ocidente. Na primeira, o professor demonstra sequências de movimento, previamente elaboradas, frente ao corpo discente. Este, por sua vez, procura memorizar, mediante a observação e simultânea experimentação prática (visualmente, mentalmente e/ou cinestesicamente), o que lhe é apresentado. Apreendidas, os alunos são levados a repeti-las e demonstrá-las com o máximo de precisão e rigor técnico, atendendo às expectativas de excelência de desempenho. Normalmente o material apresentado é acompanhado de indicações verbais, dando informações adicionais favoráveis à apreensão do assunto (IANITELLI, 2004, p. 33).

Acrescenta ainda que:

Nesse tipo de abordagem, emoções são ignoradas, bem como aspectos biomecânicos, históricos e psicológicos que caracterizam cada indivíduo. Os alunos agem como receptores passivos dessa prática metodológica. Com maior ou menor esforço, eles buscam adequar-se ao modelo de desempenho ideal, ainda que contrariando as suas características e tendências pessoais (IANITELLI, 2004, p. 32).

Porém, em ambas as visões e práticas há elementos necessários

para a perpetuação de uma cultura artística como também ações que

estimulam o desenvolvimento cognitivo, motor e social em uma criança. No

entanto, o que talvez seja ainda uma grande discussão é que se tenha uma

equilibração entre os meios para que haja uma troca construtiva em um

ambiente tão heterogêneo como na escola, com relação às vivências,

experiências e preferências pessoais, para cada educando.

Antes de concluir qual seria a melhor abordagem e para a

compreensão das variáveis no campo das artes, no caso deste estudo: a

Dança, é de grande relevância para esta análise identificar os sujeitos

implicados no processo artístico-educacional como um todo. Partindo desses

sujeitos para um estudo mais específico de uma prática docente em Dança

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dentro do âmbito escolar, faz-se indispensável a discussão a respeito de como

o sistema nervoso central funciona e possibilita o aprendizado de ações que

envolvem a consciência do corpo, lateralidade, memorização dentre outros,

comumente citados dentre os benefícios que a prática da dança proporciona.

1.1. O sistema nervoso

A dança na antiga Grécia, ganhou amplo espaço na educação como

base da formação física, estética e filosófica, confirmado por Platão, em Leis II,

ao referir ser a Choreia uma educação completa (BOURCIER, 2001). Segundo

Tiriba (2003), ao longo dos séculos, no decorrer do processo civilizatório

ocidental aconteceram grandes e radicais transformações. Novos

conhecimentos surgiram e cada vez mais foi necessário haver especialistas em

determinados setores. Dessa forma, desenvolveu-se uma supervalorização da

capacidade intelectual e, diferente dos gregos, um afastamento de outras

dimensões humanas.

Diante dessa ruptura entre mente e corpo, percebe-se que por muito

tempo o corpo foi negado. Distante de ser considerado como sabedoria e/ou

fonte de conhecimento, o corpo passou a ser sinônimo de ação funcional em

prol da produção de bens, até chegar a ser o principal consumidor da própria

manufatura. Um verdadeiro cabide às estéticas da moda.

Mais uma vez a dança emerge como uma ferramenta às práticas

educativas no ensino regular atual e para que a dança aconteça existem trocas

de informações realizadas por células nervosas durante todo o tempo. Essas

células nervosas que formam o cérebro e o sistema nervoso como um todo,

comunicam-se umas com as outras por meio de pulsos eletroquímicos para a

produção das mais variadas atividades (RELVAS, 2009). Por isso, entende-se

ser necessário compreender as ligações e conexões internas do corpo pois,

dessa forma, pode auxiliar na compreensão do movimento propriamente dito,

mas, principalmente, na compreensão de como essa pessoa aprende e/ou

apreende.

Contudo, é visto que a criação em dança, com finalidades

profissionais ou escolares, é um diálogo neurofisiológico constante do corpo.

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Nesse mesmo espaço que ocorre o movimento, a consciência, a percepção e o

pensamento, por exemplo, estão todos conectados nessa rede de relações

internas e externas.

Dângelo e Fattini (2011) dizem que as funções orgânicas, assim

como a integração no meio ambiente estão na dependência de um sistema

especial denominado sistema nervoso. Diante dessa afirmação, entende-se

que o sistema nervoso controla e coordena as funções dos sistemas orgânicos

bem como recebe estímulos externos e é capaz de interpretá-los e emitir

respostas adequadas a estes estímulos. O sistema nervoso divide-se em duas

partes fundamentais que são o sistema nervoso central (SNC) e o sistema

nervoso periférico (DÂNGELO; FATTINI, 2011)

Dângelo e Fattini (2011) acrescentam que o sistema nervoso central

é uma porção de recepção de estímulos, comando e desencadeadora de

respostas. Já a porção periférica está constituída pelas vias que conduzem os

estímulos ao sistema nervoso central ou que levam aos órgãos efetores as

ordens emanadas pela porção central.

Relvas (2009) declara que é no sistema nervoso central (SNC) onde

estão localizadas a maioria das células, seus prolongamentos e os contatos

que fazem entre elas. E no sistema nervoso periférico (SNP), comparando-o ao

SNC, possuem poucas células e um grande número de fibras nervosas que

agrupadas em filetes alongados são chamados de nervos onde, segundo a

autora, funcionam como fios condutores de informações motoras e sensitivas.

Cosenza e Guerra (2011) recordam que o cérebro é a parte

essencial do sistema nervoso. E é através do cérebro que o ser humano toma

consciência das informações que chegam pelos órgãos dos sentidos e

processam essas informações, comparando-as com as vivências e

expectativas. Logo, é a partir dele que partem as respostas voluntárias e

involuntárias que fazem com que o corpo atue sobre o meio.

Para melhor esclarecimento observe brevemente as estruturas que

compõem esse sistema tão complexo:

● SISTEMA NERVOSO: está dividido em sistema nervoso central e

sistema nervoso periférico.

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● SISTEMA NERVOSO CENTRAL (SNC) é composto pelo encéfalo e pela

medula espinal, contidos dentro da cavidade craniana e do canal da

coluna vertebral, respectivamente. Este sistema funciona como um

controlador e integrador do sistema nervoso, recebendo impulsos

sensitivos do sistema nervoso periférico, formulando respostas para

estes impulsos.

● SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO é constituído pelas terminações

nervosas (extremidades de fibras sensitivas ou motora), pelos gânglios

(grupos de corpos de células nervosas associadas aos nervos) e pelos

nervos (cordões esbranquiçados formados por fibras nervosas unidas

por tecido conjuntivo com função de intermediar impulsos

eletroquímicos). (DÂNGELO, 2011, p. 52-71)

As células do sistema nervoso são chamadas de neurônios. O

neurônio é uma célula diferenciada e possui as funções de receber e conduzir

estímulos, enviados ao centro onde são avaliadas as informações e

processadas as instruções para o organismo, o córtex cerebral. O córtex

cerebral necessita de impulsos advindos dos receptores exteroceptivos,

proprioceptivos e interoceptivos para que haja a transmissão de informações

(OLIVEIRA, 2014).

De acordo com Oliveira (2014) a condução dos impulsos vindos dos

receptores aos centros nervosos se faz através de fibras nervosas sensitivas

ou aferentes e a transmissão aos músculos é realizada pelas fibras eferentes

ou motoras. Afirma ainda que a velocidade dos impulsos nervosos se faz

através do revestimento da bainha de mielina com papel importante na

transmissão de informações como também de isolante.

O sistema nervoso humano, explicam Cosenza e Guerra (2011),

inicia o seu desenvolvimento durante as primeiras semanas de vida

embrionária, havendo várias etapas que devem ser cumpridas para que as

conexões entre as células nervosas sejam feitas de forma correta. Apontam

que a maior parte das conexões no cérebro de um bebê será feita com o

auxílio das interações com o meio ambiente e que a falta de estimulação

adequada pode ser prejudicial ao desenvolvimento do cérebro.

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É necessário destacar que existem períodos no qual a

aprendizagem é mais fácil. As percepções sensoriais assim como a habilidade

motora devem passar por longos períodos de aprendizagem (COSENZA;

GUERRA, 2011).

Como conclusão, Cosenza e Guerra (2011) mostram que:

Resumindo, do ponto de vista neurobiológico a aprendizagem se traduz pela formação e consolidação das ligações entre as células nervosas. É fruto de modificações químicas e estruturais no sistema nervoso de cada um, que exigem energia e tempo para se manifestar. Professores podem facilitar o processo, mas, em última análise, a aprendizagem é um fenômeno individual e privado e vai obedecer às circunstâncias históricas de cada um de nós. (COSENZA; GUERRA, 2011, p. 38)

Para que haja desenvolvimento o sujeito sofre continuamente

influências de fatores internos e externos, variando de um indivíduo para outro,

o que o torna único. Quanto mais estimular uma criança maior nela será o

número de sinapses.

Sobre sinapses Relvas (2009, p. 32) define como “junções formadas

com outras células nervosas onde o terminal pré-sináptico de uma célula faz

contato com a membrana pós-sináptica de outra”. Existindo dois tipos de

sinapses: a elétrica que ocorre “quando o terminal pré-sináptico está em

continuidade com o pós-sináptico” e a química, “carreada por

neurotransmissores, substâncias neuroativas liberadas no lado pré-sináptico da

junção” (RELVAS, 2009, p. 32-33).

Papalia (2006) sobre as influências no desenvolvimento coloca que:

Algumas influências sobre o desenvolvimento originam-se com a hereditariedade: a dotação genética inata dos pais biológicos de uma pessoa. Outras provém do ambiente externo: o mundo fora da pessoa, que se inicia no útero (...). (PAPALIA, 2006, p. 54)

Piaget considera a maturação como um dos fatores expressivos

para o desenvolvimento mental. A maturação nervosa é essencial para a

aprendizagem (OLIVEIRA, 2014). Papalia (2006) acrescenta a respeito de

maturação que:

Muitas mudanças típicas da primeira e segunda infâncias parecem vinculadas à maturação do corpo e do cérebro - o

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desdobramento de uma sequência natural geneticamente influenciada de mudanças físicas e padrões de comportamento, incluindo a prontidão para adquirir novas habilidades, como caminhar e falar (...). (PAPALIA, 2006, p. 54)

Dessa forma, para compreender as semelhanças e dissemelhança

no desenvolvimento, é necessário observar as características herdadas como

também muitos dos fatores ambientais que lhe são influenciados. Embora não

seja trazido um aprofundamento nestas questões sociais, Papalia (2006)

destaca os seguintes contextos/fatores externos que podem afetar o

desenvolvimento: o contexto familiar, o bairro onde se reside e a condição

socioeconômica como também a etnicidade com relação a sua descendência,

religião, língua e/ou nacionalidade o que contribui a um sentido de identidade e

o contexto cultural, referindo-se ao modo de vida.

Assim, o desenvolvimento do sistema depende das ações biológicas

no ambiente externo e dos efeitos dessas ações no próprio organismo. Essa

“capacidade do organismo em adaptar-se às mudanças ambientais externas e

internas, mediadas pela ação sinérgica de diferentes órgãos, coordenados pelo

SNC”, referidas por Duarte e Barbosa (2010, p. 49), é denominada plasticidade

neural.

1.2. Neuroplasticidade e o ensino da Dança

A neurociência se constitui como a ciência do cérebro e a educação

como ciência do ensino e da aprendizagem e ambas possuem uma relação de

proximidade pois o cérebro tem uma significância no processo de

aprendizagem pessoal. Verdadeiro seria, também, afirmar o inverso: que a

aprendizagem interessa diretamente ao cérebro (PAULA et al. 2006).

A partir dos estudos de Paula (et al, 2006), a aprendizagem pode ser

entendida como uma mudança de comportamento decorrente a plasticidade

dos processos cognitivos inatos do ser humano. Estes, oriundo de fatores

biológicos somados a sua relação com o meio ambiente. Para que haja

aprendizagem é necessária uma organização cerebral integrada que exigem

níveis de ativação e atenção, vigilância e seleção de informações. O resultado

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decorre da recepção e troca de informações entre o meio ambiente e os

processos do sistema nervoso central (PAULA et al. 2006).

A dança enquanto atividade interdisciplinar pode estimular a

interação social, através do qual, o estudante não só se relaciona com o outro,

mas garante acesso à informação e à produção de conhecimentos e saberes,

construindo uma visão de mundo, de si e do outro, permitindo uma

compreensão mútua de todo e qualquer conteúdo envolvido.

Pereira (2017, p. 14) afirma que:

Dança como área de conhecimento pode dialogar com outras, e a Neurociência é uma delas. Acabamos por querer separar em áreas distintas para compreendermos melhor as coisas, mas o problema aparece quando não as vemos como partes de um todo e não as juntamos de volta.

Todo conhecimento é adquirido por meio do processo de

aprendizagem. Uma vez captada a informação, seu processamento se dá a

partir da extração das características sensoriais, passando pela interpretação

do significado até ser emitido uma resposta. Dessa forma, a área de projeção

desse encadeamento estão relacionadas às áreas sensitivas, motoras,

associativas e de sobreposição (PAULA et al, 2006, p. 227).

Levando em consideração a própria definição de aprendizagem,

essa apoiada nos procedimentos clássicos da psicomotricidade, uma

consciência de si e o conhecimento do funcionamento biológico para a

aprendizagem pode garantir procedimentos pedagógicos cada vez mais

eficazes relacionados ao ensino-aprendizagem, ligados às necessidades

individuais e coletivas no processo de aprender.

Esse diálogo com as demais áreas de conhecimento mostra-se

enriquecedor. Permite uma maior apreensão e compreensão daquilo que o

cerca como também do seu próprio corpo. A dança, dessa forma, pode

contribuir para o entendimento social e cultural. E no que se refere ao ensino-

aprendizagem há um grande potencial para a compreensão no que esse

processo poderá promover no desenvolvimento das potencialidades do

educando.

É válido ressaltar que a aprendizagem está ligada ao

desenvolvimento neural, resultado da recepção e troca de informações entre o

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meio ambiente e os centros nervosos. Ou seja, para que haja aprendizagem, o

processo inicia de um estímulo de natureza físico-químico advindo do ambiente

que o sujeito se encontra e transformado em impulso nervoso pelos órgãos do

sentido.

Ao ser captada a informação, é extraído as características

sensoriais, interpretado o significado até se emitir uma resposta. O sistema

nervoso periférico leva ao córtex informações do meio externo, permitindo

acionar a área responsável, através de neurônios específicos, estabelecendo

inter-relações funcionais para a emissão de resposta.

Neste trabalho, o conceito de plasticidade neural é de extrema

importância. De acordo com Relvas (2009, p. 80), plasticidade “é a capacidade

de o sistema nervoso alterar o funcionamento do sistema motor e perceptivo

baseado em mudanças no ambiente”. Na discussão sobre esta temática,

percebe-se que a falta de estimulação adequada pode ser prejudicial ao

desenvolvimento do cérebro. Embora se saiba que a plasticidade seja maior

durante os primeiros anos de vida. Essa capacidade de fazer e refazer

conexões entre os neurônios como consequência das interações constantes

com o ambiente externo e interno do corpo, permanece, de forma diminuída,

por toda vida (COSENZA; GUERRA, 2011).

De modo geral, as instituições constroem um conhecimento com

pouquíssima participação do corpo no processo de aprendizagem escolar.

Tornando o ensino estático e obediente em detrimento à emoção,

comunicação, personalidade, cultura e política do meio no qual o estudante se

insere. Observada a carência do movimento, das sensações e informações que

a dança pode contribuir, é necessário que se amplie o número de profissionais

atuantes em escolas formais de educação. Mas para isso a preparação

profissional tem papel fundamental.

Os estudos no campo da neurociência vêm contribuindo

significativamente para o conhecimento do cérebro humano e sua relação com

o aprendizado. Dessa forma, pode contribuir ao educador na sua atuação

pedagógica devido a compreensão do funcionamento das estruturas do

sistema nervoso central, permitindo a compreensão a respeito dos processos

envolvidos na aprendizagem.

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Assim, como a neurociência vem construindo respostas desde o

século XVIII onde ainda “acreditava-se que o sistema nervoso funcionasse

como uma glândula que secretava seus fluidos que seriam conduzidos pelos

nervos para a periferia do corpo” (TABACOW, 2006 in PAULA et al, 2006, p.

15), a dança, anterior a neurociência, vem se moldando ao longo dos séculos.

Dessa forma, será analisado a seguir os elos históricos da dança buscando

compreender esquemas culturais que baseiam a construção do conhecimento.

Seguidamente, será analisado a plasticidade e, dessa forma, averiguar as

possibilidades desse olhar no ambiente da dança.

1.2.1. A observação científica em um breve paralelo histórico da Dança

Discutir a respeito da dança é também refletir acerca do corpo, das

mudanças sofridas sobre ele, sejam estéticas ou culturais, e das próprias

transformações sociais advindas de novos conhecimentos, mudanças de

hábitos, tecnologia e tantos outros que podem ser abordados como fatores

modificantes ao ser humano e, consequentemente, na dança.

Observando a evolução biocultural do homem, a transformação dos

padrões sociais e econômicos e os diferentes contextos onde as manifestações

da dança foram adquirindo novas visões e diferentes concepções sobre a arte

e o corpo foi possível notar uma preocupação em adequar-se aos avanços

principalmente no que dizia respeito ao corpo. Em um desses momentos pode-

se apontar a ascensão do balé clássico e até mesmo as danças que

contrariaram esta técnica, como a dança moderna e contemporânea, séculos

mais tarde.

Independente da classificação ditada à dança: “étnica, folclórica,

teatral” (FARO, 2011, p. 13), todas, de acordo com seu tempo e sua cultura,

atentaram-se ao corpo. As mais remotas parecem buscar também as

potencialidades e possibilidades do corpo tanto ao sagrado quanto a própria

cura. No decorrer do tempo, essas condições evoluíram e, dessa forma, a

dança recebeu novos contornos e características que a fazem um processo

cultural ímpar, em constante transformação.

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Para buscar e analisar toda a história da dança seria necessária

uma vida e talvez não fosse o bastante. Mas aqui será trazido algumas

manifestações que podem contribuir para um breve entendimento sobre a

história da dança e abordar conceitos neurocientíficos na análise de cada uma

delas. Portinari (1989, p. 17) constata que:

Antropólogos e arqueólogos assumem que o homem primitivo dançava como sinal de exuberância física, rudimentar tentativa de comunicação e, posteriormente, já como forma de ritual. Dançou-se assim desde tempos imemoriais, em torno de fogueiras e diante de cavernas: gestos rítmicos, repetitivos, às vezes levados ao paroxismo, serviam para aquecer os corpos antes de caça e do combate. Nas mais remotas organizações sociais, a dança esteve presente, celebrando as forças da natureza, investidas bélicas, mudança das estações.

Neste trecho, embora a própria autora já dê uma datação citando a

descoberta da imagem dançante na caverna de Cogul no período mesolítico no

parágrafo seguinte a este citado, nota-se que aqueles homens já “percebiam”

seus corpos e através do corpo buscavam a comunicação. Além disso, destaca

a possibilidade do processo de desenvolvimento de áreas cerebrais. Ao referir-

se aos gestos rítmicos leva-se em consideração a pesquisa de Steven Brown e

Lawrence M. Parsons (2006) onde concluiu que o sincronismo inconsciente

acontece “quando uma mensagem auditiva neural se projeta diretamente nos

circuitos auditivos e de ritmo presente no cerebelo, desviando-se de áreas

auditivas superiores no córtex cerebral”. Diante dessa afirmação é possível

compreender a presença de movimentos ritmados neste período primitivo.

Primitivo aqui entra em acordo com Gombrich (2012) quando afirma que:

(...) Chamamos a esses povos “primitivos”, não porque sejam mais simples do que nós - os seus processos de pensar, com frequência, são mais complicados do que os nossos-, mas por estarem mais próximos do estado em que, num dado momento, emergiu a humanidade. (GOMBRICH, 2012, p. 39)

A repetição, também citado no parágrafo de Portinari (1989), leva a

análise do que são os neurônios espelhos. Esses neurônios “são de uma

classe particular de neurônios visuomotores” (BRAGATO, 2010, on-line).

(...). Ou seja, os neurônios espelho, quando ativados pela observação de uma ação, permitem que o significado da ação seja compreendida automaticamente (de modo pré-atencional). Este processamento pode (ou não) ser seguido por um

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processamento consciente que conduz a uma compreensão mais abrangente dos eventos através de mecanismos cognitivos mais sofisticados. Assim, estes neurônios possibilitam a compreensão da ação e/ou da intenção de outro animal pela ativação subliminar desta ação nos circuitos fronto-parietais. (...). (GAWRYSZEWSKI; PEREIRA JR; LAMEIRA; 2007)

De acordo com Faro (2011) a dança nasce da necessidade de

expressão do homem. Posteriormente, o homem primitivo por meio de imitação

buscou reproduzir através do corpo os ritmos da natureza e movimentos dos

animais (BATALHA, 1983). Essa associação, mais tarde, passa transformá-la

em uma dança simbólica representando o sobrenatural, passou assim à

religiosidade até chegar a um grande momento comunitário de cerimônias

através da linguagem corporal (PASI, 1991).

Esta transformação, resultado de um aprendizado que se deu

através de modificações funcionais do sistema nervoso central agindo, neste

caso, nas áreas corticais das praxias, da memória e da atenção, por exemplo,

para que se fossem possíveis o aprendizado e o ensino de tais movimentos.

Sem a consolidação do que foi observado e aprendido tal cultura não poderia

ter sido perpetuada.

Lembrando que a aprendizagem está ligada ao desenvolvimento

neural, resultado da recepção e troca de informações entre o meio ambiente e

os centros nervosos. No caso, o estímulo externo nesse período primitivo se

deu a partir da observação da própria natureza e mais tarde dos ensinamentos

culturais perpassados entre os grupos.

Durante a antiguidade clássica, a dança esteve presente em rituais,

festejos e cerimônias de distintas civilizações. No antigo Egito praticou-se a

dança em um caráter eminentemente ritualístico, na forma de dança sagrada,

depois a litúrgica, destacado por Bourcier (2001) a liturgia funerária, e, por fim,

a dança de recreação.

De acordo com Bourcier (2001) encontra-se alusão à dança entre os

hebreus em livros líricos, como os Salmos, além de textos canônicos, como a

Mishna. O mesmo autor destaca o caráter paralitúrgico da dança hebraica,

porém praticadas em contexto religioso. Apresenta também um caráter

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excepcional a sua forma e seu espírito, sendo o único povo a não transformar

sua dança em arte.

O que talvez pode chamar mais a atenção é observar que nesta

época já se obtinha cuidados com a distribuição espacial e possíveis, como são

chamados hoje, desenhos coreográficos.

Encontramos danças em fileiras, por exemplo, no Êxodo, XV, quando a profetisa Miriam, irmã de Moisés, tamborim na mão, dirige um coro de mulheres para celebrar a passagem pelo Mar Vermelho; o mesmo rito será dançado na vitória de Jefté (Juízes, XI, 34), na de Davi sobre Golias (I Samuel, XVIII, 6-7), na Judith sobre Holoferno (Judith, XV, 12-13). As rodas são evocadas no Êxodo, XXXII, quando, ao descer do Sinai, Moisés encontra seu povo dançando em torno do Bezerro de Ouro e, de forma mais ortodoxa, nos Salmos (XXVI, 6): “Javé, ando em roda em torno de teu altar”. As “jovens de Silo" dançam em roda nos vinhedos, sem dúvida durante a festa dos Tabernáculos, quando os homens de Benjamin vêm raptá-las (Juízes, XXI, 19-23). (BOURCIER, 2001, p. 18)

Chama a atenção também observar a caracterização da famosa

dança de Davi, onde esteve quase nu diante do Arco, ao voltar a Jerusalém (II

Samuel, VI), por passos considerados extremamente técnicos que são os giros

- mekarkêr - e os saltos - mepazzez - (BOURCIER, 2001). Tais movimentos

podem ser caracterizados como movimentos voluntários que “supõe-se que

houve uma intenção, um desejo ou uma necessidade e finalmente o

desenvolvimento do movimento” (OLIVEIRA, 2014, p. 24). Estes movimentos,

mesmo inicialmente voluntários, dependendo do treinamento, da prática e da

repetição pode ser transformado em movimentos automáticos (OLIVEIRA,

2014).

Os automatismos tanto podem ser mentais quanto motores e até sociais como, por exemplo, a cortesia, o cavalheirismo, a cooperação, etc. A observação, a retenção mnemônica, a leitura rápida, a indução etc. constituem exemplos de hábitos mentais. A eficiente realização de atividades dessa natureza depende de um bom desenvolvimento dos hábitos, das habilidades mentais e motoras; através da experiência e do treino, o rendimento, em tempo e em qualidade, sem mesmo necessitar concentrar a sua atenção para executá-los (CAMPOS, 1973, p. 55 apud OLIVEIRA, 2014, p. 25).

Com o progresso do Cristianismo no Ocidente, a dança

desenvolveu-se também como manifestação popular através das danças

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folclóricas. Essas representavam períodos e etapas do desenvolvimento

socioeconômico, com seus usos e costumes (NANNI, 1998). Com o

crescimento da sociedade, o cerimonial diversifica e torna-se artístico (PASI,

1991).

Os gregos deram destaque à dança desde os primórdios da

civilização, em mitos, lendas, cerimônias, literatura e também como matéria

obrigatória para o cidadão (PORTINARI, 1989). De acordo com Bourcier (2001,

pág. 22), para Sócrates em Platão, Leis, VII, “a dança forma o cidadão

completo”, sendo ainda “um exercício que dá proporções corretas ao corpo” e

uma fonte de boa saúde. Esses pensamentos concederam amplo espaço à

dança na educação grega.

Os gregos deram extrema importância à estética, ao corpo humano,

à harmonia, à busca por novos conhecimentos etc. (BOURCIER, 2001;

PORTINARI, 1989). Segundo Pereira (2017), Platão (428/427 - 348/347 a.C)

ainda que tenha ressaltado a dimensão espiritual e tratado o corpo como o

aprisionamento da alma, estabeleceu que o primeiro possuía três dimensões: o

corpo racional, o irracional e o dos apetites. E posteriormente, Aristóteles (384-

322 a.C.) situou “o corpo como algo individual, real, limitado por uma superfície,

em movimento e, dessa forma, possuidor do poder de interferir, de

transformar”, embora tenha sido Hipócrates (460-377 a.C.) que atribuiu ao

corpo qualidades como o frio, úmido, quente e seco, o situando com relação ao

seu entorno e a sua harmonia com a natureza (PEREIRA, 2017, p. 16).

Estas valorizações, não com a dança especificamente, mas com a

consciência de si alcançadas pelos gregos, foram rompidas pelos romanos que

valorizaram mais espetáculos de forças e lutas gladiadoras. “Só o louco e o

bêbado são capazes de dançar” assim se manifestou Cícero apesar de a

dança já ter sido implantada em Roma antes da sua reprovação (PORTINARI,

1989, pág. 36). No período dos Reis, Roma obtinha danças de origem agrária

pelos etruscos; e salianos consistiam de danças guerreiras (BOURCIER,

2001). Também de acordo com Bourcier (2001) no período da República as

origens religiosas das danças foram abandonadas, estadistas como Cipião

Emiliano fechou escolas gregas onde ensinavam as danças às crianças. Foi

apenas durante o Império que a dança volta a ser praticada por mulheres de

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alta classe, mesmo período em que a pantomima dançada foi bastante

apreciada, antes de se tornar grosseira e a mímica assumir maior importância.

Embora nesse período as preferências tenham se modificado, foi percebido

que o ser humano é um ser em movimento e expressar-se faz parte da sua

necessidade de comunicação e enquanto dança, a necessidade de expor

aquilo que o move. Entretanto, a divisão entre o teatro e a dança iniciou

quando a racionalidade romana passou a acreditar que a dança não era

racional, mas um resultado de um corpo em estado de catarse, enquanto o

teatro era dependente da palavra, sendo assim, o veículo principal do

pensamento (PAVIS, 1999).

Durante a Idade Média, a terra foi sinônimo de poder e disputa por

meio de batalhas, onde o comportamento moral, interpessoal e familiar foi

fortemente influenciado pelo clero assim como na maneira de pensar e vestir

(DAMBROS; CORTE; JAEGER, 2008). O clero proibiu bailes e danças

consideradas profanas, deteu a supremacia absoluta do pensamento. A dança

foi por muito tempo afastada do caucionamento das hierarquias sociais até o

surgimento do Renascimento, no qual a censura religiosa se atenuou (NANNI,

1998).

De acordo com Dambros, Corte e Jaeger (2008), apesar de ter sido

um período rico às artes sacras, não só a dança de cunho popular sofreu com

a estagnação ou o repúdio de uma visão profana sobre o corpo durante o

período da idade média, mas a ciência, mais especificamente a anatomia,

também sofreu com esse pensamento.

Segundo RODRIGUES (1999), a abertura do corpo humano e a dissecação de cadáveres, para a mentalidade medieval, era uma ação inconcebível, um gesto do mais supremo sacrilégio e por este motivo, conforme nos mostra PEREIRA (1988), a anatomia passa por um período de estagnação – representando um período negativo para a Educação Física – tendo seus estudos retomados com a chegada do Renascimento. O corpo jamais poderia ser considerado como objeto; para os medievais, a putrefação era continuidade da vida, era húmus. Existiam valas coletivas que ficavam abertas até serem preenchidas por corpos e era comum tê-los em putrefação em casa. Há imagens da época que retratam homens dançando com cadáveres que se desfaziam. (DAMBROS; CORTE; JAEGER, 2008, on-line)

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Embora a idade média seja um período contestado, Franco Junior

(2001) aponta esse período como a matriz da civilização ocidental cristã. Com

a crise dessa civilização, passou a ser almejado uma mudança que mais tarde

foi significativa à população modernista. O mesmo autor destaca quatro

movimentos inauguradores da Modernidade sendo eles medievais: o

Renascimento, o Protestantismo, os descobrimentos e a centralização. Esses

movimentos enriqueceram direta e indiretamente a história da dança no

ocidente para dar início ao que é conhecido hoje como balé clássico.

Com as acentuadas transformações sociais, políticas e econômicas ocorridas a partir do século XI, foi quebrada a clara predominância desfrutada pela cultura clerical na fase anterior. A cultura vulgar ressurgia com força. Em conseqüência, a cultura intermediária passou a marcar presença em quase todos os campos. A cultura erudita viu, assim, reduzidas suas áreas de exclusividade, mas com isso pôde concentrar forças e em certos setores atingir seu apogeu. O movimento conhecido por Renascimento do século XII ilustra bem esse fenômeno: ele significou a recuperação e revalorização da cultura greco-latina, mas também, ao mesmo tempo, a reemergência de uma cultura folclórica muitas vezes pré-romana. Quer dizer, ao contrário do que esse rótulo historiográfico parece insinuar e do que indica o estudo pioneiro a respeito, o Renascimento do século XII não é globalmente expressão da cultura erudita, e sim da cultura intermediária. (FRANCO JUNIOR; 2001, p. 148)

Entre os séculos XIV e XV, a França passou por uma estagnação à

evolução cultural devido a Guerra dos Cem anos, enquanto isso a Itália

renascia com o Quattrocento. Segundo Rosa (2012) no início do Quattrocento

apenas uma de cada vinte pinturas era de cunho pagão, no final do século

essa proporção havia quintuplicado. Afirma também que nesta época o

Vaticano expunha quadros e esculturas que apresentavam nus e divindades

pagãs e que o corpo humano foi admirado pela beleza, harmonia e proporções

que seguiam o modelo grego. Tal contradição, de acordo com Rosa (2012),

teria sido alvo de crítica da Reforma protestante.

Mas foi com a formação de uma sociedade cortesã que surgiram os

grandes Triunfos, que podem ser entendidos como uma reprodução do ritual

praticado pelos imperadores da Roma Antiga com grandes desfiles que

simbolizavam o retorno triunfal dos campos de batalha. Esses cortejos

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gradativamente foram introduzidos nos salões dos senhores renascentistas

onde foi necessário adaptar a proporções menores.

Inspirado no ballo, danças tradicionais italianas dos séculos XV e

XVI, esses pequenos cortejos passaram a ser chamado balleto, uma proporção

menor dessas danças de cunho popular com ritmo medido e melodias em

forma de canção (CAMINADA, 1999). Essa releitura das procissões medievais

foi conveniente à jovem aristocracia que ansiava em legitimar-se embora tenha

precisado conscientizar-se das possibilidades de expressão do corpo humano

e da utilidade das regras para explorá-las, tornando-se uma dança erudita e

metrificada.

A dança erudita desenvolveu-se com a Itália e a França como as

principais influências para o modelo social e artístico europeu entre o fim da

Idade Média e o início do Renascimento. Tais influências como o porte e o

gesto do corpo associado à elegância e às regras de etiqueta afetaram

diretamente as danças da nobreza e posteriormente foram reavivadas na

consolidação do alicerce da futura escola de balé (FERREIRA, 2015).

Leonardo da Vinci (1452-1519) exerceu grande influência na

medicina ocidental retomando o pensamento de Hipócrates definindo os quatro

humores do corpo: o frio, o seco, o quente e o úmido (PEREIRA, 2017). De

acordo com Pereira (2017) Da Vinci em seu Tratado sobre a pintura aponta

razões para a escolha das cores com o intuito de provocar emoções e

sentimentos nos observadores, ao levar em consideração a subjetividade do

corpo através das suas reações internas e as inferências (reações químicas)

do ambiente. Tais colocações afetaram diretamente na transformação que a

dança erudita passara nesta época. A partir desses novos conceitos surgiu a

necessidade de organização e com ela os primeiros tratados de dança que

dramatizados, enriquecidos, aperfeiçoados ficaram conhecidos um século mais

tarde com o nome ballet (CAMINADA, 1999).

De acordo Homans (2012), Leonardo da Vinci não só colaborou na

encenação de “Festa de Paradiso" em 1490 como mais tarde seus escritos

influenciaram mestres de dança como Carlo Blasis na publicação de Traité

élémentaire, Théorique et Pratique de l’Art de la Danse em 1820, como

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também os estudos de Da Vinci levaram Blasis a publicar um ensaio sobre o

próprio Leonardo da Vinci em 1870.

O Renascimento nos séculos XV e XVI, para Franco Junior (2001)

recorreu a modelos culturais clássicos, que a Idade Média também conhecera

e amara. O mesmo autor esclarece que as características básicas do

movimento renascentista (individualismo, racionalismo, empirismo,

neoplatonismo, humanismo) estavam presentes na cultura ocidental pelo

menos desde o princípio do século XII.

De acordo com Dambros, Corte e Jaeger (2008), a redescoberta do

gesto como objeto de pensamento e de reflexão ética foi graças ao

Renascimento Intelectual do século XII. A Antiguidade Clássica reapareceu e

foi celebrada por artistas que puderam expressar o corpo e pelo corpo a beleza

física.

Com as mudanças ocorridas, os mestres de dança tiveram como

função organizar as estruturas da dança tida como improvisada e

desorganizada, transformando-as em uma representação social rigorosamente

coreografada, realizada em pares e em grupos. Dessa forma o balé, assim

como as danças de corte, estava acompanhado de ideologias e estruturas

organizacionais que estabeleciam visual e coreograficamente o cotidiano

gestual desta camada hierárquica (MONTEIRO, 1999).

Para Braz (2012) a reaproximação do corpo com a natureza e com o

conhecimento foi destacado devido o surgimento das academias científicas em

decorrência do progresso da ciência. Com isso, o entendimento de corpo

sofreu mudanças e, consequentemente, tornou-se objeto de estudo para

diferentes pensadores ao longo da história moderna como Pascal, Descartes e

Newton.

Na segunda metade do Renascimento Científico, entre os séculos

XV e XVI, Rosa (2012) afirma que o conhecimento teórico foi descartado,

embora a experimentação e a “matematização” tiveram passado a ser

elementos essenciais na metodologia, ainda nascente, empregada para o

estudo dos fenômenos do mundo físico.

Se Grosseteste e Roger Bacon já haviam enfatizado a aplicação da Matemática para se chegar à verdade exata na experimentação científica, Nicolau de Cusa e Leonardo da

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Vinci seriam seus grandes arautos ao defenderem, em diversos apontamentos, a necessidade de sólida base teórica, de cuidadosa experimentação e do emprego da Matemática no trabalho científico (ROSA, 2012, p. 395).

O pensamento do “corpo máquina” reflete a concepção do corpo na

modernidade e René Descartes (1596-1650) foi um dos principais filósofos a

refletir sobre o corpo como uma máquina. O funcionamento desse corpo é

entendido por Silva (2004 apud BRAZ, 2012) a partir das leis da física

Newtoniana: as leis da mecânica. Pode-se exemplificar novamente citando

Leonardo da Vinci com sua obra “Homem Vitruviano” onde o “corpo é como

uma fórmula matemática: devidamente proporcional, o domínio sobre os

movimentos corporais proporciona-lhe total domínio sobre a natureza” (BRAZ,

2012, on-line).

Durante todo o Renascimento houveram conquistas que marcariam

definitivamente a história. De acordo com Rosa (2012) na segunda fase pode-

se destacar o desenvolvimento da Álgebra e da Trigonometria, uma das

maiores conquistas do Renascimento Científico pois tal ferramenta foi

imprescindível para os avanços notáveis na Astronomia e na Física. A

presença da obra de Nicolau Copérnico (1473-1543) é outro exemplo de

extrema importância para a História da Ciência, uma vez que marca o início de

um processo de constituição de uma nova Astronomia e com o avanço desse

estudo, se pôde reformar o calendário Juliano passando ao Gregoriano. Na

área da Física embora no campo da Estática tenha se limitado ao

conhecimento recebido da Grécia Antiga, durante o século XVI, no campo da

Dinâmica o conceito de impulso assumiu grande importância. A respeito do

conhecimento do corpo humano, Rosa (2012) relata que foi equivocado e com

graves erros até o século XVI, aproximadamente, alegando ser com o

surgimento de André Vesálio (1514-1564) que houve uma revolução no estudo

e na pesquisa da Anatomia humana.

A segunda fase do Renascimento Científico correspondeu ao período de um primeiro verdadeiro avanço no estudo, na pesquisa e no espírito que iriam presidir o desenvolvimento da Anatomia humana. A Itália, berço do extraordinário desenvolvimento da Álgebra e da Mecânica no século XVI, seria, igualmente, o principal centro dos estudos de Medicina, para onde seguiam todos aqueles interessados em estudar

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anatomia. A França e a Alemanha seriam outros centros de referência (ROSA, 2012, p. 460).

Claramente é observado a valorização do corpo na modernidade a

partir do retorno dos ideais humanísticos clássicos da Antiguidade, ainda que o

corpo obtivesse um papel secundário na educação e na formação individual.

Todavia, foi a partir da modernidade, a retomada da sistematização e

organização das atividades corporais (PEREIRA, 2006). A partir desta análise

pode-se compreender o modo como a dança ganhou forma, evoluiu e tornou-

se tão tradicional com essas proporcionalidades dos estudos que ocorriam no

ocidente.

Na França, no ano de 1581, foi criado o Ballet Comique de la Reine

de Balthasar de Beaujoyeux (1500-1587), apresentado no Palácio Bourbon. Foi

Catarina de Médicis quem promoveu a dança como forma de espetáculo,

concebido para comemorar o casamento da irmã, Marguerite de Vaudémont

(HOMANS, 2012). Dessa forma, originou-se o chamado Balé de Corte, estilo

que se propagou pela Europa, surgindo a dança teatral (NANNI, 1998;

PORTINARI, 1989; BOURCIER, 2001). Esse espetáculo se tornou a grande

matriz da dança, com nobres nos papéis de destaque e mestres e bailarinos

nos papéis que exigiam maior aptidão técnica.

O Ballet Comique de la Reine e o surgimento do ballet de cour marcaram assim uma mudança importante relativamente a práticas anteriores: investigaram a dança de um objetivo sério e quase religioso e associaram à vida intelectual e política francesa. Um forte pendor idealista com origem no humanismo renascentista e reforçado pela Contra-Reforma católica levou homens cultos como academistas a pensar que juntando a dança, a música e a poesia num espetáculo coerente poderiam efetivamente começar a colmatar o enorme abismo entre as paixões terrenas e a transcendência espiritual. Era uma ambição assombrosa, e que na verdade nunca desapareceu do ballet, mesmo que em épocas de maior cepticismo fosse por vezes esquecida ou esclarecida. Os artistas que criaram o Ballet Comique de la Reine esperavam sinceramente elevar o homem, fazê-lo subir um degrau na Grande Cadeia do Ser e aproximá-lo dos anjos e de Deus. (HOMANS, 2012, p. 35).

As ideias edificadas no Ballet Comique de la Reine deixaram marcas

que perpetuaram no século XVII, durante a Guerra dos Trinta Anos (1618-

1648) distintos cientistas, poetas e escritores se inspiraram para a criação de

novas obras. O abade Marin Mersenne (1588-1648) escreveu sobre o balé de

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corte, e muitos de seus amigos e colegas, incluindo Descartes, também

analisaram a arte e em alguns casos tentaram compor bailados (HOMANS,

2012). De acordo com Homans (2012), Descartes ofereceu o Ballet de la

Naissance de la Paix à rainha da Suécia em 1649.

Entretanto, o auge do balé clássico foi no reinado de Luís XIV,

grande apreciador e praticante da dança. Foi o rei que transformou sua corte

no centro da cultura europeia. Luís XIV considerava que as grandes montagens

eram um meio vantajoso de propagar seu governo e controlar opiniões,

estreitando as relações entre arte e política. O fato de ter o apoio real fez com

que o balé tivesse um ambiente propício para se desenvolver na França.

(BURKE, 2009)

O interesse de Luís XIV pelo ballet não era apenas um capricho de juventude, era um assunto de Estado. Como ele próprio refletiu mais tarde, estes espetáculos lisonjeavam os cortesãos e conquistavam o coração e espírito do povo, talvez mais intensamente, até, do que dádivas e boas ações (...). (HOMANS; 2012, p. 38)

Embora o século XVII tenha sido marcado por grandes tensões e

conflitos, foi sob essas tensões sociais que ocorreram mudanças que alteraram

profundamente a ordem política, social, cultural, econômica e educacional na

Europa. De acordo com Suchodolski (1978 apud BRAZ, 2012) nesse período, o

“sistema natural” de cultura é imprescindível às relações sociais, políticas,

econômicas e científicas.

Luís XIV investiu energicamente no refinamento e especialização

das formas artísticas. Sua mais famosa representação na dança foi o “Rei Sol”,

do Ballet de la Nuit (1653), considerado uma importante demonstração da força

e do poder do rei. Foi responsável pela sistematização, registro e ensino da

dança no ocidente, criando no ano de 1661 a Academia Real de Dança, sua

primeira criação acadêmica. De acordo com Bourcier (2001), Luís XIV

estabeleceu com a criação desta academia a missão de conservação. Desta

forma, nenhum novo espetáculo de dança poderia ser apresentado sem a

aprovação dos acadêmicos. Entretanto, a Academia Real de Dança não

cumpre sua missão e cessa completamente suas atividades.

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Em 1669 foi fundada na Academia Real de Música, mais tarde

conhecida por Ópera de Paris, a escola oficial de dança. Em 1672, Giovanni

Baptista Lully (1632-1687), bailarino e famoso maestro de dança, assume a

direção da academia sendo responsável por muitos balés apresentados na

corte de Luís XIV, criados ao lado de Pierre Beauchamps (1636-1705), com

colaboração do dramaturgo Molière (1622-1673). A esta escola coube a função

de sistematizar o ensino do balé, sob a orientação de Beauchamps e

colaboração de Louis Pécourt (1651-1729) e Jean Balon (1676-1739).

A partir daí é criada uma estrutura acadêmica designada à formação

de padrões técnicos e notações coreográficas. Coube à escola francesa

“sistematizar o ensino do balé, desenvolvendo um esquema básico e rígido de

posições de cabeça, tronco, braços e pernas, sob orientação de Pierre

Beauchamps” (CAMINADA, 1999, p. 105). Esta escola formalizou, as posições

básicas, que regem o princípio do balé clássico e ainda o nome dos passos em

língua francesa que são utilizados até os dias atuais.

Portinari (1989) afirma que Luís XIV despede-se da cena aos 32

anos, interpretando Netuno e Apolo em Divertissement Royal. Faro (2011)

acrescenta que tendo o rei se afastado da cena, toda a corte segue seu

exemplo, acabando por enfraquecer o balé de corte. Entretanto, as raízes da

dança estavam devidamente plantadas, o apoio e o investimento à academia

que fundara não foi deixado de lado.

O círculo estava, portanto, a fechar-se: o ballet mudara-se da corte para o teatro, da dança social para a dança teatral. (...). O ballet, afinal era um artefato perfeito da cultura aristocrática francesa do século XVII: uma amálgama das regras e praxes da vida na corte, cavalheirismo e etiqueta, códigos de noblesse, lemerveilleux e o espetáculo barroco. Todas estas coisas estavam inscritas nos passos e práticas do ballet. (...). Na medida em que etiqueta sofisticada da corte de Luís XIV buscava a simetria e a ordem, e se inspirava em fortes tendências do pensamento do Renascimento e da Antiguidade, o ballet estava imbuído de uma geometria anatômica e de lógica física distinta também implicações transcendentes. Como arte, era atraída pelos polos poderosos do estilo clássico e barroco. Era uma visão e apologia da nobreza - não como classe social, mas como uma estética e um modo de vida. (HOMANS, 2012, p. 75)

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Preparadas por Beauchamps na Academia Real, uma primeira

geração de bailarinos iria surgir no palco, preconizando o estilo da Ópera de

Paris. Após a morte do rei que transformara toda uma história, 1715, o gênero

do balé de corte entrou em declínio (PORTINARI, 1989) embora o balé clássico

já houvesse difundido por diferentes cidades da Europa (HOMANS, 2012).

A idade moderna, que se iniciara em 1453 e se encerra em 1789 com a Revolução Francesa, marcou a transição da dança de diversão aristocrática para uma forma teatral. Dos trionfi renascentistas ao apogeu do ballet de corte com Luís XIV, ela se diversifica e recebe normas. Os mestres já não se limitam a ensinar à nobreza. Lecionam em academias abertas a alunos das mais diferentes origens sociais. O apuro técnico que lhes é exigido assinala a alvorada do profissionalismo. (PORTINARI, 1989, p. 69)

O que marca o século XVIII, na Europa, foram, novamente, grandes

transformações na história do ocidente, o período do Iluminismo. Dentre as

transformações, deve-se destacar o início da Revolução Industrial em 1750 e a

Revolução Francesa em 1789. Enquanto o balé se transformou símbolo da

decadência e do declínio após a morte de Luís XIV, o “Século das Luzes” para

os mestres de balé e bailarinos foi sinônimo de reestruturação da sua arte. Os

reformadores da dança colocaram à prática a dança à imagem do próprio

homem (HOMANS, 2012).

Por detrás das grandes mudanças, como o número de balés

apresentados em teatros públicos e a profissionalização do bailarino, houve

uma necessidade de ocupação de novos espaços. A produção artística e

intelectual sai da corte de Versalles para um público cada vez mais amplo em

Paris (MONTEIRO, 2006). Em conformidade com Monteiro (2006), a

descentralização se deu em dois sentidos, o primeiro pela diminuição da

influência da corte sobre a produção artística e o segundo pela diversificação

dos centros de criação de dança fora do eixo franco-italiano na Europa. Com

tais mudanças mudou-se as possibilidades de trabalho aos bailarinos

profissionais e mestres de dança que dependeram cada vez menos da

monarquia para exercerem seu trabalho.

Em 1760, Jean Georges Noverre (1727-1810), em seu livro Lettres

sur La Danse et sur les Ballets, registrou conselhos práticos, reflexões teóricas,

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descrição de suas montagens e comentários opinativos. Os escritos foram

reeditados e lidos em várias cidades da Europa, desde Paris a São

Petersburgo. Conhecido não só pelos escritos, Noverre compôs cerca de

oitenta balés e vinte e quatro ópera-ballets, além de eventos, festivais e obras

encenadas em cidades e cortes europeias (HOMANS, 2012). Em meio às

críticas aos balés de sua época propôs um gênero novo capaz de utilizar da

expressão, incorporar a pantomima, dando significados e emoção, ao contrário

da chamada "dança mecânica" (MONTEIRO, 2006). A concepção de um balé

como imitação da natureza e o diálogo entre o compositor e o poeta foram

questões anteriores a Noverre. Sobre isso Homans (2012) escreve que:

Algo tinha acontecido: no final do século XVIII, o ballet clássico - que outrora fora uma arte respeitada e até venerada, imbuída do prestígio da monarquia e do grand siècle - parecia vazio e sem sentido, um tipo de dança em que poucos acreditavam e muitos rejeitavam categoricamente. Foi neste contexto que Noverre escreveu as suas Lettres. Ele queria reorientar o ballet: desviá-lo de uma aristocracia fútil e hedonista e direcioná-lo para a tragédia, os dilemas morais e o estudo do homem. (...). O ballet devia tornar-se um retrato da humanidade, que adoptasse o ser humano e a verdade como tema. (...). (HOMANS, 2012, p. 103)

Sobre as significativas mudanças que ocorreram, Misi (2004) declara

que Noverre parecia anunciar a grande transformação da sociedade que a

Revolução Francesa e os ideais Iluministas sopravam naqueles anos. Passo a

passo, a dança trocou os sapatos de salto por sapatos baixos e flexíveis,

passou a utilizar figurinos mais leves e, finalmente, abandonou as máscaras, o

que deu início ao trabalho da expressividade na interpretação do bailarino.

Monteiro (2006) após as mais variadas peculiaridades apresentada a

respeito da teoria e história do Balé de Ação encerra o capítulo com o seguinte

parágrafo:

Noverre fala em ação, em expressão fisionômica, em energia, em verdade dos gestos; entendia tudo isso a partir da música, que é vista como uma espécie de texto que a dança deve interpretar. A consciência de que os destinos da dança ligavam-se estreitamente aos da música levou Noverre a tematizar as relações entre elas, dando sequência a preocupações que, de alguma forma, já haviam sido no balé Os Caracteres da Dança. (MONTEIRO, 2006, p. 69)

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Para chegar a um resultado significativo foi visto muitos e diferentes

questionamentos para uma harmonização artística no Balé de Ação. Os

pensamentos de Rameau, Rousseau, Diderot e Noverre foram muito

expressivas, além de outros, para a renovação da dança durante o século. Mas

o que deve ser notado é novamente o corpo como fator predominante no

interesse aos reformadores.

O domínio e controle extremo do corpo são mais necessárias que nunca. A natureza emerge trabalhada, cultivada. A máscara cai, o corpo se mostra, porém, acima de tudo, domado, isento de reações, a não ser previstas para serem mostradas. O grande exemplo é dado pelas bailarinas, que, ao contrário dos seus companheiros, são mestras em disfarçar o esforço físico, pondo a expressão fisionômica a serviço exclusivamente da expressão espiritual. O exercício, segundo Noverre, livrou-as dos tiques, das contorções e das caretas. Mesmo nos momentos de grande esforço físico, conseguem manter a fisionomia terna, voluptuosa, viva e animada. (MONTEIRO, 2006, p. 143)

Como foi visto, a partir de então o controle do corpo e o domínio

técnico em prol da expressão máxima dos sentimentos e emoções foram cada

vez mais solicitados. Ao ser lido as quinze cartas de Noverre pode-se certificar

que este era um grande estudioso e a par de diferentes assuntos e

descobertas de sua época. Em especial, a carta de número doze traz

significativas abordagens anátomo-fisiológicas para colocações do corpo e

execução de movimentos de acordo com as descobertas até àquele século.

Com a Europa Iluminista tomada pela Revolução Industrial houve a

exacerbação de um imaginário onde prevalecia a ideia de um mundo ideal.

Diante dessa transformação surge o período do bailado Romântico, que ia de

encontro à expressão dos sentimentos, inspirados nos contos de amor, no qual

a mulher assume o papel principal (PORTINARI, 1989).

O Romantismo foi vigorosamente influenciado pelos ideais de

liberdade, igualdade e fraternidade da Revolução Francesa e do Iluminismo,

anunciado previamente no final do século XVIII por Rousseau e Chateaubriand

no século XIX. Neste período, o homem passou a ser o objeto central das

temáticas artísticas. As danças regionais apareceram no balé e se tornaram

parte da tradição dessa dança, com passos folclóricos revelaram um estilo

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mais popular para a época. A valsa despontou primeiro nos bailes e depois nos

balés, tendo grande importância na transição da dança para o século XIX como

um símbolo do romantismo.

La Sylphide, com música de Jean Schneitzhoeffer e coreografia de

Filippo Taglioni, estreou na Ópera de Paris em 1832, e Giselle, com música de

Adolphe Adam e coreografia de Jean Coralli e Jules Perrot, foi apresentado

pela primeira vez em Paris no Theatre de l'Académie Royale de Musique em

1841, ambos são marcos importantes na história do balé e, consequentemente,

do romantismo. Foi nessa época que surgiu a dança nas pontas, as saias

bufantes chamadas de tutu, o desejo de criar uma ilusão de leveza e falta de

esforço e a associação da bailarina como criaturas de fantasia, como ninfas e

fadas. Foi no balé romântico que se consolidou a ideia das primeiras bailarinas

e grandes nomes aparecem: Marie Taglioni (1804-1884), Fanny Elssler (1810-

1884) e Carlota Grisi (1819-1899).

La Sylphide abrangeu todos os componentes do romantismo. Foi

neste balé que Marie Taglioni alcançou verdadeiro sucesso, dançou todo o

espetáculo sobre as pontas, habilidade que se tornou obrigatória e o próprio

símbolo de uma bailarina. É importante notar que neste balé se encontra o

predomínio da figura feminina, da delicadeza e do inatingível. A execução de

passos complexos, sobretudo saltos, foram realizados por mulheres.

A sapatilha de ponta foi o elemento que permitiu a ilusão da

imaterialidade, personificando o ideal romântico. Mas contrário do que se

pensa, a “ponta” surgiu de um estilo estritamente acrobático e sensacionalista

das tradições italianas e atribuído a Amalia Brugnoli (1802-1892). Dessa forma,

o trabalho de ponta tão caracterizado como poético, se deu a partir de

movimentos acrobáticos executados por bailarinas italianas e transformado por

Taglioni, e outras, em ações mais elegantes e refinados (HOMANS, 2012).

Este grande feito só foi possível devido a exercícios e treinamentos

repetidos organizados por Filippo Taglioni que adequava poses e posições de

Marie Taglioni de acordo com as linhas e proporções das estátuas gregas

(HOMANS, 2012). A partir da técnica recém-criada, Marie Taglioni teria

driblado suas limitações físicas, que para Homans (2012) eram de proporções

estranhas, alterando habilidosamente o seu equilíbrio e o alinhamento dos

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membros disfarçando, assim, as imperfeições. Não só Taglioni foi enriquecida

através de um trabalho físico e eficaz seguindo minuciosos estudos que a

trouxeram força e resistência, Vestris e os bailarinos de Paris no começo do

século XIX também desenvolveram um programa de exercícios que deixaram

seus corpos igualmente musculosos e fortes. Resultados excepcionais e

semelhantes, porém, com objetivos bastante distintos, Vestris apostou

abertamente nas acrobacias e piruetas e uma técnica estritamente masculina

enquanto Taglioni investiu na feminilidade e graciosidade, concentrando nas

linhas e nas formas, combinando a força com a elegância discreta de uma

senhora (HOMANS, 2012).

Giselle foi a obra-prima do balé romântico pois reuniu grandes

profissionais de cada setor, desde os intérpretes, passando por cenógrafo,

iluminador, compositor e um grande destaque foi que, pela primeira vez, no

segundo ato, todas as bailarinas dançaram sobre as “pontas dos pés”. Carlota

Grisi foi Giselle, para quem o papel foi criado, nove anos antes, na estreia de

La Sylphide, apenas a solista fizera tal feito.

Um ano depois de sua estreia, em 1842, Giselle estreou em São

Petersburgo, com a versão de Antoine Titus (1780-1860). A coreografia que foi

remanejada teve suas primeiras modificações feitas por Jules Perrot em 1848

quando chegou à Rússia. Posteriormente, 1887, Arthur Saint-Léon (1821-1870)

e Marius Petipa (1818-1910) elaboraram uma versão de Giselle que se tornou

a mais conhecida no Ocidente.

Na trajetória da dança, ainda no fim do século XVIII, a Rússia

começava sua trajetória para se tornar uma potência do balé clássico, a partir

da contratação de Filippo Beccari em Moscou e de Jean-Baptiste Landé (? -

1748) em São Petersburgo. Com o investimento dos Czares e com

funcionamento em regime de internato com curso de dez anos de duração, a

Escola Imperial formou bailarinos que, desde meados do século XVIII, fizeram

a reputação desses teatros construídos de acordo com o gosto da aristocracia.

O que se denomina escola russa, foi moldado ao longo de gerações.

Mestres como Le Picq, Diderot, Perrot, Saint-Léon, Christian Johansson,

Marius Petipa, Enrico Cecchetti e russos como Lev Ivanov, estabeleceram uma

tradição pedagógica que, em 1934, foi ampliada por Agrippina Vaganova

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(PORTINARI, 1989). Todo o investimento dos governantes e os mestres que

trabalharam na Rússia colaboraram para que a bailarina russa, formada pela

Escola do Teatro Imperial, pudesse desenvolver uma nova metodologia de

ensino da técnica do balé clássico. Segundo Caminada (1999), Vaganova

recebeu aprovação e o conhecimento internacional de dança, como o mais

perfeito método de ensino, um dos fatores incontestáveis da excelência do

bailarino russo e da qualidade de performance da companhia apontada como a

mais perfeita dentro do balé de estilo acadêmico: o Balé Kirov.

A apropriação dessa cultura que se desenvolveu na Europa atingiu a

excelência com Agrippina Vaganova, que ergueu um método por meio da fusão

dos elementos do método francês e do método italiano de balé, onde encontrou

conceitos efetivos para o ensino do balé clássico.

Paralelamente ao final do século XVIII, correntes teóricas ventricular

e tecidual permaneciam lado a lado, e só o desenvolvimento da ciência

moderna veio comprovar o acerto da segunda teoria. A localização das funções

mentais no cérebro se deu desde o século IV, pela doutrina ventricular que

defendeu a localização das funções mentais em três câmaras no centro do

cérebro. Sendo assim foram atribuídos aos ventrículos cerebrais as funções

superiores.

Posteriormente, para Andreas Vesalius (1514-1564) a função dos

ventrículos era de conduzir nutrientes às partes mais profundas do cérebro

através de vasos sanguíneos (HERCULANO-HOUZEL, 2008). Quanto à

localização das funções mentais superiores, devido às limitações dos estudos

anatômicos, Vesalius não chegou a formar sua própria teoria a respeito do

tema.

Leonardo da Vinci (1472-1519) foi o precursor de uma concepção

mais realista da estrutura dos ventrículos. De acordo com Herculano-Houzel

(2008), Da Vinci injetou cera líquida nos ventrículos de um cérebro bovino e ao

remover o tecido, após a cera endurecer, revelou uma estrutura ventricular

diferente das representações conhecidas até então. Porém, Da Vinci não

desprezou a teoria ventricular, mas adaptou-a a desenhos anatomicamente

corretos.

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Por outro lado, René Descartes (1596-1650) acreditava que os

fluidos, ou espíritos animais, circulavam pelo cérebro, através de tubos

nervosos. Tais fluidos levariam uma imagem visual até o local do cérebro no

qual entrariam em contato com a res cogitans, imaterial, que na verdade seria a

glândula pineal (HERCULANO-HOUZEL, 2008).

Os estudos sobre o funcionamento do cérebro, durante esta época,

despertam um questionamento: de que forma os estudos e,

consequentemente, as mudanças de comportamento, poderiam estar

influenciando artistas a criarem obras tão significativas para a história?

É necessário destacar que o balé Giselle é composto por linguagens

híbridas, ou seja, há um diálogo sincrônico entre diferentes linguagens

artísticas: dança, música, figurino, iluminação, cenário, libreto. O último, libreto,

é do escritor, poeta, dramaturgo, jornalista e crítico literário francês Théophile

Gautier (1811 - 1872), em colaboração com o dramaturgo Saint-Georges. A

cena do enlouquecimento de Giselle é uma das cenas de maior expressão

dramática e muito marcante ao espectador. O que pode ser destacado aqui é

que Giselle é um balé que mexe com o imaginário, com o emocional; aborda a

superstição (lenda das Willis), a loucura, o suicídio e a memória da

personagem ao reportar a um sonho e a memória do próprio espectador que se

recorda de um dos trechos importantes da história ao apreciar repetições de

movimentos da bailarina, que Beaumont (1988) chama de leitmotiv

coreográfico, se tornando uma tradução da passagem entre os “dois mundos”

(PEREIRA, 2004).

Para Herculano-Houzel (2008) apenas no século XIX, com Franz

Gall (1758-1828), houve o nascimento da neurociência com a associação da

cognição ao córtex cerebral. Ou seja, com o rompimento da doutrina

ventricular.

Para a história da neurociência, Thomas Willis (1621-1675),

escreveu um dos livros mais importante, o Cerebri anatomie (1664). Nele,

sugeriu que os ventrículos eram uma espécie de resultado acidental das

dobras do cérebro, entretanto ainda sim atribuía-lhes a função de formação e

circulação dos espíritos animais (HERCULANO-HOUZEL, 2008). Para Willis,

as funções mentais da memória e da tomada de decisão seriam controladas

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pelos giros cerebrais, não pelos ventrículos. Assim como a percepção estaria

situada no corpo estriado, na porção basal e frontal do cérebro; a imaginação

no corpo caloso; e a memória no córtex.

Já para Franz Gall (1758-1828) o córtex cerebral era na verdade

uma série de regiões com funções distintas. Inicialmente pressupôs 27

faculdades afetivas e intelectuais, posteriormente J. G. Spurzheim (1776-1832)

acrescentou e passaram para 35 faculdades afetivas e intelectuais

(HERCULANO-HOUZEL, 2008).

Para Pereira (2017), quando Gall e Spurzheim afirmaram que o

cérebro era organizado em 35 regiões com funções específicas, variando de

funções cognitivas básicas até as mais complexas, constataram que quanto

mais se usasse uma determinada função, o cérebro cresceria na área

solicitada, deixando marcas no crânio. Embora não tenham feito experimentos

para testar suas afirmativas, criaram a chamada técnica de "personologia

anatômica", capaz de identificar traços da personalidade do sujeito seguindo as

marcas no crânio.

No início do século XIX, Pierre Gratiolet (1814-1865) e François

Leuret (1797-1851) denominaram que diferentes funções mentais eram

correspondentes a diferentes porções do córtex (HERCULANO-HOUZEL,

2008). Mas de acordo com Pereira (2018), as ideias localizacionistas não foram

aceitas por Pierre Flourens (1794-1867), principalmente no que dizia a respeito

a funções como a linguagem e a memória humana. De acordo com a mesma

autora em experimentos com pássaros, Flourens concluiu que “todo o cérebro

participa no comportamento” (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006, p. 21 apud

PEREIRA, 2017, p. 29), acrescentando ainda que para ele o cérebro era um

"campo agregado".

Mas Paul Broca (1832-1880) causou uma verdadeira revolução ao

declarar que a linguagem tinha uma localização precisa no córtex cerebral

humano.

Com o tempo foram sendo criados métodos de imagem para que fosse possível fotografar o encéfalo vivo e não somente morto. Além disso, os métodos microscópicos também ganharam espaço com Korbinian Brodmann (1868-1918) com o intuito de identificar diferentes organizações celulares no

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córtex, posteriormente denominadas de "citoarquitetura" (PEREIRA, 2017, p. 29)

Com o decorrer das descobertas foram sendo criados métodos de

imagem no qual era possível obter imagens de um encéfalo vivo. Além do

mais, os métodos microscópicos ganharam espaço também com Korbinian

Brodmann (1868-1918) para a identificação de organizações celulares distintas

no córtex, denominadas como "citoarquitetura", posteriormente.

Segundo Pereira (2017) havia uma disputa entre os neurocientistas

Camillo Golgi (1843-1926) e o Santiago Ramón y Cajal (1852-1934). De acordo

com ela, Golgi havia desenvolvido uma coloração - “reação negra"- que

penetrava nos neurônios permitindo a visualização completa de uma única

célula nervosa. Apesar disso, Golgi teria acreditado que o encéfalo era um

sincício, um conjunto de células que se fundiram, tendo um único citoplasma

com vários núcleos. Em oposição, Ramón y Cajal defendeu a natureza unitária

do neurônio, expondo a ideia da transmissão de informação elétrica entre esse

tipo de célula (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006 apud PEREIRA, 2017).

Entre tantos estudos Brodmann que propôs um dos mapas

citoarquitetônicos com 52 áreas anatomicamente distintas no cérebro,

correspondentes a áreas funcionais. Gustav Fritsch (1838-1927) e Eduardo

Hitzig (1838-1907) demonstraram a localização funcional dos movimentos e

Harvey Cushing (1869-1939) apontou que a estimulação da zona parietal do

cérebro trazia sensações táteis (HERCULANO-HOUZEL, 2008).

Caminhando ao século XX, uma referência para a arte foi o teórico

das artes dramáticas François Delsarte (1811-1871).

O descobridor dos princípios fundamentais da dança moderna é um cantor semifracassado que, justamente em virtude de seu fracasso, concentrou sua reflexão e suas experiências nas relações entre a alma e o corpo, mais exatamente nos mecanismos pelos quais o corpo traduz os estados sensíveis interiores: François Delsarte. (BOURCIER, 2001, p. 243)

Bourcier (2001) afirma que Delsarte teria considerado os métodos de

ensino utilizados por seus mestres, arbitrários devido a falta da observação e

reflexão sobre o aluno. Publicou uma importante coleção a respeito do canto -

Archives du chant - enquanto estudava pessoas a fim de estabelecer um

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catálogo de gestos que correspondiam aos estados emocionais. Após

frequentar asilos psiquiátricos, hospitais, anfiteatro de dissecação e necrotérios

para examinar exageros patológicos constatou que, de modo geral, a morte se

anunciava pela contração muscular do dedo polegar ao se apertar contra a

mão. E, recorrentemente, “constata que há uma emoção, a uma imagem

cerebral, corresponde um movimento ou, ao menos, uma tentativa de

movimento” (BOURCIER, 2001, p. 244).

Bourcier (2001) declara que as consequências das ideias de

Delsarte sobre a dança foram imediatas. Destacando, na página 245, que:

● “todo corpo é mobilizado para a expressão, principalmente o

torso, que todos os dançarinos modernos de todas as tendências consideram a

fonte é o motor do gesto;”

● “a expressão é obtida pela contração e pelo relaxamento dos

músculos: tension - release serão as palavras-chave do método de Martha

Graham.”

● “a extensão do corpo está ligada ao sentimento de

autorrealização; o sentimento de anulação se traduz por um dobrar do corpo;

estas posições reforçam os sentimentos que traduzem. Todos os sentimentos

têm sua própria tradução corporal. O gesto os reforça e, por sua vez, eles

reforçam o gesto.”

O sistema delsartismo foi exposto por Alfred Giraudet em 1895 com

Physionomie et Gestes - Méthode pratique d’après le système de François

Delsarte em Paris pois Delsarte teria ensinado apenas de forma oral o método

que criara (BOURCIER, 2001). O delsartismo teve uma forte influência na

dança moderna dos Estados Unidos, a transmissão se deu por Henriette

Crane, que trabalhou com o filho de Delsarte em Paris e formou alunos nos

EUA e uma delas, Mary Perring King que teria ensinado à Ted Shawn (1891-

1972) que conheceu Crane e a pediu para ministrar aulas na Denishawnschool.

Ruth Saint-Denis (1879-1968) teria apreendido com sua mãe que, por sua vez,

teria aprendido com Pote, aluna de MacKay (BOURCIER, 2001).

Outra discípula, Geneviève Stebbins teria ensinado à Isadora

Duncan. Esta última teria sido a responsável por importar o delsartismo para a

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Alemanha em sua turnê a Berlim em 1902. Dessa forma, Rudolf von Laban

teria integrado alguns princípios delsartianos em seu próprio sistema de ensino

(BOURCIER, 2001).

Com a influência do Impressionismo, surgiu a dança moderna, que

buscou a essência expressiva do homem. Na América do Norte, Isadora

Duncan (1877-1927) renovou ao dançar com movimentos inspirados pela

contemplação da natureza, se opondo a utilização de qualquer técnica de balé,

inspirando-se na cultura e na filosofia grega (FAZENDA, 2012). Na Europa,

Jacques Dalcroze (1865-1950), ao analisar o movimento em função do senso

rítmico, encontrou os princípios descobertos por Denishawn: tensão-

relaxamento, contração-descontração, a partir daí observou que a economia de

forças musculares não afetava o processo mental, mas suprimia os

movimentos parasitas e tornava o gesto mais eficaz e significante. Com isso,

Dalcroze criou uma educação psicomotora com base na repetição de ritmos,

criadora de reflexos, na progressão da complexidade e da sobreposição de

ritmos, na decifração corporal, na sucessão do movimento (BOURCIER, 2001).

Rudolf Laban (1879-1958) interessado pelo movimento e pelo corpo em geral

expandiu o seu trabalho para várias dimensões. Sobre os estudos cinéticos.

Bourcier (2001) diz que:

Os estudos cinéticos de Laban abrem-se para uma teoria geral do movimento, que é a da modern dance: seus movimentos “centrífugos” e “centrípetos”, seu movimento “contínuo em forma de 8”, a noção de dinamismo captada pela tomada de consciência do peso são uma formulação metódica dos princípios utilizados por Humphrey e Graham. Para Laban, como diz de forma excelente Roger Garaudy (Danser savie), “ritmo, por si mesmo, é uma linguagem particular que pode veicular um significado sem recorrer às palavras”. (BOURCIER, 2001, p. 295)

Enquanto isso, segundo Pereira (2017), a primeira metade do século

XX foi marcada por confusões, dúvidas e contradições nas pesquisas em

neurociência: "pesquisadores de diferentes campos passaram a professar a

autonomia absoluta de suas especialidades, separando a psique de suas

bases biológicas. (...) Neurobiólogos reduziram tudo ao cérebro, separando-o

do corpo" (RIBEIRO, 2015, p. 137 apud PEREIRA, 2017, p. 29-30).

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Conforme colocado por esta mesma autora, um dado importante

para esta mesma época foi que nesse período Charles Sherrington (1857-

1932) teria reafirmado o neurônio como unitário e criado o termo "sinapse" para

denominar a junção existente entre dois neurônios como também a ideia

marcante “de que o todo é diferente da soma das partes, por não fazer sentido

querer compreender o todo apenas dissecando e isolando as partes, pois o

todo é vivo, dinâmico e com relações, mostrando assim o limite em estudar, por

exemplo, um órgão sozinho” (PEREIRA, 2017, p. 30). Tais ideias teriam

motivado Constantin von Monakow (1853-1930) a desenvolver o conceito da

"diásquise", que reafirmava que um dano em uma região do encéfalo pode

interferir em outras. Do mesmo modo, Henry Head (1861-1940) teria anunciado

que o encéfalo é um sistema dinâmico, interconectado e mutante,

acrescentando que um sistema lesionado não seria mais o mesmo, mas um

novo sistema, com outras combinações, necessidades e estratégias

(GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006 apud PEREIRA, 2017).

No final dos anos de 1940, Walter Hess (1881-1973) criticou a noção de “centro” nervoso e propôs que as diferentes atividades dependem de uma “organização” cerebral. Atividades mais complexas recrutariam, proporcionalmente, um maior número de estruturas, que intervêm no processo. Na mesma época, a partir dos estudos de James Papez (1883-1958) e Paul MacLean (1913-), evoluía o conceito de “sistema límbico”, um conjunto de estruturas cerebrais interconectadas, que se revelava importante para o processamento das funções emocionais e sua integração com a vida de relação. Nos anos 1950 o neurocirurgião William Scoville (1906-1984) publicou o caso de um paciente – amplamente conhecido na literatura neuropsicológica como paciente “H.M.” – submetido à remoção bilateral do hipocampo e das amígdalas para tratamento de um grave quadro epiléptico e que, após a cirurgia, desenvolveu uma incapacidade maciça de aprender novas informações. Ficava claro que processos mentais importantes, como a aprendizagem e a memória, dependiam da integridade de centros nervosos específicos e suas conexões. (COSENZA; FUENTES; MALLOY-DINIZ, 2008, p. 18)

De acordo com Cosenza, Fuentes e Malloy-Diniz (2008), no começo

do século XX, pesquisadores experimentais, como Karl Lashley, publicaram

dados desanimadores sobre a possível localização de funções, como a

memória, em regiões cerebrais circunscritas. Entretanto, surgiram evidências e

teorizações que deram corpo à neuropsicologia que atualmente se conhece.

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Para tais evidências e teorias, no final dos anos de 1940, Walter

Hess (1881-1973) teria criticado a noção de “centro” nervoso e proposto que

diferentes atividades dependem de uma “organização” cerebral. Sendo assim,

atividades mais complexas “recrutariam, proporcionalmente, um maior número

de estruturas, que intervêm no processo” (COSENZA; FUENTES; MALLOY-

DINIZ, 2008, p. 18).

A partir dos anos de 1970, o modelo input-output, segundo Santos

(2012), da vertente cibernética de modelo computacional foi abandonada,

motivo que fez surgir uma segunda corrente cognitivista, denominada

“conexionismo” de Von Foerster, baseada em conceitos de auto-organização e

emergência, a partir de “redes neurais”. A partir de 1990, a “década do cérebro”

foi visto que:

(...). Alguns avanços tecnológicos foram conquistados como: as técnicas de neuroimagem estrutural e funcional, através da ressonância magnética, da tomografia computadorizada, da tomografia por emissão de pósitrons (PET) e da tomografia por emissão de fótons (SPECT) - que tornaram possível observar o cérebro em pleno funcionamento. Desse modo, estas teorias sobre o funcionamento cerebral saíram do meio acadêmico para revistas de ampla circulação, dando enfoque não somente a descoberta dos mecanismos pelos quais a mente funciona, mas aos usos de tal descoberta no tratamento de doenças mentais, na compreensão do desenvolvimento infantil, na prevenção de problemas da velhice, na promoção da inteligência, nas artes e de outras faculdades mentais. Diversas publicações viraram best-sellers, a exemplo de O erro de Descartes - emoção, razão e o cérebro humano, de Antonio Damásio entre outros, que promovem uma divulgação científica dos estudos em torno do cérebro e seu funcionamento sob a denominação de “ciências cognitivas”. (SANTOS, 2012, p. 7)

Responder como o corpo se relaciona com os processos mentais e

comportamentais foi sempre uma questão de interesse ao ser humano.

Durante a Antiguidade, em diferentes culturas, várias teorias tentaram localizar

a alma no corpo humano. Não há como saber, precisamente, quando essa

associação entre a atividade cerebral e a mente se deu. Mas apesar das

discordâncias, uma teoria precisamente complementou a outra ao longo do

tempo e constituiu a base do que é entendido atualmente.

Concomitantemente, grandes descobertas científicas, na

convergência de saberes, modificaram o modo de se pensar, na forma de viver

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em diferentes sociedades e, não contrário, permearam nos processos de

criações artísticas. Com a abrangência do entendimento da aquisição do

conhecimento a partir do cérebro humano, permite-se romper com as barreiras,

se ainda existentes, entre a arte e a ciência. Possivelmente, foram os

estreitamentos entre os saberes e conhecimentos adquiridos ao longo do seu

tempo que se deu o resultado da dança que temos hoje.

1.2.2. A contemporaneidade que se expande e a plasticidade que se

adquire

Observar a trajetória da dança pelos acontecimentos do mundo

permite perceber que ela vem de acordo com um contexto histórico e social,

mas não se deve negligenciar que, a dança como arte, apenas se torna

possível a partir de um corpo biológico. Para chegar a segunda metade do

século XX, tanto a Dança quanto a Neurociência percorreram longos caminhos

e, consequentemente, transformações já citadas anteriormente.

De acordo com Monteiro (1998), Noverre (1727-1810) em suas

“Cartas sobre a dança”, onde expunha a respeito do que ele pensava sobre a

arte de dançar, trazia desde então a questão da expressão do bailarino e da

dança propriamente dita. Conceitos citados por ele que são fundamentais para

a dança contemporânea ou, minimamente, a permitiu se desenvolver anos

mais tarde.

Foi há um pouco mais de um século, em 1913, que a grande

revolução aconteceu. A Sagração da Primavera de Vaslav Nijinsky (1889-1950)

foi um momento determinante na história do balé pois abandonou

drasticamente a dança vital, “profundamente humana e sensual que o público

aprendera a esperar dos Ballets Russes” (HOMANS, 2012, p. 358) de Serge

Diaghilev (1872-1929).

Foi com o surgimento e estabelecimento da Dança Moderna que

houve rápida e drástica mudança à arte do movimento. Dentre esse período

estão nomes já citados como François Delsarte (1811-1871), Isadora Duncan

(1877-1927), Rudolf Laban (1879-1958). Ruth Saint-Denis (1878-1968) marcou

definitivamente o nascimento da dança moderna, elaborando uma técnica

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corporal precisa e metódica. Saint-Denis teria abandonado pela primeira vez as

sapatilhas de pontas e o contato direto do pé contra o chão apareceu como um

novo elemento da dança, no qual será visto à frente como um dos elementos

característicos da linguagem da dança contemporânea (BOURCIER, 2001).

Doris Humphrey (1895-1958) foi uma das discípulas de Saint-Denis

na Denishawnschool. Assim como Graham, Humphrey almejava criar uma

dança autêntica em diálogo com a realidade. Ela não apenas contribuiu na

difusão das disciplinas coreográficas nas universidades americanas como

também trouxe para a dança moderna elementos presentes ainda hoje na

dança contemporânea como as quedas e suspensões, perda e recuperação de

equilíbrio (BOURCIER, 2001). Martha Graham (1894-1991) é outro nome de

grande influência na dança moderna. Semelhante a Humphrey, Graham

trabalhou elementos como quedas e suspensões, mas o método que

desenvolveu se caracterizou pela contração e relaxamento muscular, chamado

por ela de tension-release, desenvolvendo uma perspectivas espiritualistas e

treinamento “nervoso e corporal” (BOURCIER, 2001, p. 280), muito se

interessou pelas teorias freudianas, agregando a técnica elementos da dança

clássica, construindo uma linguagem única na dança que prevalece até hoje.

Merce Cunningham (1919-2009), ex-aluno e bailarino de Graham,

após alguns anos de estudo e de experiência na dança prosseguiu em um

caminho que a resultou em uma inovadora técnica, uma nova linguagem e um

novo modo de olhar a dança (BOURCIER, 2001). Juntamente com Pina

Bausch (1940-2009), podem ser destacados como grandes nomes da dança

contemporânea devido a nova construção de linguagem e, acima disso, o

respeito mútuo para a criação sob o olhar de cada coreógrafo. Apesar dos

elementos e códigos já existentes na Dança, a linguagem e o estilo de cada

criador é única e singular, de acordo com as experiências adquiridas em seu

meio, com o mundo e da relação com ele.

Dessa forma, o cérebro é o ponto inicial e fundamental sendo o ser

humano um resultado de um “produto de uma historicidade e de uma evolução,

que conquistou uma morfogênese complexa e multidimensional” (PEREIRA,

2017, p. 42).

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Miranda-Neto, Molinari e Sant’Ana (2002) afirmam que a plasticidade

do sistema nervoso é resultado da capacidade que o próprio sistema nervoso

possui de modificar-se e adaptar-se através da eliminação dos neurônios que

não são utilizados e da manutenção do dinamismo morfológico e funcional

daqueles que são utilizados; alteração na produção de neurotransmissores;

formação de novas sinapses. Acrescentam que as novas sinapses “aumentam

o número de comunicação entre os neurônios que são solicitados para o

desempenho de atividades físicas e mentais (vida de relação) e para o controle

de nossas funções vitais (vida vegetativa)” (MIRANDA-NETO; MOLINARI;

SANT’ANA, 2002, p. 9).

Segundo Relvas (2017) o bebê nasce com estruturas

neuroanatômicas prontas e aptas à sobrevivência da espécie, consideradas

primitivas que respondem aos instintos de adaptação. Entretanto, por possuir

regiões mais complexas, é considerada ser uma das funções nobres por

amadurecer ao receberem estímulos externos.

Cosenza e Guerra (2011, p. 28) esclarecem que o sistema nervoso

humano se desenvolve a partir das primeiras semanas de vida embrionária

“sob a forma de um minúsculo tubo cuja parede é formada por células-tronco

que vão dar origem a todos os neurônios e também à maior parte das células

auxiliares, as células glias, que iremos encontrar no adulto”. Destacam que a

medida que as paredes do tubo ficam espessas, na região que dará origem ao

cérebro, a primeira ação dos novos neurônios será deslocar de maneira ativa

com a finalidade de ocupar os lugares para os quais cada neurônio estará

predeterminado geneticamente. Esse deslocamento programado é auxiliado

por células gliais específicas dessa etapa do desenvolvimento. Ao chegar nos

locais específicos, as células começam a desenvolver seus axônios, dendritos

e prolongamentos indispensáveis ao envio e recepção de outras células.

Relvas (2017) acrescenta que durante o processo de

desenvolvimento cognitivo da criança é importante frisar a respeito da

formação do revestimento dos axônios pelas células gliais que constituem a

mielina. A mielina possui a função de proteger o neurônio, sendo constituída

por fosfolipídios, substância encontrada no leite materno. Miranda-Neto,

Molinari e Sant’Ana (2002) afirmam que a utilização dos neurônios, durante o

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desempenho das múltiplas funções orgânicas e psíquicas, que irá estimular e

estabelecer um número crescente de comunicações entre si, pela ativação ou

formação de novas sinapses. A qualidade do estímulo que possibilitará o

surgimento de novas vias de comunicação interneural resultando na otimização

do funcionamento do sistema nervoso.

No desenvolvimento da construção do cérebro são formados

neurônios em um número muito maior do que o necessário para o seu

funcionamento havendo muitos descartes ao final do desenvolvimento do

cérebro ou ainda por motivos do neurônio não se localizar, por não conseguir

fazer ligações necessárias ou pela ligação não ser correta ou não se tornar

funcional. Atualmente, sabe-se que em algumas regiões cerebrais permanece

a capacidade de produção de novas células, porém esse fenômeno é muito

limitado (COSENZA; GUERRA, 2011). Contudo, Miranda-Neto, Molinari e

Sant’Ana (2002) apontam que mesmo com a perda de neurônios por apoptose

há possibilidade de redução dessas perdas ou a compensação delas com a

estimulação adequada, dentre outros fatores, de novas sinapses entre os

neurônios remanescentes e dos que se perderam em decorrência de lesão ou

da eliminação natural por não serem utilizados.

Com isso, a interação com o meio é imprescindível à formação de

conexões nervosas e, dessa forma, a aprendizagem. Os sistemas nervosos

têm a capacidade muito ampla de formação de novas sinapses durante os

primeiros anos de vida por ser extremamente plástico. Embora o sistema

nervoso se modifique por toda vida, para Cosenza e Guerra (2011), há dois

momentos particularmente importantes: o período em torno da época do

nascimento, quando ocorre um ajuste quanto ao número de neurônios que

serão utilizados nos circuitos necessários à execução das diferentes funções

neurais, e a adolescência, quando há um acelerado processo de eliminação de

sinapses em regiões distintas do córtex cerebral. “Além disso, há um notável

aumento da mielinização das fibras nervosas em circuitos cerebrais, tornando-

os mais eficientes” (COSENZA; GUERRA, 2011, p. 36).

Para a neuroplasticidade, a aprendizagem desempenha um papel

fundamental. Por meio da estimulação dos órgãos dos sentidos é produzido

impulsos nervosos oriundos dos receptores da periferia do corpo, atingindo

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neurônios sensitivos, motores e de associação que se conectam tanto pelo

sistema nervoso periférico quanto na medula espinal no encéfalo (MIRANDA-

NETO; MOLINARI; SANT’ANA, 2002). Por meio do treinamento e da

aprendizagem é possível levar à criação de novas sinapses e a facilitação do

fluxo da informação dentro de um circuito nervoso (COSENZA; GUERRA,

2011). Os impulsos nervosos permitem que se utilize as sensações que partem

do meio externo como estímulo para o desenvolvimento de percepções.

Plasticidade é, portanto, de acordo com Cosenza e Guerra (2011, p.

36), “a capacidade de fazer é desfazer ligações entre os neurônios como

consequência das interações constantes com o ambiente externo e interno do

corpo”. A afirmativa a respeito da plasticidade de Lent (2005, p. 135 apud

PEREIRA, 2017, p. 33), declara que seria "a capacidade de adaptação do

sistema nervoso, especialmente a dos neurônios, às mudanças nas condições

do ambiente que ocorrem no dia-a-dia da vida dos indivíduos". Dessa forma, a

plasticidade é a base da aprendizagem e permanece ao longo da vida, apesar

de diminuída ao passar dos anos, demandando maior esforço para a

concretização do aprendizado durante a fase adulta (COSENZA; GUERRA,

2011).

Sabendo das condições e possibilidades durante o desenvolvimento

humano, a responsabilidade do professor aumenta ainda mais, cada estímulo

pode resultar em novos aprendizados, sejam eles sensitivos, motores ou

cognitivos, ficará registrado na morfologia do sistema nervoso possibilitando

novas conexões. Ou seja, as ações dos estímulos terão implicações que serão

repercutidos também na vida adulta. E a respeito dos cuidados e da qualidade

dos estímulos às crianças, Relvas (2017) finaliza um de seus capítulos da

seguinte forma:

Concluindo que o bebê nasce para aprender e que tudo começa com o brincar, por isso tem de se levar a sério. Dessa maneira, os estímulos e desafios precisam fazer sentidos ao cérebro do bebê, tendo como finalidade a organização e a observação do sentir e pensar do mundo para que seja construído com significado. Corpo, cérebro e mente são interdependentes - contudo se faz necessário criar hábitos e rotinas saudáveis, pois promovem a longevidade vital do cérebro do bebê, da criança, do adolescente e do adulto. (RELVAS, 2017, p. 42)

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Sobre o determinismo genético, Miranda-Neto, Molinari e Sant’Ana

(2002) alerta que para uma criança que nasceu com um tipo de potencial

genético determinado, ainda sim, através da estimulação adequada pode haver

a redução da perda de neurônios por apoptose e, além do mais, obter um

aumento do número de comunicação entre neurônios. Mas para isso é

necessário ter algumas condições envolvidas como: “uma relação afetiva

positiva com o adulto que estimula ao mesmo tempo em que media as

aprendizagens da criança; condição nutricional adequada; saúde física e

mental (não confundir deficiência mental com doença mental); boa qualidade

de sono” (MIRANDA-NETO; MOLINARI; SANT’ANA, 2002, p. 12).

Compreender o fenômeno do sono em seus diversos aspectos é o procedimento científico para buscar soluções para seus distúrbios, visando alcançar um rendimento satisfatório nas atividades diárias. Na vida diária, o sono interfere no humor, na memória, na atenção, nos registros sensoriais, no raciocínio, enfim nos aspectos cognitivos que relacionam uma pessoa ao seu ambiente. Alterações no sono determinam má qualidade ao desempenho e interferem na saúde, às vezes, de forma muito grave. (VALLE; VALLE; REIMAO, 2009, p. 287)

Ao pensar a plasticidade nas aulas de dança, se o sujeito estiver

motivado a aprender novos movimentos físicos, e frequentemente estiver

procurando novas leituras sobre os diferentes assuntos, haverá novas sinapses

e, dessa forma, surgirão novos circuitos neuronais. Se um determinado estilo

ou passo de dança já foi aprendido é o momento de aprender um novo ou

estudar suas diferentes combinações e complexidades. Em outras palavras, se

houver a automatização e uma estagnação do que foi aprendido é necessário

aprender algo novo pois grupos musculares pouco utilizados, assim como os

neurônios relacionados a propriocepção e ao controle motor destes músculos,

serão acionados a partir da novidade imposta a eles. Em contrapartida, para a

memorização dos passos de dança são promovidas alterações neuroquímicas

como também podem promover a formação de novas sinapses, devido a

estimulação das memórias visuais e auditivas (MIRANDA-NETO; MOLINARI;

SANT’ANA, 2002).

É importante salientar que as emoções são essenciais para a

aprendizagem. Para Fonseca (2016) as emoções são adaptativas pois

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preparam, predispõem e orientam comportamentos para experiências tanto

positivas quanto negativas. Complementa que estas fornecem informações a

respeito da importância dos estímulos externos e internos do organismo, como

também, das “situações-problema” onde os indivíduos se encontram envolvidos

num determinado contexto.

Em termos de substratos neurológicos responsáveis pelas funções emocionais, incluindo necessariamente as funções afetivas e sociais, falamos particularmente do sistema límbico (córtex relacional, social, emocional ou paleomamífero, também conhecido como circuito de Papez), uma região subcortical mais profunda e central do cérebro, e envolvida, digamos assim, desde os primórdios evolucionistas dos mamíferos mais antigos, nas relações do organismo com o seu envolvimento social e objetivo, presente e passado (imediato, curto e longo prazo). (FONSECA, 2016, p. 367)

Contudo, práticas pedagógicas baseadas nos processos de ensino e

aprendizagem que envolvem conexões afetivas e emocionais do sistema

límbico fazem com que seja ativado o cérebro de recompensa. Damásio (1996)

destacou que a ausência da emoção pode prejudicar o raciocínio coerente e a

capacidade de tomada de decisão. Esse controle comportamental e cognitivo

está relacionado ao conceito de funções executivas.

Cosenza e Guerra (2011) definem as funções executivas como um

conjunto de habilidades e capacidades que permitem executar as ações

necessárias para se atingir um objetivo. De forma que incluem: estipular metas,

elaborar estratégias comportamentais, monitorar as ações adequadas e o

cumprimento às regras sociais.

Dessa forma, os controles comportamentais e cognitivos estão

intimamente relacionados ao conceito das funções executivas. Sendo o

desenvolvimento de tal função essencial para a regulação da emoção. Ambos

os desenvolvimento, cognitivo e emocional, parecem estar apoiados por

diferentes funções executivas corriqueiramente presentes nos contextos no

qual o sujeito da ação está emocionalmente sendo exigido.

Os impulsos nervosos oriundos a partir dos estímulos pelo meio

externo e as respostas motoras mobilizam uma pequena parte das vias

neurais. Porém, Miranda-Neto, Molinari e Sant’Ana (2002, p. 13) afirmam que

“se as informações que entram por estas vias forem motivadoras de reflexões e

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aprendizagens e mobilizadoras do pensamento, cria-se no sujeito a

possibilidade de aprender de dentro para fora”.

A expressividade e a afetividade na criação ou na execução dos

movimentos na dança estão intimamente presentes e pode ser o que difere a

dança de outras áreas que também regem movimentos complexos como nos

esportes. Essa característica em especial, pode estar ligada ao conhecimento

dos próprios processos internos, tendo uma percepção mais integrada do

corpo, permitindo externalizar uma variedade de movimentos e gestos

originados de impulsos particulares compondo uma relação íntima com o

tempo, o espaço, com as emoções, os sentimentos e intenções que resulta

uma dança singular e diferenciada como forma de expressão individualizada

mesmo que vista na coletividade.

Mas é somente através da emoção que a aprendizagem pode ser

relevante, significativa e útil para a vida de todos pois, todos, segundo Fonseca

(2016), devem ser reconhecidos como seres relacionais e emocionais, como

sujeitos histórico-sociais constituídos por atitudes, condutas, conhecimentos e

competências transmitidas por outros.

A neuroplasticidade refere, então, a mudança adaptativa que o

sistema nervoso central possui tanto na estrutura como em suas funções

decorrente às interações com o ambiente externo ou interno, ou ainda, como

resultado de injúrias, traumatismos ou lesões que venha afetar o ambiente

neural (DUARTE; BARBOSA, 2010).

Contudo, apesar de estruturas aparentemente iguais, cada indivíduo

é único. Compreender as singularidades das experiências e que cada circuito

neural é distinto, intransferível e apto a mudanças, torna mais fácil esclarecer

sobre a plasticidade, que é peculiar e imprescindível para a sobrevivência e a

(com)vivência da diversidade humana.

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CAPÍTULO II

O DESENVOLVIMENTO DE UM CORPO QUE DANÇA

O objetivo da dança na escola é, para Strazzacappa (2003),

desenvolver potencialidades para a formação do cidadão sensível, que se

atenta aos aspectos de identificação da sua cultura, podendo haver o interesse

a profissionalização e, sobretudo, a formação de público para esta arte. A

mesma autora alerta ao equívoco em considerar a dança como uma simples

atividade física pois, segundo Vianna (2005, p. 111), é imprescindível

considerar, ao longo do aprendizado, a relação “mundo-eu, verdadeira origem

e motor do movimento e da própria dança, pois é da dinâmica desse

relacionamento que emerge a singularidade que faz de cada pessoa um ser

único e diferenciado”.

É comum a formação em dança ser iniciada em academias e

estúdios enquanto é ainda muito jovem. Sobre estes locais Strazzacappa

(2003) afirma que:

(...). Nestes estabelecimentos, prevalece a característica da tradição oral. O professor realiza o movimento - o aluno imita o gesto. O professor orienta - o aluno faz. As escolas perpetuam essa metodologia de aprendizagem na qual há sempre um modelo para ser seguido ou obedecido. Os chamados “mestres” ensinam segundo a maneira como eles, por sua vez, foram ensinados. Dessa forma, é possível se identificar uma genealogia dos diferentes estilos dentro de uma mesma estética de dança. (STRAZZACAPPA, 2003, p. 189)

O fenômeno do espelhamento se dá devido os neurônios espelho

que desempenham uma função crucial para o comportamento humano

(LAMEIRA; GAWRYSZEWSKI; PEREIRA JR, 2006). São ativados pela

observação de uma ação não dependendo obrigatoriamente da memória.

Lameira, Gawryszewski e Pereira Jr. (2006) exemplificam que quando alguém

faz um movimento corporal complexo mesmo que nunca tenha realizado o

movimento antes, os neurônios-espelho identificam no sistema corporal os

mecanismos proprioceptivos e musculares correspondentes e dessa forma

tende-se a imitar, inconscientemente, aquilo que observou, ouviu ou percebeu

de alguma forma. O mesmo pode acontecer com as emoções e essa

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capacidade é denominado empatia. Em conformidade com os mesmos autores,

o surgimento e o aprimoramento dessas células propiciou o desenvolvimento

de funções importantes como linguagem, imitação, aprendizado e cultura.

Sendo assim, é possível compreender a colocação de Strazzacappa (2003) ao

dizer que:

(...). Atuar como nossos professores atuaram só pode ser viável quando reproduzidos os bônus de tal formação. No entanto, repetir atitudes equivocadas em nome da tradição (“foi assim que aprendi, é assim que ensino”) é considerar a disseminação dos conhecimentos nas áreas de psicologia, sociologia e pedagogia aplicadas à formação do artista. É igualmente menosprezar novas informações oriundas de outras áreas de conhecimento, como a cinesiologia, a fisiologia do movimento, a antropologia e a história. A repressão, a agressão física e/ou moral, a discriminação de alunos entre “talentosos” e “desajeitados” e tantas outras atitudes lamentáveis, ainda presentes em algumas aulas de dança, devem ser veementemente condenadas. Infelizmente, sabemos que essas questões não são exclusivas do ensino de dança, mas estão em outras muitas situações de ensino. (STRAZZACAPPA, 2003, p. 189-190)

Em um ambiente onde a dança possa ser construída durante o

processo, tanto no sentido do amadurecimento biológico como psicossocial,

permite se fazer pensar a respeito da dança como uma atividade

pedagogicamente transformadora.

Desenvolver o sentido do movimento, do qual todos estamos dotados, em maior ou menor medida, é de suma importância. Para isso é necessária uma clara consciência das sensações motoras, combinadas com as que surgem da interação do esforço e do corpo no espaço. Os movimentos físicos que parecem confusos no ritmo do esforço, as formas espaciais e a execução corporal não reforçam a sensibilidade para o movimento, nem a capacidade de criar no movimento. Deve-se aperfeiçoar o conhecimento da organização e o sentido da qualidade das unidades de movimento, com freqüência criadas livres e espontaneamente, de maneira que nossas ações físicas se tornem específicas o bastante para permanecer impressas em nós e se possa criar uma experiência psicofísica do movimento. (LABAN, 1990, p. 109-110)

A reflexão destas questões como a consciência de si, o sentido do

movimento na sua organização e qualidade corporal dentre outras, foram

construídos ao longo dos estudos referentes ao corpo, mas foram os

pesquisadores modernos/contemporâneos no decorrer do século XX até os

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dias atuais que permitiram se pensar em novas metodologias de ensino e o

resgate da percepção de prazer pela dança.

Não está sendo discutido aqui o conteúdo do qual a criança irá

aprender pois a “metodologia de ensino não depende necessariamente dos

conteúdos desenvolvidos, embora haja afinidades seguidas pela tradição”

(MARQUES, 2003, p. 140). Uma tradicional aula de dança clássica, por

exemplo, pode estar condizente com as propostas contemporâneas

educacionais como também uma aula de dança contemporânea sem estrutura,

apoio ou metodologia pode estar privando a criança de qualquer conhecimento

no que estiver atribuído a dança. É importante adotar uma metodologia

formativa que visa estimular e alcançar maiores êxitos com uma conduta

pautada em uma educação inclusiva e coesa socialmente.

2.1. O desenvolvimento humano: Da primeira à terceira infância.

O desenvolvimento humano constitui-se do estudo científico da

mudança e da continuidade durante todo o ciclo vital (PAPALIA, 2006). Relvas

(2017) afirma que desde o nascimento, o cérebro está preparado para recrutar

as experiências adquiridas e utilizá-las de maneira mais apropriada às

necessidades e preferências individuais. Essa adequação se dá previamente

pela existência de fatores genéticos somados a um ambiente rico em

oportunidades, vivências e experiências em prol de um bom desenvolvimento

maturacional neurológico.

Algumas influências sobre o desenvolvimento originam-se com a hereditariedade: a dotação genética inata dos pais biológicos de uma pessoa. Outras provêm do ambiente externo: o mundo fora da pessoa, que se inicia no útero. As diferenças individuais aumentam à medida que as pessoas envelhecem. Muitas mudanças típicas da primeira e segunda infância parecem vinculadas à maturação do corpo e do cérebro - o desdobramento de uma seqüência natural geneticamente influenciada de mudanças físicas e padrões de comportamento, incluindo a prontidão para adquirir novas habilidades, como caminhar e falar. A medida que as crianças transformam-se em adolescentes e depois em adultos, as diferenças nas características inatas e na experiência de vida desempenham um papel mais importante. (PAPALIA, 2006, p. 54)

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Desde a fase inicial da gestação o cérebro vai sendo moldado.

Sinais químicos, durante o primeiro mês de gestação, fazem com que um

grupo de células no desenvolvimento do embrião comece a se transformar no

sistema nervoso. Com três semanas após a concepção, “a placa neural, uma

camada de células que percorre a extensão do feto, une as suas extremidades

para formar o tubo neural, que mais tarde se transformará no cérebro e na

medula espinhal” (RELVAS, 2017, p. 38).

De acordo com Cosenza e Guerra (2011), há várias etapas que

devem ser cumpridas durante o período pré-natal para que as conexões entre

as células nervosas sejam efetuadas de forma correta. No processo de

construção do cérebro muitos neurônios são formados, mas posteriormente

são descartados pois não se tornarem funcionais.

A criança nasce bastante imatura, a maior parte das conexões em

seu cérebro surgirá com o auxílio das interações com o meio ambiente. “A falta

de estimulação adequada pode ser prejudicial ao desenvolvimento do cérebro”

(COSENZA; GUERRA, 2011, p. 39). Pois, de acordo Relvas (2017), o estágio

final de maturação do sistema nervoso (iniciado no sexto mês de gestação,

intensificado após o nascimento, podendo prosseguir até os trinta anos) é

marcado pelo processo de mielinização.

A mielina é uma substância lipoproteica (constituída de gordura e proteína) produzida por certos tipos de gliócitos (células especializadas do sistema nervoso central). Estas células se enrolam em torno dos axônios, formando uma bainha isolante que, entre outras coisas, contribui aumentar a velocidade de propagação do impulso nervoso, atribuindo maior eficiência na transmissão da informação, garantindo, então, o estímulo por meio dos neurônios. Dessa maneira, o processo de mielinização tem uma relação direta com a aprendizagem, assim como a quantidade de conexões entre as células neuronais. (RELVAS, 2017, p. 38-39)

A seguir, será seguido uma sequência de quatro períodos de oito

trazidos por Papalia (2006). Depois de descrever algumas mudanças que

ocorrem no período pré-natal, será investigado aspectos físicos, cognitivos e

psicossociais no desenvolvimento na primeira, segunda e terceira infância.

Contrapondo com as considerações sobre a aprendizagem e o

desenvolvimento de acordo com a teoria de Wallon. As divisões etárias

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apresentadas também serão seguidas de acordo com Papalia (2006). Embora

haja algumas diferenças, a cada idade estabelece-se um tipo particular na

interação do indivíduo com o meio (GALVÃO, 1996) e, assim, serão

investigadas.

2.1.1. O desenvolvimento pré-natal

A fecundação ou concepção acontece durante o processo pelo qual

o espermatozoide e o óvulo - os gametas masculino e feminino ou células

sexuais, - se fundem para criar uma única célula chamada zigoto. Esta, então

se duplica repetidamente por divisão celular para se tornar posteriormente em

um bebê (PAPALIA, 2006).

Enquanto se divide, o óvulo fecundado adquire uma forma de uma

esfera preenchida de líquido, denominado de blastocisto, no qual flutua

livremente no útero até alojar-se na parede uterina. Ao iniciar a diferenciação

celular, algumas das células em torno da borda do blastocisto aglomeram-se

em um lado para formar o disco embrionário, uma massa celular espessa a

partir da qual o embrião começa a se desenvolver. Essa massa diferencia-se

em duas camadas: a camada superior, o ectoderma, que dará origem à

camada externa da pele, às unhas, aos pelos, aos dentes, aos órgãos dos

sentidos e ao sistema nervoso, inclusive cérebro e medula espinal, e a camada

inferior, o endoderma, que dará origem ao aparelho digestivo, fígado, pâncreas,

glândulas salivares e ao aparelho respiratório. Posteriormente, uma camada

intermediária, o mesoderma, se desenvolverá e diferenciará em camada

interna da pele, músculos, esqueleto e sistemas excretor e circulatório

(PAPALIA, 2006).

Segundo Papalia (2006) a fecundação normalmente acontece

durante o curto espaço de tempo em que o óvulo passa através da tuba

uterina. Para isso os espermatozoides entram pela vagina e nadam através do

cérvix (a abertura do útero) para dentro das tubas uterinas, entretanto apenas

uma fração diminuta consegue chegar a tal feito.

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A gestação é calculada a partir do primeiro dia do último período

menstrual normal. São consideradas 40 semanas completas ou 286 dias, com

a previsão de acontecer o parto em cerca de 280 dias (RELVAS, 2017).

Papalia (2006) considera que o desenvolvimento pré-natal ocorre em

três fases: germinal, embrionária e fetal. Durante as três fases de gestação, o

zigoto original unicelular se transforma em um embrião e em seguida em um

feto. Complementa que tanto antes como depois do nascimento, o crescimento

e o desenvolvimento motor seguem dois princípios fundamentais: ocorrem de

cima para baixo e do centro do corpo para fora.

O princípio cefalocaudal (do latim "da cabeça para a cauda")

determina que o desenvolvimento ocorra da cabeça para a

parte inferior do tronco. A cabeça, o encéfalo e os olhos do

embrião desenvolvem-se mais cedo e são

desproporcionalmente grandes até que as outras partes os

alcancem. Aos 2 meses de idade, a cabeça de um embrião

mede a metade do comprimento de todo o corpo. No momento

do nascimento, a cabeça representa apenas um quarto do

comprimento do corpo, mas ainda é desproporcionalmente

grande; segundo o princípio próximo-distal (do latim "do

próximo ao distante"), o desenvolvimento ocorre das partes

próximas ao centro do corpo para as partes externas. A cabeça

e o tronco do embrião desenvolvem-se antes dos membros, e

braços e pernas antes dos dedos de pés e mãos. (PAPALIA,

2006, p. 124)

A primeira semana do desenvolvimento do embrião é caracterizada,

de acordo com Relvas (2017), por uma intensa multiplicação celular e pelo

transporte do zigoto do terço superior da tuba uterina para a cavidade uterina.

Durante a terceira semana, as alterações no corpo da mãe já são sentidas pois

há liberação do hormônio gonadotrofina coriônica, responsável pela

manutenção da produção de progesterona e de estrogênio. A mesma autora

afirma que é por volta da quarta semana que há o surgimento da placa neural.

Dessa forma, inicia-se a formação do tecido nervoso, e as vesículas ópticas,

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que “induzem a formação do cristalino, as placas olfativas e a da curvatura

mesencefálica das vesículas cerebrais acentuam-se” (RELVAS, 2017, p. 18).

Durante o primeiro mês, o crescimento é mais rápido do que em qualquer outra época da vida pré-natal ou pós-natal: o embrião atinge um tamanho 10 mil vezes maior do que o zigoto. No final do primeiro mês, ele mede cerca de 12,6 mm. O sangue circula através de suas veias e artérias, as quais são muito pequenas. Ele possui um coração minúsculo que bate 65 vezes por minuto. Ele já apresenta o princípio de um encéfalo, rins, fígado e trato digestivo. O cordão umbilical, do qual depende para sobreviver, está funcionando. Utilizando-se um microscópio, é possível ver as saliências na cabeça que por fim tornar-se-ão seus olhos, ouvidos, boca e nariz. Ainda não é possível determinar o sexo. (PAPALIA, 2006, p. 125)

Nesta fase da quarta semana, desenvolve-se o sistema nervoso

central e periférico primitivo, complexo. Estes são envolvidos por três

membranas, as meninges. Segundo Relvas (2017, p. 18) acontece também a

formação das células micróglias, fundamentais para “formar as futuras e novas

conexões neurais, estabelecendo, fortalecendo e consolidando os estímulos

recebidos do meio externo que permearão entre os neurônios”.

Ainda, na quarta semana, surgem a formação do epitélio sensorial do olfato e do ouvido interno e as glândulas hipófise e a adrenal. Estas estruturas serão importantes canais de comunicação e ajustes neuroquímicos para a captação dos estímulos sensoriais e emocionais no desenvolvimento cognitivo, afetivo e relacional. (RELVAS, 2017, p. 18-19)

É perceptível que é uma fase de extrema importância a formação do

bebê devido a origem de os demais tecidos no processo de organogênese. O

organismo em desenvolvimento pode ser muito afetado por seu ambiente pré-

natal devido diferentes fatores externos como a nutrição, atividade física, uso

de drogas, infecção materna, idade materna, incompatibilidade de tipos

sanguíneos e ameaças ambientais externas como substâncias químicas e

radiação. Estes fatores podem ocasionar defeitos congênitos a depender da

época da ocorrência e da intensidade de um evento ambiental e de sua

interação com fatores genéticos.

Ao final do segundo mês, o organismo tem menos do que 2,5

cm e pesa apenas 9,4 g. Sua cabeça tem a metade do

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comprimento total do corpo. As partes faciais estão claramente

desenvolvidas, apresentando o germe de língua e dentes. Os

braços têm mãos, dedos e polegar, e as pernas possuem

joelhos, tornozelos e artelhos. Há uma fina cobertura de pele, e

mãos e pés deixam impressões. Células ósseas aparecem

aproximadamente na oitava semana. Impulsos cerebrais

coordenam o funcionamento dos sistemas orgânicos. Os

órgãos sexuais estão em desenvolvimento; os batimentos

cardíacos são firmes. O estômago produz sucos digestivos; o

fígado, células sanguíneas. Os rins removem o ácido úrico do

sangue. A pele agora é suficientemente sensível para reagir à

estimulação tátil. Se um feto abortado de oito semanas é

tocado, ele reage flexionando o tronco, estendendo a cabeça e

movendo os braços para trás. (PAPALIA, 2006, p. 125)

A respeito dos impulsos cerebrais, Relvas (2017) diz que a sinapse é

fundamental para o complexo desenvolvimento do sistema nervoso e nesta

fase ocorrem a formação e renovação dos circuitos neurais, a sinaptogênese.

Ao final do terceiro mês, de acordo com Papalia (2006), o feto pesa

aproximadamente 28 g e mede cerca de 7,5 cm de comprimento. Já possuindo

unhas nas mãos e nos pés, pálpebras (ainda fechadas), cordas vocais, lábios e

nariz proeminente. Sobre a cabeça afirma ser ainda grande com cerca de um

terço de seu comprimento total e a testa alta. Quanto ao sexo diz ser facilmente

determinado.

Durante o terceiro mês os sistemas orgânicos funcionam de forma

que o feto tenha possibilidade de respirar, fazer circular o líquido amniótico

para dentro e para fora dos pulmões, e ocasionalmente urinar. As costelas e

vértebras tornaram-se cartilagem. Podendo, o feto, emitir respostas

especializadas como mexer as pernas, os pés, os polegares e a cabeça;

podendo sua boca se abrir, fechar e engolir. “As pálpebras se contraem quando

tocadas. Se a palma de sua mão é tocada, ela se fecha parcialmente; quando

tocados, seus lábios sugam; e quando a planta do pé é tocada, os artelhos se

abrem em leque” (PAPALIA, 2006, p. 125). Tais reflexos, segundo a mesma

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autora, estarão presentes no nascimento entretanto, irão desaparecer durante

os primeiros meses de vida.

Durante o quarto mês de gestação, o corpo está alcançando o

desenvolvimento da cabeça, a qual agora representa apenas um quarto do

comprimento total, proporção semelhante a que terá no nascimento. O feto

neste momento mede de 20 a 25 cm e pesa aproximadamente 170 g. O cordão

umbilical possui o mesmo comprimento do feto e continuará a crescer com ele.

A placenta estará totalmente desenvolvida. A mãe poderá sentir o feto

movendo-se. As atividades reflexas que apareceram no terceiro mês passam a

serem mais bruscas em função do maior desenvolvimento muscular (PAPALIA,

2006).

No quinto mês de gestação, o feto possui padrões definidos de sono

e vigília, como também uma posição de sua preferência no útero. Papalia

(2006) declara que neste mês o feto torna-se mais ativo - chutando,

espichando-se, encolhendo-se e até soluçando, sendo possível ouvir através

do abdome materno os batimentos cardíacos do feto. Tanto as glândulas

sudoríparas e sebáceas quanto o sistema respiratório estão em funcionamento,

entretanto, o sistema respiratório ainda não é capaz de sustentar a vida fora do

útero, podendo vir a óbito caso venha nascer nessa fase. Aparecem pelos mais

grossos na região das sobrancelhas e cílios, o cabelo mais fino na cabeça e

uma lanugem cobre o corpo (PAPALIA, 2006).

Ao quinto mês de gestação, segundo Relvas (2017) ocorrem

sinapses simples, mas é no sétimo mês que se encontra uma intensidade

maior. Melo (2015 apud RELVAS, 2017) revela que durante a fase pré-natal os

neurônios originam em um processo de maturação, ocorrendo o crescimento

dos dendritos e axônios. Relvas (2017) complementa que os dendritos se

iniciam como projeções simples do corpo celular, posteriormente

desenvolvendo-se por meio de extensões cada vez mais complexas, regiões

estas onde ocorrem as sinapses. Essas estruturas neurais sofrem constantes

mudanças quando estimuladas e potencializadas.

Ao final do sexto mês, conforme Papalia (2006), há uma diminuição

da taxa de crescimento fetal, possuindo cerca de 35 cm de comprimento.

Consiste no sexto mês: a formação de camadas de gordura por baixo da pele,

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a estrutura completa dos olhos, a capacidade auditiva e de fechamento da mão

com força. O nascimento durante este mês ainda contém riscos pois o aparelho

respiratório ainda não está completamente amadurecido.

Ao final do sétimo mês, o feto dispõe de padrões reflexos bem

desenvolvidos. Possui a capacidade de chorar, respirar, engolir, podendo sugar

o polegar. Pode ocorrer o desaparecimento da lanugem nesta época ou

permanecer até um pouco depois do nascimento. As chances de sobrevivência

aumentam, mas é necessário acompanhamento médico, com probabilidade de

ser mantido em uma incubadora até atingir o peso de 2,25 kg (PAPALIA, 2006).

O feto de 8 meses tem de 46 a 51 cm de comprimento e pesa de 2,25 a 3,1 kg. Devido à progressiva falta de espaço dentro do útero, seus movimentos são reduzidos. Durante este mês e o seguinte, desenvolve-se uma camada de gordura em todo o corpo do feto, a qual irá lhe permitir ajustar-se às temperaturas variáveis fora do útero. (PAPALIA, 2006, p. 126)

Aproximadamente uma semana antes do nascimento, de acordo

com Papalia (2006), o bebê para de crescer e atinge uma média de 3,4 kg e o

comprimento de cerca de 51 cm. Uma curiosidade abordada é que os meninos

tendem a ser um pouco mais compridos e pesados comparados com as

meninas. Em oposição ao crescimento, as camadas de gordura continuam a se

formar. Quanto aos sistemas orgânicos, esses operam com maior eficiência, a

frequência cardíaca aumenta e há maior eliminação de resíduos através do

cordão umbilical. “No nascimento, o feto terá permanecido no útero por

aproximadamente 266 dias, embora a idade de gestação geralmente seja

estimada em 280 dias, pois os médicos datam a gravidez a partir do último

período menstrual da mulher” (PAPALIA, 2006, p. 126).

Após o nascimento o processo sináptico estará suscetível às

influências do meio no qual o sujeito estará envolvido, sendo possível criar

novas conexões. De acordo com Relvas (2017), os estímulos visuais

intensificam-se a partir do quarto mês de vida e cessam por volta dos dois anos

de idade, devido a isso, é importante a exploração dessa área do cérebro com

a utilização de imagens e atividades lúdicas orientados pois, de segundo Melo

(2015 apud RELVAS, 2017, p. 20), se desprovida de estímulo visual, a criança

nesse período pode tornar-se cega.

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Durante o processo de desenvolvimento cognitivo da criança ocorre

a formação do revestimento dos axônios por células gliais que constituem a

mielina. Esse processo acontece de forma mais acentuada nos últimos meses

do desenvolvimento fetal e ao longo dos dois primeiros anos de vida. Mas em

determinadas áreas do cérebro, a mielinização poderá ser considerada

completa apenas na vida adulta (RELVAS, 2017).

Dessa forma, Henry Wallon (1879-1962) em sua teoria psicogenética

considera que o eixo principal no processo de desenvolvimento se faz a partir

da integração em dois sentidos: integração organismo-meio e integração

cognitiva-afetiva-motora. Sendo assim, na primeira, o desenvolvimento se faz a

partir da interação do potencial genético e uma variedade de fatores ambientais

(MAHONEY; ALMEIDA, 2005). Nesse sentido, para Galvão (1996), a análise

das interações das crianças com o seu meio físico e social é necessário para a

compreensão de cada etapa do desenvolvimento ao mesmo tempo que o é

para a compreensão do próprio meio.

Logo, o processo de aprendizagem se consiste na articulação do

sujeito com a sua própria história somados às suas diferentes possibilidades.

Aprender implica “um movimento que envolve tanto a utilização dos recursos

cognitivos mesclados com os processos internos quanto com as possibilidades

socioafetivas” (RELVAS, 2009, p. 127-128). Embora o movimento puro e

isolado não esclareça o que é dança, ele é imprescindível para que ela

aconteça.

Dançar requer um corpo biológico e sociocultural. Não se pode

negligenciar que a dança só é possível graças a um corpo biológico que se

move graças a administração por um sistema nervoso complexo, apto para

lidar com diferentes mecanismos e constantes mudanças. Estudar dança,

nesse ponto de vista, requer conhecer o corpo que dança, o meio no qual está

inserido e a forma como se dança ou como ela é ou pode ser aprendida.

2.1.2. O desenvolvimento na primeira infância (0 aos 3 anos)

O desenvolvimento infantil refere-se ao processo gestacional até a

adolescência, contudo não se observa apenas do crescimento físico da

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criança, mas todas as transformações progressivas que alteram a composição

e funcionamento das células o que resulta na maturação dos sistemas e órgãos

e a aquisição de novas funções. Atualmente, é necessário levar em

consideração todo o desenvolvimento do sistema nervoso, pois a maturação do

mesmo exerce grande influência na passagem das diferentes fases ao longo

da vida. Havendo uma multiplicidade de fatores como: desenvolvimento

neuronal de várias áreas cerebrais, a mielinização de estruturas cerebrais, o

desenvolvimento de padrões de respostas e conexões que ocorrem devido a

experiência através da interação do sujeito com o meio no qual está inserido.

Ao nascer a criança possui o funcionamento dos sentidos em graus

variados. De acordo com Papalia (2006) o cérebro aumenta a sua

complexidade e é altamente sensível à influência ambiental. E o crescimento e

o desenvolvimento físico das habilidades motoras são considerados rápidos.

Esses seguem dois princípios de maturação: o princípio cefalocaudal e o

princípio próximo-distal (PAPALIA, 2006).

No princípio cefalocaudal, o desenvolvimento ocorre da cabeça para

a cauda. O cérebro desenvolve-se muito rapidamente no período gestacional,

dessa forma a cabeça de um bebê recém-nascido é desproporcionalmente

grande alcançando ao completar um ano de idade, 70% do peso seu o cérebro

adulto. A cabeça torna-se proporcionalmente menor à medida que a criança

cresce, tanto em altura quanto as partes inferiores do corpo se desenvolvem.

Os desenvolvimento sensorial e motor ocorrem, segundo a mesma autora, de

acordo com o mesmo princípio: “os bebês aprendem a utilizar as partes

superiores do corpo antes de utilizar as inferiores. Eles veem os objetos antes

de poderem controlar seu tronco e aprendem a fazer muitas coisas com as

mãos muito antes de saberem engatinhar ou andar” (PAPALIA, 2006, p. 163).

Já o princípio próximo-distal, o crescimento e o desenvolvimento

motor ocorrem do centro do corpo para fora. Assim como no útero, a cabeça e

o tronco desenvolvem-se antes dos braços e das pernas, posteriormente

desenvolvem-se as mãos e os pés, e, em seguida, os dedos dos pés e mãos,

durante os primeiros anos de vida, os membros continuam crescendo mais

rápido do que as mãos e os pés, consequentemente. Desse modo, as crianças

desenvolvem primeiro a capacidade de utilizar as partes superiores de braços e

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pernas, no qual ficam mais próximas ao centro do corpo, após os antebraços e

parte inferior das pernas, depois mãos e pés e, por fim, os dedos de pés e

mãos (PAPALIA, 2006).

Para Papalia (2006) o crescimento cerebral não é regular e contínuo

e ocorre de maneira intermitente. Os surtos de crescimento cerebral, períodos

que o crescimento e desenvolvimento são mais rápidos, coincidem com as

mudanças no comportamento cognitivo (FISCHER; ROSE, 1994; 1995 apud

PAPALIA, 2006). Sendo que as partes distintas do cérebro crescem de forma

mais rápida em períodos diferentes. No período do nascimento, por exemplo, o

desenvolvimento súbito da medula espinal e do tronco encefálico está quase

no fim, o cerebelo, em contrapartida, cresce mais rapidamente durante o

primeiro ano de vida (CASAER, 1993 apud PAPALIA, 2006).

O cérebro humano é constituído em dois hemisférios: esquerdo e

direito, cada um deles com funções especializadas. O hemisfério esquerdo

controla a fala em mais de 95% dos seres humanos. Segundo Lent (2002 apud

RELVAS, 2009) isso não exclui a eficiência do hemisfério direito para tal feito,

ao contrário, confere a ele as nuances afetivas essenciais à comunicação

interpessoal da fala. O hemisfério esquerdo é também responsável pela

realização mental de cálculos matemáticos, pelo comando da escrita e pela

compreensão dela por intermédio da leitura, ou seja, verbal e analítico. O

hemisfério direito é melhor para a percepção de sons musicais e no

reconhecimento de faces, na detecção de relações específicas e espaciais, ou

seja, é rápido, complexo, espacial, perceptivo e configuracional (RELVAS,

2009). Os dois hemisférios ligam-se por um feixe espesso de tecido

denominado corpo caloso, o qual lhes permite trocar informações e coordenar

comandos (PAPALIA, 2006). Cada um deles está dividido em lobo frontal, lobo

parietal, lobo occipital e lobo temporal.

A partir do nascimento, Papalia (2006) estima que a maioria dos

mais de 100 bilhões de neurônios de um cérebro maduro já estejam formados

embora ainda não estejam completamente desenvolvidos. A multiplicação de

dendritos e conexões sinápticas, especialmente durante os últimos dois meses

e meio de gestação e nos primeiros seis meses a dois anos de vida, estão

responsáveis por grande parte do aumento de peso do cérebro e permitem a

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emergência de novas capacidades perceptivas, cognitivas e motoras

(PAPALIA, 2006).

A medida que se multiplicam, migram para suas devidas posições e desenvolvem conexões, os neurônios sofrem os processos complementares de integração e diferenciação. Através da integração, os neurônios que controlam os diversos grupos de músculos coordenam suas atividades. Através da diferenciação, cada neurônio assume uma estrutura e função especializada específica. (PAPALIA, 2006, p. 169)

O aperfeiçoamento da eficiência na comunicação entre as células

nervosas está ligado às células gliais que revestem as rotas neurais da mielina

(PAPALIA, 2006). O processo de mielinização ocorre aceleradamente na fase

pós-natal, porém, em determinadas áreas do cérebro, como o córtex cerebral,

o processo só é considerado completo na fase adulta (RELVAS, 2017). Para

Papalia (2006) a mielinização das rotas sensórias e motoras, iniciadas na

medula espinal do feto e, posteriormente, após o nascimento, no córtex

cerebral, pode explicar o aparecimento e desaparecimento dos primeiros

reflexos.

Os comportamentos reflexos são controlados pelos centros

cerebrais inferiores que controlam outros processos involuntários, como

respiração e frequência cardíaca. Estes desempenham importante colaboração

na estimulação do desenvolvimento inicial do sistema nervoso central e dos

músculos (PAPALIA, 2006). De acordo com Papalia (2006) os bebês humanos

possuem cerca de 27 reflexos principais, divididos em: reflexos primitivos,

relacionados com as necessidades instintivas de sobrevivência e proteção;

reflexos posturais (entre os 2 e 4 meses), relacionados às reações a mudanças

de posição ou equilíbrio; reflexos locomotores, como os reflexos de andar e

nadar que se assemelham aos movimentos voluntários no qual originam-se

meses depois após os reflexos desapareceram.

A maioria dos reflexos iniciais desaparecem durante os primeiros 6 meses a 1 ano. Os reflexos que continuam desempenhando funções de proteção - como piscar, bocejar, tossir, engasgar-se, espirrar, tremer e o reflexo pupilar (dilatação das pupilas no escuro) - permanecem. O desaparecimento de reflexos desnecessários na época prevista é sinal de que as rotas motoras do córtex foram parcialmente mielinizadas, permitindo uma transição para o comportamento voluntário. Dessa forma, podemos avaliar o desenvolvimento

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neurológico de um bebê verificando se certos reflexos estão presentes ou ausentes. (PAPALIA, 2006, p. 173)

É o que pode ser observado na teoria de Henry Wallon como

impulsividade motora, entre zero e três meses, ao relatar uma manifestação de

reações com descargas motoras indiferenciadas. Estes gestos não intencionais

para Wallon possuem um efeito significativo no meio ambiente, suscitando

como respostas intervenções úteis e desejáveis (GALVÃO, 1995). Os

comportamentos reflexos, visto por Papalia (2006), desempenham importante

papel na estimulação do desenvolvimento inicial do sistema nervoso central e

dos músculos.

Dessa forma, compreender o cérebro como um sistema plástico que

se modifica na construção de sua própria história, bem como em seu

desenvolvimento ontogenético se faz necessário. Pois se os estados mentais

são resultados de padrões de atividades neurais, logo a aprendizagem é

alcançada pela estimulação das conexões neurais, tendo seu fortalecendo de

acordo com a qualidade da intervenção pedagógica.

Quando o sistema nervoso central, os músculos e os ossos se

encontram devidamente preparados, os bebês só necessitam de espaço que

lhe permitam movimentar-se e liberdade para experimentações, explorações e

práticas.

(...). Os bebês primeiramente adquirem habilidades simples e depois as combinam em sistemas de ação cada vez mais complexos, os quais permitem uma gama mais ampla ou mais precisa de movimentos e um controle mais eficiente do ambiente. No desenvolvimento da ação de agarrar com precisão, o bebê primeiro tenta pegar as coisas com a mão inteira, fechando os dedos sobre a palma da mão (movimento ulnar); posteriormente, o bebê aprende o movimento em pinça, no qual as pontas do polegar e do indicador encontram-se formando um círculo, tornando possível pegar objetos diminutos. Ao aprender a caminhar, o bebê primeiro adquire controle dos movimentos separados dos braços, pernas e pés antes de juntar esses movimentos para dar aquele primeiro passo importante. (PAPALIA, 2006, p. 176)

De modo geral, considera-se a existência de alguns marcos de

desenvolvimento motor conduzido pelo cérebro em amadurecimento de acordo

com os Testes de Avaliação do Desenvolvimento de Denver, aplicados em

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crianças de 1 mês a 6 anos de idade, para determinar se elas estão

desenvolvendo-se dentro da, considerada, normalidade. Estes testes avaliam

as habilidades motoras gerais, as habilidades motoras finas, o desenvolvimento

linguístico e o desenvolvimento social e da personalidade (PAPALIA, 2006).

O Teste de Triagem do Desenvolvimento motor de Denver foi criado

por Frankenburg et al., em 1967, com o objetivo de suprir a necessidade de um

instrumento que auxiliasse na observação do desenvolvimento infantil, diante

das dificuldades e inexistência de avaliações objetivas e padronizadas de rotina

para crianças de 0 a 6 anos de idade.

Para o controle da Cabeça, de acordo com Papalia (2006), ao

nascer, a maioria dos bebês são capazes de virar a cabeça de um lado para o

outro enquanto estão deitados de costas. Na posição de bruços, muitas delas

são capazes de erguer a cabeça o suficiente para virar-se. Entre 2 e 3 meses,

é possível que levantem a cabeça cada vez mais alto. Aos 4 meses de idade,

grande parte dos bebês conseguem manter a cabeça ereta enquanto alguém

os segura, ou enquanto estão sentados com apoio.

Sobre o controle das mãos, os neonatos, bebês até quatro semanas,

nascem com o reflexo de preensão. Ao acariciarmos a palma da mão de um

bebê, sua mão fecha-se com força. Aproximadamente aos 3 meses e meio, a

maioria dos bebês conseguem pegar um objeto de tamanho moderado, porém

possuem dificuldade para segurar objetos pequenos. Após, é notável que eles

começam a passar objetos de uma mão para a outra e depois seguram

pequenos objetos. Entre os 7 e os 11 meses, suas mãos adquirem

coordenação suficiente para pegar um pequeno objeto com um movimento

semelhante ao de uma pinça. Aos 15 meses, o bebê já pode conseguir

construir uma torre de dois cubos. Alguns meses depois dos três anos, é

possível que uma criança saiba copiar um círculo razoavelmente bem.

Já a locomoção, após os 3 meses de idade, o bebê tende a revirar-

se deliberadamente, podendo permanecer sentado sem apoio aos 6 meses e

sentar-se sozinho em aproximadamente 2 meses e meio depois. Entre os 6 e

10 meses, a maioria dos bebês iniciam o deslocamento por sua própria

vontade, engatinhando e rastejando de diversas maneiras. Essa nova

capacidade de autolocomoção, de acordo com Papalia (2006), possui

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extraordinárias implicações cognitivas e psicossociais. Com a utilização de

apoio, o bebê, em sua maioria, pode ficar de pé com um pouco mais de 7

meses de idade. Aproximadamente quatro meses depois, após prática

constante de colocar-se em posição ereta, a maioria dos bebês conseguem

soltar-se e ficar de pé sem auxílio.

Segundo Papalia (2006) após ficarem de pé, aproximadamente aos

onze meses e meio, a maioria dos bebês dão os primeiros passos sem auxílio.

Logo após o primeiro ano de idade, a criança estará caminhando bem. Durante

o segundo ano, os desafios aumentam e é possível começarem a subir

degraus um de cada vez, e mais tarde, com alternância dos pés. Ainda no

segundo ano, as crianças correm e pulam. Aos 3 anos e 6 meses, a maioria

das crianças são capazes de se equilibrar brevemente em um dos pés e pular

(PAPALIA, 2006).

A fase entre os 12 e 18 meses corresponde ao estágio sensório-

motor da teoria walloniana, no qual encontra-se a investigação e a exploração

da realidade exterior, bem como pela aquisição da aptidão simbólica e pelo

início da representação. Para Galvão (1995) o predomínio da atividade de

exploração, de manipulação, põe a criança em contato com o mundo físico.

Estabelecer relações com o espaço sensório-motor, em conformidade com

Galvão (1995), faz com que a criança desenvolva uma inteligência prática,

também denominada como inteligência das situações.

Ao final do primeiro ano, Galvão (1996) afirma que com o

desenvolvimento dos gestos instrumentais intensificam-se as possibilidades do

movimento como recurso de exploração do meio físico, em prol da adaptação

da criança à realidade objetiva.

Entre os 18 aos 36 meses, na teoria walloniana, o estágio projetivo

(construção simbólica do real) refere-se que tanto o andar como a linguagem

dão oportunidade de a criança entrar em contato com a simbologia das coisas.

Nesta etapa, Galvão (1995) afirma que o ato mental se projeta em atos

motores assim como os gestos antecedem a palavra.

No estágio projetivo dois movimentos são destacados. O movimento

da imitação, processo já explicado anteriormente nesta pesquisa, que nesta

teoria também está de acordo com a indução de um ato por modelo exterior,

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cujo modelo é percebido e transformado em ação no momento presente e o

desdobramento do ato que seria a possibilidade de realizar a diferenciação do

eu e do outro, tomar consciência de si e do mundo. E o simulacro,

caracterizado pelo exercício ideomotor, ou seja, pensamento apoiado em

gestos. Trata-se de um ato sem o objeto real (o exercício do “faz de conta”).

Porém, o desdobramento da realidade só poderá ser possível se houver a

subordinação da atividade sensório-motora ao surgimento e a formação da

representação e, aliado às relações interpessoais e culturais, dessa forma,

contribuirá em diferentes funções que conduzem a criança à expressão da

atividade mental (GALVÃO, 1995).

De acordo com Galvão (1995), ocorre no estágio projetivo, a

construção do “eu-corporal”. Essa é a capacidade de diferenciar-se dos outros

e do meio, através da exploração do próprio corpo. Aos 2 anos a criança

consegue atribuir a si a sua própria imagem refletida no espelho. O

desenvolvimento cognitivo permite que a criança integre as partes em um todo

(GALVÃO, 1995).

O desenvolvimento motor é, portanto, considerado como um

processo sequencial, contínuo e relacionado à idade cronológica, pelo qual o

ser humano adquire uma vasta quantidade de habilidades motoras, as quais

progridem de movimentos simples e desorganizados para a execução de

habilidades motoras mais organizadas e complexas (HAYWOOD; GETCHELL,

2004).

A interação entre aspectos relativos ao sujeito, como suas

características físicas e estruturais, ao meio ao qual está inserido e à tarefa a

ser aprendida, são determinantes na aquisição e refinamento das diferentes

habilidades motoras (HAYWOOD; GETCHELL, 2004).

De acordo com Papalia (2006) as capacidades de aprender e

lembrar estão presentes, mesmo nas primeiras semanas de vida do ser

humano. E o uso de símbolos e a capacidade de resolver problemas

desenvolvem-se ao final do segundo ano de vida. É nessa fase que a

compreensão e o uso da linguagem se desenvolvem rapidamente.

Para a ação do desenvolvimento, seja ele cognitivo ou neural,

implica no processo sequencial de maturação e atualização de estruturas

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orgânicas e mentais (RELVAS, 2017). Piaget refletia o desenvolvimento

intelectual ou cognitivo como a aquisição de conhecimento pela criança. E

dessa forma, o conhecimento se constrói pelas interações com o meio.

A inteligência, na concepção piagetiana, segundo Santana (2006),

organiza-se através de estruturas que atuam como mediadoras entre as

funções invariantes no qual definem a própria essência, as características

amplas da atividade inteligente, e os diversos conteúdos comportamentais que

variam de acordo com a idade e são caracterizados por dados

comportamentais brutos.

Seria por meio das interações com o meio que a criança se adapta a

ele. A adaptação, nessa perspectiva, consiste de dois processos

complementares: assimilação e acomodação. Considerando que conhecer é

interpretar, atribuir significados, faz-se isso assimilando elementos do meio

onde a criança está inserida aos seus esquemas e estruturas cognitivas e

acomodando-os às novas exigências que o meio vai lhe impondo.

O desenvolvimento orgânico e a maturação formado pelo sistema

nervoso e pelos sistemas endócrinos é um dos quatro fatores do

desenvolvimento apontados por Piaget: “(...) a maturação desempenha um

papel durante todo o crescimento mental”. Embora, se conhecia muito pouco

na época de seu estudo: “(...) não sabemos, em particular, quase nada das

condições de maturação que possibilitam a constituição das grandes estruturas

operatórias” (PIAGET; INHELDER, 1986. p. 130).

No estágio sensório-motor de Piaget (aproximadamente de 0 a 2

anos de idade), a criança interage com os elementos de seu ambiente: através

de seus esquemas sensorial e motor, e atribui-lhes significado, ou seja, com a

determinação da finalidade de cada objeto, o que é para sugar, chacoalhar e

assim por diante. De acordo com seu estudo, a ausência da linguagem

impossibilita à criança representar mentalmente a realidade. Um objeto que

tenha sido removido de seu campo visual é como tivesse deixado de existir, por

isso ela não o procurará.

De acordo com Papalia (2006), Piaget afirma que o estágio sensório-

motor é composto de seis subestágios, que fluem de um para o outro à medida

que os esquemas de um bebê, seus padrões organizados de comportamento,

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tornam-se mais complexos. Durante os cinco primeiros subestágios, os bebês

aprendem a coordenar as informações dos sentidos e a organizar suas

atividades em relação a seu ambiente. No sexto e último subestágio, eles

progridem da aprendizagem por tentativa e erro para a utilização de símbolos e

conceitos para resolver problemas ssimple (PAPALIA, 2006).

Já neste período os esquemas diferenciam-se das ações por

conservarem uma determinada organização interna cada vez que aparecem,

constituindo-se em uma unidade básica do funcionamento cognitivo e no

processo que remete ao desenvolvimento da função simbólica para a

constituição do pensamento. Progressivamente, esses esquemas vão sendo

submetidos a um processo de diferenciação o que o levam à construção de

esquemas de ação que, ao se coordenarem, favorecem o surgimento de novos

esquemas. Por volta dos 2 anos de idade, esses esquemas de ação, devido ao

surgimento da função simbólica, convertem-se em esquemas representativos,

ou seja, em esquema de ação interiorizado (COLL; GILLIÈRON, 1987).

A relação existente entre formação de pensamento e aquisição da linguagem, na visão piagetiana, configura-se de caráter apenas correlacional, sendo o pensamento constituído por um processo bem mais amplo que remete ao desenvolvimento da função simbólica. Desse modo, na concepção piagetiana, defende-se que a maneira como a criança faz uso da linguagem, exprime o tipo de lógica que caracteriza seu pensamento. Afora isso, advoga-se também que a linguagem da criança preenche outras funções além da comunicação, observando, por exemplo, que durante seu desenvolvimento, a linguagem pode ser duplamente categorizada, ou seja, ela pode ser apreendida enquanto uma linguagem egocêntrica ou enquanto uma linguagem socializada (Flavell, 1988). (...). (SANTANA, 2006, p. 72)

Nesta concepção, segundo Santana (2006), existe uma lógica das

ações que precede a aquisição da linguagem, observada em uma fase pré-

verbal, anterior ao desenvolvimento da função semiótica, contrariando a

tendência do empirismo lógico de vincular a origem das operações intelectuais

à linguagem, através da tentativa de explicar o caráter operativo da lógica

enquanto circunscrito aos aspectos sintático, semântico e pragmático da

mesma.

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Embora Piaget muito tenha colaborado para o conhecimento do

desenvolvimento cognitivo humano, atualmente existem estudos que

contestam algumas de suas ideias. Em conformidade com Papalia (2006), nos

dias atuais existem cada vez mais indícios de que algumas das limitações

identificadas por Piaget nas capacidades cognitivas podem, em vez disso, ser

um reflexo da imaturidade das habilidades linguísticas e motoras desses

bebês. Com a utilização de tarefas simplificadas e modernos instrumentos de

pesquisa, alguns pesquisadores demonstraram habilidades cognitivas

diferentes daquelas apontadas por Piaget. A mesma autora exemplifica, dentre

outros citados, que estudos realizados desde o final dos anos de 1970,

utilizando metodologia de processamento de informações, sugerem que bebês

ainda muito jovens podem formar representações mentais - imagens ou

lembranças de objetos fisicamente ausentes - capacidade que, segundo a

teoria de Piaget, não aparecia antes dos 18 meses.

Certamente, o conhecimento progressivo do sistema nervoso não foi

ignorado por Piaget, pelo qual considerou a maturação do sistema nervoso

como uma condição necessária, embora não suficiente, do desenvolvimento

cognitivo. Entretanto, ao acompanhar a evolução dos conhecimentos sobre

sistema nervoso advindos da considerada “década do cérebro”, 1990, verifica-

se que grandes e importantes informações impulsionadas nessa época

permaneceram inacessíveis a Piaget.

Uma dessas informações é a respeito da plasticidade do cérebro, há

pouco tempo, acreditava-se que o sistema nervoso seria uma estrutura

programada não modificável, que mudaria apenas em uns poucos locais e sob

alguns poucos mecanismos (COSENZA; GUERRA, 2011). Mas, essa

propriedade do sistema nervoso permite o desenvolvimento de alterações

estruturais em resposta à experiência, e como adaptação ao meio, tornando

possíveis capacidades e comportamentos que se contrapõe de modo particular

com a ideia de interação sujeito-objeto que resultaria em construção de

conhecimento.

Compreender os processos de assimilação e acomodação de

Piaget, embora tenha abordado os aspectos psicológicos desses processos,

para estes seriam necessários compreender seus aspectos neurocientíficos, ou

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seja, as estruturas e funções do sistema nervoso constituem-se no substrato da

assimilação e acomodação.

O processo de troca entre o organismo e o meio está intimamente

ligado a ação do sistema nervoso central e periférico. Sternberg (2008) explica

que a principal função do sistema nervoso periférico é transmitir a informação

entre o sistema nervoso central e os nervos que se localizam fora deste, tais

como os dos órgãos sensoriais externos (como pele, ouvido, olhos) e de partes

internas do corpo (como estômago e músculos).

Esta comunicação entre as duas vias do sistema nervoso tanto

recebem a informação sensorial advindas dos nervos do sistema nervoso

periférico e transmitem a informação ao sistema nervoso central, quanto as

estruturas efetoras transmitem a informação motora do sistema nervoso central

ao sistema nervoso periférico.

Diante dessa perspectiva, os processos de assimilação e

acomodação de Piaget, podem ser explicados e analisados em termos

neurocientíficos pela atividade neuronal no qual as estruturas receptoras

recebem a informação do meio, a enviam para regiões específicas do córtex

cerebral, processando-a por meio de neurônios associativos, o que resulta em

resposta do organismo enviada ao meio por estruturas efetoras.

De acordo com Sternberg (2008), as áreas de associação

constituem cerca de 75% do córtex cerebral. Essas áreas integram partes

variadas das informações provenientes do córtex sensorial e enviam as

informações integradas ao córtex motor, dando início a um comportamento

intencional.

Ohlweiler (2006) considera as modificações anatômicas, funcionais e

as habilidades intelectuais de adaptação da criança ao referir-se à teoria do

desenvolvimento neurológico sequencial. Observando as diferentes etapas

deste desenvolvimento, pode-se analisar mudanças cerebrais que

correspondem aos estágios de desenvolvimento propostos por Piaget.

Na primeira etapa, é observado um desenvolvimento da substância

reticular ascendente, já em atividade desde o nascimento, mas adquire ação

plena aos 12 meses de idade.

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A segunda etapa, está relacionada ao desenvolvimento da área

motora primária e das áreas sensitivas primárias. As áreas sensitivas se

conectam com as motoras, tornando possível uma atividade sensório-motora,

que se desenvolve nos dois primeiros anos de vida. Corresponde ao período

sensório-motor de Piaget. A terceira etapa corresponde à maturação funcional

das áreas secundárias. Esta etapa inicia-se a partir das anteriores,

especialmente aos dois anos de vida, porém esta etapa se estende até os

cinco anos de idade.

A linguagem é um aspecto importante do desenvolvimento cognitivo.

No cérebro humano encontra-se circuitos especializados para o processamento

da linguagem. A primeira região, área de Broca, localiza-se no lobo frontal do

hemisfério esquerdo e está relacionada com a expressão da linguagem. A

segunda, área de Wernicke, localiza-se na junção entre os lobos temporal e

parietal do hemisfério esquerdo e está relacionada com a compreensão da

linguagem.

As influências sobre o desenvolvimento da linguagem incluem a

maturação cerebral e a interação social. Não podendo descartar que o

desenvolvimento e a expressão de diferentes emoções parecem estar

atrelados à maturação cerebral e ao desenvolvimento cognitivo (PAPALIA,

2006).

As emoções conferem, de acordo com Fonseca (2016), ao suporte

básico, afetivo, fundamental e necessário às funções cognitivas e executivas

da aprendizagem que são responsáveis pelas formas de processamento de

informação humanas, verbais e simbólicas. As funções cognitivas superiores

das aprendizagens mais complexas vão sendo construídas e reconstruídas

diante a dinâmica das reações comportamentais emocionais e afetivas.

Evoluindo a partir da integridade antecipatória das funções emocionais

(FONSECA, 2016).

Observa-se que cada vez mais existem turmas para o aprendizado

da dança com crianças nesta faixa etária. Diante disso, é necessário destacar

que o professor pode contribuir positivamente ao aprendizado da criança se

tomar ciência de toda essa transformação sofrida por ela. No processo ensino-

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aprendizado as emoções podem facilitar na aprendizagem, mas o estresse tem

efeito contrário (COSENZA; GUERRA, 2011).

Compreender a dança como expressão permite ter um espaço para

que a criança busque o conhecimento si, do outro e do meio no qual está

inserida. Embora a dança nesse conceito seja entendida como algo isolado a

proposta do conteúdo, é importante salientar que se os estímulos forem bem

aplicados possivelmente esse espaço terá resultados favoráveis aos objetivos

previsto para a aula. Pois, de acordo com Cosenza e Guerra (2011, p. 81), “a

maioria dos comportamentos motivados, direcionados para um objetivo, é

aprendida”.

A motivação parece ser resultante de uma atividade cerebral que processa as informações vindas do meio interno (fome, dor, desejo sexual) e do ambiente externo (oportunidade e ameaças) e determina o comportamento a ser exibido. A motivação não se refere a comportamentos reflexos ou localizados, mas envolve a aprendizagem e outros processos cognitivos que se encarregam da organização das ações que melhor garantam a sobrevivência. Geralmente, mais de uma alternativa comportamental está disponível, e o processamento deve ser capaz de fazer escolhas e priorizar o comportamento mais adequado para aquela situação. (COSENZA; GUERRA, 2011, p. 81)

Aprender através da experiência sugere uma interação mais íntima e

efetiva entre as emoções e a cognição, entre processos corporais e a

motricidade e processos relacionados com o cérebro e a mente. Para que as

crianças possam experienciar e vivenciar seus corpos de maneira

transformadora é necessário permitir o conhecimento dos seus próprios

sentidos.

2.1.3. O desenvolvimento na segunda infância (3 aos 6 anos)

Nesse período, costuma-se denominar como o período pré-escolar,

as crianças passam da primeira para a segunda infância. Os corpos passam

por uma significativa mudança tornando-se mais delgados e atlética, com

capacidades motoras e mentais mais aguçadas e personalidades e

relacionamentos mais complexos. Essas mudanças na aparência refletem os

desenvolvimentos no interior do corpo (PAPALIA, 2006).

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Papalia (2006) afirma que o desenvolvimento muscular e esquelético

continua tornando as crianças mais fortes. As cartilagens transformam-se em

ossos de maneira mais acelerada do que anteriormente, e os ossos tornam-se

mais duros, dando à criança uma estrutura mais firme e protetora dos órgãos

internos.

Essas mudanças físicas coordenadas pelo amadurecimento do

cérebro e do sistema nervoso, promovem o desenvolvimento de uma variedade

de habilidades motoras. A maior capacidade dos sistemas respiratório e

circulatório produzem vigor físico e, juntamente com o desenvolvimento do

sistema imunológico, mantém as crianças mais saudáveis (PAPALIA, 2006).

Na teoria piagetiana, no início do estágio pré-operacional,

equivalente dos dois aos seis anos, aproximadamente, a criança se locomove

sozinha e obtém um amplo vocabulário. Tais características alteram de forma

significativa as interações da criança com o meio físico e, também, social.

Nesse estágio a criança seria portadora de perguntas e criações, com

atribuição de qualidades materiais a coisas imateriais e subjetividade a bens

inanimadas. Portanto, a criança já possui o conceito de objeto permanente,

porém ainda não desenvolveu a noção de conservação, seu pensamento ainda

não está dotado de reversibilidade (PIAGET; SZEMINSKA, 1981).

O terceiro estágio da teoria Walloniana, o personalismo,

corresponde a faixa etária dos três aos seis anos. Esta consiste na fase de se

descobrir diferente das outras crianças e adultos. No personalismo, assim

como na puberdade e na adolescência, a afetividade encontra-se mais

evidenciada (MAHONEY; ALMEIDA, 2005). Para Wallon, de acordo com

Galvão (1995), para a compreensão do processo de construção do sujeito, é

necessário observar a relação de reciprocidade e interdependência entre o

afetivo e o cognitivo.

Nesta etapa, o caráter expressivo da motricidade ainda se mostra

preponderante. Como também, a motricidade desempenha papel fundamental

no processo mental, constituinte do suporte à expressão do pensamento

(GALVÃO, 1996).

Mahoney e Almeida (2005) expõem que o estágio de personalismo

está marcado por 3 etapas distintas: Oposição, sedução e imitação. Galvão

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(1995) declara a oposição como recusa e reivindicação. De acordo com a

teoria walloniana, a criança, por volta dos três anos, opõe-se sem motivo

aparente, em busca da afirmação de si e de diferenciar-se do outro. Assim, a

criança mostra o sentido de propriedade, entretanto reconhece o sentido de

partilha. Apesar da distinção, sente prazer em misturar realidade e fantasia em

suas brincadeiras.

Quanto a sedução, esta liga-se à necessidade de ser admirada, de

sentir ser agradável, pois só assim poderá se admirar também. Galvão (1995)

afirma que graça e timidez, maneirismo e falta de habilidade alternam-se neste

estágio, como também, em busca de apoio, de fazer valer seus méritos a fim

de obter uma satisfação narcísica, utiliza um tom sedutor para a demonstração

das suas habilidades. Mas percebe que pode ter sucesso ou fracasso

tornando-se não só competitiva, mas ciumenta, em decorrência da ansiedade,

inquietação, conflitos e decepções se está correspondendo à expectativa do

outro ou não.

Embora a existência de conflitos, nas relações da criança com o seu

meio demarcadas por atitudes de oposição e afirmação de si, aparentemente,

existe uma necessidade de assegurar-se de afeto e proteção das pessoas

envolvidas em seu meio.

A imitação, nesse caso, perpassa de um gesto simples para um

papel, um personagem, um ser preferido e, em algumas vezes, desejado.

Dessa forma, amplia sua capacidade pelo movimento de incorporação do

outro. Esse que exige um movimento de interiorização e exteriorização que

torna possível copiar e assimilar as qualidades e méritos da pessoa ou

personagem observado e posteriormente reproduzi-lo de forma enriquecida

(GALVÃO, 1995).

Para Wallon, de acordo com Galvão (1995), a imitação possui graus

de evolução: a sensório-motor no qual repete o gesto que acabou de ser feito

na sua frente; a projetiva que consegue realizar uma imitação de algo que

ocorreu após um período de incubação; e o personalismo onde a criança imita

a pessoas ou personagem que admira, ampliando a sua própria capacidade.

Em comparação do estágio de desenvolvimento pré-operatório de

Piaget com a terceira etapa da teoria do desenvolvimento neurológico

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sequencial destacado por Ohlweiler (2006), esta faixa etária corresponde à

maturação funcional das áreas secundárias. Esta etapa, como citado

anteriormente, inicia-se a partir das anteriores, especialmente aos 2 anos, se

estendendo até os 5 anos de idade. De acordo com Ohlweiler (2006), as áreas

secundárias recebem informação das primárias e de estruturas subcorticais

que tornam possíveis processos motores e perceptuais complexos. Nesta

etapa inicia o desenvolvimento da linguagem e a lateralização dos hemisférios

cerebrais. Em correlação à descrição de Piaget do desenvolvimento cognitivo,

este corresponde ao pensamento representativo e de preparação para as

operações concretas.

Papalia (2006) declara que durante a segunda infância, as crianças

apresentam uma melhora significativa da atenção e da velocidade e eficiência

com que processam as informações, dando início a formação de memórias de

longa duração. Para Cosenza e Guerra (2011) a atenção não é um fenômeno

unitário e, dessa forma, existem diferentes mecanismos pelos quais podem se

regular. Existindo pelos menos três circuitos nervosos importantes ao

fenômeno da atenção.

Um aspecto do funcionamento do cérebro que deve ser considerado

ao analisar a atenção é o nível de vigilância ou de alerta em que o sujeito se

encontra no determinado momento. O principal circuito do sistema funcional

para a regularização do estado de vigilância fica localizado no mesencéfalo

(porção do encéfalo abaixo do cérebro), sendo o principal neurotransmissor, a

noradrenalina que mantém a regulação do estado de alerta do organismo. A

classificação da atenção pode ser dada entre a atenção reflexa, comandadas

por estímulos periféricos, e a atenção voluntária regulada por aspectos centrais

do processamento cerebral (COSENZA; GUERRA, 2011). O segundo, é o

circuito orientador, localizado no córtex do lobo parietal, no qual permite o

desligamento do foco atencional de um determinado ponto e dirigindo-se para

outro sentido, permitindo a discriminação do que irá ser observado. O terceiro é

o circuito executivo responsável por manter a atenção e inibir os estímulos

distraidores (COSENZA; GUERRA, 2011).

A respeito da memória Relvas (2009) afirma que é uma das funções

mais significativas do cérebro por estar ligada ao aprendizado e à capacidade

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de repetir acertos e evitar erros. A memória de longo prazo permite armazenar

informações por longo período, embora a capacidade de armazenamento seja

limitada. Esta pode ser explícita que envolve mecanismos conscientes ou

implícita, processada de forma inconsciente.

Os registros da memória explícita se formam por meio de processos

de repetição juntamente com sua elaboração, fortalecendo o traço de memória,

o tornando mais duradouro, e o processo de consolidação, indispensável para

que os registros fiquem retidos por um tempo maior no cérebro. A consolidação

da aprendizagem se faz durante o sono, dependendo do hipocampo. O

hipocampo e as áreas corticais adjacentes são importantes para a

consolidação da memória, que envolve o estabelecimento de novas conexões

entre as regiões corticais (COSENZA; GUERRA, 2011).

Os registros da memória implícita, ocorrem de maneira

independente dos processos conscientes. É dividida em diferentes processos,

mas Cosenza e Guerra (2011) destacam a memória de procedimentos que

envolve as habilidades sensório-motoras. Ela se instala por meio do processo

de repetição e não se organiza em redes, mas se limita ao aperfeiçoamento ou

reforço das conexões em circuitos específicos. Esta memória não depende do

hipocampo e do lobo temporal medial, mas o que pesquisas indicam é que está

coordenada no cérebro pelo corpo estriado (COSENZA; GUERRA, 2011).

Pode-se constatar que a memória de procedimentos está presente nas mais

diversas atividades humanas, mas, em especial, na dança por envolver

habilidades motoras.

A tarefa central do estágio personalismo é a formação do “eu”, o

qual, segundo Galvão (1996), até então encontra-se em um estado de

sincretismo e indiferenciação. E de acordo com a mesma autora, a vivência

desse processo se dá nas interações sociais definindo a predominância das

relações afetivas com o meio e a necessidade de expressão da subjetividade.

Para o processo ensino-aprendizagem nesse contexto necessita de

diferentes atividades e a possibilidade de escolha. O essencial em sala de aula

é reconhecer e respeitar as diferenças existentes. Reconhecer e chamar pelo

nome, mostrar que a criança está sendo vista e dar oportunidade de se

expressar são importantes, dentro de outras ações, para esta fase do

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desenvolvimento. Pois a consolidação da função simbólica e a diferenciação do

“eu” realizadas nesse estágio “possibilitam ao estágio seguinte a realização de

importantes avanços no plano da inteligência, na direção de uma compreensão

cada vez mais objetiva do real” (GALVÃO, 1996, p. 46).

2.1.4. O desenvolvimento na terceira infância (6 aos 11 anos)

Nesta faixa etária diferente da segunda infância, o crescimento em

peso e em altura é consideravelmente mais lento. Entretanto, Papalia (2006)

reconhece que por mais que as mudanças diárias possam não parecerem

óbvias, produzem uma diferença significativa entre crianças de 6 anos e 11

anos.

Papalia (2006) considera haver poucas diferenças nas habilidades

motoras na comparação entre meninos e meninas com pouca idade. Essa

afirmação muda à medida que as crianças se aproximam da puberdade. Outro

dado importante é que as diferenças de gênero são consideradas por Papalia

(2006), em parte, devido ao maior crescimento e à força dos rapazes e à

corpulência das moças. Mas destaca ser em grande parte da colaboração

dessa diferenciação entre os gêneros às diferentes expectativas culturais e

experiências, aos diferentes níveis de treinamento e às diferentes taxas de

participação.

No estágio de operações concretas, as crianças podem realizar uma

variedade de tarefas em um nível mais elevado do que podiam no estágio pré-

operacional. São mais proficientes em tarefas que exigem raciocínio lógico,

como pensamento espacial, compreensão de causalidade, categorização,

conservação e operações numéricas, de acordo com a teoria piagetiana. A

coordenação dos diferentes esquemas propostos por Piaget, conduziria a

inferências práticas que comportariam, ademais, às noções de conservação e

reversibilidade operatória.

Embora as características do pensamento operacional concreto e a

sequência de progressão nas habilidades cognitivas pareça universal, o ritmo

de desenvolvimento em alguns domínios pode depender de fatores culturais

(DASEN, 1994 apud PAPALIA, 2006). A experiência cultural tende a contribuir

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ao desenvolvimento das habilidades piagetianas. O pensamento torna-se

progressivamente mais reversível, neste estágio embora a criança seja capaz

de representar e operar mentalmente situações que vivenciou concretamente.

Segundo Piaget e Inhelder (1986) o desenvolvimento moral está

ligado à maturação cognitiva e ocorre em duas etapas: na moralidade de

restrição, no qual corresponde aproximadamente ao estágio pré-operacional, e

na moralidade de cooperação, que corresponde aos estágios de operações

concretas e operações formais.

Na comparação do estágio de desenvolvimento operatório concreto

de Piaget depare-se com a quarta etapa da teoria do desenvolvimento

neurológico sequencial trazido por Ohlweiler (2006), é visto que nesta etapa

origina-se o desenvolvimento das áreas terciárias da segunda unidade

funcional, localizadas na região parietal. Essa permite a produção de atividades

mentais complexas relacionadas com o nível simbólico e conceitual. Ohlweiler

(2006) aponta que o máximo de desenvolvimento desse sistema funcional

ocorre entre os 5 e os 12 anos de vida.

No estágio categorial de Wallon, entre os 6 e 11 anos, configura-se

como uma etapa em que o interesse se desvia da subjetividade e se volta ao

meio exterior. Segundo Galvão (1996), este período é marcado pelo desejo de

conhecer e conquistar o mundo exterior. Dessa forma, o gosto da criança

cresce de acordo com a sua capacidade de compreender manipular e

transformar.

Contrário do estágio anterior, que a compreensão de objeto estava

relacionada às suas experiências emocionais, nesta fase há um predomínio

cognitivo e a interação com o conhecimento objetivo se faz necessária

(GALVÃO, 1996; 1995). A diferenciação mais clara entre o “eu” e o outro

permite condições mais estáveis para a exploração mental do meio externo

através da utilização de atividades cognitivas de agrupamento, classificação,

categorização nas mais variadas abstrações no período pré-categorial (6 a 9

anos) até se alcançar o pensamento categorial (9 a 11 anos) (MAHONEY;

ALMEIDA, 2005).

Estas duas etapas consistem ainda pela presença do sincretismo na

etapa do pensamento pré-categorial e na formação de categorias intelectuais

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como elemento da classificação, pelo qual permite que a criança se posicione

no mundo utilizando categorias para ordenar a realidade, durante o

pensamento categorial. Em conjunto caracterizam a inteligência discursiva

(GALVÃO, 1995).

Galvão (1995) afirma que o início do estágio categorial é marcado

pela capacidade de autodisciplina mental, a atenção. Como foi colocado

anteriormente, a atenção é o nível de vigilância ou de alerta em que o sujeito

se encontra em determinado momento. E se os aspectos já citados forem

levados em consideração, as atividades que façam parte da vivência dessas

crianças podem despertar maiores interesses e, consequentemente, serem

alvo da atenção. Pois nesse estágio a criança consegue permanecer atenta a

uma atividade por mais tempo e a sua motricidade nos gestos estão mais

precisas e localizadas.

O pensamento categorial sob a ótica da teoria walloniana consiste

no amadurecimento dos centros de inibição e discriminação o que, para Galvão

(1995), estão por trás da disciplina mental. Com a redução do sincretismo entre

os 6 e 9 anos, a passagem desses centros exigem uma nova possibilidade de

discriminação, sendo citado a diferenciação do que pertence à realidade, ao

mito, à religião e estabelecer hierarquia nas operações mentais. Após os 9 ou

10 anos, as categorias intelectuais possibilitam à criança, segundo Galvão

(1995), a identificação, a análise, a definição e a classificação dos objetos ou

das situações. É possível se fazer comparações e assimilações sistemáticas e

coerentes. Como resultados, a mesma autora coloca que o pensamento da

criança nesta fase se organiza em torno de noções fundamentais que ordenam

os dados da realidade: a noção de tempo, de espaço, de causa.

Dentre os resultados apontados por Papalia (2006), acima citado,

pode-se analisar dois deles através dos estudos de Laban dentre os quatro

fatores que imprimem qualidades específicas ao movimento: Fluência, Espaço,

Peso e Tempo.

Fator é um conceito que engloba os elementos que compõem o movimento e como tal, faz parte dos fenômenos da natureza. Deste modo os fatores estão no agente, naturalmente presentes. No entanto, é preciso uma atitude interna ativa do agente para com eles, de outra forma, o movimento permanece indiscriminado. A partir desta atitude e gerado, sucessiva ou

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simultaneamente, um modo de o movimento acontecer. Este modo de o movimento acontecer e o esforço, o qual, com suas qualidades, discrimina modos de expressividade. (RENGEL, 2001)

O fator Espaço é o segundo elemento observado no

desenvolvimento do sujeito e responde pela sua boa comunicação. A

comunicação que possibilita o sujeito se relacionar com o outro e com o seu

meio. A atitude relacionada ao espaço é a atenção, no qual afeta o foco do

movimento. As características desse fator levam ao movimento um aspecto

intelectual da personalidade, pois, de acordo com Rengel (2001), as

localizações no espaço são complexas e requerem atenção. O treinamento

com este fator e suas qualidades pode gerar atitudes internas alertas ou

exploratórias.

O fator Tempo é o quarto elemento no desenvolvimento do sujeito,

tendo como qualidades de esforço: súbita e sustentada. Segundo Rengel

(2001), Laban preferia utilizar os termos sustentado e súbito por considerar

rápido e lento como termos quantitativos, enquanto sustentado e súbito

requerem uma atitude interna de sustentação ou aceleração do tempo,

passando, assim, à aspectos qualitativos. Considera que este fator traz ao

movimento, um aspecto mais intuitivo da personalidade, e o mesmo auxilia na

operacionalidade do movimento ou da ação (RENGEL, 2001).

Para Papalia (2006), a capacidade da memória de trabalho aumenta

de maneira considerável durante a terceira infância, assim como o tempo de

reação, a velocidade de processamento, a atenção seletiva e a concentração.

A memória de trabalho é a memória onde são armazenadas e processadas as

informações necessárias ao desempenho de uma atividade que requer a

consciência (COSENZA; GUERRA, 2011). De acordo com Relvas (2009) essa

memória é sustentada pela atividade elétrica dos neurônios do córtex pré-

frontal que interagem com outros neurônios durante a percepção, aquisição ou

evocação da memória.

A metamemória, o conhecimento sobre a própria memória, e a

atenção seletiva melhoram durante a terceira infância. Com isso, as crianças

tornam-se mais competentes na utilização de estratégias mnemônicas, como

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os recursos mnemônicos externos, o ensaio, a organização e a elaboração

(PAPALIA, 2006).

A educação tem como objetivo o desenvolvimento de novos

conhecimentos ou comportamentos. Caracteriza-se por um processo que

envolve a aprendizagem, que por sua vez é mediada por propriedades

estruturais e funcionais do sistema nervoso. É essencial que, além de dispor de

diferentes recursos ao acesso da informação, se observe e estimule as

crianças em um processo facilitador.

Embora cada estágio seja único e completo, é necessário permitir a

expressão, a experimentação e a reflexão como fontes de conhecimento que

possibilitem relações humanas e culturais. É preciso permitir a valorização das

diferenças e o respeito dos limites individuais, pressupõe ser o

desenvolvimento um processo constante de transformação.

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CAPÍTULO III

Observar, imitar, refletir, criar...

Fazendo uma analogia, observa-se que todos os povos, desde a

Antiguidade, cultivavam formas expressivas. E não diferente das organizações

sociais, a dança sofreu, ao longo do tempo, influências do desenvolvimento

socioeconômico e sociocultural dos povos.

Considerada a arte do movimento, a dança para diferentes autores

proporciona uma ampla consciência corporal, contribuindo para o

desenvolvimento das funções intelectuais como a criatividade, observação,

exploração, atenção, memorização, poder de crítica, raciocínio e reflexão. Além

disso, é considerada a aprendizagem de valores humanos através da relação

da consciência de si, do outro e do mundo através da vivência do corpo em

suas diferentes dimensões.

Para Nanni (2001) a prática regular da dança possibilita alguns

benefícios como a melhora da capacidade física seja ela motora, articular,

muscular e/ou cardiorrespiratória que possibilitam uma infinitude de

movimentos, como também destaca o aumento na capacidade de comunicação

e a melhora na autoestima. Para Achcar (1998), a dança para o

desenvolvimento das crianças é fundamental, tanto para sua formação artística

quanto para sua integração social por permear entre os estímulos táteis,

visuais, auditivos, afetivos, cognitivos e motor.

A educação pela dança, além de ser uma ferramenta com funções e

propósitos à escola, trata de conhecimentos próprios, além dos benefícios que

são proporcionados. A expressão por meio de movimentos acompanha todo o

desenvolvimento humano. É fundamental refletir, nesse caso, sobre o fazer e o

pensar na dança, na maneira como se pode construir um planejamento

profundo e consciente dos objetivos a serem alcançados bem como a utilização

das relações interdisciplinares que permitam o uso dos conhecimentos, das

habilidades e competências, além da própria consciência do corpo sobre as

individualidades e limitações de cada ser humano.

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Para a estruturação e organização das ideias ou ações

educacionais, entende ser necessário desenvolver metodologias que

possibilitem um aprendizado transformador. Segundo Marques (2003), a

dança, inserida nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) aponta para a

necessidade de maior comprometimento nesta área de conhecimento e

considera a linguagem da dança como uma área privilegiada para que se

possa trabalhar, discutir e problematizar a pluralidade cultural social.

O ensino da dança é enriquecido de uma amplitude que envolve de

forma integral o físico, o psíquico, o cognitivo e o emocional. E de acordo com

as ações pedagógicas utilizadas estas podem permitir infinitas experiências e

vivências através do movimento integrado às habilidades corpóreas e criativas

da criança em seu processo de desenvolvimento cognitivo. A aprendizagem em

dança, tanto se relacionada à prática propriamente dita, como pela observação.

Ambas utilizam circuitos neurais que dão suporte a organização de ações

complexas. O aprendizado pela observação pode ser utilizado, por exemplo,

para outras habilidades cognitivas. (GAZZANIGA, 2008).

Diante disso, a dança será aqui considerada como resultado da

integração entre o movimento e a cognição. Questões sobre diferentes

aspectos cognitivos envolvidos na aprendizagem levaram ao estudo de alguns

processos cognitivos e neurais envolvidos na execução, expressão e

observação da dança.

3.1. As áreas e a organização do movimento voluntário

A dança compreendida como linguagem corporal e constituída por

movimentos voluntários expressivos provido de ritmos e carregado de sentidos,

torna-se, passível de ser analisada neurofisiologicamente. A aprendizagem

motora pode estar associada à prática ou à experiência que pode trazer

mudanças na capacidade de produzir uma ação de maneira hábil. Um dos

processos da aprendizagem da dança perpassam pela observação, imitação,

repetição e o exercício consciente. Entretanto, o resultado em um ato motor

consciente, voluntário e objetivado requer atenção e a conscientização do

movimento, além da intencionalidade intrínseca à dança. Tais capacidades são

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adquiridas através da experiência, somados aos princípios cerebrais da

percepção e controle do movimento (HAGENDOORN, 2004).

O movimento é realizado por meio da interação entre os sistemas

sensório-motor, cognitivo e afetivo/emocional. Segundo Brown e Parsons

(2008), as áreas de processamento sensorial nos lobos temporal, occipital e

parietal interpretarão os sinais recebidos do meio externo e interno, enviando

sinais para as áreas de planejamento do movimento no córtex frontal.

Explicado por Relvas (2009) ser, o lobo frontal, o responsável pela elaboração

de pensamento, planejamento, programação de necessidades individuais e da

emoção.

No córtex pré-frontal processa-se o tipo mais adequado do

movimento a ser executado, enviando sinais para a área motora suplementar,

cerebelo e núcleos da base, responsáveis pela estratégia motora (BROWN;

PARSONS, 2006; 2008). O cerebelo e os núcleos da base controlam a

execução do movimento realizada pelos músculos que, por meio de órgãos

sensoriais, enviam informações a respeito da orientação do corpo no espaço

(RIBEIRO, 2007). Dessa forma, é possível realizar readequações nos

movimentos, se necessário. Assim, a ação motora se resulta da integração dos

estímulos sensoriais e motores de forma voluntária e dotada de

intencionalidade.

O córtex pré-frontal e a área motora suplementar, basicamente, se

comunicam com o córtex motor primário, que por sua vez determina quais os

músculos precisam se contrair e a intensidade, após, envia as informações

pela medula espinal até os músculos (BROWN; PARSONS, 2006).

O ajuste fino decorre, em parte, segundo Brown e Parsons (2006), à

medida que os músculos devolvem os sinais para o cérebro. Assim, o cerebelo

usa a resposta muscular para auxiliar a manutenção do equilíbrio e aprimorar

os movimentos. Além disso, os gânglios da base reúnem informações

sensoriais das regiões corticais e as transmitem por meio do tálamo até áreas

motoras do córtex.

Na dança, a demonstração é uma das formas de ensino mais

utilizadas para a instrução dos movimentos. Nessa condição, a informação

visual é recebida e após a visualização da ação, o estudante tenta reproduzir

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uma versão do movimento a partir das informações retidas, se utilizando do

foco atencional. Mas para que haja êxito é necessário que se tenha as

capacidades físicas, cognitivas e emocionais para desenvolver a ação do

movimento dançante.

Durante o processo desse aprendizado associativo, ao ser

observado a ação executada pelo professor, internamente há uma simulação

do movimento. Essa ação simulada é definida por Jeannerod (1994) como uma

representação interna do programa motor sem o movimento explícito,

possuindo, assim, uma rede neural, ou seja, um circuito específico à ação

simulada.

Decety et al. (1995; 1994) demonstraram que regiões cerebrais

ativadas durante os movimentos imaginados também são ativadas na

execução dos movimentos. Bouquet et al. (2007) declaram que o sistema

motor não somente executa a ação, mas também ressoa com as ações

observadas. Esse ressoar pode ser entendido como a própria simulação do

movimento. De acordo com essas pesquisas, a experiência física do

movimento altera as bases neurais dos processos de simulação motora. Pode-

se considerar então, que com o aprendizado prévio e adequado, novas

combinações sequenciais de movimentos semelhantes serão por certo

aprendidas mais facilmente.

A imitação possui um circuito neural específico assim como a

simulação, exigindo a interação de funções visuo-motoras. Iacoboni (1999)

considera três regiões corticais próximas do sulco lateral: o córtex parietal

posterior, córtex frontal inferior e o córtex temporal superior. A última forneceria

uma descrição visual da ação observada para os neurônios espelho do córtex

parietal, codificando inicialmente a descrição da ação a ser imitada. Para

Ribeiro e Teixeira (2008) os neurônios espelho do córtex parietal posterior

forneceriam informações somatossensoriais adicionais da ação observada e as

enviariam para os neurônios espelho localizados no córtex frontal inferior,

detalhando as especificações motoras à ação a ser copiada. E por fim, no

córtex frontal inferior, os neurônios espelho codificariam o objetivo da ação a

ser imitada (IACOBONI, 2005).

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O conhecimento da ação é, dessa forma, o resultado da associação

entre a representação de um movimento e suas consequências. É com os

neurônios espelho que tal conhecimento pode ser atribuído pelas ações

observadas. O significado da ação que foi observada é reconhecido devido a

similaridade entre duas representações: da gerada internamente durante a

ação e da evocada por estímulo (RIZZOLATTI et. al., 1996).

Ribeiro e Teixeira (2008) dividem em três estágios o processo de

aprendizagem da dança que reflete no processo de imitação, repetição e

automatismo.

O primeiro é denominado como estágio cognitivo. Nesta fase

acontece um esforço cognitivo devido o envolvimento do bailarino/estudante a

compreensão da natureza da tarefa motora e, posteriormente, pelo

desenvolvimento de estratégias para atingir o objetivo. Nesse caso, requer

intensa atividade de regiões corticais pré-frontais responsáveis pela atenção

seletiva, além das áreas que estão relacionadas mais especificamente com a

produção motora, como as áreas motora primária, motora suplementar e pré-

motora.

Na segunda fase, consiste no aprendizado associativo, no qual há

uma seleção de estratégias para atingir o objetivo. O intérprete inicia um

processo de refinamento do movimento por meio da repetição. Nesse

momento, coexiste a aprendizagem processual e a declarativa. As ações

podem ser executadas sem a necessidade de se focar a atenção, em outras

palavras, sem um pensamento consciente sobre o ato motor.

Na terceira fase, denominado como estágio autônomo ou

“automatismo”, concentra-se em uma tarefa secundária, o que para Ribeiro e

Teixeira (2008) se refere a especialização da sequência e a otimização da

eficiência do movimento. Exemplificam analisando o momento em que o

bailarino se emociona ao executar a coreografia ou quando tem que lidar com

algum imprevisto na execução coreográfica ou no espaço físico onde ela é

realizada.

Desconhece-se que, no sentido neural, a automatização é um mecanismo protetor, permitindo a ativação simultânea de vários circuitos no momento da execução da coreografia. Isso ocorre possivelmente devido à liberação de circuitos pré-frontais cujas funções passam a ser controladas em parte pelo

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cerebelo e pelos núcleos da base. Essa mesma liberação pode ser o que permite a relação das seqüências com algum tipo de emoção que as “acompanha”, dotando o bailarino de um “quê” especial que o distingue dos demais. (RIBEIRO; TEIXEIRA, 2008, p. 227)

Para Ribeiro (2007) o automatismo é acompanhado por uma série

de funções cognitivas superpostas. E a experiência individual não está apenas

baseada nas informações provenientes dos sentidos, mas formada pelas

memórias, desejos e intenções, condicionadas pelas expectativas, emoções e

contingências do estado físico do corpo.

A partir dessa análise, em especial sobre os neurônios espelho,

entende que ao ser observada as ações, diferentes representações mentais

podem vir a estar envolvidas numa espécie de associação dos movimentos ao

planejamento dos próprios movimentos. A percepção visual faz com que se

inicie uma simulação interna das ações a serem realizadas. Por sua vez, a

ativação de simulação motora por meio da observação pode ter importante

participação para o aperfeiçoamento da aprendizagem de uma determinada

habilidade. Por esta razão que os neurônios espelho foram associados a outras

mudanças no comportamento humano além da imitação, propriamente dita.

Portanto, a aprendizagem da dança por meio de sequências

coreográficas, como foi colocado, envolve uma variedade de requisitos

neurobiológicos que podem ser observados através de um mapeamento neural

dos processos de observação, simulação, imitação e repetição.

3.2. Os processos em uma metodologia criativa/exploratória

Salientar aspectos neurofuncionais dentro da dança contemporânea

ou na dança criativa é de um grande desafio e complexidade. Contrário da

metodologia tradicional, neste caso apoia-se primordialmente em referências

internas e pessoais. Para Marques (2012, p. 18) “compreender a dança como

expressão é também acreditar na possibilidade de a criança ser autora de suas

danças, ou seja, possibilitar que ela crie, invente, componha”.

A abordagem das aulas e improvisações é mediada pelo professor e

durante a criação gera-se ampla possibilidade de aprendizado e compreensão

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através da experimentação pelo corpo em movimento. Estes

movimentos/criações também podem propor múltiplas relações entre diferentes

aspectos físicos, cognitivos, emocionais e socioculturais.

A pesquisa corporal decorre do estudo através da fisicalidade,

possuindo como caminho a experiência da percepção sensorial e motora.

Dessa forma, o movimento é construído pelo diálogo entre o “dentro e fora”

representado pelo fluxo das ações no espaço/tempo (GREINER, 2005). E

pode-se acrescentar, o diálogo de fora para dentro, levando-se em conta os

estímulos externos que fazem parte de maneira significativa para o processo

de desenvolvimento.

Com relação aos estímulos externos, que também podem ser uma

ação no qual foi observada sugere novamente considerar os neurônios

espelho, os quais possuem concomitantemente propriedades visuais e

motoras, sendo responsáveis por codificar tanto a informação relativa à ação

motora quanto à informação da observação dessa ação (COSENZA; GUERRA,

2011; RIBEIRO; TEIXEIRA, 2008; RIBEIRO, 2007; IACOBONI, 1999).

Tourinho e Silva (2006), acerca da preparação técnica de um

intérprete de dança contemporâneo, defendem que o conceito de estudo do

movimento que desenvolva o autoconhecimento coloca o bailarino

contemporâneo dentro de um outro paradigma. Não sendo mais necessário

incorporar códigos rígidos e preestabelecidos, mas a recriação desses. Com

isso, destacam a possibilidade de se “dançar com o corpo que se tem, com seu

corpo próprio, e não com o corpo que se imagina ter” (TOURINHO; SILVA,

2006, p. 131).

A preparação corporal implica em estimular toda a corporeidade

para um trabalho artístico e, por consequência, abordar os aspectos

fisiológicos, emocionais e energéticos do ser humano (TOURINHO; SILVA,

2006). E para os mesmos autores, implicam também em auxiliar o intérprete a

compreender, de maneira mais ampla, que todos esses aspectos agem em

comunhão durante a cena.

Nesse contexto, a dança se utiliza da dinâmica do movimento

humano como forma de expressão e a experiência estética por meio da

subjetividade existente no movimento que lhe é particular. É válido ressaltar

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que a criança sofre constantes transformações a partir da relação com o outro.

Por esse fato, o ambiente assim como a mediação precisam ser pensados para

se fazer emergir todas as potencialidades existentes nessa criança.

Na dança contemporânea ou na dança criativa, por exemplo, há

múltiplas proposições, além de estarem vinculadas a diferentes olhares e

percepções, o que admite a transitoriedade e multiplicidade de ideais presentes

no movimento contemporâneo. Dessa forma, cabe levar em consideração a

atividade e a mediação proposta pelo professor, se esta se fará em favor à

algum dos aspectos do desenvolvimento motor, cognitivo, emocional e mesmo

a relação com o outro.

Hagendoorn (2004) propõe que os sentimentos experimentados ao

assistir a dança são um produto de uma variedade de processos sensoriais,

cognitivos e emocionais. Esses sentimentos não seriam acidentais, mas

dependentes de propriedades dos processos cerebrais envolvidos na análise

dos estímulos sensoriais e na interação das expectativas, associações e

preferências pessoais.

Na proposta trazida por Marques (2010) considera o diálogo entre a

proposta da Abordagem Triangular e o ensino da dança em favor a experiência

como um mecanismo sensibilizador e propiciador de conhecimento e de

desenvolvimento do pensamento. Em conformidade aos conceitos de

contextualizar e de fazer em dança, é remetido a ideia do questionar,

pesquisar, refletir criticamente e os diferentes contextos em que essa se insere

e se relaciona. Em contrapartida, o conceito do fazer relaciona-se com a

condição de experimentar e criar diferentes movimentos, que podem resultar

em estilos, gêneros ou linguagens de dança ou mesmo serem abordados de

modo mais livre, através de improvisações ou outras estratégias de exploração

e investigação do movimento. Por fim, a apreciação se refere ao comunicar e

dividir experiências através da dança, atribuindo sentidos e interpretando

significados não rígidos.

(...) o movimento pode ser decifrado como a matriz cinética do pensamento do corpo. A hipótese de que o corpo, tal como o cérebro, também possui um pensamento, permite que se desloque a ênfase usual do entendimento da dança. Pensamento, aqui, deve ser entendido como uma ação movida por um propósito. (KATZ, 2005, p. 84)

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Entender a dança como um pensamento do corpo, uma ação movida

por um propósito, e o movimento como uma matriz cinética desse pensamento,

aproxima aos questionamentos que motivaram algumas pesquisas mais

recentes em neurociência.

No campo da neurociência, os estudos sobre a ativação de áreas

cerebrais durante os passos de dança, demonstram processos neurais

complexos detrás da habilidade de dançar. A convergência de movimentos,

ritmo e representações gestuais na dança, de acordo com Brown e Parsons

(2008), acionam uma coordenação interpessoal no espaço e no tempo

enquanto a intenção, sincronismo, consciência espacial e equilíbrio estão

sendo melhor mapeados. Outro dado importante, é que pesquisas sugerem

que os seres humanos mentalmente ensaiam o que está vendo. Os circuitos de

imitação no cérebro são mais ativados à medida que há o aprendizado motor.

Quanto mais experiente uma pessoa se torna em um determinado padrão motor, melhor consegue imaginar qual a sensação de executá-lo, e assim fica mais fácil realizá-lo. (...) não é uma atividade simplesmente visual, também cinestésica. (...) verdadeira aptidão exige, de certo modo, a criação de uma imagem motora nas áreas de planejamento do movimento do cérebro. (PARSONS E BROWN, 2009, p. 66)

Mas os aspectos da cognição incorporada no aprendizado da dança

interligam-se ao estudo do conhecimento do controle motor, da experiência e

da percepção da ação. Tais relações decorrem por processos cognitivos e

neurais envolvidos na execução, expressão e observação da dança associados

à sua aprendizagem.

Encontra-se nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) que o

fazer e conhecer arte faz com que se percorra por trajetos de aprendizagem

que propiciam conhecimentos específicos sobre sua relação com o mundo.

Outra questão colocada é o desenvolvimento de potencialidades, como a

percepção, a observação, a imaginação e a sensibilidade, que podem alicerçar

a consciência de si no mundo e, assim, contribuir para a apreensão significativa

de conteúdos correspondentes a outras áreas do currículo escolar (BRASIL,

1997).

O lúdico pode possibilitar que se potencialize a exploração e a

construção do conhecimento devido a motivação. Dessa forma, se analisado

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em uma perspectiva pedagógica esta vem a ser um rico instrumento na

aprendizagem, propriamente dita, quanto no desenvolvimento cognitivo,

afetivo, motor e social da criança. E se pensar em atividades de fruição, o

experienciar a ação ou investigação do outro pode se tornar um estímulo para

diferentes contextos ou situações.

Para Silva Filho (2003), o ser humano necessita da fantasia, tanto

consciente como inconsciente, em alternância perene entre essa realidade

interna e o mundo exterior. Segundo ele, ambas são necessárias à mente, para

dar "alma" ao cérebro, sem as quais Este morreria.

Para Herculano-Houzel (2003), a criatividade é a capacidade de

recombinar informações já existentes a fim de resolver problemas. É resultado

de diferentes partes do cérebro que participam de outras funções. Segundo a

autora, desde os anos de 1990 têm-se conhecimento que a imaginação,

definida como a capacidade de visualizar mentalmente o que não está

acessível aos olhos ou outros sentidos, usa as mesmas partes do cérebro que

recebem informações dos sentidos.

O mesmo se aplica a outras funções. A capacidade de encontrar novos caminhos entre ideias e conceitos, e novos conceitos a partir das mesmas ideias, depende do esforço conjunto de regiões dos dois lados do cérebro que também participam da memória de trabalho, da representação de objetos e ações, de significados emocionais complexos, do prazer e da satisfação, e sobretudo da flexibilidade cognitiva: a capacidade de mudar o conjunto de regras em uso. Na hora de ser criativo, o cérebro usa a si mesmo de outra maneira e descobre um caminho alternativo para resolver o problema da vez. (HERCULANO-HOUZEL, 2003, online)

Portanto, a imaginação depende dos sentidos, que por sua vez

dependem da experiência. Somente assim será possível o cérebro aprender a

enxergar, a representar objetos e ações, a raciocinar. “A criatividade, portanto,

pode ser desenvolvida junto com a experiência do mundo. É só o córtex pré-

frontal deixar o resto do cérebro se soltar” (HERCULANO-HOUZEL, 2003, s.n.).

A aprendizagem é uma função integrativa e a criança em

desenvolvimento possui um cérebro plástico, capaz de reorganizar-se para

melhor atender ao organismo em desenvolvimento, às suas capacidades

intelectuais e comportamentais. Importante pensar que a sala de aula é um

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ambiente de múltiplos estímulos que desencadearão o desenvolvimento de

novas conexões neurais. Para isso, é de fundamental importância que o

professor esteja consciente de sua responsabilidade na qualidade de suas

ações e relações, valorizando o desenvolvimento afetivo, social e não apenas o

cognitivo ou motor, como elementos fundamentais no desenvolvimento da

criança para como um todo.

3.3. A emoção nos processos de aprendizagem da Dança

Tanto no aprendizado quanto na execução dos movimentos o sujeito

é afetado pelas suas emoções. Dessa forma, não se pode refletir sobre a

aprendizagem sem considerar as emoções envolvidas durante o processo.

Relvas (2012) define as emoções como conjuntos de reações químicas e

neurais que ocorrem no cérebro emocional e que usam o corpo como “teatro”,

no qual pode ocasionar emoções viscerais que afetam os órgãos internos,

conforme sua intensidade.

De acordo com Cosenza e Guerra (2011) a neurociência vêm

mostrando que os processos cognitivos e emocionais estão profundamente

interligados para o funcionamento do cérebro. As emoções envolvem respostas

periféricas, manifestações que podem ser observadas externamente, além de

haver modificações corporais internas que são percebidas pelo sujeito. Essas

respostas fisiológicas, segundo os mesmos autores, são acompanhadas de

sentimento emocional, ligado ao universo afetivo do organismo (euforia,

desânimo, irritação, etc.), além de poder identificar a emoção sentida (amor,

medo, ódio, ciúme, decepção, etc.). Essa consciência emocional é admitida

apenas a espécie humana.

Embora o funcionamento emocional ocorra em todo o cérebro, em

termos de substratos neurológicos responsáveis pelas funções emocionais,

incluindo necessariamente as funções afetivas e sociais, refere-se

particularmente ao sistema límbico. O sistema límbico, sendo uma região

subcortical envolvida na relação do organismo com o seu envolvimento

“presente e passado”, integra estruturas nervosas importantes para a memória

e para a aprendizagem, como a amígdala, o hipocampo, hipotálamo, a ínsula, o

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córtex cingulado, o núcleo accumbens e os corpos mamilares (FONSECA,

2016). As funções emocionais, portanto, se interligam às funções cognitivas e

as funções executivas. Tanto o desenvolvimento cognitivo quanto o emocional

parecem estar apoiados por diferentes funções executivas corriqueiramente

presentes nos contextos no qual o sujeito da ação está emocionalmente sendo

exigido.

Todos os acontecimentos se originam no cérebro e são processados

por diferentes sistemas e circuitos. Cosenza e Guerra (2011) afirmam que a

amígdala é um centro nervoso que regula os processos emocionais.

Determinados estímulos que possuem valor emocional podem afetar o cérebro.

O primeiro por vias sensoriais ao córtex cerebral, o estímulo ao ser captado,

mobiliza a atenção a atinge as regiões corticais, onde é percebido e

identificado, tornando-se consciente. O segundo, após seguir inicialmente as

mesmas vias sensoriais seguem à amígdala antes de chegar ao córtex

cerebral, desencadeando as respostas emocionais periféricas antes que o

córtex cerebral tome conhecimento do estímulo (COSENZA; GUERRA, 2011).

Estudos apontam que a amígdala parece estar ligada também, além

do medo e da raiva, com o desencadeamento de emoções positivas.

Interligada a outras estruturas cerebrais destaca-se o envolvimento com

circuitos dopaminérgico, originados em neurônios do mesencéfalo ao cérebro.

Esse destino possui um dos seus alvos principais, o núcleo acumbente, cujo os

neurônios se conectam ao córtex pré-frontal, esse circuito está envolvido no

fenômeno da motivação, importante para a aprendizagem (COSENZA;

GUERRA,2011).

Segundo Cosenza e Guerra (2011) durante o processo educacional

aprende-se a controlar a expressão das emoções de forma aceitável

socialmente e a pesar as consequências dos comportamentos sugeridos pelo

sentimento emocional. Essa interação entre os processos cognitivos e

emocionais no cérebro se dá pela área orbitofrontal, importante no controle

social das respostas emocionais e também na associação do processamento

emocional com o cognitivo ou racional no cérebro.

Damásio (1996) considera que as funções cognitivas são guiadas

pela emoção e pela avaliação e julgamento das consequências das ações e

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destaca que a ausência da emoção pode prejudicar o raciocínio coerente e a

capacidade de tomada de decisão. Para Fonseca (2016) a aprendizagem não é

um ato isolado nem neutro afetivamente, podendo apenas ser concebida em

um contexto de transmissão intencional e de atenção e interação emocional

compartilhada, o que por si já integra emoções e cognições, leitura de faces e

de mentes, exibição de sinais não verbais e corporais de tristeza, alegria,

desgosto, surpresa, medo, dentre outros.

As emoções para Cosenza e Guerra (2011) não são, por si mesmas,

boas ou más, mas a forma como se lida com elas pode fazer diferença nas

relações sociais. As emoções podem facilitar o processo de aprendizagem,

mas o estresse deve ser evitado pois possui o efeito contrário. Para esses

autores, a linguagem emocional é corporal antes de ser verbal, e em muitos

momentos a postura, as atitudes e o comportamento do professor assumem

importância sem ter se dado conta. Logo, é necessário criar condições que

levem a um maior autoconhecimento e orientar para que haja respostas mais

adequadas nas interações com o outro.

Fonseca (2016) esclarece que aprender com a experiência sugere

uma interação íntima entre a emoção e a cognição, entre os processos

relacionados com o corpo e a motricidade e processos relacionados com o

cérebro e a mente. A eficiência e o sucesso da aprendizagem ocorrem na

incorporação das funções emocionais nos processos de aquisição de novas

competências e de novos conhecimentos.

É importante lembrar que cada ser humano é único. O professor

como todos os envolvidos na educação da criança são geradores de potencial

cerebral que permeiam por todo o desenvolvimento motor, cognitivo,

emocional, social. Ter conhecimento do funcionamento do cérebro promove

mais qualidade, no que diz respeito aos estímulos, proporcionando aulas cada

vez mais participativas. Contudo, sendo o ser humano programado para

aprender, deve se considerar que a “nossa inteligência se inventa e se

promove no exercício social de nosso corpo consciente" (FREIRE, 2015, p.

122).

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CONCLUSÃO

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma reflexão

sobre os processos que permeiam o ensino e aprendizado da dança com

enfoque interdisciplinar. Permitiu também uma análise para obter dados mais

consistentes sobre as etapas do desenvolvimento motor, cognitivo e social

durante a infância. Além de investigar as metodologias que tomam frente às

discussões sobre o ensino da dança.

Ao investigar, verificou-se que durante sua trajetória, a dança foi

observada e aprimorada de acordo com a evolução do seu tempo. O que

presume ser um dos motivos que a trouxeram durante os séculos. Os

aprofundamentos nas pesquisas acerca dos mecanismos neurofisiológicos

permitiram maior conhecimento dos aspectos funcionais que são acionados

durante o dançar.

Com a análise pôde se mostrar que a dança pode ser uma

ferramenta importante para o desenvolvimento infantil, devido a ampla

possibilidade de estimulação em prol dos processos neurais. Para mais,

enquanto atividade interdisciplinar, pode não apenas estimular a interação

social e afetiva, mas também garantir acesso a informação e à produção de

conhecimentos e novos saberes por meio de investigações, permitindo a

consciência de si e de todo o seu meio.

Dada à importância desse assunto, torna-se necessário o

desenvolvimento de novos estudos que estimulem o uso de metodologias que

alcem a excelência nos processos de ensino-aprendizagem da dança. Dessa

forma, poder ser reavivada como ferramenta contribuinte para a formação e

capacitação de pessoas através de uma aprendizagem humanizadora.

Nesse sentido, a observação, a investigação e a reflexão através do

corpo e a experiência por meio dele permite se fazer conhecer a si, o outro e o

mundo. Portanto, a dança torna-se uma das artes com ricas possibilidades de

experiência e estímulos. Contudo, o diálogo entre a dança e a neurociência têm

proporcionado saberes e novos conhecimentos que podem contribuir nos

processos metodológicos no ensino desta arte.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02

AGRADECIMENTOS 03

DEDICATÓRIA 04

RESUMO 05

METODOLOGIA 06

SUMÁRIO 07

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

A COMPLEXIDADE DO MEIO, DA CULTURA E DA PLASTICIDADE 11

1.1. O sistema nervoso 14

1.2. Neuroplasticidade e o ensino da Dança 18

1.2.1. A observação científica em um breve paralelo histórico da Dança 21

1.2.1. A contemporaneidade que se expande e a plasticidade que se adquire 47

CAPÍTULO II

O DESENVOLVIMENTO DE UM CORPO QUE DANÇA 55

2.1. O desenvolvimento humano: Da primeira à terceira infância 57

2.1.1. O desenvolvimento pré-natal 59

2.1.2. O desenvolvimento na primeira infância (0 aos 3 anos) 65

2.1.3. O desenvolvimento na segunda infância (3 aos 6 anos) 78

2.1.4. O desenvolvimento na terceira infância (6 aos 11 anos) 83

CAPÍTULO III

OBSERVAR, IMITAR, REFLETIR, CRIAR... 88

3.1. As áreas e a organização do movimento voluntário 89

3.2. Os processos em uma metodologia criativa/exploratória 93

3.3. A emoção nos processos de aprendizagem da Dança 98

CONCLUSÃO 101

BIBLIOGRAFIA 102